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Capítulos 1 2 3 4 5 6 Anterior Capa Índice Seguinte<br />
PRINT<br />
POBREZA INFANTIL<br />
E DISPARIDADES<br />
EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
FACEBOOK<br />
TWITTER<br />
YOUTUBE<br />
United Nations<br />
<strong>Mozambique</strong>
AGRADECIMENTOS<br />
O estudo Pobreza Infantil e Disparidades em<br />
Moçambique 2010 é uma iniciativa conjunta<br />
das Nações Unidas em Moçambique. Longo<br />
foi o processo de pesquisa e redacção para<br />
a elaboração do relatório, e muitas foram<br />
as pessoas que nele participaram. Embora<br />
demasiadas para mencionarmos cada uma<br />
delas em particular, queremos manifestar<br />
a nossa gratidão pelo seu forte empenho<br />
e dedicação para com as crianças de<br />
Moçambique.<br />
À equipe da Secção de Política Social,<br />
Planificação, Informação e Monitoria<br />
(SPPIM) da Representação do <strong>UNICEF</strong><br />
Moçambique coube a principal<br />
responsabilidade de coordenação e<br />
redacção do relatório. Realizou a pesquisa<br />
Brendan Kelly, em estreita colaboração com<br />
as secções da Representação do <strong>UNICEF</strong><br />
Moçambique, que preparou os documentos<br />
preliminares de base para os capítulos<br />
temáticos.<br />
O relatório beneficiou enormemente das<br />
generosas contribuições e orientação<br />
intelectual de um Comité Director<br />
multissectorial composto pelo Governo<br />
(MPD, MISAU, MINED, MMAS, MINJUS, INE<br />
e CNCS), a Sociedade Civil (Fórum Mulher,<br />
FDC, Aliança Save the Children, Rede da<br />
Criança e Grupo 20); Organizações Bilaterais<br />
(DFID, Banco Mundial e Embaixada da Suíça)<br />
e as Nações Unidas (ONUSIDA e <strong>UNICEF</strong>).<br />
Pelos seus proveitosos comentários e<br />
contributos, agradecemos especialmente<br />
a Carlo Azzari (Banco Mundial), Gabriel<br />
Dava (PNUD), Baiba Gaile (PNUD), Isabel<br />
Kreisler (PNUD), Pierre Martel, Wim Ulens<br />
(UE), Bridget Walker (Ajuda Irlandesa), Karin<br />
Metell (Embaixada da Suécia), António<br />
Nucifora (Banco Mundial) e Zainul Sajan<br />
Virgi (Universidade McGill).<br />
Pela sua liderança e visão no<br />
desenvolvimento de todo o relatório, Leila<br />
Gharagozloo-Pakkala, que desempenhou<br />
a função de Representante do <strong>UNICEF</strong><br />
Moçambique em fases cruciais da<br />
preparação deste estudo, merece também o<br />
nosso agradecimento especial.<br />
A reprodução de qualquer parte desta publicação não carece de autorização,<br />
excepto para fins comerciais. Exige-se, no entanto, a identicação da fonte.<br />
© <strong>UNICEF</strong>, Maputo, Moçambique, 2011
Prefácio<br />
O estudo Pobreza Infantil e Disparidades em<br />
Moçambique 2010 constitui uma oportunidade<br />
para se inventariarem os progressos alcançados<br />
na materialização dos direitos dos dez milhões de<br />
crianças moçambicanas desde o estudo A Pobreza<br />
na Infância em Moçambique: Uma Análise da<br />
Situação e das Tendências e os imensos desafios<br />
que persistem para os próximos anos.<br />
O Governo de Moçambique demonstrou o seu<br />
empenho na realização dos direitos das crianças<br />
moçambicanas ao ratificar, em 1994, a Convenção<br />
sobre os Direitos da Criança. Os direitos e<br />
necessidades das crianças são distintos dos direitos<br />
e necessidades dos adultos uma vez que enfrentar<br />
pobreza e privação quando se é ainda uma<br />
criança afecta, ao longo de toda a vida, a saúde, a<br />
produtividade e a capacidade de criar uma família e<br />
viver uma vida feliz. Sendo assim, é preciso que se<br />
invista hoje para garantir uma próxima geração de<br />
moçambicanos produtiva, saudável e realizada.<br />
Nos últimos seis anos a pobreza estagnou em<br />
Moçambique. Mais de metade da população, o<br />
que inclui mais crianças do que adultos, continua<br />
a viver com menos de meio dólar americano por<br />
dia. Um surpreendente número de crianças têm<br />
baixa altura para a idade – sofrem de desnutrição<br />
crónica –, cujos efeitos são irreversíveis. O número<br />
de crianças com acesso a água potável tem vindo<br />
a diminuir, sendo ainda inferior o de crianças com<br />
acesso a saneamento básico. A não satisfação<br />
dessas necessidades básicas das crianças torna-as<br />
mais fáceis vítimas das quatro principais causas de<br />
mortalidade infantil: malária, problemas neonatais,<br />
infecções respiratórias agudas e SIDA. Dada a<br />
grande desigualdade com que deparam no acesso<br />
a serviços já de si escassos, as meninas, os órfãos,<br />
as crianças portadoras de deficiência e a viver em<br />
áreas rurais e as famílias mais pobres encontramse<br />
em situação de vulnerabilidade ainda maior.<br />
Não quer isto dizer que nos últimos anos não<br />
se tenham registado progressos. A pobreza<br />
absoluta, medida pela privação de necessidades<br />
e serviços básicos, diminuiu significativamente<br />
em Moçambique, com mais crianças tendo<br />
acesso a serviços básicos como a saúde e a<br />
educação, como resultado directo do empenho<br />
do Governo nesse domínio. Nunca é de mais<br />
referir a importância da educação, pois uma<br />
mãe instruída é um factor determinante na<br />
saúde e bem-estar dos seus filhos. Eliminar a<br />
disparidade geográfica é igualmente crucial, pois<br />
as crianças das províncias do centro e do norte,<br />
como a Zambézia, estão a ser deixadas para<br />
trás, com mais baixas dotações orçamentais e a<br />
correspondente inacessibilidade aos serviços de<br />
que tanto necessitam para se equipararem às suas<br />
congéneres do sul.<br />
Restam-nos apenas quatro anos para 2015, a<br />
meta dos Objectivos de Desenvolvimento do<br />
Milénio (ODM). Não obstante ser cada vez mais<br />
evidente a improbabilidade de Moçambique<br />
alcançar todos esses objectivos, os próximos<br />
quatro anos são uma oportunidade para se<br />
ampliarem as intervenções visando reduzir<br />
o fardo resultante da pobreza, da fome, da<br />
mortalidade infantil, da desigualdade de género<br />
e das doenças que muitas crianças continuam<br />
a enfrentar. Cada meta dos ODM que vier a ser<br />
alcançada dever-se-á a esforços concertados e<br />
colaboração entre o Governo de Moçambique,<br />
a família das NU, a comunidade de doadores, a<br />
sociedade civil e o povo moçambicano.<br />
Os últimos anos têm demonstrado que se pode<br />
investir para melhorar a vida das crianças em<br />
Moçambique. Chegou a hora de se redobrarem<br />
esses esforços para que cada criança e cada<br />
moçambicano possam ansiar por uma vida<br />
longa, saudável, feliz e gratificante.<br />
Coordenadora Residente do Sistema das Nações Unidas,<br />
Jennifer Topping
Índice<br />
Lista de figuras .............................................................................................................................................................................................. XVII<br />
Lista de Tabelas ............................................................................................................................................................................................. XVII<br />
Siglas......................................................................................................................................................................................................................... XIX<br />
Mapa de Moçambique ............................................................................................................................................................................ XXII<br />
Sumário Executivo ..................................................................................................................................................................................... XXIII<br />
CAPÍTULO 1: POBREZA EM MOÇAMBIQUE<br />
1. Introdução ...................................................................................................................................................................................................... 3<br />
2. Medindo a pobreza ................................................................................................................................................................................ 4<br />
2.1. Pobreza baseada no consumo ...................................................................................................................................... 4<br />
2.2. Medidas de pobreza baseada em privações .................................................................................................... 9<br />
2.3. Comparação entre a medida de pobreza baseada em privações e a medida<br />
baseada no consumo ............................................................................................................................................................ 14<br />
3. Análise por privação ............................................................................................................................................................................. 15<br />
3.1. Privação severa de educação nas crianças .......................................................................................................... 15<br />
3.2. Privação severa de nutrição nas crianças ........................................................................................................... 16<br />
3.3. Privação severa de água nas crianças ................................................................................................................... 17<br />
3.4. Privação severa de saneamento nas crianças ................................................................................................ 18<br />
3.5. Privação severa de saúde nas crianças ................................................................................................................ 19<br />
3.6. Privação severa de abrigo nas crianças ............................................................................................................... 20<br />
3.7. Privação severa de informação nas crianças .................................................................................................. 20<br />
4. Conclusões ..................................................................................................................................................................................................... 21<br />
Referências ............................................................................................................................................................................................................. 23<br />
CAPÍTULO 2: O CONTEXTO DE DESENVOLVIMENTO<br />
1. Introdução ...................................................................................................................................................................................................... 27<br />
2. Transição para a paz, democracia e economia de mercado ............................................................................ 28<br />
2.1. Tendências demográficas .................................................................................................................................................. 29<br />
2.2. Crescimento económico e estabilidade macroeconómica ................................................................. 29<br />
2.3. Objectivois de Desenvolvimento do Milénio ................................................................................................... 30<br />
2.4. O processo de descentralização em Moçambique .................................................................................... 33<br />
3. Análise das políticas e institucional ......................................................................................................................................... 35<br />
3.1. Políticas e mecanismos de planificação ................................................................................................................ 35<br />
3.2. Monitorização e avaliação ................................................................................................................................................. 37<br />
3.3. Quadro legal para apoiar a realização dos direitos da criança ....................................................... 39<br />
VII
4. Ajuda externa ao desenvolvimento ........................................................................................................................................ 40<br />
4.1. Coordenação da assistência internacional ao desenvolvimento .................................................. 40<br />
4.2. Análise das implicações para as crianças .......................................................................................................... 41<br />
5. Conclusões ........................................................................................................................................................................................................ 43<br />
Referências .............................................................................................................................................................................................................. 45<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
1. Introdução ...................................................................................................................................................................................................... 49<br />
2. Saúde e nutrição ....................................................................................................................................................................................... 51<br />
2.1. Sobrevivência infantil ............................................................................................................................................................ 51<br />
2.2. Nutrição infantil .......................................................................................................................................................................... 55<br />
2.3. Sobrevivência, saúde e nutrição materna............................................................................................................. 67<br />
2.4. Doenças da infância ................................................................................................................................................................. 73<br />
2.5. Malária ................................................................................................................................................................................................. 73<br />
2.6. Infecções respiratórias agudas ..................................................................................................................................... 76<br />
2.7. Doenças diarreicas ................................................................................................................................................................... 76<br />
2.8. Cólera ................................................................................................................................................................................................... 78<br />
2.9. Doenças preveníveis por vacinação e imunização .................................................................................... 78<br />
2.10. HIV e SIDA ........................................................................................................................................................................................ 81<br />
2.11. Financiamento e alocação orçamental ao sector da saúde ............................................................... 81<br />
3. Água e saneamento ................................................................................................................................................................................ 85<br />
3.1. Quadro Institucional ............................................................................................................................................................... 85<br />
3.2. Programa Nacional de Abastecimento de Água e Saneamento Rural ................................... 87<br />
3.3. Abastecimento de água ....................................................................................................................................................... 87<br />
3.4. Saneamento ...................................................................................................................................................................................... 91<br />
3.5. Sustentabilidade das infra-estruturas de ASH ............................................................................................... 93<br />
3.6. Água e saneamento nas escolas ................................................................................................................................. 93<br />
3.7. Financiamento do sector e dotações orçamentais .................................................................................... 97<br />
4. Conclusões ..................................................................................................................................................................................................... 99<br />
Referências ........................................................................................................................................................................................................ 101<br />
CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO<br />
DESENVOLVIMENTO<br />
1. Introdução .................................................................................................................................................................................................... 109<br />
2. A actual situação e recentes tendências no sector da educação .......................................................... 110<br />
2.1 O sistema de educação em Moçambique ......................................................................................................... 110<br />
2.2. Crianças na escola ................................................................................................................................................................. 111<br />
2.3.Crianças fora da escola ...................................................................................................................................................... 112<br />
2.4. Atrasos no início da escolarização ...................................................................................................................... 113<br />
2.5. Conclusão do ensino primário e transição para o ensino secundário .............................. 114<br />
2.6. Progressão pelas classes ................................................................................................................................................ 115<br />
2.7. Equidade na Educação ...................................................................................................................................................... 116<br />
2.8. Alfabetização .............................................................................................................................................................................. 118<br />
2.9. Ensino superior ........................................................................................................................................................................ 118<br />
3. Barreiras à participação na educação ............................................................................................................................... 119<br />
3.1. Custos directos com a educação .......................................................................................................................... 119<br />
3.2. Custos de oportunidade para as comunidades ...................................................................................... 119<br />
3.3. Impacto de tradições e da cultura no direito das crianças à educação ............................ 119<br />
3.4. Impacto da violência e do abuso nas escolas ............................................................................................ 120<br />
3.5. Qualidade de ensino ............................................................................................................................................................ 120<br />
3.6. Infra-estruturas escolares ............................................................................................................................................... 123<br />
3.7. Disponibilidade de professores ............................................................................................................................. 124<br />
3.8. Formação pré-docência e formação contínua de professores ................................................... 125<br />
3.9. Gestão escolar ........................................................................................................................................................................... 127<br />
3.10. Falta de enfoque em saúde escolar .................................................................................................................... 127<br />
3.11. Impacto da língua nos resultados educacionais .................................................................................... 128<br />
4. Outras questões no sector da educação ......................................................................................................................... 129<br />
4.1. Estratégia de habilidades para a vida visando combater a SIDA .............................................. 129<br />
4.2. Participação das crianças ................................................................................................................................................ 129<br />
4.3. Educação para crianças com necessidades especiais ...................................................................... 130<br />
4.4. Financiamento e alocação orçamental do sector da educação ............................................... 130<br />
4.6. Programa Apoio Directo às Escolas ................................................................................................................... 132<br />
5. Conclusões .................................................................................................................................................................................................. 133<br />
Referências ........................................................................................................................................................................................................ 135<br />
VIII<br />
IX
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
1. Introdução ................................................................................................................................................................................................. 141<br />
2. Reforma legislativa e das políticas ..................................................................................................................................... 143<br />
3. Violência, abuso e exploração ................................................................................................................................................. 146<br />
3.1. Violência e abuso sexual nas escolas .............................................................................................................. 146<br />
3.2. A violência doméstica ..................................................................................................................................................... 148<br />
3.3. Exploração e abuso sexual comercial .............................................................................................................. 150<br />
3.4. Tráfico de crianças e migração ............................................................................................................................... 150<br />
3.5. Trabalho infantil ..................................................................................................................................................................... 151<br />
3.6. Casamento infantil ............................................................................................................................................................... 154<br />
4. As crianças e o sector da justiça ............................................................................................................................................ 156<br />
4.1. Acesso das crianças a propriedade e herança .......................................................................................... 157<br />
4.2. Registo de nascimento .................................................................................................................................................... 158<br />
4.3. Crianças portadoras de deficiência ...................................................................................................................... 160<br />
4.4. Mecanismos de cuidados alternativos ............................................................................................................ 160<br />
4.5. Crianças órfãs e vulneráveis e outras crianças marginalizadas .............................................. 162<br />
4.6. Protecção Social Básica ................................................................................................................................................. 164<br />
4.7. Atestados de Pobreza ...................................................................................................................................................... 166<br />
4.8. Análise de capacidade .................................................................................................................................................... 166<br />
4.9. Parcerias da sociedade civil ....................................................................................................................................... 169<br />
4.10. Financiamento do sector e dotações orçamentais .............................................................................. 169<br />
5. Conclusões ................................................................................................................................................................................................ 171<br />
Referências ........................................................................................................................................................................................................ 173<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
1. Introdução ................................................................................................................................................................................................. 179<br />
2. Género ............................................................................................................................................................................................................ 180<br />
2.1. Aspectos de género da pobreza em Moçambique ................................................................................ 181<br />
2.2. Desenvolvimento ajustado ao género e empoderamento com base em género .... 182<br />
2.3. Disparidades de género .................................................................................................................................................. 184<br />
2.4. Questões de género na educação ........................................................................................................................ 184<br />
2.5. Violência, abuso e exploração .................................................................................................................................. 185<br />
2.6. Sistemas de Linhagem .................................................................................................................................................... 186<br />
2.7. HIV e género ............................................................................................................................................................................. 186<br />
2.8. Conclusões .................................................................................................................................................................................. 188<br />
3. Disparidades geográficas ............................................................................................................................................................ 189<br />
3.1. Disparidades nas dotações orçamentais ........................................................................................................ 191<br />
3.2. Disparidades na saúde ..................................................................................................................................................... 192<br />
3.3. Disparidades no acesso à educação ................................................................................................................... 194<br />
3.4. Disparidades na protecção da criança .............................................................................................................. 196<br />
3.5. Conclusões .................................................................................................................................................................................. 197<br />
4. HIV e SIDA ..................................................................................................................................................................................................... 199<br />
4.1. Perfil da epidemia do HIV em Moçambique ................................................................................................ 199<br />
4.2. Acções prioritárias em prol das crianças no âmbito do HIV e da SIDA ............................. 203<br />
4.3. P1 – Prevenção primária ................................................................................................................................................. 204<br />
4.4. P2 – Prevenção da transmissão vertical do HIV......................................................................................... 206<br />
4.5. P3 – SIDA Pediátrica ........................................................................................................................................................... 212<br />
4.6. P4 – Proteger as crianças órfãs e vulneráveis afectadas pela SIDA ..................................... 215<br />
4.7. Nutrição e HIV .......................................................................................................................................................................... 215<br />
4.8. Conclusões ................................................................................................................................................................................ 216<br />
5. Questões ambientais e mudança climática ................................................................................................................ 217<br />
5.1. Questões ambientais em Moçambique ........................................................................................................... 217<br />
5.2. O desenvolvimento sustentável em Moçambique ................................................................................ 218<br />
5.3. O impacto da degradação ambiental e das situações de emergência<br />
nas crianças em Moçambique................................................................................................................................... 219<br />
5.4. O contexto institucional .................................................................................................................................................. 225<br />
5.5. Conclusões .................................................................................................................................................................................. 225<br />
6. Comunicação para o Desenvolvimento .......................................................................................................................... 227<br />
6.1. Desenvolvimento dos órgãos de comunicação social em Moçambique ......................... 227<br />
6.2. O papel de mudança dos media: comunicação para o desenvolvimento<br />
e mobilização da comunidade .................................................................................................................................. 229<br />
6.3. Iniciativas promissoras nos media moçambicanos .............................................................................. 229<br />
6.4. Redes e parcerias amigas da criança ................................................................................................................. 230<br />
6.5. Privação de informação .................................................................................................................................................. 231<br />
6.6. Conclusões .................................................................................................................................................................................. 231<br />
Referências ........................................................................................................................................................................................................ 233<br />
BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................................................................................................. 243<br />
X<br />
XI
Lista de Figuras<br />
Figura 1.1:<br />
Percentagem de crianças com duas ou mais privações severas,<br />
2003 e 2008 ........................................................................................................................................................................ 12<br />
Figura 1.2: Percentagem de crianças que sofrem privações, 2003 e 2008............................................. 13<br />
Figura 1.3:<br />
Figura 1.4:<br />
Percentagem de crianças com duas ou mais privações severas por província,<br />
2003 e 2008 ........................................................................................................................................................................ 13<br />
Pobreza baseada em privações comparada com pobreza baseada<br />
no consumo nas crianças, 2008, percentagem ................................................................................ 14<br />
Figura 1.5: Níveis de privação severa de educação por província, 2003 e 2008 ........................... 15<br />
Figura 1.6: Privação nutricional severa nas crianças, por província, 2003 e 2008 ....................... 16<br />
Figura 1.7: Privação severa de água por quintil de riqueza, 2008 ............................................................... 18<br />
Figura 1.8: Privação severa de saneamento nas crianças, por província, 2008 ............................. 19<br />
Figura 1.9: Níveis de privação severa de saúde por província, 2003 e 2008 ..................................... 19<br />
Figura 1.10: Privação severa de abrigo por quintil de riqueza, 2008 ........................................................... 20<br />
Figura 2.1: Instrumentos de Planificação em Moçambique ............................................................................... 37<br />
Figura 3.1: Taxas de mortalidade em Moçambique por 1.000 nados vivos, de 2003 e 2008<br />
(média dos cinco anos precedentes ao inquérito) ........................................................................ 51<br />
Figura 3.2:<br />
Figura 3.3:<br />
Figura 3.4:<br />
Taxas de mortalidade infantil por 1.000 nados vivos em Moçambique,<br />
de 2003 e 2008 (média dos cinco anos que antecederam a pesquisa) ...................... 52<br />
Parcela de agregados familiares situados a menos de 45 minutos<br />
a pé de uma unidade de cuidados de saúde primários,<br />
2002/03 e 2008/09 (percentagem) .................................................................................................................. 53<br />
Probabilidade de sobrevivência das crianças (0-17 anos) nos últimos<br />
12 meses, por nível de escolaridade do chefe de família, 2008 ........................................ 54<br />
Figura 3.5: Causas da mortalidade infantil em Moçambique, 2008 ............................................................ 54<br />
Figura 3.6: Taxas de desnutrição crónica por país, 2009 ....................................................................................... 56<br />
Figura 3.7:<br />
Figura 3.8:<br />
Figura 3.9:<br />
Taxas de desnutrição (moderada) em crianças menores de cinco<br />
anos, 2003 e 2008 .......................................................................................................................................................... 57<br />
Percentagem de baixo peso para a altura em crianças menores<br />
de cinco anos por província, 2008 ................................................................................................................. 57<br />
Percentagem de baixo peso em crianças menores de cinco anos,<br />
por província, 2008 ...................................................................................................................................................... 58<br />
Figura 3.10: Percentagem de desnutrição crónica (baixa altura para a idade)<br />
em crianças menores de cinco anos, por província, 2008 ...................................................... 59<br />
Figura 3.11: O quadro conceptual da desnutrição Desnutrição infantil,<br />
morte e deficiência ...................................................................................................................................................... 61<br />
XIII
Figura 3.12: Percentagem de crianças com amamentação exclusiva: dados<br />
de diferentes grupos etários, 1997, 2003 e 2008............................................................................... 62<br />
Figure 3.13: Amamentação exclusiva em crianças com menos de 12 meses,<br />
1997, 2003 e 2008 .......................................................................................................................................................... 62<br />
Figura 3.14: Padrões alimentares de crianças menores de um ano<br />
de idade, 2008 .................................................................................................................................................................. 63<br />
Figura 3.15: Crianças com 6-11 meses alimentadas com leite materno e alimentos<br />
complementares pelo menos três vezes por dia, por província, 2008 ........................ 63<br />
Figura 3.16: Uso de sal iodado por província, 2008 ...................................................................................................... 65<br />
Figura 3.17: Uso de sal iodado por quintil de riqueza de 2008 .......................................................................... 66<br />
Figura 3.18: Cobertura da suplementação com vitamina A, 2003 e 2008 ............................................... 66<br />
Figura 3.19: Continuum de cuidados de saúde materna e neonatal ............................................................. 68<br />
Figura 3.20: Mulheres atendidas pelo menos uma vez por pessoal de saúde qualificado<br />
durante a gravidez, 1997, 2003 e 2008 ...................................................................................................... 71<br />
Figura 3.21: Percentagem de mulheres que beneficiaram de cuidados pré-natais<br />
e deram à luz em unidades sanitárias, por quintil de riqueza, 2008............................... 72<br />
Figura 3.22: Percentagem de crianças que receberam tratamento adequado<br />
para malária, 2003 e 2008 ..................................................................................................................................... 74<br />
Figura 3.23: Prevalência de infecções respiratórias agudas, por província,<br />
em 2008 .................................................................................................................................................................................. 77<br />
Figura 3.24: Percentagem de crianças menores de cinco anos que recebem tratamento<br />
adequado para infecções respiratórias agudas por província, 2008.............................. 77<br />
Figura 3.25: Vacinação de crianças de 12-23 meses por antígeno, em 1997,<br />
2003 e 2008 ......................................................................................................................................................................... 80<br />
Figura 3.26: Dotações per capita para a saúde por província (meticais), 2009 ................................... 82<br />
Figura 3.27: Dotações para o sector da saúde, CFMP 2010-2012 ..................................................................... 83<br />
Figura 3.28: Percentagem de agregados familiares com acesso a água potável,<br />
2004 e 2008 ......................................................................................................................................................................... 87<br />
Figura 3.29: Uso de fonte de água melhorada por província, 2008 ................................................................ 89<br />
Figura 3.30: Tempo médio gasto para se chegar a uma fonte de água<br />
(em minutos), 2008....................................................................................................................................................... 90<br />
Figura 3.31: Probabilidade de acesso a fonte de água melhorada, por classificação<br />
de riqueza 2008................................................................................................................................................................. 90<br />
Figura 3.32: Acesso a saneamento seguro por localização geográfica, 2004 e 2008 ..................... 91<br />
Figura 3.33: Acesso a instalações sanitárias melhoradas, 2008 ......................................................................... 92<br />
Figura 3.34: Probabilidade de acesso a fonte de saneamento melhorado .............................................. 92<br />
Figura 4.1: Taxas líquidas de frequência, 2003 e 2008 ........................................................................................... 111<br />
Figure 4.2: Probabilidade de não frequentar a escola primária, 2008 ..................................................... 112<br />
Figura 4.3:<br />
Figura 4.4:<br />
Figura 4.6:<br />
Figura 4.8:<br />
Percentagem de crianças de 6-12 e 13-17 anos fora da escola,<br />
por sexo, local de residência e condições socioeconómicas, 2008 .............................. 113<br />
Distribuição da população de acordo com a idade de entrada<br />
na escola, 2008 ................................................................................................................................................................ 114<br />
Percentagem dos que entram na primeira classe que chegam à última<br />
classe do ensino primário, por características seleccionadas<br />
de riqueza, 2003 e 2008............................................................................................................................................. 116<br />
Rácios líquidos de frequência no ensino secundário por quintil<br />
de riqueza, 2003 e 2008 ........................................................................................................................................... 117<br />
Figura 4.9: Taxas de alfabetização em mulheres de 15-24 anos por quintil<br />
de riqueza, 2008 .............................................................................................................................................................. 118<br />
Figura 4.10: Casamentos infantis e raparigas fora da escola secundária<br />
por província, 2008 ...................................................................................................................................................... 120<br />
Figura 4.11: Resultados dos alunos em leitura, 2000 e 2007 .............................................................................. 121<br />
Figura 4.12: Resultados dos alunos em matemática, 2000 e 2007 ................................................................. 121<br />
Figura 4.13: Rácio professor-aluno, 2004-2009 ................................................................................................................. 125<br />
Figura 4.14: Dotação orçamental para a educação em milhões de meticais,<br />
2009 e 2010 ......................................................................................................................................................................... 130<br />
Figura 5.1:<br />
Figura 5.2:<br />
Figura 5.3:<br />
Figura 5.4:<br />
Figura 5.5<br />
Percentagem de mulheres de 15-49 anos que acham que um marido<br />
pode bater na sua esposa, por motivo específico, 2008 .......................................................... 148<br />
Percentagem de mulheres (15-49 anos) que acreditam que bater<br />
na esposa se justifica em determinadas circunstâncias, 2008 ........................................... 149<br />
Probabilidade de aceitação da violência doméstica pelas<br />
mulheres, 2008 ................................................................................................................................................................ 149<br />
Percentagem de crianças de 5-14 anos que estão envolvidas<br />
em trabalho infantil, por província e sexo, 2008 ............................................................................. 152<br />
Prevalência de trabalho infantil por nível de escolaridade<br />
da mãe, 2008 ..................................................................................................................................................................... 152<br />
Figura 5.6: Trabalho infantil e frequência escolar, por área geográfica, 2008.................................... 153<br />
Figura 5.7: Mulheres de 20-24 anos que se casaram antes dos 15 e dos 18<br />
anos, 2003 e 2008 .......................................................................................................................................................... 154<br />
Figura 5.8: Razões para não registar os nascimentos, 2008 .............................................................................. 159<br />
Figura 5.9:<br />
Percentagem de crianças com menos de cinco anos com registo<br />
de nascimento, por província, 2008 ............................................................................................................. 159<br />
Figura 5.10: Percentagem de crianças (2-9 anos) com pelo menos uma deficiência<br />
relatada, 2008 .................................................................................................................................................................... 160<br />
XIV<br />
XV
Figura 5.11: Percentagem de crianças órfãs e vulneráveis devido à SIDA, 2008 .............................. 164<br />
Figura 6.1:<br />
Figura 6.2:<br />
Figura 6.3:<br />
Percentagem de agregados familiares chefiados por homens por<br />
quintil de riqueza, 2002, 2005 e 2008 .......................................................................................................... 182<br />
IDG baseado em diferentes métodos de determinação da<br />
diferença salarial, 2009 ............................................................................................................................................ 183<br />
Despesa per capita combinada para saúde, educação<br />
e justiça, 2005, 2006 e 2008 ............................................................................................................................... 191<br />
Figura 6.4: Despesa de saúde per capita, percentagem da média nacional, 2008 .................... 192<br />
Figura 6.5: Despesa per capita na saúde (2008) e sobrevivência da criança (1998-2008)..... 193<br />
Figura 6.6: Prevalência de HIV por província, 2009................................................................................................... 193<br />
Figura 6.7:<br />
Percentagem de mulheres que receberam informação sobre o HIV<br />
e fizeram teste em consultas de cuidados pré-natais, 2008 ................................................ 194<br />
Figura 6.8: Despesa per capita na educação, percentagem da média nacional, 2008.............. 195<br />
Figura 6.9: Despesa per capita na Educação e taxas de alfabetização, 2008..................................... 195<br />
Figura 6.10: Rácio líquido de escolarização no ensino primário<br />
(EP1 & EP2) por província, 2008 .................................................................................................................. 196<br />
Figura 6.11: Percentagem de mulheres com 15-49 anos casadas ou em união antes<br />
completarem os 15 anos, 2008........................................................................................................................ 196<br />
Figura 6.12: Distribuição de novas infecções por modo de exposição<br />
em Moçambique, 2008 ........................................................................................................................................... 201<br />
Figura 6.13: Incidência e prevalência de HIV estimada por região<br />
em Moçambique, 1998–2010 ............................................................................................................................ 203<br />
Figura 6.14: Identificação de concepções erróneas sobre o HIV, mulheres<br />
de 15-49 anos, 2008 ................................................................................................................................................. 204<br />
Figura 6.15: Probabilidade de não uso de preservativo em relação sexual,<br />
mulheres de 15-24 anos, 2008.......................................................................................................................... 205<br />
Figura 6.16: Tendências na cobertura de PTV entre 2002 e 2009 ................................................................... 207<br />
Figura 6.17: Testagem e aconselhamento em consultas pré-natais, 2003 e 2008 .......................... 208<br />
Figura 6.18: Testagem e aconselhamento de HIV em consultas pré-natais,<br />
por quintil de riqueza, 2008 .............................................................................................................................. 209<br />
Figura 6.19: Partos assistidos, 1997, 2003 e 2008 ........................................................................................................ 210<br />
Figura 6.20: Cascata de PTV pré-natal e pós-natal, 2009 ....................................................................................... 211<br />
Figura 6.21: Número estimado de crianças com menos de 15 anos vivendo com HIV,<br />
menores de 5 vivendo com HIV, número de novas infecções em menores<br />
de 15, e número de crianças com menos de 15 anos a necessitar<br />
de tratamento/terapia anti-retroviral, 2006–2010 .......................................................................... 212<br />
Figura 6.22: Custo da degradação ambiental por ano, 2009 .............................................................................. 219<br />
Lista de Tabelas<br />
Tabela 1.1: Privação em Moçambique, 2008 ..................................................................................................................................... 9<br />
Tabela 2.1: Indicadores Económicos, 2003-2009 ............................................................................................................................ 28<br />
Tabela 2.2: Evolução rumo aos ODM ...................................................................................................................................................... 31<br />
Tabela 2.3: Financiamento interno e externo no Orçamento do Estado, 2009-2012<br />
(pressupondo um crescimento do PIB de 6,1 por cento) .............................................................................. 41<br />
Tabela 3.1: Regressão linear multivariável de todas as variáveis explicativas relevantes<br />
sobre o Z-score do indicador altura/idade (height-for-health Z-zcore)<br />
em crianças menores de cinco anos incluídas no MICS, excluindo<br />
a classificação da riqueza, 2008 ....................................................................................................................................... 60<br />
Tabela 3.2: Casos de cólera em Moçambique, 2007-2010 ....................................................................................................... 78<br />
Tabela 3.3: Análise comparativa das dotações para a saúde, 2007 e 2008 ................................................................ 81<br />
Tabela 3.4: Número de alunos matriculados, por sexo, em cinco distritos de Escolas<br />
Amigas da Criança, 2006-2008 .......................................................................................................................................... 97<br />
Tabela 3.5: Financiamento do sector da água como percentagem do orçamento<br />
do estado, 2003-2010, anos seleccionados .............................................................................. 98<br />
Tabela 4.1: Relação professor-aluno por província, 2008 .......................................................................... 124<br />
Tabela 5.1: Transferências de dinheiro projectadas para agregados familiares chefiados<br />
por idosos, portadores de deficiência e doentes crónicos, 2010-2014 ................................................. 166<br />
Tabela 5.2: Transferências de dinheiro para famílias com crianças órfãs e vulneráveis, 2010-2014...... 166<br />
Tabela 6.1: Scorecard para a resposta do Governo de Moçambique à SIDA numa<br />
perspectiva de género................................................................................................................ 188<br />
Tabela 6.2: Percentagem de crianças que enfrentam duas ou mais privações severas,<br />
2003 e 2008.................................................................................................................................. 190<br />
Tabela 6.3: Metas relativas ao HIV pediátrico, 2009.................................................................................... 214<br />
Tabela 6.4: Estratégias para fazer face a dificuldades usadas anualmente na época<br />
seca no Moçambique rural, 2009, percentagem...................................................................... 221<br />
XVI<br />
XVII
Siglas<br />
ADE<br />
ADE-COV<br />
ADPP<br />
AIDI<br />
AIDNI<br />
AIM<br />
AMCOW<br />
APE<br />
ASH<br />
AZT<br />
C-AIDI<br />
C-AIDNI<br />
C-IMCI<br />
C-IMNCI<br />
C4D<br />
CEDAW<br />
CLTS<br />
CMC<br />
COV<br />
DNA<br />
DNRN<br />
DPI<br />
DPT<br />
EFA-FTI<br />
EP1<br />
EP2<br />
EPC<br />
EPE<br />
EPF<br />
ESG1<br />
ESG2<br />
FASE<br />
FORCOM<br />
FRELIMO<br />
Apoio Directo às Escolas<br />
Apoio Directo às Escolas - Crianças Órfãs e Vulneráveis<br />
Ajuda de Desenvolvimento de Povo para Povo<br />
Atenção Integrada às Doenças da Infância<br />
Atenção Integrada às Doenças Neonatais e da Infância<br />
Agência de Informação de Moçambique<br />
African Ministers’ Council on Water (Conselho de Ministros Africanos da Água)<br />
Agente Polivalente Elementar de Saúde<br />
Água, Saneamento e Higiene<br />
Zidovudine<br />
Atenção Comunitária Integrada às Doenças da Infância<br />
Atenção Comunitária Integrada às Doenças Neonatais e da InfânciaINCM<br />
Community-Integrated Management of Childhood Ilness (Atenção Comunitária<br />
Integrada às Doenças da Infância)<br />
Community-Integrated Management of Neonatal and Childhood Ilness (Atenção<br />
Comunitária Integrada às Doenças Neonatais e da Infância)<br />
Comunicação para o Desenvolvimento<br />
Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as<br />
Mulheres<br />
Community Led Total Sanitation (Saneamento Total Liderado pela Comunidade)<br />
Centro Multimédia Comunitário<br />
Crianças Órfãs e Vulneráveis<br />
Direcção Nacional de Águas<br />
Direcção Nacional dos Registos e Notariado<br />
Desenvolvimento na Primeira Infância<br />
Difteria-Tosse convulsa-Tétano<br />
Educação para Todos – Fast Track Initiative<br />
Ensino Primário do Primeiro Grau<br />
Ensino Primário do Segundo Grau<br />
Ensino Primário Completo<br />
Escolas Primárias Expandidas<br />
Escola de Professores do Futuro<br />
Ensino Secundário Geral do Primeiro Grau<br />
Ensino Secundário Geral do Segundo Grau<br />
Fundo de Apoio ao Sector Educação<br />
Fórum Nacional de Rádios Comunitárias<br />
Frente de Libertação de Moçambique<br />
XIX
GABINFO<br />
HAART<br />
HIV<br />
IAF<br />
ICS<br />
IDG<br />
IDS<br />
IFP<br />
Gabinete de Informação<br />
Hihgly Active Antiretroviral Therapy (terapia antiretroviral altamente activa)<br />
Vírus de Imunodeficiência Humana<br />
Inquérito aos Agregados Familiares<br />
Instituto de Comunicação Social<br />
Índice de Desenvolvimento Ajustado ao Género<br />
Inquérito Demográfico e de Saúde<br />
Instituto de Formação dos Professores<br />
IFTRAB Inquérito Integrado à Força de Trabalho (2004/05)<br />
INGC<br />
Instituto Nacional de Gestão de Calamidades<br />
INSIDA<br />
Inquérito Nacional de Prevalência. Riscos Comportamentais e Informação sobre o HIV e<br />
SIDA em Moçambique<br />
Instituto Nacional das Comunicações de Moçambique<br />
IOF<br />
Inquérito sobre o Orçamento Familiar<br />
IPAJ Instituto do Patrocínio e Assistência Jurídica<br />
IPG<br />
Índice de Paridade de Género<br />
IRA<br />
Infecção Respiratória Aguda<br />
LOLE Lei dos Órgãos Locais do Estado<br />
MICOA Ministério da Coordenação da Acção Ambiental<br />
MICS Inquérito de Indicadores Múltiplos<br />
MINED Ministério da Educação<br />
MMAS Ministério da Mulher e da Acção Social<br />
MPG Medida de Participação segundo o Género<br />
NVP Nevirapina<br />
ODM Objectivos de Desenvolvimento do Milénio<br />
OIM Organização Internacional para as Migrações<br />
OMS Organização Mundial de Saúde<br />
PACOV Plano de Acção para Crianças Órfãs e Vulneráveis<br />
PAP Parceiros de Apoio Programático<br />
PARP Plano de Acção para a Redução da Pobreza<br />
PARPA I Plano de Acção para a Redução da Pobreza Absoluta (2002-2005)<br />
PARPA II Plano de Acção para a Redução da Pobreza Absoluta (2006-2009)<br />
PASD Programa de Apoio Social Directo<br />
PES Plano Económico e Social<br />
PESA-ASR Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento Rural<br />
PIB<br />
Produto Interno Bruto<br />
PIDOM Pulverização Residual Intra-domiciliar<br />
PRONASAR Programa Nacional de Abastecimento de Água e Saneamento Rural<br />
PSA<br />
PTV<br />
QFMP<br />
QUIBB<br />
RCP<br />
RED<br />
RENAMO<br />
RM<br />
RMM<br />
RMTILD<br />
SACMEQ<br />
SANTOLIC<br />
SETSAN<br />
SISTAFE<br />
TIC<br />
TVM<br />
UEM<br />
UP<br />
ZIP<br />
Programa de Subsídio de Alimentos<br />
Prevenção da Transmissão Vertical<br />
Quadro Fiscal de Médio Prazo<br />
Questionário de Indicadores Básicos de Bem-Estar<br />
Reacção em cadeia da polimerase<br />
Reaching Each District (Atingir Cada distrito)<br />
Resistência Nacional Moçambicana<br />
Rádio Moçambique<br />
Rácio de Mortalidade Materna<br />
Redes Mosquiteiras Tratadas com Insecticida de Longa Duração<br />
Southern and Eastern Africa Consortium for Monitoring Education Quality (Consórcio da<br />
África Austral e Oriental para a Monitorização da Qualidade Educacional)<br />
Saneamento Total Liderado pela Comunidade<br />
Secretariado Técnico de Segurança Alimentar e Nutricional<br />
Sistema de Administração Financeira do Estado<br />
Tecnologia de Informação e Comunicação<br />
Televisão de Moçambique<br />
Universidade Eduardo Mondlane<br />
Universidade Pedagógica<br />
Zona de Influência Pedagógica<br />
XX<br />
XXI
Zumbu<br />
ZÂMBIA<br />
Magoe<br />
ZIMBABWE<br />
ÁFRICA DO SUL<br />
SWAZILÂNDIA<br />
Mapa de Moçambique<br />
Palma<br />
Nangade<br />
Mocimboa<br />
MALAWI<br />
Mueda<br />
da praia<br />
Muidumbe<br />
Mecula<br />
Cabo<br />
Macomia<br />
Sanga Mavago<br />
Lago<br />
Delgado<br />
Meluco Quissanga<br />
Montepuez<br />
Muembe Niassa<br />
Pemba<br />
Ancuabe<br />
Marrupa<br />
Mecuti<br />
Lichinga<br />
Majune<br />
Balama<br />
Chiure<br />
N‘gauma<br />
Namuno<br />
Maua<br />
Erati Memba<br />
Nipepe<br />
Nacaroa<br />
Mandimba<br />
Metarica<br />
Lalaua Mecuburi<br />
Chifunde<br />
Nacala-a-Velha<br />
Cuamba<br />
Muecate<br />
Angonia<br />
Malema<br />
Monapo<br />
Macanga<br />
Ribaue Nampula Ilha<br />
Maravia<br />
Nampula<br />
Mecanhelas<br />
Morrupula<br />
Mossuril<br />
Tsangano<br />
Gurue<br />
Chiuta<br />
Tete<br />
Alto<br />
Mogincual<br />
Molocue<br />
Mogovolas<br />
Cahora<br />
Namarroi<br />
Moatize<br />
Bassa<br />
Gile<br />
Angoche<br />
Tete<br />
Milange<br />
Ile<br />
Lugela<br />
Changara<br />
Moma<br />
Mutarara<br />
Zambezia<br />
Tambara<br />
Pebane<br />
Guro<br />
Chemba<br />
Mocuba<br />
Morrumbala<br />
Maganja<br />
da costa<br />
Namacurra<br />
Caia<br />
Macossa Maringue<br />
Quelimane – Cap<br />
Mopeia Nicuadala<br />
Báruè<br />
Inhassunge<br />
Marromeu<br />
Manica<br />
Cheringoma<br />
Chinde<br />
Gorongosa<br />
Manica Sofala<br />
Muanza<br />
Gondola<br />
Nhamatanda<br />
Dondo<br />
Sussundenga<br />
Beira<br />
Buzi<br />
Chibabava<br />
Chicualacuala<br />
Massangena<br />
Mossurize<br />
Mabalane<br />
Morrumbene<br />
Maxixe<br />
Panda<br />
Homoine<br />
Guijá<br />
Jangamo<br />
Inharrime<br />
Magude<br />
Mandlakazi<br />
Xai-Xai<br />
Zavala<br />
Xai-Xai – Cap<br />
Maputo<br />
Bilene<br />
Moamba<br />
Manhiça<br />
Marracuene<br />
Massingir<br />
Gaza<br />
Maputo Cidade<br />
Boane<br />
Namaacha<br />
Matutuíne<br />
Machaze<br />
Chokwe<br />
Chigubo<br />
Chibuto<br />
Mabote<br />
Machanga<br />
Govuro<br />
Funhalouro<br />
Inhassoro<br />
Vilankulo<br />
Inhambane<br />
Massinga<br />
TANZÂNIA<br />
Canal de<br />
Moçambique<br />
Sumário Executivo<br />
A pobreza vivida na infância tem efeitos<br />
imediatos e de longo prazo nas crianças.<br />
Desnutrição crónica, por exemplo, nos dois<br />
primeiros anos de vida pode influenciar<br />
permanentemente o crescimento da criança,<br />
resultando em baixa altura para a idade<br />
e reduzido desenvolvimento mental. O<br />
impacto da pobreza intergeracional na<br />
infância e sua natureza cíclica também<br />
é evidenciado pelo comprovado papel<br />
da pobreza como obstáculo ao acesso a<br />
serviços sociais. As famílias pobres têm mais<br />
dificuldade em aceder a cuidados de saúde<br />
de qualidade, menor probabilidade de ter<br />
os seus filhos na escola e também menor<br />
probabilidade de aceder a água potável e<br />
instalações sanitárias adequadas. É elevado<br />
o risco que as crianças pobres correm de<br />
crescer para se tornarem adultos pobres e,<br />
por sua vez, terem filhos também pobres.<br />
Em 2008/2009, 12 milhões dos cerca de<br />
21,5 milhões de pessoas em Moçambique,<br />
ou seja, 55 por cento da população, vivia<br />
abaixo da linha de pobreza de 18,4 meticais<br />
(cerca de meio dólar americano) por dia.<br />
Comparativamente a 2002/03, a taxa de<br />
pobreza estagnou. Outros indicadores<br />
baseados no consumo incluem a quantidade<br />
de calorias consumidas diariamente. Mais<br />
de metade das crianças moçambicanas<br />
consomem diariamente calorias abaixo do<br />
considerado adequado pela Organização<br />
Mundial de Saúde. No entanto, entre 2002<br />
e 2008 as taxas de pobreza baseada no<br />
consumo estagnaram, principalmente devido<br />
a falta de progressos no sector agrícola.<br />
Moçambique tem registado, nos últimos<br />
anos, grandes progressos na redução da<br />
pobreza na infância baseada em privações e<br />
no aumento do acesso a serviços essenciais.<br />
O nível do rendimento familiar não nos dá<br />
uma imagem completa da saúde e bemestar<br />
da criança. A abordagem baseada<br />
em privações, centrada nas necessidades<br />
básicas e principais serviços públicos de<br />
que a criança está privada, permite uma<br />
compreensão mais multidimensional da<br />
pobreza. Recorrendo a esse indicador, 48<br />
por cento das crianças moçambicanas<br />
vivem em situação de pobreza absoluta -<br />
medida por uma metodologia baseada em<br />
privações – decaindo-se assim dos 59 por<br />
cento registados em 2008. A redução deveuse<br />
a significativas alterações nos sectores<br />
de saúde e educação. As crianças são<br />
particularmente vulneráveis a privações de<br />
água, saneamento e informação.<br />
Sobrevivência e Desenvolvimento<br />
Infantil<br />
A pobreza e a sobrevivência infantil estão<br />
intrinsecamente ligadas. Baixos níveis de<br />
sobrevivência infantil e estado de saúde<br />
deficiente são, simultaneamente, causa e<br />
sintoma de pobreza. O principal indicador<br />
utilizado para medir o nível de bem-estar<br />
da criança e sua taxa de mudança num país<br />
é a taxa de mortalidade de menores de<br />
cinco anos, que desceu de 153 mortes por<br />
1.000 nascidos vivos em 2003 para 141 em<br />
2008. A taxa de mortalidade de menores<br />
de cinco anos resulta de uma ampla<br />
gama de factores, nomeadamente estado<br />
nutricional e conhecimento das mães sobre<br />
a saúde, práticas relativas aos cuidados<br />
a dar, disponibilidade, uso e qualidade<br />
dos serviços de saúde materno-infantil,<br />
rendimento e disponibilidade de alimentos<br />
na família, disponibilidade de água limpa<br />
e saneamento seguro, e segurança global<br />
do ambiente da criança. Embora continue a<br />
haver disparidade, foram feitas melhorias<br />
na taxa de mortalidade de menores de cinco<br />
pelas áreas rurais.<br />
A malária, causas neonatais, infecções<br />
respiratórias agudas e a SIDA são as quatro<br />
principais causas imediatas de mortalidade<br />
nas crianças em Moçambique. A desnutrição<br />
é a principal causa subjacente. A baixa<br />
altura para a idade (ou desnutrição crónica)<br />
permanece muito elevada - 44 por cento<br />
XXII<br />
XXIII
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
SUMÁRIO EXECUTIVO<br />
das crianças menores de 5 anos têm baixa<br />
altura para a idade, um decréscimo de<br />
apenas 4 pontos percentuais desde 2003. A<br />
baixa altura para a idade afecta a criança,<br />
mas está também intimamente ligado ao<br />
desenvolvimento global do país, uma vez<br />
que a desnutrição afecta o desenvolvimento<br />
cognitivo e tem relação com os resultados<br />
educacionais futuros.<br />
A prevalência de malária (causa de um terço<br />
das mortes em crianças menores de cinco<br />
anos de idade) alterou-se muito pouco nos<br />
últimos anos. Em 2007, a prevalência global<br />
era de 51 por cento da população. Apesar<br />
das significativas melhorias, continuou<br />
a ser baixo o acesso a medicamentos<br />
antimaláricos; pouco mais de um terço das<br />
crianças com febre recebem tratamento, o<br />
que reflecte baixa consciência e procura de<br />
tratamento pelos encarregados de cuidar das<br />
crianças e baixo acesso a serviços de saúde.<br />
Infecções Respiratórias Agudas (IRA)<br />
são mais uma das principais causas de<br />
morbilidade e mortalidade nas crianças em<br />
Moçambique, sendo a pneumonia a infecção<br />
mais grave. Há uma grande disparidade<br />
entre a percentagem de crianças que<br />
recebem tratamento para IRA. As que vivem<br />
em áreas urbanas, as das famílias mais<br />
ricas e as crianças cujas mães são instruídas<br />
têm muito mais probabilidade de receber<br />
tratamento para sintomas de IRA.<br />
Água insalubre, saneamento precário e<br />
higiene inadequada também contribuem<br />
para a mortalidade e morbilidade infantil.<br />
Água, saneamento e higiene estão<br />
intimamente ligados a desnutrição infantil.<br />
O acesso a água potável tem também um<br />
efeito significativo sobre as taxas de pobreza<br />
por aumentar o tempo que as famílias (em<br />
particular as mulheres e meninas) podem<br />
despender em actividades mais produtivas.<br />
O acesso a água potável e saneamento<br />
básico continua a ser baixo, situando-se em<br />
43 e 19 por cento dos agregados familiares,<br />
respectivamente. É elevado o nível de<br />
desigualdades geográficas no que respeita a<br />
acesso a água potável e saneamento.<br />
Educação<br />
Uma população instruída é um dos<br />
requisitos fundamentais para uma ampla<br />
redução da pobreza. Moçambique teve,<br />
ao longo da sua história, um sistema<br />
educativo extremamente limitado. Apesar<br />
das significativas melhorias alcançadas,<br />
continuam a ser enormes os desafios no<br />
sector. Estão agora a frequentar a escola<br />
primária cerca de 3,3 dos 4,1 milhões<br />
de crianças de Moçambique com idades<br />
compreendidas entre os 6 e os 12 anos. As<br />
taxas líquidas de escolarização no ensino<br />
primário têm aumentado drasticamente.<br />
Foram também registadas melhorias em<br />
termos de paridade de género, mas justificase<br />
um foco contínuo sobre esta área uma<br />
vez que continuam a ficar fora do sistema<br />
educativo mais meninas do que rapazes.<br />
Foram reduzidas disparidades de longa data<br />
no sector. Se bem que as crianças urbanas e<br />
mais ricas ainda tenham mais probabilidade<br />
de participar no sistema educativo do que<br />
as suas congéneres rurais e mais pobres, foi<br />
nos dois últimos grupos que se registou um<br />
melhoramento mais significativo.<br />
Estar ‘acima da idade’ na escola é um<br />
fenómeno generalizado em Moçambique.<br />
Embora as crianças tendam a entrar para a<br />
escola mais cedo nos últimos anos, é mais<br />
provável que as de 13-17 anos de idade<br />
ainda se encontrem a frequentar o ensino<br />
primário do que o ensino secundário. O<br />
fenómeno ‘acima da idade’ no ensino básico<br />
tem significativas implicações para os<br />
resultados de aprendizagem das crianças,<br />
uma vez que é ministrado o mesmo currículo<br />
a alunos de diferentes idades e níveis de<br />
desenvolvimento cognitivo.<br />
É generalizado o fenómeno do ‘choque<br />
de acesso’. O aumento maciço do número<br />
de alunos tem colocado enorme pressão<br />
sobre o sistema de ensino, com efeitos<br />
danosos na qualidade de ensino. Dados<br />
recentes indicam que nos últimos anos as<br />
competências de leitura e aritmética das<br />
crianças moçambicanas se têm deteriorado.<br />
É necessário que se registem melhorias no<br />
número e na qualidade dos professores, nas<br />
infra-estruturas escolares e na protecção<br />
das crianças contra a violência física e<br />
sexual para se conseguir elevar o acesso e<br />
a qualidade, e para que o acesso se traduza<br />
em resultados de desenvolvimento.<br />
Protecção da criança<br />
Uma protecção efectiva da criança assegura<br />
que as mais vulneráveis sejam protegidas<br />
de práticas prejudiciais e não fiquem<br />
marginalizadas na redução da pobreza.<br />
Abuso e exploração sexual, tráfico, trabalho<br />
infantil, violência, deficiência, casamento<br />
infantil, entre outros, são questões a tratar<br />
no âmbito da protecção das crianças em<br />
Moçambique. Sistemas nacionais eficazes<br />
de protecção da criança têm como ponto<br />
de partida a existência de leis, políticas<br />
e regulamentos que visem defender os<br />
direitos da criança. Importantes progressos<br />
foram feitos nessas áreas nos últimos anos,<br />
mas continuam a existir muitos desafios.<br />
A violência contra as mulheres e crianças<br />
tem devastadoras consequências para<br />
a saúde física e mental a curto e longo<br />
prazo. A violência física e sexual é comum,<br />
chegando a 54 por cento as mulheres<br />
que foram espancadas e 23 por cento as<br />
submetidas a alguma forma de abuso<br />
sexual. É também muito comum nas<br />
escolas o abuso sexual cometido contra<br />
alunas. Um baixo nível de conhecimento,<br />
por parte das vítimas, dos seus direitos e,<br />
simultaneamente, uma cultura de silêncio<br />
e aceitação da violência são o principal<br />
obstáculo à resolução o problema.<br />
O trabalho infantil é outra forma comum<br />
e grave de abuso e exploração em<br />
Moçambique. As crianças trabalhadoras são<br />
muitas vezes acrescidamente exploradas<br />
com más condições de trabalho, incluindo<br />
abuso verbal e sexual, e salários pagos<br />
com atraso ou, inclusivamente, não pagos.<br />
Reduzir a carga de trabalho sobre as<br />
crianças depende tanto da aplicação de<br />
regulamentação laboral eficaz contra o<br />
trabalho infantil como de garantir às crianças<br />
e suas famílias, especialmente às mais<br />
pobres e mais vulneráveis, os benefícios<br />
resultantes da redução da pobreza.<br />
Os casamentos prematuros podem ter<br />
graves implicações para a saúde das<br />
meninas. Gravidez e parto na adolescência<br />
estão associados a problemas de saúde<br />
e fracos resultados nutricionais tanto da<br />
mãe como dos filhos. Mais de metade<br />
das raparigas moçambicanas casam-se<br />
antes dos 18 anos de idade. O casamento<br />
infantil é mais comum na região norte de<br />
Moçambique.<br />
O registo de nascimento tem impactos<br />
sobre a pobreza uma vez que possibilita<br />
às crianças um maior acesso a serviços<br />
sociais. Moçambique tem aumentado<br />
significativamente, em todo o país, o acesso<br />
a serviços de registo de nascimento, que, no<br />
entanto, continua baixo. A percentagem de<br />
crianças menores de cinco anos com registo<br />
de nascimento aumentou de 8 por cento em<br />
2003 para 31 por cento em 2008.<br />
Estima-se existirem 1,8 milhões de órfãos<br />
em Moçambique, dos quais 510.000 devido<br />
à SIDA, número este que deverá crescer nos<br />
próximos anos. As crianças órfãs podem<br />
enfrentar uma ampla gama de ameaças à<br />
sua protecção. Têm maior probabilidade<br />
do que os não órfãos de ter uma iniciação<br />
sexual precoce, sendo também mais<br />
propensos que os não órfãos a casar jovens.<br />
Embora a capacidade dos sistemas de<br />
justiça na prevenção e combate às diferentes<br />
formas de violência, abuso e exploração<br />
tenha sido reforçada, a resposta global<br />
continua a ser fragmentada, reactiva,<br />
fraca e insuficientemente financiada. É<br />
também necessário que se aperfeiçoem os<br />
mecanismos de recolha de dados, monitoria e<br />
apresentação de relatórios a todos os níveis.<br />
Questões transversais<br />
Em Moçambique, as mulheres têm maior<br />
probabilidade que os homens de viver em<br />
situação de pobreza. Em 2007, Moçambique,<br />
classificou-se, entre 155 países, na 145a<br />
posição no índice de desenvolvimento<br />
XXIV<br />
XXV
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
SUMÁRIO EXECUTIVO<br />
ajustado ao género baseado na esperança<br />
de vida, educação, alfabetização e PIB per<br />
capita, o que reflecte os desafios sociais,<br />
económicos e culturais enfrentados pelas<br />
mulheres. As mulheres são mais propensas<br />
que homens a participar na força de<br />
trabalho, mas têm menor acesso à educação,<br />
menos oportunidades de emprego formal,<br />
menor renda e menos oportunidade de<br />
diversificar os seus rendimentos. Estudantes<br />
do sexo feminino enfrentam barreiras de<br />
acesso à educação, incluindo abuso sexual<br />
nas escolas e casamento prematuro.<br />
Existem desigualdades entre as províncias<br />
em todas as áreas, tendo as crianças das<br />
províncias do norte e do centro menor<br />
acesso aos serviços de saúde, educação,<br />
água, saneamento e protecção. Províncias<br />
como a Zambézia têm mais baixas<br />
dotações orçamentais, menos serviços e<br />
menores resultados de desenvolvimento<br />
humano em termos de sobrevivência e<br />
mortalidade infantil. As províncias do sul<br />
têm maior prevalência de HIV/SIDA, bem<br />
como, de forma correspondente, mais<br />
elevados resultados nos serviços de saúde e<br />
tratamento.<br />
O HIV e a SIDA afectam a pobreza das<br />
famílias, incapacitando os que trabalham<br />
para as sustentar e elevando o nível de<br />
dependência na população. Através dos<br />
seus efeitos sobre o número de professores<br />
formados, profissionais de saúde e outros<br />
prestadores de serviços, a SIDA tem<br />
também impacto sobre a futura geração<br />
de capital humano. O Inquérito Nacional<br />
sobre o HIV/SIDA 2009 (INSIDA) mostra uma<br />
prevalência nacional de HIV no grupo etário<br />
de 15-49 anos de idade de 11,5 por cento.<br />
Os resultados desagregados por região<br />
confirmaram a maior prevalência no sul,<br />
seguindo-se a zona centro. A prevalência<br />
do HIV é significativamente mais elevada<br />
nas áreas urbanas do que nas áreas rurais<br />
em todas as regiões e entre as mulheres,<br />
especialmente entre as jovens. Há, contudo,<br />
alguma evidência de que a incidência do<br />
HIV tem vindo a diminuir. Os dados indicam<br />
também uma tendência global positiva no<br />
conhecimento e consciência da transmissão<br />
do HIV e sua prevenção.<br />
Situações de emergência como as secas<br />
e inundações, por exemplo, têm graves<br />
impactos sobre o bem-estar das crianças.<br />
A vulnerabilidade das crianças aumenta<br />
em situações de emergência, uma vez que<br />
elas ficam com menos acesso a serviços de<br />
saúde, ao mesmo tempo que aumentam<br />
as doenças transmitidas pela água, como<br />
a cólera. Há rotura na educação e na<br />
rotina, e as crianças têm menos protecção<br />
contra a exploração, por exemplo, contra<br />
o abuso sexual e sexo para sobrevivência.<br />
As emergências, paralelamente às<br />
vulnerabilidades que agravam, podem<br />
intensificar-se pois a mudança climática faz<br />
aumentar a ocorrência de ciclones no país.<br />
Há também factores ambientais<br />
relacionados com as principais causas de<br />
mortalidade infantil, como a malária e<br />
infecções respiratórias agudas. Degradação<br />
ambiental significa aumento de poluição,<br />
stress hídrico, desflorestação e degradação<br />
do solo, que se traduzem em pressão nas<br />
necessidades básicas de saúde e segurança<br />
alimentar das crianças.<br />
Comunicação e fortes órgãos de<br />
comunicação social são fundamentais<br />
para todos os cidadãos, inclusive crianças,<br />
terem uma palavra a dizer nas questões<br />
que afectam as suas vidas. São ainda uma<br />
forma de transmitir informações vitais para<br />
os pais em matéria de educação, saúde e<br />
questões de protecção, por exemplo, como<br />
proteger os seus filhos da malária ou quais<br />
os efeitos nocivos do abuso cometido contra<br />
crianças. Uma comunicação inovadora para<br />
estratégias de desenvolvimento, incluindo<br />
a Rádio Criança para Criança e Unidades<br />
Móveis Multimédia têm um enorme<br />
potencial para envolver mais pessoas,<br />
principalmente jovens, em actividades<br />
educativas, diálogo e debate públicos.<br />
XXVI<br />
XXVII
1CAPÍTULO<br />
1. Introdução<br />
A pobreza em<br />
Moçambique<br />
1CAPÍTULO<br />
A POBREZA EM MOÇAMBIQUE<br />
O Programa Quinquenal do Governo 2010-2014<br />
estabelece as prioridades estatais nacionais de<br />
Moçambique. Este plano e o respectivo plano<br />
operacional e quadro de monitoria e avaliação<br />
- o Plano de Acção para a Redução da Pobreza,<br />
ou PARP orientam, por sua vez, as contribuições<br />
das Nações Unidas (ONU), dos doadores e dos<br />
parceiros da sociedade civil em apoio a essas<br />
prioridades. O Sistema das NU em Moçambique<br />
vai preparar um novo Quadro de Assistência<br />
ao Desenvolvimento, para 2012-2015, e cada<br />
agência e parceiro desenvolverão os seus<br />
próprios Programas de Cooperação com o<br />
país, apoiando e obedecendo a prioridades e<br />
processos de planificação nacionais.<br />
Em 2006, o Sistema das Nações Unidas em<br />
Moçambique publicou A Pobreza na Infância<br />
em Moçambique: Uma Análise da Situação<br />
e das Tendências, 1 onde se descreve como<br />
a pobreza afecta a vida das crianças e a sua<br />
capacidade de usufruir dos seus direitos. Este<br />
estudo de 2010 centrar-se-á na avaliação da<br />
pobreza infantil em Moçambique e identificação<br />
dos obstáculos à realização dos direitos da<br />
criança. Trata-se de uma actualização onde<br />
se descreve detalhadamente a situação em<br />
que vivem os dez milhões de crianças em<br />
Moçambique, bem como as políticas públicas,<br />
o financiamento e o ambiente da prestação de<br />
serviços para as crianças. Funcionará como<br />
fonte de dados quantitativos e qualitativos<br />
para informar decisões políticas baseadas em<br />
evidências sobre as prioridades nacionais de<br />
desenvolvimento e intervenções nesse domínio.<br />
Desde a publicação de A Pobreza na Infância<br />
em Moçambique: Uma Análise da Situação<br />
e das Tendências - 2006, vieram a lume mais<br />
dados e análises da situação das crianças,<br />
principalmente através do Censo de 2007, 2<br />
da Pesquisa de Indicadores Múltiplos 2008<br />
(MICS), 3 do Inquérito aos Orçamentos<br />
Familiares (IOF) 2008/09, 4 do Estudo<br />
Nacional sobre a Mortalidade Infantil 2008, 5<br />
das Observações Finais do Comité para a<br />
Convenção sobre os Direitos da Criança 6 e da<br />
avaliação conjunta dos progressos alcançados<br />
rumo aos objectivos e metas do PARPA II (2006<br />
-2009) do Governo de Moçambique realizada<br />
em 2009. 7<br />
A pobreza na infância tem efeitos imediatos<br />
e de longo prazo nas crianças. Desnutrição<br />
crónica, por exemplo, nos dois primeiros anos<br />
de vida pode influenciar permanentemente o<br />
crescimento de uma criança, resultando em<br />
baixa altura para a idade e desenvolvimento<br />
mental reduzido. O impacto da pobreza<br />
intergeracional na infância e sua natureza cíclica<br />
também é evidenciado pelo seu comprovado<br />
papel como obstáculo ao acesso a serviços<br />
sociais. As famílias pobres têm mais dificuldade<br />
em aceder a cuidados de saúde de qualidade,<br />
têm menos probabilidade de ter os seus filhos<br />
na escola e igualmente menos probabilidade de<br />
aceder a água potável e instalações sanitárias<br />
adequadas. É elevado o risco que correm as<br />
crianças pobres de se tornarem adultos pobres<br />
e, por sua vez, virem a ter filhos pobres.<br />
Este capítulo analisa a pobreza na infância,<br />
debruçando-se, em primeiro lugar, sobre as<br />
tendências históricas da pobreza baseada no<br />
consumo e, em segundo lugar, da pobreza<br />
baseada em privações. Finalmente, esboçamse<br />
uma série de conclusões concernentes à<br />
pobreza infantil.<br />
3
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPITULO 1: A POBREZA EM MOÇAMBIQUE<br />
2. Medindo a pobreza<br />
2.1. Pobreza baseada no<br />
consumo<br />
Após a assinatura do Acordo de Paz de<br />
1992, Moçambique fez progressos notáveis<br />
na redução da incidência da pobreza, de<br />
69 por cento em 1996 para 54 por cento<br />
em 2002, superando a meta do PARPA I de<br />
uma incidência de pobreza de 60 por cento<br />
até 2005. 8 Esta tendência não se manteve<br />
entre 2002 e 2008. De acordo com o IOF de<br />
2008/2009, 55 por cento dos moçambicanos<br />
vivem abaixo da linha de pobreza de 18,4<br />
meticais (cerca de meio dólar americano)<br />
por dia. O consumo e os rendimentos<br />
aumentaram e a pobreza decaiu para a<br />
maioria dos moçambicanos entre 1996 e<br />
2002, Seguiu-se estagnação entre 2002 e<br />
2008. 9<br />
As estimativas oficiais da pobreza nacional<br />
de Moçambique medem a capacidade<br />
de uma família, através do seu consumo,<br />
de satisfazer as suas necessidades mais<br />
elementares. A incidência da pobreza<br />
baseada no consumo tem por base o<br />
Inquérito aos Orçamentos Familiares<br />
(IOF), que é realizado de seis em<br />
seis anos pelo Instituto Nacional de<br />
Estatística e o Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento. O terceiro e mais recente<br />
inquérito foi realizado em 2008/09.<br />
‘Consumo’ inclui tanto produtos alimentares<br />
como não alimentares, sendo ajustado para<br />
a sazonalidade dos primeiros, mas omite<br />
serviços públicos e serviços feitos em casa.<br />
Aplica-se uma metodologia de Custo de<br />
Necessidades Básicas, uma abordagem<br />
que consiste no desenvolvimento de uma<br />
cesta de alimentos consumidos pelos<br />
pobres, que é considerada suficiente para<br />
as necessidades básicas de calorias (o<br />
i<br />
conteúdo calórico de cada cesta depende<br />
da composição demográfica da região,<br />
mas, em média, ronda as 2.150 calorias por<br />
dia). O custo de tal cesta representa a linha<br />
de pobreza alimentar. A linha de pobreza<br />
não alimentar é obtida através da análise<br />
da parcela de despesa total atribuída a<br />
outros que não alimentos por famílias que<br />
se encontram próximo da linha de pobreza<br />
alimentar. A linha de pobreza global é então<br />
calculada como soma das linhas de pobreza<br />
alimentar e não alimentar. Note-se que a<br />
linha de pobreza representa um padrão de<br />
vida extremamente básico. i<br />
O indicador para medir a percentagem de<br />
pessoas vivendo abaixo da linha de pobreza<br />
é conhecido como incidência da pobreza.<br />
Embora a incidência da pobreza a nível<br />
nacional se tenha mantido relativamente<br />
constante entre 2003 e 2008, foram estimadas<br />
grandes disparidades tanto nos níveis como<br />
na variação da pobreza a nível provincial.<br />
A maior redução nas taxas de pobreza<br />
ocorreu em Cabo Delgado (-26 pontos<br />
percentuais) e Inhambane (-23 pontos<br />
percentuais). Em contrapartida, a Zambézia<br />
(+26 pontos percentuais) e Sofala (+22 pontos<br />
percentuais) destacam-se como sendo as<br />
duas províncias que apresentam os maiores<br />
aumentos na incidência da pobreza desde<br />
2002/03. A estagnação na taxa de pobreza<br />
global desde 2002/03 é principalmente devida<br />
ao substancial aumento da pobreza medida<br />
na Zambézia e em Sofala, que contrabalançou<br />
a queda observada em cinco províncias.<br />
Estimativas indicam que a província da<br />
Zambézia tinha a maior incidência de pobreza<br />
em 2008/09: 70,5 por cento. 10<br />
A incidência da pobreza não informa<br />
sobre os níveis de bem-estar dos que se<br />
encontram abaixo da linha da pobreza. Para<br />
Para uma completa descrição da metodologia usada para estimar a taxa de pobreza de Moçambique, ver Ministério<br />
de Planificação e Desenvolvimento, ‘Pobreza e Bem-estar em Moçambique: Terceira Avaliação Nacional da Pobreza’,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, Setembro de 2010.<br />
medir a profundidade da pobreza, utilizase<br />
o índice de profundidade da pobreza .<br />
Trata-se de uma medida da distância média<br />
percentual que contempla o que falta ao<br />
agregado familiar médio pobre para escapar<br />
da pobreza e elevar-se acima da linha de<br />
pobreza. Para medir a desigualdade entre<br />
os pobres, recorre-se ao quadrado do<br />
índice de profundidade da pobreza. Este<br />
índice é o termo médio do quadrado das<br />
profundidades da pobreza, dando assim<br />
peso a ganhos obtidos pelos mais pobres<br />
dos pobres. A Terceira Avaliação Nacional da<br />
Pobreza não constatou qualquer mudança<br />
nas medidas de profundidade da pobreza e<br />
do quadrado da profundidade da pobreza<br />
entre 2002/03 e 2008/09, querendo isto<br />
dizer que o rendimento real dos pobres em<br />
relação à linha de pobreza foi relativamente<br />
constante entre 2002 e 2008. 11<br />
Os níveis de igualdade têm permanecido<br />
razoavelmente constantes entre 2002 e<br />
2008. O coeficiente de Gini, ii um indicador<br />
da desigualdade de rendimento, calculado<br />
a partir dos inquéritos do IOF, não registou<br />
alteração significativa entre 1997 e 2008.<br />
A desigualdade é significativamente mais<br />
elevada nas áreas urbanas do que nas áreas<br />
rurais. 12 Indícios há que apontam para uma<br />
maior desigualdade no interior das províncias<br />
e distritos do que entre estes. Segundo um<br />
estudo, 83 a 86 por cento da desigualdade<br />
total em Moçambique ocorre no interior dos<br />
distritos e não entre distritos. 13<br />
A redução da pobreza em Moçambique entre<br />
1996/97 e 2002/03 não beneficiou de igual<br />
modo todos os segmentos da população. A<br />
pobreza teve uma redução mais significativa<br />
nas famílias chefiadas por homens do que<br />
nas famílias chefiadas por mulheres, que<br />
representam cerca de 30 por cento do total<br />
de agregados familiares em Moçambique. 14<br />
Embora a pobreza tenha diminuído 26 por<br />
cento nos agregados familiares chefiados<br />
por homens (passando de cerca de 70<br />
por cento em 1996/97 para 52 por cento<br />
em 2002/03), registou um decréscimo de<br />
apenas 6 por cento nos agregados familiares<br />
chefiados por mulheres (de 67 para 63 por<br />
cento entre 1996/97 e 2002/03). iii<br />
Os agregados familiares em Moçambique<br />
são vulneráveis a choques que os podem<br />
fazer descer abaixo da linha de pobreza.<br />
Os níveis de pobreza entre as famílias<br />
variaram significativamente ao longo<br />
da última década, especialmente a nível<br />
provincial, o que realça a vulnerabilidade de<br />
grande parte da população. Os agregados<br />
familiares moçambicanos são extremamente<br />
vulneráveis a choques como a perda de<br />
um rendimento ou uma cultura fracassada<br />
devido a secas ou inundações. As flutuações<br />
sazonais podem levar temporariamente os<br />
agregados familiares para cima ou para<br />
baixo da linha de pobreza.<br />
O Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento apontou os seguintes<br />
factores como subjacentes à pobreza entre<br />
2002 e 2008: 15<br />
• l Muito baixas taxas de crescimento da<br />
produtividade agrícola, especialmente<br />
no que respeita a culturas alimentares,<br />
registadas desde 2002;<br />
• l Choques climáticos que afectaram as<br />
colheitas de 2008, particularmente nas<br />
províncias do centro;<br />
• l Declínio dos termos de troca, devido<br />
a grandes aumentos nos preços dos<br />
alimentos e combustíveis. Os preços dos<br />
combustíveis, em particular, aumentaram<br />
substancialmente no período 2002/03 a<br />
2008/09.<br />
ii O coeficiente de Gini é uma medida de dispersão estatística comummente usada como medida de desigualdade de renda<br />
ou de riqueza. O coeficiente de Gini varia de 0 a 1. Um baixo coeficiente de Gini indica uma distribuição mais igualitária, em<br />
que 0 corresponde a uma perfeita igualdade, enquanto coeficientes de Gini mais elevados indicam uma distribuição mais<br />
desigual, correspondendo 1 a uma perfeita desigualdade. O coeficiente de Gini foi de 0,41 tanto em 2002 como em 2008.<br />
iii Ver Capítulo 6, Questões transversais, para uma discussão mais pormenorizada da feminização da pobreza em<br />
Moçambique.<br />
4<br />
5
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPITULO 1: A POBREZA EM MOÇAMBIQUE<br />
A medida de consumo utilizada em<br />
Moçambique é uma medida per capita,<br />
absolutamente sem se considerarem as<br />
diferenças entre as crianças e os adultos<br />
nas necessidades diárias de calorias para<br />
satisfazer as suas necessidades mínimas. À<br />
primeira vista, isso significa que a situação<br />
de pobreza nas crianças pode ser um pouco<br />
melhor do que o retratado, pois um adulto<br />
trabalhador necessita de mais calorias por<br />
dia, e, portanto, de mais despesas do que<br />
uma criança não trabalhadora. No entanto,<br />
como as crianças necessitam de ingerir<br />
mais micronutrientes do que os adultos,<br />
manter a necessidade de calorias dos adultos<br />
pode ser um razoável indicador indirecto<br />
para a formulação de uma linha de pobreza<br />
infantil baseada no consumo. 16 Além disso,<br />
a percentagem de crianças trabalhadoras é<br />
elevada, reportando os relatórios do MICS<br />
2008 que 22 por cento das crianças com<br />
idades entre os 5 e os 14 anos estiveram<br />
envolvidas em alguma forma de trabalho fora<br />
de casa (28 ou mais horas por semana). 17<br />
Todas as medidas de pobreza têm as suas<br />
limitações e a abordagem baseada no<br />
consumo não é excepção. Uma limitação<br />
importante é que a medida se aplica ao<br />
consumo de agregados familiares e não<br />
de indivíduos. Não é possível com os<br />
dados do IOF estimar-se o consumo de<br />
cada membro do agregado. A medida não<br />
captura, portanto, variações na distribuição<br />
entre os membros da família, incluindo as<br />
diferenças entre adultos e crianças. Este facto<br />
poderia significar que alguns membros de<br />
um agregado não pobre podem ser, de facto,<br />
pobres em termos de consumo, e o contrário.<br />
Há evidências de que ocorre de facto<br />
discriminação em Moçambique na alocação<br />
de recursos no seio dos agregados familiares.<br />
Por exemplo, um estudo de 2005 constatou<br />
que os descendentes não biológicos do chefe<br />
de família são discriminados na alocação<br />
intra-domiciliar de recursos em agregados<br />
familiares pobres. 18 Não é possível medir essa<br />
discriminação através dos dados do IOF. Além<br />
disso, é excluído o consumo de todos os<br />
serviços públicos. Não há nenhuma tentativa<br />
de cálculo do valor do consumo de serviços<br />
públicos como educação, saúde e infraestrutura<br />
económica. 19 Dado o significativo<br />
investimento em serviços públicos nos<br />
últimos anos, o consumo de bens públicos<br />
teve um significativo impacto no bem-estar<br />
das crianças em Moçambique.<br />
As crianças vivenciam a pobreza, a privação<br />
e a violação dos seus direitos de forma<br />
diferente de seus pais e outros adultos,<br />
no que respeita tanto ao tipo de privação<br />
Caixa 1.1 Metodologia e fontes de informação<br />
Metodologia da pesquisa<br />
A metodologia empregue na elaboração deste estudo Pobreza Infantil e Disparidades em Moçambique - 2010<br />
consiste principalmente em revisão documental de publicações, dados de pesquisas e relatórios já existentes. Para<br />
a análise, solicitaram-se contribuições do Governo, de parceiros doadores, agências das NU e uma série de outras<br />
partes interessadas, num processo que foi gerido por um comité director presidido pelo <strong>UNICEF</strong>. A estrutura e o<br />
conteúdo do estudo baseiam-se nos que foram utilizados em A Pobreza na Infância em Moçambique: Uma Análise<br />
da Situação e das Tendências - 2006, visando garantir coerência, facilitar comparações e avaliar o progresso.<br />
Adicionou-se um novo capítulo em que serão tratadas questões transversais.<br />
A análise documental foi complementada por consultas à sociedade civil e outras partes interessadas. As<br />
consultas foram de grande utilidade no desenvolvimento de análises de causalidade, de papéis/padrões e de<br />
capacidade adiante descritas. À semelhança do relatório de 2006, esta actualização serve-se de uma medida da<br />
pobreza infantil baseada em privações para complementar a medida de pobreza oficial baseada no consumo.<br />
A análise da pobreza baseada em privações examina o acesso das crianças a sete aspectos fundamentais do<br />
desenvolvimento: água, saneamento, habitação, educação, nutrição, saúde e informação. 20<br />
Fontes de dados e informações<br />
O estudo Pobreza Infantil e Disparidades em Moçambique - 2010 baseia-se em três pesquisas importantes,<br />
nomeadamente o Inquérito de Indicadores Múltiplos (MICS) 2008 21 , o Inquérito aos Orçamentos Familiares<br />
(IOF) de 2008/09 e o Estudo Nacional sobre a Mortalidade Infantil - 2009. 22 O MICS foi realizado e publicado<br />
pelo Instituto Nacional de Estatística, com apoio técnico e financeiro do <strong>UNICEF</strong>. O IOF 2008/09 foi realizado<br />
e publicado pelo Instituto Nacional de Estatística e o Ministério de Planificação e Desenvolvimento. O Estudo<br />
Nacional sobre a Mortalidade Infantil foi realizado pelo Instituto Nacional de Saúde de Moçambique, em<br />
colaboração com a Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres e o <strong>UNICEF</strong>. Os dados obtidos a partir<br />
destas fontes foram utilizados para actualizar as informações apresentadas no estudo sobre a pobreza na<br />
infância, 2006. Uma importante fonte de informações e análise foi a avaliação conjunta do impacto do PARPA II,<br />
incluindo os estudos em profundidade solicitados no âmbito do processo de avaliação do PARPA II. 23<br />
Pelo olhar de uma criança iv<br />
Seguiu-se a metodologia conhecida como foto-voz para compreender melhor as ideias, perspectivas e<br />
realidades projectadas pelas meninas. A foto-voz consiste em fazer perguntas às crianças sobre os problemas<br />
que enfrentam a que devem responder por meio de fotografias tiradas, seguindo-se debate e diálogo de grupo.<br />
Através deste processo, as meninas pareciam passar por uma transformação. No início da pesquisa, estavam<br />
envergonhadas e tímidas. Quando uma respondia, em voz muito baixa, a uma pergunta, as outras traduziam a<br />
resposta em mímica, mudando ligeiramente as palavras. A alguma pergunta que se seguisse, elas respondiam<br />
tranquilamente usando apenas uma ou duas palavras. As meninas confidenciaram que ninguém lhes pedia que<br />
apresentassem as suas ideias, pelo que estavam a viver uma experiência nova. Em breves instantes, usandose<br />
uma metodologia participativa, elas estavam ansiosas por compartilhar as suas próprias ideias. Na verdade,<br />
estavam a discutir umas com as outras e, confiantes, a exprimir os seus pensamentos. Tinham deixado de ser<br />
destinatárias passivas de conhecimento, passando a contribuintes activas para novo conhecimento, ideias e<br />
soluções. Elas compartilharam soluções práticas para os desafios enfrentados no seu dia-a-dia e, por meio<br />
das entrevistas à comunidade que realizaram e das fotos que tiraram, começaram a ver, pela primeira vez,<br />
semelhanças nas vidas das suas avós, mães e tias e em que medida queriam que as suas vidas fossem diferentes.<br />
O grupo produziu mais de 100 fotografias e exprimiu os seus pontos de vista sobre uma grande variedade de<br />
questões, incluindo pobreza, saúde, água e saneamento e questões de género. Estão contidas no presente<br />
relatório algumas das fotos que tiraram e das histórias que contaram.<br />
iv Zainul SajanVirgi, doutoranda na McGill Universidty, realizou uma pesquisa participativa para descobrir problemas enfrentados<br />
pelas crianças na Machava, nos arredores da Cidade de Maputo. A pesquisa envolveu consulta contínua de um grupo de meninas<br />
pré-adolescentes por um período de seis meses.<br />
6<br />
7
Pelo olhar<br />
de uma<br />
criança<br />
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
“Nesta fotografia lembro-me muito bem que naquele dia eu tinha comido.”<br />
experimentada como ao grau relativo de<br />
privação. As crianças são proporcionalmente<br />
mais vulneráveis à pobreza extrema, sendo,<br />
por isso, fundamental que se determine<br />
se a situação de pobreza descrita numa<br />
perspectiva predominantemente de adulto<br />
é igualmente aplicável às crianças. 24<br />
Apresentam-se nesta secção estimativas de<br />
pobreza infantil, utilizando os indicadores<br />
de Bristol para uma medida baseada em<br />
privações, adaptados para Moçambique.<br />
Estimativas da incidência de pobreza infantil<br />
baseada no consumo, obtidas a partir do<br />
Inquérito aos Agregados Familiares (IAF) 2003,<br />
indicaram que o nível de pobreza nas crianças<br />
foi significativamente mais elevado do que<br />
nos adultos. Em 2002/2003, 58 por cento<br />
das crianças viviam em situação de pobreza,<br />
comparativamente a 49 por cento dos adultos.<br />
Embora a pobreza infantil baseada no<br />
consumo tenha diminuído significativamente<br />
entre o inquérito de 1997 e o de 2003, o fosso<br />
entre as crianças e os adultos não estreitou<br />
entre 1996/97 e 2002/03, com ambos os grupos<br />
registando uma redução de 22 por cento no<br />
seu nível de pobreza. A diminuição nos níveis<br />
de pobreza infantil foi mais acentuada nas<br />
zonas rurais (24 por cento) do que nas áreas<br />
urbanas (16 por cento).<br />
CAPITULO 1: A POBREZA EM MOÇAMBIQUE<br />
2.2. Medidas de pobreza<br />
baseada em privações<br />
O Plano de Acção para a Redução da Pobreza<br />
Absoluta, PARPA I (2001-2005), definiu<br />
pobreza absoluta como “incapacidade dos<br />
indivíduos de assegurar para si e os seus<br />
dependentes um conjunto de condições<br />
mínimas para a sua subsistência e bem-estar,<br />
segundo as normas da sociedade.” 25 Muitos<br />
observadores propuseram posteriormente<br />
que esta definição de pobreza fosse suportada<br />
por medidas mais multidimensionais, a fim<br />
de apresentar uma análise mais ampla, mais<br />
pluralista e baseada em direitos. 26 Esta opinião<br />
foi formalmente aprovada pelo Governo no<br />
Plano de Acção para a Redução da Pobreza<br />
Absoluta 2006-2010 (PARPA II).<br />
Embora reporte sobre a medida baseada<br />
no consumo na sua análise da pobreza, o<br />
PARPA II adoptou uma nova definição de<br />
pobreza: “Impossibilidade por incapacidade,<br />
ou por falta de oportunidade de indivíduos,<br />
famílias e comunidades de terem acesso<br />
a condições mínimas, segundo as normas<br />
básicas da sociedade.” O PARPA II reconhece<br />
expressamente que é importante não<br />
se ficar excessivamente dependente de<br />
qualquer medida de pobreza, afirmando<br />
que “Para efeitos de definição de políticas,<br />
”Nós nunca temos comida suficiente.<br />
Normalmente temos chá preto e pão para<br />
o pequeno almoço. Se temos ou não<br />
mais uma refeição depende dos adultos<br />
com que vivemos. Se as nossas mães<br />
e avós fizeram dinheiro naquele dia ou<br />
guardaram dinheiro que tenha restado<br />
do seu salário mensal, nós comemos.<br />
Perto do fim do mês, podemos já não ter<br />
dinheiro nem comida, e então vamos para<br />
a cama com fome. Muitas vezes ficamos<br />
um dia, mesmo dois, sem comer nada.<br />
Muitas vezes choramos, não só porque<br />
estamos com fome, mas porque nos<br />
sentimos sozinhos quando não temos<br />
comida, como se ninguém se preocupasse<br />
connosco.<br />
“Lembramo-nos dos dias em que comemos.<br />
Muitas vezes, quando acordamos a meio da<br />
noite, vemos as nossas mães preocupadas<br />
com o que nos vão dar de comer no dia<br />
seguinte. Mesmo quando as nossas mães e<br />
avós trabalham todos os dias, voltam muitas<br />
vezes para casa com muito pouco dinheiro.<br />
É triste para nós ver a vida difícil que levam<br />
as nossas mães e avós. Quando crescermos,<br />
vamos trabalhar muito para cuidar delas“.<br />
-Lina, 14 anos<br />
Fonte: SajanVirgi, Zainul, 2010.<br />
Tabela 1.1: Privação em Moçambique, 2008<br />
Privação<br />
Nutrição<br />
Água<br />
Saneamento<br />
Saúde<br />
Abrigo<br />
Educação<br />
Informação<br />
Percentagem de crianças com privações severas<br />
20 por cento das crianças menores de cinco anos de idade confronta-se com desnutrição<br />
grave. v<br />
39 por cento das crianças não têm acesso a água potável a menos de 30 minutos de sua<br />
casa.<br />
43 por cento das crianças não têm acesso a um sanitário de qualquer espécie nos<br />
arredores de sua casa.<br />
12 por cento das crianças menores de cinco anos de idade não são imunizadas ou<br />
tiveram alguma infecção respiratória aguda (IRA) que não foi tratada.<br />
5 por cento das crianças vivem numa casa com mais de cinco pessoas por quarto.<br />
12 por cento das crianças nunca frequentaram a escola.<br />
40 por cento das crianças não têm televisão, rádio ou jornal em casa<br />
Fonte: <strong>UNICEF</strong>, Child Poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivations-based approach. Maputo, 2009.<br />
v Percentagem de crianças menores de cinco anos de idade cujo índice nutricional (peso para a altura, peso para a idade,<br />
altura para a idade) é igual ou encontra-se abaixo de -3 desvios-padrão da mediana do padrão da OMS 2006<br />
8<br />
9
Pelo olhar<br />
de uma<br />
criança<br />
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
“A minha bisavó trabalhou no campo. A<br />
minha avó trabalha no campo. Eu não sei<br />
o que faz a minha mãe desde que ela foi<br />
morar para a África do Sul. A minha tia tem<br />
barracas de comida. Agora que vejo a vida<br />
da minha família, espero vir a fazer alguma<br />
coisa diferente”.<br />
– Aida, 12 anos<br />
Fonte: Virgi Sajan, Zainul, 2010.<br />
a pobreza foi inicialmente relacionada<br />
com a falta de rendimentos – dinheiro ou<br />
espécie – necessários para a satisfação das<br />
necessidades básicas. Porque esta definição<br />
monetarista não cobria todas as vertentes<br />
da pobreza, foi-se alargando o conceito para<br />
abarcar aspectos como falta de acesso à<br />
educação, saúde, água e saneamento, entre<br />
outros.” 27<br />
O <strong>UNICEF</strong>, tal como um crescente número<br />
de académicos e decisores políticos, optou<br />
por adoptar uma visão cada vez mais<br />
multidimensional do que significa estar a<br />
viver em situação de pobreza. Esta tem sido<br />
tradicionalmente medida estritamente a<br />
partir do consumo das famílias, mas o nível<br />
do rendimento familiar não dá uma imagem<br />
completa da saúde e bem-estar da criança.<br />
Os pais de uma criança podem ter um salário<br />
decente, mas viver muito longe de uma escola<br />
em que os seus filhos possam frequentar<br />
as aulas. A educação e outros serviços<br />
básicos como os de saúde, saneamento e<br />
água potável são investimentos necessários<br />
para uma criança crescer e se tornar um<br />
adulto produtivo. Focalizar as necessidades<br />
básicas e os principais serviços públicos de<br />
que uma criança está privada permite uma<br />
compreensão multidimensional da pobreza.<br />
Com a abordagem baseada em privações,<br />
torna-se muito mais explícita a ligação entre<br />
a alocação de recursos, as escolhas políticas<br />
e as mudanças resultantes da pobreza na<br />
infância.<br />
Na análise aqui apresentada usa-se uma<br />
medida de pobreza infantil absoluta<br />
baseada em privações. Para a quantificar<br />
foram utilizados indicadores originalmente<br />
desenvolvidos por uma equipe da<br />
Universidade de Bristol, frequentemente<br />
referidos como Indicadores de Bristol. 28<br />
Assentam na abordagem da pobreza<br />
baseada em privações, partindo da definição<br />
de pobreza absoluta acordada na Cimeira<br />
Mundial para o Desenvolvimento Social:<br />
condição caracterizada por severa privação<br />
de necessidades humanas básicas. 29<br />
Os indicadores compreendem sete medidas<br />
de privação severa: nutrição, água potável,<br />
CAPITULO 1: A POBREZA EM MOÇAMBIQUE<br />
saneamento, saúde, habitação, educação e<br />
informação. A abordagem dos Indicadores<br />
de Bristol define a percentagem de crianças<br />
em situação de pobreza absoluta como<br />
sendo a de crianças que enfrentam duas<br />
ou mais formas de privação severa. Os<br />
indicadores constituem, simultaneamente,<br />
causas e sintomas de pobreza. O acesso à<br />
água potável, por exemplo, é um sintoma<br />
de pobreza na medida em que as famílias<br />
pobres têm muito menos probabilidade de<br />
desfrutar de água segura. É também uma<br />
das causas da pobreza porque indivíduos<br />
que não têm acesso a água potável são mais<br />
propensos a sofrer de doenças transmitidas<br />
pela água, que os impedem de se envolver<br />
em actividades que proporcionem<br />
rendimento para as suas famílias.<br />
Um ponto forte inerente a uma abordagem<br />
baseada em privações é a inclusão do<br />
consumo de serviços públicos essenciais.<br />
Este aspecto é particularmente evidente<br />
quando se contrastam os resultados das<br />
medidas de pobreza baseada em privações<br />
e baseada no consumo das crianças de<br />
zonas rurais e urbanas. Em 2003, 22 por<br />
cento das crianças urbanas viviam em<br />
condições de pobreza absoluta, medida pela<br />
abordagem baseada em privações versus 55<br />
por cento, medida pela abordagem baseada<br />
no consumo, o que reflecte o aumento do<br />
acesso a serviços sociais em áreas urbanas.<br />
Com a abordagem baseada em privações, a<br />
ligação entre a alocação de recursos, acções<br />
políticas e mudanças resultantes da pobreza<br />
na infância torna-se muito mais explícita.<br />
Por exemplo, o incremento da alocação<br />
de fundos para expandir os programas<br />
de vacinação teria um impacto directo e<br />
imediato sobre a pobreza infantil com a<br />
medida baseada em privações (mostrando<br />
um maior número de crianças que haviam<br />
sido vacinadas), mas revelaria o efeito<br />
mais lentamente com a medida baseada no<br />
consumo.<br />
Utilizando a abordagem baseada em<br />
privações, centrada na capacidade de uma<br />
criança para aceder a serviços essenciais, a<br />
percentagem de crianças em condições de<br />
pobreza absoluta em Moçambique decaiu<br />
10<br />
11
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPITULO 1: A POBREZA EM MOÇAMBIQUE<br />
de 59 por cento em 2003 para 48 por cento<br />
em 2008. vi 30 A percentagem de crianças<br />
nas zonas rurais em situação de pobreza<br />
absoluta diminuiu significativamente, de<br />
72 por cento para 60 por cento (Figura 1.1).<br />
Em 2008, 22 por cento das crianças urbanas<br />
eram pobres, contra 60 por cento das rurais.<br />
A redução nos níveis de pobreza absoluta<br />
das crianças foi impulsionada por melhorias<br />
significativas nos sectores de saúde e<br />
educação. A percentagem de crianças com<br />
privação severa de educação reduziu para<br />
metade entre 2003 e 2008 (de 24 para 12 por<br />
cento), tendo-se reduzido em um terço (18 a<br />
12 por cento) 31 a privação severa de saúde. A<br />
percentagem de crianças que experimentam<br />
privações de nutrição e saneamento registou<br />
ligeiras melhorias entre 2003 e 2008, mas a<br />
percentagem de crianças vítimas de privação<br />
severa de água aumentou. As privações<br />
severas mais frequentemente vividas são<br />
as de água, saneamento e informação, que<br />
afectam 39 por cento, 43 por cento e 40 por<br />
cento das crianças, respectivamente. Apenas<br />
cinco por cento das crianças sofrem privação<br />
severa de abrigo (Figura 1.2).<br />
Em termos de províncias, a pobreza infantil<br />
entre 2003 e 2008 diminuiu em Niassa, Cabo<br />
Delgado, Zambézia, Sofala e Inhambane e<br />
Cidade de Maputo. Veja-se na Figura 1.3 a<br />
percentagem de crianças, por província, que<br />
sofreram duas ou mais privações severas em<br />
2003 e 2008.<br />
São significativas as disparidades existentes<br />
nas taxas de pobreza provinciais. A<br />
percentagem de crianças sofrendo duas ou<br />
mais privações severas foi mais elevada na<br />
província da Zambézia em 2003 e 2008 (80<br />
e 64 por cento, respectivamente). A Cidade<br />
de Maputo apresenta os mais baixos níveis<br />
de pobreza infantil absoluta, com apenas<br />
4 por cento das crianças a enfrentar duas<br />
ou mais privações severas, o que reflecte<br />
o nível relativamente elevado de acesso a<br />
serviços básicos na capital. A segunda maior<br />
redução na privação ocorreu na província<br />
do Niassa, onde a proporção caiu de 58 por<br />
cento em 2003 para 35 por cento em 2008.<br />
Curiosamente, tanto a Cidade de Maputo<br />
como Niassa registaram grandes reduções<br />
na medida de pobreza baseada no consumo<br />
entre 2002/03 e 2008/09. 32<br />
Para obter uma melhor compreensão da<br />
relação entre uma medida de pobreza<br />
baseada em privações, os indicadores<br />
de Bristol e outras variáveis pertinentes,<br />
individuais e a nível de agregado familiar,<br />
disponíveis nos dados do MICS 2008,<br />
realizou-se uma análise multivariada<br />
utilizando como resultado o número de<br />
privações severas nas crianças de 0 a 17<br />
anos de idade.<br />
Figura 1.2: Percentagem de crianças que sofrem privações, 2003 e 2008<br />
50%<br />
45%<br />
40%<br />
35%<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
27%<br />
20%<br />
31%<br />
39%<br />
47% 43%<br />
18%<br />
A riqueza baseada em bens materiais é<br />
uma variável fundamental na previsão de<br />
privações. O modelo indica que a riqueza<br />
baseada em bens materiais está fortemente<br />
(e inversamente) relacionada com o número<br />
de privações; como seria de esperar, as<br />
crianças de famílias mais abastadas têm<br />
muito menos probabilidade de sofrer<br />
privações.<br />
12%<br />
6% 5%<br />
24%<br />
12%<br />
39% 40%<br />
Nutritição Água Saneamento Saúde Abrigo Educação Informação<br />
Figura 1.1: Percentagem de crianças com duas ou mais privações severas, 2003 e 2008<br />
2003 2008<br />
Fonte: <strong>UNICEF</strong>, Child Poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivations-based approach, Ministério de Planificação e Desenvolvimento, Maputo, 2009.<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
72%<br />
59%<br />
60%<br />
48%<br />
30%<br />
22%<br />
Total Urbano Rural<br />
Figura 1.3: Percentagem de crianças com duas ou mais privações severas por província, 2003 e 2008<br />
90%<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
58%<br />
35%<br />
62%<br />
45%<br />
66%<br />
59%<br />
80%<br />
64% 65%<br />
60%<br />
58%<br />
52%<br />
68%<br />
53%<br />
48%<br />
37%<br />
53%<br />
39%<br />
2003 2008<br />
Fonte: <strong>UNICEF</strong>, Child Poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivations-based approach, Ministério de Planificação e Desenvolvimento, Maputo, 2009.<br />
vi A cifra citada em A Pobreza na Infância em Moçambique: Uma Análise da Situação e das Tendências - 2006 para a<br />
percentagem de crianças em situação de pobreza absoluta em 2003 (49 por cento) difere da aqui utilizada devido a<br />
melhorias na metodologia seguida para calcular diversas privações nas áreas de água, saúde e nutrição. Os dados de<br />
2003 foram, portanto, recalculados para reflectir essas melhorias.<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula Zambézia Tete Manica Sofala Inhambane<br />
2003 2008<br />
Gaza<br />
24%<br />
18%<br />
Maputo<br />
Província<br />
11%<br />
4%<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
Fonte: <strong>UNICEF</strong>, Child poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivations-based approach, Ministério de Planificação e Desenvolvimento, Maputo, 2009<br />
12<br />
13
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPITULO 1: A POBREZA EM MOÇAMBIQUE<br />
No entanto, a análise sugere que outros<br />
factores também desempenham um<br />
importante papel, como o nível de<br />
escolaridade da mãe ou pessoa que tem a<br />
criança a seu cargo, o rácio de dependência<br />
a nível de agregado familiar, a área de<br />
residência e o estado de sobrevivência<br />
dos pais da criança. É provável que a área<br />
de residência seja um indicador indirecto<br />
de algumas variáveis não mensuráveis<br />
ligadas à situação das populações rurais<br />
desfavorecidas.<br />
Além do melhoramento da riqueza<br />
material, o modelo indica que a forma mais<br />
importante, e possivelmente a mais simples<br />
e directa de reduzir a pobreza infantil poderá<br />
ser melhorar a educação das futuras mães.<br />
2.3. Comparação entre a<br />
medida de pobreza baseada<br />
em privações e a medida<br />
baseada no consumo<br />
Em 2008, os níveis de pobreza foram<br />
significativamente mais baixos quando<br />
medidos pela abordagem baseada em<br />
privações do que medidos com base no<br />
consumo. Razão para isso foi o facto de se<br />
terem registado significativas melhorias nas<br />
medidas de pobreza não monetária entre<br />
2002 e 2008, mas não correspondentes<br />
melhoramentos no aumento do consumo.<br />
As taxas de pobreza eram relativamente<br />
semelhantes (por ambas as medidas), no<br />
centro e no norte do país, mas divergiam<br />
acentuadamente no sul. No caso da Cidade<br />
de Maputo, explica-o o facto de a abordagem<br />
baseada no consumo não considerar<br />
directamente o acesso a serviços sociais como<br />
saúde, educação, água e saneamento, que<br />
tendem a concentrar-se nas áreas urbanas. Por<br />
ambas as medidas, estima-se que a Zambézia<br />
tenha a mais elevada percentagem de pessoas<br />
a viver em pobreza absoluta. Conforme<br />
discutido no capítulo 6, têm sido atribuídos<br />
à Zambézia fundos consideravelmente<br />
abaixo da média per capita, encontrandose<br />
esta província entre as que apresentam<br />
pior desempenho nos indicadores de<br />
desenvolvimento humano. Reparar esta<br />
desigual distribuição de recursos deveria<br />
constituir uma prioridade para o Governo e<br />
seus parceiros de desenvolvimento.<br />
3. Análise por privação<br />
Apresenta-se em seguida uma análise de<br />
cada um dos sete indicadores de Bristol.<br />
3.1. Privação severa de<br />
educação nas crianças<br />
Entre 2003 e 2008, a privação severa de<br />
educação diminuiu para metade (24 versus<br />
12 por cento). O indicador de privação de<br />
educação é a percentagem de crianças entre<br />
os 7 e os 18 anos que nunca frequentaram<br />
a escola e que não estão a frequentá-la no<br />
momento. Os níveis de privação severa<br />
de educação são três vezes superiores em<br />
crianças do meio rural (15 por cento) do que<br />
em crianças urbanas (5 por cento), embora<br />
ambos os grupos tenham registado grandes<br />
melhorias. A privação severa de educação<br />
apresenta uma alta correlação com a<br />
riqueza do agregado familiar. As crianças de<br />
agregados mais pobres, assim considerados<br />
com base num índice de riqueza, têm uma<br />
probabilidade quase dez vezes superior de<br />
sofrer privação severa de educação do que<br />
as crianças de agregados mais abastados.<br />
A privação severa de educação foi reduzida<br />
em todas as províncias, como pode ser visto<br />
na Figura 1.5 adiante. Niassa, Zambézia,<br />
Inhambane e Gaza apresentaram grandes<br />
reduções. Em todas as quatro províncias<br />
verificou-se um declínio relativo de mais de<br />
60 por cento na percentagem de crianças<br />
vítimas de privação severa de educação.<br />
Apenas três por cento das crianças em Gaza<br />
estão severamente privadas de educação.<br />
Apesar dessas melhorias, a privação de<br />
educação continua a ser elevada nas<br />
províncias de Niassa e Zambézia (15 e 12<br />
por cento, respectivamente). A mais elevada<br />
regista-se em Tete (22 por cento), onde as<br />
crianças têm a mais baixa taxa de conclusão<br />
do ensino primário (5 por cento), dos mais<br />
baixos níveis de apoio familiar para a<br />
educação das crianças vii e o menor acesso a<br />
Figura 1.4: Pobreza baseada em privações comparada com pobreza baseada no consumo nas crianças, 2008,<br />
percentagem<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
Privação severa 2008<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Gaza<br />
Maputo<br />
Prov.<br />
Maputo<br />
Cdade<br />
Urbana Rural Total<br />
Consumo-baseado na pobreza 2008/09<br />
Fonte: <strong>UNICEF</strong>, Child poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivations-based approach, Ministério de Planificação e Desenvolvimento, Maputo,<br />
2009 e Ministério de Planificação e Desenvolvimento. ‘Pobreza e bem-estar em Moçambique: Terceira Avaliação Nacional, Governo<br />
de Moçambique. Setembro de 2010.<br />
Figura 1.5: Níveis de privação severa de educação por província, 2003 e 2008<br />
40%<br />
35%<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
37%<br />
15%<br />
Niassa<br />
26%<br />
14%<br />
34%<br />
17%<br />
Cabo Nampula<br />
Delgado<br />
33%<br />
30%<br />
22%<br />
18%<br />
24%<br />
12% 12% 11%<br />
9%<br />
Zambézia<br />
12%<br />
3%<br />
4%<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Gaza<br />
2003 2008<br />
31%<br />
24%<br />
15%<br />
12%<br />
12%<br />
5%<br />
4%<br />
2% 3% 2%<br />
Maputo<br />
Prov.<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
Urbana Rural Total<br />
Fonte: <strong>UNICEF</strong>, Child poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivations-based approach, Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Maputo, 2009.<br />
vii A pesquisa do MICS calcula o apoio da família à educação de uma criança através de cinco indicadores: a) Crianças de<br />
agregados familiares cujos membros estão envolvidos em quatro ou mais actividades que promovam a aprendizagem<br />
e facilitem a educação; b) Número médio de actividades em que membros adultos participam com a criança; c) crianças<br />
cujo pai está envolvido em uma ou mais actividades que promovam a aprendizagem e facilitem a educação; d) Número<br />
médio de acções em que o pai está envolvido; e e) Crianças que vivem num agregado sem o seu pai biológico.<br />
14<br />
15
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPITULO 1: A POBREZA EM MOÇAMBIQUE<br />
materiais pedagógicos em casa. 33 Tudo leva<br />
a crer que os maus resultados educacionais<br />
em Tete são mais complexos do que<br />
simplesmente falta de oportunidades<br />
educacionais. O problema também pode<br />
estar relacionado com o valor que os pais<br />
nessa província aplicam na aprendizagem<br />
das crianças.<br />
As raparigas têm uma maior probabilidade<br />
de experienciar privação severa de<br />
educação que os rapazes (13 e 10 por cento,<br />
respectivamente). 34 A província de Sofala<br />
tem a maior disparidade de género nas taxas<br />
de frequência do ensino primário, com 87<br />
por cento dos rapazes e 77 por cento das<br />
raparigas a frequentar a escola primária.<br />
Tete tem a maior disparidade de género<br />
no ensino secundário: 12 por cento dos<br />
rapazes frequentam a escola secundária,<br />
comparativamente a 6,5 por cento das<br />
raparigas. A nível nacional, a diferença de<br />
género na educação tem vindo a diminuir,<br />
assim como as disparidades entre as<br />
províncias. 35<br />
Figura 1.6: Privação nutricional severa nas crianças, por província, 2003 e 2008<br />
45%<br />
40%<br />
35%<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
33%<br />
22%<br />
Niassa<br />
39%<br />
23%<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
30%<br />
36%<br />
36%<br />
20%<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
27%<br />
21%<br />
24%<br />
17%<br />
29%<br />
15%<br />
3.2. Privação severa de nutrição<br />
nas crianças<br />
17%<br />
14%<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
2003 2008<br />
20%<br />
10%<br />
Gaza<br />
31%<br />
27%<br />
22%<br />
20%<br />
17% 15%<br />
10%<br />
8% 9% 8%<br />
Maputo<br />
Prov.<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
Urbano Rural Total<br />
Fonte: <strong>UNICEF</strong>, Child poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivations-based approach, Ministério de Planificação e Desenvolvimento, Maputo,<br />
2009.<br />
A desnutrição tem vastas repercussões<br />
na vida das mães e das crianças em<br />
Moçambique. O mais drástico desses<br />
impactos é a mortalidade infantil. A<br />
desnutrição é a causa subjacente que<br />
mais contribui para o elevado nível de<br />
mortalidade infantil em Moçambique. Uma<br />
nutrição adequada também é importante<br />
por si própria, uma vez que a desnutrição<br />
(em particular a desnutrição crónica<br />
ou a baixa altura para a idade) afecta o<br />
desenvolvimento físico e mental da criança,<br />
estando intimamente ligada à capacidade<br />
de ser bem sucedida na escola e tornarse<br />
um adulto produtivo. O indicador de<br />
privação nutricional é a percentagem de<br />
crianças menores de cinco anos cujo índice<br />
nutricional (com base num compósito<br />
constituído por peso para a altura, peso<br />
para a idade, altura para a idade igualmente<br />
ponderados) seja igual ou inferior a menos<br />
3 desvios-padrão da mediana da populaçãopadrão<br />
da OMS, ou seja, grave défice<br />
antropométrico.<br />
Houve uma redução na percentagem de<br />
crianças em Moçambique que enfrentam<br />
privação nutricional severa, viii de 27 por<br />
cento em 2003 para 20 por cento em 2008. 36<br />
A privação severa de nutrição é mais elevada<br />
nas crianças do meio rural (22 por cento) do<br />
que nas crianças urbanas (15 por cento). A<br />
mais elevada taxa de crianças da zona rural<br />
é basicamente explicada por diferenças na<br />
disponibilidade de alimentos, falta de uma<br />
dieta variada e menor acesso a serviços<br />
de saúde, 37 água potável e instalações<br />
sanitárias. As crianças rurais também podem<br />
ser mais propensas a, em algum momento,<br />
enfrentar défices alimentares razoavelmente<br />
prolongados.<br />
A redução na percentagem de crianças<br />
vítimas de privação nutricional grave foi<br />
impulsionada por melhorias nas crianças<br />
da zona rural. Trinta e um por cento das<br />
crianças das zonas rurais faziam face<br />
a privação nutricional severa em 2003,<br />
comparativamente a 22 por cento em 2008. A<br />
redução do nível de privação nutricional nas<br />
crianças urbanas não foi estatisticamente<br />
significativa. Portanto, a diferença entre as<br />
áreas rural e urbana diminuiu de 2003 a<br />
2008, embora persista disparidade.<br />
Há considerável desigualdade em termos<br />
de privação nutricional severa. As crianças<br />
das famílias mais pobres (25 por cento)<br />
são significativamente mais propensas a<br />
enfrentar privação nutricional severa do que<br />
as crianças dos agregados familiares mais<br />
abastados (9 por cento). Contudo, as famílias<br />
mais pobres tiveram uma melhoria mais<br />
significativa na percentagem de crianças que<br />
experimentam privação nutricional severa. 38<br />
3.3. Privação severa de água nas<br />
crianças<br />
O acesso a água limpa e segura é vital<br />
para a sobrevivência e o desenvolvimento<br />
saudável das crianças, reduzindo a doença<br />
e a morte por doenças diarreicas e outras<br />
importantes causas de mortalidade infantil.<br />
O uso de água potável diminui o risco de<br />
doenças transmitidas pela água em crianças<br />
enfraquecidas por desnutrição, reduzindo<br />
também o risco de infecções oportunistas<br />
em crianças vivendo com HIV/SIDA. Em<br />
Moçambique, a falta de acesso a água potável<br />
é directamente responsável por surtos<br />
regulares de cólera. O indicador de privação<br />
de água é a percentagem de crianças com<br />
menos de 18 anos de idade que só têm acesso<br />
a águas superficiais (rios, por exemplo) para<br />
beber, ou que vivem em agregados familiares<br />
cujas fontes de água mais próximas se<br />
localizam a 30 minutos ou mais.<br />
A privação severa de água nas crianças<br />
aumentou em Moçambique entre 2003 e<br />
2008 (31 versus 39 por cento). ix Existe uma<br />
grande disparidade entre as crianças urbanas<br />
e rurais; as crianças da zona rural estão<br />
mais de duas vezes e meia mais propensas<br />
a sofrer de privação severa de água do<br />
que as crianças urbanas (14 e 40 por cento,<br />
respectivamente). As crianças rurais viram<br />
aumentada a sua privação severa de água<br />
entre 2003 e 2008, enquanto nas crianças<br />
urbanas o nível de privação permaneceu<br />
razoavelmente constante. 39<br />
Na província de Gaza, mais de metade<br />
das crianças fazem face a privação severa<br />
de água (58 por cento). Gaza registou um<br />
aumento dessa privação nas crianças entre<br />
2003 e 2008 (39 versus 58 por cento). O<br />
tempo médio de caminhada para uma fonte<br />
viii A diferença entre este valor e o reportado em A Pobreza na Infância em Moçambique: Uma Análise da Situação e das<br />
Tendências deve-se a mudança nos padrões da OMS nos componentes do indicador nutricional. As estimativas no<br />
relatório do IDS de 2003 foram baseadas na população de referência NCHS, desenvolvida em 1975. As estimativas<br />
baseadas nos dados do IDS de 2003 foram recalculadas utilizando-se como base a população padrão da OMS de 2006.<br />
Ver WHO, Growth Standards, Methods and Development: http://who.int/childgrowth/standards/en.<br />
ix Cálculos anteriores da privação severa de água nas crianças utilizaram como indicador “tempo para ir e voltar de uma<br />
fonte de água superior a 30 minutos”. O indicador correcto, segundo Gordon et al. 2003, refere-se a crianças que vivem a<br />
mais de 30 minutos de uma fonte de água. Os dados de 2003 foram recalculados para reflectir essa mudança.<br />
16<br />
17
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPITULO 1: A POBREZA EM MOÇAMBIQUE<br />
de água na província de Gaza é de mais<br />
de uma hora e meia. 40 Não há nenhuma<br />
evidência de que qualquer província consiga<br />
uma redução estatisticamente significativa na<br />
privação severa de água nas crianças.<br />
Há considerável desigualdade no acesso a<br />
água potável. As crianças de famílias pobres<br />
estão em muito maior risco de privação severa<br />
de água. A privação severa de água é quase<br />
cinco vezes maior nas crianças que vivem nas<br />
famílias mais pobres do que nas que vivem<br />
nos agregados familiares mais abastados (54<br />
versus 11 por cento) (ver Figura 1.7).<br />
3.4. Privação severa de<br />
saneamento nas crianças<br />
Falta de saneamento e uma higiene<br />
inadequada são factores que contribuem<br />
para a mortalidade e morbilidade infantil. 41<br />
Água, saneamento e higiene estão também<br />
intimamente ligados a desnutrição infantil.<br />
O indicador de privação de saneamento<br />
é a percentagem de crianças menores de<br />
18 anos de idade que não têm acesso a<br />
instalações sanitárias de qualquer espécie,<br />
incluindo sanitários ou latrinas comunais,<br />
nos arredores da sua habitação.<br />
Figura 1.7: Privação severa de água por quintil de riqueza, 2008<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
54%<br />
46%<br />
40%<br />
A percentagem de crianças gravemente<br />
carenciadas de saneamento permaneceu<br />
razoavelmente constante entre 2003 e<br />
2008. Em 2008, 43 por cento das crianças<br />
sofriam privação severa nesse domínio,<br />
sendo grande a disparidade entre as zonas<br />
urbanas e rurais. Cinquenta e seis por cento<br />
das crianças rurais enfrentam privação<br />
severa de saneamento, em comparação<br />
com quinze por cento das crianças<br />
urbanas. 42<br />
Além das disparidades entre a situação<br />
urbana e a rural verificam-se também<br />
grandes diferenças entre as províncias. Na<br />
Zambézia, 73 por cento das crianças vivem<br />
severamente privadas de saneamento,<br />
comparativamente a menos de um por<br />
cento na Cidade de Maputo. É maior a<br />
percentagem de crianças nas províncias do<br />
centro e do norte comparativamente à do<br />
sul. (ver Figura 1.8).<br />
Há também uma grande disparidade em<br />
função da riqueza da família. Os dados<br />
mostram que 92 por cento das crianças<br />
nas famílias mais pobres enfrenta privação<br />
severa de saneamento, comparativamente<br />
a 3 por cento nos agregados familiares mais<br />
abastados.<br />
Mais baixo Segundo Médio Quarto Mais allto<br />
Fonte: <strong>UNICEF</strong>, Child poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivations-based approach, Ministério da Planificação e Desenvolvimento,<br />
Maputo, 2009.<br />
* A pequena diferença entre o valor relatado aqui para 2003 e o valor reportado em 2006 do <strong>UNICEF</strong> é explicado pelo<br />
tratamento das crianças sem qualquer informação em saúde. Em consonância com a metodologia estabelecida do<br />
indicador de Bristol, crianças sem informações sobre os componentes do indicador de saúde foram excluídas do cálculo.<br />
38%<br />
11%<br />
Figura 1.8: Privação severa de saneamento nas crianças, por província, 2008<br />
80%<br />
60%<br />
40%<br />
20%<br />
0%<br />
23%<br />
Niassa<br />
30%<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
45%<br />
73%<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
59%<br />
52%<br />
3.5. Privação severa de saúde<br />
nas crianças<br />
A privação severa de saúde nas crianças<br />
decaiu significativamente entre 2003 e<br />
2008, de 18 por cento* para 12 por cento. O<br />
indicador de privação severa de saúde é a<br />
percentagem de crianças menores de cinco<br />
anos que nunca foram vacinadas ou que<br />
sofreram um episódio grave de infecção<br />
respiratória aguda que não chegou a ser<br />
tratado. Como se pode ver na Figura 1.9<br />
abaixo, há desigualdade entre as crianças<br />
rurais e urbanas, tendo as rurais duas vezes<br />
mais probabilidade de sofrer de privação<br />
58%<br />
30%<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
20%<br />
Gaza<br />
13%<br />
Maputo<br />
Prov.<br />
0%<br />
15%<br />
56%<br />
43%<br />
Maputo Urbano Rural Total<br />
Cidade<br />
Fonte: <strong>UNICEF</strong>, Child poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivations-based approach, Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Maputo, 2009.<br />
Figura 1.9: Níveis de privação severa de saúde por província, 2003 e 2008<br />
40%<br />
35%<br />
30%<br />
32%<br />
35%<br />
severa de saúde (14 por cento contra 7 por<br />
cento). Os níveis de privação, no entanto,<br />
diminuíram significativamente nas crianças<br />
da zona rural, permanecendo relativamente<br />
constantes nas crianças urbanas. Há também<br />
disparidades entre as províncias, variando<br />
de cinco por cento na Cidade de Maputo a 19<br />
por cento na Zambézia e em Nampula.<br />
A desagregação do indicador nos seus<br />
componentes (Infecção Respiratória<br />
Aguda e vacinação) revela algumas das<br />
causas subjacentes aos altos níveis de<br />
privação severa de saúde nas províncias da<br />
Zambézia, Nampula e Tete.<br />
25%<br />
20%<br />
21%<br />
22%<br />
19%<br />
15%<br />
19%<br />
18%<br />
14%<br />
10%<br />
13%<br />
11%<br />
12% 12%<br />
13%<br />
11%<br />
12%<br />
9%<br />
10% 11%<br />
9%<br />
5%<br />
8%<br />
7% 7% 7%<br />
5%<br />
6% 7%<br />
4%<br />
0%<br />
Niassa Cabo Nampulbézibane<br />
Zam-<br />
Tete Manica Sofala Inham-<br />
Gaza Maputo Maputo Urbano Rural Total<br />
Delgado<br />
Prov. Cidade<br />
2003 2008<br />
Fonte: <strong>UNICEF</strong>, Child poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivations-based approach, Ministério de Planificação e Desenvolvimento, Maputo, 2009.<br />
18<br />
19
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPITULO 1: A POBREZA EM MOÇAMBIQUE<br />
Nestas três províncias, as mães ou os<br />
que têm crianças a seu cargo são menos<br />
tendentes a reconhecer os sintomas de<br />
pneumonia do que a média nacional, o que<br />
indica que a privação severa de saúde pode<br />
estar associada ao nível de conhecimento<br />
que os que cuidam das crianças têm sobre<br />
as doenças. É de ressaltar o facto de apenas<br />
três por cento das crianças na Zambézia<br />
suspeitas de pneumonia terem recebido<br />
antibióticos. 43<br />
3.6. Privação severa de abrigo<br />
nas crianças<br />
Cinco por cento das crianças vivem<br />
com privações severas de abrigo em<br />
Moçambique. Este nível manteve-se<br />
relativamente constante entre 2003 e 2008.<br />
O indicador de abrigo é a percentagem<br />
de crianças com menos de 18 anos que<br />
vivem em habitações com mais de cinco<br />
pessoas por quarto (superlotação severa).<br />
Cabo Delgado tem experimentado uma<br />
grande redução da privação severa de<br />
abrigo nas crianças. Quase nenhuma criança<br />
(0,2 por cento) na província se encontra<br />
agora em situação de privação severa de<br />
abrigo, comparativamente a 3 por cento<br />
em 2003. A privação severa de abrigo tem<br />
aumentado em Gaza e Inhambane. Nenhuma<br />
outra província mostra evidências de uma<br />
variação estatisticamente significativa na<br />
percentagem de crianças com essa privação.<br />
Figura 1.10: Privação severa de abrigo por quintil de riqueza, 2008<br />
14%<br />
12%<br />
10%<br />
8%<br />
13%<br />
É forte a correlação entre a privação severa de<br />
abrigo e a riqueza. Treze por cento das crianças<br />
no quintil mais pobre têm tal privação, quando<br />
apenas 1 por cento das crianças nos agregados<br />
familiares mais abastados a enfrentam.<br />
3.7. Privação severa de<br />
informação nas crianças<br />
Não houve variação estatisticamente<br />
significativa na percentagem de crianças a<br />
sofrer de privação severa de informação entre<br />
2003 e 2008. Quarenta por cento das crianças<br />
sofriam-na em 2008. O indicador de privação<br />
de informação é a percentagem de crianças<br />
entre os 5 e os 18 anos que não possuem ou<br />
não têm acesso a uma televisão, rádio ou<br />
jornal em casa.<br />
O indicador de privação de informação não<br />
leva em conta a posse de telefone móvel.<br />
É provável que se tivesse sido incluído no<br />
cálculo da privação de informação o acesso<br />
a telemóveis, este tivesse causado uma<br />
redução na percentagem de crianças vítimas<br />
de privação severa de informação, dado o<br />
grande aumento da posse de celulares em<br />
Moçambique na última década (ver Capítulo<br />
6, Questões transversais). É também possível<br />
que a rápida expansão da posse de telemóvel<br />
esteja a reduzir a demanda de rádios e<br />
televisões entre as famílias mais pobres<br />
por estas darem prioridade a telemóveis<br />
comparativamente a outros artigos de<br />
comunicação.<br />
6%<br />
6%<br />
4%<br />
4%<br />
2%<br />
3%<br />
0% 1%<br />
Mais baixo Segundo Médio Quarto Mais alto<br />
4. Conclusões<br />
São significativas as melhorias que se têm<br />
registado nos níveis de pobreza absoluta nas<br />
crianças medida pela abordagem baseada<br />
em privações. Os avanços observados na<br />
pobreza baseada em privações estão em<br />
parte associados aos grandes esforços<br />
feitos pelo Governo na prestação de<br />
serviços sociais. O Governo tem investido<br />
fortemente em educação e saúde, o que se<br />
tem traduzido em melhorias significativas<br />
na percentagem de crianças severamente<br />
privadas de educação e saúde. Embora a<br />
percentagem de crianças com privações<br />
severas tenha diminuído nos últimos anos,<br />
quase metade das crianças moçambicanas<br />
continuam a enfrentá-las. As privações mais<br />
frequentes são as de acesso a água potável,<br />
saneamento e informação. Um investimento<br />
continuado em serviços essenciais significa<br />
um investimento continuado no futuro das<br />
crianças de Moçambique.<br />
A dicotomia urbano/rural é particularmente<br />
evidente com a análise baseada em<br />
privações. É também evidente a partir<br />
dos resultados que os níveis de privação<br />
são significativamente mais elevados nas<br />
províncias do centro e do norte do que nas<br />
províncias do sul. No entanto, se excluirmos<br />
a Cidade de Maputo, foram as províncias do<br />
norte que registaram a maior redução nos<br />
níveis de pobreza infantil. Da mesma forma,<br />
as estimativas de pobreza de consumo<br />
indicam uma tendência positiva no norte de<br />
Moçambique.<br />
As taxas de pobreza têm registado<br />
estagnação quando medidas pela<br />
abordagem baseada no consumo, havendo<br />
quase 12 milhões de moçambicanos a viver<br />
com menos de 18,4 meticais (cerca de meio<br />
dólar americano) por dia. Deve-se tal facto<br />
principalmente ao fraco desempenho do<br />
sector agrícola, do qual depende a maior<br />
parte da população para a sua subsistência.<br />
É inequívoca a relação entre a riqueza e<br />
o bem-estar das crianças. Não obstante a<br />
necessidade de investimentos continuados<br />
nos sectores sociais para que se reduzam<br />
os níveis de privação, é fundamental que o<br />
Governo e os seus parceiros reexaminem<br />
a sua abordagem para estimular o sector<br />
agrícola.<br />
Tanto a medida baseada no consumo como<br />
a medida baseada em privação realçam<br />
os elevados níveis de vulnerabilidade<br />
da população moçambicana, como<br />
demonstrado pela flutuação das taxas de<br />
pobreza provincial. Essas disparidades estão<br />
relacionadas com a desigual distribuição<br />
de recursos do Governo. As províncias com<br />
menor índice de desenvolvimento humano<br />
tendem a receber uma menor alocação de<br />
recursos. A capacidade das famílias para<br />
resistir a choques internos ou externos é<br />
extremamente limitada. Os choques mais<br />
comuns são a morte de um membro da<br />
família ou choques climatéricos como<br />
secas ou inundações. 44 Esses choques<br />
podem impor às crianças e suas famílias<br />
severas privações e pobreza absoluta, com<br />
consequências no bem-estar das crianças ao<br />
longo de toda a sua vida.<br />
Fonte: <strong>UNICEF</strong>, Child poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivations-based approach, Ministério de Planificação e Desenvolvimento, Maputo, 2009.<br />
20<br />
21
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPITULO 1: A POBREZA EM MOÇAMBIQUE<br />
Referências<br />
1 Fundo das Nações Unidas para a Infância,<br />
A Pobreza na Infância em Moçambique:<br />
Uma Análise da Situação e das Tendências,<br />
<strong>UNICEF</strong>, Maputo, 2006.<br />
2 National Institute of Statistics, ‘Statistics of<br />
<strong>Mozambique</strong>’, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, descarregado de http://www.ine.gov.<br />
mz, acedido a 30 de Outubro de 2010.<br />
3 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
4 Ministério de Planificação e Desenvolvimento<br />
‘Pobreza e Bem-estar em Moçambique:<br />
Terceira Avaliação Nacional da Pobreza,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, Setembro<br />
de 2010.<br />
5 <strong>Mozambique</strong> National Institute of Health,<br />
London School of Hygiene and Tropical<br />
Medicine, and <strong>UNICEF</strong>, <strong>Mozambique</strong> National<br />
Childhood Mortality Study 2009, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
6 United Nations Committee on the Rights of<br />
the Child, Consideration of Reports Submitted<br />
by States Parties Under Article 44 of the<br />
Convention: Concluding observations of<br />
the Committee on the Rights of the Child<br />
– <strong>Mozambique</strong>, CRC/C/MOZ/CO/2, Office of<br />
the High Commissioner on Human Rights,<br />
Genebra, Outubro de 2009.<br />
7 Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
‘Relatório de Avaliação de Impacto do PARPA<br />
II’, Governo de Moçambique, Maputo, 30 de<br />
Outubro de 2009.<br />
8 <strong>Mozambique</strong> Ministry of Planning and<br />
Finance, International Food Policy Research<br />
Institute, and Purdue University, Poverty<br />
and Well-Being in <strong>Mozambique</strong>: The second<br />
national assessment, 2002–2003, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2004.<br />
9 Ministério de Planificação e Desenvolvimento<br />
‘Pobreza e Bem-estar em Moçambique:<br />
Terceira Avaliação Nacional da Pobreza,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, Setembro<br />
de 2010<br />
10 Ibid.<br />
11 Ibid.<br />
12 Ibid<br />
13 Simler, Kenneth R., and Virgulino Nhate,<br />
V., ‘Poverty, Inequality, and Geographic<br />
Targeting: Evidence from Small-Area<br />
Estimates in <strong>Mozambique</strong>,’ Governo de<br />
Moçambique, Maputo, Março de 2005.<br />
14 Instituto Nacional de Estatística, ‘Inquérito<br />
Integrado à Força de Trabalho (IFTRAB)<br />
2004/05,’ Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2006.<br />
15 Ministério de Planificação e Desenvolvimento<br />
‘Pobreza e Bem-estar em Moçambique:<br />
Terceira Avaliação Nacional da Pobreza,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, Setembro<br />
de 2010.<br />
16 Fundo das Nações Unidas para a Infância,<br />
A Pobreza na Infância em Moçambique:<br />
Uma Análise da Situação e das Tendências,<br />
<strong>UNICEF</strong>, Maputo, 2006.<br />
17 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010. Virgulino, Nhate, et al. Orphans<br />
and Discrimination in <strong>Mozambique</strong>: An<br />
Outlay Equivalence Analysis, Ministério de<br />
Planificação e Desenvolvimento, Maputo,<br />
Outubro de 2005.<br />
18 Virgulino, Nhate, et al. Orphans and<br />
Discrimination in <strong>Mozambique</strong>: An Outlay<br />
Equivalence Analysis, Ministério de<br />
Planificação e Desenvolvimento, Maputo,<br />
Outubro de 2005.<br />
19 Ministério de Planificação e Desenvolvimento<br />
‘Pobreza e Bem-estar em Moçambique:<br />
Terceira Avaliação Nacional da Pobreza,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, Setembro<br />
de 2010.<br />
20 Gordon, David, et al., ‘The Distribution of<br />
Child Poverty in the Developing World’,<br />
Centre for International Poverty Research,<br />
University of Bristol, e <strong>UNICEF</strong>, Bristol, Julho<br />
de 2003.<br />
21 Instituto Nacional de Estatística, ‘Inquérito<br />
de Indicadores Múltiplos 2008, Sumário’,<br />
Governo de Moçambique, Maputo,<br />
descarregado de: http://www.ine.gov.mz,<br />
acedido a 30 de Outubro de 2010.<br />
22<br />
23
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPITULO 1: A POBREZA EM MOÇAMBIQUE<br />
22 <strong>Mozambique</strong> National Institute of Health,<br />
London School of Hygiene and Tropical<br />
Medicine, and United Nations Children’s<br />
Fund, <strong>Mozambique</strong> National Childhood<br />
Mortality Study 2009, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
23 Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
‘Relatório de Avaliação de Impacto do PARPA<br />
II’, Governo de Moçambique, Maputo, 30 de<br />
Outubro de 2009.<br />
24 Fundo das Nações Unidas para a Infância,<br />
A Pobreza na Infância em Moçambique:<br />
Uma Análise da Situação e das Tendências,<br />
<strong>UNICEF</strong>, Maputo, 2006.<br />
25 Governo de Moçambique, ‘Plano de Acção<br />
para a Redução da Pobreza Absoluta (2001-<br />
2005),’ Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2001.<br />
26 Grupo 20, ‘Annual Poverty Report 2004,’<br />
Grupo 20, Maputo, 2004.<br />
27 República de Moçambique, ‘Plano de Acção<br />
para a Redução da Pobreza Absoluta 2006-<br />
2009,’ República de Moçambique, Maputo,<br />
2006.<br />
28 Gordon, David, et al., The Distribution of<br />
Child Poverty in the Developing World,<br />
relatório para o <strong>UNICEF</strong>, Julho de 2003.<br />
29 United Nations, Report of the World Summit<br />
for Social Development, United Nations,<br />
Copenhaga, 1995.<br />
30 United Nations Children’s Fund, ‘Trends<br />
in Child Poverty in <strong>Mozambique</strong>: A<br />
deprivations-based approach,’ Ministério de<br />
Planificação e Desenvolvimento, Governo<br />
de Moçambique e <strong>UNICEF</strong> Moçambique,<br />
Maputo, 2009.<br />
31 Ibid<br />
32 Ministério de Planificação e Desenvolvimento<br />
‘Pobreza e Bem-estar em Moçambique:<br />
Terceira Avaliação Nacional da Pobreza,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, Setembro<br />
de 2010.<br />
33 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010<br />
34 United Nations Children’s Fund, ‘Trends in<br />
Child Poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivationsbased<br />
approach,’ Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Governo de Moçambique e<br />
<strong>UNICEF</strong> <strong>Mozambique</strong>, Maputo, 2009<br />
35 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
36 United Nations Children’s Fund, ‘Trends in<br />
Child Poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivationsbased<br />
approach, ’Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Governo de Moçambique e<br />
<strong>UNICEF</strong> Moçambique, Maputo, 2009<br />
37 Fundo das Nações Unidas para a Infância,<br />
A Pobreza na Infância em Moçambique:<br />
Uma Análise da Situação e das Tendências,<br />
<strong>UNICEF</strong>, Maputo, 2006.<br />
38 United Nations Children’s Fund, ‘Trends in<br />
Child Poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivationsbased<br />
approach’, Mini stério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Governo de Moçambique e<br />
<strong>UNICEF</strong> Moçambique, Maputo, 2009<br />
39 Ibid<br />
40 Instituto Nacional de Estatística,‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
41 World Health Organisation, ‘Turning the tide<br />
of malnutrition: responding to the challenge<br />
of the 21st century,’ Geneva, 2000<br />
42 United Nations Children’s Fund, ‘Trends in<br />
Child Poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivationsbased<br />
approach,’ Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Governo de Moçambique e<br />
Unicef Moçambique, Maputo, 2009<br />
43 Instituto Nacional de Estatística,‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
44 Austral Cowi, Revisão de Literatura sobre<br />
os Determinantes da Vulnerabilidade e<br />
Tendências, United Kingdom Department for<br />
International Development, 2009.<br />
24<br />
25
2CAPÍTULO<br />
O contexto de<br />
desenvolvimento<br />
1. Introdução<br />
2CAPÍTULO<br />
Este capítulo descreve o contexto político,<br />
social e económico do desenvolvimento<br />
humano em Moçambique. Desde a<br />
assinatura do Acordo de Paz em 1992,<br />
Moçambique tem vivido um período de forte<br />
crescimento económico. Com uma forte<br />
estrutura legal e política baseada em direitos<br />
e orientada para o crescimento económico e<br />
redução da pobreza, Moçambique encontrase<br />
fortemente dependente da cooperação<br />
internacional e da Assistência Externa ao<br />
Desenvolvimento. A influência dos doadores<br />
tem levantado algumas preocupações<br />
relativamente à responsabilidade<br />
pública e ao potencial enfraquecimento<br />
do papel das instituições nacionais na<br />
governação. A descentralização orçamental<br />
e administrativa que está em curso pode<br />
garantir que os recursos sejam alocados às<br />
províncias de forma equitativa, tendo em<br />
conta os indicadores de desenvolvimento<br />
humano. Esta realocação não foi ainda,<br />
no entanto, alcançada, estando as<br />
províncias com os piores indicadores de<br />
desenvolvimento a receber, de uma maneira<br />
geral, verbas inferiores.<br />
O contexto de desenvolvimento<br />
27
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 2: O CONTEXTO DE DESENVOLVIMENTO<br />
2. Transição para a paz, democracia<br />
e economia de mercado<br />
Moçambique tornou-se independente de<br />
Portugal em 1975, mas quase imediatamente<br />
entrou num período de 16 anos de<br />
instabilidade, caracterizado por um conflito<br />
armado entre o Governo, liderado pela<br />
Frente de Libertação de Moçambique<br />
(FRELIMO), e a Resistência Nacional de<br />
Moçambique (RENAMO). Os efeitos sociais<br />
da guerra foram dramáticos, chegando a<br />
um milhão de mortos, entre os quais cerca<br />
de 600.000 crianças. Mais de um terço da<br />
população foi forçada a abandonar as suas<br />
casas e muitas infra-estruturas públicas<br />
foram destruídas, principalmente escolas.<br />
Milhares de cidadãos ficaram deficientes<br />
e foram muitos os que sofreram os efeitos<br />
da fome e traumas psicológicos 1 . Os dois<br />
partidos assinaram um Acordo Geral de<br />
Paz em Outubro de 1992, e em Outubro de<br />
1994 realizaram-se as primeiras eleições<br />
presidenciais e legislativas do país, que<br />
resultaram na eleição de Joaquim Chissano<br />
como Presidente da República e na criação<br />
do primeiro parlamento multipartidário de<br />
Moçambique, a Assembleia da República.<br />
Até agora foram realizadas quatro rondas<br />
sucessivas de eleições gerais e presidenciais<br />
em que a FRELIMO saiu vencedora, com<br />
maioria tanto nas presidenciais como nas<br />
parlamentares, tendo a RENAMO liderada<br />
uma união eleitoral de partidos da oposição.<br />
A quarta eleição presidencial, realizada em<br />
Tabela 2.1: Indicadores Económicos, 2003-2009<br />
Outubro de 2009, resultou em vitória do<br />
actual presidente Armando Guebuza, que<br />
obteve cerca de 75 por cento dos votos<br />
expressos. O recém-formado Movimento<br />
Democrático de Moçambique, liderado por<br />
Daviz Simango, Presidente do Conselho<br />
Municipal da Beira, conquistou, nesta<br />
cidade, a maioria dos votos. A Missão de<br />
Observação Eleitoral do Fórum Parlamentar<br />
da Comunidade de Desenvolvimento da<br />
África Austral concluiu que as eleições de<br />
2009 “reflectiram de facto a vontade do<br />
povo moçambicano” 2 . Embora o registo de<br />
votantes seja consistentemente elevada,<br />
situando-se em cerca de 80 por cento, o<br />
número de eleitores caiu de 88 por cento<br />
nas primeiras eleições nacionais para uma<br />
percentagem estimada em 42 por cento em<br />
2009 3 .<br />
Na altura em que o Acordo de Paz foi<br />
assinado em 1992, Moçambique encontravase<br />
entre os países mais pobres do mundo,<br />
de acordo com o Índice de Desenvolvimento<br />
Humano das Nações Unidas e com<br />
estimativas do Banco Mundial do Produto<br />
Interno Bruto per capita 4 . Apesar de<br />
quase duas décadas de paz, estabilidade<br />
política e um forte crescimento económico,<br />
Moçambique continua a ser um dos países<br />
mais pobres do mundo, ocupando o 165º<br />
lugar de entre 169 países em termos do<br />
Índice de Desenvolvimento Humano 5 .<br />
Indicador 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009<br />
Crescimento real do PIB (%) 6,5 7,9 8,4 8,7 7,3 6,8 6,4<br />
Inflação (%) 13,5 12,6 6,4 13,2 8,2 10,3 3,3<br />
PIB per capita (USD) 256,9 301,6 334,5 352,8 398,7 476,9 453,9<br />
Fonte: República de Moçambique, Relatório sobre os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2010.<br />
2.1.Tendências demográficas<br />
Os dados e as projecções oficiais sobre a<br />
população são produzidos pelo Instituto<br />
Nacional de Estatística e baseiam-se em<br />
dados de censos nacionais 6 . O último<br />
recenseamento foi realizado em 2007, tendo<br />
os resultados revelado um crescimento da<br />
população total de Moçambique de 28 por<br />
cento entre 1997 e 2007, o que equivale a<br />
uma taxa de crescimento anual de 2,4 por<br />
cento. A província de Maputo registou o<br />
maior aumento populacional, 52 por cento,<br />
no período entre os censos de 1997 e 2007. A<br />
população da Cidade de Maputo aumentou<br />
apenas ligeiramente, uma vez que grande<br />
parte da migração foi para os subúrbios<br />
em desenvolvimento em torno da cidade,<br />
e não para a própria cidade. A maioria da<br />
população de Moçambique (quase 40 por<br />
cento) está concentrada nas duas províncias<br />
nortenhas de Nampula (cerca de 4 milhões<br />
de habitantes) e da Zambézia (3,9 milhões). 7<br />
A população de Moçambique é<br />
predominantemente jovem. Em 2007,<br />
de uma população total de 20,5 milhões,<br />
metade eram crianças com idade inferior<br />
a 18 anos (10 milhões). Pouco mais de<br />
metade da população é constituída por<br />
mulheres, com uma proporção entre<br />
homens e mulheres de 91:100. A densidade<br />
populacional é baixa, cerca de 26 habitantes<br />
por quilómetro quadrado, 8 e uma população<br />
predominantemente rural (69 por cento).<br />
Estima-se que um agregado familiar médio<br />
seja composto, nas áreas urbanas, por 4,7<br />
membros por família, em média, e nas<br />
zonas rurais, por 4,2, o que corresponde a<br />
uma média nacional de 4,3. 9 , 10 . Em 2006,<br />
estimavam-se em 72 e 92 por cento os rácios<br />
de dependência i nas áreas urbanas e rurais,<br />
respectivamente, com uma taxa global<br />
nacional de 85 por cento. 11<br />
i<br />
2.2. Crescimento económico<br />
e estabilidade<br />
macroeconómica<br />
Moçambique é uma economia de baixo<br />
rendimento, com um Produto Interno<br />
Bruto (PIB) per capita estimado em 453<br />
milhões de dólares americanos em 2009. 12<br />
O crescimento do PIB atingiu uma média<br />
anual impressionante de 8 por cento durante<br />
o período 1993-2009 (ver Figura 2.1). O forte<br />
crescimento real do PIB desde 2000 tem<br />
sido impulsionado por fortes investimentos<br />
em grandes projectos, especialmente<br />
nos sectores de minerais e mineração. O<br />
crescimento económico foi acompanhado<br />
pelo desenvolvimento de um ambiente<br />
macroeconómico razoavelmente estável e<br />
previsível. Apesar da recente crise financeira<br />
global e da correspondente crise dos custos<br />
dos combustíveis e alimentos, Moçambique<br />
continuou a mostrar um crescimento<br />
económico relativamente forte e uma<br />
robusta estrutura macroeconómica. Embora<br />
o crescimento do PIB em cada um dos<br />
últimos cinco anos tenha ultrapassado os 6,5<br />
por cento, o PIB per capita baixou entre 2008<br />
e 2009. 13<br />
Estima-se que os mega-projectos estejam a<br />
contribuir, actualmente, com mais de 70 por<br />
cento das exportações; no final dos anos 90<br />
a sua contribuição era praticamente nula.<br />
No entanto, dada a redução de impostos,<br />
os mega-projectos detidos por estrangeiros<br />
ainda não contribuem significativamente<br />
para as receitas públicas, o que limita as<br />
finanças públicas e transfere a carga fiscal<br />
para as pequenas e médias empresas. 14 A<br />
dependência de megaprojectos também<br />
levantou entre alguns observadores<br />
preocupações com uma possível economia<br />
de duas vertentes, onde “os sectores de<br />
exportação de capital intensivo continuam<br />
Os rácios de dependência dos agregados familiares são estimados somando o número de crianças dos 0 aos 14 anos<br />
com o de pessoas com idade igual ou superior a 65 anos, e dividindo a soma pelo número de pessoas “activas” com<br />
idades compreendidas entre os 15 e os 64 anos.<br />
28<br />
29
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 2: O CONTEXTO DE DESENVOLVIMENTO<br />
a prosperar sem um suficiente trickle-down<br />
para o resto do sector privado [sem fazer<br />
com que os estratos inferiores do sector<br />
privado também beneficiem] e com pouco<br />
impacto na redução da pobreza.” 15<br />
Moçambique tem incentivado o investimento<br />
estrangeiro através da adopção de políticas<br />
de mercado aberto, o que criou um ambiente<br />
de investimento mais acolhedor para grandes<br />
investidores do que em muitos outros países<br />
africanos. No entanto, rígidas leis laborais<br />
e problemas de governação continuam a<br />
afectar a atractividade de Moçambique para<br />
os investidores, Esta situação está reflectida<br />
no relatório do Banco Mundial de 2011 ‘Doing<br />
Business’, que coloca Moçambique em 126º<br />
lugar de entre 183 economias na facilidade<br />
de fazer negócios. 16 O Banco Africano de<br />
Desenvolvimento também comentou o difícil<br />
ambiente de negócios no país, observando<br />
que os investidores nacionais se deparam<br />
com uma regulamentação asfixiante,<br />
corrupção e monopólios públicos de<br />
deficiente funcionamento. 17<br />
Moçambique é país que mais beneficia<br />
de doações em África em termos de<br />
percentagem do PIB, mais de 9 por cento<br />
em 2007. Estimativas do Governo de<br />
Moçambique indicam que os recursos<br />
externos cobriam 53 por cento do<br />
orçamento do Estado em 2010. 18 Para reduzir<br />
esta dependência da Assistência Externa ao<br />
Desenvolvimento, o país começou a fazer<br />
reformas na sua política fiscal, ampliando a<br />
sua base tributária e melhorando a cobrança<br />
de direitos aduaneiros. As receitas fiscais<br />
representavam 17,8 por cento do PIB em<br />
2009, contra 13,0 por cento registados em<br />
2003. 19<br />
2.3. Objectivos de Desenvolvimento<br />
do Milénio<br />
No seu quarto e mais recente relatório<br />
nacional de progresso sobre os Objectivos<br />
de Desenvolvimento do Milénio (ODM), de<br />
2010, o Governo de Moçambique reafirmou<br />
o seu compromisso de alcançar as metas. ii<br />
O Governo assinalou que o país “continuou<br />
a registar progressos significativos”,<br />
destacando a “expansão dos serviços de<br />
saúde e educação.” 20 De uma maneira geral,<br />
considera-se que Moçambique está capaz<br />
de atingir 4 das 21 metas e tem potencial<br />
para alcançar mais 9, mas é improvável que<br />
alcance uma. Por falta de dados, não foi<br />
possível avaliar o progresso relativamente<br />
a 7 metas. Os progressos alcançados<br />
encontram-se resumidos na Tabela 2.2.<br />
ii Na 55ª Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, realizada em 2000, 189 dos países do mundo e muitas das<br />
principais instituições de desenvolvimento assumiram o seu compromisso para com a Declaração do Milénio, uma<br />
reafirmação dos líderes mundiais da sua responsabilidade colectiva de apoiar os princípios de dignidade humana,<br />
igualdade e equidade a nível global. A Declaração do Milénio estabeleceu uma nova parceria global para reduzir a<br />
pobreza extrema, e definiu uma série de metas com limite temporal, a serem alcançadas até 2015. Tais metas tornaramse<br />
depois conhecidas como os oito Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM), aos quais se encontram<br />
associadas 21 metas e 60 indicadores.<br />
Tabela 2.2: Evolução rumo aos ODM<br />
OBJECTIVOS/METAS<br />
ATINJIR-SE-Á O OBJECTIVO/A META?<br />
POBREZA EXTREMA E FOME É Provável Há possibilidade É improvável Não há dados<br />
Reduzir para metade, até 2015, a<br />
percentagem de pessoas que vivem em<br />
pobreza extrema<br />
Garantir, até 2015, trabalho decente<br />
para todos, incluindo mulheres como<br />
jovens<br />
Reduzir para metade, até 2015, a<br />
percentagem da população em situação<br />
de fome<br />
ENSINO PRIMÁRIO UNIVERSAL<br />
Garantir, até 2015, que todas as crianças<br />
de ambos os sexos completem todo um<br />
ciclo completo do ensino primário<br />
IGUALDADE DE GÉNERO<br />
Eliminar, de preferência até 2005, as<br />
disparidades de género no ensino<br />
primário e secundário, e, até 2015, em<br />
todos os níveis de ensino<br />
MORTALIDADE INFANTIL<br />
Reduzir em três quartos, até 2015, a taxa<br />
de mortalidade de menores de cinco<br />
anos<br />
MORTALIDADE MATERNA<br />
Reduzir em três quartos, até 2015, o<br />
rácio de mortalidade materna<br />
Alcançar, até 2015, o acesso universal a<br />
saúde reprodutiva.<br />
HIV/SIDA, MALÁRIA E OUTRAS DOENÇAS<br />
Reduzir para metade e começar a<br />
reverter, até 2015, a propagação do<br />
HIV/SIDA<br />
Alcançar, até 2010, o acesso universal<br />
a tratamento para HIV/SIDA para todos<br />
aqueles que dele necessitem<br />
Reduzir para metade, até 2016, e<br />
começar a reverter a incidência da<br />
malária e outras principais doenças<br />
SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL<br />
Integrar os princípios do<br />
desenvolvimento sustentável nas<br />
políticas e programas nacionais e<br />
reverter a perda de recursos ambientais<br />
É Provável<br />
É Provável<br />
É Provável<br />
Há possibilidade<br />
Há possibilidade<br />
Há possibilidade<br />
Há possibilidade<br />
Há possibilidade<br />
Há possibilidade<br />
Há possibilidade<br />
É improvável<br />
Não há dados<br />
Não há dados<br />
30<br />
31
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 2: O CONTEXTO DE DESENVOLVIMENTO<br />
Reduzir a perda de biodiversidade,<br />
atingindo, até 2010, um nível<br />
significativo<br />
Reduzir para metade, até 2015, a<br />
percentagem de população sem acesso a<br />
água potável e saneamento<br />
Até 2020, melhorar consideravelmente a<br />
qualidade de vida da população que vive<br />
em bairros pobres<br />
PARCERIA GLOBAL PARA O DESENVOLVIMENTO<br />
Continuar a desenvolver um sistema<br />
comercial e financeiro multilateral<br />
aberto, regulado, previsível,<br />
não discriminatório. Isto inclui<br />
comprometer-se a uma boa governação,<br />
desenvolvimento e redução da pobreza,<br />
tanto a nível nacional como internacional<br />
Procurar satisfazer as necessidades<br />
especiais dos países menos avançados<br />
Procurar satisfazer as necessidades<br />
especiais dos países sem acesso ao<br />
mar e dos pequenos estados insulares,<br />
e o resultado da 20ª sessão especial da<br />
Assembleia Geral das NU<br />
Tratar de uma maneira global os<br />
problemas da dívida dos países em<br />
desenvolvimento através de medidas<br />
nacionais e internacionais, a fim de tornar<br />
a sua dívida sustentável a longo prazo<br />
Em cooperação com empresas<br />
farmacêuticas, proporcionar acesso<br />
a medicamentos essenciais a<br />
preços acessíveis nos países em<br />
desenvolvimento<br />
Em cooperação com o sector privado,<br />
tornar acessíveis os benefícios das<br />
novas tecnologias, em particular<br />
das tecnologias de informação e<br />
comunicação<br />
É Provável<br />
Há possibilidade<br />
Há possibilidade<br />
Há possibilidade<br />
Não há dados<br />
Não há dados<br />
Não há dados<br />
Não há dados<br />
Não há dados<br />
Fonte: República de Moçambique, Relatório sobre os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2010.<br />
2.4. O processo de<br />
descentralização em<br />
Moçambique<br />
A descentralização é considerada uma<br />
força motriz para a redução da pobreza, já<br />
que favorece a democracia, a participação<br />
popular, a receptividade, a responsabilidade<br />
e a equidade a nível local. A descentralização<br />
pode dar voz aos cidadãos pobres e melhorar<br />
o seu acesso às estruturas do Governo.<br />
Além disso, parte-se do princípio de que as<br />
autoridades locais percebem melhor a sua<br />
situação e as massas populares do que as<br />
autoridades centrais, podendo assim, definir<br />
de forma mais eficaz para onde direccionar<br />
investimentos para a redução da pobreza. A<br />
descentralização é uma prioridade no Plano<br />
Quinquenal 2010-14.<br />
O processo de descentralização remonta, em<br />
Moçambique, à adopção da Constituição em<br />
1990, que estabelece os Órgãos Locais do<br />
Estado. A Lei 2/1997 institui os municípios<br />
como unidades territoriais dotadas de<br />
órgãos representativos (assembleias<br />
municipais) e órgãos executivos (conselho<br />
municipal) próprios. A assembleia municipal<br />
é composta por membros directamente<br />
eleitos, enquanto o conselho municipal<br />
compreende o Presidente do Conselho<br />
Municipal e os vereadores do município. O<br />
Decreto 15/2000 reconhece as autoridades<br />
comunitárias como sendo o elo de ligação<br />
entre a sociedade civil e os Órgãos Locais do<br />
Estado, e descreve as diversas obrigações<br />
das autoridades comunitárias reconhecidas,<br />
nomeadamente: (i) divulgação de leis e<br />
políticas governamentais aos membros<br />
da comunidade; (ii) cobrança de impostos;<br />
(iii) registo da população; (iv) aplicação<br />
da justiça; e (v) mobilização e organização<br />
das comunidades para actividades de<br />
desenvolvimento local. As autoridades<br />
comunitárias recebem um incentivo<br />
monetário pelos impostos que cobram.<br />
As directrizes nacionais para os planos de<br />
desenvolvimento distrital (aprovadas em<br />
2003) reforçam o papel dos municípios como<br />
unidades de planificação e orçamentação,<br />
e consideram a criação de conselhos<br />
consultivos locais para servir de interface<br />
entre a sociedade civil e as autoridades<br />
distritais no processo de planificação.<br />
A Lei 8 / 2003 iii define a estrutura e<br />
organização dos Órgãos Locais do Estado e<br />
institui o distrito como unidade orçamental,<br />
com poder para planificar e definir as suas<br />
prioridades. O plano de desenvolvimento<br />
distrital é legalmente reconhecido como<br />
principal instrumento de planificação e<br />
orçamentação. Incentiva-se a consulta e<br />
a participação comunitária por meio de<br />
conselhos consultivos distritais, a quem é<br />
atribuído um papel na elaboração, aprovação<br />
e execução dos planos a nível distrital. Os<br />
conselhos consultivos distritais oferecem um<br />
potencial caminho através do qual as vozes<br />
das crianças podem ser ouvidas e os seus<br />
direitos realizados.<br />
Desde 2006 que o Governo tem atribuído<br />
cerca de sete milhões de meticais a cada<br />
distrito, a serem investidos na criação de<br />
emprego e promoção do sector privado. Esta<br />
medida proporcionou um forte incentivo<br />
para o melhoramento de sistemas visando<br />
garantir que as verbas sejam efectivamente<br />
gastas em projectos de desenvolvimento<br />
local. Na sua 17ª Sessão Ordinária em<br />
2007, o Conselho de Ministros decidiu<br />
descentralizar o financiamento para estradas,<br />
água, agricultura, saúde e educação e<br />
infra-estruturas, como um passo para a<br />
implementação efectiva da Lei 8/2003 e<br />
consecução dos objectivos estratégicos do<br />
PARPA II e do Plano Quinquenal.<br />
Um estudo solicitado para a avaliação do<br />
PARPA II concluiu que “(1) a descentralização<br />
dos fundos sectoriais ainda não é eficaz;<br />
(2) o envolvimento de instituições de<br />
planificação e as consultas à comunidade<br />
são eficazes; (3) os sistemas de contabilidade<br />
são complexos, lentos e contraproducentes;<br />
(4) o sistema de monitorização e avaliação<br />
iii Lei dos Órgãos do Estado (LOLE)<br />
32<br />
33
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 2: O CONTEXTO DE DESENVOLVIMENTO<br />
a nível distrital carece de melhorias; (5) a<br />
capacidade de manutenção a nível distrital<br />
requer fortalecimento; (6) o sector privado<br />
está pouco envolvido na prestação de<br />
serviços; (7) há divergência institucional<br />
em relação à aplicação da legislação;<br />
(8) os critérios de atribuição de fundos<br />
sectoriais são inconsistentes e pouco<br />
conhecidos; e (9) falta uma perspectiva<br />
multissectorial a nível distrital, uma vez que<br />
se trata de um processo de planificação<br />
sistemático.” O estudo revelou também<br />
diferenças significativas entre os processos<br />
de descentralização nas duas províncias<br />
visitadas (Nampula e Gaza). Foram também<br />
observadas diferenças em relação aos<br />
critérios de planificação, definição de<br />
prioridades, alocação de recursos e fluxos<br />
financeiros. Estas diferenças podem ser<br />
explicadas, pelo menos em parte, por<br />
diferenças no nível de experiência na gestão<br />
de processos de descentralização entre as<br />
duas províncias. 21<br />
Grande parte das reformas do governo<br />
local realizadas até à data baseou-se na<br />
descentralização de funções administrativas<br />
(muitas vezes designada ‘desconcentração’),<br />
em alguns elementos fiscais do sector<br />
público, e com maior ênfase nos processos<br />
de planificação e orçamentação. A<br />
descentralização democrática continua<br />
a ser uma possibilidade distante e, além<br />
da planificação distrital participativa, a<br />
prestação de contas no distrito tende a fluir<br />
de baixo para cima, para o nível provincial e<br />
nacional, em vez de ser de cima para baixo,<br />
para a população local, através de eleições.<br />
3.Análise das políticas e institucional<br />
3.1. Políticas e mecanismos de<br />
planificação<br />
A planificação a nível nacional, em<br />
Moçambique, norteia-se pelo Programa<br />
Quinquenal do Governo. Cada novo<br />
governo que toma posse iv elabora um Plano<br />
Quinquenal e define as suas prioridades<br />
e agenda operacional até às eleições<br />
gerais seguintes. O Plano Quinquenal é<br />
o principal instrumento de planificação<br />
de longo prazo que define as prioridades<br />
e os objectivos centrais do Governo e<br />
descreve as estratégias específicas para a<br />
sua consecução. O actual Plano Quinquenal<br />
2010-2014 tem como objectivo central a<br />
redução da pobreza absoluta para melhorar<br />
as condições de vida do povo moçambicano<br />
num ambiente de paz, harmonia e<br />
tranquilidade. Aborda os seguintes temas:<br />
desenvolvimento humano e social, boa<br />
governação, desenvolvimento económico<br />
e fortalecimento da soberania nacional e<br />
da cooperação internacional, bem como<br />
as questões transversais de desminagem,<br />
meio ambiente, vulnerabilidade, HIV/SIDA,<br />
género, alimentação e segurança alimentar e<br />
desenvolvimento rural.<br />
O PARP é o instrumento-chave para a<br />
operacionalização do Plano Quinquenal<br />
do Governo. Moçambique, até à data,<br />
produziu dois Planos de Acção para a<br />
Redução da Pobreza Absoluta ou PARPA<br />
(PARPA I 2001-2005 22 e PARPA II 2006-<br />
2009 23 ). O PARPA II reflecte as metas e<br />
objectivos de acordos regionais, africanos<br />
e internacionais, incluindo os ODM, a Nova<br />
Parceria para o Desenvolvimento de África<br />
e a Comunidade para o Desenvolvimento<br />
da África Austral. Foi desenvolvido com<br />
a estrutura geral do documento de visão<br />
nacional Agenda 2025, compreendendo<br />
quatro pilares: macroeconomia e pobreza,<br />
governação, desenvolvimento económico e<br />
capital humano. As questões transversais,<br />
entre as quais género, HIV/SIDA, meio<br />
ambiente, segurança alimentar e nutricional<br />
e desastres naturais, foram integradas ao<br />
longo de todo o documento. O PARPA II<br />
foi consideravelmente mais favorável às<br />
crianças que o PARPA I, tendo definido<br />
metas obrigatórias e quantificáveis para a<br />
concretização dos direitos da criança, muitas<br />
das quais contribuem directamente para a<br />
consecução dos ODM.<br />
O PARPA II centrou-se nos sectores e<br />
estratégias chave para o crescimento<br />
económico e redução da pobreza,<br />
apresentando mais detalhes relativos à<br />
alocação de recursos e estabelecimento<br />
de metas obrigatórias para acompanhar<br />
e avaliar o desempenho. O PARPA II<br />
reafirmou o compromisso do Governo de<br />
proporcionar serviços sociais, mas priorizou<br />
também a promoção do desenvolvimento<br />
do sector privado como forma de manter o<br />
crescimento económico, reduzir a pobreza<br />
e, a longo prazo, gerar fontes domésticas<br />
de divisas, aumentar as receitas e reduzir a<br />
dependência da ajuda. Em Outubro de 2009,<br />
o Governo e os seus parceiros realizaram<br />
uma avaliação conjunta sobre o impacto<br />
do PARPA 24 , que concluiu que, apesar dos<br />
significativos progressos registados na<br />
concretização dos objectivos do pilar de<br />
capital humano, especialmente em termos<br />
de expansão do acesso a serviços básicos,<br />
nem todas as metas estabelecidas foram<br />
alcançadas. Foram áreas que registaram<br />
insuficiente progresso a cobertura dos<br />
serviços de saúde, a garantia de qualidade<br />
dos serviços de educação, a melhoria do<br />
uso dos serviços de água e saneamento<br />
e a disponibilização de programas de<br />
proteção social para os pobres. Espera-se<br />
que a terceira geração, em Moçambique, do<br />
iv Segundo estabelece o Artigo 198 da Constituição, o parlamento deve discutir o Plano Quinquenal no início da legislatura.<br />
34<br />
35
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 2: O CONTEXTO DE DESENVOLVIMENTO<br />
Documento da Estratégia para a Redução<br />
da Pobreza (o PARP) fique concluída no<br />
início de 2011.<br />
O Cenário Fiscal de Médio Prazo (CFMP)<br />
25 é um instrumento de planificação<br />
de médio prazo que estabelece os<br />
recursos financeiros necessários para a<br />
implementação dos objectivos do Plano<br />
Quinquenal e do PARPA. O CFMP contribui<br />
também para garantir a disciplina fiscal e<br />
orçamental, conjuntamente. O PARP e o<br />
CFMP, em conjunto, são os instrumentos<br />
de planificação e orçamentação em que<br />
se baseia a harmonização de políticas e<br />
prioridades nacionais e definem os recursos<br />
Caixa 2.1 Instrumentos de Planificação e Orçamentação em Moçambique<br />
necessários para a sua implementação<br />
a médio prazo. Os planos nacionais são<br />
complementados por planos sectoriais,<br />
provinciais e distritais (ver Figura 2.1), os<br />
quais, juntamente com o PARPA e o CFMP,<br />
constituem o quadro de planificação nacional<br />
de médio prazo. A elaboração de Planos<br />
Estratégicos Sectoriais não está sujeita<br />
a uma metodologia definida, usando os<br />
diferentes sectores abordagens distintas.<br />
O ciclo anual de planificação começa com a<br />
preparação do CFMP em Fevereiro, sendo<br />
a versão final apresentada em Abril/Maio<br />
como uma contribuição para a fase seguinte<br />
do ciclo: preparação do orçamento. Os<br />
1. O PRSP (PARPA ou PARP) baseia-se no Programa Quinquenal do Governo e nos Planos<br />
Estratégicos Sectoriais, apresentando as políticas, os objectivos, as metas e os resultados que<br />
se esperam para a redução da pobreza absoluta no país num período de cinco anos.<br />
2. Os Planos Estratégicos Sectoriais são instrumentos de planificação de médio prazo, destinados<br />
a harmonizar as políticas globais do Governo com as políticas sectoriais. Estes planos estão em<br />
sintonia com o Programa Quinquenal e detalham as estratégias que nortearão a realização dos<br />
objectivos do Governo.<br />
3. O CFMP é um instrumento de planificação a médio prazo usado para alocar os recursos<br />
financeiros disponíveis de acordo com as prioridades estabelecidas no PARPA e nos Planos<br />
Estratégicos Sectoriais.<br />
4. O Plano Económico e Social é o instrumento de planificação anual onde são estabelecidos os<br />
principais objectivos económicos e sociais e as metas para o ano fiscal.<br />
5. O Orçamento do Estado é a expressão financeira do Plano Económico e Social.<br />
6. O Plano Estratégico Provincial é um instrumento de planificação de médio prazo que<br />
descreve as estratégias de desenvolvimento a nível provincial, tomando como ponto de<br />
partida os objectivos nacionais apresentados no Programa Quinquenal. O Plano Estratégico<br />
Provincial é traduzido num Plano Económico e Social e um Orçamento Provincial, os quais<br />
são apresentados ao Ministério de Planificação e Desenvolvimento para aprovação final. O<br />
orçamento provincial é então incorporado no Orçamento do Estado.<br />
7. O Plano Estratégico de Desenvolvimento Distrital é um instrumento de planificação de médio<br />
prazo que descreve as estratégias de desenvolvimento a nível distrital. Estes planos são<br />
desenvolvidos pelos governos distritais com apoio técnico das províncias e participação das<br />
comunidades locais. Os Planos Estratégicos de Desenvolvimento Distrital são implementados<br />
por meio de Planos Económicos e Sociais e Orçamentos Distritais anuais.<br />
8. O Plano Económico e Social e Orçamento Distrital é o instrumento de planificação anual que<br />
operacionaliza o Plano Estratégico de Desenvolvimento Distrital e inclui uma estimativa das<br />
receitas e despesas distritais previstas para o ano.<br />
planos sectoriais, provinciais e distritais,<br />
bem como as propostas de orçamento,<br />
devem ser apresentados até finais de Julho.<br />
Estes planos são consolidados no Plano<br />
Económico Social nacional e no Orçamento<br />
do Estado, para serem submetidos ao<br />
Conselho de Ministros até 15 de Setembro,<br />
após o que passam para a Assembleia<br />
da República, até 30 de Setembro, para<br />
aprovação final até 15 de Dezembro.<br />
O Orçamento do Estado 26 e o Plano<br />
Económico e Social traduzem o PARP em<br />
planos anuais. O Plano Económico e Social é<br />
a materialização anual do Plano Quinquenal<br />
do Governo e do PARPA.<br />
3.2. Monitorização e avaliação<br />
Não existe uma fonte única explícita de<br />
orientação normativa sobre processos de<br />
planificação, monitorização e avaliação<br />
em Moçambique. Pelo contrário, essa<br />
orientação pode ser encontrada na<br />
Figura 2.1: Instrumentos de Planificação em Moçambique<br />
PARPA<br />
Instrumentos de Médio prazo<br />
Instruções<br />
sobre como<br />
afectar<br />
fundos a<br />
propriedades<br />
CFMP<br />
Planos<br />
Estratégicos<br />
Sectoriais e<br />
Provinciais<br />
Harmonização<br />
entre Políticas,<br />
estratégias e<br />
Objectivos<br />
Plano Quinquenal do Governo<br />
Constituição, na lei respeitante ao SISTAFE<br />
(Sistema de Administração Financeira do<br />
Estado) e no estatuto que criou o Ministério<br />
de Planificação e Desenvolvimento. A<br />
Constituição de Moçambique estabelece o<br />
Plano Económico e Social como principal<br />
instrumento de planificação, em sintonia<br />
com o Programa Quinquenal do Governo,<br />
estabelecendo que este plano deve ser<br />
desenvolvido por via de um processo de<br />
planificação descentralizada. O Orçamento<br />
do Estado é a expressão financeira do Plano<br />
Económico e Social e é aprovado pela<br />
Assembleia da República. A Lei do SISTAFE<br />
(n º 9/2002, de 12 de Fevereiro) requer que<br />
seja apresentada à Assembleia da República<br />
duas vezes por ano informação sobre a<br />
execução do Plano Económico e Social.<br />
Existe um sistema de monitorização e<br />
avaliação para o Orçamento do Estado, com<br />
relatórios trimestrais e anuais. O Orçamento<br />
do Estado é monitorado internamente pelo<br />
Ministério das Finanças através do Relatório<br />
Harmonização<br />
de Metas<br />
Sectorias e<br />
Provinciais<br />
Afectação<br />
de Fundos a<br />
Propriedades<br />
Instrumentos anuais<br />
Plano Económco e Social<br />
Definição Anual<br />
das Prioridades<br />
respeitantes a<br />
Políticas, acções<br />
e Medidas<br />
Orçamento do estado<br />
Fonte: Governo de Moçambique, ‘Plano de Acção para a Redução da Pobreza Absoluta 2006-2009’, República de Moçambique,<br />
Maputo, 2006.<br />
36<br />
37
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 2: O CONTEXTO DE DESENVOLVIMENTO<br />
de Execução do Orçamento do Estado, e<br />
externamente através de uma auditoria da<br />
Conta Geral do Estado feita pelo Tribunal<br />
Administrativo.<br />
A necessidade de acompanhar a<br />
implementação e o impacto do PARPA I<br />
exigiu o desenvolvimento de um Quadro<br />
de Monitorização e Avaliação. Foi adoptada<br />
uma versão resumida deste quadro,<br />
conhecida como Quadro de Avaliação<br />
do Desempenho, como instrumento de<br />
monitorização e avaliação anual do Apoio<br />
Geral ao Orçamento (ver adiante). A<br />
Estratégia de Monitorização e Avaliação do<br />
PARPA II tinha por finalidade desenvolver<br />
um sistema nacional integrado de<br />
monitorização e avaliação, operando como<br />
uma componente rotineira do processo de<br />
planificação. Este documento estabeleceu<br />
uma matriz de indicadores estratégicos<br />
mais ampla que a do Quadro de Avaliação<br />
do Desempenho, e é reportado no Plano<br />
Económico e Social e respectivo relatório<br />
de revisão. O PARPA II também introduziu<br />
uma distinção entre indicadores de médio<br />
prazo baseados em resultados e indicadores<br />
avaliados anualmente baseados em<br />
produtos finais. O Quadro de Avaliação e<br />
Monitorização do Plano Quinquenal 2010-14,<br />
o PARP, está a ser presentemente elaborado.<br />
O PARPA também é avaliado através de<br />
revisões semestrais e anuais conjuntas<br />
de doadores e de uma avaliação final<br />
de impacto (Relatório de Avaliação de<br />
Impacto), que avalia o progresso em cada<br />
um dos pilares e nas áreas temáticas<br />
transversais ao longo de toda a vigência do<br />
PARPA. A Revisão Conjunta é o mecanismo<br />
pelo qual o Governo, os doadores e a<br />
sociedade civil avaliam a implementação<br />
do PARPA, com ênfase no Plano Económico<br />
e Social, no Orçamento do Estado e<br />
instrumentos de monitorização relacionados<br />
(Balanço do PES e Relatório de Execução do<br />
Orçamento do Estado). A revisão conjunta<br />
do desempenho do Governo e dos doadores<br />
realiza-se em Abril de cada ano e analisa<br />
o desempenho ao longo do ano anterior,<br />
enquanto a Revisão Semestral (ou reunião<br />
de planificação) acontece em Setembro<br />
e centra-se no estabelecimento de metas<br />
para o ano seguinte, determinando se existe<br />
a possibilidade de se atingirem as metas<br />
fundamentais do Quadro de Avaliação<br />
de Desempenho. A reunião de revisão<br />
conjunta também avalia as contribuições<br />
dos Parceiros de Apoio Programático na<br />
obtenção de resultados em conformidade<br />
com os princípios da Declaração de Paris de<br />
2005 sobre a Eficácia da Ajuda. Os dados de<br />
monitorização do PARPA são principalmente<br />
recolhidos através de contribuições<br />
sectoriais que quantificam a contribuição<br />
dos sectores. Os inquéritos, entre os quais o<br />
Inquérito Demográfico e de Saúde, o MICS,<br />
o Inquérito aos Agregados Familiares, o<br />
Questionário de Indicadores Básicos de<br />
Bem-Estar e o Inquérito Integrado à Força<br />
de Trabalho [IFTRAB] são utilizados para<br />
quantificar o produto final e os resultados.<br />
A irregularidade dos inquéritos e a falta de<br />
coordenação entre o ciclo de planificação<br />
de médio prazo e os inquéritos relevantes<br />
dificultaram uma monitoria eficaz do PARPA.<br />
Segundo um estudo solicitado<br />
pelo Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento em 2008, apesar do<br />
enorme progresso alcançado nos últimos<br />
anos em matéria de monitorização e<br />
avaliação em Moçambique, continuam<br />
a existir pontos fracos decorrentes da<br />
não consolidação de uma multiplicidade<br />
de processos e metodologias. 27 A nível<br />
central, existem três sistemas distintos de<br />
monitoria e avaliação do Plano Económico e<br />
Social, do PARPA e dos Planos Estratégicos<br />
Sectoriais. Estes sistemas nacionais são,<br />
por sua vez, apoiados por uma série de<br />
sistemas sectoriais e provinciais que não<br />
têm beneficiado de uma metodologia ou<br />
padronização consistente. Existem múltiplos<br />
pedidos de informação para monitorização<br />
e avaliação, tanto de fontes internas como<br />
externas, o que coloca uma significativa<br />
carga sobre os sistemas. Os instrumentos e<br />
processos de planificação distrital, entre os<br />
quais o Plano Económico e Social Distrital,<br />
os orçamentos distritais e a aprovação da<br />
Lei dos Órgãos Locais do Estado (LOLE),<br />
têm vindo a desenvolver-se a um ritmo<br />
regular, de acordo com estratégias de<br />
descentralização. No entanto, não houve<br />
o concomitante desenvolvimento de<br />
instrumentos e processos de monitoria e<br />
avaliação da execução destes planos. A<br />
utilização de processos participativos de<br />
monitorização e avaliação em Moçambique<br />
é relativamente nova e, de algum modo,<br />
subdesenvolvida.<br />
Grande parte das actividades de monitoria<br />
e avaliação realizadas em Moçambique<br />
parecem ser uma resposta a pedidos<br />
de informação de parceiros externos ou<br />
centros administrativos superiores, ao<br />
invés de fornecimento de subsídios para a<br />
formulação de políticas. Fazer o desembolso<br />
do Apoio Geral ao Orçamento depender do<br />
desempenho em função de indicadores do<br />
Quadro de Avaliação do Desempenho pode<br />
ter incentivado os sectores a definir metas<br />
conservadoras facilmente exequíveis e a dar<br />
prioridade a acções que satisfaçam o âmbito<br />
restrito desses indicadores, a fim de manter<br />
o financiamento externo.<br />
3.3. Quadro legal para apoiar a<br />
realização dos direitos da<br />
criança<br />
A Constituição de Moçambique foi aprovada<br />
e promulgada em Novembro de 1990, e<br />
revista em 2004. A Constituição funciona<br />
como lei fundamental para todas as<br />
organizações políticas e sociais no país.<br />
Nos termos do seu Artigo 62º, Moçambique<br />
aceita, observa e aplica os princípios da<br />
Carta das Nações Unidas e da Carta da<br />
Organização da Unidade Africana. 28<br />
Moçambique ratificou, sem reservas, a<br />
Convenção das Nações Unidas sobre<br />
os Direitos da Criança, que, depois de<br />
publicada no Boletim da República, em 23<br />
de Outubro de 1990, foi incorporada na<br />
estrutura legal interna do país. 29 Antes da<br />
sua ratificação, a Convenção foi analisada<br />
por instituições nacionais, entre as quais<br />
o Tribunal Supremo, a Procuradoria-Geral<br />
da República, os Ministérios da Justiça,<br />
Educação e Saúde e outros sectores<br />
relevantes, tendo-se concluído não existirem<br />
nenhuma incompatibilidade importante entre<br />
a Convenção e a ordem jurídica interna. Ao<br />
mesmo tempo, foi reconhecida a necessidade<br />
de se melhorarem os regulamentos internos<br />
relacionados com a criança.<br />
O Governo também aderiu aos dois<br />
Protocolos Adicionais à Convenção sobre<br />
os Direitos da Criança, relativos à venda de<br />
crianças, prostituição infantil e pornografia<br />
infantil, e sobre o envolvimento de crianças<br />
em conflitos armados, em 2003 e 2004,<br />
respectivamente. Além da Convenção<br />
sobre os Direitos da Criança, Moçambique<br />
ratificou igualmente a Carta Africana<br />
sobre os Direitos e Bem-Estar da Criança,<br />
bem como outros instrumentos jurídicos<br />
internacionais relativos ao desenvolvimento<br />
e bem-estar das crianças. Imediatamente<br />
após a independência nacional, e antes da<br />
Convenção sobre os Direitos da Criança,<br />
Moçambique tinha adoptado a sua própria<br />
Declaração sobre os Direitos da Criança<br />
Moçambicana, contendo um conjunto de<br />
12 direitos básicos. 30 A legislação nacional<br />
relativa aos direitos das crianças é discutida<br />
no Capítulo 5.<br />
38<br />
39
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 2: O CONTEXTO DE DESENVOLVIMENTO<br />
4. Ajuda externa ao desenvolvimento<br />
Moçambique é o maior destinatário da<br />
assistência internacional ao desenvolvimento<br />
em África, sendo o Reino Unido a maior<br />
fonte de ajuda bilateral ao país. 31 O aumento<br />
do volume de Assistência Externa ao<br />
Desenvolvimento a que se comprometeram os<br />
países desenvolvidos é, de uma maneira geral,<br />
considerado positivo, e as Nações Unidas<br />
defendem uma dotação de 0,7 por cento do<br />
PIB dos países desenvolvidos. No entanto, a<br />
concentração de grandes volumes de ajuda<br />
externa em alguns países levanta a questão da<br />
dependência na ajuda. O Comité dos Direitos<br />
da Criança, nas suas observações finais no<br />
Segundo Relatório Periódico de Moçambique, 32<br />
nota com preocupação que, apesar do<br />
notável crescimento económico mantido<br />
na última década, o Estado Parte continua a<br />
ser fortemente dependente da cooperação<br />
internacional, referindo que uma parte<br />
significativa do orçamento nacional provém<br />
da cooperação para o desenvolvimento. O<br />
Centro Internacional da Pobreza argumenta<br />
que um grande e contínuo fluxo da Assistência<br />
Externa ao Desenvolvimento num país pode<br />
fazer afastar o enfoque da responsabilidade do<br />
estado e da sociedade para o relacionamento<br />
entre o Governo e os doadores, enfraquecendo<br />
assim o papel das instituições nacionais na<br />
governação. 33 Outros comentários assumiram<br />
uma visão mais extrema, afirmando que,<br />
devido ao processo do apoio orçamental, os<br />
representantes dos doadores estão agora no<br />
centro do processo de tomada de decisão no<br />
governo. 34<br />
4.1. Coordenação da<br />
assistência internacional ao<br />
desenvolvimento<br />
Nos últimos anos, e no contexto da forte<br />
dependência externa, passou-se para uma<br />
maior harmonização e alinhamento da<br />
ajuda externa, sobretudo após o PARPA<br />
II e a Declaração de Paris de 2005 sobre<br />
Eficácia da Ajuda. 35 A ênfase está agora em<br />
Fundos Comuns sectoriais e mecanismos<br />
de Apoio Geral ao Orçamento, que dão<br />
maior flexibilidade ao Governo no que<br />
respeita à forma como este aloca os fundos<br />
recebidos. O Apoio Geral ao Orçamento<br />
deve também reduzir o fardo do Governo<br />
de monitoria, avaliação e apresentação de<br />
relatórios a várias fontes de financiamento<br />
externas. O PARPA II apoia a utilização de<br />
modalidades de financiamento mais flexíveis,<br />
em particular o Apoio Geral ao Orçamento,<br />
e afirma que, “embora o equilíbrio ideal<br />
entre as modalidades de ajuda possa conter,<br />
provavelmente, uma mistura de todas elas,<br />
o Governo pretende que haja um aumento<br />
da proporção de fundos canalizados através<br />
da Conta Pública do Tesouro, principalmente<br />
através do Apoio Geral ao Orçamento.” 36<br />
A mudança com vista à harmonização,<br />
alinhamento e uso de modalidades de ajuda<br />
cada vez mais flexíveis, em Moçambique tem<br />
sido conduzida pelo grupo de Parceiros de<br />
Apoio Programático. O Grupo de Parceiros<br />
de Apoio Programático (PAPs), também<br />
conhecido como Grupo dos 19 ou G19, é<br />
constituído por 19 doadores bilaterais e<br />
multilaterais v que proporcionam Apoio Geral<br />
ao Orçamento. O Governo de Moçambique e<br />
os PAPs assinaram primeiro um Memorando<br />
de Entendimento em 2004, onde foram<br />
definidos os princípios da parceria e os<br />
compromissos para melhorar a qualidade do<br />
Programa de Ajuda Humanitária. Um segundo<br />
Memorando de Entendimento foi assinado<br />
em Março de 2009. O objectivo geral do<br />
apoio dos PAP ao orçamento de Moçambique<br />
é contribuir para a redução da pobreza em<br />
todas as suas dimensões. Além disso, o<br />
Memorando de Entendimento estabelece que<br />
“o Apoio ao Orçamento dos PAPs deve ajudar<br />
v Os 19 parceiros são: Banco Africano de Desenvolvimento, Bélgica, Canadá, Dinamarca, Comissão Europeia, Finlândia,<br />
França, Alemanha, Países Baixos, Irlanda, Itália, Noruega, Portugal, Espanha, Suécia, Suíça, Reino Unido, Banco Mundial<br />
e Áustria. Os Estados Unidos da América e as Nações Unidas aderiram como Membros Associados em 2009.<br />
a alcançar os objectivos comuns de redução<br />
da pobreza e os ODM em Moçambique,<br />
através de financiamento ao orçamento do<br />
sector público para redução da pobreza, em<br />
sintonia com os sistemas de Moçambique<br />
e associado, de forma clara e transparente,<br />
ao desempenho.” 37 O Apoio Directo ao<br />
Orçamento proporciona também uma<br />
importante via para um diálogo coordenado e<br />
harmonizado entre o Governo e os doadores<br />
sobre as políticas de desenvolvimento e<br />
opções da despesa pública.<br />
Os compromissos dos PAPs de Apoio Geral ao<br />
Orçamento totalizaram, em 2009, 485 milhões<br />
de dólares americanos, e, em 2010, 472<br />
milhões. 38 De acordo com o CFMP 2010-2012,<br />
o financiamento externo representa cerca de<br />
44 por cento do Orçamento do Estado total,<br />
aumentando para 47 por cento em 2010 e 48<br />
por cento em 2011 e 2012 (ver Tabela 2.3).<br />
4.2. Análise das implicações para<br />
as crianças<br />
É essencial conhecer todo o pacote de<br />
recursos disponíveis para garantir uma<br />
alocação de recursos públicos para crianças<br />
orientada pelas políticas. Financiamento fora<br />
do orçamento, ou financiamento que esteja<br />
total ou parcialmente fora do processo<br />
orçamental formal prejudica os esforços<br />
do Governo para definir prioridades,<br />
planear, orçamentar, monitorar e avaliar de<br />
forma eficaz. Os fundos extra-orçamentais<br />
prejudicam também a credibilidade do<br />
processo orçamental, levam a uma onerosa<br />
e desnecessária duplicação da apresentação<br />
de relatórios, acabando por enfraquecer a<br />
responsabilidade do executivo perante o<br />
Parlamento. O problema do financiamento<br />
fora do orçamento é mais grave nos sectores<br />
de serviços sociais e infra-estruturas, uma<br />
vez que são os maiores beneficiários da<br />
ajuda externa.<br />
O Comité dos Direitos da Criança, nas suas<br />
observações finais sobre Moçambique,<br />
recomenda ao Estado Parte que, ao negociar<br />
a cooperação para o desenvolvimento, e<br />
particularmente quaisquer incrementos,<br />
o financiamento seja direccionado para<br />
programas que possam proporcionar<br />
o maior e mais rápido impacto na<br />
implementação dos direitos da criança. 39 Em<br />
particular, deve ser dada prioridade a:<br />
• l Programas de grande escala que<br />
proporcionem claros benefícios para as<br />
crianças, como a distribuição alargada<br />
Tabela 2.3: Financiamento interno e externo no Orçamento do Estado, 2009-2012 (pressupondo um<br />
crescimento do PIB de 6,1 por cento)<br />
2009 (adjusted) 2010 2011 2012<br />
Recursos internos<br />
Receitas do Estado 43,100 49,981 56,826 64,230<br />
Privatização 1,044<br />
Crédito interno 5,721 2,449 -1,595 -2,923<br />
Total Interno 49,865 52,430 55,231 61,307<br />
Recursos externos<br />
Doações 31,991 34,770 37,488 40,368<br />
Créditos 7,148 11,673 14,171 17,304<br />
Total Externo 39,139 46,443 51,659 57,672<br />
Total Interno + Externo 89,004 98,873 106,890 118,979<br />
Recursos internos como % do total 0.56 0.53 0.52 0.52<br />
Recursos externos como % do total 0.44 0.47 0.48 0.48<br />
Fonte: Ministério de Planificação e Desenvolvimento e Ministério das Finanças, Cenário Fiscal de Médio Prazo 2010-2012, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, Setembro de 2009.<br />
40<br />
41
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 2: O CONTEXTO DE DESENVOLVIMENTO<br />
de redes mosquiteiras, de longa duração,<br />
tratadas com insecticida;<br />
• l Programas de saúde de larga escala<br />
junto das comunidades, incluindo o<br />
uso estruturado de Semanas de Saúde<br />
da Criança nacionais, para aumentar a<br />
cobertura da vacinação, suplementação<br />
com micronutrientes e cuidados<br />
preventivos ao nível da comunidade;<br />
• l Continuada e acelerada expansão da<br />
qualidade de e acesso a tratamento<br />
pediátrico, aconselhamento e testagem<br />
voluntária como parte de programas prénatais,<br />
e medicamentos para a prevenção<br />
da transmissão vertical do HIV;<br />
• l Uso de financiamento direccionado para<br />
programas relacionados com a SIDA<br />
como ponto de entrada para a afectação<br />
de recursos ao sector de saúde em<br />
geral, fortalecimento da expansão de<br />
estabelecimentos de saúde e melhoria da<br />
qualidade de assistência;<br />
• l Regimes de protecção social de grande<br />
escala e programas de transferência de<br />
dinheiro;<br />
• l Programas rurais e peri-urbanos<br />
alargados de água e saneamento,<br />
baseados em iniciativas relacionadas<br />
com água e saneamento rural, como, por<br />
exemplo, a ‘Iniciativa Um Milhão’; e<br />
• l Campanhas para expandir a construção<br />
de escolas em todos os distritos,<br />
utilizando tanto trabalho comunitário ou<br />
local como empreiteiros contratados.<br />
São amplamente reconhecidos pelos<br />
governos dos países desenvolvidos e em<br />
desenvolvimento os benefícios a longo<br />
prazo da reforma de como é prestada a<br />
assistência externa ao desenvolvimento,<br />
conforme evidenciado pela Declaração de<br />
Paris de 2005 sobre a Eficácia da Ajuda e<br />
pela Agenda de Acção de Accra, de 2008.<br />
No entanto, a plena implementação dos<br />
dois processos, tanto um afastamento dos<br />
mecanismos bilaterais existentes, que têm<br />
substanciais componentes de financiamento<br />
‘extra-orçamental’ e baseadas em projectos,<br />
como o desenvolvimento da capacidade dos<br />
governos nacionais, pode levar vários anos.<br />
O desenvolvimento de capacidades é uma<br />
área-chave que tem sido negligenciada nas<br />
reformas de harmonização e alinhamento.<br />
5. Conclusões<br />
Apesar de uma transição bem sucedida<br />
para a paz, de anos de crescimento<br />
económico estável e um conjunto de<br />
processos institucionais com enfoque no<br />
desenvolvimento, Moçambique continua a<br />
ser um dos países mais pobres do mundo,<br />
ocupando o 165º lugar de entre 169 no Índice<br />
de Desenvolvimento Humano 2010. Desde<br />
a assinatura do Acordo de Paz em 1992,<br />
Moçambique registou progressos numa série<br />
de indicadores relacionados com o bem-estar<br />
da criança em Moçambique. No entanto, são<br />
necessários novos investimentos para que o<br />
país alcance muitos dos ODM’s. Moçambique<br />
é actualmente considerado susceptível de<br />
atingir apenas quatro das 21 metas, com<br />
potencial para alcançar mais nove.<br />
O ambiente fiscal é caracterizado por<br />
uma forte dependência em ajuda externa.<br />
De acordo com o CFMP 2010-2012, o<br />
financiamento externo representa cerca<br />
de 44 por cento do total do Orçamento do<br />
Estado, aumentando para 47 por cento em<br />
2010 e 48 por cento em 2011 e 2012. Dentro<br />
do contexto da forte dependência em ajuda<br />
externa, houve, nos últimos anos, uma<br />
mudança para uma maior harmonização<br />
e alinhamento da assistência humanitária,<br />
sobretudo após o PARPA II e a Declaração<br />
de Paris de 2005 sobre a Eficácia da Ajuda.<br />
Uma dependência exagerada em ajuda pode<br />
afastar a responsabilização do Estado e da<br />
sociedade para se centrar nos doadores,<br />
enfraquecendo assim o papel de instituições<br />
nacionais, como o Parlamento.<br />
O Plano Quinquenal do Governo e o seu<br />
plano operacional, o PARP, estão centrados<br />
nas prioridades de desenvolvimento<br />
nacional para o desenvolvimento humano<br />
e social, juntamente com outras áreas do<br />
desenvolvimento económico e político. Para<br />
se obter mais progressos na consecução<br />
das metas estabelecidas na planificação<br />
do Governo e nos instrumentos de<br />
orçamentação, são necessários mais<br />
esforços para a consolidação dos quadros<br />
nacionais de planificação, monitorização e<br />
avaliação.<br />
42<br />
43
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 2: O CONTEXTO DE DESENVOLVIMENTO<br />
Referências<br />
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by States Parties<br />
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<strong>Mozambique</strong>, CRC/C/41/Add.11, Nações<br />
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Frelimo win landslide victory,’ descarregado<br />
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acedido a 9 de<br />
Novembro de 2009.<br />
3 Hanlon, Joseph, ‘<strong>Mozambique</strong>: ‘the war ended<br />
17 years ago, but we are still poor,’’ Conflict,<br />
Security & Development, 10: 1, 2010, pp. 77<br />
-102.<br />
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Washington, D.C., 1997.<br />
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6 National Institute of Statistics, ‘Statistics of<br />
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Maputo, descarregado de http://www.ine.gov.<br />
mz, acedido a 30 de Outubro de 2010.<br />
7 Ibid.<br />
8 Ibid.<br />
9 National Institute of Statistics, ‘Inquérito<br />
Integrado à Força de Trabalho (IFTRAB)<br />
2004/05’, Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2006.<br />
10 National Institute of Statistics, ‘Statistics of<br />
<strong>Mozambique</strong>’, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, descarregado de http://www.ine.gov.<br />
mz, acedido a 30 de Outubro de 2010.<br />
11 National Institute of Statistics, <strong>Mozambique</strong><br />
Third Population and Housing Census,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2007.<br />
12 Government of <strong>Mozambique</strong>. Report on the<br />
Millennium Development Goals, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2010.<br />
13 Ibid<br />
14 African Development Bank Group and the<br />
Development Centre of the Organisation for<br />
Economic Co-operation and Development,<br />
African Economic Outlook 2009, descarregado<br />
de http://africaneconomicoutlook.org, 2009.<br />
15 Standard & Poor’s, Ratings Direct,<br />
<strong>Mozambique</strong>, 4 de Fevereiro de<br />
2009, descarregado de: http://www.<br />
standardandpoors.com/ratingsdirect, 2009.<br />
16 The International Bank for Reconstruction<br />
and Development, Doing Business 2011,<br />
<strong>Mozambique</strong>: Making a difference for<br />
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Finance Corporation, 2010<br />
17 African Development Bank Group<br />
and the Development Centre of the<br />
Organisation for Economic Co-operation<br />
and Development, African Economic<br />
Outlook 2009 , descarregado de http://<br />
africaneconomicoutlook.org, 2009.<br />
18 United Nations Children’s Fund, Cenário<br />
Fiscal de Médio Prazo 2010 – 2012. Como<br />
o CFMP responde aos desafios de redução<br />
da pobreza na infância em Moçambique?<br />
Maputo, 2010.<br />
19 USAID,PARPA II review. The tax system in<br />
<strong>Mozambique</strong> , Maputo, Setembro de 2009.<br />
20 Government of <strong>Mozambique</strong>, Report on the<br />
Millennium Development Goals, Maputo,<br />
2010.<br />
21 Kulipossa, Fidelx Pius, e Eduardo Jossias<br />
Nguenha, Relatório Final da Pesquisa<br />
sobre o Impacto da Descentralização dos<br />
Fundos Sectoriais de Estradas, Águas e de<br />
Construção Acelerada de Salas de Aulas nas<br />
Províncias, nos Distritos e nas Autarquias<br />
Locais, Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2009.<br />
22 Governo de Moçambique, Plano de Acção<br />
para a Redução da Pobreza Absoluta (2001–<br />
2005), Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2001.<br />
23 Governo de Moçambique, Plano de Acção para<br />
a Redução da Pobreza Absoluta (2006–2009),<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2006.<br />
44<br />
45
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 2: O CONTEXTO DE DESENVOLVIMENTO<br />
24 Ministry of Planning and Development,<br />
Relatório de Avaliação de Impacto do PARPA<br />
II, Governo de Moçambique, Maputo, 30 de<br />
Outubro de 2009.<br />
25 Ministry of Planning and Development and<br />
Ministry of Finance, Cenário Fiscal de Médio<br />
Prazo 2010–2012, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, Setembro de 2009.<br />
26 Governo de Moçambique, Orçamento do<br />
Estado, Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2009.<br />
27 Ministério de Planificação e Desenvolvimento<br />
e USEC Inc., Estudo sobre o Ciclo de<br />
Planeamento, Monitoria e Avaliação, Governo<br />
de Moçambique, Maputo, 2008.<br />
28 Governo de Moçambique, Constituição da<br />
República, Governo de Moçambique, Maputo,<br />
19 de Novembro de 2004.<br />
29 United Nations Committee on the Rights of<br />
the Child, Consideration of Reports Submitted<br />
by States Parties Under Article 44 of the<br />
Convention: Initial report of States Parties<br />
due in 1996 – <strong>Mozambique</strong>, CRC/C/41/Add.11,<br />
Office of the High Commissioner on Human<br />
Rights, Genebra, 2001.<br />
30 Ibid.<br />
31 Economist Intelligence Unit, Country Report<br />
<strong>Mozambique</strong>, Economist Intelligence Unit,<br />
Londres, Maio de 2009.<br />
32 United Nations Committee on the Rights of<br />
the Child, Consideration of Reports Submitted<br />
by States Parties Under Article 44 of the<br />
Convention: Concluding observations of<br />
the Committee on the Rights of the Child<br />
– <strong>Mozambique</strong>, CRC/C/MOZ/CO/2, Office of<br />
the High Commissioner on Human Rights,<br />
Genebra, Outubro de 2009.<br />
33 Virtanen, Pekka, and Dag Ehrenpreis, ‘Growth,<br />
Poverty and Inequality in <strong>Mozambique</strong>’,<br />
Country Study No. 10, International Poverty<br />
Centre, New York, September 2007.<br />
34 Hanlon, Joseph, ‘<strong>Mozambique</strong>: ‘the war<br />
ended 17 years ago, but we are still poor’’,<br />
Conflict,<br />
Security & Development, 10: 1, 2010, pp. 77-<br />
102.<br />
35 ‘High Level Forum on Aid Effectiveness,<br />
‘Paris Declaration on Aid Effectiveness,’<br />
Organisation for Economic Cooperation and<br />
Development, Paris, 2005.<br />
36 Governo de Moçambique, Plano de Acção<br />
para a Redução da Pobreza Absoluta (2006–<br />
2009), Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2006.<br />
37 ‘Memorandum of Understanding between the<br />
Government of the Republic of <strong>Mozambique</strong><br />
and the Programme Aid Partners on the<br />
Provision of General Budget Support’,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, Março de<br />
2009.<br />
38 Programme and Partnership <strong>Mozambique</strong>,<br />
‘Financial Contributions’, descarregado<br />
de: http://www.pap.org.mz/financial_<br />
contributions.html, 2010.<br />
39 United Nations Committee on the Rights of<br />
the Child, Consideration of Reports Submitted<br />
by States Parties Under Article 44 of the<br />
Convention: Concluding observations of<br />
the Committee on the Rights of the Child<br />
– <strong>Mozambique</strong>, CRC/C/MOZ/CO/2, Office of<br />
the High Commissioner on Human Rights,<br />
Genebra, Outubro de 2009.<br />
46<br />
47
3CAPÍTULO<br />
SOBREVIVÊNCIA E<br />
DESENVOLVIMENTO<br />
INFANTIL<br />
1. Introdução<br />
3CAPÍTULO<br />
SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
Os direitos de cada criança à vida,<br />
sobrevivência e desenvolvimento estão<br />
consagrados na Convenção das Nações<br />
Unidas sobre os Direitos da Criança. Apesar<br />
dos compromissos de nações de todo<br />
o mundo, quase 10 milhões de crianças<br />
continuam a morrer todos os anos, ocorrendo<br />
a maioria dessas mortes em 60 países em<br />
desenvolvimento.1 Cerca de 40 por cento das<br />
mortes de crianças ocorrem no primeiro mês<br />
de vida, geralmente em casa e frequentemente<br />
por falta de acesso a serviços e produtos<br />
básicos de saúde. 2 Muitas crianças morrem<br />
devido a doenças e condições facilmente<br />
preveníveis ou tratáveis, como, por exemplo,<br />
infecções diarreicas, sarampo, malária<br />
e pneumonia, entre outras. Em cerca de<br />
metade das mortes de crianças menores de<br />
cinco anos, a desnutrição é uma das causas<br />
subjacentes, 3 mas o uso de água imprópria,<br />
saneamento precário e higiene inadequada<br />
também contribuem para a mortalidade<br />
e morbilidade infantil. Água, saneamento<br />
e higiene estão intimamente ligados a<br />
desnutrição infantil. 4 Pesquisas que remontam<br />
a 1968 confirmaram o efeito nocivo da diarreia<br />
sobre o estado nutricional das crianças. Oitenta<br />
e oito por cento dos casos de diarreia no<br />
mundo são atribuíveis a água, saneamento<br />
e higiene, 5 enquanto as infestações por<br />
lombrigas (ascaris), trichuria (trichuris) e<br />
filária são atribuíveis a deficientes condições<br />
de saneamento e higiene. 6 Evidências mais<br />
recentes proporcionaram directrizes para a<br />
prevenção e tratamento destas doenças (por<br />
exemplo, a promoção do aleitamento materno<br />
e a suplementação com micronutrientes). 7<br />
A sobrevivência infantil é uma importante<br />
prioridade de desenvolvimento, tanto a<br />
nível internacional como de cada país. O<br />
Objectivo de Desenvolvimento do Milénio 4<br />
tem como meta reduzir em dois terços a taxa<br />
de mortalidade de menores de cinco anos<br />
entre 1990 e 2015. Além da oportunidade<br />
que representa para o cumprimento das<br />
metas internacionais de desenvolvimento,<br />
melhorar a sobrevivência e a saúde das<br />
crianças é um investimento fundamental para<br />
o futuro desenvolvimento e prosperidade<br />
das nações. As crianças bem nutridas,<br />
bem cuidadas e saudáveis têm maior<br />
probabilidade de sobreviver e de se tornarem<br />
adultos saudáveis e produtivos, capazes de<br />
dar uma contribuição significativa para o<br />
desenvolvimento económico e social das<br />
suas famílias, comunidades e nações. O<br />
investimento na sobrevivência e boa saúde<br />
das crianças apresenta também uma boa<br />
relação custo-eficácia. As intervenções<br />
com maior impacto sobre a prevenção da<br />
mortalidade infantil são práticas adequadas<br />
de alimentação infantil e uso de materiais<br />
tratados com insecticida (com potencial<br />
para prevenir 19 e 7 por cento das mortes,<br />
respectivamente), enquanto as intervenções<br />
terapêuticas mais eficazes são o uso da<br />
terapia de reidratação oral (que, se aplicada<br />
universalmente, reduz em 15 por cento a<br />
mortalidade infantil) e o uso de antibióticos<br />
49
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
para septicemia e pneumonia (cada uma<br />
prevenindo 6 por cento das mortes). 8<br />
Em 2010 morrerão aproximadamente<br />
207.000 crianças menores de cinco anos<br />
de malária, 42.000 de infecções do trato<br />
respiratório inferior e 64.000 de doenças<br />
diarreicas. 9 Há soluções com eficiência<br />
de custos que poderiam trazer rápidas<br />
melhorias, mas é necessário agir-se com<br />
urgência e empenho para as implementar e<br />
cumprir os Objectivos de Desenvolvimento<br />
do Milénio (ODM) relacionados com a<br />
saúde materna e infantil. 10 A mortalidade<br />
materna i sempre mereceu, de um modo<br />
geral, menos atenção dos governos<br />
nacionais e da comunidade internacional do<br />
que a mortalidade infantil, daí resultando<br />
que os sucessos sejam mais evasivos.<br />
No entanto, um conjunto cada vez maior<br />
de evidências de pesquisas sugere<br />
estarem já disponíveis os instrumentos<br />
necessários para criar impacto nesta área<br />
anteriormente negligenciada. Estima-se<br />
que 80 por cento das mortes maternas<br />
poderiam ser evitadas se as mulheres<br />
tivessem acesso a serviços essenciais de<br />
maternidade e cuidados básicos de saúde. 11<br />
É crescente o consenso de que a saúde<br />
e a sobrevivência da mãe e do recémnascido<br />
podem ser melhoradas através<br />
da criação de um ‘continuum de cuidados’<br />
para mães, recém-nascidos e crianças que<br />
integre programas e intervenções de saúde<br />
reprodutiva, maternidade segura, cuidados<br />
aos recém-nascidos, e sobrevivência,<br />
crescimento e desenvolvimento da criança,<br />
todos proporcionados num ambiente legal,<br />
institucional e comunitário e familiar que<br />
defenda e respeite os direitos das mulheres.<br />
As novas tendências da mortalidade de<br />
crianças menores de cinco anos, tal como<br />
outros indicadores sobre o bem-estar<br />
das crianças em Moçambique, mostram<br />
disparidades geográficas persistentes. A<br />
parte norte do país e as zonas rurais ainda se<br />
encontram muito aquém do sul e das áreas<br />
urbanas (apesar das melhorias significativas,<br />
tanto nas áreas urbanas como rurais).<br />
Embora se tenham registado melhorias<br />
em todos os segmentos da população, foi<br />
pequena a redução das diferenças entre<br />
os mais pobres e os que se encontram em<br />
melhor situação.<br />
Este capítulo está dividido em duas secções:<br />
saúde e nutrição e água e saneamento.<br />
2. Saúde e nutrição<br />
2.1. Sobrevivência infantil<br />
O principal indicador usado para medir o<br />
nível de bem-estar das crianças num país<br />
é a taxa de mortalidade de menores de<br />
cinco anos. A taxa de mortalidade neste<br />
grupo etário resulta de muitos factores: o<br />
estado nutricional e o conhecimento das<br />
mães em matéria de saúde; as práticas de<br />
cuidados infantis; a disponibilidade, o uso e<br />
a qualidade dos serviços de saúde maternoinfantis;<br />
o rendimento e a disponibilidade<br />
de alimentos na família; a disponibilidade<br />
de água potável e saneamento seguro; e a<br />
segurança geral do ambiente da criança. A<br />
taxa de mortalidade de menores de cinco<br />
anos pode ser considerada um indicador<br />
representativo do estado de saúde das<br />
crianças moçambicanas e da sociedade<br />
como um todo.<br />
Os resultados do Inquérito de Indicadores<br />
Múltiplos de 2008 revelam uma redução<br />
da taxa de mortalidade de menores<br />
de cinco anos de 153 mortes por cada<br />
1.000 nados vivos em 2003 para 141 em<br />
2008 (ver Figura 3.1). Isto representa um<br />
progresso significativo na melhoria da<br />
saúde e sobrevivência da criança e da mãe<br />
em Moçambique, embora esta taxa de<br />
redução tenha abrandado nos últimos anos<br />
e deva ser acelerada para que o país possa<br />
alcançar o ODM 4. 12 Apesar deste progresso,<br />
Moçambique possui o 22º mais elevado<br />
índice de mortalidade de menores de cinco<br />
anos do mundo. 13 Além disso, a melhoria nas<br />
taxas de sobrevivência infantil encontra-se<br />
distribuída de forma desigual pelo país fora,<br />
havendo crianças e mulheres em algumas<br />
províncias a beneficiarem menos do que as<br />
de outras províncias. A pandemia da SIDA<br />
está a fazer cada vez mais baixas em vidas<br />
de crianças, podendo afectar negativamente<br />
a encorajadora tendência recente.<br />
Além da taxa de mortalidade de menores<br />
de cinco anos, é também fundamental<br />
a medição das taxas de mortalidade<br />
neonatal (crianças com menos de um<br />
mês) e infantil (crianças com menos de<br />
um ano), pois estas taxas reconhecem<br />
a particular vulnerabilidade dos recémnascidos<br />
e das crianças no seu primeiro<br />
ano de vida. A mortalidade neonatal indica,<br />
especificamente, as circunstâncias de todo o<br />
período de gravidez e parto da criança, tais<br />
Figura 3.1: Taxas de mortalidade em Moçambique por 1.000 nados vivos, de 2003 e 2008 (média dos cinco anos<br />
precedentes ao inquérito)<br />
250<br />
200<br />
150<br />
100<br />
201<br />
153<br />
135 141<br />
101 95<br />
50<br />
0<br />
1997 2003 2008<br />
i<br />
A OMS define mortalidade materna como sendo a morte de uma mulher durante a gravidez ou até 42 dias após o termo<br />
desta, independentemente do local ou duração da gravidez, por qualquer causa relacionada com ou agravada pela<br />
gravidez ou sua gestão.<br />
Fonte: IDS 1997 e 2003, MICS 2008.<br />
Menores de 5 anos<br />
Menores de 1 ano<br />
50<br />
51
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
como a saúde da mãe, as circunstâncias em<br />
que a criança nasceu e os cuidados que o<br />
recém-nascido recebeu nos primeiros dias<br />
de vida.<br />
As crianças fazem face a uma barreira<br />
de doenças, todas elas agravadas pela<br />
desnutrição. A maior parte das mortes de<br />
crianças menores de cinco anos deve-se a<br />
um pequeno número de doenças comuns,<br />
evitáveis e tratáveis, como a malária,<br />
problemas neonatais, infecções agudas do<br />
trato respiratório inferior, infecção por HIV,<br />
doenças intestinais infecciosas, meningite<br />
e desnutrição, que ocorrem isoladamente<br />
ou combinadas. O risco de uma criança<br />
morrer é muito alto no primeiro mês de vida<br />
(período neonatal); quase um quarto de todas<br />
as mortes nesta faixa etária ocorrem nesse<br />
período (38 por 1.000 nados vivos em 2008). 14<br />
A redução observada na mortalidade em<br />
Moçambique foi mais acentuada nas áreas<br />
rurais, onde a taxa média de mortalidade de<br />
237 mortes por mil nados vivos, registada<br />
de 1987 a 1997, baixou para 164 óbitos no<br />
período 1998-2008, o que equivale a uma<br />
redução de 32 por cento. Nas áreas urbanas,<br />
180<br />
160<br />
a taxa de mortalidade de menores de cinco<br />
anos diminuiu de 150 em 1987-1997 para<br />
138 no período 1998-2008, uma redução de<br />
cerca de 10 por cento. A acentuada melhoria<br />
nas zonas rurais pode estar associada a um<br />
maior acesso a estabelecimentos e serviços<br />
de saúde. As disparidades geográficas<br />
continuam agudas, estimando-se que uma<br />
criança na província de Cabo Delgado tem<br />
quase três vezes mais probabilidades de<br />
morrer antes de atingir os cinco anos de<br />
idade do que uma criança na Cidade de<br />
Maputo. Tendência semelhante pode ser<br />
observada na mortalidade infantil (ver<br />
figura 3.2), que também decaiu muito mais<br />
rapidamente nas áreas rurais.<br />
A acentuada melhoria nas taxas de<br />
mortalidade infantil verificada nas zonas<br />
rurais pode estar associada, pelo menos em<br />
parte, a um maior acesso a serviços de saúde<br />
nestas áreas. Foi grande o melhoramento<br />
registado nas zonas rurais em termos de<br />
distância para a unidade sanitária de cuidados<br />
primários mais próxima. Em 2008/09, nas<br />
zonas rurais do norte, por exemplo, 69,7 por<br />
cento das famílias já conseguia aceder a uma<br />
unidade sanitária a cerca de 45 minutos a pé,<br />
Figura 3.2: Taxas de mortalidade infantil por 1.000 nados vivos em Moçambique, de 2003 e 2008 (média dos cinco<br />
anos que antecederam a pesquisa).<br />
160<br />
em comparação com apenas 31,5 por cento<br />
em 2002/03. As zonas rurais no centro e no<br />
sul também registaram melhorias, mas não<br />
tão rapidamente.<br />
Nas áreas urbanas, o acesso a unidades<br />
sanitárias de cuidados primários parece<br />
ter piorado, uma vez que um número<br />
ligeiramente menor de agregados familiares<br />
referiu ser capaz de chegar a uma unidade<br />
hospitalar em 45 minutos a pé. Esta situação<br />
pode estar relacionada com uma série<br />
de factores, como a urbanização devido<br />
ao maior crescimento populacional na<br />
periferia das cidades, onde o acesso a<br />
estabelecimentos públicos é menor – e uma<br />
maior dependência de hospitais e outros<br />
estabelecimentos de saúde em áreas<br />
urbanas, o que reduz a procura de unidades<br />
de cuidados básicos. 15<br />
Há uma diferença significativa na<br />
mortalidade de crianças menores de cinco<br />
anos entre as províncias do centro e do<br />
norte e as do sul. As províncias da Zambézia<br />
e Cabo Delgado registaram as taxas mais<br />
elevadas (206 e 181 óbitos por 1.000<br />
nados vivos, respectivamente), enquanto<br />
a província de Tete apresenta a terceira<br />
mais elevada taxa de mortalidade nesta<br />
faixa etária, 174 por 1.000 nados vivos, e<br />
a província e a Cidade de Maputo as mais<br />
baixas (103 e 109, respectivamente). 16ii<br />
Foi realizada uma análise de regressão<br />
multivariada para melhor explorar quais os<br />
factores relacionados com a sobrevivência<br />
de crianças (0-17 anos) a nível dos<br />
agregados familiares, tomando a variável<br />
dependente no modelo como um indicador<br />
representativo de saúde infantil.<br />
Figura 3.3: Parcela de agregados familiares situados a menos de 45 minutos a pé de uma unidade de cuidados de<br />
saúde primários, 2002/03 e 2008/09 (percentagem)<br />
Norte – urbana<br />
IAF02<br />
Centro – urbana<br />
IOF08<br />
Sul – urbana<br />
IAF02<br />
IOF08<br />
IAF02<br />
IOF08<br />
75.4<br />
76.3<br />
78.7<br />
86.3<br />
88.8<br />
92.0<br />
140<br />
120<br />
100<br />
80<br />
101<br />
135<br />
95<br />
111<br />
95<br />
Norte – rural<br />
Centro – rural<br />
IAF02<br />
IOF08<br />
IAF02<br />
IOF08<br />
31.5<br />
35.0<br />
47.6<br />
69.7<br />
60<br />
40<br />
Sul – rural<br />
IAF02<br />
IOF08<br />
48.8<br />
53.6<br />
20<br />
0<br />
1997 2003 2008<br />
0% 20% 40%<br />
60% 80% 100%<br />
Agregados familiares<br />
Fonte: Ministry of Planning and Development. “Poverty and Welbeing in <strong>Mozambique</strong>: Third National Poverty Assessment”, Governo<br />
de Moçambique, Setembro de 2010.<br />
Urbana<br />
Rural<br />
Fonte: IDS 1997, IDS 2003, MICS 2008<br />
ii Média de dez anos antes da pesquisa.<br />
52<br />
53
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
Os agregados familiares onde o chefe<br />
possuía o nível secundário ou superior<br />
apresentavam menor probabilidade de<br />
ocorrência de morte de crianças, como<br />
confirma a Figura 3.4, ao passo que a relação<br />
observada com a idade do chefe de família<br />
reflecte apenas a relação biológica entre<br />
a idade dos pais e a da criança. Todavia,<br />
o sexo do chefe de família não parece<br />
Figura 3.4: Probabilidade de sobrevivência das crianças (0-17 anos) nos últimos 12 meses, por nível de<br />
escolaridade do chefe de família, 2008<br />
Probabilidade de sobrevivência da criança<br />
. 96 . 9 7 . 9 8 . 9 9 1<br />
.95<br />
18 28 38 48 58 68<br />
primário<br />
Fonte: Cálculos do <strong>UNICEF</strong> baseados no MICS 2008<br />
Idade do chefe do agregado familiar<br />
Figura 3.5: Causas da mortalidade infantil em Moçambique, 2008<br />
10%<br />
Desnutrição<br />
4%<br />
HIV/SIDA<br />
10%<br />
Meningite<br />
2%<br />
Doenças<br />
infecciosas<br />
intestinais<br />
Infecções agudas<br />
do trato respiratório<br />
7%<br />
inferior<br />
Malária<br />
33%<br />
Outras doenças<br />
infecciosas<br />
5%<br />
Outras<br />
causas<br />
13%<br />
Neonatal<br />
16%<br />
estar estatisticamente correlacionado com<br />
a sobrevivência da criança, enquanto a<br />
pulverização contra o mosquito parece<br />
reduzir em 1% a mortalidade infantil no<br />
agregado. 17<br />
A malária, os problemas neonatais e as<br />
infecções respiratórias agudas são as três<br />
principais causas imediatas de mortalidade<br />
secundário<br />
Asfixia<br />
ao nascer<br />
5%<br />
Prematuridade<br />
8%<br />
superior<br />
Septicemia<br />
do recémnascido<br />
Fonte: National Institute of Health, London School of Hygiene and Tropical Medicine and <strong>UNICEF</strong>, <strong>Mozambique</strong> National Child<br />
Mortality Study, 2009, Maputo, 2009.<br />
3%<br />
nas crianças em Moçambique. 18iii A<br />
SIDA está também a emergir como um<br />
importante causador de morte, sendo<br />
responsável por 10 por cento das mortes de<br />
crianças menores de cinco anos, enquanto<br />
a desnutrição e as doenças diarreicas<br />
aparecem como duas das principais causas<br />
subjacentes. Muitas destas condições podem<br />
ser prevenidas com vacinação ou através de<br />
outras medidas profiláticas simples.<br />
O relatório nacional de progresso nos<br />
Objectivos de Desenvolvimento do Milénio<br />
de 2010 concluiu que, se as actuais<br />
tendências de redução da mortalidade<br />
infantil se continuarem a verificar, o país<br />
tem potencial para alcançar os ODM<br />
relativos à mortalidade infantil até 2015.<br />
No entanto, para atingir a meta de redução<br />
da mortalidade de crianças menores de<br />
cinco anos, que corresponde a uma taxa de<br />
mortalidade de 108 por 1.000 nados vivos<br />
em 2015, é necessário que haja uma redução<br />
anual de 4,3 por cento do número de mortes<br />
na taxa de mortalidade de menores de cinco,<br />
e de 3,7 por cento na taxa de mortalidade<br />
infantil. Isto representaria uma aceleração<br />
das taxas de redução verificadas nos últimos<br />
cinco anos, situadas em 3 por cento e<br />
ligeiramente abaixo dos 2 por cento ao ano,<br />
respectivamente.<br />
2.2. Nutrição infantil<br />
A desnutrição é a principal causa subjacente<br />
contribuinte para o elevado nível de<br />
mortalidade infantil em Moçambique. A<br />
desnutrição é também, ela própria, um factor<br />
importante, uma vez que a desnutrição (em<br />
especial a desnutrição crónica ou baixa altura<br />
para a idade) afecta o desenvolvimento<br />
cognitivo e está intimamente ligada ao<br />
desempenho educacional futuro. As<br />
principais manifestações da desnutrição são<br />
baixo peso para a idade, baixo peso para a<br />
altura, baixa altura para a idade e deficiências<br />
de micronutrientes.<br />
Estado nutricional das crianças<br />
De acordo com dados do MICS 2008, e<br />
usando o sistema de classificação da<br />
Organização Mundial de Saúde (OMS), as<br />
crianças moçambicanas apresentam uma<br />
prevalência muito elevada (44 por cento) de<br />
baixa altura para a idade, uma prevalência<br />
média de baixo peso (18 por cento) e uma<br />
prevalência baixa (4 por cento) de baixo<br />
peso para a idade, (ver Figura 3.6). 19 De<br />
1996/97 a 2008 observou-se uma tendência<br />
de ligeiro declínio em todos os indicadores<br />
de desnutrição. Moçambique possui uma<br />
das mais elevadas taxas de baixa altura para<br />
a idade em todo o mundo, com mais de 1,6<br />
milhões de crianças nessa situação.<br />
O Inquérito sobre o Orçamento Familiar (IOF)<br />
de 20008/09 apresenta níveis de desnutrição<br />
ligeiramente diferentes em relação ao<br />
MICS 2008 por exemplo, de acordo com<br />
o IOF de 2008/09, o índice de desnutrição<br />
crónica é de 46 por cento, contra os 44 por<br />
cento indicados no MICS de 2008. A análise<br />
realizada pelo Ministério de Planificação<br />
e Desenvolvimento restringiu a análise<br />
do MICS 2008 e do IOF 2008 a agregados<br />
familiares pesquisados durante o mesmo<br />
período desse ano (o MICS foi realizado entre<br />
Setembro e Novembro de 2008, enquanto<br />
que o IOF decorreu entre Setembro de 2008<br />
e Agosto de 2009). Esta análise mostrou não<br />
haver diferenças estatísticas entre as médias<br />
nacionais nos três indicadores. 20<br />
Desnutrição aguda (baixo peso para a<br />
altura)<br />
Não foi observada nenhuma diferença<br />
significativa nas taxas de desnutrição aguda<br />
em crianças menores de cinco anos entre<br />
iii Estas conclusões derivam do estudo sobre mortalidade infantil levado a cabo pelo Ministério da Saúde e <strong>UNICEF</strong>,<br />
em 2008, cujo objectivo era medir as taxas de mortalidade neonatal, de bebés e crianças menores de cinco anos em<br />
Moçambique em relação a todas as causas relevantes para o programa, usando dados recolhidos a nível da comunidade.<br />
Foram usadas autópsias verbais, i.e.,entrevistas com membros da família ou prestadores de cuidados, sobre as<br />
circunstâncias da morte, para determinar as causas da mortalidade infantil.<br />
54<br />
55
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
Figura 3.6: Taxas de desnutrição crónica por país, 2009<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Classificação<br />
País<br />
2003 iv e 2008, calculadas em 5 e 4 por cento,<br />
respectivamente. 21 O baixo peso para a<br />
altura, ou desnutrição aguda, é um tipo de<br />
desnutrição que resulta de uma recente<br />
perda excessiva de peso devido a doença<br />
grave ou falta de alimentos. Note-se que<br />
a instabilidade temporal e sazonal deste<br />
indicador coloca consideráveis desafios a<br />
comparações entre anos.<br />
Apesar de a prevalência de baixo peso<br />
para altura a nível nacional ser baixa (um<br />
valor inferior a 5 por cento é considerado<br />
Prevalência de<br />
baixa altura para a<br />
idade (%)<br />
Número de crianças com baixa<br />
altura para a idade (milhares,<br />
2008)<br />
1 Índia 48 60,788<br />
2 China 15 12,685<br />
3 NigÉria 41 10,158<br />
4 Paquistão 42 9,868<br />
5 Indonésia 37 7,688<br />
6 Bangladesh 43 7,219<br />
7 Etiópia 51 6,768<br />
8 República Unida da Tanzânia 46 5,382<br />
9 Filipinas 34 3,617<br />
10 United Republic of Tanzania 44 3,359<br />
11 Afeganistão 59 2,910<br />
12 Egipto 29 2,730<br />
13 Vietname 36 2,619<br />
14 Uganda 38 2,355<br />
15 Sudão 40 2,305<br />
16 Quénia 35 2,269<br />
17 Iémen 58 2,154<br />
18 Myanmar 41 1,880<br />
19 Nepal 49 1,743<br />
20 Moçambique 44 1,670<br />
21 Madagáscar 53 1,622<br />
22 México 16 1,594<br />
23 Níger 47 1,473<br />
24 África do Sul 51 1,425<br />
Fonte: <strong>UNICEF</strong>, Tracking Progress in Child and Maternal Nutrition: A survival and development priority, <strong>UNICEF</strong>, Novembro de 2009.<br />
baixo segundo a classificação da OMS), as<br />
diferenças provinciais são significativas,<br />
variando entre 9 por cento em Nampula<br />
e 1 por cento em Gaza (ver Figura 3.8). A<br />
prevalência de baixo peso para a altura está<br />
associada à riqueza, daí que as crianças dos<br />
agregados familiares mais pobres tenham<br />
três vezes mais probabilidade de sofrer de<br />
desnutrição aguda (6 por cento) do que<br />
as das famílias em melhores condições<br />
(2 por cento). As taxas de baixo peso<br />
para a altura são mais elevadas aos seis<br />
meses de idade (8 por cento), declinando,<br />
iv Os dados antropométricos do IDS de 2003 foram calculados com base na população-padrão da OMS.<br />
Figura 3.7: Taxas de desnutrição (moderada) em crianças menores de cinco anos, 2003 e 2008<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
48%<br />
Fonte: IDS 1997, MICS 2008.<br />
10%<br />
9%<br />
8%<br />
7%<br />
6%<br />
5%<br />
4%<br />
3%<br />
2%<br />
1%<br />
0%<br />
5%<br />
Niassa<br />
44%<br />
20%<br />
Baixa altura para a idade Baixo peso Baixo peso para a altura<br />
4%<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
9%<br />
5%<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
3%<br />
18%<br />
2003 2008<br />
Figura 3.8: Percentagem de baixo peso para a altura em crianças menores de cinco anos por província, 2008<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
depois, progressivamente. A prevalência<br />
de baixo peso para a altura é similar nas<br />
áreas rurais e urbanas (5 e 3 por cento,<br />
respectivamente). 22<br />
Baixo peso<br />
A prevalência de baixo peso em crianças<br />
menores de cinco anos reduziu de 22 por<br />
cento em 200323 para 18 por cento em<br />
2008. 24 O baixo peso, que é definido como<br />
4%<br />
3%<br />
4%<br />
5%<br />
1%<br />
Gaza<br />
4%<br />
2% 2%<br />
Maputo Maputo<br />
Província Cidade<br />
peso insuficiente para a idade, é uma<br />
consequência de deficiências em matéria<br />
de nutrição, saúde e outros cuidados,<br />
quer actuais, quer anteriores, sofridas por<br />
uma criança. As maiores melhorias neste<br />
indicador ocorreram em áreas rurais, onde<br />
a prevalência diminuiu de 25 por cento em<br />
2003 para 19 por cento em 2008. Durante<br />
o mesmo período, a prevalência nas áreas<br />
urbanas permaneceu estática, situando-se<br />
nos 13 por cento (ver Figura 3.9). Melhorias<br />
56<br />
57
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
mais notáveis foram observadas entre os<br />
agregados familiares mais pobres, onde<br />
a prevalência de crianças com baixo peso<br />
decaiu de 29 por cento em 2003 para 23 por<br />
cento em 2008. 25<br />
A incidência de baixo peso é maior entre<br />
rapazes do que entre raparigas (20 contra<br />
15 por cento), ao passo que os níveis<br />
deste indicador por faixa etária são mais<br />
elevados entre os 6-11 meses (22 por cento),<br />
diminuindo ligeiramente à medida que as<br />
crianças vão crescendo, mas mantendo-se<br />
ainda em aproximadamente 15 por cento<br />
à medida que se vão aproximando do<br />
seu quinto aniversário. As disparidades<br />
provinciais são particularmente graves,<br />
com mais de uma em cada quatro crianças<br />
a apresentar baixo peso na província de<br />
Nampula, em comparação com uma em<br />
cada quinze na Cidade de Maputo (ver Figura<br />
3.9). 26<br />
O relatório nacional de progresso nos<br />
Objectivos de Desenvolvimento do Milénio<br />
de 2010 considera haver potencial para se<br />
cumprir a meta dos ODM de reduzir para<br />
metade a prevalência de baixo peso. 27<br />
Embora esta seja uma conquista importante,<br />
não pode haver condescendência uma vez<br />
que os níveis de baixa altura para a idade<br />
são superiores ao dobro dos níveis de baixo<br />
peso. Mesmo se Moçambique cumprir o<br />
Objectivo do Milénio relativo ao baixo peso,<br />
são necessárias medidas urgentes para<br />
enfrentar os elevados níveis de baixa altura<br />
para a idade.<br />
Desnutrição crónica (baixa altura para<br />
a idade)<br />
A percentagem de crianças de cinco anos<br />
com baixa altura para a idade, decresceu<br />
de 48 por cento em 2003 para 44 por<br />
cento em 2008. 28 A OMS ainda caracteriza<br />
a prevalência de desnutrição crónica em<br />
Moçambique como “muito elevada”. A<br />
desnutrição crónica, definida como baixa<br />
altura para a idade, apresenta a desnutrição<br />
resultante de deficiências cumulativas<br />
no estado nutricional e de saúde da mãe<br />
antes e durante a gravidez, e da criança<br />
nos dois primeiros anos de vida. A baixa<br />
altura para a idade é um bom indicador do<br />
bem-estar de uma população, uma vez que<br />
reflecte o contexto estrutural que envolve a<br />
desnutrição. As crianças com baixa altura<br />
para a idade têm o desenvolvimento físico<br />
e mental comprometido, o que significa<br />
que a oportunidade de crescimento está<br />
irreversivelmente perdida, não podendo ser<br />
recuperada, mesmo que as condições de<br />
nutrição melhorem e a criança ganhe peso.<br />
Figura 3.9: Percentagem de baixo peso em crianças menores de cinco anos, por província, 2008<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
18%<br />
Niassa<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
22%<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
26%<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Nampula<br />
21%<br />
Zam -<br />
bézia<br />
18% 19%<br />
16%<br />
12%<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
7% 7% 7%<br />
Gaza<br />
Maputo Maputo<br />
Província Cidade<br />
A percentagem de crianças com severa baixa<br />
altura para a idade reduziu de 23 por cento<br />
em 2003 para 18 por cento em 2008. Esta<br />
redução parece ter ocorrido principalmente<br />
nas zonas rurais, onde a taxa de prevalência<br />
passou de 52 para 47 por cento, 29 enquanto<br />
nas áreas urbanas, onde a prevalência de<br />
desnutrição crónica é mais baixa, a redução<br />
foi menos acentuada, com um decréscimo<br />
de apenas 0,4 pontos percentuais anuais<br />
alcançado entre 2003 (37 por cento) e 2008<br />
(35 por cento). 30<br />
Em Moçambique, a baixa altura para a<br />
idade é observada em crianças em muito<br />
tenra idade, mesmo antes dos seis meses,<br />
e aumenta até aos 24-36 meses. A elevada<br />
prevalência (ligeiramente acima dos 20<br />
por cento) de desnutrição em crianças com<br />
menos de seis meses de idade é motivo de<br />
preocupação, dado não ser espectável uma<br />
taxa de tal ordem nessa faixa etária. As taxas<br />
de baixa altura para a idade aumentam com<br />
a idade do nascimento até aos 24-36 meses,<br />
atingindo um pico de cerca de 54 por cento,<br />
após o que diminuem ligeiramente. 31<br />
Figura 3.10: Percentagem de desnutrição crónica (baixa altura para a idade) em crianças menores de cinco<br />
anos, por província, 2008<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
45%<br />
Niassa<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
56%<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
51%<br />
46%<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
48% 48%<br />
As disparidades provinciais em<br />
relação à baixa altura para a idade são<br />
particularmente impressionantes (ver Figura<br />
3.10), sendo a sua prevalência em crianças<br />
menores de cinco anos maior nas províncias<br />
de Cabo Delgado (56 por cento) e Nampula<br />
(51 por cento), e também superior a 40 por<br />
cento nas províncias da Zambézia, Niassa,<br />
Tete, Sofala e Manica. 32<br />
O sexo masculino, a idade (em meses), o<br />
baixo nível de escolaridade da mãe, o uso<br />
de água imprópria, as deficientes condições<br />
de saneamento e viver nas províncias do<br />
centro e norte têm um efeito negativo sobre<br />
a altura das crianças relativamente à idade.<br />
Estes resultados foram obtidos analisando<br />
alguns dos factores relacionados com<br />
desnutrição crónica por meio de regressão<br />
multivariada (ver Tabela 3.1), com base em<br />
dados do MICS 2008. O efeito da província<br />
de residência mantém-se, mesmo quando<br />
se consideram outras variáveis, tais como<br />
a pobreza e o acesso a água potável e<br />
saneamento melhorado.<br />
40%<br />
34%<br />
34%<br />
Gaza<br />
28%<br />
Maputo<br />
Província<br />
25%<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
v A variável riqueza baseia-se num índice de riqueza que é construído com base em informações sobre a posse, por<br />
parte das famílias de bens duráveis, como, por exemplo, televisão, bicicleta ou carro, bem como nas características da<br />
habitação, incluindo electricidade, fonte de água potável, tipo de instalações sanitárias e material usado para cobertura.<br />
É um indicador do nível de riqueza que se mostrou estar correlacionado com medidas de despesas e rendimentos. Para<br />
uma discussão integral da metodologia e suas limitações, ver Gwatkins et al, Socio-economic differences in Health,<br />
Nutrition and Population in <strong>Mozambique</strong>, Banco Mundial, 2000.<br />
58<br />
59
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
Tabela 3.1: Regressão linear multivariável de todas as variáveis explicativas relevantes sobre o Z-score<br />
do indicador altura/idade (height-for-health Z-zcore) em crianças menores de cinco anos incluídas no<br />
MICS, excluindo a classificação da riqueza, 2008<br />
Variáveis explicativas do indicador altura/<br />
idade em crianças de 0–59 meses<br />
Coeficiente de<br />
regressão linear (b)<br />
95% de intervalo<br />
confiança de (b)<br />
Valor 1 de p<br />
(P-value1)<br />
a) Sexo masculino -0,188 -0,253 a -0,122
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
Alimentação de bebés e crianças<br />
pequenas<br />
As práticas apropriadas de alimentação<br />
infantil são cruciais para a sobrevivência e<br />
desenvolvimento da criança, recomendandose<br />
o aleitamento materno exclusivo para os<br />
primeiros seis meses de vida. Depois dessa<br />
idade, as crianças devem ingerir alimentos<br />
sólidos, semi-sólidos e moles, com<br />
frequência crescente, ao mesmo tempo que<br />
continua a ser amamentada. O aleitamento<br />
pode ser mantido até aos dois ou mais<br />
anos de idade. 35 A OMS recomenda que a<br />
amamentação seja iniciada imediatamente<br />
após o parto, altura em que é forte o reflexo<br />
de sucção do recém-nascido. O Ministério da<br />
Saúde aprovou, no início de 2009, um plano<br />
quinquenal abrangente de comunicação e<br />
mobilização social, para promover, proteger<br />
e apoiar o aleitamento materno.<br />
Em 2008, 63 por cento dos recém-nascidos<br />
começaram a ser postos ao peito uma<br />
hora após o parto, comparativamente aos<br />
65 por cento registados em 2003, e 88 por<br />
cento foram-no até um dia após o parto. 36<br />
As taxas de aleitamento materno exclusivo<br />
em crianças menores de seis meses, em<br />
Moçambique, aumentaram significativamente<br />
entre 2003 e 2008 (de 30 para 37 por cento),<br />
embora em termos absolutos o nível continue<br />
baixo (ver Figura 3.12). O aleitamento<br />
materno exclusivo diminui rapidamente com<br />
a idade, de 57 por cento para a faixa etária de<br />
zero a um mês, a 17 por cento entre os quatro<br />
e os cinco meses (ver Figura 3.13). 37<br />
Os principais alimentos dados aos<br />
recém-nascidos que interferem com<br />
a amamentação exclusiva são água e<br />
alimentos sólidos, semi-sólidos ou moles<br />
38 (ver Figura 3.14). Um estudo qualitativo<br />
realizado na Cidade de Maputo e nas<br />
províncias de Gaza, Tete, Zambézia e<br />
Nampula 39 mostrou que as mães acataram<br />
a recomendação de alimentarem os seus<br />
filhos exclusivamente com leite do peito,<br />
mas não se acham capazes de aplicar na<br />
prática os seus conhecimentos, já que outros<br />
membros da família insistem que devem dar<br />
água, remédios tradicionais e/ou alimentos<br />
sólidos, semi-sólidos ou moles ao bebé.<br />
Isto indica que os esforços de comunicação<br />
devem concentrar-se na eliminação desses<br />
alimentos da dieta e incluir familiares e as<br />
comunidades nos esforços para informar<br />
que o leite materno contém água e<br />
nutrientes suficientes para as crianças com<br />
menos de seis meses de idade, e que as<br />
mães precisam de apoio prático e emocional<br />
para amamentarem.<br />
A duração média do aleitamento materno<br />
em 2008 reduziu para 18 meses, em<br />
comparação com os 22 meses registados em<br />
2003. 40 Este facto é motivo de preocupação,<br />
pois o leite materno continua a fornecer<br />
Figura 3.14: Padrões alimentares de crianças menores de um ano de idade, 2008<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
Aleitamento e alimentos<br />
sólidos, semi-líquidos<br />
ou moles<br />
56%<br />
2%<br />
Aleitamento materno<br />
e outro leite/preparado<br />
para bebés<br />
nutrientes essenciais e protege a criança<br />
contra doenças da infância entre os 12 e<br />
23 meses de idade. Uma amamentação<br />
continuada é de extrema importância<br />
quando as crianças estão doentes e perdem<br />
Aleitamento<br />
materno<br />
exclusivo<br />
20%<br />
Aleitamento<br />
materno exclusivo<br />
e água simples<br />
16%<br />
Desmame<br />
2%<br />
4%<br />
Aleitamento materno<br />
e líquidos que não leite<br />
o apetite para outros alimentos, mas<br />
continuam a ser amamentadas. 41<br />
Depois dos seis meses, devem ser<br />
introduzidos alimentos sólidos, semi-sólidos<br />
Figura 3.15: Crianças com 6-11 meses alimentadas com leite materno e alimentos complementares pelo menos<br />
três vezes por dia, por província, 2008<br />
Figura 3.12: Percentagem de crianças com<br />
amamentação exclusiva: dados de diferentes grupos<br />
etários, 1997, 2003 e 2008<br />
100%<br />
80%<br />
60%<br />
40%<br />
20%<br />
37.6<br />
38.3<br />
48.4<br />
30 36.8<br />
Figure 3.13: Amamentação exclusiva em crianças<br />
com menos de 12 meses, 1997, 2003 e 2008<br />
100%<br />
80%<br />
60%<br />
40%<br />
20%<br />
57.3<br />
53.1<br />
49.8<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
71%<br />
48%<br />
53%<br />
46%<br />
53%<br />
45%<br />
49%<br />
32%<br />
51% 51%<br />
63%<br />
51%<br />
0%<br />
1997 (IDS) 2003 (IDS) 2008 (MICS)<br />
0-3 meses<br />
0-6 meses<br />
0%<br />
0-1 2-3 4-5 6-7 8-9 10-11<br />
1997 (IDS) 2003 (IDS) 2008 (MICS)<br />
0%<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Gaza<br />
Maputo Maputo<br />
Província Cidade<br />
Total<br />
Fonte: IDS 1997, IDS 2003 e MICS 2008.<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
62<br />
63
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
ou moles na dieta das crianças, com uma<br />
frequência adequada: duas a três vezes por<br />
dia para bebés entre os seis e oito meses, e<br />
três vezes por dia para crianças dos nove aos<br />
onze meses, para além do leite materno. Em<br />
média, apenas metade das crianças de seis<br />
a onze meses receberam o número mínimo<br />
recomendado de refeições, conforme se<br />
pode ver na Figura 3.15. É considerável a<br />
variação entre as províncias, com setenta<br />
e um por cento das crianças nesta faixa<br />
etária a serem devidamente alimentadas no<br />
Niassa, em comparação com 32 por cento<br />
em Inhambane. 42<br />
Alimentação infantil e transmissão do<br />
HIV<br />
Uma das formas de transmissão de HIV da<br />
mãe para a criança (transmissão vertical)<br />
(para além de durante a gravidez e o parto)<br />
é através do aleitamento materno. Foi<br />
determinado que o risco total da transmissão<br />
vertical é de cerca de 30-45 por cento.<br />
Numerosos estudos têm documentado que<br />
o risco de as crianças não amamentadas<br />
morrerem por causas que podem ser evitadas<br />
pelo aleitamento materno, nomeadamente<br />
desnutrição, diarreia e infecções, é<br />
semelhante ao risco de as amamentadas<br />
serem infectadas com HIV. A chamada taxa de<br />
sobrevivência livre de HIV aos 18 meses ou<br />
dois anos de idade é semelhante para ambos<br />
os grupos. As orientações anteriores para as<br />
mães que vivem com HIV recomendavam o<br />
aleitamento materno exclusivo, a menos que<br />
a alimentação substituta fosse “aceitável,<br />
viável, acessível, sustentável e segura”. 43<br />
Em finais de 2009, a OMS actualizou as<br />
suas directrizes, recomendando o uso de<br />
medicamentos anti-retrovirais (para a mãe<br />
e para a criança) durante a amamentação. 44<br />
Desta forma, a criança tira proveito do leite<br />
materno, bem como da protecção contra a<br />
transmissão do HIV. O Ministério da Saúde<br />
de Moçambique, no âmbito do Programa de<br />
Prevenção da Transmissão Vertical, adoptou<br />
as recomendações mais recentes da OMS<br />
em meados de 2010. Isto significa que as<br />
mães seropositivas serão aconselhadas a<br />
seguir a amamentação exclusiva dos seus<br />
filhos durante os primeiros seis meses<br />
de vida, e a continuar a amamentar, com<br />
alimentos complementares adequados,<br />
até aos 12 meses ou acima dessa idade.<br />
Depois disso, a amamentação pode ser<br />
interrompida. Durante todo o período de<br />
amamentação e até uma semana depois, as<br />
crianças devem tomar uma dose diária do<br />
medicamento anti-retroviral Nevirapina. As<br />
novas orientações deverão ser introduzidas<br />
de forma faseada a partir de 2011.<br />
Deficiências em micro-nutrientes:<br />
Deficiência de iodo<br />
A deficiência de iodo é a maior causa<br />
individual evitável de dano cerebral<br />
e retardamento mental no mundo. 45<br />
A deficiência de iodo reduz também a<br />
sobrevivência infantil, o crescimento e o<br />
desenvolvimento. As mulheres grávidas com<br />
deficiência de iodo correm risco de aborto,<br />
nado-morto e outras complicações. As<br />
consequências visíveis e mais graves desta<br />
deficiência são bócio (aumento da glândula<br />
tiróide) e cretinismo. Nas suas formas mais<br />
moderadas, pode levar a uma redução do<br />
desenvolvimento mental.<br />
A estratégia com melhor relação custoeficácia<br />
para prevenir a deficiência de iodo<br />
é a iodização universal do sal, que consiste<br />
na fortificação, com iodo, do sal destinado<br />
a consumo humano e animal. Além disso,<br />
podem distribuir-se cápsulas de óleo iodado<br />
em áreas com uma elevada prevalência<br />
desta deficiência.<br />
Em Janeiro de 2000, o Ministério da Saúde<br />
e o Ministério da Indústria e Comércio<br />
emitiram o Diploma Ministerial conjunto<br />
n.º 7/2000, que estabelece que todo o sal<br />
produzido localmente ou importado para<br />
consumo humano e animal seja iodado.<br />
Contudo, até à data, a execução desta<br />
directiva tem sido relativamente fraca.<br />
O Ministério da Indústria e Comércio<br />
investiu na formação de produtores de sal<br />
e forneceu equipamento para iodização<br />
do sal e monitoria, enquanto o Ministério<br />
da Saúde tem vindo a apoiar actividades<br />
promocionais. A ONG PSI está também<br />
a apoiar o Governo na criação de maior<br />
procura de sal iodado.<br />
O uso do sal iodado aumentou ligeiramente,<br />
de 54 por cento em 2003 para 58 por cento<br />
em 2008. 46 O maior aumento proveio de um<br />
maior uso de sal iodado nas áreas urbanas;<br />
nas zonas rurais verificou-se uma ligeira<br />
diminuição. As diferenças no uso de sal<br />
iodado e nos níveis de sal adequadamente<br />
iodado entre as províncias são acentuadas.<br />
Em 2008, apenas 25 por cento das famílias<br />
utilizava sal adequadamente iodado (mais de<br />
15 partes por milhão), devendo-se esta baixa<br />
percentagem provavelmente a deficiências<br />
na iodização e práticas de embalagem na<br />
fábrica e/ou a inadequadas práticas de<br />
armazenamento.<br />
Curiosamente, Cabo Delgado, Nampula<br />
e Zambézia, províncias produtoras de sal<br />
iodado, têm os menores níveis de iodização<br />
do sal. Entre 2003 e 2008, os níveis de<br />
iodização diminuíram em todas as três<br />
províncias, o que pode dever-se ao facto<br />
Figura 3.16: Uso de sal iodado por província, 2008<br />
100%<br />
90%<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
29%<br />
45%<br />
Niassa<br />
Fonte: MICS 2008<br />
22%<br />
8%<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
25%<br />
32%<br />
9%<br />
5%<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
49%<br />
18%<br />
52%<br />
29%<br />
de o sal não processado, não iodado, estar<br />
mais facilmente disponível nas áreas onde é<br />
extraído e mais facilmente poder ser levado<br />
para o mercado local.<br />
Os agregados familiares dos quintis em<br />
melhor situação usam com mais frequência<br />
sal iodado e também mais facilmente sal<br />
adequadamente iodado, o que se deve<br />
provavelmente ao facto de esses agregados<br />
terem mais possibilidades de adquirir sal<br />
iodado que, muitas vezes, custa o dobro<br />
ou mais que o sal não iodado, e ao facto<br />
de poderem estar melhor equipados para<br />
armazenar o sal de forma adequada.<br />
Em 2007, o Ministério da Saúde iniciou a<br />
distribuição de cápsulas de óleo iodado<br />
nas províncias com as mais elevadas taxas<br />
de deficiência de iodo, nomeadamente<br />
Niassa, Nampula, Zambézia e Tete, tendo<br />
como grupo-alvo da intervenção mulheres<br />
grávidas e crianças de 7-24 meses. Em<br />
2008, foram distribuídas cápsulas de iodo<br />
durante as Semanas de Saúde da Criança,<br />
alcançando 89 por cento de cobertura, mas<br />
em 2009 a intervenção foi descontinuada. 47<br />
46%<br />
35%<br />
52%<br />
36%<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
0 < 15 PPM 15 + PPM<br />
21%<br />
71%<br />
Gaza<br />
29%<br />
48%<br />
26%<br />
58%<br />
Maputo Maputo<br />
Província Cidade<br />
33%<br />
25%<br />
Total<br />
64<br />
65
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
Figura 3.17: Uso de sal iodado por quintil de riqueza de 2008<br />
100<br />
80<br />
60<br />
40<br />
20<br />
0<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
Figura 3.18: Cobertura da suplementação com vitamina A, 2003 e 2008<br />
90%<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
48%<br />
46%<br />
38%<br />
26%<br />
19%<br />
29%<br />
35%<br />
33%<br />
32%<br />
36%<br />
49%<br />
34%<br />
15%<br />
20%<br />
12%<br />
Mais baixo Segundo Médio Quarto Mais elevado<br />
15+PPP 0
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
CAIXA 3.1: Semanas de Saúde da Criança<br />
Figura 3.19: Continuum de cuidados de saúde materna e neonatal<br />
Articulação de cuidados durante o ciclo de vida (A) e nos locais das pessoas com crianças<br />
a seu cargo (B). Adaptado de Partnership for Maternal, Newborn and Child Health, com<br />
autorização.<br />
Adolescência<br />
e antes de gravidez<br />
A<br />
B<br />
Idade reprodutiva<br />
Gravidez<br />
Morte<br />
Envelhecimento<br />
Maioridade<br />
(Idade adulta)<br />
Nascimento<br />
28 dias<br />
20 anos<br />
10 anos<br />
Adolescência<br />
Período neonatal<br />
Infância<br />
5 anos<br />
1 ano<br />
Gravidez Nascimento Pós-natal (mãe) Post-natal health<br />
Hospitais e unidades sanitárias<br />
Serviços ambulatórios de extensão<br />
e junto às comunidades<br />
Cuidados familiares e comunitários<br />
Appropriate<br />
Fonte: Kevbes, Kate J., et al., ‘Continuum of Care for maternal, Newborn and Child Health: From slogan to service deliver’,<br />
The Lancet, vol. 370, nº 9595, 13 de Outubro de 2007, p. 1360.<br />
Idade escolar<br />
Infância<br />
Idade pré-escolar<br />
Pós-natal (recém-nascido)<br />
follow-up<br />
referral and<br />
Infancy<br />
Childhood<br />
A oferta de um pacote integrado de intervenções preventivas e curativas relativamente baratas, quando<br />
realizada em escala, pode reduzir até 63 por cento a mortalidade de crianças menores de cinco anos.<br />
Infelizmente, em muitos países, as crianças que mais necessitam destas intervenções não têm acesso<br />
fácil a serviços de qualidade nas unidades de saúde. As Semanas de Saúde da Criança estão concebidas<br />
como medida principalmente temporária (para um determinado número de anos) para melhorar o<br />
acesso, oferecendo um pacote de intervenções de saúde e nutrição com uma boa relação custo-eficácia a<br />
crianças menores de cinco anos, utilizando uma abordagem de campanha que atinge até mesmo as áreas<br />
mais remotas do país. O uso deste tipo de abordagem não só expande o alcance dos serviços de saúde,<br />
como também pode reforçar a prestação de serviços de rotina e junto das comunidades, uma vez que os<br />
profissionais de saúde são frequentemente submetidos a formação adicional e as famílias recebem mais<br />
informações sobre os serviços. A disponibilidade de um pacote integrado de serviços de saúde eficazes e de<br />
qualidade, prestados ao mesmo tempo e num único lugar, evita que os que têm crianças a seu cargo tenham<br />
de fazer com elas várias (e dispendiosas) deslocações para as unidades sanitárias, além de promover a<br />
procura de outros serviços de saúde de rotina, especialmente quando se faz uma mobilização social efectiva.<br />
As Semanas de Saúde da Criança são normalmente constituídas por pelo menos duas intervenções<br />
complementares de saúde ou nutrição, podendo incluir um pouco mais. Os serviços e intervenções<br />
prestados em Moçambique são:<br />
Principais Intervenções:<br />
• l Suplementação com vitamina A para crianças dos 6 meses aos 5 anos;<br />
• l Vacinação de rotina ou para pôr as vacinas em dia contra sarampo, poliomielite, tétano, difteria e<br />
tosse convulsa, e tuberculose;<br />
• l Desparasitação de crianças de 1-4 anos.<br />
As outras intervenções que foram adicionadas em Moçambique foram as seguintes:<br />
Triagem de desnutrição (com o uso da Circunferência Braquial -- circunferência no ponto médio da<br />
parte superior do braço) e encaminhamento para gestão de desnutrição aguda;<br />
• l Promoção e distribuição de redes mosquiteiras tratadas com insecticida de longa duração;<br />
• l Promoção de práticas familiares e cuidados infantis saudáveis, como por exemplo aleitamento<br />
materno exclusivo;<br />
• l Vacinação contra o tétano de mulheres em idade fértil;<br />
• l Suplementação com Vitamina A para mães a amamentar durante as primeiras oito semanas após o<br />
parto.<br />
A chave para o sucesso das Semanas de Saúde da Criança é uma estratégia de mobilização social bem<br />
integrada, que vise a participação universal de famílias elegíveis cobertas pela campanha. Projectada e<br />
implementada a nível nacional, provincial e distrital, sob coordenação do Ministério da Saúde, a estratégia<br />
tem duas vertentes. Em primeiro lugar – e tendo início bem antes da Semana de Saúde da Criança a<br />
estratégia serve para consciencializar o público sobre a semana. A segunda componente da estratégia<br />
funciona em conjunto com a prestação do serviço, para garantir a promoção de importantes mensagens<br />
sobre os comportamentos de saúde e práticas de higiene complementares. A mobilização social para as<br />
Semanas de Saúde da Criança explora os media e os meios de comunicação locais para divulgar anúncios<br />
de serviços públicos e especialmente através das rádios comunitárias gerar discussão e participação da<br />
comunidade através de diálogo e debates comunitários. Os activistas locais penetram nos bastidores<br />
dos meios de comunicação para divulgar informação, utilizando materiais de comunicação produzidos<br />
especificamente para as campanhas e servindo-se das línguas locais para chegar às comunidades.<br />
Durante toda a semana, faz-se um uso estratégico de figuras influentes locais e nacionais líderes de<br />
opinião e decisores que têm a confiança e o respeito dos seus constituintes para reforçar a divulgação<br />
de mensagens e maximizar a participação. Através de reuniões comunitárias e comunicação<br />
interpessoal a nível das famílias, os líderes locais desempenham um papel crucial na mobilização de<br />
participação para estas campanhas de saúde da criança.<br />
68<br />
69
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
e da Infância, com enfoque na assistência<br />
neonatal, estando presentemente 90 por<br />
cento das unidades sanitárias a implementar<br />
estes serviços, comparativamente a 50 por<br />
cento em 2005. 54<br />
Moçambique tem potencial real para<br />
cumprir as metas para 2015 do ODM 5:<br />
um Rácio de Mortalidade Materna de<br />
250/100.000 nados vivos e uma cobertura<br />
de 66 por cento de partos institucionais. A<br />
realização destes objectivos exigirá: melhoria<br />
da qualidade e cobertura dos serviços de<br />
saúde reprodutiva; expansão e manutenção<br />
de serviços de cuidados obstétricos de<br />
emergência e neonatais de qualidade;<br />
diagnóstico, tratamento e encaminhamento<br />
atempado de complicações obstétricas;<br />
melhoria da estrutura e funcionamento<br />
do sistema de referência; melhoria do<br />
Sistema de Informação de Saúde para<br />
melhor monitorar os cuidados obstétricos<br />
de emergência e neonatais; garantia<br />
de segurança dos produtos para saúde<br />
reprodutiva; e maior envolvimento da<br />
comunidade, especialmente dos homens,<br />
nas decisões sobre saúde reprodutiva.<br />
São cinco as causas directas da mortalidade<br />
materna: hemorragia (ocorrendo geralmente<br />
no pós-parto), septicemia, eclampsia,<br />
parto obstruído e complicações de aborto.<br />
Muitos destes factores podem ser facilmente<br />
resolvidos se houver profissionais de saúde<br />
qualificados prontamente disponíveis,<br />
medicamentos básicos, equipamento e<br />
instalações para referência. As mortes<br />
obstétricas indirectas ocorrem como<br />
resultado quer de condições previamente<br />
existentes quer de condições decorrentes da<br />
gravidez, que não estão relacionadas com<br />
as causas obstétricas directas mas podem<br />
ser agravadas pelos efeitos fisiológicos da<br />
gravidez. É o caso de SIDA, malária, anemia<br />
e doenças cardiovasculares. A gravidez na<br />
adolescência também aumenta o risco de<br />
mortes maternas. 55<br />
Um dos mais importantes factores que<br />
afectam a saúde das mulheres é uma boa<br />
nutrição. Segundo dados do Inquérito<br />
Demográfico e de Saúde de 2003, cerca<br />
de 9 por cento das mulheres em idade<br />
reprodutiva em Moçambique sofre de<br />
desnutrição (indicado por um baixo índice<br />
de massa corporal). x Em 2003, a prevalência<br />
de desnutrição era mais elevada entre as<br />
mulheres nas zonas rurais do que nas áreas<br />
urbanas, e duas vezes maior entre as mulheres<br />
mais pobres (10 por cento) do que entre<br />
as que se encontram em melhor situação<br />
(5 por cento). 56 De acordo com um estudo<br />
realizado em 2002, a anemia, que pode estar<br />
relacionada com um insuficiente consumo de<br />
alimentos ricos em ferro, parasitoses, malária<br />
ou outras infecções, afectou 70 por cento das<br />
mulheres grávidas, contra 48 por cento das<br />
não grávidas. 57 Apesar da prevalência desta<br />
doença, 39 por cento das mulheres grávidas<br />
não tomaram qualquer suplemento de ferro e<br />
ácido fólico durante a gravidez. 58<br />
Nos últimos anos, a cobertura de cuidados<br />
pré-natais em Moçambique melhorou<br />
significativamente, tendo-se verificado<br />
um aumento da percentagem de mulheres<br />
atendidas pelo menos uma vez por pessoal<br />
de saúde qualificado durante a gravidez, de<br />
85 por cento em 2003 para 92 por cento em<br />
2008 (ver Figura 3.20). 59 Os maiores ganhos<br />
foram registados nas áreas rurais, onde a<br />
percentagem de mulheres grávidas que<br />
relataram ter recebido cuidados pré-natais<br />
pelo menos uma vez subiu de 79 para 90 por<br />
cento entre 2003 em 2008, como resultado da<br />
expansão dos serviços de saúde nestas áreas.<br />
A cobertura de cuidados pré-natais nas áreas<br />
urbanas permaneceu praticamente estável,<br />
com um ligeiro aumento entre 2003 e 2008,<br />
de 97 para 99 por cento.<br />
A cobertura de cuidados pré-natais<br />
ultrapassou os 80 por cento em todas as<br />
províncias do país, oscilando entre 81 por<br />
cento, na Zambézia, e uma cobertura quase<br />
universal em Gaza e na Cidade de Maputo.<br />
Os serviços de cuidados pré-natais variam<br />
de acordo com o estatuto socioeconómico<br />
da mulher, com 86 por cento das mulheres<br />
no quintil mais pobre relatando ter assistido<br />
a pelo menos uma consulta pré-natal, em<br />
comparação com 99 por cento no quintil<br />
mais favorecido. Entre 2003 e 2008, o nível<br />
de cobertura entre as mulheres no quintil<br />
mais pobre subiu de 67 para 85 por cento.<br />
Segundo dados do MICS 2008, 58 por<br />
cento dos partos tiveram lugar em<br />
estabelecimentos de saúde. Nas áreas<br />
rurais, a cobertura chegou aos 49 por cento.<br />
A percentagem de partos institucionais<br />
entre 1997 e 2003 aumentou de 33 para<br />
34 por cento, ao passo que nas áreas<br />
urbanas permaneceu estável, em 81 por<br />
cento. O número relativamente elevado de<br />
partos que ocorrem fora de maternidades<br />
formais ou outros estabelecimentos<br />
de saúde é relevante, tanto em relação<br />
ao acesso das mulheres a serviços<br />
obstétricos de emergência e cuidados<br />
neonatais, como ao uso de intervenções<br />
de prevenção da transmissão vertical, que<br />
são proporcionados através de unidades<br />
sanitárias. Fora de unidades sanitárias<br />
100%<br />
90%<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
70%<br />
formais não existe nenhum sistema<br />
para garantir que as que não têm partos<br />
institucionais cumpram e, portanto,<br />
beneficiem, desta intervenção.<br />
As normas estabelecidas no programa<br />
nacional de assistência pré-natal<br />
recomendam que todas as mulheres<br />
grávidas recebam informação sobre<br />
possíveis problemas de saúde durante a<br />
gravidez, incluindo a infecção por HIV e o<br />
risco de sua transmissão vertical. Apesar de<br />
estas normas estabelecerem também que<br />
as mulheres grávidas sejam avaliadas em<br />
termos de peso, altura e pressão arterial e<br />
façam o teste de rastreio da sífilis, parece<br />
não haver cumprimento desta orientação. De<br />
acordo com o MICS 2008, embora a maior<br />
parte das mulheres grávidas atendidas nas<br />
consultas pré-natais tenham sido pesadas<br />
durante consultas, apenas 52 por cento<br />
foram informadas sobre os sintomas de<br />
complicações de saúde relacionadas com a<br />
gravidez, 48 por cento mediram a altura, 36<br />
por cento foram solicitadas a fornecer uma<br />
amostra de urina, e 47 por cento fizeram<br />
colheita de sangue para testes de HIV. Além<br />
disso, apenas pouco mais de metade das<br />
mulheres (59 por cento) foram aconselhadas<br />
Figura 3.20: Mulheres atendidas pelo menos uma vez por pessoal de saúde qualificado durante a gravidez,<br />
1997, 2003 e 2008<br />
85%<br />
86%<br />
x<br />
Considera-se que uma mulher está desnutrida quando o rácio altura-peso, usado para calcular o índice de massa<br />
corporal, é inferior a 18,5.<br />
0%<br />
Fonte: IDS 1997e 2003, MICS 2008.<br />
1997 2003 2008<br />
70<br />
71
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
sobre o HIV e a SIDA. Estes resultados<br />
revelam a fraca qualidade geral dos cuidados<br />
de saúde primários em Moçambique, e a<br />
necessidade urgente de formação de pessoal<br />
de nível médio e básico, a fim de manter<br />
níveis aceitáveis de serviços de saúde<br />
materna.<br />
Em 2003, apenas 48 por cento dos partos<br />
foram assistidos por pessoal de saúde<br />
qualificado, 60 percentagem esta que<br />
aumentou para 55 por cento em 2008. 61<br />
As províncias com menor percentagem de<br />
partos assistidos por pessoal qualificado<br />
foram Manica (33 por cento) e Zambézia (38<br />
por cento). A grande maioria dos cuidados<br />
pré-natais é prestada por enfermeiras e<br />
parteiras (53 por cento em 2008), sendo<br />
os médicos responsáveis por apenas<br />
2 por cento dos cuidados pré-natais<br />
proporcionados globalmente. O acesso a<br />
profissionais de saúde qualificados durante<br />
o parto e a partos institucionais está<br />
correlacionado com a riqueza. Noventa por<br />
cento das mulheres no quintil mais elevado<br />
de riqueza deu à luz numa unidade sanitária,<br />
contra 30 por cento das mulheres no quintil<br />
mais baixo (Figura 3.21). 62<br />
O nível de cuidados pós-parto também<br />
continua baixo. Cerca de 60 por cento<br />
das mulheres que tiveram partos não<br />
institucionais não receberam qualquer<br />
tipo de cuidados pós-parto, e apenas 12<br />
por cento foram a algum tipo de unidade<br />
sanitária até dois dias após o parto. 63<br />
Considerando a necessidade de intervenções<br />
comunitárias para atingir estas mães, foi<br />
incluída, a partir de 2008, uma componente<br />
de cuidados neonatais nos pacotes de<br />
Atenção Integrada às Doenças da Infância<br />
(AIDI) e Atenção Comunitária Integrada às<br />
Doenças da Infância (C-AIDI), alterando as<br />
siglas para Atenção Integrada às Doenças<br />
Neonatais e da Infância (AIDNI) e Atenção<br />
Comunitária Integrada às Doenças Neonatais<br />
e da Infância (C-AIDNI), respectivamente.<br />
Para expandir os serviços comunitários de<br />
saúde preventiva e curativa, o Ministério<br />
da Saúde, em colaboração com os seus<br />
parceiros, desenvolveu manuais de formação<br />
para implementar um modelo adequado de<br />
cuidados para recém-nascidos, abrangentes<br />
e baseados na comunidade, que inclui<br />
visitas domiciliárias a serem efectuadas em<br />
dias-chave durante o primeiro mês de vida<br />
(dias 3, 7, 14 e 28), para identificar sinais<br />
Figura 3.21: Percentagem de mulheres que beneficiaram de cuidados pré-natais e deram à luz em unidades<br />
sanitárias, por quintil de riqueza, 2008<br />
100%<br />
80%<br />
60%<br />
40%<br />
20%<br />
0%<br />
82%<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
38%<br />
85%<br />
48%<br />
89%<br />
57%<br />
Recebe apoio pré-natal de pessoal habilitado<br />
95%<br />
68%<br />
98%<br />
90%<br />
Mais baixo Segundo Médio Quarto Mais elevado Total<br />
89%<br />
58%<br />
Deu à luz num estabelecimento de saúde<br />
de perigo e providenciar encaminhamento<br />
atempado. A formação de formadores foi<br />
realizada nas três regiões do país em 2008,<br />
enquanto a de agentes comunitários de<br />
saúde na implementação de AIDNI a nível<br />
da comunidade iniciou em alguns distritos<br />
abrangidos pela estratégia “Atingir Cada<br />
Distrito” (RED – Reach each District). Em<br />
2009, perto de 450 agentes comunitários<br />
de saúde foram treinados em C-AIDNI, em<br />
resultado do que mais de quatro mil recémnascidos<br />
(3 por cento dos partos previstos)<br />
em 21 distritos de 7 províncias receberam<br />
visitas domiciliárias no seu primeiro mês<br />
de vida. Entre eles, mais de 1.100 (28 por<br />
cento) foram encaminhados para centros de<br />
saúde em 2009. 64 A revitalização em curso do<br />
programa de agentes de saúde comunitários<br />
com trabalhadores remunerados vai reforçar<br />
e ampliar ainda mais estas intervenções com<br />
Cuidados Domiciliários Maternos, Infantis e<br />
para o Recém-nascido abrangentes.<br />
A anemia e a deficiência de vitamina A estão<br />
entre os principais problemas nutricionais<br />
que afectam as mulheres, particularmente<br />
as grávidas e a amamentar. A pesquisa<br />
nacional de 2002 sobre deficiência de<br />
vitamina A e anemia e malária em crianças<br />
menores de cinco anos e suas mães, revelou<br />
que 70 por cento das mulheres grávidas<br />
sofria de anemia, contra 48 por cento de<br />
mulheres não grávidas, 65 e que apenas 61<br />
por cento das mulheres grávidas tomaram<br />
ferro e suplementos de ácido fólico durante<br />
a gravidez. 66 Estes resultados ilustram os<br />
baixos níveis de cumprimento da actual<br />
política nacional de suplementação de ferro<br />
e ácido fólico para mulheres grávidas.<br />
2.4. Doenças da infância<br />
Uma importante intervenção de saúde<br />
pública para abordar as doenças da infância<br />
foi o desenvolvimento do programa de<br />
AIDI (Atenção Integrada às Doenças da<br />
Infância), que tem três componentes: a<br />
capacitação de profissionais de saúde,<br />
o fortalecimento do sistema de saúde e<br />
o melhoramento das práticas de saúde<br />
da família e da comunidade. A AIDI foi<br />
introduzida em Moçambique em 1998,<br />
quando o Ministério da Saúde iniciou a<br />
implementação gradual, começando em<br />
29 distritos. Desde então, a cobertura do<br />
programa de AIDI tem aumentado. Segundo<br />
revela a Avaliação Anual Conjunta de 2008<br />
sobre o desempenho do sistema de saúde,<br />
cerca de 90 por cento dos serviços de saúde<br />
em todo o país estavam a implementar a<br />
Atenção Integrada às Doenças Neonatais e<br />
da Infância, em comparação com cerca de 50<br />
por cento em 2005. 67<br />
A AIDNI é um dos pilares fundamentais<br />
da estratégia de Sobrevivência e<br />
Desenvolvimento Acelerados da Criança,<br />
com potencial, se aplicado na íntegra e<br />
incluindo uma componente comunitária,<br />
para evitar até um terço do total de mortes<br />
de crianças.<br />
Apesar do importante progresso registado<br />
na redução de doenças da infância, a<br />
situação global continua assustadora.<br />
Apresentam-se em seguida, mais<br />
pormenorizadamente, os sucessos e<br />
desafios particulares na luta contra doenças<br />
da infância em Moçambique, nas áreas da<br />
malária, infecções respiratórias agudas,<br />
diarreia e doenças preveníveis por vacina.<br />
2.5. Malária<br />
O Estudo Nacional sobre Mortalidade<br />
Infantil 2008, confirma a malária como a<br />
principal causa de morte de crianças em<br />
Moçambique. 68 Trinta e três por cento das<br />
mortes de crianças menores de cinco anos<br />
são atribuídas à malária. Entre as crianças<br />
de 1-5 anos, as mortes atribuídas à malária<br />
chegam a 46 por cento. Para além de ser<br />
a principal causa de morte de crianças de<br />
tenra idade, a malária é também responsável<br />
por 40 por cento de todas as consultas<br />
externas, e aproximadamente 60 por cento<br />
dos doentes internados em enfermarias<br />
pediátricas necessitam de tratamento<br />
para malária grave, colocando um peso<br />
significativo sobre os recursos da saúde.<br />
72<br />
73
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
A prevalência de malária pouco mudou<br />
durante o período entre uma pesquisa<br />
nacional realizada em 2002 e o Inquérito<br />
Indicador de Malária (Malaria Indicator<br />
Survey), de 2007, 69 que registou uma<br />
prevalência global de 51 por cento (27 por<br />
cento nas zonas urbanas e 58 por cento<br />
nas zonas rurais). xi Apesar dos níveis<br />
semelhantes de prevalência global, foram<br />
observadas importantes reduções em áreas<br />
do país onde se verificou uma expansão<br />
das intervenções contra a malária, como a<br />
província de Maputo.<br />
Trinta e seis por cento das crianças<br />
com febre receberam medicamentos<br />
antimaláricos em 2008, comparativamente<br />
a 15 por cento de 2003 (ver Figura 3.22). 70<br />
Embora esta taxa esteja ainda aquém das<br />
metas revistas do programa “Fazer Recuar<br />
a Malária” xii , 71 representa uma melhoria<br />
significativa. Foram observadas grandes<br />
reduções em casos de infecção em áreas do<br />
país onde houve expansão das intervenções<br />
da prevenção e controlo da malária, como,<br />
por exemplo, na província de Maputo,<br />
onde a prevalência da malária diminuiu<br />
drasticamente.<br />
As baixas taxas de tratamento adequado<br />
relatadas indicam, por um lado, deficiente<br />
conhecimento e procura de tratamento nos<br />
prestadores de cuidados (apenas 60 por<br />
cento das crianças com febre foram levadas<br />
a um centro de saúde, de acordo com o<br />
Inquérito Indicador de Malária 2007) e, por<br />
outro, o baixo acesso aos serviços de saúde.<br />
Fora do sistema formal de saúde, somente<br />
as farmácias registadas e algumas lojas<br />
especificamente registadas podem fornecer<br />
medicamentos antimaláricos, tornando<br />
assim difícil o acesso a tratamento rápido,<br />
especialmente em áreas rurais carentes.<br />
O tratamento da malária está igualmente<br />
Figura 3.22: Percentagem de crianças que receberam tratamento adequado para malária, 2003 e 2008<br />
40%<br />
35%<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
15%<br />
8%<br />
Crianças com febre que receberam<br />
anti-maláricos<br />
37%<br />
2003 2008<br />
36%<br />
Crianças com febre que receberam<br />
anti-maláricos (no prazo de 24 horas)<br />
disponível a nível comunitário em partes<br />
seleccionadas do país, onde é administrado<br />
por agentes comunitários de saúde,<br />
conhecidos como Agentes Polivalentes<br />
Elementares. Os trabalhadores de saúde das<br />
aldeias, designados Socorristas e formados<br />
pela World Relief, estão também autorizados<br />
a tratar a malária a nível da comunidade em<br />
Gaza. Espera-se que a revitalização em curso<br />
do programa dos APEs que está a ser levada<br />
a cabo pelo Governo melhore a situação.<br />
A situação respeitante a prevenção e<br />
controlo da malária é mais positiva do que<br />
a relativa ao tratamento rápido e eficaz. O<br />
Governo de Moçambique promove o uso<br />
de dois instrumentos igualmente eficazes<br />
para o controlo e prevenção da malária: a<br />
pulverização residual de superfícies interiores<br />
das casas (PIDOM) com insecticidas de<br />
longa duração e o uso de redes mosquiteiras<br />
tratadas com insecticida de longa duração.<br />
O Governo identificou a PIDOM como uma<br />
estratégia fundamental para o controlo<br />
e prevenção da malária no PARPA II,<br />
estabelecendo uma meta de cobertura de 50<br />
por cento desta intervenção até 2009, contra<br />
os cerca de 18 por cento registados em<br />
2005. Esta meta do PARPA já foi alcançada,<br />
com mais de 50 por cento da população a<br />
ser coberta com acções de PIDOM, embora<br />
subsistam perguntas a respeito da qualidade<br />
da pulverização realizada e da precisão dos<br />
dados de cobertura.<br />
Em 2000, foram introduzidos pela<br />
primeira vez no sistema de saúde pública,<br />
nas províncias da Zambézia e Gaza,<br />
dois importantes programas de redes<br />
mosquiteiras tratadas com insecticida.<br />
Até meados de 2009, havia programas de<br />
distribuição de redes mosquiteiras tratadas<br />
com insecticida de longa duração em todas<br />
as dez províncias e na Cidade de Maputo.<br />
As redes mosquiteiras são distribuídas a<br />
mulheres grávidas através dos serviços de<br />
cuidados pré-natais e a crianças menores<br />
de cinco anos através de campanhas, como<br />
as Semanas de Saúde da Criança. A partir<br />
de 2009, o Governo introduziu uma política<br />
de acesso universal a redes mosquiteiras<br />
tratadas com insecticida de longa duração.<br />
A cobertura de crianças com menos de cinco<br />
após as actividades da campanha em 2009<br />
é estimada em cerca de 93 por cento nos<br />
distritos não pulverizados, e cerca de 54 por<br />
cento a nível nacional. 72<br />
A posse de redes mosquiteiras à escala<br />
nacional passou de 18 por cento de famílias<br />
que possuíam pelo menos uma rede<br />
mosquiteira em 2003 para 65 por cento em<br />
2008. 73 No entanto, apenas 31 por cento<br />
dos agregados familiares relataram possuir<br />
uma rede tratada com insecticida. xiii A<br />
percentagem de crianças que reportaram ter<br />
dormido sob uma rede mosquiteira na noite<br />
anterior à pesquisa aumentou de 10 por<br />
cento em 2003 para 42 por cento em 2008.<br />
Destes 42 por cento, 23 por cento usaram<br />
uma rede tratada. 74 Em 2008, 74 por cento<br />
das mulheres grávidas em todo o país havia<br />
recebido uma rede mosquiteira tratada com<br />
insecticida de longa duração, contra apenas<br />
46 por cento em 2007. 75<br />
Devido à expansão da cobertura de redes<br />
mosquiteiras tratadas com insecticida e da<br />
pulverização residual de interiores, foram<br />
cumpridas as metas de prevenção do<br />
“Fazer Recuar a Malária” para 2010. xiv No<br />
entanto, apesar dos sinais encorajadores<br />
de progresso, a cobertura com redes<br />
mosquiteiras tratadas, que são duas vezes<br />
mais eficazes que as redes sem tratamento,<br />
continua muito abaixo das metas nacionais e<br />
Fonte: IDS 2003, MICS 2008.<br />
xi O Inquérito Indicador de Malária usou os recentemente desenvolvidos Testes de Diagnóstico Rápido para avaliar a<br />
presença de parasitas da malária.<br />
xii A Cimeira de Abuja sobre o Fazer Recuar a Malária, de 2000, estabeleceu uma meta de, até 2005, 60 por cento dos<br />
doentes de malária poderem ter acesso a e usar medicamentos correctos, acessíveis e apropriados no prazo de 24 horas.<br />
xiii Antes da introdução de redes mosquiteiras tratadas com insecticida de longa duração, que não requerem tratamento<br />
durante o seu tempo de vida útil de três a cinco anos, as redes tinham de ser submetidas a novo tratamento com<br />
insecticida de seis em seis meses, para garantir a sua eficácia contínua. Todas as redes mosquiteiras distribuídas depois<br />
de 2006 são de longa duração.<br />
xiv As metas do programa “Fazer Recuar a Malária” para 2010 são as seguintes: 80 por cento da população protegida da<br />
malária através de PIDOM ou Redes Mosquiteiras Tratadas com Insecticida de Longa Duração, 80 por cento de pessoas<br />
capazes de receber tratamento efectivo num prazo de 24 horas, e 80 por cento de mulheres grávidas capazes de receber<br />
Tratamento Preventivo Intermitente contra a malária durante a gravidez.<br />
74<br />
75
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
internacionais. Além disso, a posse familiar<br />
de redes mosquiteiras não se traduz num<br />
uso efectivo das redes por crianças menores<br />
de cinco anos e mulheres grávidas, os dois<br />
grupos populacionais de maior risco de<br />
doença grave e morte por malária.<br />
Considera-se que, anualmente, chegam a um<br />
milhão as gravidezes na África subsaariana<br />
que têm complicações devido a co-infecção<br />
de malária e HIV. 76 Tanto a infecção com<br />
malária como por HIV durante a gravidez<br />
estão associadas a anemia materna, baixo<br />
peso à nascença e mortalidade materna e<br />
infantil, apresentando a infecção por HIV um<br />
maior risco de malária. Em presença de coinfecção,<br />
a prevalência de anemia e baixo<br />
peso à nascença pode ultrapassar os 35<br />
por cento. 77 A OMS agora recomenda o uso<br />
de tratamento preventivo intermitente xv e<br />
redes mosquiteiras tratadas com insecticida<br />
para todas as mulheres grávidas que<br />
vivam em áreas de alto risco de malária.<br />
De forma correspondente, o Ministério da<br />
Saúde em Moçambique também reforçou<br />
o tratamento preventivo e introduziu o<br />
tratamento preventivo intermitente em 2006.<br />
Em 2008, o MICS registou que 67 por cento<br />
das mulheres grávidas tinham recebido<br />
tratamento preventivo intermitente, o que<br />
não está muito longe da meta de 2010.<br />
2.6. Infecções respiratórias<br />
agudas<br />
Tal como a malária, as infecções<br />
respiratórias agudas (IRA) constituem<br />
uma das principais causas de morbilidade<br />
e mortalidade entre as crianças em<br />
Moçambique, sendo a pneumonia a mais<br />
grave de entre elas. Segundo estimativas<br />
da OMS, 60 por cento das mortes causadas<br />
por IRA poderiam ser evitadas com o uso<br />
selectivo de antibióticos, mas o sucesso do<br />
tratamento depende de detecção precoce e<br />
do acesso a unidades médicas.<br />
A percentagem de crianças menores de<br />
cinco anos com sintomas de pneumonia<br />
reduziu de 10 por cento em 2003 para 5 por<br />
cento em 2008. Em 2008, cerca de 65 por<br />
cento das crianças com sintomas de IRA<br />
foram levadas a uma unidade sanitária. 78<br />
A prevalência de sintomas de IRA em crianças<br />
que vivem em áreas urbanas era maior do<br />
que nas que vivem em áreas rurais (12 e 9 por<br />
cento, respectivamente). A percentagem de<br />
crianças com sintomas na Cidade de Maputo<br />
era cinco vezes superior à de Tete (ver Figura<br />
3.23) 79 , o que poderia ser explicado pela<br />
maior densidade populacional da Cidade<br />
de Maputo, uma vez que as IRA podem<br />
propagar-se ou agravar-se com superlotação<br />
das habitações, ambientes de vida de má<br />
qualidade ou poluição. A menor prevalência<br />
em crianças de famílias mais pobres ou<br />
menos escolarizadas pode ser explicada<br />
pelo facto de a maioria das pessoas mais<br />
escolarizadas viver em áreas urbanas.<br />
Existe uma grande disparidade na<br />
percentagem de crianças que recebem<br />
tratamento para as IRA (ver Figura 3.24).<br />
As crianças das famílias em melhores<br />
condições e aquelas cujas mães tinham pelo<br />
menos o ensino primário têm muito mais<br />
probabilidade de receber tratamento para<br />
sintomas de IRA do que as de áreas rurais,<br />
de famílias pobres e aquelas cujas mães não<br />
tinham escolarização. Não foi observada<br />
nenhuma relação entre o nível educacional<br />
da mãe e a sua capacidade de reconhecer os<br />
sintomas de pneumonia, o que indica que o<br />
sistema de ensino deve incidir mais sobre<br />
questões de saúde familiar. 80<br />
2.7. Doenças diarreicas<br />
A diarreia é outra importante causa de<br />
morbilidade e mortalidade infantil em<br />
Moçambique. Torna-se mais frequente em<br />
crianças com seis ou mais meses de idade,<br />
quando começam a gatinhar e a comer<br />
alimentos complementares, e estimativas<br />
globais recentes indicam que é causa de<br />
morte, anualmente, de 1,5 milhões de<br />
crianças. 83 A Organização Mundial de Saúde<br />
estimou que em 2007, em Moçambique,<br />
26.900 mortes por ano se deviam a<br />
doenças diarreicas relacionadas com água,<br />
saneamento e higiene. 84<br />
Os dados do MICS de 2008 indicam que<br />
doenças diarreicas são a quinta maior causa<br />
de mortalidade de crianças menores de<br />
cinco. Esta estimativa é apoiada pelo Estudo<br />
Nacional sobre a Mortalidade Infantil 2009,<br />
segundo o qual as doenças gastro-intestinais<br />
infecciosas contribuem com quase sete<br />
Figura 3.23: Prevalência de infecções respiratórias agudas, por província, em 2008<br />
12%<br />
10%<br />
8%<br />
6%<br />
4%<br />
6%<br />
2%<br />
3%<br />
2%<br />
0%<br />
Niassa Manica Cabo<br />
Delgado<br />
Fonte: MICS, 2008.<br />
3% 3%<br />
6%<br />
por cento do número total de óbitos. 85 As<br />
doenças diarreicas são responsáveis por uma<br />
percentagem relativamente mais elevada<br />
do total de óbitos de menores de cinco<br />
anos em Inhambane (12 por cento) e Cabo<br />
Delgado (11 por cento) e uma percentagem<br />
ligeiramente maior de mortes de rapazes do<br />
que de raparigas em todas as faixas etárias,<br />
desde pós-neonatais até menores de cinco<br />
anos. O MICS 2008, também indica ter havido<br />
um aumento na prevalência de doenças<br />
diarreicas em crianças menores de cinco<br />
anos, de 14 por cento em 2003 para 18 por<br />
cento em 2008. A mais elevada prevalência<br />
de diarreia foi registada em Nampula (23<br />
por cento), e a mais baixa na província do<br />
Tete Sofala Maputo Maputo Zambézia<br />
Cidade Província<br />
Nampula<br />
Inhambane<br />
Figura 3.24: Percentagem de crianças menores de cinco anos que recebem tratamento adequado para infecções<br />
respiratórias agudas por província, 2008<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
69%<br />
78%<br />
71%<br />
62%<br />
45%<br />
74%<br />
5%<br />
59%<br />
2%<br />
70%<br />
7%<br />
56%<br />
6%<br />
71%<br />
10%<br />
Gaza<br />
47%<br />
5%<br />
Total<br />
65%<br />
xv Definido como a provisão de, pelo menos, duas doses de tratamento de sulfadoxina+pirimetamina durante as as<br />
consultas pré-natais de rotina.<br />
0%<br />
Niassa Cabo<br />
Delgado<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Gaza<br />
Maputo Maputo<br />
Província Cidade<br />
Total<br />
76<br />
77
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
Tabela 3.2: Casos de cólera em Moçambique, 2007-2010<br />
Ano<br />
Nº de casos<br />
de cólera<br />
Número<br />
de óbitos<br />
Taxa de<br />
letalidade<br />
2007 1073 16 1,4% A partir da 41ª semana (Outubro-Dezembro de 2007)<br />
2008 12306 157 1,3% Dezembro-Janeiro de 2008<br />
2009 19088 150 0,8% Janeiro-Dezembro 2009<br />
2010 4129 56 1,4% Referente à 21ª semana epidemiológica<br />
Pelo olhar<br />
de uma<br />
criança<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
Fonte: Ministério da Saúde, Manual de Prevenção e Controlo da Cólera e de Outras Diarreias Agudas, Governo de Moçambique,<br />
Maputo.<br />
Niassa (13 por cento). As crianças com baixa<br />
altura para a idade parecem ter diarreia mais<br />
frequentemente do que as crianças sem esse<br />
défice, tendo-se verificado que 51 por cento<br />
das que apresentavam baixa altura para a<br />
idade tiveram diarreia nas duas semanas<br />
anteriores à pesquisa, em comparação com<br />
37 por cento das crianças sem tal défice. 86<br />
Quase metade (47 por cento) das crianças<br />
(com idades entre 0-5 anos) com diarreia<br />
foram submetidas a terapia de reidratação<br />
oral e continuaram com o aleitamento<br />
materno normal. O zinco ainda não está a ser<br />
usado sistematicamente para tratar a diarreia<br />
em Moçambique. A introdução de zinco e da<br />
gestão de casos a nível da comunidade por<br />
agentes de saúde comunitários treinados<br />
melhorará ainda mais os resultados e<br />
acelerará a redução da mortalidade infantil de<br />
menores de cinco anos.<br />
2.8. Cólera<br />
Devido aos baixos níveis de cobertura de<br />
saneamento, tem-se registado um elevado<br />
número de casos de cólera ao longo dos<br />
anos em Moçambique (ver Tabela 3.2).<br />
De 1992 a 2004, os casos de cólera em<br />
Moçambique representavam entre um terço<br />
e um quinto de todos os casos africanos. 87<br />
Em 1997/98, um surto de cólera resultou em<br />
50.000 casos e 1.353 óbitos, com uma taxa<br />
de letalidade de 3,2 por cento.88 Os factores<br />
que contribuem para surtos de cólera em<br />
Moçambique são: falta de saneamento<br />
básico e condições de higiene precárias,<br />
escassez e falta de acesso a água potável,<br />
inadequada eliminação de resíduos, fracas<br />
condições económicas das comunidades;<br />
secas e inundações recorrentes; alta<br />
densidade populacional e urbanização<br />
deficientemente planeada.<br />
Para resolver a fraca situação de saneamento<br />
no país, o Governo de Moçambique lançou<br />
uma campanha de saneamento em 2008 que<br />
incidiu sobre a lavagem das mãos, construção<br />
e utilização de latrinas, fornecimento de<br />
água potável e eliminação de lixo, e está<br />
a ser finalizado um plano multissectorial e<br />
multianual de prevenção da cólera.<br />
2.9. Doenças preveníveis por<br />
vacinação e imunização<br />
O Programa Alargado de Vacinação nacional<br />
registou substanciais progressos nos<br />
últimos anos. Moçambique aumentou as<br />
suas taxas de vacinação contra sarampo<br />
e difteria-tétano-tosse convulsa (DPT3) de<br />
cerca de 50 por cento em 1991 para 70-80<br />
por cento em 2007.89 Foram introduzidas<br />
duas novas vacinas, as de hepatite B e<br />
Haemophilus influenzae, havendo planos<br />
para a introdução de vacinas contra rotavírus<br />
e pneumococcus.<br />
Para tentar ultrapassar a baixa cobertura e<br />
as desigualdades na cobertura entre áreas<br />
rurais e urbanas, entre províncias e entre<br />
quintis de riqueza, o Ministério da Saúde<br />
introduziu a abordagem Atingir Cada Distrito,<br />
que incide sobre a capacitação dos distritos,<br />
profissionais de saúde e comunidades para<br />
melhorar a vacinação e outros serviços<br />
de sobrevivência materna e infantil. A<br />
abordagem “Atingir Cada Distrito está a ser<br />
“Esta imagem mostra de onde acarretamos<br />
água. É um lugar cheio de lixo, matope e<br />
água suja. Isto não é bom, pois podemos<br />
acabar por apanhar cólera e outras doenças.<br />
Os miúdos brincam nesta água porque não<br />
temos jardins infantis e parques. As crianças<br />
ficam doentes.”<br />
“Uma pessoa recebe melhor tratamento<br />
quando tem algum familiar a trabalhar num<br />
hospital”.<br />
“A maioria de nós não tem nenhum hospital<br />
na comunidade; os mais próximos ficam a<br />
aproximadamente 3,5-5 km das nossas casas.<br />
Muitos temos de ir a pé para o hospital.<br />
Andar a pé quando estamos doentes cansa<br />
muito. Às vezes, conseguimos ir ao hospital,<br />
outras vezes não conseguimos pagar as<br />
taxas. Muitos de nós temos marcas nos<br />
braços, não sabemos por quê, mas não temos<br />
condições para ir ao médico ver o que é.”<br />
“No hospital, pedem dinheiro por cada<br />
coisa pequena. Até onde podemos pagar?<br />
E quando estamos doentes e nos pedem<br />
dinheiro, ficamos tristes e aborrecidos.<br />
Quando crescermos, e se viermos a ser<br />
médicos, vamos sempre cuidar dos pobres<br />
em primeiro lugar, porque sabemos como<br />
uma pessoa se sente quando alguém não lhe<br />
presta atenção só porque não tem dinheiro.<br />
-Argentina, 16 anos<br />
Fonte: Virgi Sajan, Zainul, 2010.<br />
78<br />
79
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
Figura 3.25: Vacinação de crianças de 12-23 meses por antígeno, em 1997, 2003 e 2008<br />
100%<br />
90%<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
86% 87%<br />
78%<br />
71%<br />
67%<br />
58%<br />
54%<br />
BCG DTP3 Pólio 3 Sarampo Todos Nenhum<br />
1997 2003 2008<br />
Fonte: IDS 1997 e 2003, MICS 2008.<br />
actualmente usada pelo Ministério da Saúde<br />
como plataforma para atingir os ODM 4 e 5.<br />
70%<br />
65%<br />
Em 2008, oitenta e sete por cento das<br />
crianças com menos de um ano tinham<br />
sido vacinadas contra a tuberculose, e 71<br />
e 70 tinham recebido as vacinas de DPT3 e<br />
poliomielite 3, respectivamente. Sessenta<br />
e quatro por cento das crianças estavam<br />
vacinadas contra o sarampo. As crianças a<br />
residir em áreas urbanas ainda têm mais<br />
probabilidade de ser vacinadas do que as<br />
das áreas rurais. Cinquenta e cinco por cento<br />
das crianças entre os 12 e os 23 meses de<br />
idade nas zonas rurais receberam todas as<br />
vacinas, contra 74 por cento das residentes<br />
em áreas urbanas. Onze por cento das<br />
crianças em áreas rurais não receberam<br />
nenhuma vacina, comparativamente a<br />
quatro por cento das zonas urbanas. 90<br />
A cobertura da vacinação contra o<br />
sarampo em Moçambique melhorou<br />
substancialmente em 2005, após a realização<br />
de uma campanha nacional de vacinação<br />
que atingiu 95 por cento das crianças com<br />
idades compreendidas entre os 9 meses e os<br />
55%<br />
70%<br />
63%<br />
53%<br />
48%<br />
44%<br />
20%<br />
11% 9%<br />
14 anos. Uma continuação desta campanha<br />
de vacinação contra o sarampo durante a<br />
segunda fase das Semanas de Saúde da<br />
Criança, em 2008, chegou a 99 por cento das<br />
crianças de 9-59 meses. 91 Como resultado<br />
destas campanhas e dos serviços de rotina<br />
reforçados através da abordagem “Atingir<br />
Cada Distrito”, houve uma diminuição<br />
substancial do número de casos de sarampo<br />
notificados no país. Está prevista uma outra<br />
campanha subsequente para 2011.<br />
Desde 2008 que o Governo de Moçambique<br />
tem vindo a implementar, duas vezes por<br />
ano, Semanas Nacionais de Saúde da<br />
Criança, para proporcionar a cada criança<br />
elegível uma oportunidade de usufruir<br />
de um pacote básico de intervenções de<br />
sobrevivência infantil. O objectivo específico<br />
deste programa nacional bianual de<br />
Semanas de Saúde da Criança é atingir pelo<br />
menos 80 por cento das crianças elegíveis<br />
menores de cinco anos com suplementação<br />
de vitamina A, além de outras intervenções<br />
de sobrevivência infantil. A partir de 2010<br />
o pacote foi alargado de forma a incluir<br />
elementos de saúde materna.<br />
2.10. HIV e SIDA<br />
A vulnerabilidade de um país aos efeitos<br />
de doenças infecciosas, incluindo a SIDA,<br />
depende, em grande medida, do nível de<br />
desenvolvimento humano alcançado por<br />
esse país. Nos países desenvolvidos, os<br />
indivíduos e a sociedade como um todo<br />
estão mais capazes de se proteger contra<br />
o impacto das doenças. Isto porque os<br />
países em desenvolvimento enfrentam<br />
limitações de recursos financeiros a nível<br />
nacional e dos agregados familiares, bem<br />
como reduzido capital humano decorrente<br />
da falta de oportunidades educativas e de<br />
acesso a outros serviços sociais básicos.<br />
Em Moçambique, o HIV e a SIDA afectam<br />
negativamente o desenvolvimento e<br />
dificultam o cumprimento dos direitos<br />
humanos, conforme se pode verificar em<br />
indicadores-chave, tais como esperança<br />
de vida à nascença, mortalidade infantil,<br />
frequência escolar, alfabetização e<br />
rendimento familiar, entre outros. 92<br />
Devido à natureza transversal da SIDA em<br />
Moçambique, esta doença é abordada no<br />
Capítulo 6, “Questões transversais”.<br />
Tabela 3.3: Análise comparativa das dotações para a saúde, 2007 e 2008<br />
2.11. Financiamento e alocação<br />
orçamental ao sector da<br />
saúde<br />
A percentagem do total de recursos<br />
financeiros à disposição do Governo que<br />
são alocados ao sector da saúde, incluindo<br />
financiamento externo, mostrou uma clara<br />
redução no período 2006-2010, passando<br />
de 13,4 por cento em 200693 para 8,4 por<br />
cento em 2010 94 . Este nível de financiamento<br />
está abaixo da meta de Abuja de atribuição<br />
de pelo menos 15 por cento do Orçamento<br />
do Estado ao sector de saúde. 95 Este<br />
sector continua a depender fortemente de<br />
financiamento externo; a percentagem do<br />
montante de recursos sectoriais financiados<br />
por fontes externas diminuiu de cerca de<br />
65 por cento em 2008 para perto de 39 por<br />
cento na proposta orçamental para 2010. 96<br />
Uma análise dos dados de 2008-2010 revela<br />
que tanto a componente de financiamento<br />
interno como a de financiamento externo do<br />
orçamento do sector da saúde diminuíram<br />
em termos reais.<br />
Do total do orçamento alocado ao Sistema<br />
Nacional de Saúde em 2010, 60 por cento<br />
Descrição Dotação Anual ($US) Variação<br />
2007 2008<br />
Orçamento do Estado (componente interna) 112.730.067 120.847.887 7%<br />
Fundos correntes 107.166.049 115.039.479 7%<br />
Fundos de investimento 5.564.018 5.808.408 4%<br />
Orçamento do Estado (componente externa) 111.788.250 90.610.103 -19%<br />
Fundo Global 49.384.580 64.794.092 31%<br />
Fundo Comum 96.750.494 93.956.010 -3%<br />
Prosaúde - Central 24.979.244 30.675.029 23%<br />
Prosaúde - Medicamentos 45.000.000 35.890.754 -20%<br />
Prosaúde - Provincial 26.771.250 27.390.229 20%<br />
Total 370.653.391 370.208.092 0%<br />
Fonte: Ministério da Saúde, Direcção de Administração e Finanças, Relatórios Financeiros (dados não publicados), 2007, 2008.<br />
80<br />
81
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
destinava-se ao Ministério da Saúde e 40 por<br />
cento às Direcções Provinciais de Saúde. Em<br />
termos de fundos de investimento, o nível<br />
provincial do Sistema Nacional de Saúde<br />
recebeu apenas 22 por cento do montante<br />
total. 97<br />
As disparidades no financiamento<br />
entre os níveis primário e terciário ou<br />
quaternário do sistema de saúde são<br />
de especial importância para a saúde e<br />
desenvolvimento das crianças, uma vez<br />
que os estabelecimentos de cuidados<br />
terciários e de nível superior tendem a estar<br />
concentrados nas zonas urbanas, enquanto<br />
muitas das doenças e condições que afectam<br />
as crianças (por exemplo, malária e doenças<br />
diarreicas) são mais comuns em áreas rurais<br />
e melhor geridas no nível primário de saúde.<br />
Além disso, os níveis terciário e superior<br />
do sistema de saúde tendem a centrar-se<br />
em cuidados curativos com mais baixa<br />
relação custo-eficácia, ao invés de cuidados<br />
preventivos.<br />
Figura 3.26: Dotações per capita para a saúde por província (meticais), 2009<br />
Meticais<br />
1000<br />
900<br />
800<br />
700<br />
600<br />
500<br />
400<br />
300<br />
200<br />
100<br />
0<br />
902<br />
Niassa<br />
878<br />
764<br />
Maputo Maputo<br />
Província Cidade<br />
711<br />
677<br />
O financiamento do orçamento do estado<br />
proposto para 2009 equivale a cerca de<br />
10,00 dólares americanos per capita. Se se<br />
considerar o financiamento total disponível<br />
para o sector da saúde, tanto do Orçamento<br />
de Estado como de outras fontes fora do<br />
orçamento, a despesa aumenta para cerca<br />
de 17,7 dólares por pessoa, dos quais 10,4<br />
foram realmente gastos em 2008 (embora<br />
o Relatório de Execução Orçamental não<br />
capture o financiamento vertical, reduzindo<br />
a despesa per capita registada, conforme<br />
adiante se apresenta). 98 Esta dotação para<br />
a saúde está em conformidade com o<br />
objectivo definido no PARPA II de aumentar<br />
a despesa de saúde para 15 dólares<br />
americanos per capita até 2009. 99 Apesar das<br />
melhorias demonstradas ao longo do tempo,<br />
a despesa de saúde per capita continua<br />
abaixo do mínimo recomendado para<br />
atender às necessidades básicas de saúde<br />
em países de baixo rendimento, conforme<br />
proposto pelo Banco Mundial e pela OMS,<br />
e também abaixo da média da África<br />
610<br />
599<br />
Tete<br />
579 562<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Sofala<br />
249 248<br />
Fonte: FDC e <strong>UNICEF</strong>, “O Que Diz a Proposta de Orçamento do Estado 2010 Sobre a Previsão de Recursos no Sector de Saúde?,<br />
Budget Brief 3, <strong>UNICEF</strong>, Maputo, 2010.<br />
Gaza Manica Inhambane<br />
Zambézia<br />
Nampula<br />
Subsaariana, estimada em 31,9 dólares<br />
americanos em 2002. xvi<br />
Em 2010, as dotações per capita para as<br />
províncias variaram entre 266 meticais por<br />
pessoa no Niassa a 74 Meticais por pessoa<br />
na Zambézia e 73 em Nampula (ver Figura<br />
3.26). O Comité dos Direitos da Criança<br />
levantou preocupações “sobre a repartição<br />
desigual dos recursos entre as províncias,<br />
com as mais baixas despesas atribuídas às<br />
províncias onde os indicadores de bem-estar<br />
das crianças, incluindo a pobreza infantil,<br />
se situam entre os piores do país”. 100 Igual<br />
preocupação foi também manifestada pelo<br />
grupo de doadores do G19, que continua a<br />
defender veementemente que o Governo<br />
deve introduzir uma fórmula ou um<br />
mecanismo de distribuição de financiamento<br />
provincial que leve em conta os diferentes<br />
Figura 3.27: Dotações para o sector da saúde, CFMP 2010-2012<br />
Milhões de Meticais<br />
8<br />
7<br />
6<br />
5<br />
4<br />
3<br />
2<br />
1<br />
0<br />
8%<br />
36%<br />
29%<br />
27%<br />
níveis de indicadores de desenvolvimento<br />
social. 101<br />
Nem todo o financiamento de doadores<br />
e todas as receitas internas do sector<br />
da saúde são capturados no Orçamento<br />
do Estado. Uma grande percentagem<br />
do financiamento de alguns parceiros é<br />
direccionada para projectos, continuando<br />
a ficar “fora do orçamento” (off budget).<br />
De acordo com o Relatório de Execução<br />
do Orçamento do Estado de 2008, cerca<br />
de 56 por cento do orçamento total do<br />
sector de saúde de 2008 consistiu em<br />
financiamento vertical, executado fora do<br />
controlo directo do Governo. O elevado<br />
grau de financiamento fora do orçamento<br />
prejudica a planificação sectorial, tendo<br />
levado o Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento e o Ministério das<br />
2009 2010 2011 2012<br />
Central<br />
2%<br />
35%<br />
35%<br />
28%<br />
Provincial<br />
Ano<br />
PROSAÚDE<br />
HIV/SIDA<br />
Fonte: Ministério de Planificação e Desenvolvimento e Ministério das Finanças, Cenário Fiscal de Médio Prazo 2010-2012,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, Setembro de 2009.<br />
xvi O Relatório do Desenvolvimento Mundial de 1993 recomendou um pacote mínimo de 12,00 dólares americanos per<br />
capita para países de baixo rendimento. Outras estimativas são: 9,24 dólares standard ao abrigo do programa “Melhor<br />
Saúde em África” (Banco Mundial, 1994) e 35,00 dólares americanos prescritos pela Comissão para Macroeconomia<br />
e Saúde da OMS (OMS, 2002) para atender às necessidades básicas de saúde até 2007. Os dados para a África<br />
Subsaariana foram obtidos do Banco Mundial (2005).<br />
2%<br />
32%<br />
37%<br />
29%<br />
1%<br />
30%<br />
40%<br />
30%<br />
82<br />
83
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
Finanças a tentarem melhorar a medida em<br />
que a ajuda externa se reflecte nos sistemas<br />
de gestão das finanças públicas do Governo.<br />
Esta iniciativa pode explicar parte do recente<br />
aumento registado na ajuda externa ao<br />
sector.<br />
No âmbito da introdução de uma<br />
Abordagem Sectorial Integrada (SWAp) na<br />
saúde em 2001, foram criados mecanismos<br />
de financiamento comum, que culminaram<br />
com a assinatura de um Memorando<br />
de Entendimento para o fundo comum<br />
PROSAÚDE, em 2003. Seguiu-se, em 2004,<br />
a criação do Fundo Comum Provincial e do<br />
Fundo Comum de Medicamentos. Em 2008,<br />
o Memorando PROSAÚDE foi actualizado, e<br />
os três Fundos Comuns foram fundidos num<br />
único Fundo Comum desligando PROSAÚDE<br />
II. O Fundo Comum PROSAUDE está dentro<br />
do orçamento (on-budget) e no tesouro<br />
(on-treasury). Os fundos “verticais” para<br />
doenças específicas estão a ser cada vez<br />
mais canalizados através do Fundo Comum<br />
PROSAÚDE II, o que torna significativamente<br />
mais fácil a quantificação do pacote de todos<br />
os recursos à disposição do Governo.<br />
O Relatório de Execução do Orçamento do<br />
Estado de 2009 constatou que a execução<br />
do orçamento do sector da saúde (menos<br />
HIV) aumentou nos últimos anos, tendo<br />
passado de 69 por cento em 2008 para 75<br />
por cento em 2009. A execução no domínio<br />
do HIV registou uma drástica redução no<br />
mesmo período, de 79 para 55 por cento. 102<br />
A execução orçamental no sector de saúde<br />
continua mais baixa que a maioria dos<br />
outros sectores, sendo uma das razões<br />
invocadas para esta diminuição o facto<br />
de o sector beneficiar mais do que outros<br />
de financiamento vertical. Por falta de<br />
informação sobre as despesas destes fundos,<br />
eles são registados como execução zero nos<br />
relatórios orçamentais, reduzindo assim os<br />
níveis gerais de execução do orçamento.<br />
3. Água e saneamento<br />
Nos últimos anos, Moçambique registou<br />
avanços significativos no abastecimento<br />
de água e no saneamento e higiene (ASH).<br />
Essas melhorias foram realizadas no<br />
quadro institucional e de políticas, tendo<br />
sido também criada uma estrutura de<br />
regulamentação que integra o Governo, o<br />
sector privado e os consumidores. Também<br />
se progrediu na descentralização da gestão.<br />
A maioria das reformas e dos investimentos,<br />
destinou-se, no entanto, ao abastecimento<br />
de água e saneamento nos grandes centros<br />
urbanos. 103 Os serviços de água rurais e<br />
peri-urbanos continuam frágeis e o acesso<br />
a saneamento e promoção da higiene,<br />
estão, em grande medida, estagnados,<br />
especialmente em áreas peri-urbanas. A<br />
capacidade institucional continua limitada,<br />
especialmente a nível local.<br />
O A Pobreza na Infância em Moçambique:<br />
Uma Análise da Situação e das Tendências<br />
2006 observou que a cobertura do<br />
abastecimento de água rural não tinha<br />
melhorado devido aos custos relativamente<br />
elevados envolvidos em Moçambique, em<br />
comparação com outros países da região. 104<br />
A partir de 2006, o Governo de Moçambique,<br />
com o apoio de parceiros, uniformizou<br />
os seus procedimentos de procurement e<br />
celebração de contratos e promoveu uma<br />
forte participação do sector privado, o que<br />
teve como consequência uma redução,<br />
na ordem dos 30 por cento, dos custos de<br />
construção de pontos de abastecimento de<br />
água rural. 105<br />
A Convenção sobre os Direitos da Criança<br />
obriga os Estados Membros a tomarem<br />
medidas adequadas para combater doenças<br />
e a desnutrição no âmbito dos cuidados<br />
de saúde primários, através, inter alia,<br />
da aplicação de tecnologias prontamente<br />
disponíveis e do fornecimento de alimentos<br />
nutritivos apropriados e água potável. A<br />
higiene e o saneamento estão também<br />
cobertos: a Convenção estabelece que os<br />
Estados Membros devem “garantir que todos<br />
os segmentos da sociedade, em especial<br />
os pais e as crianças, sejam informados,<br />
tenham acesso a educação e sejam apoiados<br />
na utilização de conhecimentos básicos<br />
de nutrição e saúde infantil, vantagens da<br />
amamentação, higiene e saneamento do<br />
meio, e prevenção de acidentes.”<br />
O principal quadro internacional para<br />
o sector de água e saneamento são os<br />
ODM, especificamente o Objectivo 7:<br />
Garantir a sustentabilidade ambiental. A<br />
meta específica relacionada com água e<br />
saneamento é a Meta 7c: “até 2015, reduzir<br />
a metade a percentagem de pessoas sem<br />
acesso a água potável e saneamento<br />
básico.” Os indicadores para avaliar o<br />
progresso na consecução desta meta<br />
incluem: a percentagem da população<br />
que utiliza uma fonte melhorada de água<br />
potável e a percentagem da população que<br />
usa instalações sanitárias melhoradas. 106 A<br />
melhoria do acesso a água e saneamento<br />
constitui uma prioridade-chave do governo<br />
no âmbito do pilar do capital humano do<br />
PARPA II, que reconhece a importância<br />
do aumento do acesso a fontes de água<br />
melhoradas e instalações sanitárias para a<br />
redução da pobreza.<br />
3.1. Quadro Institucional<br />
A Política Nacional da Água revista incide<br />
sobre descentralização, sustentabilidade,<br />
participação efectiva dos utentes, mudança<br />
dos papéis e responsabilidades do Governo,<br />
de implementador para facilitador, e<br />
maior envolvimento do sector privado,<br />
de organizações não governamentais e<br />
organizações comunitárias. Esta Política<br />
Nacional da Água tem como principais<br />
objectivos os seguintes:<br />
• l Satisfação das necessidades básicas de<br />
consumo humano de água. O objectivo a<br />
médio prazo está em conformidade com<br />
84<br />
85
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
a meta dos ODM de reduzir para metade<br />
o número de pessoas sem acesso a um<br />
abastecimento de água seguro e fiável.<br />
O objectivo a longo prazo é garantir o<br />
acesso universal a abastecimento de água<br />
segura e aumentar os níveis de serviço;<br />
• l Melhoria do saneamento como<br />
instrumento essencial para a redução de<br />
doenças transmitidas através da água<br />
(tais como cólera, malária e diarreia),<br />
melhoria da qualidade de vida e da<br />
conservação ambiental. Foram definidas<br />
metas separadas para áreas urbanas e<br />
áreas rurais, sendo o objectivo a longo<br />
prazo contribuir para o alcance do acesso<br />
universal a serviços de saneamento;<br />
• l Uso eficiente da água para<br />
desenvolvimento económico;<br />
• l Uso da água para conservação<br />
ambiental. A Política da Água promove<br />
a conservação da água como parte da<br />
gestão dos recursos hídricos;<br />
• l Redução da vulnerabilidade a cheias e<br />
secas através de melhor coordenação<br />
e planeamento, bem como prontidão e<br />
preparação de indivíduos, comunidades e<br />
instituições nas áreas afectadas;<br />
• l Gestão conjunta das bacias hidrográficas<br />
partilhadas para promover a paz e a<br />
integração regional.<br />
Através da Política Nacional da Água, o<br />
Governo reafirmou o seu compromisso<br />
político de alcançar as metas dos ODM<br />
relacionadas com água e saneamento, o que<br />
implica a provisão de serviços melhorados<br />
de água e saneamento para mais de sete<br />
milhões de moçambicanos nas zonas rurais,<br />
e três milhões em áreas urbanas, antes de<br />
2015.<br />
O Programa Nacional de Abastecimento<br />
de Água e Saneamento Rural, de 2009, 107<br />
é o quadro para a operacionalização e<br />
implementação do Plano Estratégico de<br />
Abastecimento de Água Rural (PESA-ASR)<br />
2006-2015 com vista à consecução da meta<br />
dos ODM de atingir, a nível nacional, 70<br />
por cento de cobertura de abastecimento<br />
de água rural e 50 por cento de cobertura<br />
de saneamento rural. O objectivo de<br />
desenvolvimento do programa é contribuir<br />
para a satisfação das necessidades<br />
humanas básicas, melhorar o bem-estar e<br />
contribuir para a redução da pobreza rural<br />
em Moçambique, através da melhoria do<br />
acesso a serviços de abastecimento de água<br />
e saneamento. O programa consiste em<br />
quatro componentes:<br />
• l Apoio ao aumento sustentável da<br />
cobertura de abastecimento de água e<br />
saneamento rural;<br />
• l Desenvolvimento de tecnologias<br />
apropriadas e modelos de gestão de<br />
abastecimento de água e saneamento<br />
rural;<br />
• l Capacitação e desenvolvimento de<br />
recursos humanos no subsector de<br />
abastecimento de água e saneamento<br />
rural;<br />
• l Apoio à planificação, gestão, monitorização<br />
e financiamento descentralizados de<br />
actividades de abastecimento de água e<br />
saneamento rural.<br />
O Programa Nacional de Abastecimento<br />
de Água e Saneamento Rural reconhece<br />
a necessidade de um quadro jurídico<br />
para a participação da comunidade,<br />
para permitir que as organizações<br />
comunitárias representem os membros<br />
da comunidade e ajam em seu nome<br />
no estabelecimento de compromissos<br />
vinculativos perante autoridades públicas<br />
e entidades privadas, na recolha e gestão<br />
de fundos, movimentação de contas<br />
bancárias, compras, pagamentos e<br />
celebração de acordos com governos locais,<br />
comerciantes, fornecedores, empreiteiros<br />
e outros. Duas leis, a Lei 15/2000, de 20<br />
de Junho de 2000, sobre a definição de<br />
autoridades comunitárias e sua relação<br />
com entidades estatais, e a Lei 8/91, de 18<br />
de Julho de 1991, que define as condições<br />
para a criação de associações legalmente<br />
reconhecidas, constituem o quadro jurídico<br />
para o funcionamento de organizações<br />
comunitárias. Tais leis podem ser aplicadas<br />
isoladamente ou em conjunto para constituir<br />
uma base jurídica para o funcionamento dos<br />
Comités de Água e Saneamento.<br />
3.2. Programa Nacional de<br />
Abastecimento de Água e<br />
Saneamento Rural<br />
Em 2010, foi criada uma nova Abordagem<br />
Sectorial Integrada (PRONASAR - Programa<br />
Nacional de Abastecimento de Água e<br />
Saneamento Rural) para o sector de água<br />
e saneamento, tendo como objectivos<br />
satisfazer necessidades humanas básicas,<br />
melhorar o bem-estar e contribuir para a<br />
redução da pobreza através de crescente<br />
uso e acesso a abastecimento de água<br />
e saneamento. O PRONASAR fornece<br />
o quadro para a operacionalização e<br />
implementação do Plano Estratégico da<br />
ARSA (PESA-ASR) e tem como objectivo<br />
corrigir os desequilíbrios nas taxas de<br />
acesso e utilização nas províncias e distritos,<br />
e promover a harmonização da ajuda e<br />
reforma institucional no subsector, com<br />
especial enfoque no desenvolvimento de<br />
capacidades a nível distrital, provincial e<br />
local. A implementação do PRONASAR,<br />
iniciada em 2010, será feita em duas<br />
fases, a saber, Fase I (2010-2012) e Fase<br />
II (2013-2015). Em 2008, foi criado um<br />
código de conduta para o sector da água,<br />
assinado pelo Governo e nove parceiros de<br />
desenvolvimento, que aplica os princípios<br />
da Declaração de Paris sobre a Eficácia<br />
da Ajuda, de 2005, ao sector da água<br />
em Moçambique. O <strong>UNICEF</strong> co-preside<br />
actualmente à Abordagem Sectorial<br />
Integrada PRONASAR.<br />
3.3. Abastecimento de água<br />
A percentagem de agregados familiares em<br />
Moçambique com acesso a água potável<br />
aumentou de 36 por cento em 2003 para 43<br />
em 2008, 108 sendo um poço não protegido a<br />
fonte de água mais comum. Ainda persistem<br />
grandes disparidades no acesso a água<br />
potável entre as áreas urbanas e rurais e<br />
entre as províncias. Quase todas as casas na<br />
Cidade de Maputo (94 por cento) têm acesso<br />
a água potável, em comparação com apenas<br />
24 por cento dos agregados familiares nas<br />
províncias da Zambézia e 30 por cento em<br />
Cabo Delgado. O acesso a água potável<br />
também varia consideravelmente entre os<br />
quintis de riqueza das famílias, com apenas<br />
13 por cento dos agregados familiares<br />
no quintil mais pobre com acesso a água<br />
Figura 3.28: Percentagem de agregados familiares com acesso a água potável, 2004 e 2008<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
66%<br />
36%<br />
23%<br />
2003 2008<br />
Urbana<br />
Rural<br />
Total<br />
Fonte: Instituto Nacional de Estatística, “Inquérito Integrado à Força de Trabalho (IFTRAB) 2004/05”, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2006 e MICS 2008.<br />
70%<br />
43%<br />
30%<br />
86<br />
87
Pelo olhar<br />
de uma<br />
criança<br />
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
“Acordo, todas as manhãs, às 5 horas para<br />
ir buscar água. Carrego pelo menos 20<br />
recipientes grandes de água, como se vê<br />
na foto. Quando acabo, estou muito, muito<br />
cansada.”<br />
“Não temos água canalizada em casa.<br />
É principalmente responsabilidade das<br />
crianças, especialmente meninas, acarretar<br />
água. Alguns de nós temos de fazer 20<br />
viagens por dia até ao poço. Algumas fontes<br />
de água ficam ainda mais longe, algumas<br />
mesmo a 60 minutos a pé. A água pesa<br />
muito na cabeça e os braços doem-nos de<br />
tanto carregar recipientes de 20 litros de<br />
água, sobretudo se não tivermos comido<br />
nada desde a noite anterior.<br />
Começamos a acarretar água todos os dias<br />
entre as 4 e as 5 horas, incluindo finais de<br />
semana. É difícil desviar de carros e camiões<br />
com recipientes de água à cabeça, enquanto<br />
tentamos atravessar as ruas movimentadas.<br />
Quando voltamos do poço depois de cartar<br />
água estamos sempre muito cansadas.<br />
Quando está calor lá fora e não temos água<br />
suficiente para beber, ficamos com fortes<br />
dores de cabeça.<br />
Não é seguro as meninas irem buscar água<br />
sozinhas. Mesmo quando estamos juntas,<br />
temos de tomar cuidado. No ano passado,<br />
mataram uma senhora que foi sozinha<br />
buscar a água às 3 horas da manhã, e uma<br />
rapariga caiu no poço de água e morreu<br />
logo. Isto assusta-nos, e por isso é que é<br />
importante irmos ao poço com alguém.”<br />
potável, contra os 85 por cento das famílias<br />
no quintil mais rico. 109 Além disso, apenas<br />
22 por cento dos domicílios sem acesso a<br />
água potável usam um método adequado<br />
de tratamento da água (por exemplo, fervêla),<br />
aumentando assim o risco de doenças<br />
transmitidas através da água. 110<br />
Existe uma grande disparidade entre as<br />
zonas urbanas e rurais: 77 por cento dos<br />
agregados familiares urbanos têm acesso a<br />
água potável, comparativamente a apenas<br />
34 por cento dos habitantes rurais. 111 Apesar<br />
das melhorias verificadas nas áreas urbanas,<br />
há um número significativo de habitantes<br />
das áreas peri-urbanas que carece de água<br />
potável e instalações sanitárias adequadas.<br />
As estimativas da cobertura de água e<br />
saneamento em algumas zonas periurbanas<br />
em Moçambique são de apenas<br />
10 por cento. 112 Dada a falta de saneamento<br />
adequado, sistemas de drenagem, gestão<br />
de resíduos e dadas precárias práticas<br />
de higiene, as áreas peri-urbanas são<br />
frequentemente um excelente local de<br />
proliferação de doenças gastro-intestinais<br />
e malária. As pessoas que vivem em áreas<br />
peri-urbanas em Moçambique encontramse,<br />
muitas vezes, entre as mais pobres<br />
e mais vulneráveis da sociedade, uma<br />
vez que não têm um rendimento estável<br />
nem terra arável para assegurar o seu<br />
próprio consumo alimentar. A densidade<br />
Figura 3.29: Uso de fonte de água melhorada por província, 2008<br />
120%<br />
100%<br />
80%<br />
60%<br />
40%<br />
20%<br />
49%<br />
36%<br />
46%<br />
26%<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
36% 37%<br />
populacional é elevada e, muitas vezes,<br />
as autoridades municipais não possuem<br />
recursos suficientes para prestar serviços<br />
para as zonas peri-urbanas. As epidemias<br />
de cólera e malária são mais comuns em<br />
assentamentos populacionais informais<br />
peri-urbanos do que em quaisquer outras<br />
áreas de Moçambique. 113 Devido à condições<br />
geográficas e climáticas – grande parte das<br />
áreas peri-urbanas seleccionadas encontrase<br />
em planícies aluviais, situadas abaixo do<br />
nível do mar – anualmente há inundações<br />
recorrentes e águas estagnadas após as<br />
chuvas que, combinadas com a prática de<br />
fecalismo a céu aberto e uso de latrinas<br />
não melhoradas vazando o seu conteúdo<br />
para o ambiente, constituem as principais<br />
causas de doença. Contrariamente ao<br />
abastecimento de água e saneamento<br />
rural, onde foi introduzida uma Abordagem<br />
Sectorial Integrada (SWAp), o saneamento<br />
nas zonas peri-urbanas ainda não tem sido<br />
matéria de prioridade.<br />
Estima-se que 5 por cento da população<br />
esteja a ser abastecida de água por um<br />
pequeno sistema canalizado. 114 Apesar de<br />
não se ter realizado nenhuma avaliação da<br />
situação, considera-se, de um modo geral,<br />
que uma grande parte destes sistemas não<br />
está operacional ou é deficiente, fornecendo<br />
água de forma irregular a apenas uma<br />
pequena percentagem de potenciais utentes.<br />
50%<br />
46%<br />
69%<br />
80%<br />
98%<br />
- Enya, 12 anos<br />
0%<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Gaza<br />
Maputo Maputo<br />
Província Cidade<br />
Fonte: Virgi Sajan, Zainul, 2010.<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
88<br />
89
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
A maioria destes sistemas é gerida pelo<br />
governo local e só funciona se as taxas de<br />
água forem subsidiadas.<br />
Para a grande maioria das famílias (95 por<br />
cento) que não têm qualquer acesso a água<br />
potável, são normalmente as mulheres<br />
adultas que acarretam água. O tempo<br />
médio para chegar a uma fonte de água é de<br />
pouco menos de uma hora (49 minutos), e<br />
são geralmente necessárias várias viagens<br />
por dia. Nos agregados familiares onde as<br />
crianças acarretam água, é muito maior a<br />
probabilidade de essa tarefa ser realizada<br />
por raparigas do que por rapazes. Os dados<br />
indicam que as raparigas acarretam água<br />
100<br />
90<br />
80<br />
70<br />
60<br />
50<br />
40<br />
30<br />
20<br />
10<br />
0<br />
22<br />
71<br />
52<br />
36 32<br />
54 55<br />
em 11 por cento das famílias nas províncias<br />
de Nampula e Gaza, com um percurso<br />
médio de 52 e 96 minutos, respectivamente,<br />
por viagem. Os homens das famílias em<br />
melhor situação têm cinco vezes mais<br />
probabilidades de acarretar água do que os<br />
homens das famílias mais pobres. 115<br />
Foi realizada uma análise de regressão<br />
multivariada para examinar mais<br />
profundamente os factores que influenciam<br />
o acesso de uma família a uma fonte de<br />
água melhorada, definida como sendo<br />
água proveniente de fontes que não sejam<br />
poços desprotegidos, lagos, rios ou lagoas<br />
(ver Figura 3.31). Os resultados mostram<br />
Figura 3.30: Tempo médio gasto para se chegar a uma fonte de água (em minutos), 2008<br />
Minutos<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
Niassa Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambezia<br />
Tete<br />
65<br />
Manica Sofala Inhambane<br />
96<br />
Gaza<br />
28<br />
15<br />
37<br />
Maputo Maputo Urban Rural Total<br />
Província Cidade<br />
Figura 3.31: Probabilidade de acesso a fonte de água melhorada, por classificação de riqueza 2008<br />
probabilidade de acesso a fonte<br />
de água melhorada<br />
0 . 2 . 4 . 6 . 8 1<br />
-1 -.5 0 .5 1 1.5 2 2.5 3<br />
Classificação da riqueza<br />
Urbana<br />
Rural<br />
53<br />
49<br />
que, para além das características do<br />
local, a riqueza das famílias é a variável<br />
explicativa mais importante no modelo, o<br />
que não constitui surpresa. Considerou-se,<br />
no entanto, que também outros factores<br />
desempenhavam um papel importante,<br />
como o facto de as famílias chefiadas por<br />
mulheres serem significativamente mais<br />
propensas a ter acesso a água potável do<br />
que as chefiadas por homens. O nível de<br />
escolaridade do chefe de família (nível<br />
secundário ou superior) está também<br />
significativamente correlacionado com o<br />
acesso a água potável. 116<br />
É interessante notar como as características<br />
do local, ou seja, a infra-estrutura deste,<br />
jogam o principal papel na explicação da<br />
qualidade da água. As famílias rurais têm<br />
significativamente menos probabilidades<br />
de acesso a uma fonte de água melhorada<br />
do que as de zonas urbanas (17 por cento),<br />
tal como todas as famílias que vivem fora<br />
da Cidade de Maputo, especialmente nas<br />
províncias do norte.<br />
3.4. Saneamento<br />
Figura 3.32: Acesso a saneamento seguro por localização geográfica, 2004 e 2008<br />
50%<br />
45%<br />
40%<br />
35%<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
34%<br />
12%<br />
4%<br />
O acesso a instalações sanitárias melhoradas<br />
continua baixo, particularmente nas áreas<br />
rurais e nas províncias do norte e centro.<br />
O acesso a saneamento seguro aumentou<br />
de 12 por cento dos agregados familiares<br />
em 2004 para 19 por cento em 2008. 117<br />
Há uma grande discrepância entre os<br />
agregados urbanos e os rurais, 47 e 6 por<br />
cento, respectivamente (ver Figura 3.32),<br />
registando-se uma taxa muito mais baixa de<br />
melhoria nos agregados rurais.<br />
O Programa de Monitorização Conjunta<br />
OMS/<strong>UNICEF</strong> constatou que 74 por cento<br />
dos 11,7 milhões de pessoas que vivem<br />
nas zonas rurais em Moçambique praticam<br />
fecalismo a céu aberto. 118 Apenas 5 por cento<br />
da população tinha acesso a instalações<br />
sanitárias melhoradas e 21 por cento a<br />
instalações não melhoradas. No entanto, a<br />
melhoria do acesso a saneamento continua<br />
a ser um dos principais objectivos do<br />
governo. Reflectindo este compromisso, o<br />
Ministério das Obras Públicas e Habitação<br />
2003 2008<br />
Urbano Rural Total<br />
Fonte: Instituto Nacional de Estatística, “Inquérito Integrado à Força de Trabalho (IFTRAB) 2004/05”, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2006 e MICS 2008.<br />
47%<br />
19%<br />
6%<br />
Fonte: Cálculos do <strong>UNICEF</strong> baseados em MICS 2008<br />
90<br />
91
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
e o Ministério da Saúde foram agraciados<br />
com o Prémio AfricaSan do Conselho<br />
Africano de Ministros da Água (AMCOW<br />
– African Ministers’ Council on Water), pela<br />
sua liderança fazendo com que 185 aldeias<br />
atingissem o estatuto de Livres de Fecalismo<br />
a Céu Aberto em 2009. 119 O AMCOW foi<br />
fundado em 2002, em Abuja, na Nigéria,<br />
principalmente para promover cooperação,<br />
segurança, desenvolvimento social e<br />
económico e erradicação da pobreza entre<br />
os estados membros, através da gestão de<br />
recursos hídricos e prestação de serviços<br />
Figura 3.33: Acesso a instalações sanitárias melhoradas, 2008<br />
90%<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
15%<br />
6%<br />
Niassa Cabo<br />
Delgado<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
15%<br />
Nam -<br />
pula<br />
8% 3%<br />
Zambézia<br />
14%<br />
22%<br />
de abastecimento de água. Os Prémios<br />
AfricaSan do AMCOW são especificamente<br />
para reconhecer notáveis esforços e<br />
conquistas em matéria de saneamento e<br />
higiene em África, com impacto tangível<br />
na melhoria do saneamento e higiene e em<br />
mudanças de comportamento sustentáveis<br />
em grande escala. Eles visam melhorar o<br />
perfil de saneamento e higiene chamando<br />
a atenção para abordagens bem sucedidas,<br />
promovendo a excelência na liderança,<br />
inovação e saneamento, bem como<br />
melhorias na higiene em África.<br />
16%<br />
Tete Manica Sofala Inham -<br />
bane<br />
Figura 3.34: Probabilidade de acesso a fonte de saneamento melhorado<br />
Probabilidade de acesso a fonte de saneamento melhorado<br />
0 . 2 . 4 . 6 . 8 1<br />
24%<br />
Gaza<br />
47%<br />
85%<br />
Maputo Maputo<br />
Província Cidade<br />
47%<br />
19%<br />
6%<br />
Urban Rural Total<br />
-1 -.5 0 .5 1 1.5 2 2.5 3<br />
Classificação de riqueza<br />
Urbano<br />
Rural<br />
Fonte: Cálculos do <strong>UNICEF</strong> baseados no MICS 2008<br />
Foi realizada uma análise de regressão para<br />
examinar mais profundamente os factores<br />
que afectam o acesso dos agregados<br />
familiares a serviços de saneamento<br />
adequados, definidos como sendo a posse<br />
ou utilização de um sanitário não tradicional.<br />
Tal como acontece com as fontes de água<br />
melhoradas, há três factores que são<br />
positiva e estatisticamente significativos<br />
para um saneamento melhorado: a riqueza<br />
do agregado familiar, a escolaridade do<br />
chefe de família e a localização. Além disso,<br />
viver num agregado familiar chefiado por<br />
uma mulher implica maior probabilidade de<br />
acesso a saneamento melhorado, embora<br />
o efeito seja menor do que em relação à<br />
escolaridade (2,5 por cento contra 24 por<br />
cento para níveis superiores de ensino). 120<br />
A infra-estrutura do local desempenha um<br />
papel importante, com todas as províncias<br />
a apresentarem menor probabilidade de<br />
acesso do que a Cidade de Maputo, embora<br />
os efeitos sejam menores do que no acesso<br />
a fonte de água melhorada (ver Figura 3.34).<br />
3.5. Sustentabilidade das infraestruturas<br />
de ASH<br />
Estudos recentes realizados pela Fundação<br />
de Água e Saneamento (Fairwater)<br />
indicaram existirem 50.000 sistemas de<br />
abastecimento de água não funcionais<br />
em toda a África, o que representa uma<br />
perda de investimento de cerca de 215-360<br />
milhões de dólares americanos. 121 Com o<br />
aumento da participação do sector privado e<br />
da sociedade civil na construção de pontos<br />
de abastecimento de água e instalações<br />
sanitárias domiciliares, o Governo de<br />
Moçambique está a mudar o seu enfoque<br />
para a garantia de sustentabilidade e<br />
qualidade de infra-estruturas.<br />
A sustentabilidade do abastecimento<br />
de água rural exige que se dê especial<br />
atenção ao controlo de qualidade durante<br />
todo o ciclo do projecto de abastecimento<br />
de água rural, nomeadamente durante a<br />
preparação dos documentos de licitação e<br />
especificações técnicas; durante a construção<br />
de pontos de abastecimento de água;<br />
durante o processo de aquisição de todos<br />
os materiais e equipamentos; e durante a<br />
capacitação das comunidades. As recentes<br />
verificações de sustentabilidade realizadas<br />
por auditores externos a instalações de<br />
água rural e saneamento nas províncias de<br />
Tete, Manica, Sofala e Zambézia indicam<br />
que aproximadamente 30 por cento de<br />
todas as fontes de água rural se encontram<br />
inoperacionais devido à falta de sentido de<br />
posse comunitária das instalações, uma fraca<br />
cadeia de reposição de peças sobressalentes<br />
e falta de mecânicos qualificados. 122<br />
Em 2010, o <strong>UNICEF</strong> realizou a Avaliação do<br />
Impacto de Meio Termo e de Verificação da<br />
Sustentabilidade do Programa “Iniciativa<br />
Um Milhão” nas províncias de Tete, Manica<br />
e Sofala. 123 A Avaliação de Impacto de<br />
Meio Termo consistiu num case controlled<br />
panel study(– Nota do Editor: quadro de<br />
monitoramento que avalia o impacto das<br />
intervenções no início, a meio termo e no<br />
fim do programa, consistindo na análise de<br />
uma amostra de várias famílias –)realizado<br />
em 80 aldeias e escolas de controlo e<br />
80 aldeias e escolas de tratamento ou<br />
intervenção. Os resultados dos 1.600<br />
inquéritos domiciliares revelaram um<br />
aumento de 27 e 9 por cento de utilização de<br />
fontes de água e saneamento melhoradas,<br />
respectivamente, na zona do programa (18<br />
distritos), entre 2008 e 2010, e uma redução<br />
de 6 por cento nos níveis de doenças<br />
diarreicas auto-reportadas. Além disso, a<br />
avaliação da sustentabilidade observou um<br />
aumento nos níveis de sustentabilidade quer<br />
institucional quer das infra-estruturas, no<br />
programa.<br />
3.6. Água e saneamento nas<br />
escolas<br />
O acesso a água potável e saneamento nas<br />
escolas, em Moçambique, ainda não está<br />
bem definido devido à falta de indicadores<br />
e ferramentas de pesquisa acordados.<br />
No entanto, num estudo de base recente<br />
realizado em cinco distritos, constatou-se<br />
que apenas 28 por cento das escolas tinha<br />
92<br />
93
Pelo olhar<br />
de uma<br />
criança<br />
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
Caixa 3.3. Dados do governo sobre acesso versus dados dos agregados familiares sobre o uso<br />
Existem duas fontes principais de informação sobre acesso e uso de água e saneamento: os<br />
sistemas de monitoria de rotina da Direcção Nacional de Águas (DNA) e os inquéritos aos<br />
agregados familiares realizados pelo Instituto Nacional de Estatística. Estas duas fontes usam<br />
indicadores diferentes, bem como diferentes definições de áreas urbanas e rurais. xvii<br />
Abastecimento de Água<br />
Segundo a DNA, em 2009, 52 por cento da população em áreas rurais tinha acesso a água<br />
proveniente de uma fonte melhorada, em comparação com os 30 por cento relatados no MICS<br />
2008. Os dados sobre acesso foram calculados com base no pressuposto de que um ponto de<br />
abastecimento de água serve, em média, 500 pessoas. Análises recentes do Governo indicam<br />
que a média de utentes por cada ponto de água melhorada é de cerca de 287 pessoas, valor este<br />
considerado como estando amplamente de acordo com a capacidade sustentável das bombas de<br />
água manuais utilizadas no país e com as normas aplicadas noutros países africanos. Em 2010, o<br />
Governo, com o apoio de parceiros de desenvolvimento, concordou em adoptar um novo padrão<br />
de planificação de 300 pessoas por cada ponto de abastecimento de água, a uma distância de<br />
um quilómetro a pé, com capacidade para fornecer 20 litros por pessoa por dia. Além disso, a<br />
estimativa de cobertura de abastecimento de água rural será baseada em dados de inquéritos aos<br />
agregados familiares realizados pelo Instituto Nacional de Estatística ou outros inquéritos nacionais<br />
representativos, relacionados com o acesso e uso de abastecimento de água e saneamento.<br />
Saneamento<br />
Relativamente à população com acesso a saneamento melhorado nas áreas rurais, o número<br />
apresentado pela DNA é de 40 por cento, enquanto o valor reportado no MICS 2008 é de apenas<br />
6 por cento. Esta discrepância deve-se ao fraco uso das instalações sanitárias existentes pelas<br />
pessoas, decorrente do baixo nível de conhecimento sobre saneamento, e de ambiguidades<br />
quanto à classificação de instalações sanitárias nos inquéritos aos agregados familiares. Prevê-se<br />
incluir melhores definições de instalações sanitárias em posteriores inquéritos.<br />
“Esta imagem mostra a casa de banho.<br />
A água escorre da casa de banho, por<br />
isso a área cheira muito mal. As crianças<br />
brincam aqui porque não há lugares para<br />
elas brincarem. Mas não é saudável para as<br />
crianças brincar em áreas que não estejam<br />
limpas.”<br />
“O que está a escorrer da casa de banho<br />
provoca problemas de saúde”<br />
“Temos casas de banho nos nossos quintais,<br />
mas não estão muito bem construídas. São<br />
feitas com chapas de zinco onduladas ou<br />
caniço e não têm electricidade. Muitas delas<br />
têm uma capulana em vez de porta. Quando<br />
o vento abana a capulana, todos conseguem<br />
ver-nos lá dentro. Eu fico tão envergonhada!<br />
Como a casa de banho não tem luz, alguns<br />
já caímos na bacia de banho e magoámo-<br />
nos. Às vezes temos medo de lá ir durante a<br />
noite e procuramos sempre alguém para nos<br />
acompanhar.<br />
Quando chove, a água provoca muitos<br />
problemas. Atrai moscas que podem<br />
provocar cólera, e o cheiro é insuportável.<br />
As casas de banho ficam com lama e sujas<br />
com a água que escorre, tanto dentro<br />
como fora. Como resultado, o lixo e a água<br />
suja escorrem para o quintal. As crianças<br />
geralmente brincam ali perto por falta de<br />
espaço para brincar. Assim, acabam por ficar<br />
doentes por causa da água contaminada que<br />
se mistura com a lama.”<br />
- Marta, 10 anos<br />
Fonte: Virgi Sajan, Zainul, 2010.<br />
acesso a água potável, e menos de 28 por<br />
cento a saneamento.<br />
Para acelerar o progresso rumo aos ODM, o<br />
Governo de Moçambique está a promover<br />
um programa denominado “Escolas Amigas<br />
da Criança”, com o objectivo de fornecer<br />
um pacote mínimo de qualidade a todas<br />
as escolas em distritos-alvo. Entre outras<br />
intervenções, o programa fornece água<br />
potável e instalações sanitárias adequadas a<br />
todas as escolas nos distritos seleccionados,<br />
tendo este esforço, até 2008, resultado num<br />
aumento da percentagem de escolas com<br />
água, de 28 para 80 por cento nos cinco<br />
distritos do programa. A introdução de<br />
SANTOLIC nas escolas e na formação das<br />
principais organizações não governamentais<br />
de implementação e funcionários públicos<br />
levou a um aumento do acesso a saneamento<br />
nas escolas.<br />
O Relatório da Avaliação Anual de Campo<br />
do projecto Escolas Amigas da Criança,<br />
do <strong>UNICEF</strong>, 124 mostra terem-se registado<br />
progressos consideráveis na matrícula, na<br />
retenção e no desempenho escolar das<br />
crianças em Moçambique, tendo o rácio<br />
líquido de matrículas no ensino primário<br />
aumentado de 69 por cento em 2003 para<br />
95 por cento em 2007. A Tabela 3.4 ilustra<br />
o progresso no aumento de matrículas nas<br />
escolas dos cinco distritos seleccionados, onde<br />
as actividades estão a ser implementadas.<br />
xvii O sector da água considera que as áreas urbanas incluem apenas as 13 principais cidades, enquanto a definição de<br />
áreas urbanas usada pelo Instituto Nacional de Estatística no IDS de 2003 incluía 13 cidades e 68 vilas secundárias.<br />
94<br />
95
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
Caixa de texto 3.4 : Saneamento Total Liderado pela Comunidade<br />
A Iniciativa Um Milhão é uma parceria programática de seis anos entre o governo dos Países<br />
Baixos e o <strong>UNICEF</strong>, que visa apoiar os esforços do Governo de Moçambique na garantia de um<br />
fornecimento adequado de água e saneamento e a adopção de melhores práticas de higiene para<br />
um milhão de pessoas em 18 distritos rurais, dos quais 6 na província de Tete, 6 em Sofala e 6 em<br />
Manica.<br />
Depois de a utilização da metodologia de Transformação Participativa de Higiene e Saneamento,<br />
através de organizações não-governamentais contratadas pelos municípios, não ter conseguido<br />
alcançar os resultados desejados nas actividades do programa de promoção da higiene e<br />
saneamento básico, decidiu-se introduzir a Abordagem Comunitária ao Saneamento Total. Em<br />
Moçambique, esta iniciativa assumiu a forma de uma combinação de Saneamento Total Liderado<br />
pela Comunidade (SANTOLIC) com um sistema de recompensas/prémios. O SANTOLIC é uma<br />
metodologia inovadora para mobilização das comunidades para a eliminação completa do<br />
fecalismo a céu aberto. As comunidades são orientadas para a realização da sua própria avaliação<br />
e análise do fecalismo a céu aberto e a tomarem as suas próprias medidas para se livrarem desta<br />
prática. No cerne do programa de SANTOLIC está o reconhecimento de que fornecer simplesmente<br />
as casas de banho não garante o seu uso nem resulta em melhores condições sanitárias e de<br />
higiene. As abordagens anteriores ao saneamento prescreviam altos padrões iniciais e ofereciam<br />
subsídios como incentivo, mas estas medidas levaram, muitas vezes, a uma adopção irregular,<br />
a problemas de sustentabilidade a longo prazo e uso apenas parcial, além de terem criado uma<br />
cultura de dependência de subsídios. O fecalismo a céu aberto e o ciclo de contaminação fecal-oral<br />
continuaram a propagar doença.<br />
Pelo contrário, o SANTOLIC centra-se na mudança de comportamento necessária para garantir<br />
melhorias reais e sustentáveis investindo na mobilização da comunidade em vez de no<br />
equipamento, e mudando o enfoque da construção de sanitários de cada agregado familiar para<br />
a criação de comunidades livres de fecalismo a céu aberto. Ao consciencializar as pessoas<br />
para o facto de, enquanto continuarem a defecar ao ar livre, mesmo que seja uma minoria,<br />
estão todos em risco de contrair doenças, o SANTOLIC promove e despoleta na comunidade<br />
o desejo de mudança, impulsiona-a para a acção e encoraja a inovação, o apoio mútuo e a<br />
procura de soluções locais adequadas, levando assim a uma maior apropriação (ownership) e<br />
sustentabilidade.<br />
3.7. Financiamento do sector e<br />
dotações orçamentais<br />
Aproximadamente 85% dos investimentos<br />
do sector nos últimos três anos<br />
vieram por via da assistência oficial<br />
ao desenvolvimento. Os orçamentos<br />
reais do sector para o período 2006-<br />
2008 aumentaram em 150 por cento em<br />
comparação com o período 2003-2005 (de<br />
cerca de 46 milhões para 116 milhões de<br />
dólares americanos). De igual modo, os<br />
desembolsos aumentaram em 155 por cento<br />
durante o mesmo período 125 , apesar de a<br />
taxa global de desembolso ter permanecido<br />
relativamente constante, em cerca de 60 por<br />
cento. O financiamento “no tesouro” (ontreasury)<br />
é desembolsado a uma taxa de<br />
82 por cento, contrariamente aos projectos<br />
geridos por doadores, cujos desembolsos<br />
são efectuados a uma taxa média de 58 por<br />
cento. 126 A melhoria da taxa de desembolso<br />
do Governo de Moçambique deveu-se a uma<br />
combinação de factores, entre os quais a<br />
Tabela 3.4: Número de alunos matriculados, por sexo, em cinco distritos de Escolas Amigas da Criança,<br />
2006-2008<br />
Distritos<br />
Maganja da<br />
Costa<br />
2006 2008 Aumento %<br />
Rapazes Raparigas Total Rapazes Raparigas Total Total<br />
31,579 18,335 49,914 41,485 26,707 68,192 36,6%<br />
Buzi 17,448 13,007 30,455 19,779 16,260 36,039 18.3%<br />
Mossurize 16,226 11,786 28,012 22,987 17,840 40,827 45.7%<br />
Changara 20,706 17,836 38,542 22,240 20,045 42,285 9.7%<br />
Chibuto 22,645 22,387 45,032 23,337 23,257 46,594 3.5%<br />
Fonte: <strong>UNICEF</strong>, “Assessment: Child-Friendly Schools Initiative in <strong>Mozambique</strong> Annual Field Assessment Report”, <strong>UNICEF</strong><br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
A WaterAid e o <strong>UNICEF</strong> tornaram-se importantes divulgadores e defensores do SANTOLIC,<br />
estando hoje esta iniciativa presente em mais de 20 países da Ásia, África, América Latina e<br />
Médio Oriente. O SANTOLIC tem um grande potencial para contribuir para a consecução dos<br />
ODM, quer directamente, influenciando os resultados relacionados com água e saneamento<br />
(meta 7), quer indirectamente, através de impactos indirectos de um melhor saneamento na luta<br />
contra doenças relevantes, especialmente diarreia (meta 6), melhoramento da saúde materna<br />
(meta 5) e redução da mortalidade infantil (meta 4).<br />
Além de criar uma cultura de bom saneamento, o SANTOLIC também pode ser um ponto de<br />
apoio eficaz para outras actividades de subsistência, mobilizando os membros da comunidade<br />
para acção colectiva e capacitando-os a empreender futuramente outras acções. Os resultados<br />
do SANTOLIC ilustram o que as comunidades podem alcançar através da realização de novas<br />
iniciativas para o seu próprio desenvolvimento.<br />
96<br />
97
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
eliminação do antigo sistema duodecimal,<br />
de atribuição do orçamento, a introdução<br />
do novo sistema de gestão financeira do<br />
Estado (SISTAFE), o melhoramento dos<br />
processos de procurement, os desembolsos<br />
mais pontuais dos doadores, melhores<br />
estimativas das datas de arranque de<br />
projectos, e a permissão, por parte de alguns<br />
doadores, de o Governo de Moçambique<br />
pagar as suas contribuições de contrapartida<br />
ou impostos usando os mesmos créditos ou<br />
subvenções dos projectos.<br />
O investimento médio anual necessário<br />
para cumprir as metas dos ODM nas<br />
zonas rurais foi estimado em 70 milhões<br />
de dólares americanos. 127 A primeira fase<br />
do Programa Nacional de Abastecimento<br />
de Água e Saneamento Rural (2009-2011)<br />
vai requerer cerca de 200 milhões de<br />
dólares americanos. Embora as despesas<br />
previstas para água urbana ultrapassem o<br />
investimento estimado necessário, há um<br />
défice de aproximadamente 35 por cento<br />
em relação ao sector de água rural. 128 Os<br />
compromissos orçamentais actuais para o<br />
saneamento indicam que foram prometidos<br />
cerca de 5 por cento dos fundos necessários<br />
para o saneamento rural, 3 milhões de<br />
dólares americanos por ano, contra os cerca<br />
de 22 milhões necessários. No saneamento<br />
urbano, foi prometido cerca de metade do<br />
montante necessário. 129 Dado o considerável<br />
défice, é pouco provável que se alcancem os<br />
ODM relacionados com água e saneamento.<br />
Estão, no entanto, a ser mobilizados recursos<br />
para preencher o défice de financiamento,<br />
quer através da criação de um fundo comum,<br />
quer melhorando a coordenação dos fundos<br />
do programa.<br />
O Governo de Moçambique reportou em 2010<br />
que 7,6 por cento (241 milhões de dólares<br />
e 8.464 milhões de meticais) do orçamento<br />
total do Estado foram atribuídos ao sector<br />
da água, 130 o que representa um aumento<br />
significativo comparativamente aos 2,8 por<br />
cento registados em 2003 (ver Tabela 3.5).<br />
Numa tentativa para reduzir as disparidades<br />
geográficas, o Programa Nacional de<br />
Abastecimento de Água e Saneamento Rural<br />
será implementado em carácter prioritário em<br />
províncias e distritos que reúnam os critérios<br />
acordados, que incluem a cobertura de água<br />
e saneamento actual, o nível de pobreza,<br />
compromissos escritos e colocação adequada<br />
de pessoal, entre outros.<br />
Apesar deste aumento na percentagem do<br />
orçamento total atribuída ao sector da água<br />
e saneamento, a contribuição do governo<br />
sofreu um grande retrocesso. Em 2006, 66 por<br />
cento das despesas para água e saneamento<br />
foram cobertas com financiamento externo. 131<br />
De acordo com uma análise sobre o<br />
investimento total do sector em 2010, 85<br />
por cento do financiamento provém agora<br />
de recursos externos, embora esta situação<br />
tenha conhecido uma ligeira diminuição a<br />
partir de 2009. 132 , 133<br />
Tabela 3.5: Financiamento do sector da água como percentagem do orçamento do estado, 2003-2010, anos<br />
seleccionados<br />
2003 2004 2005 2008 2009 2010<br />
3% 2% 2,5% 5% 4,5% 8%<br />
Fonte: Ministério das Finanças, 2008, 2010.<br />
4. Conclusões<br />
Há várias causas subjacentes às elevadas<br />
taxas de mortalidade e condições de saúde<br />
precárias das crianças moçambicanas, bem<br />
como substanciais barreiras à melhoria da<br />
sua sobrevivência e desenvolvimento.<br />
Uma das principais causas subjacentes<br />
da morbilidade e mortalidade infantil em<br />
Moçambique é a falta de acesso a serviços<br />
públicos, tanto em termos de acesso físico<br />
como económico, e a má qualidade destes<br />
serviços. As barreiras ao acesso e uso de<br />
serviços são particularmente graves para<br />
os agreados familiares mais pobres, para as<br />
pessoas que vivem em áreas rurais e para<br />
as que têm menos escolaridade, o que tem<br />
directamente que ver com maior índice de<br />
mortalidade nas crianças desses agregados.<br />
Existem disparidades significativas na<br />
alocação de recursos do nível central a<br />
determinadas províncias e áreas rurais, o<br />
que se pode em parte atribuir a insuficientes<br />
ligações entre instrumentos da política de<br />
saúde, que enfatizam a redução da pobreza<br />
e a necessidade de ter como alvo grupos<br />
vulneráveis, e a planificação e sistemas de<br />
alocação de recursos do sector.<br />
A pobreza continua a ser uma das principais<br />
causas subjacentes da mortalidade infantil.<br />
As taxas de mortalidade nas crianças das<br />
famílias mais pobres são significativamente<br />
mais elevadas do que as das famílias em<br />
melhor situação. Dados do inquérito MICS<br />
2008 mostram que os níveis de mortalidade<br />
infantil começam a diminuir de forma<br />
significativa apenas no quarto quintil de<br />
riqueza. A pobreza contribui para as altas<br />
taxas de mortalidade infantil não só devido<br />
às desvantagens que as famílias mais<br />
pobres enfrentam, tais como menor acesso<br />
a serviços, mais baixos níveis educacionais<br />
e ambientes de vida menos saudáveis, mas<br />
também devido à falta imediata de dinheiro<br />
para pagar por serviços ou medicação.<br />
As práticas de prestação de cuidados,<br />
entre as quais as práticas de alimentação<br />
infantil, higiene e saneamento, e a gestão<br />
de doenças da infância desempenham<br />
um papel importante na sobrevivência e<br />
desenvolvimento saudável das crianças.<br />
As práticas de prestação de cuidados<br />
não só têm um impacto directo na saúde<br />
das crianças, como também moldam o<br />
comportamento e tratamento dos seus<br />
próprios filhos mais tarde na vida. Devido<br />
aos baixos níveis educacionais, ao limitado<br />
acesso a informação sobre prevenção e<br />
tratamento de doenças e ao ambiente pouco<br />
saudável de muitas famílias, as práticas dos<br />
provedores de cuidados são, muitas vezes,<br />
inadequadas ou mesmo prejudiciais à saúde<br />
das crianças.<br />
O acesso a água potável e, particularmente,<br />
a saneamento, continua baixo. Água potável<br />
e saneamento são essenciais para melhorar<br />
a saúde das crianças e das famílias, devido à<br />
elevada prevalência de doenças transmitidas<br />
pela água. A falta de acesso a água potável<br />
retira também tempo das actividades<br />
produtivas, uma vez que o tempo médio<br />
gasto até uma fonte de água é de quase uma<br />
hora, uma deslocação mais frequentemente<br />
feita por mulheres e raparigas.<br />
Apesar dos progressos realizados na<br />
criação de um ambiente propício (quadro<br />
institucional sectorial e directrizes e<br />
abordagens de implementação conexas),<br />
a capacidade para implementar as<br />
intervenções na escala necessária e com<br />
a qualidade exigida nem sempre está<br />
presente a nível subnacional. Além disso, as<br />
avaliações do sector recentemente levadas<br />
a cabo mostraram que, apesar dos avanços<br />
nas áreas urbanas, um número significativo<br />
de pessoas a viver em áreas peri-urbanas<br />
carece de água potável e instalações<br />
sanitárias adequadas.<br />
98<br />
99
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
A melhoria das práticas de higiene e<br />
saneamento, particularmente em áreas<br />
rurais e peri-urbanas, deverá ser uma<br />
prioridade nacional, e exige uma forte<br />
colaboração multissectorial para que se<br />
tratem todas as causas subjacentes. Embora<br />
estejam a ser empreendidas acções para<br />
o melhoramento das condições sanitárias<br />
(através de campanhas de saneamento), são<br />
ainda necessários esforços suplementares<br />
a todos os níveis, com um forte enfoque<br />
de abordagem comunitária. O SANTOLIC é<br />
uma metodologia inovadora para mobilizar<br />
as comunidades no sentido de fazerem<br />
a sua auto-avaliação e análise do seu<br />
próprio saneamento, e tomarem medidas<br />
para melhorar a sua situação de forma<br />
sustentável.<br />
Referências<br />
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Lancet, vol. 362, no. 9387, 13 de Setembro de<br />
2003, pp. 2226.<br />
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2010.<br />
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of the World’s Children 2008,’ <strong>UNICEF</strong>, Nova<br />
Iorque, 2009.<br />
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7 Brown, K.H., ‘Diarrhoea and malnutrition’.<br />
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8 Black, Robert E., et al., ‘Child Survival’, The<br />
Lancet , vol. 362, no. 9387, 13 de Setembro de<br />
2003, pp. 915–916.<br />
9 Cálculos dos autores baseados em:<br />
<strong>Mozambique</strong> National Institute of Health,<br />
London School of Hygiene and Tropical<br />
Medicine, e <strong>UNICEF</strong>, <strong>Mozambique</strong> National<br />
Childhood Mortality Study 2009, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
10 United Nations Children’s Fund, The State<br />
of the World’s Children 2009, <strong>UNICEF</strong>, Nova<br />
Iorque, 2009.<br />
11 Ibid.<br />
12 Governo de Moçambique e Nações Unidas,<br />
Report on the Millenium Development Goals,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2010.<br />
13 United Nations Children’s Fund, The State<br />
of the World’s Children 2009, <strong>UNICEF</strong>, Nova<br />
Iorque, 2009.<br />
14 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
15 Ministério da Planificação e Desenvolvimento,<br />
“Pobreza e Bem-estar em Moçambique:<br />
Terceira Avaliação Nacional da Pobreza”,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, Setembro<br />
2010.<br />
16 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
17 Cálculos do <strong>UNICEF</strong> baseados em: Instituto<br />
Nacional de Estatística, ‘MICS 2008, Relatório<br />
Final,’ Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2010.<br />
18 <strong>Mozambique</strong> National Institute of Health,<br />
London School of Hygiene and Tropical<br />
Medicine, <strong>Mozambique</strong> National Childhood<br />
Mortality Study 2009, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
19 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
20 Ministério da Planificação e Desenvolvimento,<br />
“Pobreza e Bem-estar em Moçambique:<br />
Terceira Avaliação Nacional da Pobreza”,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, Setembro<br />
de 2010.<br />
21 Instituto Nacional de Estatística,‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
22 Ibid.<br />
23 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
Demográfico e de Saúde 2003, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, Junho de 2005.<br />
24 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
de Indicadores Múltiplos 2008, Sumário,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2008.<br />
25 Instituto Nacional de Estatística,‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
26 Ibid.<br />
100<br />
101
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
27 Government of <strong>Mozambique</strong>, Report on<br />
the Millenium Development Goals 2010,<br />
Moçambique, Maputo, 2010.<br />
42 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
56 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
Demográfico e de Saúde 2003, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, Junho de 2005.<br />
70 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final’, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
28 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
29 Ibid.<br />
30 Cálculos do <strong>UNICEF</strong> baseados em: Instituto<br />
Nacional de Estatística, ‘MICS 2008, Relatório<br />
Final,’ Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2010.<br />
31 Instituto Nacional de Estatística,‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
32 Ibid.<br />
33 Ministério da Planificação e Desenvolvimento,<br />
“Pobreza e Bem-estar em Moçambique:<br />
Terceira Avaliação Nacional da Pobreza”,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, Setembro<br />
2010.<br />
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Genebra, 2003.<br />
36 Instituto Nacional de Estatística,‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
37 Ibid.<br />
38 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
de Indicadores Múltiplos 2008, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2010.<br />
39 Pedro, A., et al., Levantamento das Barreiras<br />
para o Aleitamento Materno Exclusivo,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2009.<br />
40 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
de Indicadores Múltiplos 2008, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2010.<br />
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Maputo, 2010.<br />
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malária em crianças dos 6-59 meses e<br />
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Saúde, Maputo, 2003.<br />
49 Ibid.<br />
50 Instituto Nacional de Estatística,‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
51 Ibid.<br />
52 United Nations Children’s Fund, The State<br />
of the World’s Children 2009, <strong>UNICEF</strong>, Nova<br />
Iorque, 2009.<br />
53 Ibid.<br />
54 Ministério da Saúde, Desempenho do Sector<br />
da Saúde, Oitava Avaliação Conjunta Anual<br />
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2009.<br />
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2004.<br />
57 Ministério da Saúde, Inquérito nacional sobre<br />
a deficiência de vitamina A, prevalência de<br />
anemia e malária em crianças dos 6-59 meses<br />
e respectivas mães, Instituto Nacional de<br />
Saúde, Maputo, 2003.<br />
58 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
Demográfico e de Saúde 2003, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, June 2005.<br />
59 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
de Indicadores Múltiplos 2008, Sumário,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2008.<br />
60 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
Demográfico e de Saúde 2003, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, Junho de 2005.<br />
61 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
62 Ibid.<br />
63 Ibid.<br />
64 Ministério da Saúde e Save the Children,<br />
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não publicados), 2009.<br />
65 Ministério da Saúde, Inquérito nacional sobre<br />
a deficiência de vitamina A, prevalência de<br />
anemia e malária em crianças dos 6-59 meses<br />
e respectivas mães, Instituto Nacional de<br />
Saúde, Maputo, 2003.<br />
66 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
Demográfico e de Saúde 2003, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, Junho 2005.<br />
67 Ministério da Saúde “Desempenho do Sector<br />
da Saúde Oitava Avaliação Conjunta Anual<br />
ACA VIII,” Ministério da Saúde, Maputo, 2009.<br />
68 <strong>Mozambique</strong> National Institute of Health,<br />
London School of Hygiene and Tropical<br />
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Childhood Mortality Study 2009, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
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73 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
74 Ibid.<br />
75 Ministério da Saúde, Relatório do Programa<br />
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76 Feiko O, et al, “The Burden of Co-infection<br />
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78 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final’, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
79 Ibid.<br />
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CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
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Medicine and <strong>UNICEF</strong>, <strong>Mozambique</strong> National<br />
Childhood Mortality Study 2009, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
86 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
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of the World’s Children 2009, <strong>UNICEF</strong>, Nova<br />
Iorque, 2009.<br />
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Maputo, 2010.<br />
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Orçamento do Estado 2010 Sobre a Previsão<br />
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Orçamento do Estado 2010 Sobre sobre os<br />
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97 Ibid.<br />
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Orçamento do Estado 2009 Sobre a Previsão<br />
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109 Ibid.<br />
110 Ibid.<br />
111 Ibid.<br />
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115 Ibid.<br />
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117 Ibid.<br />
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Santos, Takiso Achame and David Kuria,’<br />
descarregado de: http://washafrica.wordpress.<br />
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2010-winners-feliciano-dos-santos-takisoachame-and-david-kuria<br />
, acedido em<br />
Dezembro de 2010<br />
120 Cálculos do <strong>UNICEF</strong> baseados em: Instituto<br />
Nacional de Estatística, ‘MICS 2008, Relatório<br />
Final,’ Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2010.<br />
121 Skinner, Jamie, and International Institute for<br />
Environment and Development, Where Every<br />
Drop Counts: Tackling rural Africa’s water<br />
crisis, Instituto Internacional para o Ambiente<br />
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125 Water and Sanitation Programme/World<br />
Bank,Water Supply and Sanitation in<br />
<strong>Mozambique</strong>: turning finance into services for<br />
2015 and beyond. An AMCOW Country Status<br />
Overview, Programa de Água e Saneamento,<br />
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129 Ibid.<br />
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de Orçamento do Estado 2010 Sobre a<br />
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<strong>Mozambique</strong>, Maputo, 2010.<br />
131 Fundo das Nações Unidas para a Infância,<br />
Pobreza Infantil em Moçambique: uma<br />
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Moçambique, Maputo, 2006.<br />
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105
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 3: SOBREVIVÊNCIA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL<br />
132 Fundação para o Desenvolvimento da<br />
Comunidade e <strong>UNICEF</strong>, O Que Diz a Proposta<br />
de Orçamento do Estado 2010 Sobre a<br />
Previsão de Recursos no Sector de águas<br />
e saneamento?, Budget Brief, <strong>UNICEF</strong><br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
133 Fundação para o Desenvolvimento da<br />
Comunidade e <strong>UNICEF</strong>, O Que Diz a Proposta<br />
de Orçamento do Estado 2010 Sobre a<br />
Previsão de Recursos no Sector de águas<br />
e saneamento?, Budget Brief, <strong>UNICEF</strong><br />
<strong>Mozambique</strong>, Maputo, 2010.<br />
106<br />
107
4CAPÍTULO<br />
A educação e<br />
o direito das<br />
crianças ao<br />
desenvolvimento<br />
4CAPÍTULO<br />
1. Introdução<br />
A educação é um direito fundamental<br />
de todas as crianças. É garantido pela<br />
constituição de Moçambique, segundo a<br />
qual “a educação constitui direito e dever de<br />
cada cidadão.” De acordo com a Convenção<br />
sobre os Direitos da Criança, o direito à<br />
educação abrange a obrigação não apenas<br />
de proporcionar acesso a educação, mas<br />
também de eliminar a discriminação a<br />
todos os níveis, definir padrões mínimos<br />
e melhorar a qualidade. Além disso,<br />
a educação constitui uma importante<br />
prioridade do desenvolvimento global. Os<br />
Objectivos de Desenvolvimento do Milénio<br />
(ODM) 2 e 3 visam, respectivamente,<br />
alcançar a educação primária universal e<br />
promover a igualdade de género, incluindo a<br />
paridade na educação.<br />
Além de necessária para a materialização<br />
dos direitos civis, políticos, económicos<br />
e sociais, a educação é um dos mais<br />
poderosos instrumentos para a promoção<br />
do desenvolvimento económico e social<br />
e na redução da pobreza, especialmente<br />
da pobreza infantil, e da desigualdade.<br />
Como observado no Capítulo 3 do presente<br />
estudo Pobreza Infantil e Disparidades em<br />
Moçambique – 2010, a educação também<br />
desempenha um papel essencial na<br />
sobrevivência e desenvolvimento da criança.<br />
Este é particularmente o caso da educação<br />
da rapariga, altamente correlacionada com<br />
a redução da mortalidade infantil e uma<br />
melhor saúde e nutrição para as próximas<br />
gerações de crianças.<br />
Este capítulo analisa o sector da educação<br />
em Moçambique. A primeira parte debruçase<br />
sobre a situação actual e tendências<br />
recentes na participação no sistema de<br />
ensino. A parte seguinte centra-se nas<br />
barreiras à participação, descrevendo as<br />
tendências recentes no financiamento do<br />
sector, e tirando algumas conclusões com<br />
base nas análises apresentadas.<br />
A educação e o direito das<br />
crianças ao desenvolvimento<br />
109
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />
2. A actual situação e recentes tendências<br />
no sector da educação<br />
2.1 O sistema de educação em<br />
Moçambique<br />
A base jurídica do Sistema Nacional de<br />
Educação de Moçambique, que define os<br />
princípios, funções e objectivos de cada<br />
subsistema de ensino, incluindo o primário,<br />
foi definida por lei em 1992 (Lei n º 6/92).<br />
Em 2004 aboliram-se as tarifas escolares no<br />
ensino primário, que, todavia, permanecem<br />
em outros níveis de ensino.<br />
O Ministério da Mulher e da Acção Social é o<br />
principal responsável pela implementação do<br />
Desenvolvimento na Primeira Infância, que,<br />
no entanto, tem sido assegurado sobretudo<br />
por operadores privados e algumas<br />
instituições públicas. Tem uma cobertura<br />
muito limitada que se traduz em cerca de<br />
61.400 crianças. 1<br />
O sistema geral de ensino em Moçambique<br />
está dividido em ensino primário e ensino<br />
secundário. O ensino primário é composto<br />
por sete anos de escolaridade, repartidos<br />
por dois níveis. O primeiro nível do ensino<br />
primário vai da primeira à quinta classe<br />
(ensino primário do primeiro grau, ou EP1)<br />
devendo ser frequentado por crianças dos<br />
6 aos 10 anos de idade. O segundo nível<br />
do ensino primário compreende a sexta e a<br />
sétima classes (ensino primário do segundo<br />
grau, ou EP2), devendo ser frequentado por<br />
crianças com 11 a 12 anos de idade. Em<br />
2004, o Ministério da Educação (MINED)<br />
introduziu um novo currículo para o ensino<br />
básico e reformou alguns pontos críticos<br />
do sistema, incluindo a obrigatoriedade de<br />
sete anos completos e integrados de ensino<br />
primário, e as passagens semi-automáticas.<br />
Assim, os dois níveis do ensino básico estão<br />
a ser actualmente fundidos numa única série<br />
(ensino primário completo, ou EPC), que<br />
compreende um ciclo de sete anos de ensino<br />
primário.<br />
O ensino secundário é constituído por<br />
cinco anos de escolaridade, sendo também<br />
dividido em dois níveis: o primeiro nível<br />
inclui as classes 8ª a 10ª (Ensino Secundário<br />
Geral do Primeiro Grau, ou ESG1) e o<br />
segundo compreende a 11ª e a 12ª classes<br />
(Ensino Secundário Geral do Segundo<br />
Grau, ou ESG2). O primeiro nível deve ser<br />
frequentado por crianças com 13 a 15 anos<br />
de idade, e o segundo por crianças com<br />
idades entre os 16 e os 17 anos. O processo<br />
de reforma curricular do ensino secundário,<br />
introduzida em 2007, tal como a Estratégia<br />
para o Ensino Secundário elaborada em<br />
2008, pretende tornar o ensino secundário<br />
mais acessível e prático e visa desenvolver<br />
nos alunos competências para a vida.<br />
A educação técnica e profissional no sistema<br />
de ensino público é composta por três<br />
níveis: elementar, básico e médio. Esses<br />
níveis são equivalentes ao EP2, ESG1 e ESG2<br />
e decorrem em dois, três e quatro anos,<br />
respectivamente. Nos níveis básico e médio,<br />
é possível especializar-se em agricultura ou<br />
indústria e comércio.<br />
No nível superior, há mais de 30 instituições<br />
em Moçambique, duas das quais são<br />
as principais universidades públicas<br />
– a Universidade Pedagógica (UP) e a<br />
Universidade Eduardo Mondlane (UEM)<br />
– bem como uma série de outras pequenas<br />
instituições de ensino superior. Os requisitos<br />
para o ingresso nessas instituições são<br />
a conclusão da ESG2 (12ª classe) e a<br />
submissão a exames de admissão.<br />
Pretende-se que a educação especial seja<br />
sistemicamente integrada por via de uma<br />
educação inclusiva, de acordo com o<br />
objectivo definido pelo Plano Estratégico de<br />
Educação e Cultura. A educação especial tem<br />
sido oferecida principalmente em algumas<br />
escolas especiais, que são geridas pelo<br />
Ministério da Mulher e da Acção Social,<br />
servindo um número limitado de crianças<br />
com necessidades especiais nas áreas de<br />
deficiência auditiva, visual, mental ou física.<br />
A Educação de Adultos, que cessou durante<br />
a guerra, tem vindo a ganhar um novo<br />
impulso nos últimos anos, com novos<br />
programas, como, por exemplo, o ensino<br />
à distância pela rádio e televisão, que foi<br />
introduzido para proporcionar educação<br />
básica a adultos, particularmente a mulheres<br />
nas zonas rurais.<br />
No ensino primário as disparidades têm<br />
vindo a diminuir, mas no ensino secundário<br />
os progressos foram lentos. Cerca de 3,3<br />
milhões de 4,1 milhões de crianças em<br />
Moçambique de 6-12 anos de idade estão<br />
agora a frequentar a escola primária, 2 o que<br />
equivale a uma taxa líquida de 81 por cento<br />
em 2008. 3 A taxa líquida de frequência no<br />
ensino secundário continua baixa; apenas<br />
20 por cento das crianças com idades entre<br />
os 13 e os 17 anos estavam a frequentar o<br />
ensino secundário em 2008. Quase metade<br />
das crianças dessa idade ainda se encontram<br />
a frequentar a escola primária. 4<br />
Figura 4.1: Taxas líquidas de frequência, 2003 e 2008<br />
90%<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
60%<br />
81%<br />
Total<br />
Primário<br />
Fonte: IDS 2003 e MICS 2008.<br />
i<br />
8%<br />
20%<br />
Total<br />
Secundário<br />
63%<br />
82%<br />
Rapazes<br />
Primário<br />
Não há diferença significativa na frequência<br />
do ensino primário e secundário entre<br />
raparigas e rapazes. As disparidades de<br />
género no ensino primário, medidas pelo<br />
índice líquido de paridade de género (IPG),<br />
diminuíram de 0,90 em 2003 para 0,97 em<br />
2008. i No secundário, o IPG melhorou de<br />
0,80 em 2003 para 0,97 em 2008.<br />
Também foram reduzidas discrepâncias<br />
de longa data na frequência escolar das<br />
crianças das áreas urbana e rural e das<br />
famílias mais pobres e mais ricas. Apesar<br />
de continuar a haver diferenças, as crianças<br />
rurais e mais pobres registaram um maior<br />
aumento das taxas líquidas de frequência<br />
nos últimos anos do que as crianças urbanas<br />
e mais abastadas, tanto a nível primário<br />
como secundário.<br />
2.2. Crianças na escola<br />
Hoje estão a frequentar a escola mais<br />
crianças do que há cinco anos. As taxas<br />
líquidas de frequência do ensino primário<br />
aumentaram entre 2003 e 2008, de 60 para<br />
81 por cento. No ensino secundário as taxas<br />
8%<br />
21%<br />
Rapazes<br />
Secundário<br />
2003 2008<br />
57%<br />
80%<br />
Raparigas<br />
Primário<br />
7%<br />
20%<br />
Raparigas<br />
Secundário<br />
O IPG é calculado dividindo-se a taxa líquida de escolarização feminina pela taxa líquida de escolarização masculina<br />
para um dado nível de ensino. Um IPG de 0,96 a 1,04 indica que as percentagens de rapazes e raparigas na escola<br />
são aproximadamente iguais. Um valor inferior a 0,96 indica uma menor percentagem de raparigas na escola<br />
comparativamente à dos rapazes.<br />
110<br />
111
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />
líquidas de frequência também aumentaram<br />
entre 2003 e 2008, embora de uma base<br />
extremamente baixa, de 8 para 20 por cento.<br />
Foi realizada uma análise de regressão para<br />
examinar os factores que influenciam a<br />
frequência do ensino primário de crianças de<br />
6-12 anos, com base no conjunto de dados<br />
do MICS 2008, onde a variável dependente<br />
é se a criança está a frequentar a escola<br />
primária. Pelos resultados, a escolaridade<br />
da mãe parece ser um dos mais importantes<br />
factores que afectam a frequência do ensino<br />
primário. A riqueza familiar ii tem também<br />
uma correlação positiva com a frequência.<br />
Além disso, as crianças em agregados<br />
familiares chefiados por mulheres e com<br />
um pai presente têm mais probabilidade<br />
de frequentar a escola. A idade do chefe da<br />
família e o tamanho da família não parecem<br />
tem relação com a frequência.<br />
Dada a percentagem relativamente<br />
elevada de crianças que iniciam a escola<br />
tardiamente, a idade da criança tem uma<br />
relação positiva com o frequentar a escola<br />
primária, embora se registe abandono<br />
Figure 4.2: Probabilidade de não frequentar a escola primária, 2008<br />
Probabilidade de não frequentar<br />
a escola primária<br />
0 .1 .2 .3 .4 .5<br />
a partir dos 10 anos de idade (ver figura<br />
4.2). O modelo também indica que uma<br />
criança portadora de deficiência tem uma<br />
probabilidade 40 por cento inferior de<br />
frequentar a escola primária que uma<br />
criança sem deficiência. O sexo da criança<br />
não tem qualquer relação estatisticamente<br />
significativa com a frequência escolar, como<br />
é também confirmado pela Figura 4.2.<br />
Em termos de diferenças geográficas, as<br />
crianças rurais têm uma probabilidade<br />
ligeiramente menor de frequentar a escola<br />
primária do que as crianças urbanas. As<br />
crianças que residem nas províncias do<br />
Norte revelam uma maior probabilidade<br />
de abandono escolar do que as crianças da<br />
Cidade de Maputo.<br />
2.3.Crianças fora da escola<br />
Em 2003, não frequentavam a escola<br />
primária 1,5 milhões de crianças. Cinco<br />
anos depois, esse número desceu para<br />
metade: 764.000 (ver Figura 4.3). Em<br />
números absolutos, porém, as disparidades<br />
de género persistem. Não estão a usufruir<br />
6 8 10 12<br />
Idade<br />
Fonte: Cálculos do <strong>UNICEF</strong> baseados em MICS 2008.<br />
Masculino<br />
Feminino<br />
2 Medida através de um índice de pontuação de bens com base na metodologia de Filmer e Pritchett, 2001.<br />
do seu direito à educação primária mais<br />
raparigas do que rapazes: 399.000 raparigas<br />
comparativamente a 364.000 rapazes. 5<br />
Nas crianças em idade de frequentar o ensino<br />
secundário que estão fora da escola, pode<br />
observar-se uma tendência oposta. O número<br />
das crianças de 13 a 17 anos de idade fora da<br />
escola parece ter aumentado ligeiramente<br />
entre 2003 e 2008, de 31 para 36 por cento. 6<br />
Mais raparigas do que rapazes (tanto do<br />
ensino primário como secundário) estão fora<br />
da escola. Isto explica-se, em parte, porque<br />
mais rapazes em idade de frequentar o ensino<br />
secundário estão matriculados em escolas<br />
primárias, isto é, estão ‘acima da idade’<br />
(49 por cento de rapazes para 38 por cento<br />
de raparigas), enquanto as raparigas estão<br />
mais fora do sistema de ensino em geral (41<br />
por cento de raparigas para 30 por cento de<br />
rapazes). 7<br />
Embora as crianças urbanas tenham taxas<br />
mais elevada que as suas congéneres rurais,<br />
as áreas rurais apresentaram um maior<br />
progresso geral nos indicadores de educação<br />
entre 2003 e 2008. As taxas líquidas de<br />
frequência primária aumentaram nas crianças<br />
rurais de 53 por cento em 2003 para 79 por<br />
cento em 2008, comparativamente a um<br />
aumento de 76 por cento para 89 por cento<br />
nas crianças urbanas no mesmo período. 8<br />
50%<br />
45%<br />
40%<br />
35%<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
11%<br />
25%<br />
22%<br />
42%<br />
18%<br />
30%<br />
Urbana Rural Rapazes Raparigas Mais ricos Mais pobres<br />
Primário<br />
2.4. Atrasos no início da<br />
escolarização<br />
Estar acima da idade na escola é um<br />
fenómeno generalizado em Moçambique,<br />
influenciado por muitos factores. Embora<br />
o Ministério da Educação tenha vindo a<br />
promover a ideia de que as crianças devem<br />
entrar para a escola na idade certa, a<br />
concretização da entrada da criança depende<br />
de vários factores, entre os quais a sua<br />
área de residência. As crianças das zonas<br />
rurais entram na escola mais tarde que as<br />
crianças das áreas urbanas. Aos seis anos,<br />
61 por cento das crianças em áreas rurais<br />
estavam a frequentar a escola primária em<br />
2008, comparativamente a 73 por cento das<br />
crianças urbanas. A entrada para a escola no<br />
momento certo é influenciada pelo nível de<br />
escolaridade da mãe e pelo nível de riqueza<br />
do agregado familiar da criança. Em 2010,<br />
com base em estatísticas do MINED, 68,8 por<br />
cento das raparigas começaram a escola na<br />
idade certa.<br />
Embora se tenha registado progresso ao<br />
longo do tempo, mais crianças com 13-17<br />
anos estão a frequentar a escola primária do<br />
que a secundária. Em 2008, 44 por cento da<br />
população total em idade escolar secundária<br />
estava na escola primária, em comparação<br />
Figura 4.3: Percentagem de crianças de 6-12 e 13-17 anos fora da escola, por sexo, local de residência e<br />
condições socioeconómicas, 2008<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
20%<br />
42%<br />
Secondário<br />
5%<br />
20%<br />
28%<br />
49%<br />
112<br />
113
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />
com 61 por cento em 2003. As disparidades<br />
de género são evidentes: entre as crianças<br />
de 17 anos, 21 por cento dos rapazes contra<br />
12 por cento das raparigas frequentavam a<br />
escola primária em 2008. 9<br />
A idade com que uma criança entra para<br />
a escola afecta claramente a percentagem<br />
de crianças acima da idade na escola. Nos<br />
últimos anos as crianças tenderam a iniciar<br />
os seus estudos mais cedo. A Figura 4.4<br />
mostra como as gerações mais jovens são<br />
mais propensas a iniciar a escola primária<br />
aos seis anos do que os grupos de mais<br />
idade.<br />
O fenómeno ‘acima da idade’ no ensino<br />
básico tem implicações significativas para<br />
os resultados de aprendizagem das crianças,<br />
uma vez que é ensinado o mesmo currículo,<br />
ao mesmo ritmo, a alunos de idades e<br />
níveis de desenvolvimento cognitivo muito<br />
diversos. Coloca também sérios desafios<br />
a programas de prevenção de HIV/SIDA<br />
direccionados para crianças de 10-14 anos<br />
nas classes 5ª a 8ª (consideradas a Janela de<br />
Esperança, pois a maior parte das crianças<br />
ainda não são sexualmente activas, ou<br />
acabam de se tornar sexualmente activas).<br />
As crianças acima da idade mais maduras<br />
requerem uma abordagem diferente nesses<br />
programas.<br />
2.5. Conclusão do ensino<br />
primário e transição para o<br />
ensino secundário<br />
A participação na escola secundária<br />
depende da conclusão da escola primária.<br />
As taxas de conclusão do ensino primário<br />
são baixas, situando-se nos 15 por cento. É<br />
significativa a disparidade existente entre<br />
as taxas urbana e rural de conclusão do<br />
ensino primário (30 por cento contra 7 por<br />
cento, respectivamente, em 2008). 10 Embora<br />
as taxas de conclusão estejam a aumentar<br />
tanto em áreas urbanas como rurais,<br />
agravou-se o fosso entre as duas, com<br />
um aumento de cinco vezes nas crianças<br />
urbanas comparativamente a duas vezes<br />
e meia nas crianças das zonas rurais. É<br />
possível que os recentes aumentos nas taxas<br />
de frequência relativas a crianças das zonas<br />
rurais se traduzam em mais elevadas taxas<br />
de conclusão nos próximos anos. Embora<br />
a maioria das crianças (73 por cento) que<br />
completam o ensino primário prossigam<br />
para o ensino secundário, as taxas de<br />
conclusão neste nível são ainda mais baixas.<br />
O Ministério da Educação estima que a taxa<br />
bruta de conclusão do ensino secundário<br />
foi de 6,5 por cento em 2009. Os rapazes<br />
têm uma maior tendência de completar o<br />
ensino secundário do que as raparigas (8 por<br />
cento contra 5 por cento, respectivamente) 11 .<br />
O ensino secundário não é grátis e não há<br />
escolas secundárias em número suficiente,<br />
especialmente nas áreas rurais.<br />
Embora tenha havido um aumento de<br />
100 por cento no número de escolas<br />
secundárias desde 2004, esse aumento<br />
ocorreu principalmente em áreas urbanas<br />
e peri-urbanas. 12 Para a grande maioria das<br />
crianças das zonas rurais que concluem<br />
o ensino básico, o acesso ao ensino<br />
secundário constitui ainda um desafio. É<br />
interessante notar, no entanto, que uma<br />
redução das taxas de matrícula cobradas<br />
às raparigas que se matriculam nas escolas<br />
secundárias fez aumentar a matrícula<br />
de raparigas no ensino secundário, não<br />
obstante as matrículas destas continuarem<br />
inferiores às dos rapazes na maioria das<br />
províncias.<br />
A conclusão do ensino primário é<br />
directamente influenciada por uma série de<br />
factores, incluindo os níveis de escolaridade<br />
das mães, a riqueza do agregado familiar<br />
e a província. iii As crianças cujas mães<br />
têm o ensino secundário ou superior<br />
têm maior probabilidade de completar o<br />
ensino na idade devida do que as crianças<br />
cujas mães não têm escolaridade (ver<br />
Figura 4.5). Quarenta e quatro por cento<br />
das crianças dos quintis mais abastados<br />
completam o ensino primário aos 12<br />
anos, comparativamente a 1 por cento do<br />
quintil mais pobre. Também persistem as<br />
desigualdades rural/urbano, pois as crianças<br />
das áreas urbanas têm quatro vezes mais<br />
probabilidade de completar a escola primária<br />
do que as crianças das áreas rurais (30 por<br />
cento contra 7 por cento). 13<br />
2.6. Progressão pelas classes<br />
As baixas taxas de conclusão do ensino<br />
primário devem-se, pelo menos em parte,<br />
à persistente incapacidade das crianças<br />
de transitar regularmente de uma classe<br />
para a seguinte. Em média, cerca de oito<br />
por cento das crianças não conseguem<br />
passar de classe cada ano, facto que se<br />
regista com considerável regularidade ao<br />
longo do ciclo primário. 14 Como a política de<br />
passagens semi-automáticas do MINED só<br />
permite que as crianças repitam a segunda,<br />
a quinta e a sétima classes, era de esperar<br />
que a não transição fosse mais acentuada<br />
a partir dessas classes. Os dados do MICS<br />
2008 mostram não ser isso o que acontece.<br />
Deve-se notar, contudo, que as taxas de<br />
reprovação registaram uma diminuição<br />
Figura 4.5: Taxas de conclusão do ensino primário e transição para o ensino secundário, 2008<br />
Figura 4.4: Distribuição da população de acordo com a idade de entrada na escola, 2008<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
41%<br />
3%<br />
Urbano<br />
5-9 anos<br />
25% 28% 18%<br />
Rural<br />
10-14 anos<br />
39%<br />
Rapazes<br />
15-19 anos<br />
17%<br />
37%<br />
Raparigas<br />
20-24 anos<br />
13%<br />
45%<br />
Mais ricos<br />
25-29 anos<br />
9%<br />
50%<br />
Mais pobres<br />
30-34 anos<br />
90%<br />
80%<br />
78%<br />
70%<br />
75%<br />
75%<br />
70%<br />
70%<br />
69%<br />
60%<br />
73%<br />
50%<br />
40%<br />
44%<br />
30%<br />
30%<br />
20%<br />
10% 14%<br />
17%<br />
15%<br />
0%<br />
7%<br />
1%<br />
Masculino Feminino Urbano Rural Mais pobre Mais rico Total<br />
Taxas de conclusão do ensino primário Taxa de transição para o ensino secundário<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
Entraram na escola aos 6 anos<br />
Entraram na escola aos 10 anos ou mais<br />
iii Note-se que a educação da mãe, a riqueza familiar e a localização da residência (urbana/rural) podem ter alguma<br />
correlação entre si.<br />
114<br />
115
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />
muito acentuada a partir de 2003.<br />
Apenas 60 por cento das crianças chegam à<br />
última classe do ensino primário (ver Figura<br />
4.6). 15 Para alguns grupos de crianças, a taxa<br />
de transição é significativamente mais baixa:<br />
as raparigas, as crianças rurais e as mais<br />
pobres são mais propensas a não progredir<br />
através do sistema de ensino primário. As<br />
crianças que não transitam tanto podem<br />
repetir uma classe (na terceira, quinta ou<br />
sétima classe) como abandonar o sistema de<br />
ensino, pelo menos temporariamente.<br />
Figura 4.6: Percentagem dos que entram na primeira classe que chegam à última classe do ensino primário, por<br />
características seleccionadas, 2008<br />
90%<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
64%<br />
56%<br />
71%<br />
53%<br />
2.7. Equidade na Educação<br />
A desigualdade no ensino primário diminuiu<br />
entre 2003 e 2008. Como pode ser observado<br />
na Figura 4.7, os rácios de frequência escolar<br />
primária aumentaram em todos os quintis de<br />
riqueza. O aumento foi maior nas crianças<br />
mais pobres do que crianças mais ricas,<br />
reduzindo-se a diferença relativa a equidade.<br />
Os três últimos quintis de riqueza tiveram,<br />
todos eles, aumentos absolutos de cerca de<br />
27 pontos percentuais. A diferença entre os<br />
Masculino Feminino Urbano Rural Mais pobre Mais rico Total<br />
47%<br />
85%<br />
60%<br />
quintis mais elevado e mais baixo baixou<br />
de 43 pontos percentuais em 2003 para 23<br />
pontos percentuais em 2008.<br />
A desigualdade é mais acentuada no nível<br />
secundário e tem aumentado nos últimos<br />
anos. Em 2003, a grande maioria das crianças<br />
na escola secundária era das famílias mais<br />
abastadas. A maioria das crianças dos quatro<br />
quintis de riqueza inferiores não frequentava<br />
a escola secundária. Em 2008, registou-se<br />
um considerável aumento nos dois primeiros<br />
quintis, mas o acesso para crianças dos três<br />
quintis inferiores continua extremamente<br />
baixo (ver Figura 4.8). Os aumentos em<br />
termos absolutos foram significativamente<br />
superiores nas crianças mais ricas. A<br />
frequência das crianças no quintil mais pobre<br />
aumentou somente 2 pontos percentuais<br />
entre 2003 e 2008, enquanto a frequência das<br />
crianças no quintil mais rico subiu 27 pontos<br />
percentuais. O fosso entre os rácios líquidos<br />
de frequência no ensino secundário das<br />
crianças mais ricas e mais pobres aumentou<br />
de 21 pontos percentuais em 2003 para 46<br />
pontos percentuais em 2008. 16iv<br />
Devido à falta de escolas suficientes para<br />
absorver o aumento da demanda, mais<br />
graduados da 7ª classe não puderam<br />
dar continuidade aos seus estudos no<br />
ensino secundário ou primeiro ciclo do<br />
Ensino Secundário Geral (8ª classe).<br />
São de igual modo insuficientes tanto o<br />
número de professores com formação<br />
como o equipamento, obrigando as<br />
famílias a colocar as crianças em escolas<br />
particulares caso tenham meios para<br />
tal. Entretanto, uma grande maioria de<br />
crianças, e particularmente as que vivem<br />
em áreas rurais, é forçada a não prosseguir<br />
na sua escolarização. Como solução<br />
para o problema de espaço, têm surgido<br />
Escolas Primárias Expandidas (EPE), que<br />
oferecem ensino secundário mas onde<br />
são frequentemente os professores da<br />
escola primária que, apesar de não terem<br />
as qualificações necessárias, dão as aulas<br />
do Ensino Secundário Geral. Além disso, o<br />
afluxo de estudantes do ensino secundário<br />
coloca mais pressão sobre o espaço<br />
disponível nas escolas primárias. 17<br />
Figura 4.8: Rácios líquidos de frequência no ensino secundário por quintil de riqueza, 2003 e 2008<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
Figura 4.7: Rácios líquidos de frequência escolar primária por quintil de riqueza, 2003 e 2008<br />
100%<br />
90%<br />
80%<br />
88%<br />
87%<br />
70%<br />
72% 74% 80%<br />
70%<br />
60%<br />
40%<br />
45%<br />
50%<br />
48% 53%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
2003<br />
2008<br />
Mais baixo Segundo Médio Quarto Mais alto<br />
Fonte: IDS 2003 e MICS 2008.<br />
95%<br />
50%<br />
45%<br />
40%<br />
35%<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
1% 2%<br />
Fonte: IDS 2003 e MICS 2008.<br />
22%<br />
8%<br />
5%<br />
6%<br />
2%<br />
3%<br />
2003 2008<br />
Mais baixo Segundo Médio Quarto Mais alto<br />
iv As comparações entre os dados de alfabetização do IDS 2003 e do MICS 2008 devem ser interpretadas com cautela uma<br />
vez que as metodologias usadas nas duas pesquisas não são compatíveis.<br />
21%<br />
49%<br />
116<br />
117
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />
2.8. Alfabetização<br />
Na altura da independência, em 1975,<br />
Moçambique tinha uma taxa de analfabetos<br />
superior a 93 por cento, com taxas ainda<br />
mais elevadas nas mulheres, o que<br />
representou um enorme desafio para o<br />
desenvolvimento do país. Os esforços<br />
do governo e das comunidades nos anos<br />
seguintes foram bem sucedidos na redução<br />
da taxa de analfabetismo para 72 por cento<br />
em 1980. Este progresso foi, no entanto,<br />
prejudicado pelo início da guerra e da crise<br />
económica na década de 1980 e inícios de<br />
1990, tendo ficado praticamente paralisado.<br />
O trabalho foi retomado após a guerra,<br />
resultando numa redução da taxa de<br />
analfabetismo em adultos de 61 por cento<br />
em 1999 para 54 por cento em 2005. 18<br />
As taxas de alfabetização continuam baixas<br />
no respeitante a mulheres. Em 2008, apenas<br />
47 por cento das mulheres sabiam ler e<br />
escrever. É todavia maior a percentagem de<br />
mulheres jovens que sabem ler e escrever:<br />
41 por cento das de 20 a 24 anos de idade<br />
em comparação com 53 por cento das de 15<br />
a 19 anos. Não houve alteração significativa<br />
nas taxas de alfabetização de mulheres<br />
entre 2003 e 2008. 19<br />
Figura 4.9: Taxas de alfabetização em mulheres de 15-24 anos por quintil de riqueza, 2008<br />
90%<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
11%<br />
24%<br />
32%<br />
O nível de riqueza das famílias está<br />
fortemente correlacionado com o nível de<br />
alfabetização, principalmente nas mulheres.<br />
Entre as mulheres de 15-24 anos, apenas<br />
11 por cento dos agregados familiares no<br />
quintil mais pobre sabiam ler e escrever,<br />
comparativamente a 84 por cento dos<br />
agregados familiares no quintil em melhor<br />
situação (ver Figura 4.9).<br />
2.9. Ensino superior<br />
O número de instituições de ensino superior<br />
aumentou de 9 para 38, entre 2000 e 2009.<br />
Entre elas encontram-se as duas principais<br />
universidades públicas: a Universidade<br />
Pedagógica (UP) e a Universidade Eduardo<br />
Mondlane (UEM). Os requisitos para o<br />
ingresso nessas instituições são a conclusão<br />
do ESG2 (12ª classe) e a aprovação em<br />
exames de admissão.<br />
As matrículas em instituições de ensino<br />
superior também têm vindo a aumentar. O<br />
número de instituições desse nível aumentou<br />
de 9 para 38 entre 2000 e 2009, tendo o<br />
número de estudantes que o frequentam<br />
passado de 13,592 para cerca de 80,000 em<br />
2009. 20 Houve também melhorias em termos<br />
de equidade geográfica, ora com toda uma<br />
instituição de ensino ora com a abertura de<br />
delegações em todas as províncias.<br />
Mais baixo Segundo Médio Quarto Mais alto<br />
60%<br />
84%<br />
3. Barreiras à participação na educação<br />
3.1. Custos directos com a<br />
educação<br />
Os custos directos do ensino primário têm<br />
sido referidos como um dos principais<br />
obstáculos ao ingresso das crianças e sua<br />
permanência na escola. 21 , 22 A abolição das<br />
tarifas escolares, introduzida em 2004,<br />
juntamente com a introdução de um novo<br />
currículo e a provisão gratuita de livros e<br />
algum material escolar básico através do<br />
programa Apoio Directo às Escolas (ADE)<br />
reduziram os obstáculos relacionados com<br />
os custos directos com o ensino primário.<br />
No entanto, o custo dos uniformes e outros<br />
materiais escolares continua a restringir<br />
o acesso no caso das famílias mais<br />
vulneráveis. Assim, para as famílias muito<br />
pobres, especialmente nas zonas rurais, a<br />
soma de todos os custos directos continua<br />
a ser um importante factor ao decidirem<br />
se, quem ou quantos filhos podem pôr na<br />
escola, sobretudo a nível secundário. 23<br />
3.2. Custos de oportunidade<br />
para as comunidades<br />
Num quadro de pobreza, o investimento em<br />
educação é uma das escolhas que as famílias<br />
devem fazer em relação a outras prioridades<br />
que afectam as suas vidas e meios de<br />
subsistência. A pobreza das famílias muitas<br />
vezes requer que as crianças ajudem nas<br />
tarefas domésticas ou que trabalhem para<br />
ganhar dinheiro para sustentar a família ou<br />
para comprar material escolar. Dados do<br />
MICS 2008 mostram que 22 por cento das<br />
crianças de 5-14 anos estão envolvidas no<br />
trabalho infantil, v mas que a maior parte<br />
delas (78 por cento) andam na escola. 24<br />
Quando as crianças não têm bom<br />
desempenho escolar, os pais podem não<br />
ver benefícios da educação em termos de<br />
retorno do seu investimento, o que pode<br />
fazer com que tirem as crianças da escola.<br />
A percepção dos benefícios da educação<br />
é também geralmente associada a outros<br />
factores, incluindo a qualidade do ensino que<br />
é ministrado às crianças, oportunidades de<br />
trabalho depois do período de escolarização,<br />
distância para a escola secundária mais<br />
próxima, disponibilidade de lugares nas<br />
escolas secundárias, competências adquiridas<br />
na escola e disponibilidade de professores<br />
qualificados. O grande aumento no número<br />
de matrículas em Moçambique indica uma<br />
demanda de educação, sem dúvida no nível<br />
primário e, de forma crescente, no nível<br />
secundário. Para além do lado da demanda,<br />
as restrições do lado da oferta agravam as<br />
barreiras à educação.<br />
3.3. Impacto de tradições e<br />
da cultura no direito das<br />
crianças à educação<br />
As tradições culturais podem funcionar<br />
como barreiras à educação. O casamento<br />
precoce das raparigas e os ritos de iniciação<br />
de rapazes e raparigas tendem a influenciar<br />
negativamente as taxas de frequência<br />
do ensino primário. Ainda ocorrem ritos<br />
de iniciação em algumas partes do país,<br />
principalmente rurais. O casamento infantil<br />
prejudica o acesso à escola, bem como a<br />
retenção e conclusão. Respondentes de um<br />
estudo do Banco Mundial realizado em 2007<br />
referiram o casamento infantil como uma<br />
razão para o não ingresso das raparigas<br />
no ensino secundário, ou para posterior<br />
abandono. 25<br />
Há uma forte correlação entre a<br />
percentagem de raparigas fora da escola<br />
secundária e a prevalência do casamento<br />
Fonte: 2008 MICS.<br />
v A definição de trabalho infantil inclui crianças envolvidas em trabalho remunerado, trabalho não remunerado, trabalho<br />
para algum negócio familiar ou tarefas domésticas por 28 ou mais horas por semana.<br />
118<br />
119
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />
infantil numa província. A Figura 4.10<br />
mostra como o casamento infantil é mais<br />
comum nas províncias do norte e centro do<br />
que no sul do país. O casamento infantil tem<br />
também uma forte relação com a riqueza<br />
das famílias. As raparigas das famílias mais<br />
pobres são muito mais propensas a casar-se<br />
do que as raparigas oriundas de meios mais<br />
ricos.<br />
3.4. Impacto da violência e do<br />
abuso nas escolas<br />
A prevalência de violência, abuso e assédio<br />
sexual nas escolas afecta a frequência dos<br />
alunos, especialmente das raparigas, tendo<br />
sido identificada pelos pais como factor que<br />
influencia a decisão de retirar os seus filhos<br />
da escola. Um estudo realizado pelo MINED<br />
em 2008, de crianças, membros do conselho<br />
da escola e membros de unidades de género<br />
de direcções provinciais de educação avaliou<br />
a prevalência de todos os tipos de violência,<br />
assédio e abuso sexual nas escolas. Setenta<br />
por cento das raparigas entrevistadas<br />
afirmaram que alguns professores exigem<br />
relações sexuais para passar os alunos e<br />
que as escolas não oferecem segurança<br />
nesse aspecto, pois o acto é cometido com<br />
o conhecimento cúmplice das autoridades<br />
escolares. O estudo também observou<br />
que as vítimas e tutores não sabem que<br />
o abuso sexual é punível por lei. O medo<br />
de represálias impele frequentemente as<br />
vítimas ao silêncio. 26<br />
Em 2003, o MINED emitiu um decreto<br />
proibindo explicitamente os professores de<br />
terem relações sexuais com estudantes. O<br />
MINED declarou também uma política de<br />
‘tolerância zero’ para abusos sexuais, e no<br />
Plano Económico e Social anual de 2010 foi<br />
reforçada a capacidade dos pontos focais<br />
provinciais de género para monitorar e<br />
relatar casos de abuso sexual nas escolas.<br />
No entanto, continuam fracos tanto o<br />
seguimento do abuso nas escolas como a<br />
aplicação rigorosa do decreto e da política<br />
de tolerância zero. O Comité dos Direitos da<br />
Criança exprimiu a sua preocupação com a<br />
prevalência de abuso e assédio sexual nas<br />
escolas.<br />
3.5. Qualidade de ensino<br />
A qualidade de ensino continua a ser<br />
uma área de grande preocupação em<br />
Moçambique. Dados recentes do Consórcio<br />
da África Austral e Oriental para a Monitoria<br />
da Qualidade de Ensino (SACMEQ)<br />
indicam que entre 2000 e 2007 os níveis de<br />
Moçambique registaram uma deterioração<br />
significativa no desempenho em leitura<br />
e matemática. 27 O SACMEQ conclui que<br />
Figura 4.11: Resultados dos alunos em leitura,<br />
2000 e 2007<br />
SACMEQ<br />
Zimbábuè<br />
Zanzibar<br />
Zâmbia<br />
Uganda<br />
Tanzânia<br />
Swazilândia<br />
África do Sul<br />
Seicheles<br />
Namíbia<br />
Moçambique<br />
511,8<br />
500<br />
507,7<br />
504,7<br />
533,9<br />
478,2<br />
434,4<br />
440,1<br />
478,7<br />
482,4<br />
577,8<br />
545,9<br />
549,4<br />
529,6<br />
494,9<br />
492,3<br />
575,1<br />
582<br />
496,9<br />
448,8<br />
476<br />
516,7<br />
Figura 4.12: Resultados dos alunos em matemática,<br />
2000 e 2007<br />
SACMEQ<br />
Zimbábuè<br />
Zanzibar<br />
Zâmbia<br />
Uganda<br />
Tanzânia<br />
Swazilândia<br />
África do Sul<br />
Seicheles<br />
Namíbia<br />
Moçambique<br />
509,5<br />
500<br />
519,8<br />
486,2<br />
478,1<br />
435,2<br />
435,2<br />
481,9<br />
506,3<br />
552,7<br />
522,4<br />
540,8<br />
516,5<br />
494,8<br />
486,1<br />
550,7<br />
554,3<br />
471<br />
430,9<br />
483,8<br />
530<br />
Figura 4.10: Casamentos infantis e raparigas fora da escola secundária por província, 2008<br />
Maurícias<br />
573,5<br />
536,4<br />
Maurícias<br />
623,3<br />
584,6<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
42%<br />
24%<br />
Niassa<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
50%<br />
30%<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
46%<br />
21%<br />
Nampula<br />
42%<br />
22%<br />
Zambezia<br />
56%<br />
19%<br />
21%<br />
52%<br />
19%<br />
45%<br />
34%<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
9% 9%<br />
Gaza<br />
33%<br />
Girls out of secondary school Percentage married before age 15<br />
6%<br />
27%<br />
Maputo<br />
Province<br />
19%<br />
4%<br />
Malawi<br />
Lesoto<br />
Quénia<br />
Botsuana<br />
433,5<br />
428,9<br />
467,9<br />
451,2<br />
543,1<br />
546,5<br />
534,6<br />
521,1<br />
Botsuana<br />
0 200 400 600 800<br />
0 200 400 600 800<br />
Maputo<br />
City 2007 2000<br />
2007 2000<br />
Source: Makuwa, D.,‘What are the levels and trends in reading and mathematics achievement?’ Southern and Eastern Africa<br />
Consortium for Monitoring Education Quality, 2010.<br />
Malawi<br />
Lesoto<br />
Quénia<br />
447<br />
432,9<br />
476,9<br />
447,2<br />
557<br />
563,3<br />
520,5<br />
512,9<br />
120<br />
121
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />
o declínio de Moçambique de mais de<br />
40 pontos em leitura e matemática foi<br />
associado às rápidas mudanças estruturais<br />
no sistema de ensino no período em análise<br />
que resultaram em aumentos maciços das<br />
matrículas na 6ª classe sem que houvesse<br />
um correspondente aumento dos recursos<br />
humanos e materiais.<br />
Só se poderá alcançar qualidade de ensino<br />
quando os ambientes de aprendizagem<br />
forem amigos da criança e promoverem uma<br />
abordagem holística ao desenvolvimento da<br />
criança. Quer isto dizer que esses ambientes<br />
procuram dar resposta aos múltiplos direitos<br />
das crianças e estabelecem ligações entre<br />
a escola, a família e a comunidade. Os<br />
ambientes amigos da criança garantem às<br />
crianças espaços de aprendizagem seguros<br />
e adequados, acesso a instalações de água e<br />
saneamento, controlos de saúde regulares.<br />
A capacidade das crianças de aprender<br />
é prejudicada quando os ambientes de<br />
aprendizagem não são centrados na criança,<br />
sensíveis ao género, inclusivos, de protecção<br />
e livres de discriminação. 28<br />
Até o momento, a abordagem à garantia<br />
de qualidade na educação em Moçambique<br />
tem sido um tanto fragmentada, com<br />
investimentos direccionados principalmente<br />
para despesas correntes e para o<br />
desenvolvimento de melhores infraestruturas.<br />
Tende a ficar para trás uma maior<br />
atenção ao melhoramento do ambiente<br />
escolar.<br />
O ambiente nas escolas de Moçambique<br />
continua a não ser suficientemente<br />
favorável à promoção de uma abordagem à<br />
educação baseada em direitos que valorize<br />
as opiniões das crianças e promova o seu<br />
pensamento crítico e as suas faculdades<br />
criativas. O ensino é muitas vezes realizado<br />
em dois ou mais turnos por dia. As turmas<br />
chegam muitas vezes a ter 75 alunos<br />
(ver Disponibilidade de professores), a<br />
maioria sentados no chão, sem de livros,<br />
mesas e materiais de aprendizagem<br />
suficientes. Em muitas escolas, as aulas<br />
são ministradas debaixo de árvores ou em<br />
pátios abertos, sem acesso a instalações<br />
de água ou saneamento. Não havendo um<br />
ambiente físico de qualidade, propício à<br />
aprendizagem e um processo de ensinoaprendizagem<br />
em sala de aula centrado na<br />
criança, pouca possibilidade há de os alunos<br />
desenvolverem o seu potencial, habilidades<br />
para a vida ou as atitudes adequadas.<br />
Moçambique tem um forte currículo, que<br />
descreve as competências (conhecimentos,<br />
habilidades, atitudes e práticas para a vida<br />
diária) que os alunos devem desenvolver,<br />
que se insere num quadro baseado em<br />
direitos. No entanto, o tipo de aprendizagem<br />
que de facto se verifica nas escolas<br />
nem sempre coincide com a visão ou as<br />
expectativas estabelecidas no currículo.<br />
A aprendizagem é predominantemente<br />
orientada para a memorização, e a interacção<br />
em sala de aula não corresponde à visão ou<br />
expectativas do currículo, o que contribuiu<br />
para elevadas taxas de abandono, baixos<br />
níveis de desempenho e baixas taxas de<br />
conclusão escolar. Outros factores, tais como<br />
a falta de cuidados de saúde e nutrição,<br />
diminuem ainda mais a capacidade das<br />
crianças em Moçambique de iniciar e<br />
prosseguir os seus estudos. Um conjunto<br />
consolidado de padrões básicos e mínimos<br />
pode funcionar como normas para as escolas<br />
garantirem que se ofereça às crianças um<br />
ambiente de aprendizagem propício.<br />
É muito limitado o material didáctico<br />
disponível para o ensino. O MINED fornece<br />
gratuitamente livros às crianças da 1ª à 7ª<br />
classe com base na projecção do número<br />
de matrículas. Em 2007, 53 por cento das<br />
crianças da 6ª classe tinham uso exclusivo<br />
de um livro de leitura. Catorze por cento<br />
partilhavam um livro com um colega de<br />
turma, enquanto 25 partilhavam um livro<br />
com dois ou mais colegas. Não havia<br />
livros disponíveis em 8 por cento das<br />
salas de aula da sexta classe. 29 Embora se<br />
tenham verificado avanços na distribuição<br />
de grandes quantidades de livros após a<br />
introdução do novo currículo do ensino<br />
primário em 2004, permanecem vários<br />
desafios. Os livros escolares fornecidos pelo<br />
governo tendem a chegar muito tarde, e<br />
são frequentes os desvios para o mercado<br />
informal.<br />
Em média a escola em Moçambique tem<br />
um grande número de professores sem<br />
formação e instalações que precisam<br />
de ser melhoradas. A falta de fortes<br />
programas de formação de professores<br />
e formadores de professores, tanto para<br />
a formação pré-docência como para a<br />
formação em exercício, tem perpetuado<br />
uma baixa qualidade nesses profissionais.<br />
A falta de preparação dos professores<br />
para leccionarem o novo currículo, e para<br />
prepararem os alunos para a aquisição de<br />
competências básicas de aprendizagem<br />
está a contribuir para elevados níveis de<br />
abandono escolar precoce, baixos níveis de<br />
desempenho e conclusão escolar, e exclusão<br />
dos mais vulneráveis.<br />
Poucas escolas em Moçambique oferecem<br />
presentemente um rácio professor-aluno ou<br />
um espaço adequados para proporcionar e<br />
manter a aprendizagem. 30 O fenómeno do<br />
‘choque de acesso’ é generalizado, tendo<br />
um aumento maciço do número de alunos<br />
conduzido a um sistema sobrecarregado<br />
que simplesmente não satisfaz. 31 Em<br />
2008/09, mais de 40 por cento do total de<br />
adultos e crianças (não contando bebés)<br />
em áreas urbanas estavam envolvidos em<br />
algum estudo, enquanto nas zonas rurais<br />
a percentagem rondava os 33 por cento. 32<br />
Mais de 1,2 milhões de pessoas estavam<br />
no sistema de ensino em 2008/09 em<br />
comparação com 2002/03. 33 Se isto constitui<br />
um significativo aumento no acesso à<br />
educação, coloca também grande pressão<br />
sobre o sistema de ensino.<br />
O choque de acesso agrava o problema das<br />
baixas taxas de conclusão, principalmente<br />
por estar incompleta a construção de<br />
escolas, e, consequentemente, estas não<br />
estarem capazes de oferecer vagas para<br />
todos os alunos em condições de transitar<br />
para o EP2 cada ano escolar. Segundo dados<br />
do MINED, cerca de 7,000 escolas do EP1<br />
não conseguiram oferecer vagas no EP2 para<br />
todos os estudantes elegíveis em 2009 (ver<br />
Infra-estruturas escolares).<br />
Não existe um quadro básico de padrões<br />
de qualidade do ensino. Embora existam<br />
vários regulamentos procurando estabelecer<br />
um ensino de qualidade, a falta de um<br />
sistema consolidado que defina requisitos<br />
mínimos para o ensino significa que nem os<br />
professores nem a comunidade estão claros<br />
quanto aos objectivos a serem alcançados<br />
relativamente às escolas. Não existem<br />
pontos de referência ou indicadores claros<br />
para monitoria do ensino, nem é medido<br />
o progresso nem são identificadas lacunas<br />
para que se possa fazer um planeamento<br />
adequado e definir sistematicamente metas<br />
a níveis descentralizados.<br />
3.6. Infra-estruturas escolares<br />
As infra-estruturas escolares são importantes<br />
para garantir qualidade do ambiente<br />
de aprendizagem. A superlotação é um<br />
problema sério nas escolas moçambicanas.<br />
O grande aumento no número de alunos no<br />
sistema de ensino nos últimos anos agravou<br />
a superlotação nas escolas e salas de aula. A<br />
falta de mobiliário escolar adequado (mesas,<br />
cadeiras, etc.) pode afectar a capacidade dos<br />
alunos de escrever correctamente e, a longo<br />
prazo, até a sua postura e saúde física. Sendo<br />
assim, as crianças enfrentam condições<br />
não saudáveis e em que a aprendizagem<br />
se torna difícil. Além disso, a falta de<br />
instalações de água e saneamento prejudica<br />
a frequência dos alunos, nomeadamente a<br />
das raparigas (ver Capítulo 3, Sobrevivência e<br />
desenvolvimento da criança).<br />
Existem em Moçambique três tipos de<br />
espaços de ensino: a escola convencional,<br />
escolas melhoradas e escolas de construção<br />
precária (de colmo, caniço). As escolas<br />
construídas com tijolos e cobertas com<br />
chapas de zinco são do tipo convencional,<br />
construídas pelo Governo. No entanto,<br />
devido ao lento ritmo de construção, muitas<br />
escolas são construídas pelas comunidades<br />
usando materiais localmente disponíveis;<br />
são estruturas basicamente temporárias,<br />
inadequadas para a aprendizagem das<br />
crianças. Todas as escolas secundárias<br />
existentes são do tipo convencional, embora<br />
em número manifestamente insuficiente.<br />
122<br />
123
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />
Em 2005, foi lançado um programa de<br />
construção acelerada de escolas de baixo<br />
custo, com participação das comunidades.<br />
Em Junho de 2010, tinham sido construídas<br />
4,601 salas de aula do ensino primário. 34<br />
Embora em 2010 se vá aplicar uma nova<br />
abordagem em regime experimental para<br />
a construção de escolas, a qualidade e a<br />
adequação das infra-estruturas escolares<br />
em Moçambique continua a ser um desafio,<br />
encontrando-se aquém das metas planeadas.<br />
Há uma situação de escassez de escolas<br />
secundárias. De acordo com as projecções<br />
para 2010, o número de crianças que<br />
completam a 7 ª classe deverá ultrapassar<br />
a entrada estimada para o ESG1 em quase<br />
185,000. 35 Para lidar com a falta de escolas<br />
secundárias, estão a ser ampliadas escolas<br />
primárias em algumas áreas. No entanto,<br />
como já se referiu neste relatório as aulas do<br />
ensino secundário são, por vezes, leccionadas<br />
por professores primários que não têm a<br />
formação exigida para o ensino secundário.<br />
Estão a ser construídas novas escolas<br />
secundárias, mas o ritmo de construção não<br />
tem acompanhando a demanda. Cortes no<br />
financiamento externo poderão vir a agravar<br />
este problema nos próximos anos.<br />
3.7. Disponibilidade de<br />
professores<br />
Moçambique enfrenta uma grave escassez<br />
de professores, e o rápido aumento das<br />
matrículas no ensino primário tem colocado<br />
significativa pressão sobre os professores<br />
no sistema de educação. A relação alunoprofessor<br />
deteriorou-se entre 2004 e 2006<br />
devido ao significativo aumento de alunos<br />
no sistema (ver Figura 4.13), mas melhorou<br />
entre 2006 e 2009. Não se registou melhoria<br />
do número de alunos por professor<br />
no ensino primário como resultado do<br />
número de novos professores contratados,<br />
principalmente devido a atrasos na<br />
substituição de funcionários que deixam o<br />
sector (mesmo por morte, despedimento<br />
e abandono de postos de trabalho), o que<br />
reflecte problemas na gestão de recursos<br />
humanos. 36 Em 2009, havia uma média<br />
de 68 alunos por professor na escola<br />
primária, superior a 65:1 em 2000. 37 O valor<br />
de referência internacional estabelecido<br />
pela Fast Track Initiative é de 40 alunos<br />
por professor. Existem significativas<br />
disparidades nas relações professor-aluno<br />
entre as diferentes províncias, variando de<br />
55:1 em Gaza a 91:1 na Zambézia.<br />
Apesar de um considerável aumento<br />
no número de professoras do ensino<br />
primário, de 16,922 em 2005 para 25,947<br />
em 2008, continua baixa a percentagem<br />
de professores do sexo feminino: em 2008,<br />
apenas 37 por cento dos professores do EP1<br />
e 29 por cento dos professores do EP2 eram<br />
mulheres. Também existem significativas<br />
disparidades entre as províncias: em<br />
Cabo Delgado, apenas 17 por cento dos<br />
professores a nível do EP2 eram mulheres,<br />
contra 38 por cento na Cidade de Maputo. 38<br />
As professoras servem de modelo para as<br />
raparigas, e, ao mesmo tempo, de bom<br />
exemplo para os rapazes verem as mulheres<br />
num papel profissional. É igualmente<br />
evidente que a presença de professoras<br />
diminui a probabilidade de violência e abuso<br />
sexual nas escolas.<br />
É comum o absentismo de professores,<br />
em parte por causa do HIV e SIDA, por um<br />
lado, e, por outro, baixo moral. Os salários<br />
dos professores são muitas vezes pagos<br />
com meses de atraso, especialmente os<br />
dos professores recém-contratados, o que<br />
os leva a abandonar os seus postos ou a<br />
privilegiar actividades não docentes.<br />
3.8. Formação pré-docência<br />
e formação contínua de<br />
professores<br />
Em 2009, estavam formados e qualificados<br />
para o ensino 68 por cento dos professores<br />
do EP1 e 79 por cento dos professores<br />
do EP2. No entanto, quase 32 por cento<br />
da força de formadores de professores<br />
primários em Moçambique não tinha<br />
formação pré-docência. 39 Há dois principais<br />
tipos de instituição de formação de docentes<br />
para o ensino primário em Moçambique:<br />
os Institutos de Formação dos Professores<br />
(IFPs), administrados pelo MINED, e as<br />
Escolas de Professores do Futuro (EPF),<br />
geridas pela organização não governamental<br />
ADPP (Ajuda de Desenvolvimento de Povo<br />
para Povo).<br />
Na província da Zambézia, apenas 58<br />
por cento dos professores do EP1 eram<br />
professores qualificados. 40 O MINED está a<br />
formar um crescente número de professores<br />
por ano, chegando a 10,000 professores em<br />
2009. 41 A diminuição da percentagem de<br />
professores qualificados constitui um desafio<br />
particularmente para o nível secundário,<br />
Tabela 4.1: Relação professor-aluno por província, 2008<br />
Província Rácio Professor-Aluno no EP1 Rácio professor-aluno no EP2<br />
Cidade de Maputo 62 59<br />
Cabo Delgado 71 37<br />
Gaza 55 44<br />
Inhambane 56 48<br />
Manica 63 45<br />
Maputo 56 48<br />
Nampula 83 45<br />
Niassa 68 41<br />
Sofala 75 58<br />
Tete 75 45<br />
Zambezia 91 44<br />
Figura 4.13: Rácio professor-aluno, 2004-2009<br />
78<br />
76<br />
74<br />
72<br />
70<br />
68<br />
66<br />
64<br />
62<br />
60<br />
2004 2005 2006 2007 2008 2009<br />
Fonte: Ministério da Educação e Cultura, Contribuição do Sector para a Reunião de Planificação do QAD, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2009.<br />
As quatro melhores<br />
As quatro médias<br />
As quatro piores<br />
Fonte: Cálculos do <strong>UNICEF</strong> com base em MEC 2008.<br />
124<br />
125
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />
onde 30 por cento do total de professores<br />
do primeiro ciclo do ensino não tinham<br />
formação em 2009, comparativamente<br />
a apenas oito por cento em 1992. 42 43 O<br />
sector deixou efectivamente de contratar<br />
professores sem formação a partir de 2008. 44<br />
Os números dos dois tipos de instituição<br />
de formação foram registando um aumento<br />
gradual, havendo pelo menos uma<br />
instituição de cada tipo em cada província<br />
do país. Para acelerar o recrutamento de<br />
professores com formação nas escolas<br />
primárias, o Governo, em 2007, reduziu<br />
a duração do curso de formação de<br />
professores pré-docência de dois anos para<br />
apenas um. Ambos os tipos de centro de<br />
formação estão agora a implementar cursos<br />
de formação pré-docência de um ano. Os<br />
IFPs também implementam programas de<br />
formação em exercício.<br />
O requisito de admissão ao IFPs/EPFs é<br />
um certificado de conclusão da 10ª classe.<br />
Devido à má qualidade do ensino secundário<br />
no país, muitos dos professores estagiários<br />
têm fracas competências de leitura e<br />
escrita. Um estudo realizado pelo Instituto<br />
de Formação da Matola, na província de<br />
Maputo, mostrou que quase 40 por cento<br />
dos formandos tinham adquirido a sua<br />
qualificação de 10 ª classe mais de seis<br />
anos antes da sua inscrição no programa e,<br />
consequentemente, tinham perdido a maior<br />
parte das suas competências académicas<br />
básicas e achavam difícil lidar com o<br />
conteúdo do curso, pesado, orientado para o<br />
conhecimento e altamente teórico.<br />
A mudança para um programa de um ano<br />
deu origem a problemas de qualidade<br />
e gestão dos cursos. O curso do IFP é<br />
operado de cima para baixo, com apenas<br />
uma semana estipulada para a prática<br />
docente. Como resultado, os graduados dos<br />
IFP não adquirem a experiência de ensino<br />
e as competências de gestão de aulas<br />
necessárias. Devido à falta de transporte,<br />
os formandos devem servir-se de escolas<br />
próximas dos centros de formação para sua<br />
prática docente. Isto faz com que um grande<br />
número de estagiários tente praticar as<br />
suas competências num pequeno número<br />
de escolas, reduzindo ainda mais o tempo<br />
disponível para a aquisição de experiência<br />
docente. As EPF, que foram obrigadas a<br />
encurtar as estruturas dos seus cursos de<br />
dois para um ano para se adequarem às<br />
directrizes nacionais, são comparativamente<br />
mais bem geridos, dedicando 50 por<br />
cento do curso de um ano à prática de<br />
ensino. Os formandos aprendem através<br />
de um sistema assistido por computador,<br />
de auto-aprendizagem com tutores à<br />
disposição para resolver problemas. São<br />
atribuídas aos alunos responsabilidades<br />
de gestão de determinadas funções do<br />
centro de formação, o que lhes proporciona<br />
experiência prática em gestão institucional.<br />
Apenas alguns membros do corpo docente<br />
dos IFP tem experiência como formadores<br />
de professores, pois são geralmente<br />
recrutados da área administrativa do MINED.<br />
Há também falta de formadores no sistema<br />
dos IFP, e o conteúdo dos seus cursos tem<br />
sido constantemente alterado ao longo dos<br />
últimos três anos para acomodar novas<br />
áreas. Estas mudanças resultaram num<br />
curso pré-docência muito pesado. Muitas<br />
vezes não há tempo suficiente para cobrir<br />
os temas de forma adequada. O MINED está<br />
a planear uma revisão da estrutura e do<br />
conteúdo do curso dos IFP.<br />
Para orientar os formadores dos IFP para a<br />
estrutura evolutiva do curso, os membros<br />
da equipe técnica do Departamento<br />
de Recursos Humanos do MINED são<br />
destacados para formar os formadores,<br />
apesar de muitos deles não serem<br />
necessariamente formadores de professores<br />
profissionalmente qualificados ou<br />
equipados com metodologias de formação<br />
de professores. Além disso, a afectação<br />
de recursos aos IFPs continua a ser muito<br />
desigual entre as diferentes províncias,<br />
e não são claros os critérios utilizados.<br />
Todos esses factores contribuem para uma<br />
situação crítica no sistema de formação de<br />
professores do país.<br />
Um curso em Ensino Básico, com a duração<br />
de dois anos, gerido pela Universidade<br />
Pedagógica destina-se principalmente a<br />
preparar os formadores de professores. Tal<br />
curso continua, no entanto, a ser teórico<br />
e a carecer de conhecimento prático e<br />
competências de formação.<br />
O principal órgão encarregado de fazer<br />
monitoria pedagógica e apoiar professores<br />
na formação em exercício é a Zona de<br />
Influência Pedagógica (ZIP). As escolas<br />
também têm tido a responsabilidade de<br />
prestar apoio em exercício a professores<br />
a nível de agrupamento. Não existe<br />
nenhum sistema estruturado ou política de<br />
formação de professores em exercício em<br />
Moçambique. A formação em exercício é<br />
geralmente executada em regime ad hoc<br />
nos IFPs, principalmente impulsionada<br />
por exigências centrais e não com base na<br />
avaliação das necessidades locais. Como<br />
resultado, há várias intervenções de formação<br />
de professores em exercício de curto prazo a<br />
serem apoiadas por parceiros, que decorrem<br />
em paralelo. Estas intervenções continuam<br />
descoordenadas e insustentáveis e têm pouco<br />
impacto institucional ou pouco impacto<br />
duradouro no desenvolvimento profissional<br />
dos professores.<br />
A ZIP é a escola principal duma localidade<br />
encarregada de fazer supervisão pedagógica<br />
de professores e directores de escola.<br />
A autoridade educacional do distrito<br />
também realiza uma ou duas visitas de<br />
supervisão por ano a um número limitado<br />
de escolas. Vários aspectos limitam o<br />
funcionamento eficaz do coordenador da<br />
ZIP, que é também o director da escola<br />
principal, com responsabilidades docentes<br />
e administrativas que limitam o tempo<br />
disponível para visitar outras escolas do<br />
grupo correspondente à ZIP. Pode haver<br />
mais de 20 escolas num grupo, podendo<br />
estas localizar-se a 25 km ou mais da escola<br />
principal. As excessivas demandas não<br />
académicas que se fazem sentir sobre os<br />
coordenadores das ZIPs têm impedido<br />
o desenvolvimento de um sistema mais<br />
estruturado de apoio aos professores a<br />
esse nível. Experiências de outros países<br />
mostram uma utilização bem sucedida<br />
das ZIPs como canal para a realização de<br />
sessões regulares de aprendizagem mútua<br />
para desenvolvimento dos professores,<br />
planificação conjunta de aulas e resolução<br />
de problemas.<br />
Ao mesmo tempo, as condições actuais de<br />
trabalho dos professores (baixos salários,<br />
falta de habitações nas zonas rurais, falta<br />
de transporte) terão de ser melhoradas<br />
para se conseguir chegar a um sistema de<br />
supervisão e apoio ao professor a nível local<br />
que funcione.<br />
3.9. Gestão escolar<br />
As deficiências no sistema de formação<br />
de professores e a fraca qualidade dos<br />
professores no país que daí resulta tornam<br />
a gestão escolar ainda mais importante na<br />
obtenção de resultados. A gestão não é,<br />
no entanto, uma área isenta de problemas.<br />
Em primeiro lugar, não há nenhum curso<br />
de formação de directores de escola em<br />
Moçambique e, portanto, todos os directores<br />
de escola são apenas professores que foram<br />
considerados aptos para desempenhar essa<br />
função. Muitos directores de escola não têm,<br />
inclusivamente, formação docente. Além<br />
disso, todos os directores de escola são<br />
obrigados a leccionar, dando, muitas vezes,<br />
aulas em dois turnos ou fazendo horas<br />
extras (no EP2), o que reduz o tempo de que<br />
dispõem para realizar a gestão e supervisão<br />
escolar.<br />
3.10. Falta de enfoque em saúde<br />
escolar<br />
Os programas de saúde escolar e nutrição<br />
são formas de baixo custo de manter<br />
as crianças na escola e promover uma<br />
educação de qualidade. Moçambique tem<br />
um programa de saúde escolar que faz<br />
parte do programa nacional integrado<br />
do sector da saúde, o qual principiou no<br />
início de 1980. O Ministério da Saúde e o<br />
MINED implementaram conjuntamente o<br />
programa de saúde escolar no âmbito de<br />
um memorando de entendimento que define<br />
os papéis e as responsabilidades de ambos<br />
os sectores e estabelece o mecanismo<br />
126<br />
127
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />
de coordenação. É, no entanto, grande<br />
o fosso existente entre a política e a sua<br />
implementação.<br />
Problemas de saúde crónicos continuam<br />
a ser um grande desafio, podendo minar<br />
as conquistas obtidas no aumento do<br />
acesso à educação. Uma saúde deficiente<br />
- especialmente devido a malária - a<br />
desnutrição e a cólera são os factores<br />
subjacentes ao absentismo, ao fraco<br />
desempenho escolar e ao abandono escolar.<br />
Consulte o Capítulo 3 para mais informações<br />
sobre os desafios de saúde enfrentados por<br />
crianças moçambicanas.<br />
3.11. Impacto da língua nos<br />
resultados educacionais<br />
A língua de ensino em todo o país é o<br />
Português, a língua oficial de Moçambique.<br />
No entanto, Moçambique tem 19 línguas<br />
locais. A maioria das comunidades fala<br />
na sua língua local, ou uma mistura de<br />
português e uma língua local, em casa.<br />
O primeiro contacto da criança com o<br />
português geralmente ocorre quando a<br />
criança começa a frequentar a escola. Isso<br />
pode afectar negativamente a aprendizagem<br />
das crianças. 45 Alguns professores nunca<br />
ficam plenamente qualificados para o<br />
ensino de português, porque o português<br />
é para eles uma segunda língua. O uso do<br />
português como meio predominante de<br />
ensino pode atrasar a entrada na escola de<br />
crianças que provêm de subgrupos culturais<br />
e falam línguas diferentes, podendo conduzir<br />
a mais baixos resultados educacionais,<br />
como, por exemplo, baixos níveis de literacia<br />
em português.<br />
Com a reforma do ensino, foi incorporado<br />
ao novo currículo o ensino bilingue, estando<br />
a ser actualmente aplicadas em regime<br />
experimental, num pequeno número de<br />
escolas, duas abordagens alternativas. Na<br />
primeira, o Português é a língua principal<br />
de ensino, e o idioma local é usado como<br />
recurso adicional de ensino e aprendizagem;<br />
no segundo, a língua local é usada como<br />
língua de ensino até à segunda classe,<br />
enquanto o português é estudado como<br />
uma disciplina formal independente.<br />
Esta iniciativa ainda se encontra numa<br />
fase piloto e está a ser implementada em<br />
apenas algumas escolas em todo o país. Há<br />
indicações de que, embora extremamente<br />
limitada, a iniciativa começa a apresentar<br />
resultados positivos, pelo que o Ministério<br />
pretende expandi-la gradualmente ao resto<br />
do país a partir de 2011. A produção de<br />
material escolar para acomodar todas as<br />
línguas locais constitui um desafio.<br />
4. Outras questões no sector da educação<br />
4.1. Estratégia de habilidades<br />
para a vida visando<br />
combater a SIDA<br />
Desde 2002 que o MINED tem vindo a<br />
implementar programas educacionais de<br />
combate ao HIV. Esses programas estão<br />
em sintonia com o plano estratégico<br />
nacional de combate ao HIV e SIDA e<br />
guiam-se pela estratégia do sector para o<br />
HIV, 46 que tem em vista reduzir o impacto<br />
do HIV e SIDA nos trabalhadores através<br />
de políticas para locais de trabalho e, nos<br />
estudantes, através do desenvolvimento<br />
de programas de habilidades para a vida<br />
nas escolas, da integração de HIV e saúde<br />
sexual e reprodutiva no currículo escolar,<br />
e proporcionando kits de informação<br />
sobre o HIV e SIDA. Com a ajuda de vários<br />
parceiros, o programa Geração Biz, apoiado<br />
pelo FNUAP e agora pelo MINED como um<br />
programa nacional, promove a educação<br />
para a vida através do seu pacote básico<br />
para a faixa etária 15-18 anos. O <strong>UNICEF</strong><br />
promove um programa de habilidades para<br />
a vida que combina conhecimento com<br />
estratégias de comunicação para a faixa<br />
etária Janela de Esperança (10 a 14 anos de<br />
idade). O programa, que foi implementado<br />
em 86 distritos em todas as províncias<br />
de Moçambique, ajuda as crianças a<br />
melhorarem as suas habilidades para a vida<br />
e a adquirirem conhecimentos e informações<br />
para se protegerem de comportamentos de<br />
risco. O programa também inclui a criação<br />
de um sistema de apoio à comunidade<br />
através de programas de rádio.<br />
Importantes desafios destas abordagens<br />
são a sustentabilidade no desenvolvimento<br />
de parcerias com organizações não<br />
governamentais, a capacitação de<br />
professores para difundir a educação<br />
baseada em habilidades para a vida e a<br />
alocação de recursos, pois estes programas<br />
continuam a ser financiados com ajuda<br />
externa.<br />
O MINED adoptou uma política de local<br />
de trabalho para reduzir o impacto do<br />
HIV e SIDA nos trabalhadores. Em 2009,<br />
o Ministério iniciou a implementação de<br />
um programa para monitorar e reduzir<br />
gradualmente a prevalência de infecções<br />
de transmissão sexual nos funcionários.<br />
O programa também inclui controlos<br />
periódicos de saúde dos trabalhadores.<br />
4.2. Participação das crianças<br />
O sistema educativo, ao invés de centrado<br />
na criança, continua a ser centrado no<br />
professor. As crianças só falam em resposta<br />
a questões colocadas pelos professores e<br />
são incentivadas a responder em uníssono.<br />
Estão a ser feitos esforços para incentivar<br />
a participação das crianças na escola. Uma<br />
dessas iniciativas é a sua participação no<br />
sistema dos conselhos da escola. Estes<br />
são compostos por representantes de<br />
estudantes, pais, professores e outros<br />
membros da comunidade. Os representantes<br />
dos alunos são eleitos pelos seus pares. Os<br />
conselhos da escola discutem e promovem<br />
soluções para os problemas que afectam<br />
as suas escolas. O desafio desta iniciativa é<br />
assegurar que a participação das crianças<br />
não seja unicamente simbólica e darlhes<br />
uma voz activa na gestão da escola.<br />
Em suas observações finais no segundo<br />
relatório periódico de Moçambique, o<br />
Comité dos Direitos da Criança expressou<br />
a sua preocupação por “as opiniões da<br />
criança em Moçambique por vezes não<br />
serem solicitadas nem consideradas em<br />
vários ambientes que lhe dizem respeito...<br />
inclusivamente em matéria de administração<br />
escolar e educação...”. 47<br />
Desporto e actividades recreativas são<br />
direitos da criança, como prevê o artigo 31<br />
da Convenção sobre os Direitos da Criança.<br />
Embora o desporto seja uma componente<br />
vital do bem-estar da criança e a educação<br />
física parte integrante do currículo do ensino<br />
128<br />
129
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />
primário, as escolas em Moçambique,<br />
sobretudo a nível primário, não têm<br />
qualquer actividade recreativa organizada<br />
ou actividades em equipa. A maior parte dos<br />
professores das escolas não têm formação<br />
formal em educação física e gestão<br />
desportiva. Nem sempre se pode dispor de<br />
equipamento ou instalações recreativas,<br />
especialmente em escolas em áreas rurais.<br />
Há no entanto no país uma forte cultura<br />
desportiva informal a nível da comunidade,<br />
mas não é muito comum a participação<br />
de raparigas e crianças portadoras de<br />
deficiência.<br />
4.3. Educação para crianças<br />
com necessidades especiais<br />
De acordo com o plano estratégico nacional<br />
do sector da educação, a educação especial<br />
está integrada na educação inclusiva. As<br />
escolas especiais geridas pelo Ministério da<br />
Mulher e da Acção Social são as instituições<br />
de educação especial predominantes. Em<br />
2009, havia cerca de 62,000 crianças com<br />
necessidades especiais matriculadas em<br />
escolas normais. Em 2008, foram formados<br />
apenas 3,127 professores para servir<br />
crianças com necessidades especiais, e<br />
havia apenas 98 escolas a oferecer educação<br />
inclusiva. 48<br />
4.4. Financiamento e alocação<br />
orçamental do sector da<br />
educação<br />
593 milhões de dólares americanos foram<br />
afectados ao sector da educação em 2010,<br />
o que representa um aumento de 10 por<br />
cento em 2009 (ver Figura 4.14). A despesa<br />
total com a educação do sector público<br />
aumentou substancialmente entre 2005 e<br />
2009 (20-37 por cento ao ano). 49 A execução<br />
orçamental no sector da educação é muitas<br />
vezes superior à dotação orçamental, pois<br />
durante o ano são feitos frequentes top-ups<br />
ao orçamento.<br />
Nos últimos anos, foram atribuídos ao<br />
sector da educação 18 a 22 por cento do<br />
orçamento. Em termos de despesa efectiva,<br />
a percentagem tem sido sistematicamente<br />
acima da marca dos 20 por cento (em 2009,<br />
a parcela da educação foi de cerca de 22<br />
por cento). A meta do PARPA II é 19 por<br />
cento. O sector da educação aumentou os<br />
seus gastos em cerca de 68 por cento entre<br />
2004 e 2008. Em geral, a taxa de execução<br />
do sector da educação tem sido razoável<br />
(90 por cento) em comparação com outros<br />
sectores, o que poderia explicar a maior<br />
parcela percentual na execução em relação à<br />
dotação orçamental. 50<br />
O financiamento externo directo destinado<br />
ao sector tem sido 35-40 por cento da<br />
despesa total (cerca de 230 milhões de<br />
dólares em 2009). Cerca de 60 por cento do<br />
financiamento externo é canalizado através<br />
do fundo comum do sector da educação. O<br />
financiamento externo financia a maior parte<br />
dos custos de investimento e correntes não<br />
relacionados com salários. 51<br />
Embora a estrutura do orçamento actual<br />
não desagregue a informação por nível de<br />
ensino, estima-se que o ensino primário<br />
(EP1 e EP2) recebeu a maior parcela de<br />
fundos, cerca de 48-54 por cento da despesa<br />
total. Prevê-se que o ensino secundário<br />
receba cerca de 20 por cento do orçamento<br />
(ES1 e ES2). 52 Salários e remunerações<br />
representaram cerca de metade do<br />
orçamento total em 2010. 53<br />
Os fundos são alocados às províncias com<br />
base em tendências históricas directamente<br />
relacionadas com a estrutura da educação a<br />
nível provincial. Estão a ser tomadas algumas<br />
medidas correctivas para combater as<br />
desigualdades entre as províncias, como, por<br />
exemplo, a afectação de novos professores<br />
com base no rácio professor/aluno. No<br />
Caixa 4.1: Educação para Todos – Fast Track Initiative<br />
entanto, os fundos atribuídos por aluno em<br />
Nampula são pouco mais de um quarto dos<br />
atribuídos por aluno na província de Niassa, e<br />
um terço dos fundos atribuídos per capita na<br />
Cidade de Maputo. 54<br />
Apesar dos ganhos de eficiência resultantes<br />
da existência de um plano estratégico<br />
nacional do sector, é necessário que, com a<br />
crescente procura de lugares, se mantenham<br />
investimentos acrescidos no sistema de<br />
ensino pós-primário (isto é, nas escolas<br />
secundárias e técnicas). Também é necessário<br />
investimento nos níveis de ensino secundário<br />
e superior para que se consiga produzir um<br />
número suficiente de professores qualificados<br />
para munir o crescente número de escolas<br />
primárias e secundárias.<br />
4.5. Financiamento externo<br />
A crise financeira global e o Código de<br />
Conduta da UE sobre a Divisão de Trabalho<br />
podem ter efeitos negativos sobre o<br />
financiamento externo para o sector da<br />
educação nos próximos anos. Para 2010,<br />
os compromissos externos foram menos<br />
22 por cento que em 2009. Embora o<br />
orçamento geral da educação para 2010 tenha<br />
Figura 4.14: Dotação orçamental para a educação em milhões de meticais, 2009 e 2010<br />
25,000<br />
20,000<br />
15,000<br />
10,000<br />
5,000<br />
0<br />
6,734<br />
9,433<br />
2009<br />
16,167<br />
7,051<br />
13,720<br />
2010<br />
Componente Investimento Componente Recorrente Total<br />
Fonte: FDC e <strong>UNICEF</strong>, O Que Diz A Proposta de Orçamento do Estado 2010 Sobre a Previsão de Recursos no Sector da Educação?,<br />
Resumo do Orçamento, <strong>UNICEF</strong> Moçambique, Maputo, 2010.<br />
20,771<br />
A Educação para Todos – Fast Track Initiative (EFA-FTI) foi lançada em 2002 como parceria<br />
global entre doadores e países em desenvolvimento para assegurar um progresso acelerado<br />
na prossecução dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio de educação primária universal<br />
até 2015. Todos os países de baixo rendimento que demonstrem um compromisso sério na<br />
materialização do ensino primário universal podem receber apoio da FTI.<br />
A FTI assenta em compromissos mútuos. Os países parceiros têm colocado o ensino primário<br />
na vanguarda dos esforços nacionais e desenvolvido fortes planos nacionais de educação,<br />
enquanto os doadores fornecem apoio financeiro e técnico coordenado e acrescido de<br />
forma transparente e previsível. A Fast Track Initiative administra dois fundos que podem<br />
conceder apoio financeiro para os objectivos de educação nos países de baixa renda: o Fundo<br />
Catalítico para a Educação, com um total de US$ 1,5 mil milhões de dólares americanos em<br />
compromissos (2003-2009), e o Fundo de Desenvolvimento do Programa de Educação, EUA,<br />
com 92 milhões de dólares em compromissos (2005-2009).<br />
Os recursos internos do sector têm sido prioritariamente canalizados para: (i) manutenção do<br />
sistema de apoio existente, (ii) melhoramento da qualidade da educação primária, e (iii) reforço<br />
da capacidade de implementação a nível distrital. 56 É a expansão do ensino pós-primário que<br />
mais afectada fica com a redução dos recursos externos para 2010.<br />
130<br />
131
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />
aumentado em cerca de 10 por cento, devido<br />
a um financiamento interno acrescido em 36<br />
por cento, a perda de financiamento externo<br />
tem afectado directamente o financiamento<br />
das actividades do programa do sector,<br />
uma vez que o aumento do financiamento<br />
interno é principalmente orientado para<br />
o financiamento de novos contratos de<br />
professores e a reforma salarial. Moçambique<br />
tem, no entanto, solicitado fundos adicionais<br />
ao abrigo do Fundo Catalítico da Fast Track<br />
Initiative (ver Caixa 4.1) após o termo da fase<br />
I em 2010, e conseguiu obter 90 milhões de<br />
dólares para o período 2011-2013. 55<br />
4.6. Programa Apoio Directo às<br />
Escolas<br />
O Apoio Directo às Escolas (ADE) transfere<br />
fundos directamente para as escolas<br />
de acordo com o número de alunos<br />
matriculados para superar barreiras de custo<br />
através de um processo de descentralização.<br />
O ADE aumentou a sua assistência financeira<br />
às escolas cinco vezes entre 2003 e 2009. 57<br />
58 De acordo com um estudo de avaliação<br />
realizado em 2007/08, foi sentimento geral<br />
das partes interessadas que o ADE contribui<br />
para a redução de problemas nas escolas<br />
(através do fornecimento de materiais<br />
necessários e melhor funcionamento das<br />
escolas), melhora o processo de ensino e<br />
aprendizagem e, portanto, a qualidade da<br />
educação, e apoia crianças carentes. 59 No<br />
entanto, apesar de serem fornecidos alguns<br />
materiais escolares através do ADE, são<br />
muitas vezes insuficientes em quantidade,<br />
fazendo com que os pais tenham de comprar<br />
consumíveis adicionais.<br />
Em Março de 2006, foi criado um programa<br />
piloto - Apoio Directo às Escolas - Crianças<br />
Órfãs e Vulneráveis (ADE-COV) - para<br />
apoiar a matrícula escolar e a retenção<br />
de crianças órfãs e vulneráveis em quatro<br />
distritos, aumentando para 12. vi Duplicou<br />
os fundos disponíveis de ADE por criança<br />
para o fornecimento de materiais e reduziu<br />
as principais barreiras à escolarização<br />
e retenção associadas a custos de<br />
oportunidade. Em dois distritos, este regime<br />
experimental foi também complementado<br />
por medidas de redução de outras barreiras<br />
dentro e fora da escola. vii Dados disponíveis viii<br />
indicam que o número de crianças órfãs<br />
e vulneráveis matriculadas aumentou nos<br />
distritos-alvo do ADE-COV em 56 por cento,<br />
quando o aumento médio nacional foi de 21<br />
por cento.<br />
vi Os quatro distritos foram: Angónia, província de Tete, Búzi, província de Sofala, Chókwè, província de Gaza, e Mocímboa<br />
da Praia, província de Cabo Delgado. Foram escolhidos com base nas taxas de prevalência do HIV, taxas de matrícula<br />
escolar, densidade populacional, meios de vida e vulnerabilidade, e sua situação geral de governação e administrativa.<br />
vii Ou seja, o fornecimento de registo de nascimento, um programa de extensão para identificar crianças órfãs e<br />
vulneráveis fora da escola e monitorar a sua participação, e prestação de apoio psicossocial às crianças órfãs e<br />
vulneráveis, consoante as necessidades. O Ministério da Mulher e da Acção Social e a Direcção Nacional dos Registos e<br />
Notariado orientam-nos na colaboração com os conselhos da escola.<br />
viii A província de Sofala, de que faz parte o distrito do Búzi, não tinha dados oficiais sobre as crianças órfãs e vulneráveis<br />
relativos a 2007.<br />
5. Conclusões<br />
Nos últimos anos registou-se um<br />
significativo progresso na expansão da<br />
participação no ensino primário. No entanto,<br />
continuam baixas as taxas de conclusão<br />
do ensino primário, bem como as taxas<br />
de frequência no nível secundário. Apesar<br />
de subsistirem diferenças, também foram<br />
reduzidas discrepâncias de longa data na<br />
frequência escolar das crianças entre as<br />
áreas urbana e rural e entre as famílias mais<br />
pobres e mais ricas. Têm sido eliminadas as<br />
disparidades entre rapazes e raparigas nas<br />
taxas líquidas de frequência.<br />
A qualidade da educação é um desafio<br />
fundamental para o sector, indicando<br />
dados recentes do SACMEQ que têm<br />
vindo a agravar-se nos últimos anos. É<br />
necessária uma abordagem abrangente<br />
para melhorar a qualidade de ensino<br />
através de: (i) desenvolvimento de padrões<br />
de qualidade escolar, (ii) criação de um<br />
quadro nacional de avaliação dos resultados<br />
da aprendizagem, e (iii) integração de<br />
vários esforços de formação, motivação e<br />
supervisão de professores, especialmente<br />
para supervisão pedagógica em exercício<br />
e apoio aos professores. A implementação<br />
da nova política de livros escolares deverá<br />
ter um impacto positivo na qualidade do<br />
ensino. Uma política nacional de expansão<br />
do ensino bilingue deverá também contribuir<br />
para a melhoria de qualidade.<br />
Num quadro de redução do financiamento<br />
externo, é necessária uma alocação<br />
estratégica de recursos para evitar que se<br />
percam ganhos já alcançados, como o apoio<br />
à iniciativa Apoio Directo a Crianças Órfãs<br />
e Vulneráveis (ADE-COV). Para garantir<br />
equidade, é necessário reconsiderar-se o uso<br />
do ADE para diferentes níveis de ensino.<br />
É necessário um significativo e sustentado<br />
investimento para fortalecer a capacidade<br />
institucional do Governo aos níveis<br />
nacional e subnacional. Deveriam ser<br />
implementados em regime experimental<br />
mecanismos que fossem projectados para<br />
proporcionar incentivos visando a redução<br />
de determinados constrangimentos-chave<br />
(inclusive relacionados com a colocação em<br />
locais remotos) e reforçar mecanismos de<br />
responsabilização. É ainda necessário que<br />
se realize e implemente um amplo processo<br />
de revisão e reforma salarial em que se dê<br />
prioridade à concessão de apoio adequado a<br />
trabalhadores da ‘linha da frente’.<br />
Para se efectuarem melhorias na qualidade<br />
de ensino, será necessário que se<br />
profissionalize o programa de formação<br />
de professores, tanto na componente prédocência<br />
como na componente em exercício<br />
a todos os níveis. Uma área que requer<br />
muita atenção é a do desenvolvimento de<br />
metodologias de formação e ensino que<br />
deixem de ser autoritárias e orientadas<br />
para a exposição para se tornarem práticas<br />
centradas no aluno e de aprendizagem<br />
independente que favoreçam as faculdades<br />
de pensamento crítico e criatividade. Uma<br />
racionalização do processo de selecção<br />
de formandos pré-docência garantirá a<br />
qualidade dos recursos humanos na profissão<br />
docente.<br />
É necessário que se descentralizem os<br />
programas de formação em exercício<br />
concebidos com base na avaliação<br />
das necessidades em professores.<br />
Isto promoverá o desenvolvimento de<br />
profissionalismo, confiança e motivação do<br />
professor. O desenvolvimento de um sistema<br />
estruturado e não ameaçador de apoio e<br />
supervisão ao professor tendo as ZIPS como<br />
os centros de recursos locais irá garantir o<br />
apoio necessário e contínuo, crucial para o<br />
desenvolvimento do professor.<br />
É necessário um sistema de identificação<br />
das competências essenciais do aprendiz e o<br />
acompanhamento do progresso das crianças<br />
através de avaliação contínua. Monitorar o<br />
nível e a aquisição de competências pelas<br />
crianças é uma componente integrante do<br />
132<br />
133
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />
sistema de passagens semi-automáticas.<br />
Isso exigirá o desenvolvimento de<br />
programas de formação de professores,<br />
tanto pré-docência como em exercício, que<br />
incidam sobre metodologias de ensino em<br />
torno de competências básicas e avaliação<br />
dessas competências por meio de métodos<br />
não ameaçadores. O desenvolvimento de um<br />
sistema nacional de avaliação (que o INDE<br />
tem presentemente em vista) terá de ser<br />
feito através de um processo consultivo que<br />
assegure apropriação e responsabilização.<br />
Deverão ser reforçadas as unidades de<br />
género a nível nacional e descentralizado<br />
para sensibilizar todas as autoridades<br />
escolares e membros de conselhos da escola<br />
sobre a prevenção e denúncia de abuso<br />
sexual; que o Ministério do Interior, em<br />
colaboração com o M inistério da Mulher<br />
e da Acção Social, reveja o seu Despacho<br />
39/GM/2003 para garantir que se puna quem<br />
cometa actos de abuso e violência.<br />
A sociedade civil continuará a<br />
desempenhar um importante papel não<br />
só na criação de procura, promovendo<br />
mudança de comportamento, mas também<br />
apoiando a expansão do acesso e da<br />
qualidade dos serviços básicos. Como<br />
muitas organizações da sociedade civil<br />
estão estabelecidas a nível da comunidade,<br />
elas estão também frequentemente em<br />
boas condições para garantir que os<br />
programas de desenvolvimento atinjam<br />
as populações mais vulneráveis e para<br />
defender a materialização dos direitos<br />
humanos. Deverão ser reforçadas<br />
as capacidades das organizações<br />
da sociedade civil a todos os níveis,<br />
devendo implementar-se mecanismos de<br />
coordenação para promover coerência e<br />
partilha de informação em abordagens<br />
lideradas e globalmente dirigidas por<br />
contrapartes governamentais de nível<br />
nacional e subnacional.<br />
Referências<br />
1 Da Costa, Maria Raquel ‘Relatório da<br />
Assistência Técnica na Área da Primeira<br />
Infância’ (inédito), 2009.<br />
2 Cálculos dos autores com base em ‘MICS<br />
2008, Relatório Final’, Instituto Nacional de<br />
Estatística, Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2010, e no Censo de 2007.<br />
3 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
4 Ibid.<br />
5 Cálculos dos autores com base em ‘MICS<br />
2008, Relatório Final’, Instituto Nacional de<br />
Estatística, Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2010, e no Censo de 2007.<br />
6 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
7 Ibid<br />
8 Ibid<br />
9 Ibid<br />
10 Ibid<br />
11 Ministério da Educação, Reunião<br />
de planificação, 2010. Balanço do<br />
aproveitamento escolar, 2009. Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2010.<br />
12 Ministry of Education and Culture, Education<br />
Statistics: Annual school results, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2008.<br />
13 Instituto Nacional de Estatística,’MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
14 Cálculos dos autores com base em Instituto<br />
Nacional de Estatística, ‘MICS 2008, Relatório<br />
Final,’ Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2010<br />
15 Ibid<br />
16 Ibid<br />
18 Ministério de Educação e Cultura, ‘Plano<br />
Estratégico de Educação e Cultura 2006-2011,’<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2006.<br />
19 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
20 Ministério da Educação e Cultura, Balanço<br />
do Plano Quinquenal do Governo Educação<br />
e Cultura, Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2009.<br />
21 Instituto Nacional de Estatística, ‘Inquérito<br />
aos Agregados Familiares sobre o Orçamento<br />
Familiar 2002/3,’ Relatório Final, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2003.<br />
22 Justiniano, M., et al., ‘Multifaceted Challenges:<br />
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Zambézia province’, <strong>UNICEF</strong> <strong>Mozambique</strong>,<br />
Maputo, 2005.<br />
23 World Bank, ‘PSIA II – Follow up Study of<br />
Primary Education and Baseline Study of<br />
Secondary Education, <strong>Mozambique</strong>’, World<br />
Bank, Maputo, 2007.<br />
24 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
25 World Bank, ‘PSIA II – Follow up Study of<br />
Primary Education and Baseline Study of<br />
Secondary Education, <strong>Mozambique</strong>’, World<br />
Bank, Maputo, 2007.<br />
26 Ministério da Educação e Cultura, Relatório<br />
da Auscultação Através das Unidades de<br />
Género, dos Conselhos das Escolas, e Jovens<br />
Raparigas sobre Que Mecanismo a Adoptar<br />
para Prevenção, Combate, Denúncia e<br />
Encaminhamento de Casos de Assédio e Todo<br />
o Tipo de Abuso, Incluindo o Abuso Sexual na<br />
Escola, Governo de Moçambique, Maputo, 2008.<br />
27 Makuwa, D. ‘What are the levels and trends<br />
in reading and mathematics achievement?’<br />
Southern and Eastern Africa Consortium for<br />
Monitoring Education Quality, 2010.<br />
17 World Bank, ‘PSIA II – Follow up Study of<br />
Primary Education and Baseline Study of<br />
Secondary Education, <strong>Mozambique</strong>’, Maputo,<br />
2007.<br />
28 United Nations Educational, Scientific and<br />
Cultural Organisation, ‘Booklet 5: Effective<br />
Learning. Good Policy and Practice in HIV &<br />
AIDS and Education (booklet series),’ UNESCO,<br />
Paris, 2008.<br />
134<br />
135
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />
29 Ross, K., ‘How successful are textbook<br />
provision programmes?’ Southern and<br />
Eastern Africa Consortium for Monitoring<br />
Education Quality, 2010.<br />
30 Swedish Development Agency, ‘Education<br />
Sector in <strong>Mozambique</strong>’, (inédito), Setembro<br />
de 2004.<br />
31 Ministério de Educação e Cultura, ‘Plano<br />
Estratégica de Educação e Cultura 2006–2011’,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2006.<br />
32 Ministry of Planning and Development.<br />
‘Poverty and Wellbeing in <strong>Mozambique</strong>: Third<br />
National Poverty Assessment.’ Governo de<br />
Moçambique, Maputo, Setembro de 2010.<br />
33 Authors calculations based on: Ministry<br />
of Planning and Development. ‘Poverty<br />
and Wellbeing in <strong>Mozambique</strong>: Third<br />
National Poverty Assessment. ’ Governo de<br />
Moçambique, Maputo, Setembro de 2010 e<br />
Censo 2007<br />
34 Ministério da Educação, ‘Programme<br />
Document for the funding request to the<br />
Catalytic Fund-FTI’, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, Setembro de 2010.<br />
35 Cálculos do <strong>UNICEF</strong> baseados em: Ministério<br />
da Educação “Plano de efectivos escolares”,<br />
2010 e Ministry of Education, ‘Programme<br />
Document for the funding request to the<br />
Catalytic Fund-FTI’, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, Setembro de 2010.<br />
36 Ministério da Educação e Cultura,<br />
‘Contribuição do Sector Para a Reunião<br />
de Planificação do QAD’, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
37 Ibid<br />
38 Ministry of Education and Culture, ‘Education<br />
Statistics: Annual school results’, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2008.<br />
39 Ibid<br />
40 Ibid<br />
41 Ministry of Education, ‘Programme Document<br />
for the funding request to the Catalytic Fund-<br />
FTI’, Governo de Moçambique, Maputo,<br />
Setembro de 2010.<br />
42 Ministry of Education and Culture, ‘Education<br />
Statistics: Annual school results’, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2008.<br />
43 Arndt, Channing, Sam Jones and Finn Tarp,<br />
‘Aid and Development: The Mozambican<br />
case’, University of Copenhagen, Discussion<br />
Paper series no. 06-13, 2006.<br />
44 Ministério da Educação e Cultura,<br />
Contribuição do Sector Para a Reunião<br />
de Planificação do QAD, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
45 Instituto Nacional do Desenvolvimento da<br />
Educação, Avaliação do Impacto do Ensino<br />
Bilingue no Novo Currículo do Ensino Básico,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2007.<br />
46 <strong>Mozambique</strong> National AIDS Council,<br />
Universal Declaration of Commitment on HIV<br />
and AIDS: <strong>Mozambique</strong> progress report for<br />
the United Nations General Assembly Special<br />
Session on HIV and AIDS, 2006–200’, Maputo,<br />
January 2008.<br />
47 Ministério da Educação e Cultura, Balanço do<br />
Plano Quinquenal do Governo - Educação e<br />
Cultura, Maputo, 2009<br />
48 United Nations Childrens Fund, O Que<br />
Diz a Proposta de Orçamento do Estado<br />
2010 Sobre a Previsão de Recursos no<br />
Sector de Educação?, Budget Brief, <strong>UNICEF</strong><br />
<strong>Mozambique</strong>, Maputo, 2010.<br />
49 Sal e Caldeira e Ximango Consultores,<br />
‘Análise do Impacto da Estrutura das<br />
Despesas sobre o Desenvolvimento<br />
Económico e as Condições de Vida em<br />
Moçambique.’ Agência Suíça para o<br />
desenvolvimento e Cooperação, Maputo,<br />
2009.<br />
50 Fundo das Nações Unidas para a Infância, O<br />
Que Diz a Proposta de Orçamento do Estado<br />
2010 sobre a Previsão de Recursos no Sector<br />
de Educação?, Resumo do Orçamento,<br />
<strong>UNICEF</strong> Moçambique, Maputo, 2010.<br />
51 Bartholomew, Ann, T. Takala and Z. Ahmed,<br />
‘Mid-Term Evaluation of the EFA Fast Track<br />
Initiative Country Case Study: <strong>Mozambique</strong>’,<br />
Cambridge Education, Mokoro Ltd., e Oxford<br />
Policy Management, Cambridge/Oxford, UK,<br />
versão preliminar, Setembro de 2009.<br />
52 Fundo das Nações Unidas para a Infância, O<br />
Que Diz a Proposta de Orçamento do Estado<br />
2010 sobre a Previsão de Recursos no Sector<br />
de Educação?, Resumo do Orçamento,<br />
<strong>UNICEF</strong> Moçambique, Maputo, 2010.<br />
53 Fundo das Nações Unidas para a Infância, O<br />
Que Diz a Proposta de Orçamento do Estado<br />
2010 sobre a Previsão de Recursos no Sector<br />
de Educação?, Resumo do Orçamento,<br />
<strong>UNICEF</strong> Moçambique, Maputo, 2010.<br />
54 Fast Track Initiative Secretariat, ‘News release:<br />
Education Fast Track Initiative Announces<br />
US$ 180 Million to Educate Children Around<br />
the World,’ retrieved from: http://www.<br />
educationfasttrack.org/news/171/177/EFA-<br />
FTI-Announces-US-180-Million-to-Educate-<br />
Children-Around-the-World/d,Whats%20New,<br />
2010.<br />
55 Ministry of Education and Culture, Financing<br />
Education in <strong>Mozambique</strong>: Analysis 2009–<br />
2010, Governo de Moçambique, Maputo,<br />
Setembro de 2009.<br />
56 Ministério da Educação e Cultura, Apoio<br />
Directo às Escolas: Situação actual e<br />
perspectivas, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2007<br />
57 Ministério da Educação e Cultura, Programa<br />
de Actividades, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2009.<br />
58 Ministério da Educação e Cultura, Avaliação<br />
do Programa de Apoio Directo às Escolas (7ª<br />
e 8ª fase), Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2009.<br />
136<br />
137
5CAPÍTULO<br />
Protecção<br />
da criança<br />
5CAPÍTULO<br />
1. Introdução<br />
PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
A Convenção sobre os Direitos da Criança,<br />
a Carta Africana sobre os Direitos e Bemestar<br />
da Criança e outros instrumentos a<br />
nível internacional e regional apresentam<br />
uma ampla análise da necessidade de<br />
protecção da criança. Esses ordenamentos<br />
jurídicos reconhecem que as crianças são<br />
vulneráveis a violações dos seus direitos<br />
humanos básicos, e, consequentemente,<br />
concedem-lhes o direito fundamental a<br />
protecção jurídica e social, antes e após<br />
o nascimento. O dever de protecção das<br />
crianças recai tanto sobre entidades públicas<br />
como privadas, que têm a responsabilidade<br />
de proteger meninos e meninas de violência,<br />
abuso, exploração e negligência, incluindo<br />
separação desnecessária do seu ambiente<br />
familiar, e dos efeitos de situações de<br />
emergência. Através de sistemas e serviços<br />
legislativos, sociais e administrativos<br />
apropriados, entre os quais programas<br />
de protecção social, podem ser tratados<br />
os riscos de violação dos direitos das<br />
crianças conhecidos, o que poderá reduzir<br />
a vulnerabilidade das crianças e fortalecer a<br />
sua resistência.<br />
Entre as várias formas de maus tratos e<br />
abuso que ameaçam as crianças encontramse<br />
o abuso e a exploração sexual, o tráfico,<br />
trabalho perigoso, violência, viver ou<br />
trabalhar nas ruas, deficiência, SIDA, e<br />
práticas prejudiciais como o casamento<br />
prematuro, a falta de acesso a uma<br />
justiça amiga da criança, a separação e a<br />
institucionalização desnecessárias, entre<br />
outros. Uma protecção efectiva da criança<br />
mitiga os riscos e vulnerabilidades que<br />
contribuem para estes abusos. Um ambiente<br />
protector para as crianças apoiado por<br />
um sólido sistema e infra-estruturas de<br />
protecção é uma abordagem baseada em<br />
direitos para impulsionar o progresso do<br />
desenvolvimento humano e económico,<br />
melhorando a saúde, a educação e o bemestar<br />
das crianças bem como as capacidades<br />
que estão a desenvolver para serem<br />
pais, cidadãos e membros produtivos da<br />
sociedade. Pelo contrário, um sistema de<br />
protecção da criança difuso e fragmentado<br />
agrava a pobreza, a exclusão social e<br />
a susceptibilidade a infecção pelo HIV,<br />
aumentando também a probabilidade de<br />
sucessivas gerações virem a enfrentar riscos<br />
semelhantes.<br />
Os principais ministérios de Moçambique<br />
responsáveis pela educação, fortalecimento<br />
e manutenção de um sistema de protecção<br />
da criança são o Ministério da Mulher e<br />
da Acção Social, o Ministério da Justiça, o<br />
Ministério do Interior e os tribunais judiciais.<br />
Todos os ramos do governo, a sociedade<br />
civil e as organizações internacionais,<br />
juntamente com os sistemas informais,<br />
como as famílias e as comunidades, têm a<br />
responsabilidade de cooperar, coordenar e<br />
colaborar para nutrir e sustentar os esforços<br />
de protecção dos direitos das crianças.<br />
141
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
Embora se tenham registado importantes<br />
avanços na protecção dos direitos das<br />
crianças em Moçambique, muito ainda há<br />
a alcançar: aumentar o acesso das crianças<br />
a serviços sociais básicos de protecção<br />
e outros, harmonizar as ferramentas<br />
de monitoria para melhorar a recolha e<br />
análise de dados para o acompanhamento<br />
e planificação efectiva do bem-estar das<br />
crianças ao longo do tempo, e fortalecer<br />
as capacidades dos ministérios relevantes.<br />
O objectivo é o desenvolvimento de uma<br />
abordagem sistémica e robusta à protecção<br />
das crianças que torne os ministérios mais<br />
responsáveis e melhore a coordenação entre<br />
eles nos diversos níveis administrativos<br />
para proteger eficazmente as crianças. É<br />
necessário que se concentrem também<br />
esforços na sensibilização a todos os<br />
níveis da sociedade, incluindo crianças,<br />
famílias e comunidades, para os direitos<br />
das crianças e a obrigação de todos os<br />
intervenientes de promover a protecção da<br />
criança. Este capítulo descreve a situação<br />
da protecção da criança em Moçambique,<br />
analisa os progressos realizados e apresenta<br />
uma análise das lacunas e problemas no<br />
ambiente de protecção da criança.<br />
2. Reforma legislativa e das políticas<br />
O amplo pacote de legislação aprovado em<br />
2008 demonstra o compromisso do Governo<br />
de Moçambique para com a protecção dos<br />
direitos da criança e o melhoramento da<br />
situação das crianças e mulheres vítimas<br />
de violência, abuso e exploração. Para<br />
além disso, foram criados quatro tribunais<br />
especializados para menores visando reduzir<br />
o atraso de decisões judiciais pendentes e<br />
melhorar as capacidades do sistema judicial<br />
para gerir eficazmente os casos de crianças<br />
em conflito com a lei e melhorar a protecção<br />
dos direitos da criança.<br />
Também o Ministério do Interior, no âmbito<br />
dos serviços policiais para proteger os<br />
direitos das crianças e mulheres, tem vindo<br />
a criar e racionalizar procedimentos-padrão<br />
bem como a aplicar abordagens mais<br />
sistemáticas. Foi ainda criado pelo Ministério<br />
da Mulher e da Acção Social, em 2009,<br />
um grupo de trabalho multissectorial para<br />
prevenção da violência contra as crianças,<br />
na sequência do Estudo das Nações Unidas<br />
sobre a Violência e do III Congresso Mundial<br />
contra a Exploração Sexual de Crianças e<br />
Adolescentes, onde o Governo reconheceu<br />
a necessidade urgente de uma abordagem<br />
multissectorial de prevenção e resposta<br />
à violência contra crianças e da criação<br />
de um sistema de encaminhamento para<br />
assistência às vítimas. 1<br />
Os sistemas nacionais de protecção<br />
da criança eficazes começam por leis,<br />
políticas e regulamentos concebidos para<br />
defender os direitos da criança em todas<br />
as circunstâncias. A falta de um quadro de<br />
políticas adequado agrava a vulnerabilidade<br />
da criança e aumenta a probabilidade de lhe<br />
ser negada uma série de direitos que vão<br />
para além dos estritamente associados à<br />
protecção. A responsabilidade de respeitar,<br />
proteger e cumprir direitos é compartilhada<br />
por vários actores, mas é o Estado o<br />
primeiro garante de direitos seja nos termos<br />
do direito internacional seja nos termos da<br />
Constituição moçambicana. O Estado deve,<br />
e tanto quanto possível, garantir que exista<br />
protecção na lei, criar e fortalecer instituições<br />
eficazes para fazer cumprir a lei e trabalhar<br />
com a sociedade civil e o sector privado na<br />
promoção de valores e práticas positivas<br />
para melhorar a eficácia da protecção legal.<br />
Com a aprovação de três instrumentos - a<br />
Lei da Criança, a Lei da Justiça Juvenil e a<br />
Lei sobre a Violência Doméstica – promoveuse<br />
um Sistema de Protecção da Criança<br />
nacional efectivo, cujo quadro tem vindo<br />
a ser desenvolvido. Outras medidas que<br />
vêm sendo adoptadas pelo governo são a<br />
criação do Conselho Nacional da Criança<br />
e da Comissão de Direitos Humanos<br />
e do Parlamento Infantil, bem como a<br />
sensibilização para as questões de direitos<br />
da criança nos media. Foram criados em<br />
cinco províncias tribunais de menores para<br />
fortalecer a protecção das crianças em<br />
conflito e em contacto com a lei.<br />
Moçambique ratificou diversos importantes<br />
instrumentos internacionais e regionais<br />
de direitos humanos sobre a protecção<br />
da criança, o que reflecte o compromisso<br />
do Governo para com a harmonização<br />
da legislação nacional com as normas<br />
internacionais. A Constituição de 2004<br />
estabelece claramente que todas as acções<br />
relativas às crianças, empreendidas tanto<br />
por entidades públicas como por instituições<br />
privadas, devem considerar o melhor<br />
interesse da criança, em conformidade com<br />
a Convenção sobre os Direitos da Criança.<br />
A Constituição define os contornos do<br />
quadro jurídico e de políticas concernente às<br />
crianças, como abaixo descrito. Ver Caixa 5.1<br />
para desenvolvimentos recentes e futuros no<br />
quadro jurídico de protecção das crianças.<br />
As políticas e os programas de protecção<br />
social têm-se revelado eficazes na resposta<br />
às necessidades das famílias e crianças<br />
vulneráveis uma vez que a protecção social<br />
desempenha um papel fundamental na<br />
redução da pobreza, superação da exclusão<br />
142<br />
143
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
social e constituição de capital humano<br />
para se atenuarem os riscos enfrentados<br />
por grupos vulneráveis, particularmente<br />
crianças e suas famílias. Várias formas de<br />
política de protecção social existiram em<br />
Moçambique desde 1975, variando ao longo<br />
dos anos o papel pretendido para o Estado,<br />
desde o de ambicioso provedor de todos os<br />
serviços (após a independência) até ao de<br />
fornecedor marginal de regimes de pensões<br />
extremamente limitados, ajuda de resposta<br />
a situações de emergência e subsídios<br />
alimentares para idosos (na sequência de<br />
programas de ajustamento estrutural).<br />
Nos últimos anos, no entanto, tem-se dado<br />
uma atenção mais centrada no reforço da<br />
protecção social em todo o país, começando<br />
a reconhecer-se a importância da protecção<br />
das crianças vulneráveis no diálogo sobre<br />
políticas nacionais. Além disso, os sectores de<br />
Saúde e Educação têm programas específicos<br />
para crianças com necessidades específicas<br />
(serviços de saúde gratuitos para crianças<br />
menores de cinco anos e crianças padecendo<br />
de desnutrição, e apoio em material educativo<br />
para crianças vulneráveis).<br />
A Lei sobre a Protecção Social, aprovada<br />
em 2007, exige que se ofereça segurança<br />
social básica a pessoas e crianças pobres<br />
em situações difíceis. Nela se define<br />
protecção social como “um conjunto de<br />
medidas que visam mitigar, em sintonia<br />
com as condições económicas do país, a<br />
pobreza absoluta da população, garantindo a<br />
subsistência dos trabalhadores em situações<br />
de privação ou diminuição de capacidade<br />
para o trabalho, bem como a sobrevivência<br />
de outros membros da família caso o<br />
dito trabalhador tenha falecido, e garantir<br />
condições para a sua sobrevivência.” 2 A<br />
lei reparte ainda a protecção social por<br />
três pilares: protecção social obrigatória<br />
(seguro social sob tutela dos Ministérios<br />
do Trabalho e das Finanças para os que<br />
se encontram no mercado de trabalho<br />
formal); protecção social complementar<br />
(iniciativas adicionais através dos sectores<br />
privado e de voluntariado) e protecção<br />
social básica, o que tem maior potencial<br />
para chegar às crianças vulneráveis. A<br />
protecção social básica abrange os cidadãos<br />
que estão impossibilitados de trabalhar ou<br />
que não têm meios para satisfazer as suas<br />
necessidades básicas, a saber:<br />
• l Pessoas em situação de pobreza absoluta;<br />
• l Crianças em difíceis circunstâncias;<br />
• l Idosos em situação de pobreza;<br />
• l Pessoas portadoras de deficiência em<br />
situação de pobreza absoluta;<br />
• l Pessoas com doenças crónicas ou<br />
doenças degenerativas.<br />
As Normas da Estratégia se Segurança Social<br />
Básica aprovadas em 2009, subdividem a<br />
segurança social básica em acção social<br />
directa, acção social relacionada com a saúde,<br />
acção social relacionada com a educação e<br />
rede de segurança produtiva. A Estratégia<br />
de Segurança Social Básica multissectorial,<br />
que foi aprovada pelo Conselho de Ministros<br />
em 2010, identifica quatro programas<br />
constituintes do pacote de segurança social<br />
básico: dois programas de transferência de<br />
dinheiro (o actual Programa Subsídio de<br />
Alimentos [PSA] e um novo programa de<br />
subsídios para a criança destinado a famílias<br />
com crianças órfãs e vulneráveis a seu cargo);<br />
o actual Programa de Apoio Social Directo<br />
(PASD) e um novo programa da rede de<br />
segurança produtiva. Planeia-se expandir o<br />
PSA para que dê maior enfoque a crianças<br />
órfãs e vulneráveis como beneficiários<br />
indirectos. A operacionalização do programa<br />
de subsídios para crianças proposto depende<br />
das conclusões da avaliação contínua do<br />
impacto do PSA e de outros estudos de<br />
viabilidade. O alcance actualmente limitado<br />
do PASD inclui ainda uma percentagem<br />
relativamente elevada de crianças<br />
beneficiárias. Prevê-se a instauração de um<br />
mecanismo para garantir que as famílias<br />
vulneráveis tenham acesso a um conjunto de<br />
serviços básicos e protecção, possivelmente<br />
partindo da experiência do atestado de<br />
pobreza actual. Deverá ser finalizado até<br />
ao final de 2010 um plano operacional para<br />
complementar a estratégia, o qual constituirá<br />
um importante instrumento para procurar<br />
influenciar no sentido de maiores fundos do<br />
governo para implementar esses programas.<br />
Caixa 5.1: Legislação e políticas de protecção social recentemente aprovadas<br />
2010<br />
2009<br />
2008<br />
2006<br />
2005<br />
2004<br />
A Estratégia de Protecção Social Básica inclui, como parte integrante, subsídios para<br />
crianças.<br />
A Lei da Violência Doméstica tem por objectivo aumentar a protecção das mulheres e das<br />
crianças contra o abuso e a exploração sexual em casa e nas comunidades. Criminaliza<br />
pela primeira vez a violência doméstica em Moçambique, requer penalizações acrescidas<br />
para os infractores e atribui ao Estado a obrigação de assistir as vítimas oferecendo<br />
serviços como investigação policial e tratamento médico.<br />
A Lei da Criança e a Lei da Justiça Juvenil, ambas aprovadas em 2008, traduzem a<br />
Convenção sobre os Direitos da Criança na legislação nacional de direitos da criança, um<br />
passo importante para a criação de um quadro jurídico e político concernente à criança.<br />
A Lei sobre o Tráfico de Pessoas, Especialmente Mulheres e Crianças define o tráfico de<br />
pessoas em consonância com os instrumentos jurídicos internacionais (nomeadamente o<br />
Protocolo de Palermo, ratificado em 2006) e criminaliza o tráfico, sobretudo de crianças e<br />
mulheres. Tem de ser elaborado e aprovado o regulamento desta lei.<br />
A Lei do Trabalho proíbe explicitamente as piores formas de trabalho infantil para crianças<br />
menores de 18 anos. Estabelece que as crianças entre os 15 e os 18 anos só podem<br />
trabalhar um máximo de 38 horas por semana ou 7 horas por dia. Em reconhecimento da<br />
realidade económica do país, permite que as crianças de 12 a 15 anos trabalhem, desde<br />
que o façam com a permissão de um dos seus progenitores ou outro responsável legal.<br />
A Lei de Protecção Social exige a provisão de segurança social básica a pessoas pobres<br />
e crianças em situações difíceis. A lei define protecção social como “um conjunto de<br />
medidas que visam mitigar ... a pobreza absoluta da população, garantindo a subsistência<br />
dos trabalhadores em situações de privação ou capacidade para o trabalho diminuída,<br />
bem como a de familiares sobrevivos em caso de morte do referido trabalhador, e garantir<br />
condições para a sua sobrevivência.”<br />
O Plano Nacional para Crianças Órfãs e Vulneráveis identifica seis serviços essenciais<br />
para atender às principais necessidades das crianças: saúde, educação, apoio nutricional e<br />
alimentar, apoio financeiro, apoio jurídico e apoio psicológico. O Governo de Moçambique<br />
comprometeu-se a garantir que as crianças tenham acesso a pelo menos três desses seis<br />
serviços, com particular incidência sobre as crianças que vivem abaixo da linha de pobreza<br />
absoluta, incluindo órfãos e crianças a viver com e afectadas pela SIDA. A implementação<br />
do plano é coordenada pelo Ministério da Mulher e Acção Social com o apoio de um grupo<br />
de trabalho técnico multissectorial e do Grupo de Trabalho Técnico para Crianças Órfãs e<br />
Vulneráveis.<br />
O Plano Nacional de Acção para a Criança 2006-2010 visa proteger os direitos civis e<br />
humanos e a segurança de todas as crianças desenvolvendo e coordenando actividades<br />
das principais partes interessadas.<br />
A Lei da Família articula novas normas jurídicas para responsabilidades parentais, guarda,<br />
adopção e herança, e eleva a idade de casamento de 16 para 18 anos tanto para rapazes<br />
como para raparigas.<br />
O Código do Registo Civil alarga o período de registo de nascimento gratuito de 30 para<br />
120 dias a contar do nascimento da criança.<br />
144<br />
145
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
3. Violência, abuso e exploração<br />
A violência contra as crianças é uma<br />
grave violação dos direitos humanos com<br />
devastadoras consequências para a saúde<br />
física e mental a curto e longo prazo.<br />
Crianças vítimas de violência incluem<br />
crianças que foram abusadas sexualmente<br />
ou submetidas a violência como punição;<br />
crianças forçadas a trabalhar em condições<br />
deploráveis ou traficadas em condições<br />
de trabalho exploratórias, ou crianças<br />
forçadas a casamento prematuro. Tal<br />
violência ultrapassa fronteiras geográficas,<br />
atravessando culturas, classes, raças e<br />
religiões. Pode ser expressa como agressão<br />
ou abuso físico ou sexual, maus tratos<br />
psicológicos ou emocionais, privação ou<br />
negligência. O risco de violência é agravado<br />
pela pobreza, que muitas vezes anda de<br />
mãos dadas com a falta de protecção<br />
adequada por parte dos cuidadores e<br />
limitado acesso a serviços essenciais.<br />
Estatísticas do Ministério do Interior revelam<br />
terem sido reportados à polícia mais de<br />
3.500 casos de violência infantil em 2009. 3 É<br />
possível que o número de crianças vítimas<br />
de violência, abuso e exploração supere em<br />
muito o número de casos notificados.<br />
O Estudo das Nações Unidas sobre a<br />
Violência constata que a violência contra<br />
as crianças é importante em termos de<br />
escala, alcance e subnotificação, três<br />
aspectos agravados pela aceitação social<br />
do fenómeno. 4 Algumas formas de violência<br />
estão enraizadas em dinâmicas de género<br />
discriminatórias e desiguais e práticas<br />
nocivas, e Moçambique não constitui<br />
excepção. Estudos e dados disponíveis<br />
constituem uma base para se afirmar que é<br />
excepcionalmente forte em Moçambique a<br />
cultura patriarcal existente e ordem social<br />
dominada pelo sexo masculino. 5 O baixo<br />
nível de conhecimento que as vítimas<br />
possuem dos seus direitos e uma cultura<br />
de silêncio e aceitação da violência são os<br />
principais obstáculos ao lidar-se com esta<br />
questão.<br />
São limitados os dados quantitativos recentes,<br />
mas pesquisas anteriores relataram uma alta<br />
incidência de exploração e abuso sexual de<br />
crianças e mulheres no lar, no trabalho e na<br />
escola. O abuso sexual de crianças e mulheres<br />
continua a ser uma grande preocupação<br />
em Moçambique. Em 2001, o Inquérito<br />
Nacional de saúde sexual e reprodutiva e<br />
comportamento sexual dos jovens indicou que<br />
30 por cento das mulheres e 37 por cento dos<br />
homens, quando crianças ou adolescentes,<br />
tinham testemunhado directamente violência<br />
entre os seus pais, e que 15 por cento das<br />
mulheres e 20 por cento dos homens sofreram<br />
abuso físico de um parente na sua juventude. 6<br />
Um estudo realizado pelo Ministério da Mulher<br />
e da Acção Social em 2004 indicou que mais<br />
de 54 por cento das mulheres pesquisadas<br />
relataram ter sido espancadas, e 23 por cento<br />
dos inquiridos reportaram ter sido submetidos<br />
a alguma forma de abuso sexual. 7 A maioria<br />
dos infractores é conhecida das vítimas e,<br />
muitas vezes, familiares próximos e amigos.<br />
As leis para proteger crianças e adolescentes<br />
contra o abuso sexual deixam considerável<br />
margem de manobra para o sistema judiciário<br />
interpretar se uma criança foi vítima de abuso<br />
sexual. Por exemplo, apenas com crianças<br />
menores de 12 são proibidas relações sexuais<br />
em qualquer circunstância (inclusive se se<br />
tiver estabelecido consenso) e as penas<br />
criminais podem ser em qualquer lugar, de<br />
dois a oito anos. No que respeita a crianças<br />
com mais de doze anos, é conferida ao juiz<br />
autoridade para determinar se ocorreu abuso<br />
sexual, mesmo no caso de adolescentes<br />
vítimas de abuso cometido por adultos.<br />
3.1. Violência e abuso sexual nas<br />
escolas<br />
O abuso sexual nas escolas constitui uma<br />
área de particular preocupação, como<br />
observou o Comité dos Direitos da Criança. 8<br />
Um inquérito do Ministério da Educação<br />
(MINED) de 2008 revelou que 70 por cento<br />
das meninas inquiridas relataram que<br />
alguns professores usam a relação sexual<br />
como condição para passar de classe,<br />
tendo 50 por cento afirmado que não são<br />
unicamente os professores que delas<br />
abusam sexualmente, mas também rapazes<br />
do seu grupo de colegas. Além disso, 80 por<br />
cento das raparigas reconheceram que o<br />
abuso e o assédio sexuais ocorrem não só<br />
nas escolas mas também nas comunidades.<br />
Muitas meninas não sabiam se esses actos<br />
eram proibidos por lei nem onde reportá-los<br />
quando ocorrem. 9<br />
A resposta institucional aos abusos sexuais<br />
nas escolas é limitada. O estudo também<br />
analisou o nível de consciencialização dos<br />
funcionários do MINED sobre o assunto.<br />
70 por cento dos funcionários provinciais<br />
de unidades provinciais de género e 65<br />
por cento dos coordenadores distritais de<br />
género reconheceram que o abuso sexual<br />
contra meninas e a gravidez precoce eram<br />
as principais preocupações e importantes<br />
obstáculos à provisão de um ambiente<br />
de aprendizagem seguro para a rapariga.<br />
Os membros dos Conselhos da Escola<br />
mostraram também preocupação com<br />
o abuso e assédio sexual nas escolas e<br />
tentaram medidas disciplinares estritas<br />
contra os professores que abusam de<br />
meninas na escola.<br />
O MINED tem uma política de ‘tolerância<br />
zero’ para o abuso sexual nas escolas, mas<br />
a continua fraca a sua aplicação. Em 2003,<br />
o MINED emitiu um decreto (Despacho<br />
39/GM/2003) proibindo os professores de<br />
terem relações sexuais com estudantes do<br />
sexo feminino e declarou ‘tolerância zero’ ao<br />
abuso sexual nas escolas. A Lei da Criança<br />
moçambicana de 2008 reafirma a obrigação<br />
da direcção da escola de comunicar às<br />
autoridades competentes os casos de<br />
maus tratos a alunos. No entanto, tanto o<br />
acompanhamento de actos de violência<br />
nas escolas como a implementação do<br />
decreto permanecem fracos. A revisão<br />
da estratégia de género e do decreto<br />
39/GM/2003 para enfatizar a notificação<br />
de violência e abuso sexual faz parte do<br />
plano de trabalho do MINED para 2010. A<br />
integração de questões de abuso sexual<br />
nas directrizes de planificação de 2010 é um<br />
avanço significativo que está a conduzir ao<br />
desenvolvimento de acções definidas para<br />
reforçar a capacidade dos pontos focais de<br />
género provinciais em matéria de monitoria<br />
e notificação de casos de abuso sexual nas<br />
escolas.<br />
Continuam a ser permitidos os castigos<br />
corporais em casa e na escola, sendo<br />
muitas vezes considerados a única forma<br />
de disciplinar as crianças. O Comité dos<br />
Direitos da Criança expressou preocupação<br />
pelo facto de “a Lei de Protecção dos<br />
Direitos da Criança (de Moçambique) não<br />
proibir explicitamente os castigos corporais<br />
em casa e nas escolas... que, apesar de<br />
os regulamentos internos do MINED, que<br />
proíbe os castigos corporais, continuam a ser<br />
infligidos às crianças por pais e professores.”<br />
O Estudo das Nações Unidas sobre Violência<br />
contra Crianças considera essencial haver<br />
sensibilização para influenciar as normas<br />
sociais, não só para as comunidades,<br />
incluindo as escolas, mas também para os<br />
profissionais em contacto com crianças.<br />
Uma adequada atenção dos media também<br />
consciencializa, promove discussão aberta<br />
e encoraja as comunidades a reagirem em<br />
casos de abuso e exploração. Tornar os<br />
serviços de apoio e reabilitação disponíveis é<br />
outro aspecto fundamental. Essas respostas<br />
tornam-se significativamente mais eficazes<br />
pela existência de um mecanismo de<br />
coordenação eficaz. Em 2009, o Ministério<br />
da Mulher e da Acção Social criou um grupo<br />
de trabalho multissectorial para questões<br />
de prevenção da violência contra crianças<br />
na sequência do Estudo das Nações Unidas<br />
para a Violência e do III Congresso Mundial<br />
contra a Exploração Sexual de Crianças e<br />
Adolescentes. Embora o processo de reforma<br />
legal tenha progredido, a tradução da nova<br />
legislação em regulamentação e programas<br />
eficazes continua a constituir, em virtude da<br />
falta de fundos, um desafio.<br />
O Plano de Acção para Prevenção da<br />
Violência Contra as Crianças está agora<br />
em fase de conclusão. O plano delineia<br />
146<br />
147
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
actividades relativas à protecção das<br />
crianças contra violência, negligência e<br />
exploração sexual estejam a ter lugar. 10<br />
A promulgação da Lei sobre a Violência<br />
Doméstica de 2009 pode impulsionar o<br />
fortalecimento de mecanismos para proteger<br />
as mulheres e as crianças de abuso sexual.<br />
Parceiros da sociedade civil prestaram<br />
acções de sensibilização a nível da<br />
comunidade, entre as quais uma campanha<br />
da Action Aid contra o abuso sexual de<br />
raparigas na escola.<br />
3.2. A violência doméstica<br />
Cinquenta e quatro por cento das<br />
mulheres que participaram num estudo<br />
do Ministério da Mulher e da Acção Social<br />
de 2004 informaram ter sido espancadas.<br />
A aceitação cultural da violência é um<br />
importante factor que muito contribui para a<br />
violência doméstica. 11 O perpetrador foi mais<br />
frequentemente o marido ou um parente<br />
Figura 5.1: Percentagem de mulheres de 15-49 anos que acham que um marido pode bater na sua esposa, por<br />
motivo específico, 2008<br />
40%<br />
35%<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
Quando ela<br />
sai de casa<br />
sem informar<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
21%<br />
19%<br />
18%<br />
19%<br />
Quando é<br />
negligente<br />
com as crianças<br />
Quando<br />
discute<br />
com ele<br />
próximo ou um conhecido. Dez por cento<br />
das respondentes relataram ter sido vítimas<br />
de algum tipo de abuso sexual. Nas áreas<br />
rurais foram reportados mais elevados níveis<br />
de violência contra as mulheres do que nas<br />
áreas urbanas. I<br />
A percentagem de mulheres que consideram<br />
que os homens têm o direito de lhes bater<br />
em certas circunstâncias desceu de 54<br />
por cento em 2003 para 36 por cento em<br />
2008. II,III Embora a redução seja positiva,<br />
continua muito elevada a aceitação da<br />
violência contra as mulheres. A razão<br />
mais comummente citada no Inquérito de<br />
Indicadores Múltiplos (MICS) de 2008 para<br />
bater na esposa é o marido aperceber-se de<br />
que a esposa está a ser negligente com as<br />
crianças. Este motivo foi citado por 21 por<br />
cento dos inquiridos (ver Figura 5.1).<br />
Há disparidades regionais nas atitudes<br />
de violência doméstica. A educação dos<br />
Quando<br />
recusa fazer<br />
sexo com ele<br />
Quando<br />
deixa a comida<br />
queimar-se<br />
Por qualquer<br />
destas razões<br />
I O estudo, realizado em 2004 para o Ministério pela Universidade Eduardo Mondlane, Centro de Estudos da População,<br />
incluiu 2052 mulheres com idades compreendidas entre os 18 e os 45 anos na Cidade de Maputo, Província de Maputo,<br />
Sofala, Manica, Zambézia e Nampula (Universidade Eduardo Mondlane, 2004).<br />
II Este valor é significativamente mais baixo que a média dos países da África Austral, onde 65 por cento das raparigas<br />
e mulheres com 15-49 anos pensam que se justifica um marido espancar ou bater na mulher em determinadas<br />
circunstâncias. Fonte : <strong>UNICEF</strong>, Progress for Children – A Report Card on Child Protecction, Número 8, <strong>UNICEF</strong>, Nova<br />
Iorque, Setembro de 2009.<br />
III O Indicador do IDS é a percentagem de mulheres com 15 e 49 anos que afirma justificar-se que um marido bata na mulher<br />
por uma das seguintes razões: roubar comida, discutir com o marido, sair de casa sem informar o marido, recusar sexo<br />
com o marido, e não cuidar das crianças.<br />
13%<br />
36%<br />
homens e das mulheres é o factor-chave<br />
na redução da violência contra crianças e<br />
mulheres. A percentagem de mulheres que<br />
acreditam que bater na esposa se justifica<br />
em certas circunstâncias varia de 10 por<br />
cento na Cidade de Maputo para perto de<br />
70 por cento em Niassa (ver Figura 5.2). 12<br />
O MICS 2008 também assinala que 24 por<br />
cento das mulheres que frequentavam o<br />
ensino secundário e superior aceitam a<br />
violência, em comparação com 38 por cento<br />
das mulheres que nunca frequentaram a<br />
escola. O estudo do Ministério da Mulher e<br />
Figura 5.2: Percentagem de mulheres (15-49 anos) que acreditam que bater na esposa se justifica em determinadas<br />
circunstâncias, 2008<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
69%<br />
Niassa<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
48%<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
42%<br />
35%<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
26% 27%<br />
35%<br />
26%<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Probabilidade de a mulher aceitar que o<br />
Figura 5.3: Probabilidade de aceitação da violência doméstica pelas mulheres, 2008<br />
marido lhe bata 15-49<br />
probabilidade de a mulher aceitar<br />
que o marido lhe bata<br />
0 .1 .2 .3 .4<br />
Fonte: Cálculos do <strong>UNICEF</strong> baseados no MICS 2008<br />
da Acção Social de 2004 concluiu que essas<br />
diferenças estão fortemente relacionadas<br />
com as normas e práticas socioculturais,<br />
bem como com a falta de educação e<br />
conhecimento dos direitos das mulheres e<br />
crianças na sociedade. 13<br />
Foi realizada uma análise de regressão<br />
probabilística multivariada para examinar<br />
os factores correlacionados com a aceitação<br />
de violência doméstica pelas mulheres<br />
(ver Figura 5.3). A variável dependente<br />
é se uma mulher (15-49 anos) aceita ser<br />
51%<br />
Gaza<br />
20%<br />
Maputo<br />
Província<br />
10%<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
-1 0 1 2<br />
3<br />
Classificação da riqueza<br />
Primário Secundário Superior<br />
148<br />
149
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
espancada pelo marido. A análise revelou<br />
que as mulheres com ensino secundário<br />
ou superior são muito menos propensas<br />
a considerar aceitável bater na mulher do<br />
que mulheres sem qualquer instrução. Ter<br />
o ensino primário, no entanto, não parece<br />
influenciar as atitudes das mulheres. A<br />
riqueza é estatisticamente relacionada com<br />
a protecção das mulheres apenas em níveis<br />
muito elevados (ver Figura 5.3), que muito<br />
poucos agregados familiares alcançam.<br />
Dados os enormes desafios na promoção<br />
da riqueza da mulher a este nível, promover<br />
o acesso à educação pode ser a resposta<br />
política mais viável para corresponder à<br />
atitude das mulheres para com a violência<br />
doméstica.<br />
O modelo não apresenta diferenças<br />
estatisticamente fiáveis nas atitudes para<br />
com a violência doméstica de mulheres em<br />
relações poligâmicas versus monogâmicas.<br />
O mesmo acontece com a idade das<br />
mulheres, ou a diferença de idades entre<br />
marido e mulher. Em termos de geografia,<br />
todas as mulheres que vivem em províncias<br />
que não Maputo (especialmente no norte)<br />
têm uma maior probabilidade de aceitar a<br />
violência, não parecendo haver diferença de<br />
atitudes entre as mulheres rurais e urbanas.<br />
Quebrar a cultura do silêncio sobre o abuso<br />
de crianças e mulheres exige um diálogo<br />
aberto, uma maior sensibilização e sistemas<br />
externos de protecção para intervir quando<br />
se identificam casos de abuso. Não é fácil<br />
fazê-lo onde a violência baseada no género<br />
e o abuso sexual, especialmente de crianças,<br />
são admitidos por algumas comunidades<br />
e indivíduos. Apesar dos progressos<br />
realizados no reforço do Governo e no<br />
desenvolvimento de um quadro jurídico e<br />
político para proteger as crianças contra a<br />
violência, o abuso e exploração, a limitada<br />
capacidade do Governo para fazer cumprir<br />
essas leis e o pouco conhecimento dos<br />
membros da comunidade sobre as questões<br />
permite que essas práticas continuem<br />
inabaláveis. Além disso, é frequente<br />
prevalecer o direito consuetudinário em<br />
muitas áreas rurais do país, particularmente<br />
no que respeita a casamento e herança.<br />
Enfrentar as convenções e normas sociais<br />
que contribuem para a violência, a<br />
exploração e o abuso é o primeiro passo<br />
para travar tais práticas em Moçambique.<br />
3.3. Exploração e abuso sexual<br />
comercial<br />
Embora os dados sejam extremamente<br />
limitados, há evidências de que ocorre em<br />
Moçambique exploração e abuso sexual<br />
de crianças. As crianças são muitas vezes<br />
forçadas a participar em actos sexuais<br />
comerciais para obter ajuda de adultos<br />
para fazer face às suas despesas ou<br />
como estratégia para enfrentar pobreza<br />
extrema. As vítimas de exploração sexual<br />
comercial são geralmente pobres e<br />
sofreram anteriormente algum grau de<br />
violência ou abuso. Embora a exploração<br />
sexual comercial se verifique com rapazes<br />
e raparigas, estas são consideradas mais<br />
comummente vítimas. Um estudo também<br />
mostra que a pressão de pares é um factor<br />
importante na introdução de meninas na<br />
indústria de exploração sexual comercial<br />
infantil. 14 Esse mesmo estudo constatou que<br />
as meninas que são vítimas de exploração<br />
sexual correm um risco acrescido por<br />
praticarem sexo sem preservativo para<br />
maiores benefícios económicos. Muitas<br />
crianças que são exploradas em sexo<br />
comercial servem-se da droga para lidar<br />
com a situação, o que também afecta o<br />
uso do preservativo. 15 Os perpetradores de<br />
exploração comercial de crianças provêm<br />
de todas as esferas da vida: membros da<br />
comunidade local, turistas nacionais e<br />
estrangeiros em resorts de Moçambique<br />
e motoristas de transportes em centros<br />
populacionais por onde passam as principais<br />
estradas.<br />
3.4. Tráfico de crianças e<br />
migração<br />
Num relatório publicado em 2002/03<br />
pela Organização Internacional para<br />
as Migrações (OIM), foi estimado que<br />
aproximadamente mil crianças e mulheres<br />
são traficadas anualmente para a África<br />
do Sul para exploração da sua força de<br />
trabalho e exploração sexual comercial. 16<br />
O tráfico de crianças não só as retira do<br />
ambiente protector da família, como também<br />
aumenta a sua vulnerabilidade à violência,<br />
exploração e abuso. iv Indica o relatório que<br />
o tráfico de pessoas está ainda relacionado<br />
com a extracção de órgãos humanos<br />
para fins rituais, embora esta questão<br />
ainda seja contestada por organismos<br />
governamentais. 17<br />
Num estudo publicado pela Save the<br />
Children em 2009, as respostas das crianças<br />
parecem indicar que o tráfico e a exploração<br />
internos em Moçambique geralmente<br />
ocorrem por ‘trapaça’, fraude ou engano,<br />
em grande parte cometido por familiares<br />
das crianças e pares. 18 O tráfico de crianças<br />
ocorre geralmente num contexto regional<br />
mais amplo, só podendo ser combatido de<br />
forma eficaz fortalecendo-se os mecanismos<br />
regionais e transfronteiriços para uma<br />
resposta multifacetada e coordenada<br />
adaptada às diferenças regionais e<br />
nacionais. Por exemplo, a Cooperação<br />
Regional dos Chefes de Polícia da África<br />
Austral tem trabalhado com a Comunidade<br />
de Desenvolvimento da África Austral em<br />
medidas comunitárias de combate ao tráfico,<br />
entre as quais formação da polícia regional.<br />
A migração infantil voluntária é muitas<br />
vezes decorrente da pobreza ou do facto de<br />
a criança ser órfã ou ter sido abandonada.<br />
Em Moçambique as crianças deslocamse<br />
das aldeias para as cidades ou, por<br />
vezes, atravessam a fronteira ilegalmente<br />
e desacompanhadas para países vizinhos,<br />
principalmente para a África do Sul, numa<br />
tentativa de melhorar a sua vida ou a<br />
vida de suas famílias. Esses padrões de<br />
migração tornam os meninos e meninas<br />
vulneráveis ao abuso e à exploração tanto<br />
durante as viagens como no seu lugar de<br />
destino. Um relatório da Save the Children<br />
de 2008 19 compila as experiências das<br />
crianças migrantes na sub-região, e indica<br />
que as meninas, em particular, viajam<br />
de Moçambique para a África do Sul em<br />
busca de trabalho, mas acabam por ser<br />
vítimas de abuso sexual e exploradas. As<br />
que não conseguem arranjar emprego e<br />
não conseguem ou não querem regressar a<br />
Moçambique, recorrem, por vezes, à falta de<br />
alternativas, a trabalho sexual.<br />
3.5. Trabalho infantil<br />
O trabalho infantil é outra grave forma<br />
de abuso e exploração em Moçambique.<br />
Os dados revelam que 22 por cento das<br />
crianças de 5-14 anos estão envolvidas<br />
em trabalho infantil, registando-se uma<br />
grande disparidade entre as zonas urbanas<br />
e as rurais (15 por cento e 25 por cento,<br />
respectivamente). 20 v A proporção de crianças<br />
envolvidas em trabalho infantil também<br />
varia de acordo com a idade da criança: uma<br />
em cada cinco de 5 a 11 anos de idade está<br />
envolvida em trabalho infantil, chegando a<br />
uma em cada quatro as crianças com 12 a 14<br />
anos. São visíveis as disparidades entre as<br />
províncias; quase 40 por cento das crianças<br />
em Inhambane estão envolvidas em trabalho<br />
infantil, em comparação com menos de 10<br />
por cento das crianças em Niassa.<br />
A prevalência de trabalho infantil está<br />
relacionada com o nível de escolaridade<br />
da mãe. Vinte e quatro por cento das<br />
crianças cujas mães não têm nenhuma<br />
escolaridade estão envolvidas em trabalho<br />
infantil, em comparação com 10 por<br />
cento das crianças cujas mães têm, pelo<br />
menos, ensino secundário. A prevalência<br />
de trabalho infantil é ligeiramente maior<br />
nas meninas (24 por cento) que nos<br />
iv Tráfico designa o transporte ilegal de seres humanos, em particular mulheres e crianças, para os vender ou para explorar<br />
a sua força de trabalho.<br />
v Uma criança é considerada envolvida em trabalho infantil se durante a semana que antecedeu a pesquisa tiver estado<br />
envolvida em: (i) pelo menos uma hora de trabalho económico ou 28 horas de trabalho doméstico por semana, se a<br />
criança tiver 5 a 11 anos de idade, (ii) pelo menos 14 horas de trabalho económico ou 28 horas de trabalho doméstico<br />
por semana, se a criança tiver 12 a 14 anos de idade.<br />
150<br />
151
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
Figura 5.4: Percentagem de crianças de 5-14 anos que estão envolvidas em trabalho infantil, por província e<br />
sexo, 2008<br />
45%<br />
40%<br />
35%<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
9%<br />
Niassa<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
26%<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
16%<br />
25%<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
24%<br />
26%<br />
30%<br />
39%<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
27%<br />
Gaza<br />
10% 11%<br />
Maputo<br />
Província<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
22%<br />
Total<br />
Figura 5.6: Trabalho infantil e frequência escolar, por área geográfica, 2008<br />
100%<br />
90%<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
15%<br />
25%<br />
Percentagem de crianças em trabalho infantil<br />
Urbana<br />
Rural<br />
86%<br />
76%<br />
Percentagem de crianças trabalhadoras<br />
que estão a frequentar a escola<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
rapazes (21 por cento). Além disso, as<br />
meninas trabalham mais que os rapazes<br />
apoiando as tarefas domésticas (8 por cento<br />
contra 5 por cento, respectivamente). A<br />
percentagem de crianças que trabalham<br />
para apoiar negócios familiares é a mesma<br />
para ambos os sexos (16 por cento). Não<br />
há grande correlação entre riqueza e<br />
trabalho infantil. A prevalência de trabalho<br />
infantil é relativamente estável para os<br />
quatro quintis inferiores, só reduzindo nas<br />
famílias em melhor situação. Um estudo de<br />
2009 indica que as crianças trabalhadoras<br />
Figura 5.5: Prevalência de trabalho infantil por nível de escolaridade da mãe, 2008<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
24%<br />
são acrescidamente exploradas por más<br />
condições de trabalho, incluindo abuso<br />
verbal e sexual, e ainda salários pagos com<br />
atraso ou não pagos na totalidade. 21<br />
O MICS de 2008 revela que 86 por cento<br />
das crianças que trabalham em áreas<br />
urbanas também frequentam a escola, em<br />
comparação com 76 por cento nas zonas<br />
rurais. Quase 30 por cento dos estudantes<br />
das zonas rurais estão envolvidos em algum<br />
tipo de trabalho infantil, antes ou depois das<br />
aulas.<br />
Nunca frequentou a escola Primário Secundário+<br />
22%<br />
10%<br />
Em Moçambique, o Ministério do Trabalho<br />
é responsável por orientar e coordenar<br />
as acções relacionadas com o trabalho<br />
infantil. As respostas nacionais ao trabalho<br />
infantil incidem sobre quatro áreas:<br />
desenvolvimento de uma legislação nacional<br />
que reflicta os padrões internacionais que<br />
Moçambique ratificou; desenvolvimento<br />
de mecanismos eficazes para fazer cumprir<br />
a legislação existente e complementar,<br />
incluindo a legislação sobre o ensino<br />
obrigatório; melhoramento da capacidade<br />
das instituições governamentais e outros<br />
actores para identificar e agir sobre a<br />
questão do trabalho infantil; e, finalmente,<br />
sensibilização do público em geral para<br />
a questão. A eficácia das iniciativas será<br />
reforçada por um maior compromisso<br />
para com a recolha de dados sobre a<br />
natureza (incluindo a dimensão do género)<br />
e as dinâmicas do trabalho infantil em<br />
Moçambique.<br />
A Lei da Criança de 2008 proíbe o trabalho<br />
infantil e qualquer forma de trabalho a<br />
menores de 15 anos, prevendo medidas<br />
punitivas a serem tomadas contra o<br />
empregador. A Lei da Criança define<br />
também formas de trabalho proibidas,<br />
incluindo a exploração sexual comercial e<br />
trabalho que possa ser prejudicial à saúde<br />
e bem-estar da criança. Contudo, uma<br />
aplicação eficaz exige a divulgação da lei<br />
a todos os interessados, bem como um<br />
considerável reforço da capacidade de todas<br />
as autoridades encarregadas da aplicação<br />
das suas disposições. Finalmente, as<br />
pressões económicas e sociais que obrigam<br />
os pais a impelir os seus filhos para trabalho<br />
infantil exploratório devem ser tratadas por<br />
via de uma protecção social mais eficaz.<br />
Reduzir a carga de trabalho sobre as<br />
crianças depende da garantia de que as<br />
crianças e suas famílias, especialmente as<br />
mais pobres e mais vulneráveis, beneficiem<br />
de programas de redução da pobreza.<br />
Enquanto o trabalho infantil continuar<br />
a ser uma necessidade económica de<br />
determinadas famílias, o Governo deverá<br />
concentrar a sua acção no garantir que<br />
qualquer actividade económica empreendida<br />
seja adequada à idade e capacidade da<br />
criança e que em nada comprometa a<br />
sua sobrevivência, saúde, educação,<br />
desenvolvimento ou bem-estar geral.<br />
152<br />
153
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
3.6. Casamento infantil<br />
Em Moçambique, é ilegal o casamento<br />
antes dos 16 anos. Pela Lei de Família de<br />
2004, o Governo de Moçambique elevou a<br />
idade legal de casamento não carecendo de<br />
consentimento dos pais dos 16 para os 18<br />
anos. A idade mínima em que o casamento<br />
pode ocorrer com o consentimento dos<br />
pais foi elevada de 14 para 16. No entanto,<br />
é limitada a capacidade de aplicar a lei, e os<br />
casamentos tradicionais ao abrigo do direito<br />
consuetudinário continuam a constituir<br />
um desafio ao estabelecimento dos 18<br />
anos como idade mínima de casamento.<br />
Em muitas comunidades, as meninas são<br />
consideradas prontas para casar ao atingir a<br />
puberdade. 22<br />
Dados recentes revelam que 18 por cento<br />
das raparigas entre os 20 e os 24 anos se<br />
casaram antes de fazerem 15 anos, e 52<br />
antes dos 18 anos. 23 A percentagem de<br />
meninas que se envolve em casamento<br />
infantil decaiu ligeiramente desde 2003.<br />
Há diferenças significativas nas taxas de<br />
casamento infantil entre as regiões sul,<br />
centro e norte de Moçambique: as províncias<br />
do sul, designadamente Gaza, Inhambane,<br />
Maputo e Cidade de Maputo, têm uma taxa<br />
de casamento infantil inferior a 10 por cento;<br />
as províncias do centro têm uma taxa média<br />
de 20 por cento, enquanto Niassa e Cabo<br />
Delgado, no norte, têm índices de 24 e 30<br />
por cento, respectivamente.<br />
O casamento infantil não só é uma grave<br />
violação dos direitos da criança em si,<br />
mas também compromete seriamente<br />
a materialização de uma série de outros<br />
direitos. Por exemplo, o casamento na<br />
adolescência pode ter graves implicações<br />
para a saúde das meninas. A gravidez e o<br />
parto na adolescência estão associados a<br />
problemas de saúde e fracos resultados<br />
nutricionais para a mãe e seus filhos. Isto<br />
acontece particularmente com raparigas que<br />
são mães pela primeira vez muito jovens. 24<br />
Adolescentes casadas muitas vezes recebem<br />
menos informações sobre saúde reprodutiva<br />
que seus pares não casados. 25 As meninas<br />
casadas têm muito menor probabilidade que<br />
seus pares casados de frequentar a escola,<br />
e são muitas vezes retiradas da escola para<br />
se casarem ou por estarem grávidas, o que<br />
às vezes pode estar relacionado com abuso<br />
sexual. 26<br />
O casamento infantil é influenciado pelas<br />
relações de género tradicionais e pelos<br />
valores que a sociedade atribui às mulheres e<br />
meninas. O casamento pode reflectir o valor<br />
atribuído à virgindade de uma menina e ser<br />
visto pelos pais como um meio para evitar<br />
as relações sexuais antes do casamento e da<br />
gravidez. Nas comunidades, muitas meninas<br />
vítimas não denunciam às autoridades os<br />
casos de abuso sexual, em parte devido ao<br />
estigma e mitos em torno da questão do<br />
abuso sexual. Mesmo quando a polícia ou<br />
outras autoridades querem avançar com os<br />
casos de abuso sexual, é frequente os pais<br />
interromperem o processo por consideraremno<br />
um problema a ser resolvido no seio da<br />
família ou entre as famílias. A falta de um<br />
instrumento legal rígido para punir casos de<br />
abuso sexual agrava o problema.<br />
Em muitos casos, o casamento infantil,<br />
tanto de rapazes como de meninas, tem<br />
uma motivação económica. O casamento<br />
infantil é uma estratégia de sobrevivência<br />
para aliviar a família do que consideram<br />
ser, face à pobreza extrema, um encargo<br />
financeiro. Embora a situação económica<br />
seja uma causa do casamento infantil,<br />
não é a única motivação. A prevalência<br />
de casamento infantil está também ligada<br />
a práticas culturais de grupos étnicos<br />
específicos. 27 Apesar de serem realizadas<br />
nas escolas campanhas de sensibilização<br />
sobre saúde sexual e gravidez, o uso do<br />
preservativo ainda é baixo em crianças. O<br />
casamento é, por vezes, organizado numa<br />
idade precoce, com as meninas começando<br />
a viver com o marido na puberdade. Um<br />
mapeamento efectivo do casamento infantil<br />
em Moçambique por grupo étnico apoiaria<br />
os esforços do programa e aumentaria a<br />
eficácia das campanhas de prevenção.<br />
São também comuns em Moçambique<br />
relações poligâmicas, encontrando-se quase<br />
um quarto das mulheres de 15-49 anos num<br />
relacionamento poligâmico. 28 Embora a<br />
poligamia não seja legal em Moçambique,<br />
é muito frequente nas províncias do centro,<br />
em particular, encontrando-se um terço<br />
das mulheres de Manica, Tete e Sofala, em<br />
uniões desse tipo.<br />
Figura 5.7: Mulheres de 20-24 anos que se casaram antes dos 15 e dos 18 anos, 2003 e 2008<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
56%<br />
51%<br />
30%<br />
42%<br />
20%<br />
10%<br />
11%<br />
21%<br />
18%<br />
0%<br />
Urbana Rural Total<br />
Percentagem de casadas antes dos 15 anos<br />
Percentagem de casadas antes dos 18 anos<br />
Fonte: IDS 2003 e MICS 2008.<br />
154<br />
155
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
4. As crianças e o sector da justiça<br />
Foi reconhecida, tanto pelo Governo como<br />
pela sociedade civil em Moçambique, a<br />
necessidade de se melhorar o sector da<br />
justiça como uma prioridade fundamental<br />
para melhorar os sistemas de protecção<br />
infantil. Isto inclui a protecção de crianças<br />
que entram em contacto com o sistema<br />
de justiça como vítimas, testemunhas ou<br />
infractoras visando pôr fim à impunidade<br />
de crimes contra as crianças. Importantes<br />
progressos foram feitos, incluindo a criação<br />
de uma secção para menores no tribunal<br />
em três províncias e a criação de mais de<br />
200 centros policiais de apoio à vítima<br />
(Gabinetes de Atendimento da Mulher<br />
e da Criança) em todas as províncias. A<br />
criação destas novas estruturas de apoio<br />
tem ajudado a garantir que os direitos da<br />
criança sejam protegidos e que esta receba<br />
um tratamento amigo da criança e sensível,<br />
em conformidade com normas e padrões<br />
internacionais, quando entra em contacto<br />
com o sistema de justiça.<br />
Os sistemas de justiça ainda não são eficazes<br />
para a maioria das crianças. Observações<br />
finais do Comité dos Direitos da Criança<br />
referiram, no segundo relatório periódico<br />
de Moçambique, por exemplo, que os<br />
perpetradores de violência e abuso raramente<br />
são levados à justiça, que o encarceramento<br />
de crianças em conflito com a lei não é usado<br />
como medida de último recurso, e que é<br />
frequente a prisão preventiva. 29<br />
O Ministério da Justiça e o Ministério do<br />
Interior carecem de recursos financeiros<br />
e humanos para melhorar a eficácia do<br />
sistema para as crianças. As dotações<br />
orçamentais do estado em 2008 destinadas<br />
ao Ministério da Justiça e ao Ministério do<br />
Interior, que inclui a polícia, foram de dois<br />
e três por cento, respectivamente, com<br />
limitados recursos destinados a crianças e<br />
programas de justiça juvenil.<br />
Grandes têm sido os progressos de<br />
Moçambique na área da reforma legislativa<br />
para fazer com que a legislação nacional<br />
fique em consonância com a Convenção<br />
sobre os Direitos da Criança. Continuam<br />
a ser tratadas algumas inconsistências<br />
internas, devendo reforçar-se iniciativas e<br />
medidas preventivas, especialmente em<br />
relação às crianças em conflito com a lei,<br />
incluindo a aplicação de medidas correctivas<br />
alternativas que estejam em conformidade<br />
com as normas internacionais. As crianças<br />
em conflito com a lei em Moçambique<br />
muitas vezes não beneficiam da protecção<br />
estipulada nos instrumentos internacionais,<br />
incluindo os Artigos 37 e 40 da Convenção<br />
sobre os Direitos da Criança, as Regras de<br />
Beijing para a Administração da Justiça<br />
Juvenil (1985), e as Directrizes de Riade para<br />
a Prevenção da Delinquência Juvenil (1998).<br />
As crianças em conflito com a lei são<br />
frequentemente colocadas em prisões<br />
para adultos, embora a lei estabeleça que<br />
devem ser mantidas em celas separadas. A<br />
polícia tem autoridade para deter menores<br />
que supostamente tenham cometido<br />
uma infracção por um período máximo<br />
de 30 dias, após o que a criança deve ser<br />
apresentada em Tribunal de Menores ou<br />
Secções Civis. O ideal seria um centro de<br />
transição ou instalação intermédia e que se<br />
tivessem atenções particulares para garantir<br />
que esses casos fossem levados a tribunal<br />
de forma expedita. Essa não é, no entanto, a<br />
prática comum em Moçambique.<br />
É frequente não se cumprirem políticas<br />
prisionais que exigem que os presos sejam<br />
separados por sexo e idade, e fiquem, de<br />
preferência, em instalações separadas, e<br />
as condições de segurança e sanitárias<br />
nas prisões são um problema. 30 O Serviço<br />
Nacional de Prisões reporta que nenhum<br />
centro para crianças em conflito com a<br />
lei está operacional neste momento; foi<br />
reabilitado um (Centro de Reabilitação de<br />
Chiango), mas não está a funcionar por falta<br />
de recursos. Estão previstos ou operacionais<br />
três centros de detenção juvenil para menores<br />
com 16 a 18 anos (assim como jovens até<br />
aos 21 anos, e excepcionalmente até aos 25).<br />
Estas instalações estão situadas em Nampula,<br />
em Matutuíne, na província de Maputo (ainda<br />
em construção), e na Beira (prevista).<br />
Trinta e cinco por cento do total da<br />
população prisional em Moçambique tem<br />
16-21 anos de idade. Dados divulgados pelo<br />
Serviço Nacional de Prisões de menores<br />
com 16 a 18 anos de idade em conflito com<br />
a lei revelam que 898 do sexo masculino<br />
e 8 do sexo feminino estão actualmente<br />
em prisões em todo o país. Existe apenas<br />
uma prisão para mulheres, localizada em<br />
Ndlavela, em Maputo, com capacidade<br />
para albergar cerca de 300 presidiárias,<br />
mas existem secções femininas em todas<br />
as prisões provinciais. Em 2008, havia 297<br />
presos do sexo feminino numa população<br />
prisional total de 14.309 pessoas. O Estudo<br />
sobre o Acesso à Justiça realizado no âmbito<br />
da avaliação do PARPA II (2009) relata que<br />
o governo está a empreender esforços para<br />
conferir tratamento especial a mulheres e<br />
menores; esses esforços, no entanto, ainda<br />
não se traduzem em prática correspondente<br />
aos objectivos da política prisional e às<br />
regras e padrões mínimos dos instrumentos<br />
internacionais. 31<br />
4.1.<br />
Para proteger as mulheres e crianças<br />
vulneráveis e promover o acesso à justiça, o<br />
Governo decidiu aumentar a capacidade do<br />
sector da justiça, definindo como prioridade<br />
o direito constitucional a representação.<br />
Para isso, aumentaram os fundos atribuídos<br />
ao Instituto de Patrocínio e Assistência<br />
Jurídica [IPAJ], que foi incluído em 2008,<br />
pela primeira vez, no orçamento do Estado.<br />
O recrutamento de profissionais em 2007 e<br />
2008 elevou o número de funcionários que<br />
recebem um salário do Estado de 10 em<br />
2002 32 para 138 no primeiro semestre de<br />
2008. 33 No mesmo período, o número total<br />
de funcionários do IPAJ subiu de 360 para<br />
700. A cobertura dos serviços prestados pelo<br />
IPAJ aumentou de 41 filiais em 2005 para<br />
57 no primeiro semestre de 2008. O número<br />
de pessoas que beneficiam destes serviços<br />
aumentou de 7.327 em 2007 para 9.615 na<br />
primeira metade de 2008. 34, 35<br />
Acesso das crianças a<br />
propriedade e herança<br />
Os direitos das mulheres e crianças à<br />
propriedade e herança estão ameaçados<br />
pela pandemia da SIDA, pois são cada<br />
vez mais as viúvas e os órfãos que se<br />
confrontam com apropriação cobiçosa<br />
de propriedade. Em Moçambique,<br />
as leis de sucessão estabelecidas no<br />
Livro de Sucessão do Código Civil<br />
de 1966 conferem iguais direitos a<br />
herdeiros do sexo feminino e do sexo<br />
masculino. Todavia, nos termos do direito<br />
consuetudinário, os homens estão mais<br />
protegidos, encontrando-se as viúvas<br />
vulneráveis a apropriação cobiçosa de<br />
propriedade.<br />
Um estudo realizado em quatro províncias<br />
de Moçambique revelou que as viúvas e<br />
os órfãos tendem a sofrer, após a morte<br />
de seu marido ou pai, algum tipo de perda<br />
de material. 36 Como a herança é encarada<br />
como assunto privado da família, os<br />
outros membros da comunidade em geral<br />
optam por não interferir nesses casos.<br />
Um estudo de seguimento realizado em<br />
2009 observa que a maioria das pesquisas<br />
abordando a questão da apropriação<br />
cobiçosa de propriedade incide sobre os<br />
aspectos legais da sucessão, e observa<br />
haver falta de dados quantitativos sobre a<br />
situação dos direitos de propriedade das<br />
crianças e mulheres. 37 O estudo destaca a<br />
necessidade de: (i) uma avaliação do grau<br />
de apropriação cobiçosa de propriedade<br />
de crianças e viúvas em Moçambique,<br />
(ii) prevenção de apropriação cobiçosa<br />
de propriedade, (iii) garantia de que as<br />
viúvas e seus filhos beneficiam de justiça,<br />
seja através de mecanismos locais de<br />
resolução de conflitos seja no quadro do<br />
sistema jurídico formal. Para atender a<br />
essas necessidades, é necessário fazeremse<br />
acções para defesa e promoção de<br />
mudanças na legislação e nas políticas<br />
do governo, bem como para melhorar<br />
a monitoria e o apoio e promover<br />
mudança comportamental ao nível das<br />
comunidades.<br />
156<br />
157
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
4.2. Registo de nascimento<br />
O registo de nascimento dá à criança<br />
existência legal e autoridade para<br />
reivindicar cidadania, bem como os direitos,<br />
benefícios e obrigações resultantes dessa<br />
cidadania. Assim, o registo de nascimento<br />
é reconhecido como um direito tanto pela<br />
Convenção sobre os Direitos da Criança<br />
(Artigo 7) como pela Carta Africana sobre<br />
os Direitos e Bem-estar da Criança (Artigo<br />
6). A obrigação de Moçambique de se<br />
registarem as crianças imediatamente após<br />
o nascimento está legalmente reconhecida<br />
no Código do Registo Civil. A falta de registo<br />
de nascimento viola o direito humano<br />
inalienável da criança a uma identidade<br />
e coloca em situação de risco o seu<br />
desenvolvimento e protecção.<br />
O registo de nascimento é especialmente<br />
importante numa altura em que a pandemia<br />
da SIDA está a privar cada vez mais crianças<br />
de cuidados parentais. A falta de uma certidão<br />
de nascimento pode resultar em problemas<br />
na determinação de relações familiares,<br />
relações legais e direitos de herança, bem<br />
como trazer dificuldades no acesso a serviços<br />
sociais básicos, como a matrícula escolar<br />
e a assistência social. Embora o uso de um<br />
registo de nascimento para crianças esteja<br />
ainda numa fase rudimentar em Moçambique,<br />
o processo de modernização e a instauração<br />
do distrito como pólo de desenvolvimento<br />
está a tornar um documento de identificação<br />
legal cada vez mais importante para<br />
protecção jurídica e prevenção de exclusão<br />
socioeconómica, especialmente dos mais<br />
vulneráveis na sociedade.<br />
Moçambique tem aumentado<br />
significativamente o acesso a serviços de<br />
registo de nascimento em todo o país. Foi<br />
desenvolvido em 2004 um plano nacional<br />
de acção para o registo de nascimento, e o<br />
registo de nascimento é parte integrante do<br />
plano nacional de acção para a criança 2006-<br />
2010. Foi lançada em 2006, pela Direcção<br />
Nacional dos Registos e Notariado, do<br />
Ministério da Justiça, uma campanha de<br />
registo de nascimento de longa duração. Os<br />
objectivos da campanha são dar resposta ao<br />
grande acumular de crianças por registar,<br />
sensibilizar para a importância do registo<br />
(precoce) e melhorar o acesso do público aos<br />
serviços de registo de nascimento levandoos<br />
para mais perto das populações.<br />
Desde a adopção do plano nacional de<br />
acção para o registo de nascimento e o<br />
lançamento da campanha, cerca de 4,2<br />
milhões de crianças menores de 18 anos<br />
foram registadas, o que representa 40 por<br />
cento de todas as crianças em Moçambique.<br />
A percentagem de crianças menores de<br />
cinco anos que tiveram o seu registo de<br />
nascimento [aumentou] de 8 por cento<br />
em 2003 38 para 31 por cento em 2008.<br />
vi Há grandes disparidades geográficas<br />
no registo: 39 por cento das crianças com<br />
menos de cinco anos tiveram os seus<br />
nascimentos registados em áreas urbanas,<br />
em comparação com 28 por cento nas<br />
zonas rurais, e enquanto 47 por cento<br />
das crianças menores de cinco anos são<br />
registadas na Cidade de Maputo, apenas<br />
11 por cento são registadas na província de<br />
Tete. A pesquisa também constatou que os<br />
entrevistados citaram as principais barreiras<br />
ao registo como sendo a complexidade dos<br />
procedimentos envolvidos (25 por cento),<br />
a distância para os serviços de registo (22<br />
por cento) e os custos (20 por cento), com<br />
apenas uma parte relativamente pequena<br />
citando a falta de conhecimento do serviço<br />
(9 por cento) ou não reconhecendo a<br />
importância do registo de nascimento (6 por<br />
cento). (Ver Figura 5.8).<br />
Num país com baixos índices de<br />
alfabetização (com índices de analfabetismo<br />
mais elevados e mais baixas taxas<br />
de registo nas áreas rurais), as rádios<br />
comunitárias desempenharam um papelchave<br />
na mobilização das famílias para<br />
matricularem as suas crianças. Spots<br />
vi Nem todos os distritos da pesquisa tinham realizado actividades de registo de nascimento na altura da pesquisa, pelo<br />
que os dados podem estar a subestimar a média nacional.<br />
Figura 5.8: Razões para não registar os nascimentos, 2008<br />
Não é<br />
importante<br />
6%<br />
Figura 5.9: Percentagem de crianças com menos de cinco anos com registo de nascimento, por província, 2008<br />
50%<br />
45%<br />
40%<br />
35%<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
15%<br />
Niassa<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
É complicado<br />
25%<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
28%<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Outras<br />
17%<br />
34%<br />
Custo<br />
20%<br />
24%<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
Distância<br />
23%<br />
produzidos e difundidos em línguas locais<br />
proporcionam fortes canais de comunicação<br />
aos activistas locais, os quais não só<br />
divulgam informações básicas sobre o<br />
registo de nascimento, como também<br />
ajudam as famílias a superar algumas das<br />
barreiras socioculturais para registarem<br />
os recém-nascidos em tempo oportuno.<br />
Em algumas comunidades, por exemplo,<br />
práticas tradicionais na escolha do nome<br />
podem estender-se para além do prazo de<br />
120 dias durante o qual os nascimentos<br />
11%<br />
podem ser registados gratuitamente. O<br />
impedimento cultural de as mães registarem<br />
uma criança sem a presença do pai é outro<br />
desafio, especialmente nos casos em que o<br />
pai fica ausente de casa por longos períodos,<br />
devido, por exemplo, a trabalho migratório.<br />
As actividades da campanha de registo<br />
de nascimento vêm dar um impulso<br />
fundamental à introdução de serviços<br />
de registo de nascimento de rotina que<br />
aproximam o registo das comunidades e<br />
evitam um futuro acumular de registos,<br />
criando uma cultura de registo (precoce)<br />
das crianças. Soluções de longo prazo,<br />
sustentáveis e de rotina, estão a ser<br />
desenvolvidas com a participação dos<br />
Ministérios da Saúde, da Educação, da<br />
Administração Estatal e da Mulher e da<br />
Acção Social. Será importante uma estreita<br />
cooperação com estes organismos do Estado<br />
para estabelecer um sistema eficaz, eficiente<br />
e sustentável, centrado especificamente<br />
no registo de nascimento. Para curto<br />
a médio prazo, até que os ministérios<br />
acima mencionados tenham capacidade<br />
institucional para conduzir o processo de<br />
registo, estão a ser oferecidos por agentes<br />
de serviços de registo alternativos que ligam<br />
as comunidades e o Governo e facilitam o<br />
estabelecimento de uma cultura de registo<br />
precoce da criança.<br />
34%<br />
36%<br />
40%<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
45% 46% 47%<br />
Gaza<br />
Maputo<br />
Província<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
158<br />
159
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
4.3. Crianças portadoras de<br />
deficiência<br />
Moçambique não é signatário da Convenção<br />
das Nações Unidas sobre os Direitos das<br />
Pessoas Portadoras de Deficiência e seu<br />
Protocolo Facultativo. A política nacional<br />
para pessoas com deficiência responsabiliza<br />
o Ministério da Mulher e da Acção Social<br />
pela promoção da integração efectiva das<br />
crianças portadoras de deficiência em<br />
actividades pré-escolares e por garantir a<br />
protecção social das pessoas com deficiência<br />
e suas famílias por meio de medidas<br />
destinadas a promover a sua autonomia e<br />
integração na comunidade.<br />
O programa estatal Subsídio de Alimentos<br />
(um pequeno valor mensal em dinheiro<br />
para pessoas especialmente vulneráveis)<br />
está disponível unicamente para cidadãos<br />
maiores de 18 anos e, portanto, exclui<br />
crianças portadoras de deficiência. 39 A<br />
política nacional de educação prevê a<br />
possibilidade de as crianças com deficiências<br />
moderadas frequentarem escolas regulares<br />
e as crianças com deficiências mais graves<br />
frequentarem escolas especiais. Conforme<br />
descrito no Capítulo 4, “Educação e<br />
desenvolvimento da criança”, as crianças<br />
portadoras de deficiência têm menos 40<br />
por cento de probabilidade de frequentar<br />
a escola primária do que as crianças sem<br />
deficiência. Dados indicam que 13 por cento<br />
das crianças com idades compreendidas<br />
entre os 2 e os 9 anos vivem com pelo<br />
menos uma deficiência (ver Figura 5.10). 40<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
9%<br />
Niassa<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
17%<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
14%<br />
15%<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
12%<br />
8%<br />
A deficiência mais comum foi a demora<br />
em sentar-se, pôr-se em pé ou andar (6 por<br />
cento das crianças).<br />
4.4. Mecanismos de cuidados<br />
alternativos<br />
Na prática, Moçambique tem dois tipos de<br />
sistemas alternativos de cuidados: formal<br />
e informal. O Governo de Moçambique<br />
incentiva o fortalecimento do papel protector<br />
das famílias como primeiro passo para a<br />
realização dos direitos das crianças. No<br />
entanto, são necessárias acções específicas<br />
para lidar com mecanismos alternativos de<br />
cuidados a crianças que não se encontrem<br />
sob cuidados parentais ou familiares.<br />
Os sistemas tradicionais de cuidados<br />
alternativos têm vindo a sofrer uma pressão<br />
cada vez maior devido às mudanças<br />
sociais decorrentes de desenvolvimento<br />
económico, migração e urbanização, e à<br />
pandemia da SIDA. As famílias alargadas e<br />
as comunidades têm sido a primeira linha<br />
de resposta à situação das crianças órfãs e<br />
vulneráveis em Moçambique.<br />
Os cuidados formais inscrevem-se no<br />
âmbito da jurisdição civil, sob a forma<br />
de guarda (tutor), acolhimento (família<br />
de acolhimento) e adopção. Nos termos<br />
da legislação moçambicana, as decisões<br />
concernentes a cuidados formais são<br />
tomadas através de uma autoridade judicial<br />
e em conformidade com o princípio do<br />
melhor interesse da criança, e a colocação<br />
Figura 5.10: Percentagem de crianças (2-9 anos) com pelo menos uma deficiência relatada, 2008<br />
5%<br />
21%<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
19%<br />
Gaza<br />
15%<br />
Maputo<br />
Província<br />
12%<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
14%<br />
Total<br />
em famílias de acolhimento ou instituições<br />
é usada apenas como último recurso.<br />
Os cuidados residenciais também são<br />
considerados um meio de cuidados formais,<br />
mas a decisão de colocar uma criança<br />
numa instituição é tomada principalmente<br />
por via de procedimentos administrativos,<br />
sob a responsabilidade do Ministério da<br />
Mulher e da Acção Social. Foi recentemente<br />
desenvolvido o Regulamento dos Centros<br />
de Acolhimento da Criança para garantir<br />
a qualidade dos serviços de assistência à<br />
infância e a aplicação de padrões mínimos,<br />
regulamento esse que aguarda a aprovação<br />
final do Ministério da Mulher e da Acção<br />
Social. Este quadro regulamentar também<br />
especifica como se devem realizar as<br />
inspecções e como deve ser monitorado o<br />
bem-estar das crianças nessas instituições.<br />
O conceito de família de acolhimento para<br />
crianças que carecem de cuidados parentais<br />
foi introduzido pela Lei da Família. Precisam,<br />
no entanto, de ser desenvolvidos os<br />
processos de execução e o regulamento, a<br />
fim de se levar avante a iniciativa. É também<br />
necessário (i) melhorar a rede de instituições<br />
para crianças e instituições infantis do tipo<br />
internato, transferindo instituições estatais<br />
infantis para centros de apoio familiar, (ii)<br />
criar um sistema alternativo de serviços<br />
de cuidados (baseados na comunidade e<br />
na família, guarda, tutoria, acolhimento,<br />
adopção), e (iii) implementar mecanismos<br />
para ampliar e estimular a integração das<br />
crianças em assistência familiar (família<br />
biológica ou alternativa).<br />
A legislação actual não faz distinção entre<br />
a adopção internacional e a adopção<br />
doméstica. Os processos de adopção devem<br />
ser harmonizados nas várias instituições e<br />
ministérios para garantir procedimentos de<br />
colocação e supervisão adequados durante<br />
o período de integração. Quanto à adopção<br />
internacional, Moçambique não assinou<br />
a Convenção de Haia n º 33, relativa à<br />
Protecção das Crianças e à Cooperação em<br />
Matéria de Adopção Internacional de 1993,<br />
ou quaisquer outros acordos bilaterais sobre<br />
a adopção, o que representa uma lacuna no<br />
quadro legal. A Ratificação da Convenção<br />
de Haia sobre a Adopção criará o quadro<br />
jurídico necessário para assegurar o devido<br />
processo para casos de adopção e também<br />
que o melhor interesse da criança seja o<br />
principal aspecto a considerar. A assinatura<br />
da Convenção de Haia foi recomendada pelo<br />
Comité dos Direitos da Criança em 2009. 41<br />
É necessário que se forneçam ao público<br />
em geral informações completas sobre<br />
a adopção, para desenvolver uma<br />
regulamentação específica para as adopções<br />
nacionais e internacionais, bem como para<br />
harmonizar os procedimentos de adopção<br />
com a Convenção sobre os Direitos da<br />
Criança e outros acordos globais de modo<br />
a assegurar supervisão do processo de<br />
adopção pelos Serviços de Acção Social e<br />
órgãos judiciais apropriados. Por exemplo,<br />
embora a Lei da Criança adopte a definição<br />
de criança da Convenção sobre os Direitos<br />
da Criança como qualquer pessoa até aos<br />
18 anos de idade, o Código Civil define a<br />
maioridade como sendo os 21. Decorrem<br />
tentativas para compatibilizar outros<br />
aspectos da legislação nacional com os<br />
padrões dos direitos humanos.<br />
Embora sejam limitados os dados<br />
quantitativos de Moçambique sobre a<br />
colocação de crianças vulneráveis em<br />
diferentes tipos de assistência, há evidências<br />
de estarem a proliferar os centros de<br />
cuidados residenciais. A partir de 2010, os<br />
dados registados pela Direcção Provincial<br />
da Mulher e Acção Social indicaram um<br />
total de 12.767 crianças a serem atendidas<br />
em 143 instituições de acolhimento em<br />
todo o país. Em 2009 e 2010, o Ministério da<br />
Mulher e da Acção Social avaliou 113 dessas<br />
instituições para determinar a qualidade<br />
dos cuidados e dos serviços prestados às<br />
crianças. Verificou-se que a maioria dos<br />
centros não estavam legalmente registados,<br />
não tinham sustentabilidade e dependiam<br />
da ajuda externa ou de doações. Além<br />
disso, a maioria dos centros não oferece<br />
actividades ocupacionais e não tem um<br />
programa de saída para crianças por volta<br />
dos 18 anos de idade. Os empregados<br />
carecem de suficientes conhecimentos e<br />
habilidades em matéria de cuidados infantis<br />
160<br />
161
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
e desenvolvimento da criança. Estão a<br />
decorrer acções em todas as províncias para<br />
a resolução de problemas encontrados nas<br />
visitas de monitoria. Embora ainda esteja<br />
muito por fazer, têm-se registado alguns<br />
progressos: foi desenvolvida uma base de<br />
dados nacional para se seguir a situação de<br />
cada centro, e tem-se realizado uma série de<br />
workshops de formação com o pessoal dos<br />
centros para resolver as carências em termos<br />
de recursos humanos.<br />
4.5. Crianças órfãs e vulneráveis<br />
e outras crianças<br />
marginalizadas<br />
A vulnerabilidade das crianças não se limita à<br />
sua condição de órfãs ou não órfãs, nem está<br />
exclusivamente ligada a ser afectada pelo<br />
HIV e pela SIDA. As crianças que perderam<br />
os seus pais devido à SIDA são parte de um<br />
grupo muito maior de crianças com sérias<br />
e urgentes necessidades. É a tripla ameaça<br />
de SIDA, pobreza e insegurança alimentar<br />
interligadas que torna vulnerável uma ampla<br />
gama de crianças. Com efeito, a análise<br />
mostra que em contextos de pobreza extrema<br />
generalizada as diferenças entre órfãos e<br />
não órfãos ou não se manifestam ou são<br />
muito pequenas quando comparadas com a<br />
privação e o sofrimento que todas as crianças<br />
vulneráveis enfrentam 42 .<br />
Consequentemente, alguns especialistas<br />
recomendam que se redefina o grupo-alvo<br />
para uma intervenção de protecção social<br />
de ‘órfãos’ considerando um mais amplo<br />
grupo de crianças vulneráveis, embora essa<br />
medida venha a apresentar as suas próprias<br />
dificuldades, como, por exemplo, chegar<br />
a consenso sobre onde estabelecer limites<br />
ou poder vir a aumentar significativamente<br />
o número de beneficiários dos programas<br />
existentes.<br />
Actualmente, o número de crianças órfãs<br />
devido à SIDA tem sido adoptado como<br />
medida para avaliar a gravidade do<br />
impacto da epidemia nas crianças, famílias,<br />
comunidades e país em geral. Apoiar as<br />
crianças que perderam os pais continua a<br />
ser visto como imperativo. No quadro do<br />
HIV e da SIDA, as crianças são consideradas<br />
Crianças Órfãs ou Vulneráveis (COV) se<br />
um ou ambos os seus progenitores tiver<br />
morrido, se no seu agregado familiar tiver<br />
morrido algum adulto nos últimos 12<br />
meses após doença prolongada, se vivem<br />
em famílias chefiadas por adultos com<br />
doença crónica, ou se vivem em domicílios<br />
chefiados por outras crianças ou por jovens,<br />
mulheres ou idosos.<br />
Estima-se que existam 1,8 milhões de<br />
órfãos em Moçambique, dos quais 510 mil<br />
devido à SIDA. 43 Prevê-se que o número de<br />
órfãos aumente, tornando-se as doenças<br />
relacionadas com a SIDA, cada vez mais, a<br />
principal causa de orfandade. O número de<br />
órfãos não toma em conta as outras crianças<br />
eventualmente vulneráveis devido ao HIV<br />
ou a viver em agregados familiares com<br />
pessoas a viver com HIV. Há 100.000 crianças<br />
de 0-14 anos vivendo com HIV. 44 O MICS<br />
refere ainda que 17,2 por cento das crianças<br />
moçambicanas são órfãs ou vulneráveis<br />
(COV) devido à SIDA.<br />
O quadro legislativo pelo qual se orienta<br />
a resposta nacional a COVs compreende<br />
dois principais planos de acção: o Plano<br />
Nacional de Acção para a Criança 2006-<br />
2010 e o Plano de Acção para Crianças<br />
Órfãs e Vulneráveis (PACOV). O PACOV<br />
também se aplica a crianças que ficaram<br />
vulneráveis devido a outros factores que<br />
não o HIV e a SIDA. Engloba as crianças que<br />
vivem na rua, as que vivem em instituições<br />
(orfanatos, prisões, instituições de saúde<br />
mental), as que entram em conflito com a<br />
lei, as portadoras de deficiência, as vítimas<br />
de violência, de abuso e exploração sexual,<br />
de tráfico e das piores forma de trabalho<br />
infantil, as que se casam antes da idade<br />
legal, e as refugiadas ou deslocadas.<br />
O PACOV identificou seis serviços básicos<br />
para atender às principais necessidades<br />
das crianças: cuidados de saúde,<br />
educação, apoio nutricional e alimentar,<br />
apoio financeiro, apoio jurídico e apoio<br />
psicossocial. O Governo de Moçambique<br />
comprometeu-se a garantir que as crianças<br />
tenham acesso a pelo menos três desses<br />
seis serviços, com particular incidência sobre<br />
as crianças que vivem abaixo da linha de<br />
pobreza absoluta, incluindo crianças órfãs e<br />
crianças vivendo com ou afectadas pelo HIV<br />
e pela SIDA. Além do PACOV, a estratégia<br />
de redução da pobreza 2005-2009 (PARPA<br />
II) incluiu também metas específicas para<br />
COV, incluindo a necessidade de desenvolver<br />
e consolidar as redes de segurança social<br />
para crianças órfãs e garantir que os rácios<br />
de frequência escolar e de desnutrição entre<br />
as crianças órfãs sejam idênticos aos das<br />
crianças não órfãs.<br />
Algumas das ameaças à protecção que as<br />
crianças órfãs enfrentam são um aumento<br />
de agregados familiares chefiados por<br />
irmãos ou crianças, menores índices de<br />
matrículas e mais fraco desempenho<br />
escolar, e maior risco de abuso sexual e<br />
infecção por HIV, trabalho infantil perigoso,<br />
actividade sexual precoce e casamento<br />
prematuro, graves problemas psicossociais<br />
e problemas de saúde e nutrição. 45 Além<br />
disso, o estigma e discriminação contra as<br />
pessoas afectadas pela SIDA continua a ser<br />
uma questão desafiadora. Crianças e jovens<br />
com familiares doentes ou moribundos<br />
estão particularmente expostas ao estigma.<br />
Podem ser condenadas ao ostracismo pelas<br />
suas comunidades e receber um apoio<br />
mínimo das suas famílias devido à vergonha<br />
e ao estigma frequentemente associados<br />
às mortes relacionadas com a SIDA. Nas<br />
escolas, a discriminação da criança traduzse<br />
em provocação e bullying [intimidação].<br />
Em alguns casos, as crianças evitam os seus<br />
pares seropositivos por terem medo de ficar<br />
infectadas.<br />
O MICS constatou que doze por cento<br />
das crianças moçambicanas eram órfãs<br />
(das quais 11 por cento órfãs de um dos<br />
seus progenitores e 1 por cento órfãs de<br />
pai e mãe), enquanto outros 6 por cento<br />
eram crianças consideradas ‘vulneráveis’. 46<br />
Também foram observadas diferenças<br />
geográficas, havendo mais COV em áreas<br />
urbanas do que em áreas rurais (20 e 16 por<br />
cento, respectivamente), e nas províncias do<br />
sul do que nas regiões centro e norte do país<br />
(ver Figura 5.11). Apenas 68 por cento das<br />
crianças moravam com ambos os pais em<br />
2008.<br />
Não há nenhuma evidência de uma maior<br />
taxa de privação severa de educação em<br />
COV do que em não órfãos. Há, no entanto,<br />
diferença nas taxas de frequência escolar<br />
entre órfãos de pai e mãe e não órfãos,<br />
sendo 0,90 o rácio de rapazes órfãos de pai e<br />
mãe e 0,92 o de meninas órfãs de pai e mãe,<br />
com relação aos seus pares não órfãos.<br />
O MICS mostra ainda que apenas 22 por<br />
cento das famílias com COV recebem algum<br />
apoio externo; a maior parte desse apoio<br />
vai para a educação, com dois por cento<br />
dos agregados familiares recebendo apoio<br />
material ou financeiro, e menos de um por<br />
cento recebendo apoio médico. Apenas<br />
20 por cento das crianças do quintil mais<br />
pobre recebem apoio externo grátis, em<br />
comparação com 27 por cento no segundo<br />
quintil mais pobre.<br />
As crianças órfãs e vulneráveis tendem<br />
a viver em famílias pobres chefiadas por<br />
idosos. O MICS constatou que 10 por cento<br />
dos agregados familiares são chefiados<br />
por uma pessoa idosa, mais de metade<br />
dos quais tem pelo menos um dependente<br />
menor. Um estudo realizado em 2006<br />
revelou que fazer face a custos associados a<br />
cuidar de crianças era um fardo impossível<br />
para os idosos: cuidar de uma criança órfã<br />
ou vulnerável custa, em média, 21 dólares<br />
americanos por mês e cuidar de uma<br />
pessoa vivendo com HIV custa 30 dólares<br />
americanos, enquanto os idosos tinham um<br />
rendimento médio mensal de 12,5 dólares<br />
americanos. 47<br />
Algumas famílias também são chefiadas<br />
por uma criança, ou têm uma criança que<br />
se vê forçada a funcionar como principal<br />
provedor devido a doença ou deficiência dos<br />
membros da família adultos (cerca de um<br />
e dois por cento, respectivamente, de<br />
acordo com o MICS). Em tais situações,<br />
as crianças têm normalmente meios de<br />
geração de rendimento muito limitados,<br />
sendo obrigadas a recorrer a estratégias<br />
de risco, como o casamento precoce,<br />
sexo transaccional e trabalho infantil<br />
162<br />
163
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
prejudicial. É também limitado o acesso<br />
dessas crianças a serviços básicos como<br />
os de saúde, educação e alimentação,<br />
jurídicos, financeiros e psicossociais. Além<br />
desses desafios, as crianças órfãs em<br />
consequência da SIDA muitas vezes são<br />
estigmatizadas e socialmente discriminadas,<br />
sendo susceptíveis a exclusão das suas<br />
comunidades. Por exemplo, um estudo<br />
realizado pelo Ministério de Planificação<br />
e Desenvolvimento realizado em 2005<br />
constatou que nas famílias pobres existe<br />
discriminação na alocação de recursos<br />
a crianças que não são descendentes<br />
biológicas do chefe de família. O estudo<br />
verificou que as crianças sem relação<br />
Figura 5.11: Percentagem de crianças órfãs e<br />
vulneráveis devido à SIDA, 2008<br />
Tete<br />
12%<br />
Gaza<br />
31%<br />
Maputo<br />
19%<br />
Manica<br />
19%<br />
Fonte: MICS, 2008.<br />
Sofala<br />
20%<br />
Inhambane<br />
15%<br />
Maputo City<br />
20%<br />
Niassa<br />
9%<br />
Zambezia<br />
19%<br />
Cabo Delgado<br />
17%<br />
Nampula<br />
13%<br />
biológica directa com o chefe da família<br />
eram vítimas de discriminação em termos<br />
de acesso à educação, tanto nas áreas rurais<br />
como nas áreas urbanas. 48<br />
O Inquérito Demográfico e de Saúde de<br />
2003 constatou que as órfãs com 15-17 anos<br />
de idade têm maior probabilidade que as<br />
não órfãs de se ter iniciado sexualmente e<br />
as órfãs de mãe têm maior probabilidade<br />
que as não órfãs de estar casadas, 49 o que<br />
significa que os adolescentes, especialmente<br />
as meninas, são particularmente vulneráveis.<br />
Um estudo constatou que os órfãos<br />
eram mais propensos a intimidações e<br />
depressões, e menos propensos a ter um<br />
adulto ou amigos de confiança. Pessoas<br />
com órfãos a seu cargo também reportaram<br />
depressão e isolamento similares. 50<br />
4.6. Protecção Social Básica<br />
Presentemente, o Instituto Nacional<br />
de Acção Social supervisiona cinco<br />
programas de protecção social: dois<br />
programas de assistência (um programa de<br />
transferências de dinheiro e um programa<br />
de transferências sociais em espécie) e três<br />
programas de promoção e desenvolvimento<br />
(Benefício Social pelo Trabalho, Geração<br />
de Rendimentos e Desenvolvimento<br />
Comunitário).<br />
Destes, o Programa Subsídio de Alimentos<br />
(PSA) é, de longe, o de maior alcance. Este<br />
programa de transferências incondicionais<br />
de dinheiro foi introduzido em 1990,<br />
destinando-se a idosos, deficientes e doentes<br />
crónicos e seus dependentes no estrato<br />
mais pobre da sociedade. Actualmente, os<br />
seus principais beneficiários directos são<br />
idosos (93 por cento), pessoas portadoras<br />
de deficiência (6 por cento) e doentes<br />
crónicos (1 por cento). Tem, portanto, as<br />
características de pensão (de velhice) não<br />
contributiva. Moçambique é um dos poucos<br />
países de baixo rendimento africanos com<br />
tal programa de transferências de dinheiro<br />
de longa duração suportado por fundos do<br />
estado e legislação nacional. Em 2007, o PSA<br />
atingiu 128 mil famílias com transferências<br />
mensais de dinheiro, aumentando para<br />
143.455 agregados familiares em 2008 e<br />
166.824 em 2009. No total, o programa<br />
alcançou 166.824 beneficiários directos<br />
e 140.643 beneficiários indirectos<br />
(dependentes) em 2009. Uma significativa<br />
percentagem de beneficiários indirectos<br />
são crianças, incluindo filhos biológicos<br />
do beneficiário directo, órfãos e crianças<br />
vulneráveis que vivem no agregado.<br />
Em 2008, o PSA passou por duas<br />
importantes reformas: o aumento gradual<br />
da escala do subsídio, e um maior enfoque<br />
na inclusão de dependentes elegíveis<br />
como beneficiários indirectos no regime<br />
de pagamento. Parte significativa desses<br />
beneficiários indirectos são crianças, o<br />
que até agora tem sido problemático em<br />
virtude de muitas vezes não cumprirem<br />
os critérios de elegibilidade. No caso das<br />
crianças, isso deve-se frequentemente<br />
à falta de um documento de registo de<br />
nascimento ou de orfandade. De acordo<br />
com os procedimentos do programa, não<br />
órfãos que vivem com os idosos, mesmo<br />
não recebendo nenhum apoio financeiro<br />
de seus pais, não são beneficiários<br />
elegíveis do PSA. Consequentemente,<br />
fica excluído do programa um número<br />
significativo de crianças extremamente<br />
vulneráveis. Um inventário e actualização<br />
das fichas de registo dos beneficiários<br />
directos e indirectos planeado para 2010<br />
irá trazer mais luz sobre o número de<br />
crianças potencialmente elegíveis nas<br />
famílias beneficiárias a que não está a ser<br />
presentemente conferido um direito. Essas<br />
informações irão alimentar o novo sistema<br />
de gestão do programa que entrará em<br />
funcionamento em 2011 e garantirão uma<br />
melhor cobertura dos dependentes elegíveis.<br />
Está prevista uma revisão do manual do<br />
programa integrada no plano operacional<br />
da Estratégia de Segurança Social Básica,<br />
que incluirá discussões sobre os critérios<br />
que determinam a inclusão de dependentes<br />
menores. A presente campanha de registo<br />
de nascimento deverá abordar o problema<br />
de não se ter um documento de registo de<br />
nascimento, facilitando assim a inclusão de<br />
crianças vulneráveis como portadoras de<br />
direitos.<br />
Está em curso uma avaliação do impacto<br />
do PSA, na qual um grupo de tratamento<br />
(1.016 famílias) e controlo (1.650 famílias)<br />
participa numa pesquisa para determinar<br />
o impacto das transferências mensais<br />
de dinheiro no consumo, na saúde e na<br />
educação (incluindo acesso a serviços), no<br />
emprego, na habitação e nas alterações<br />
demográficas intra-agregados familiares. O<br />
levantamento inicial foi realizado em 2008,<br />
estando previstas pesquisas de seguimento<br />
para 2009 (já realizada), 2011 e 2013. É seu<br />
objectivo analisar o impacto do PSA nos<br />
beneficiários e famílias visando informar o<br />
diálogo técnico e político com o Governo<br />
e os parceiros sobre o rumo do programa.<br />
Prevê-se que evidências empíricas geradas<br />
por essa avaliação venham a influenciar<br />
as principais decisões programáticas, tais<br />
como montantes e a gama da escala de<br />
benefícios, o número de beneficiários,<br />
a constituição do grupo-alvo, etc. Os<br />
resultados da avaliação deverão também<br />
informar o diálogo técnico e político sobre<br />
a introdução de um subsídio para crianças<br />
como proposto na Estratégia de Segurança<br />
Social Básica.<br />
A Estratégia prevê ampliar o programa PSA<br />
para 452.000 agregados familiares até 2014.<br />
Espera-se que estes agregados representem<br />
1.356.000 beneficiários directos e indirectos,<br />
dos quais 795.520 beneficiários indirectos<br />
serão provavelmente crianças.<br />
Além do PSA, o programa de transferências<br />
em espécie identifica crianças órfãs e<br />
vulneráveis como beneficiários directos. É<br />
fornecido material de apoio a indivíduos<br />
e famílias que necessitam de assistência<br />
imediata sob a forma de produtos<br />
alimentares, material escolar, utensílios<br />
domésticos e material de construção. Em<br />
2008, este apoio chegou a 24 por cento<br />
dos agregados familiares. O maior grupo<br />
de beneficiários são as crianças, incluindo<br />
26 por cento de crianças órfãs, 23 por<br />
cento de crianças desnutridas; 12 por<br />
cento de gémeos; 10 por cento de crianças<br />
abandonadas; 6 por cento de bebés que não<br />
podem ser amamentados; 6 por cento de<br />
crianças chefes de agregados familiares; 2<br />
164<br />
165
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
por cento de adolescentes e 0,24 por cento<br />
de trigémeos. Embora esse apoio seja um<br />
valioso contributo para aliviar a privação<br />
das famílias em extrema necessidade, é<br />
dado como fornecimento, sendo a cobertura<br />
limitada e insuficiente para atender à<br />
presente demanda.<br />
O programa de subsídio para as crianças<br />
proposto terá como alvo famílias que<br />
cuidam de órfãos e crianças vulneráveis.<br />
Está previsto introduzir-se o subsídio numa<br />
abordagem faseada (ver Tabela 5.2), mas os<br />
fundos estatais para a sua introdução não<br />
foram ainda assegurados, pelo que não foi<br />
viável o lançamento do programa em 2010.<br />
4.7. Atestados de Pobreza<br />
O Governo criou um sistema em que<br />
são emitidos atestados de pobreza para<br />
os agregados mais vulneráveis visando<br />
garantir o livre acesso das crianças a<br />
serviços de educação, saúde e registo<br />
civil. Os agregados familiares beneficiários<br />
são definidos como sendo os que não<br />
têm recursos para sobreviver sem ajuda<br />
do Estado. O processo de obtenção de<br />
atestados de pobreza requer interacção<br />
com o registo local (para confirmar o local<br />
de residência), depois com os serviços<br />
de acção social a nível distrital (para<br />
verificar as informações sobre a condição<br />
social do requerente) e, finalmente, com a<br />
administração do distrito (para emissão do<br />
atestado). Relatórios de organizações não<br />
governamentais que apoiam o acesso das<br />
famílias a este programa têm revelado que<br />
morosos procedimentos e falta de clareza<br />
sobre a que serviços se aplicam os atestados<br />
(mesmo entre os prestadores de serviços<br />
e agentes da administração), bem como a<br />
falta de meios dos prestadores de serviço<br />
para aceitar gratuitamente os beneficiários<br />
representam grandes constrangimentos.<br />
4.8. Análise de capacidade<br />
O estudo Acesso à Justiça 2009, realizado<br />
por incumbência do Ministério da<br />
Planificação e Desenvolvimento no âmbito<br />
do processo de avaliação do PARPA II<br />
concluiu que durante o período 2005-2009<br />
o acesso à justiça em Moçambique não<br />
Tabela 5.1: Transferências de dinheiro projectadas para agregados familiares chefiados por idosos,<br />
portadores de deficiência e doentes crónicos, 2010-2014<br />
2010 2011 2012 2013 2014<br />
Número de famílias alargadas 242.296 312.592 382.888 453.183 523.479<br />
Montante atribuído (Milhões de Mts) 668,74 862,75 1,056,77 1,250,79 1,444,80<br />
Percentagem de fundos do estado 0,24% 0,29% 0,34% 0,38% 0,42%<br />
Número de idosos beneficiários<br />
directos e indirectos 300.447 387.614 474.781 561.947 649.114<br />
Fonte: Governo de Moçambique, “Estratégia Nacional de Segurança Social Básica,” Maputo, Março 2010.<br />
Tabela 5.2: Transferências de dinheiro para famílias com crianças órfãs e vulneráveis, 2010-2014<br />
2010 2011 2012 2013 2014<br />
Número de famílias alargadas 66.780 133.559 200.339 267.119 333.899<br />
Montante atribuído (milhões de Mts) 186,51 373,03 559,54 746,06 932,57<br />
Percentagem de fundos do estado 0,20% 0,39% 0,55% 0,71% 0,85%<br />
Número de crianças beneficiárias 203.531 407.062 610.594 814.125 1.017,656<br />
Fonte: Governo de Moçambique, “Estratégia Nacional de Segurança Social Básica,” Maputo, Março 2010.<br />
melhorou (embora também não se tenha<br />
reduzido). 51 Persistem falhas no assegurar<br />
que os benefícios dos serviços públicos<br />
oferecidos pelo sector da justiça (ou seja, os<br />
Tribunais, a Procuradoria Geral da República,<br />
o Ministério da Justiça e o Instituto de<br />
Assistência Jurídica alcancem de facto a<br />
maioria dos cidadãos, especialmente os mais<br />
vulneráveis.<br />
A avaliação de impacto do PARPA II revelou<br />
que, das 36 acções previstas nas áreas<br />
de reforma da justiça, legalidade, ordem<br />
e segurança pública, apenas seis foram<br />
totalmente concluídas, e que em dez<br />
acções não registou qualquer progresso.<br />
Entre as importantes acções que não<br />
foram concluídas constam a nova lei<br />
sobre o Instituto de Assistência Jurídica, a<br />
digitalização dos dados do tribunal judicial,<br />
a aprovação da Política Nacional de Direitos<br />
Humanos, e a reforma da Unidade de<br />
Investigação Criminal da Polícia.<br />
Todo o sector de justiça, e particularmente<br />
as forças policiais, deve desempenhar um<br />
papel mais activo no sentido de garantir<br />
que as famílias, comunidades e escolas<br />
proporcionem ambientes seguros e de<br />
protecção para as crianças, aplicando as<br />
leis penais e ampliando iniciativas como os<br />
Gabinetes de Atendimento. Foram criados<br />
mais de 200 centros em todo o país desde<br />
o primeiro Gabinete de Atendimento na<br />
Beira, em 2002. 52 Estes gabinetes foram<br />
criados com vista a proporcionar às vítimas<br />
um espaço seguro para denunciarem à<br />
polícia casos de violência e para serem<br />
encaminhadas, pelo Ministério da Mulher<br />
e Acção Social, o Ministério da Saúde e<br />
ministérios afins, incluindo trabalhadores de<br />
saúde e assistentes sociais, para os serviços<br />
necessários. Entre Janeiro e Setembro de<br />
2009, mais de 14.000 vítimas de violência,<br />
abuso e exploração, das quais 2.721<br />
crianças (1.219 rapazes e 1.502 raparigas),<br />
foram apoiadas através desses gabinetes<br />
por todo o país. No entanto, continuam a<br />
verificar-se carências significativas até que<br />
esses gabinetes possam ser considerados<br />
plenamente operacionais. Os recursos<br />
humanos e logísticos disponíveis são<br />
insuficientes para permitir que a maioria dos<br />
gabinetes funcione 24 horas por dia. Apenas<br />
sete dos 200 Gabinetes de Atendimento têm<br />
os seus próprios veículos, o que representa<br />
uma séria limitação na mobilidade para<br />
investigar casos de violência contra crianças<br />
e mulheres, para prestar cuidados e apoiar<br />
as vítimas. Deve ser mobilizado mais apoio<br />
para reforçar a capacidade dos centros<br />
visando facilitar um rápido encaminhamento<br />
dos casos para prestadores de serviços<br />
básicos e assegurar às crianças e mulheres<br />
vítimas de violência serviços de qualidade.<br />
A recolha de dados fiáveis sobre as<br />
questões relacionadas com a protecção da<br />
criança no sector da justiça é fundamental<br />
para melhorar essa protecção, mas<br />
extremamente difícil em Moçambique,<br />
nomeadamente a nível provincial e distrital.<br />
Tal situação é devida, por um lado à<br />
tradição de se lidar com os casos no seio<br />
das famílias e dos agregados, ao invés dos<br />
canais formais legais, e, por outro, à falta<br />
de capacidade técnica e material a nível do<br />
Governo e do sistema de justiça. A violência,<br />
a exploração e o abuso desenvolvem-se<br />
em condições de ilegalidade e falta de<br />
transparência, tornando difícil as estatísticas<br />
dos Ministérios da Justiça e do Interior<br />
reflectirem a verdadeira dimensão e<br />
extensão dos problemas. 53<br />
A realidade para a maioria dos<br />
moçambicanos é que os tribunais judiciais<br />
são inacessíveis, bloqueados por uma série<br />
de obstáculos, incluindo custos elevados<br />
em relação ao rendimento, distância e<br />
fracas redes de transporte. Moçambique<br />
enfrenta desafios significativos na oferta<br />
de acesso à justiça à maioria dos seus<br />
cidadãos, bem como no cumprimento dos<br />
padrões constitucionais e internacionais de<br />
justiça. 54 Os principais centros do sistema<br />
de justiça encontram-se em áreas urbanas,<br />
principalmente em Maputo, ficando as áreas<br />
rurais por servir. O relatório sobre o Sector<br />
da Justiça e o Estado de Direito publicado<br />
pela Open Society Foundation (Sociedade<br />
Aberta) citou constrangimentos no acesso<br />
à justiça, incluindo um insuficiente número<br />
de funcionários nos tribunais e a falta de<br />
166<br />
167
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
pessoal qualificado, tais como magistrados,<br />
procuradores gerais e escrivães. Mais<br />
obstáculos verificados foram a acumulação<br />
de processos nas várias secções, a falta<br />
de equipamentos e infra-estrutura (apenas<br />
estão cobertas neste momento capitais<br />
provinciais e pouco mais de metade das<br />
capitais de distrito) e a falta de advogados<br />
disponíveis para representar as crianças<br />
acusadas de crime, especialmente fora<br />
da Cidade de Maputo. Esses importantes<br />
obstáculos no sistema de justiça impedem<br />
os tribunais de satisfazer os crescentes<br />
pedidos de guarda, bem como outras<br />
questões de justiça juvenil e contribuem<br />
para um atraso cada vez maior de casos<br />
pendentes.<br />
Embora a capacidade dos sistemas<br />
de justiça para prevenir e responder a<br />
diferentes formas de violência, abuso e<br />
exploração tenha sido reforçada, a resposta<br />
global continua a ser fragmentada, reactiva,<br />
fraca e insuficiente. É urgentemente<br />
necessária uma melhoria da capacidade<br />
dos Ministérios da Justiça e do Interior para<br />
proporcionar a devida atenção e protecção<br />
às vítimas de violência, abuso e exploração.<br />
A capacidade dos sectores de acção social,<br />
do interior e de justiça para prevenir e<br />
responder a casos de violência contra<br />
as crianças, tanto a nível nacional como<br />
provincial também tem de ser reforçada<br />
através de recolha de dados, monitoria e<br />
mecanismos de apresentação de relatórios a<br />
todos os níveis.<br />
Em termos de capacidade neste domínio<br />
falta também um banco de dados<br />
nacional sobre violência e abuso sexual. O<br />
desenvolvimento de um sistema nacional<br />
eficaz aumentaria consideravelmente a<br />
capacidade do Governo para registar,<br />
acompanhar, avaliar e responder a padrões<br />
de abuso e violência. Esse desenvolvimento<br />
seria especialmente útil para ministérioschave<br />
como o Ministério do Interior<br />
(para notificação de casos criminais),<br />
o Ministério da Mulher e Acção Social<br />
(para aos assistentes sociais fornecerem<br />
informações sobre casos de género), e o<br />
Ministério da Educação (para notificação<br />
de incidentes em escolas), bem como para<br />
reforçar a capacidade das comunidades para<br />
prevenirem e responderem à violência nas<br />
famílias ou na rua. As observações finais do<br />
Comité dos Direitos da Criança ao relatório<br />
periódico de Moçambique reconhecem que<br />
o reforço da base de evidências sobre a<br />
protecção das crianças no sector da justiça<br />
é fundamental, sobretudo para se garantir<br />
que se usem os dados para melhorar as leis,<br />
políticas e práticas. 55<br />
Outro grande desafio para o sector da justiça<br />
é a necessidade de se coordenar, dinamizar<br />
e maximizar o impacto do desenvolvimento<br />
de capacidades e esforços de sensibilização<br />
por uma grande variedade de partes<br />
interessadas. Doadores, organizações nãogovernamentais<br />
e agências das NU estão<br />
a definir como alvo juízes, funcionários<br />
judiciais, agentes prisionais e policiais,<br />
tanto a nível nacional como comunitário. No<br />
entanto, o Governo não estabeleceu padrões<br />
para materiais de formação e mensagens<br />
de sensibilização, e não existe uma<br />
abordagem sistemática e coordenada para<br />
a formação e sensibilização. Para melhor<br />
institucionalizar os esforços de capacitação,<br />
tanto o Ministério da Justiça como o<br />
Ministério do Interior têm vindo a integrar<br />
módulos de formação que descrevem<br />
pormenorizadamente como proteger os<br />
direitos das crianças na qualidade de<br />
vítimas, testemunhas e infractoras no<br />
sistema de justiça criminal nos manuais<br />
de formação utilizados pelo Instituto de<br />
Formação Jurídica e Judiciária nacional e<br />
pela academia nacional da polícia, dando por<br />
esse meio uma atenção sistémica a questões<br />
de protecção infantil.<br />
Apesar das limitações acima mencionadas,<br />
registaram-se melhorias, nomeadamente<br />
no âmbito dos tribunais e do Ministério<br />
Público. De acordo com o segundo Plano<br />
Estratégico Integrado do Sector da Justiça<br />
(Plano Estratégico Integrado II) um total de<br />
1.173 pessoas formaram-se nas diferentes<br />
faculdades de direito no país desde 2000.<br />
Desde que o Centro de Formação Jurídica<br />
e Judiciária iniciou suas actividades em<br />
2001, cerca de 136 juízes e procuradores,<br />
343 funcionários de tribunal, 51 assistentes<br />
jurídicos e 45 notários públicos se formaram<br />
a partir do Centro, estimando-se que 90<br />
por cento dos licenciados entraram depois<br />
numa das instituições do sector. Desde 2004,<br />
a Academia da Polícia concedeu os graus<br />
equivalentes a Licenciado e Mestrado em<br />
ciências policiais a cerca de 85 candidatos<br />
por ano, e 1.200 agentes policiais se<br />
graduam anualmente a partir da escola<br />
básica da polícia.<br />
O Ministério da Mulher e da Acção Social<br />
tem recebido apoio técnico e financeiro de<br />
uma série de parceiros para implementar<br />
o PACOV. No entanto, uma avaliação<br />
constatou que o Ministério opera com<br />
limitados recursos e competências a nível<br />
distrital, o que enfraquece a sua capacidade<br />
de responder de forma abrangente às<br />
necessidades das crianças existentes. 56<br />
Assim, está a ser encomendado um estudo<br />
para gerar mais evidências relativas a onde<br />
residem as lacunas de capacidade ou pontos<br />
fracos a nível distrital e, consequentemente,<br />
como podem essas carências ser<br />
transformadas em pontos fortes.<br />
Para avaliar o impacto da implementação do<br />
PACOV, o Ministério da Mulher e da Acção<br />
Social encomendou uma avaliação. Os<br />
resultados dirão da relevância e eficiência do<br />
PACOV na prestação de assistência e apoio<br />
às crianças, em especial às que vivem em<br />
situação de vulnerabilidade. A elaboração<br />
dos Padrões Mínimos de Assistência a<br />
Crianças Órfãs e Vulneráveis centrando-se<br />
especificamente nos seis serviços básicos<br />
definidos pelo PACOV, agora em curso, será<br />
um importante guia para a implementação<br />
no país de actividades respeitantes a<br />
crianças<br />
Conforme estabelecido na Lei da Criança, o<br />
Conselho de Ministros aprovou o Conselho<br />
Nacional dos Direitos da Criança em<br />
2009. Este será um importante fórum para<br />
diferentes instituições governamentais e<br />
organizações da sociedade civil definirem<br />
as principais estratégias para os direitos<br />
das crianças e coordenarem futuramente as<br />
acções de uma forma eficaz.<br />
4.9. Parcerias da sociedade civil<br />
Também a sociedade civil participa<br />
activamente em acções de advocacia,<br />
no diálogo político, na capacitação e<br />
sensibilização da comunidade sobre<br />
questões de protecção da criança no sistema<br />
de justiça. Os parceiros da sociedade civil<br />
têm assumido um papel activo na divulgação<br />
de diversas leis, entre as quais da Lei da<br />
Criança, na sua versão ‘amiga da criança’.<br />
Organizações da sociedade civil em<br />
Moçambique também desempenham um<br />
papel vital na provisão de serviços básicos,<br />
especialmente no apoio a famílias e crianças<br />
vulneráveis que fazem face ao HIV e à SIDA.<br />
Embora não estejam disponíveis dados<br />
específicos sobre o apoio a crianças órfãs e<br />
vulneráveis prestado por organizações da<br />
sociedade civil, note-se que só o Plano de<br />
Emergência do Presidente dos EUA para o<br />
Alívio da SIDA ajudou 16 organizações nãogovernamentais<br />
a alcançarem 242.800 COV<br />
em 2008. 57 As organizações da sociedade<br />
civil despenderam cerca de 38 por cento do<br />
total de fundos gastos no domínio do HIV de<br />
2004 a 2006. 58<br />
É necessário que se melhore a coordenação<br />
das actividades das organizações da<br />
sociedade civil para evitar duplicação,<br />
expandir o que, muitas vezes, é apoio<br />
localizado e garantir sustentabilidade, uma<br />
vez que chega a 70 por cento o apoio de<br />
organizações da sociedade civil que provém<br />
de fontes externas. 59 Uma meta-análise 60 de<br />
grupos comunitários a trabalhar no domínio<br />
da protecção e bem-estar da criança ressaltou<br />
a necessidade de financiamento de longo<br />
prazo para permitir o desenvolvimento de<br />
grupos de protecção da criança pertencentes<br />
a e assumidos pelas próprias comunidades.<br />
4.10. Financiamento do sector<br />
e dotações orçamentais<br />
O Ministério da Mulher e da Acção Social<br />
recebe baixos níveis de apoio financeiro do<br />
Governo de Moçambique: em 2010, foi-lhe<br />
atribuído apenas 1,1 por cento do PIB, uma<br />
redução de 0,3 por cento da verba de 2009. 61<br />
168<br />
169
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
Além disso, a capacidade das Direcções<br />
Provinciais da Mulher e Acção Social para<br />
desempenhar efectivamente as suas funções<br />
e responsabilidades tem sido limitada pela<br />
falta de recursos humanos e formação<br />
adequada (em termos seja de trabalho social<br />
seja de gestão do programa).<br />
Desde 2003, as dotações orçamentais<br />
para o sector da justiça têm-se mantido<br />
relativamente estáveis, representando<br />
entre seis e sete por cento do orçamento<br />
do Estado. 62 O Ministério do Interior<br />
absorve cerca de 70 por cento dos recursos<br />
alocados. vii Em termos nominais, as verbas<br />
aumentaram de 22 por cento para 25 por<br />
cento cada ano, com excepção de 2006<br />
(um aumento de 5 por cento). As dotações<br />
orçamentais por instituição para as despesas<br />
de investimento foram irregulares, não se<br />
podendo observar nenhuma clara tendência.<br />
As dotações orçamentais para o nível<br />
provincial estão a aumentar, mas apenas<br />
proporcionalmente ao aumento do<br />
orçamento total. As dotações para o nível<br />
provincial representam aproximadamente<br />
cerca de 25 por cento do total das<br />
dotações para o sector da justiça em 2008.<br />
Poucas evidências há de uma efectiva<br />
descentralização de recursos ou sua<br />
administração a nível provincial.<br />
vii O orçamento do Ministério do Interior não está desagregado, não permitindo, portanto, que se identifique a parcela<br />
atribuída às forças policiais.<br />
5. Conclusões<br />
São muito diversos os problemas de<br />
protecção que se colocam às crianças em<br />
Moçambique. A violência física e sexual,<br />
o casamento precoce, o trabalho infantil<br />
e o tráfico de crianças continuam a ser<br />
comuns; embora os dados nessas áreas<br />
sejam escassos, a informação disponível<br />
indica que as tendências não melhoraram<br />
significativamente nos últimos anos. O<br />
número de crianças órfãs e vulneráveis<br />
tem-se mantido, principalmente como<br />
resultado do HIV e da SIDA. Embora as<br />
famílias alargadas e as comunidades em<br />
Moçambique tenham sempre constituído a<br />
primeira linha de resposta, este sistema de<br />
apoio tradicional está sujeito a uma pressão<br />
cada vez maior, uma vez que tem vindo a<br />
subir o número de crianças a necessitar<br />
de assistência. Além disso, registou-se<br />
um progresso significativo na área dos<br />
serviços de registo de nascimento por todo<br />
o país, com cerca de 7 milhões de crianças<br />
registadas desde 2005; o desafio nesta área<br />
consistirá em assegurar que se mantenham<br />
as iniciativas em curso para se alcançar uma<br />
cobertura universal.<br />
Nos últimos anos foi alcançado um<br />
significativo progresso no quadro legal e<br />
de políticas respeitantes à protecção da<br />
criança, nomeadamente a aprovação da<br />
Lei sobre a Violência Doméstica, da Lei da<br />
Criança e da Lei da Justiça Juvenil, entre<br />
outros. Apesar dessas melhorias, a resposta<br />
global continua a ser fragmentada, reactiva,<br />
fraca e insuficientemente provida de fundos,<br />
e é necessário que esta nova legislação<br />
se traduza em regulamentos e programas<br />
eficazes. A Estratégia de Segurança Social<br />
Básica, recentemente aprovada pelo<br />
Conselho de Ministros e actualmente em<br />
vias de operacionalização apresenta um<br />
cenário promissor no que respeita a lidar<br />
com crianças e vulnerabilidade familiar,<br />
especialmente porque incorpora uma<br />
componente de subsídio para crianças. Os<br />
progressos alcançados no programa de<br />
transferência social do PSA, onde o número<br />
de agregados familiares passou de 90.000<br />
em 2005 para cerca de 170.000 em 2009,<br />
são um exemplo encorajador de como as<br />
crianças poderiam beneficiar das iniciativas<br />
de protecção social.<br />
As políticas e os programas de protecção<br />
social são meios eficazes de responder<br />
às necessidades das famílias e crianças<br />
vulneráveis, dado o fundamental papel da<br />
protecção social na redução da pobreza, na<br />
superação da exclusão social e na formação<br />
de capital humano para se reduzirem os<br />
riscos e a vulnerabilidade enfrentados por<br />
grupos vulneráveis, particularmente crianças<br />
e pessoas que delas cuidam. De forma mais<br />
específica, é necessário que se enfrentem<br />
três importantes desafios para ir ao encontro<br />
das necessidades e proporcionar resultados<br />
efectivos e benéficos às crianças vulneráveis<br />
e suas famílias:<br />
• l O apoio e os serviços liderados pelo<br />
governo devem chegar a todas as crianças<br />
que deles precisam em comunidades<br />
pobres afectadas pelo HIV e pela SIDA.<br />
Isto inclui crianças que perderam os pais,<br />
mas também muitas outras, incluindo as<br />
vítimas de violência, abuso e exploração;<br />
• l As políticas e os programas para<br />
crianças vulneráveis devem fortalecer<br />
a capacidade das famílias alargadas e<br />
comunidades para cuidar das crianças a<br />
nível da base;<br />
• l É necessário que se abordem os<br />
problemas de pobreza familiar e<br />
desigualdade de género com vista a<br />
obterem-se melhores resultados para as<br />
crianças.<br />
Apesar dos importantes avanços na área<br />
da defesa dos direitos das crianças em<br />
Moçambique, muito mais há a fazer para<br />
desenvolver um sistema holístico de<br />
protecção da criança, que procure sinergias<br />
170<br />
171
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
entre os sectores de acção social e justiça<br />
para aumentar o acesso das crianças a<br />
serviços de protecção e outros importantes<br />
serviços sociais. Isso envolve principalmente<br />
o melhoramento dos dados e mecanismos<br />
de monitoria; o desenvolvimento de uma<br />
abordagem mais sistémica e coordenada<br />
dentro de e entre os ministérios-chave;<br />
e o fortalecimento de capacidades dos<br />
ministérios relevantes para desenvolver<br />
uma abordagem robusta e sistémica à<br />
protecção da criança. Além disso, como as<br />
normas culturais e sociais desempenham tão<br />
importante papel no contexto da protecção<br />
das crianças, é contínua a necessidade de<br />
se proceder a uma divulgação efectiva de<br />
informação sobre questões-chave e de se<br />
sensibilizar a sociedade em geral para os<br />
direitos da criança e a obrigação que todos<br />
têm de as proteger. No entanto, sem que<br />
haja mais recursos, continuará limitada<br />
a capacidade do Ministério da Mulher<br />
e da Acção Social aos níveis nacional e<br />
subnacional para levar a cabo as tarefas<br />
que lhe competem. É fundamental que as<br />
respostas das políticas governamentais<br />
às ameaças que se colocam às crianças<br />
vulneráveis tenham o devido financiamento<br />
e uma implementação adequada para que se<br />
possam proteger os direitos dessas crianças.<br />
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9 Ministério da Educação e Cultura, Relatório<br />
da Auscultação Através das Unidades de<br />
Género, dos Conselhos Escolas, e Jovens<br />
Raparigas sobre Que Mecanismo a Adoptar<br />
para Prevenção, Combate, Denúncia e<br />
Encaminhamento de Casos de Assédio e Todo<br />
o Tipo de Abuso, Incluindo o Abuso Sexual<br />
na Escola, Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2008.<br />
10 Ministério da Mulher e da Acção Social, Plano<br />
Nacional de Acção para a Criança, Governo<br />
de Moçambique, Maputo, 2005.<br />
11 Ministério da Mulher e da Acção Social,<br />
Inquérito sobre Violência Contra a Mulher,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2004.<br />
12 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
de Indicadores Múltiplos 2008, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2010.<br />
13 Ministério da Mulher e da Acção Social,<br />
Inquérito sobre Violência Contra a Mulher,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2004.<br />
14 Ibid.<br />
15 Ibid.<br />
16 International Organization for Migration,<br />
Regional Office for Southern Africa,<br />
Seduction, Sale and Slavery:Trafficking in<br />
Women and Children for Sexual Exploitation<br />
in Southern Africa, 3rd ed., Pretoria, 2003.<br />
17 <strong>Mozambique</strong> Human Rights League,<br />
Trafficking Body Parts in <strong>Mozambique</strong> and<br />
South Africa, Moçambique Liga dos Direitos<br />
Humanos, Maputo, 2008.<br />
18 deSasKropiwinicki, Zosa,The Internal<br />
Trafficking and Exploitation of Women and<br />
Children in <strong>Mozambique</strong>, Save the Children,<br />
Noruega, 2009.<br />
19 Save the Children, Our Broken Dreams:<br />
Child migration in southern Africa, Save the<br />
Children UK e Save the Children Norway em<br />
<strong>Mozambique</strong>, Maputo, 2008.<br />
20 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
de Indicadores Múltiplos 2008, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2010.<br />
21 deSasKropiwinicki, Zosa, The Internal<br />
Trafficking and Exploitation of Women and<br />
Children in <strong>Mozambique</strong>, Save the Children,<br />
Noruega,2009.<br />
22 Population Council, ‘Child Marriage Briefing:<br />
<strong>Mozambique</strong>’, 2004, descarregado de: http://<br />
www.popcouncil.org/pdfs/briefingsheets/<br />
MOZAMBIQUE_2005.pdf, acedido a 8 de<br />
Novembro de 2010.<br />
23 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
de Indicadores Múltiplos, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2010.<br />
24 Population Council, ‘Child Marriage Briefing:<br />
<strong>Mozambique</strong>’, 2004, descarregado de: http://<br />
172 173
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />
www.popcouncil.org/pdfs/briefingsheets/<br />
MOZAMBIQUE_2005.pdf, acedido a 8 de<br />
Novembro de 2010.<br />
25 Haberland, Nicole, Erica Chong and Hillary<br />
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document preparado para o WHO/UNFPA/<br />
Population Council Technical Consultation on<br />
Married Adolescents, Organização Mundial de<br />
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26 Ministério da Educação e Cultura, Direcção<br />
de Programas Especiais, Relatório da<br />
Auscultação Através das Unidades de<br />
Género, dos Conselhos das Escolas e Jovens<br />
Raparigas sobre Que Mecanismo Adoptar<br />
para Prevenção, Combate, Denúncia e<br />
Encaminhamento de Casos de Assédio e Todo<br />
o Tipo de Abuso, Incluindo o Abuso Sexual<br />
na Escola, Governo de Moçambique, Maputo,<br />
2008.<br />
27 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
Demográfico e de Saúde 2003, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2005.<br />
28 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
de Indicadores Múltiplos, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2010.<br />
29 United Nations Committee on the Rights of the<br />
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Submitted by States Parties Under Article 44<br />
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of the Committee on the Rights of the Child:<br />
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2009<br />
32 Open Society Institute for Southern Africa,<br />
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33 Legal Aid Institute, ‘Report to the Consultative<br />
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2008.<br />
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de 2007.<br />
174<br />
175
6CAPÍTULO<br />
1. Introdução<br />
Questões<br />
transversais<br />
6CAPÍTULO<br />
Melhorar a situação dos membros mais<br />
vulneráveis da sociedade exige que se<br />
saiba quem são, onde vivem e quais<br />
os desafios e riscos que enfrentam.<br />
Moçambique não é um país homogéneo,<br />
e crianças vivendo em áreas diferentes, e<br />
inclusivamente sob o mesmo tecto, nem<br />
sempre enfrentam os mesmos níveis de<br />
vulnerabilidade. Determinadas crianças,<br />
famílias e comunidades inteiras estão<br />
ameaçadas pela presença de perigos físicos,<br />
ambientais ou sociais com que outras não<br />
têm que se preocupar. Além disso, há uma<br />
série de factores que afectam a capacidade<br />
de certos subgrupos da população de lidar<br />
com a presença de ameaças ao seu bemestar.<br />
Questões relacionadas com género,<br />
disparidades geográficas, HIV e SIDA, falta<br />
de informação e condições ambientais<br />
tornam mais complexos e desafiam cada<br />
um dos sectores discutidos nos últimos três<br />
capítulos: sobrevivência da criança, educação<br />
e protecção. Para que as intervenções a<br />
serem projectadas e implementadas para<br />
diminuir a vulnerabilidade global sejam<br />
eficazes, é fundamental uma análise<br />
aprofundada destas questões transversais<br />
e dos sistemas institucionais e sociais que<br />
estão implantados para as abordar.<br />
Este capítulo incide sobre cinco temas<br />
transversais: género, HIV e SIDA,<br />
disparidades regionais, comunicação para o<br />
desenvolvimento e meio ambiente.<br />
Questões transversais<br />
179
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
2. Género<br />
<strong>Home</strong>ns e mulheres usufruírem dos direitos<br />
humanos em condições de igualdade é<br />
um princípio consagrado na Declaração<br />
Universal dos Direitos do <strong>Home</strong>m. 1 Em 1979,<br />
as Nações Unidas aprovaram a Convenção<br />
sobre a Eliminação de Todas as Formas de<br />
Discriminação contra a Mulher (CEDAW), que<br />
definiu ainda os direitos legais e humanos<br />
das mulheres. 2 O princípio da igualdade<br />
no gozo de direitos foi depois reafirmado<br />
pela Declaração de Viena, adoptada por 171<br />
Estados na Conferência Mundial sobre os<br />
Direitos Humanos em Junho de 1993. 3<br />
O <strong>UNICEF</strong> está empenhado em promover<br />
a igualdade de direitos das mulheres e<br />
meninas e apoiar a sua plena participação<br />
no desenvolvimento político, social e<br />
económico das suas comunidades. Só<br />
assegurando iguais oportunidades a<br />
homens e mulheres, raparigas e rapazes, as<br />
sociedades podem esperar criar condições<br />
para acabar com a pobreza e permitir a cada<br />
indivíduo desenvolver plenamente o seu<br />
potencial.<br />
Género e desenvolvimento de género não<br />
têm unicamente a ver com os direitos<br />
das mulheres e meninas; pelo contrário,<br />
abordam todas as formas de discriminação<br />
ou preconceitos baseados no sexo das<br />
pessoas com que nos confrontamos na<br />
realização dos direitos humanos ou nos<br />
esforços para alcançar desenvolvimento.<br />
Em muitos casos, as mulheres e meninas<br />
são mais frequentemente vítimas de<br />
discriminação de género, embora também<br />
possa haver situações de meninos ou<br />
homens serem discriminados, que deverão<br />
merecer igual consideração.<br />
i<br />
Moçambique ratificou a Convenção das<br />
Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas<br />
as Formas de Discriminação contra a Mulher<br />
em 1993, que entrou em vigor em 1997, bem<br />
como o Protocolo Facultativo à Convenção.<br />
Moçambique é também signatário da Carta<br />
Africana dos Direitos do <strong>Home</strong>m e dos Povos<br />
e dos Direitos da Mulher de 2005.<br />
O Ministério da Mulher e da Acção Social foi<br />
criado em 2005. i Compete-lhe implementar<br />
e coordenar as iniciativas relativas aos<br />
direitos das mulheres e crianças. O Conselho<br />
Nacional para o Avanço da Mulher é uma<br />
plataforma de coordenação multissectorial<br />
através da qual o Ministério da Mulher e da<br />
Acção Social monitora a implementação do<br />
Plano Nacional para o Avanço da Mulher.<br />
Apesar dos progressos no quadro jurídico,<br />
a discriminação com base no género, e<br />
especialmente a discriminação contra as<br />
mulheres é uma realidade em Moçambique.<br />
Ela reflecte-se em aspectos da vida social,<br />
cultural, política e económica das mulheres,<br />
incluindo os seguintes: 4<br />
• l Na família, as mulheres são discriminadas<br />
pelos seus familiares directos e não<br />
recebem o mesmo tratamento que os<br />
homens. Por exemplo, os meninos são<br />
muitas vezes favorecidos em decisões<br />
sobre que membros da família deverão<br />
beneficiar de educação formal, embora<br />
a desigualdade de género na educação<br />
tenha diminuído nos últimos anos. As<br />
decisões são muitas vezes tomadas com<br />
base em práticas costumeiras, onde os<br />
meninos e os homens são definidos<br />
como os que ganham para o sustento da<br />
família, e as meninas e mulheres como<br />
Em 2000, foi criado o Ministério para a Coordenação da Acção Social. Em 2005, o Ministério foi reestruturado passando<br />
a ser conhecido por Ministério da Mulher e da Acção Social, nome que reflecte a elevação das questões de igualdade de<br />
género em Moçambique.<br />
donas de casa. Os maiores níveis de<br />
analfabetismo nas mulheres e a falta de<br />
conhecimento dos seus direitos significam<br />
que os casos de discriminação contra<br />
as mulheres raramente são levados a<br />
um tribunal de direito. Na área laboral,<br />
são poucas as oportunidades existentes<br />
para as mulheres no sector formal,<br />
especialmente para posições de nível<br />
sénior;<br />
• l Tanto os homens como as mulheres são<br />
relutantes em resolver os seus conflitos<br />
nos tribunais judiciais formais. Nas zonas<br />
rurais, os tribunais podem ficar distantes.<br />
As vítimas de violência doméstica podem<br />
estar relutantes em levar o seu parceiro<br />
a tribunal. A violência doméstica ainda<br />
não é vista como crime, mas considerada<br />
normal nas relações entre homens e<br />
mulheres.<br />
O Plano Quinquenal do Governo 2010-2014<br />
estabelece como objectivo a promoção da<br />
igualdade de oportunidades económicas,<br />
sociais e culturais para homens e mulheres. 5<br />
2.1. Aspectos de género da<br />
pobreza em Moçambique<br />
Conforme discutido no Capítulo 1, a redução<br />
da pobreza em Moçambique entre 1996/97 e<br />
2002/03 não beneficiou todos os segmentos<br />
da população da mesma forma. A pobreza<br />
foi reduzida mais significativamente nas<br />
famílias chefiadas por homens do que nas<br />
famílias chefiadas por mulheres. Embora<br />
a pobreza tenha registado uma redução<br />
de 26 por cento nos agregados familiares<br />
chefiados por homens (passando de cerca<br />
de 70 por cento em 1996/97 para 52 por<br />
cento em 2002/03), foi apenas uma redução<br />
de 6 por cento nos agregados familiares<br />
chefiados por mulheres (de cerca de 67<br />
por cento para 63 por cento entre 1996/97<br />
e 2002/03). Desta situação podem advir<br />
implicações para as crianças órfãs, uma<br />
vez que é nos agregados chefiados por<br />
mulheres que aqueles mais frequentemente<br />
se encontram. O Inquérito à Força de<br />
Trabalho (IFTRAB) 2004/05 indicou que 54<br />
por cento do total de crianças órfãs viviam<br />
em agregados familiares chefiados por<br />
mulheres, em comparação com 46 por cento<br />
em agregados chefiados por homens. 6<br />
Estudos recentes indicam que a tendência<br />
de feminização da pobreza se deve,<br />
pelo menos parcialmente, ao facto de<br />
as mulheres estarem mais fortemente<br />
envolvidas no sector agrícola do que os<br />
homens (89 por cento comparativamente<br />
a 68 por cento). 7 Ao mesmo tempo, as<br />
mulheres têm menos acesso à educação,<br />
menos oportunidades de emprego<br />
formal, mais baixos rendimentos e menos<br />
oportunidades para diversificar suas fontes<br />
de renda. Estudos mostraram também<br />
que os agregados familiares chefiados por<br />
mulheres, além de serem mais pobres em<br />
termos monetários do que os chefiados<br />
por homens, têm reduzido acesso dos<br />
social como consequência das estruturas<br />
predominantemente patriarcais da sociedade<br />
moçambicana. 8<br />
Outra prova da feminização da pobreza<br />
provém de uma análise de três Inquéritos<br />
Nacionais Agrícolas (2002, 2005 e 2008),<br />
segundo os quais, nos três anos do<br />
inquérito, os agregados familiares chefiados<br />
por mulheres estavam sobre-representados<br />
entre os agregados mais pobres. 9 Em<br />
contrapartida, a percentagem de domicílios<br />
chefiados por homens tende a aumentar à<br />
medida que sobe o quintil de rendimento<br />
(ver figura 6.1).<br />
A tendência de feminização da pobreza<br />
é suportada pela percepção da mudança<br />
registada nos agregados familiares<br />
chefiados por homens e por mulheres,<br />
respectivamente. Uma maior percentagem<br />
de agregados chefiados por mulheres<br />
do que por homens considera que a sua<br />
situação piorou nos últimos cinco anos. Ao<br />
mesmo tempo, a percepção de deterioração<br />
das condições nos domicílios chefiados por<br />
mulheres é mais pronunciada nas zonas<br />
rurais que nas urbanas, o que pode indicar<br />
melhores oportunidades para os agregados<br />
familiares chefiados por mulheres nas áreas<br />
urbanas.<br />
180<br />
181
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Figura 6.1: Percentagem de agregados familiares chefiados por homens por quintil de riqueza, 2002, 2005 e 2008<br />
Percentagem de agregados familiares<br />
chefiados por homens<br />
100%<br />
80%<br />
60%<br />
40%<br />
20%<br />
0%<br />
2002 2005 2008<br />
2002 2005 2008<br />
Os níveis gerais de participação no mercado<br />
de trabalho são ligeiramente mais elevados<br />
nas mulheres em idade activa (15-59<br />
anos), 82 por cento, do que nos homens da<br />
mesma idade (79 por cento). A participação<br />
das mulheres na força de trabalho está<br />
principalmente concentrada na agricultura<br />
de subsistência nas zonas rurais, onde<br />
elas constituem 62 por cento da população<br />
activa, enquanto os homens predominam<br />
em todos os outros principais sectores da<br />
economia, onde mais se pode ganhar. As<br />
mulheres que se encontram na força de<br />
trabalho têm habilitações de níveis mais<br />
baixos que os homens: 15 por cento dos<br />
homens no mercado de trabalho chegaram<br />
ao segundo nível do ensino primário ou<br />
acima disso, comparados com apenas cinco<br />
por cento das mulheres participantes. 10<br />
Embora as mulheres constituam a maior<br />
parte da população economicamente activa,<br />
estão principalmente envolvidas no sector<br />
agrícola, principalmente na produção<br />
familiar com limitados excedentes. Quando<br />
existem oportunidades de geração de<br />
rendimento, os homens tendem a ter uma<br />
maior probabilidade de aceder a estas<br />
oportunidades e a delas beneficiar. Nas áreas<br />
urbanas, as mulheres são mais propensas<br />
a depender do sector informal devido aos<br />
mais baixos requisitos de ingresso e ao<br />
facto de o acesso ao emprego formal ser<br />
2002 2005 2008<br />
2002 2005 2008<br />
2002 2005 2008<br />
Quintil inferior Segundo Médio Quarto Quintil superior<br />
Fonte: Cunguara, Benedito e Brendan Kelly, ‘Trends in agriculture producers’ income in rural <strong>Mozambique</strong>’, study as input to Impact<br />
Evaluation Report of PARPA II, MPD, 2009<br />
amplamente controlado pelo capital social<br />
(contactos sociais), que favorece os homens<br />
por ainda serem vistos como o ganha-pão da<br />
família.<br />
2.2. Desenvolvimento<br />
ajustado ao género e<br />
empoderamento com base<br />
em género<br />
No Relatório de Desenvolvimento Humano<br />
2009, Moçambique ocupa o 145º lugar em<br />
155 países, e é-lhe atribuído um Índice de<br />
Desenvolvimento Ajustado ao Género de<br />
0,395 em 2007. Em 1995, Moçambique<br />
alcançou um Índice de Desenvolvimento<br />
Ajustado ao Género (IDG) de 0,229,<br />
colocando-se em 123º lugar entre os 130<br />
países para os quais o índice foi calculado.<br />
Quer isto dizer que embora Moçambique<br />
tenha melhorado em matéria de igualdade<br />
de género em termos absolutos, não<br />
melhorou tanto quanto outros países. O<br />
IDG nas províncias do centro e do norte foi<br />
menor do que no sul.<br />
O IDG utilizado baseou-se em três<br />
indicadores a que se atribuiu peso igual:<br />
• l Esperança de vida ao nascer;<br />
• l Uma combinação da taxa de alfabetização<br />
de adultos com a taxa líquida de<br />
Figura 6.2: IDG baseado em diferentes métodos de determinação da diferença salarial, 2009<br />
Índice de Desenvolvimento Ajustado ao Género<br />
escolarização combinada nos níveis<br />
primário, secundário e terciário;<br />
• l Produto Interno Bruto per capita expresso<br />
como paridade do poder de compra em<br />
dólares americanos<br />
Foi solicitado, como parte da avaliação<br />
do impacto do PARPA II 2009, 11 um estudo<br />
para actualizar o IDG do Programa de<br />
Desenvolvimento das Nações Unidas<br />
concernente a Moçambique.<br />
O IDG foi calculado de acordo com quatro<br />
cenários diferentes: três utilizando diferentes<br />
métodos de determinação da diferença<br />
salarial entre homens e mulheres, e um<br />
usando uma esperança de vida ajustada<br />
considerando o impacto da SIDA:<br />
• l Cenário A: diferença salarial não agrícola<br />
calculada com base em diferentes níveis<br />
de qualificação de homens e mulheres;<br />
• l Cenário B: diferença salarial global<br />
(agrícola e não agrícola), com base em<br />
diferentes níveis de qualificação de<br />
homens e mulheres;<br />
0.430<br />
0.410<br />
0.390<br />
0.370<br />
0.350<br />
0.330<br />
0.310<br />
0.290<br />
0.270<br />
• l Cenário C: diferença salarial não agrícola<br />
com base no pressuposto do Programa de<br />
Desenvolvimento das Nações Unidas de<br />
que, em média, as mulheres ganham 75<br />
por cento do salário de seus congéneres<br />
do sexo masculino;<br />
• l Cenário D: usando estimativas de<br />
esperança de vida ajustadas tendo em<br />
conta a SIDA. O Cenário D fornece uma<br />
ilustração do impacto do HIV sobre o<br />
Índice de Desenvolvimento Ajustado ao<br />
Género na ausência de intervenções de<br />
prevenção e tratamento da SIDA.<br />
De acordo com os cenários A e C, a meta do<br />
PARPA II para o IDG foi atingida em 2008,<br />
resultado que o relatório atribuiu ao elevado<br />
nível de equidade de género alcançado nas<br />
matrículas na escola primária.<br />
Moçambique saiu-se muito melhor na<br />
Medida de Participação Segundo o Género<br />
(MPG) que foi calculada em 0,350, o que<br />
coloca o país em 61º lugar de entre 116<br />
países. A MPG foi mais um reflexo da<br />
percentagem relativamente elevada de<br />
assentos parlamentares ocupados por<br />
0.250<br />
2004 2005 2006 2007 2008<br />
Ano<br />
Cenário A Cenário B Cenário C Cenário D<br />
Fonte: Ministério de Planificação e desenvolvimento, Ministério da Mulher e da Acção Social e Grupo de Coordenação de Género<br />
(GCG), ‘Calculando o Gender Development Index no Contexto da Avaliação do PARPA II (2006–2009)’, Maputo, 2009.<br />
182<br />
183
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
mulheres em Moçambique (15 por cento<br />
em 1994) e da parcela de rendimento<br />
proporcional auferida pelas mulheres (40<br />
por cento em 1994), que foi mais elevadas<br />
do que para vários outros países nos<br />
rankings. Não é apresentada nenhuma<br />
MPG para Moçambique no Relatório do<br />
Desenvolvimento Humano 2009. Existe um<br />
elevado grau de disparidade regional na<br />
MPG, situando-se no norte do país as quatro<br />
províncias com os menores (piores) índices.<br />
Defende-se que a área em que mais<br />
progressos se têm feito em termos de<br />
igualdade de género em Moçambique é<br />
a da participação política das mulheres.<br />
Moçambique possui uma elevada<br />
percentagem de mulheres em órgãos de<br />
tomada de decisões como o Parlamento,<br />
onde, após as eleições de 2004, 36 por<br />
cento dos assentos estavam ocupados<br />
por mulheres. Antes do novo Governo<br />
anunciado em 2010, o cargo de primeiroministro<br />
era ocupado por uma mulher. 12<br />
Embora tenha havido uma redução da<br />
percentagem de mulheres no Governo<br />
na sequência das eleições de 2009, a<br />
participação política das mulheres em<br />
Moçambique é elevada para os padrões<br />
regionais. Actualmente, 18 por cento dos<br />
ministros e vice-ministros e 27 por cento dos<br />
governadores provinciais são mulheres.<br />
2.3. Disparidades de género<br />
Um estudo realizado pelo Ministério de<br />
Planificação e Desenvolvimento no âmbito<br />
da Avaliação do Impacto do PARPA II<br />
2009 não revelou nenhuma diferença na<br />
percentagem de meninas e rapazes em<br />
situação de pobreza absoluta medida pela<br />
abordagem baseada em privações (ver<br />
Capítulo 1, A pobreza em Moçambique,<br />
para uma discussão mais detalhada da<br />
pobreza baseada em privações). É mais<br />
elevada a percentagem de rapazes que sofre<br />
de deficiência nutricional severa do que<br />
a de meninas (23 por cento versus 17 por<br />
cento). São inúmeras as hipóteses sobre<br />
as razões que explicam essa diferença,<br />
incluindo diferenças nas necessidades<br />
nutricionais, hábitos alimentares, acesso a<br />
alimentos e cuidados infantis, mas não há<br />
provas suficientes para confirmar ou refutar<br />
qualquer dessas possíveis explicações.<br />
As meninas têm maior probabilidade de<br />
estar severamente privadas de educação<br />
do que os meninos (13 e 10 por cento,<br />
respectivamente). No entanto, a privação<br />
de educação reduziu-se significativamente<br />
tanto nas meninas como nos rapazes entre<br />
2003 e 2008. As taxas de conclusão e de<br />
alfabetização das meninas são também são<br />
inferiores às dos rapazes, especialmente no<br />
nível secundário.<br />
2.4. Questões de género na<br />
educação<br />
O PARPA II discute a relação entre educação,<br />
redução da pobreza e crescimento<br />
económico, dando especial ênfase ao papel<br />
da educação das raparigas. Os objectivos do<br />
PARPA II para os níveis primário, secundário<br />
e terciário do sistema de ensino referem-se<br />
explicitamente a inclusão na base de género,<br />
vulnerabilidade e necessidades especiais.<br />
São também apresentadas estratégias para<br />
aumentar a educação da rapariga, incluindo<br />
lidar com a sensível, mas fundamental<br />
questão de reduzir a incidência do abuso<br />
sexual nas escolas. O Plano Quinquenal<br />
do Governo 2010-14 também define como<br />
prioritária a paridade de género na escola<br />
primária.<br />
Baixos níveis de alfabetização,<br />
especialmente nas mulheres, têm sido,<br />
desde há muitos anos, uma característica<br />
constante da sociedade moçambicana.<br />
Por exemplo, o Inquérito Demográfico<br />
e de Saúde 2003 registou uma taxa<br />
de analfabetismo de 62 por cento nas<br />
mulheres, em comparação com 33 por<br />
cento nos homens. Os relatórios de do<br />
MICS 2008 reportam que 41 por cento dos<br />
moçambicanos com 20-24 anos de idade são<br />
alfabetizados, número que sobe para 53 por<br />
cento nas jovens de 15-19 anos. 13<br />
No período 1992-2009, o número de alunos<br />
nas escolas primárias e secundárias registou<br />
um enorme aumento tanto nos rapazes<br />
como nas meninas, mas continua a haver<br />
diferenças de género em todos os níveis da<br />
educação. A diferença absoluta de género<br />
na escolarização bruta no primeiro nível do<br />
ensino primário tem diminuído desde 1999,<br />
mas continua elevada, situando-se nos 14<br />
por cento. 14<br />
A disparidade de género no número de<br />
matrículas revela uma variação geográfica<br />
considerável, com menos meninas<br />
matriculadas nas regiões centro e norte,<br />
enquanto em algumas províncias do<br />
sul, como Maputo e Inhambane, estão<br />
matriculadas ligeiramente mais raparigas do<br />
que rapazes. Em 2007, a taxa de conclusão<br />
da primeira fase do ensino primário foi de 65<br />
por cento nas raparigas e 80 por cento nos<br />
rapazes. Este diferencial de género continua<br />
a verificar-se na segunda fase do ensino<br />
primário, com taxas de conclusão de 39<br />
por cento nas raparigas e 53 por cento nos<br />
rapazes. 15<br />
O género é um importante factor de impacto<br />
no sector da educação: é particularmente<br />
forte o seu efeito nas famílias mais pobres,<br />
nas zonas rurais e nas províncias do Centro<br />
e do Norte. A disparidade de género<br />
também está a prejudicar alguns notórios<br />
ganhos, com taxas de conclusão nas<br />
meninas substancialmente inferiores às dos<br />
rapazes. Embora a diferença de género tenha<br />
diminuído nos últimos anos, continuam a<br />
existir fortes disparidades que têm de ser<br />
examinadas contemplando a situação de<br />
pobreza, o local de residência, e práticas e<br />
tradições culturais.<br />
Para promover a educação das raparigas,<br />
o Ministério da Educação tem dado grande<br />
atenção à melhoria da segurança nas<br />
escolas, definindo inclusivamente passos<br />
básicos para reagir ao abuso sexual nas<br />
escolas. Foram também empreendidos<br />
esforços para fortalecer a capacidade da<br />
unidade do Ministério responsável pelo<br />
género a fim de melhor se integrar o género<br />
e a SIDA na planificação, implementação e<br />
monitoria de processos iniciados e trabalhar<br />
com as comunidades na prevenção da<br />
educação das raparigas, do abuso sexual<br />
precoce e da gravidez. Além disso, a<br />
capacidade das unidades de género deve<br />
ser reforçada no respeitante a monitoria<br />
e notificação de abuso sexual e violência.<br />
Focalizar a educação das meninas é tanto um<br />
meio de resolver a disparidade de género<br />
como uma estratégia para alavancar ganhos<br />
ao lidar com outras disparidades.<br />
2.5. Violência, abuso e<br />
exploração<br />
Algumas formas de violência contra as<br />
mulheres e crianças estão enraizadas<br />
em dinâmicas de género da sociedade<br />
discriminatórias e de desigualdade. 16<br />
Estudos e dados disponíveis parecem indicar<br />
que a ordem social dominada por uma<br />
cultura tradicional e patriarcal machista é<br />
forte em Moçambique. 17 Continua a haver,<br />
por exemplo, casamento infantil, apesar das<br />
disposições da Lei da Família de 1997, o que<br />
parece estar relacionado com a persistência<br />
dos papéis de género tradicionalmente<br />
atribuídos a mulheres e meninas como mães<br />
e cuidadoras na sociedade.<br />
Muitas meninas vítimas não denunciam<br />
casos de estupro ou abuso sexual às<br />
autoridades, em parte devido ao estigma<br />
que envolve a questão do abuso sexual.<br />
No seu primeiro e segundo relatórios<br />
combinados ao Comité das Nações Unidas<br />
para a Convenção sobre a Eliminação da<br />
Discriminação contra as Mulheres (CEDAW),<br />
Moçambique informou que a maioria<br />
das famílias prefere resolver os casos de<br />
abuso sexual fora dos tribunais, por via de<br />
indemnização ou casamentos. O relatório<br />
também reconhece a falta de conhecimento<br />
sobre o sistema legal e atrasos excessivos<br />
no sistema judicial como obstáculos<br />
adicionais a uma solução jurídica para esses<br />
casos. 18 Fraco acesso ao sistema de justiça,<br />
insuficiente conhecimento dos direitos das<br />
mulheres, e falta de um sistema de aplicação<br />
de penas legais agravam o problema.<br />
A violência doméstica contra as mulheres<br />
é também um sério problema em<br />
184<br />
185
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Moçambique. Embora escasseiem dados<br />
quantitativos, os dados de 2004 indicam<br />
que 54 por cento das mulheres inquiridas<br />
relataram ter sido vítimas de abuso, como<br />
discutido no Capítulo 5. Revelam também<br />
esses dados uma aceitação generalizada do<br />
uso da violência. Em 2008, a percentagem<br />
de mulheres que afirmaram que os homens<br />
tinham o direito de lhes bater em certas<br />
circunstâncias, tais como sair de casa sem<br />
informar o marido ou recusar sexo, foi de<br />
36 por cento, uma redução relativamente<br />
aos 54 por cento de 2003. As mulheres mais<br />
escolarizadas são menos propensas a aceitar<br />
a violência doméstica, tal como as mulheres<br />
que vivem em áreas urbanas (ver Capítulo<br />
5). Apesar da aparente aceitação cultural da<br />
violência doméstica, outros estudos 19 têm<br />
revelado que a violência extrema resultando<br />
em danos corporais é inaceitável para as<br />
comunidades, bem como para os homens e<br />
mulheres individualmente.<br />
A prevalência de trabalho infantil é<br />
ligeiramente maior entre as meninas (24<br />
por cento) do que entre os rapazes (21 por<br />
cento). Uma maior percentagem de meninas<br />
do que meninos trabalha em tarefas<br />
domésticas (oito por cento contra cinco por<br />
cento, respectivamente). A percentagem de<br />
crianças que trabalham para apoiar negócios<br />
familiares é a mesma para ambos os sexos<br />
(16 por cento). 20<br />
São as mulheres e meninas que<br />
tradicionalmente acarretam água para a<br />
família. O MICS constatou que em 86 por<br />
cento dos agregados familiares é uma<br />
mulher adulta que se dedica a essa tarefa,<br />
enquanto em 7 por cento dos agregados<br />
familiares é uma menina (menor de 15 anos).<br />
As fontes de água situam-se normalmente<br />
muito longe de casa, uma média de cerca<br />
de 50 minutos a pé (excluindo os agregados<br />
familiares com água nas suas instalações - 9<br />
por cento). Normalmente, são feitas várias<br />
deslocações por dia para a fonte de água. 21<br />
2.6. Sistemas de Linhagem<br />
Em Moçambique, existem os dois sistemas<br />
de linhagem, patrilinear e matrilinear. Sob<br />
o sistema patriarcal, a mulher e os filhos<br />
pertencem ao marido e sua família, e é<br />
o marido que concede ao seu cônjuge do<br />
sexo feminino acesso à terra. No sistema<br />
matriarcal, a mulher e os filhos continuam<br />
a ser considerados membros da família<br />
matrilinear da mulher. Sob o sistema<br />
matriarcal, é o tio da mulher que dá acesso<br />
à terra, enquanto as crianças pertencem<br />
a familiares consanguíneos da mãe. 22 Em<br />
ambos os sistemas, patrilinear e matrilinear,<br />
as posições das mulheres baseiam-se em<br />
submissão aos membros masculinos da<br />
família - ou seja, ao marido/pai ou irmãos,<br />
respectivamente. 23<br />
Os direitos à terra são de certa forma<br />
problemáticos em Moçambique devido à<br />
existência de dois sistemas contraditórios.<br />
Oficialmente, e em conformidade com a<br />
Constituição e a Lei de Terras, a terra é<br />
propriedade inalienável do Estado. No<br />
entanto, ao abrigo do direito consuetudinário<br />
e tradição, a terra pertence à comunidade<br />
que vive em seu redor e aos antepassados<br />
dessa comunidade. O acesso à terra é gerido<br />
por uma complexa rede de tradições sociais<br />
que se constitui em torno do casamento,<br />
como base de alianças entre as famílias.<br />
Assim, os direitos hereditários à terra<br />
dependem da idade, do sexo e da condição<br />
social, inclusive do parentesco ou outros<br />
vínculos com as famílias que foram as<br />
primeiras a povoar a região. Os títulos de<br />
propriedade da terra formais não parecem<br />
ser relevantes para fins de herança. Nas<br />
sociedades patriarcais, surgem problemas<br />
em caso de divórcio ou morte do marido,<br />
onde uma mulher corre o risco de perder<br />
as suas terras e todos os seus pertences<br />
a favor de outros membros da família<br />
do falecido marido, mesmo tendo ela a<br />
responsabilidade de cuidar dos seus filhos e<br />
outros familiares. 24<br />
2.7. HIV e género<br />
A Declaração de Compromisso de 2001<br />
sobre o HIV/SIDA reconhece que as<br />
mulheres são desproporcionalmente<br />
afectadas pela SIDA no quadro global,<br />
devendo merecer prioridade nas respostas<br />
nacionais e globais. 25 A dimensão de género<br />
do HIV e da SIDA tem uma componente<br />
biológica e uma componente social.<br />
Biologicamente, as mulheres são mais<br />
vulneráveis à infecção pelo HIV do que<br />
homens, sendo as meninas ainda mais<br />
vulneráveis. No entanto, o mais importante<br />
para determinar o diferencial na transmissão<br />
e no impacto nas mulheres é a componente<br />
social. Em Moçambique, é ensinado às<br />
mulheres que o sexo é uma estratégia de<br />
sobrevivência, pelo que é frequente elas<br />
se submeterem às decisões dos homens,<br />
tendo menos capacidade para negociar<br />
sexo seguro, fidelidade ou abstinência.<br />
Sexo coagido ou forçado e violência sexual<br />
exacerbam as vulnerabilidades biológicas e<br />
sociais das mulheres à infecção. As meninas<br />
tendem a iniciar relações sexuais regulares<br />
mais cedo do que meninos, aumentando o<br />
risco de transmissão. 26<br />
Como resultado destes dois grupos de<br />
factores, a prevalência de infecção em<br />
mulheres de 15-49 anos (13,1 por cento) é<br />
mais de um terço superior à dos homens<br />
da mesma faixa etária (9,2 por cento). Entre<br />
as mulheres na faixa etária de 15-24 anos,<br />
a prevalência do HIV é 3 vezes superior à<br />
dos homens da mesma idade. 27 28 A AIDS<br />
Accountability International preparou um<br />
Scorecard on Woman que classifica as<br />
respostas dos Governos à epidemia de SIDA<br />
a partir de uma perspectiva de género. Os<br />
seis elementos fundamentais incluídos no<br />
Scorecard são: recolha de dados, género,<br />
ambiente político e legal, programas<br />
nacionais, conhecimento, comportamento<br />
e impacto. É atribuída aos países uma<br />
classificação de A (muito bom) a E (muito<br />
fraco) para cada elemento. Ver Tabela 6.1<br />
abaixo com a pontuação de Moçambique. 29<br />
186<br />
187
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Tabela 6.1: Scorecard para a resposta do Governo de Moçambique à SIDA numa perspectiva de género<br />
Recolha de dados<br />
Integração sistemática de género<br />
Ambiente de políticas e legal<br />
Programas nacionais<br />
Conhecimento e comportamento<br />
Impacto<br />
2.8. Conclusões<br />
As mulheres têm maior probabilidade de<br />
viver em situação de pobreza do que os<br />
homens em Moçambique. A incidência<br />
da pobreza em agregados familiares<br />
chefiados por mulheres é superior à<br />
dos agregados familiares chefiados por<br />
homens. As mulheres têm menos acesso<br />
ao emprego formal do que os homens, e<br />
tendem a trabalhar em indústrias de menor<br />
remuneração. Há indícios, no entanto, de<br />
que a desigualdade entre os homens e as<br />
mulheres tem diminuído em Moçambique<br />
nos últimos anos.<br />
Existe uma clara relação entre o bemestar<br />
das mulheres e o bem-estar de<br />
seus filhos. Mães instruídas são mais<br />
propensas a ter filhos mais instruídos,<br />
mais saudáveis, menos vulneráveis. Tendo<br />
como alvo raparigas a frequentarem<br />
escolas, os programas de saúde e protecção<br />
podem não só melhorar o bem-estar das<br />
Pontuação<br />
A – Muito bom<br />
C – Médio<br />
C – Médio<br />
B – Bom<br />
A – Muito bom<br />
C – Médio<br />
Fonte: AIDS Accountability International, ‘The AIDS Accountability Scorecard on Women 2009’, Joint United Nations Programme on<br />
HIV/AIDS, Geneva, 2009.<br />
pessoas abrangidas, como também gerar<br />
significativos efeitos secundários positivos<br />
nos futuros filhos dessas meninas.<br />
A paridade de género na educação, em<br />
termos de taxas de frequência, tem vindo<br />
a melhorar. No que respeita a taxas de<br />
alfabetização e conclusão, no entanto,<br />
persistem consideráveis disparidades.<br />
Na promoção do acesso das mulheres à<br />
educação é fundamental melhorar-se a<br />
segurança nas escolas. Para isso, é preciso<br />
que se reforce a capacidade das unidades<br />
de género para monitorar e reportar abuso e<br />
violência sexual.<br />
A violência contra a mulher é comum e<br />
é considerada aceitável por uma grande<br />
percentagem de mulheres, bem como<br />
pela sociedade em geral. Para diminuir<br />
a incidência de violência de género são<br />
necessárias iniciativas de sensibilização para<br />
mudar as mentes e divulgação de melhor<br />
informação.<br />
3. Disparidades geográficas<br />
Moçambique é um país grande com uma<br />
densidade populacional relativamente baixa.<br />
Cobre uma superfície de aproximadamente<br />
802.000 km2 e tem um litoral que se estende<br />
por quase 2.500 km, desde a África do<br />
Sul, no sul, até à Tanzânia, no norte. A<br />
densidade populacional média é de cerca de<br />
26 habitantes por km2. Relacionada com a<br />
grande extensão geográfica do país está a<br />
sua diversidade linguística, cultural e étnica.<br />
São diferentes as tradições e costumes<br />
entre as várias regiões. Mais de uma dezena<br />
de línguas locais, algumas das quais com<br />
seus próprios dialectos, são faladas em<br />
Moçambique. O português é a língua oficial<br />
e da administração, mas menos de dez<br />
por cento da população o fala como língua<br />
materna, e apenas cerca de 40 por cento o<br />
aprendeu a falar. 30<br />
Os dados revelam a existência de claras<br />
disparidades na incidência da pobreza entre<br />
as províncias. Por exemplo, a incidência<br />
da pobreza no inquérito de 2008/09 varia<br />
entre 71 por cento em Inhambane e 31 por<br />
cento no Niassa. Continua a haver uma<br />
significativa demarcação urbano/rural em<br />
termos de taxas de pobreza: 57 por cento<br />
dos habitantes rurais vivem em pobreza<br />
absoluta em comparação com 50 por cento<br />
da população urbana. 31<br />
O acesso aos serviços sociais básicos é<br />
geralmente mais elevado no sul do país. As<br />
disparidades no Índice de Desenvolvimento<br />
Humano (IDH) e no IDG do Programa das<br />
Nações Unidas para o Desenvolvimento<br />
têm feito ver que as províncias do norte do<br />
país geralmente apresentam mais baixos<br />
níveis de desenvolvimento humano do que<br />
as do centro ou do sul. 32 Todas as províncias<br />
do país apresentaram melhorias nos seus<br />
IDG entre 2001 e 2006. 33 Outros indicadoreschave,<br />
incluindo o PIB per capita, também<br />
apresentam uma variação considerável entre<br />
as províncias. 34 Há alguma evidência de que<br />
as desigualdades no consumo que existem<br />
em Moçambique são frequentemente<br />
mais pronunciadas no seio das regiões e<br />
províncias do que entre elas. 35<br />
No seu primeiro Plano de Acção para a<br />
Redução da Pobreza Absoluta (PARPA I),<br />
o governo de Moçambique reconheceu a<br />
desigualdades económicas e sociais entre<br />
a área Maputo-Matola e arredores e o<br />
resto do país como sendo “a característica<br />
mais visível” do país. Essa desigualdade<br />
é atribuída a vários factores, incluindo a<br />
guerra civil. O segundo Plano de Acção para<br />
a Redução da Pobreza Absoluta (PARPA<br />
II) também observou que as medidas de<br />
pobreza, tanto baseada no consumo como<br />
não baseada no rendimento variavam<br />
consideravelmente entre as províncias. Lidar<br />
com as disparidades regionais foi objectivo<br />
prioritário do PARPA I, bem como do PARPA<br />
II. A avaliação de impacto do PARPA II<br />
realizada em 2009 concluiu ter havido uma<br />
ligeira redução das disparidades, embora<br />
estas, no que respeita a agricultura, tenham<br />
aumentado, enquanto as dos sectores de<br />
saúde e educação se continuam a manter a<br />
níveis elevados. 36<br />
Também se vêm disparidades provinciais<br />
em relação às medidas da pobreza não<br />
baseadas no rendimento. Um estudo sobre a<br />
privação severa nas crianças efectuado como<br />
parte da avaliação do PARPA II (ver Capítulo<br />
1) revelou que, em 2003 e 2008, a maior<br />
percentagem de crianças com privações<br />
severas vivia na província da Zambézia, 80<br />
por cento em 2003 e 64 por cento em 2008<br />
(ver Tabela 6.2). 37 A Cidade de Maputo tem,<br />
de longe, os mais baixos níveis de pobreza<br />
infantil, como este método de medição, com<br />
apenas cerca de 4 por cento das crianças<br />
vivendo duas ou mais privações severas.<br />
Uma comparação dos níveis de pobreza<br />
em 2008, medidos utilizando a abordagem<br />
baseada no consumo e a abordagem<br />
baseada em privações severas permite<br />
188<br />
189
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Tabela 6.2: Percentagem de crianças que enfrentam duas ou mais privações severas, 2003 e 2008<br />
2003 2008<br />
Global 59% 48%<br />
Urbana 30% 22%<br />
Rural 73% 60%<br />
Província<br />
Niassa 58% 35%<br />
Cabo Delgado 62% 45%<br />
Nampula 66% 59%<br />
Zambézia 80% 64%<br />
Tete 65% 60%<br />
Manica 58% 52%<br />
Sofala 68% 53%<br />
Inhambane 48% 37%<br />
Gaza 53% 39%<br />
Maputo Província 24% 18%<br />
Maputo Cidade 11% 4%<br />
Quintil de riqueza:<br />
Mais baixo 95% 91%<br />
Segundo 87% 65%<br />
Médio 60% 41%<br />
Quarto 36% 33%<br />
Mais elevado 13% 5%<br />
Fonte: <strong>UNICEF</strong>, Trends in Child Poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivations-based approach, Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Maputo, 2009.<br />
• l São vincadas as disparidades na<br />
prevalência do HIV e no acesso a serviços<br />
de prevenção e tratamento entre as<br />
províncias e regiões do país, havendo<br />
mais elevada prevalência e tratamento no<br />
sul. A prevalência de HIV varia entre 25<br />
por cento em Gaza, no sul, e 4 por cento<br />
em Niassa, no norte; 41<br />
• l Apenas três por cento das crianças<br />
em Gaza sofreram privação severa de<br />
educação em 2008, em comparação com<br />
22 por cento em Tete, 15 por cento em<br />
Niassa e 12 por cento na Zambézia. 42<br />
3.1. Disparidades nas dotações<br />
orçamentais<br />
Em A pobreza na Infância em Moçambique:<br />
Uma Análise da Situação e das Tendências<br />
2006, de sua autoria, o <strong>UNICEF</strong> constatou<br />
ser particularmente notório que as dotações<br />
do Orçamento do Estado para sectoreschave<br />
muitas vezes não correspondem ao<br />
padrão dos indicadores de desenvolvimento<br />
infantil, recomendando a necessária revisão,<br />
baseada em evidências, dos critérios<br />
utilizados para alocar fundos do orçamento<br />
do Estado e alcançar uma distribuição mais<br />
equitativa. Um estudo recente aprofundou<br />
esta questão das províncias menos<br />
desenvolvidas receberem uma mais baixa<br />
dotação do orçamento do estado do que<br />
outras províncias mais desenvolvidas. 43<br />
O estudo confirma a percepção de<br />
desigualdade e reporta que os padrões<br />
provinciais de atribuição de financiamento<br />
observados são fortemente indicativos de<br />
uma desigual distribuição geográfica de<br />
recursos, com as províncias mais populosas<br />
de Nampula e Zambézia recebendo<br />
sistematicamente menos do que deveriam<br />
com base no tamanho das suas populações.<br />
Por exemplo, em 2008, a despesa per capita<br />
na Zambézia foi de 69 por cento da média<br />
nacional para a saúde e 73 por cento da<br />
média na educação 2008. 44<br />
As disparidades provinciais nas dotações<br />
orçamentais não se têm reduzido nos<br />
últimos anos. Como pode ser observado<br />
na Figura 6.3 abaixo, a despesa per capita<br />
aumentou de 2005 a 2008, mas as dotações<br />
provinciais relativas permaneceram<br />
razoavelmente constantes. A dotação per<br />
capita é mais elevada nas províncias do Sul<br />
algumas interessantes constatações. Para a<br />
maioria das províncias nas regiões norte e<br />
centro do país, os níveis de pobreza medidos<br />
com os dois métodos são bastante similares.<br />
No entanto, no sul do país, o índice de<br />
incidência da pobreza é muito maior que a<br />
percentagem de crianças com duas ou mais<br />
privações severas. Verifica-se essa diferença<br />
porque a abordagem baseada em privações<br />
incorpora uma medida de acesso aos<br />
serviços sociais básicos, incluindo saúde,<br />
educação, água e saneamento, enquanto<br />
a incidência da pobreza não captura<br />
directamente esses aspectos.<br />
Uma análise da percentagem de crianças<br />
que enfrentam cada uma das privações<br />
revela também um padrão de disparidade<br />
entre as províncias. Tais resultados são<br />
apresentados mais pormenorizadamente nos<br />
capítulos deste relatório correspondentes a<br />
cada sector, resumindo-se ao seguinte:<br />
• l Os níveis de privação nutricional severa<br />
são mais elevados nas províncias do<br />
Norte, seguindo-se as do centro e, na<br />
mais baixa posição, as províncias do sul; 38<br />
• l Além de disparidades entre as zonas<br />
urbanas e as rurais no acesso a serviços<br />
de saneamento, existem também grandes<br />
disparidades entre as províncias. Na<br />
Zambézia, 73 por cento das crianças<br />
vivem com privações severas de<br />
saneamento, comparativamente a menos<br />
de um por cento na Cidade de Maputo; 39<br />
• l Também se podem verificar disparidades<br />
provinciais em relação à privação de<br />
saúde. Cinco por cento das crianças na<br />
Cidade de Maputo sofrem privação severa<br />
de saúde, em comparação com 19 por<br />
cento na Zambézia e em Nampula; 40<br />
Figura 6.3: Despesa per capita combinada para saúde, educação e justiça, 2005, 2006 e 2008<br />
capita (MZN)<br />
Despesa per<br />
1200<br />
1000<br />
800<br />
600<br />
400<br />
200<br />
0<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
2005 2006 2008<br />
Gaza<br />
Maputo Maputo<br />
Província Cidade<br />
Fonte: Sal e Caldeira e Ximango Consultores, ‘Análise do Impacto da Estrutura das Despesas sobre o Desenvolvimento Económico e<br />
as Condições de Vida em Moçambique,’ Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação, 2009.<br />
190<br />
191
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
do que no centro e no norte do país. É de<br />
notar que o custo da prestação de serviços<br />
não é igual nas diferentes províncias.<br />
Nas áreas rurais, os custos per capita são<br />
geralmente mais elevados.<br />
Os sectores e os ministérios tendem<br />
a planificar as suas actividades e,<br />
consequentemente, a afectar os seus<br />
fundos de acordo com importantes temas,<br />
programas e projectos que abarcam<br />
várias províncias, ao invés de planificarem<br />
intervenções por província. Como resultado,<br />
os fundos administrados centralmente<br />
não são explicitamente atribuídos e<br />
contabilizados numa base provincial, o que<br />
dificulta a quantificação do total de fundos<br />
recebido a nível de província. As despesas<br />
correntes, entre as quais os salários, revelam<br />
geralmente uma estreita concordância entre<br />
as contas centrais e os relatóri os financeiros<br />
provinciais e sectoriais. Muito mais variação<br />
se observa com relação aos gastos de<br />
investimento.<br />
3.2. Disparidades na saúde<br />
Há grandes disparidades na despesa de<br />
saúde per capita por província. A Zambézia<br />
recebe a menor distribuição per capita, 60<br />
por cento da média nacional, enquanto<br />
Niassa recebe 156 por cento. A Zambézia<br />
tem o pior desempenho com relação a<br />
muitos indicadores de resultados de saúde<br />
infantil.<br />
Mortalidade infantil<br />
Existem diferenças significativas nas taxas<br />
provinciais de mortalidade de menores de<br />
cinco. As taxas mais elevadas registam-se<br />
na Zambézia (206 mortes por mil nascidos<br />
vivos) e Cabo Delgado (181 mortes por<br />
1.000 nados vivos). Tete tem a terceira mais<br />
elevada taxa de mortalidade de menores<br />
de cinco, com 175 por mil nados vivos.<br />
A Província de Maputo e a Cidade de<br />
Maputo reportam as mais baixas taxas de<br />
mortalidade de menores de cinco anos (103<br />
e 109, respectivamente. 45 Uma comparação<br />
da taxa de sobrevivência infantil com os<br />
gastos com saúde por província revela uma<br />
correlação significativa. Províncias com<br />
baixas despesas de saúde também tendem a<br />
ter baixas taxas de sobrevivência infantil (ver<br />
Figura 6.5).<br />
A cobertura de cuidados pré-natais varia<br />
entre as províncias, com um intervalo que<br />
vai de 81 por cento, na Zambézia, a uma<br />
cobertura universal em Gaza e na Cidade de<br />
Maputo. A percentagem de partos atendidos<br />
por um agente qualificado também varia<br />
entre as províncias. As províncias com<br />
menor percentagem de partos assistidos por<br />
um agente qualificado foram Manica (33 por<br />
cento) e Zambézia (38 por cento). 46<br />
HIV e SIDA<br />
A prevalência de HIV apresenta também<br />
fortes disparidades geográficas, com as<br />
maiores taxas registadas nas províncias<br />
do sul de Gaza e Maputo (25,1 e 19,8 por<br />
cento, respectivamente) e as menores<br />
nas províncias de Niassa, Nampula e<br />
Figura 6.5: Despesa per capita na saúde (2008) e sobrevivência da criança (1998-2008)<br />
Child survival rate (10 year average)<br />
920<br />
900<br />
880<br />
860<br />
840<br />
820<br />
800<br />
780<br />
760<br />
740<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
Taxa de sobrevivência infantil<br />
Cabo Delgado (3,7; 4,6 e 9,4 por cento,<br />
respectivamente) (ver Figura 6.6).<br />
São grandes as disparidades geográficas na<br />
percentagem de mulheres que receberam<br />
aconselhamento sobre o HIV integrado na<br />
sua consulta pré-natal, variando de apenas<br />
28 por cento na Zambézia a 94 por cento<br />
na Cidade de Maputo. A percentagem<br />
de mulheres com teste de HIV em 2008<br />
também variou consideravelmente entre as<br />
províncias, com apenas 19 por cento das<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Gaza<br />
Maputo<br />
Província<br />
Despesa de saúde per capita<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
Fonte: Sal e Caldeira e Ximango Consultores, ‘Análise do Impacto da Estrutura das Despesas sobre o Desenvolvimento<br />
Económico e as Condições de Vida em Moçambique,’ Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação, 2009 e MICS 2008.<br />
180<br />
160<br />
140<br />
120<br />
100<br />
80<br />
60<br />
40<br />
20<br />
0<br />
Despesa per capita (Mzn)<br />
Figura 6.4: Despesa de saúde per capita, percentagem da média nacional, 2008<br />
160%<br />
140%<br />
120%<br />
100%<br />
80%<br />
60%<br />
40%<br />
20%<br />
0%<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
Gaza<br />
Maputo<br />
Província<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
Figura 6.6: Prevalência de HIV por província, 2009<br />
35%<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
3% 4% 6% 3%<br />
Niassa<br />
8% 6%<br />
10% 9% 10%<br />
6%<br />
15%<br />
9%<br />
16% 15%<br />
18%<br />
Mulheres15-49 <strong>Home</strong>ns 15-49<br />
13%<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Nampula<br />
Tete Cabo Inhambane<br />
Zambezia<br />
Manica Sofala<br />
Delgado<br />
20%20% 21% 12%<br />
Maputo<br />
Província<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
30%<br />
17%<br />
Gaza<br />
Fonte: Sal e Caldeira e Ximango Consultores, ‘Análise do Impacto da Estrutura das Despesas sobre o Desenvolvimento Económico e<br />
as Condições de Vida em Moçambique,’ Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação, 2009.<br />
Fonte: Instituto Nacional de Estatística, Ministério da Saúde, ‘Inquérito Nacional de Prevalência. Riscos Comportamentais e<br />
Informação sobre o HIV e SIDA em Moçambique (INSIDA), Relatório Preliminar sobre a Prevalência da Infecção por HIV, 2009.<br />
192<br />
193
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Figura 6.7: Percentagem de mulheres que receberam informação sobre o HIV e fizeram teste em consultas de<br />
cuidados pré-natais, 2008<br />
100%<br />
80%<br />
60%<br />
40%<br />
20%<br />
60%<br />
29%<br />
49%<br />
34%<br />
52%<br />
31% 28%<br />
19%<br />
52%<br />
39%<br />
73% 68% 85% 74% 69%<br />
61%<br />
79%<br />
72% 91% 86% 96% 97% 59%<br />
47%<br />
Figura 6.8: Despesa per capita na educação, percentagem da média nacional, 2008<br />
180%<br />
160%<br />
140%<br />
120%<br />
100%<br />
80%<br />
0%<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Gaza<br />
Maputo Maputo<br />
Província Cidade<br />
Total<br />
60%<br />
40%<br />
Receberam informação sobre a prevenção do HIV em consulta pré-natal<br />
20%<br />
Fizeram teste de HIV em consulta pré-natal<br />
Fonte: Instituto Nacional de Estatística. ‘Inquérito de Indicadores Múltiplos 2008. Sumário’, Maputo, Moçambique, 2008.<br />
0%<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambezia<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Gaza<br />
Maputo<br />
Province<br />
Maputo<br />
City<br />
mulheres grávidas testadas na Zambézia,<br />
em comparação com 95 por cento na Cidade<br />
de Maputo. Quarenta e três por cento das<br />
mulheres receberam os seus resultados. 47<br />
Em 2006, 68 por cento do total de crianças<br />
que receberam tratamento para a SIDA viviam<br />
nas quatro províncias do sul do país, e 55<br />
por cento na Cidade de Maputo. Em 2008, as<br />
províncias do sul foram responsáveis por 56<br />
por cento de todas as crianças que receberam<br />
medicamentos anti-retrovirais, e a Cidade<br />
de Maputo por 33 por cento. A distribuição<br />
geográfica das crianças com acesso ao<br />
tratamento ainda é bastante desigual: na<br />
região sul do país, cerca de metade das que<br />
necessitam de tratamento anti-retroviral<br />
conseguem ter-lhe acesso, enquanto nas<br />
regiões centro e norte é muito maior a<br />
percentagem de necessidades não satisfeitas.<br />
e Nampula recebem a mais baixa dotação<br />
de fundos (ver Figura 6.8). Uma vez mais<br />
as províncias do centro e do norte recebem<br />
uma dotação substancialmente menor que<br />
as províncias do sul. 48<br />
As províncias do centro e do norte recebem<br />
mais baixa dotação orçamental e têm<br />
mais baixos resultados na educação do<br />
que as províncias do sul. Os resultados<br />
educacionais em termos de alfabetização<br />
estão intimamente relacionados com as<br />
despesas per capita da educação (ver Figura<br />
6.9). As taxas de alfabetização das mulheres<br />
variam consideravelmente por província, de<br />
84 por cento na Cidade de Maputo a menos<br />
de 50 por cento em Cabo Delgado, Zambézia<br />
e Nampula. Às três últimas províncias cabem<br />
também os mais baixos níveis de despesa<br />
com a educação.<br />
Fonte: Sal e Caldeira e Ximango Consultores, ‘Análise do Impacto da Estrutura das Despesas sobre o Desenvolvimento Económico e<br />
as Condições de Vida em Moçambique,’ Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação, 2009 e MICS 2008.<br />
Figura 6.9: Despesa per capita na Educação e taxas de alfabetização, 2008<br />
Despesa per capita (Mtn)<br />
900<br />
800<br />
700<br />
600<br />
500<br />
400<br />
300<br />
200<br />
100<br />
0<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambezia<br />
Despesa per capita<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Gaza<br />
Maputo Maputo<br />
Província Cidade<br />
Taxas de alfabetização<br />
90<br />
80<br />
70<br />
60<br />
50<br />
40<br />
30<br />
20<br />
10<br />
0<br />
Taxa de alfabetização<br />
3.3. Disparidades no acesso à<br />
educação<br />
Uma análise da despesa de educação per<br />
capita revela uma situação semelhante à da<br />
despesa de saúde. As províncias da Zambézia<br />
Embora o rácio bruto de escolarização ii de<br />
2008 para a primeira fase do ensino primário<br />
(EP1) tenha ultrapassado os 100 por cento<br />
independentemente da região, província<br />
ou género, a taxa bruta de escolarização<br />
na segunda fase do ensino primário (EP2)<br />
revela fortes disparidades geográficas. Na<br />
ii O rácio bruto de escolarização é a percentagem de crianças de qualquer idade a frequentar a última classe de<br />
determinado nível de educação. Um rácio superior a 100 por cento indica crianças ‘acima da idade’.<br />
Fonte: Sal e Caldeira e Ximango Consultores, ‘Análise do Impacto da Estrutura das Despesas sobre o Desenvolvimento Económico e<br />
as Condições de Vida em Moçambique,’ Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação, 2009 e MICS 2008.<br />
Cidade de Maputo e na província de Maputo,<br />
que registaram os mais elevados níveis de<br />
matrículas, o rácio bruto de escolarização<br />
das raparigas no EP2 excedeu o dos rapazes.<br />
Outras províncias registaram rácios brutos<br />
de escolarização inferiores a 100 por cento<br />
no EP2, sendo, na maioria delas, o das<br />
meninas inferiores aos dos rapazes. A nível<br />
regional, as províncias com mais baixos<br />
rácios brutos de escolarização no EP2 e as<br />
maiores diferenças de género foram as das<br />
regiões norte e centro do país.<br />
194<br />
195
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Figura 6.10: Rácio líquido de escolarização no ensino primário (EP1 & EP2) por província, 2008<br />
100%<br />
80%<br />
60%<br />
40%<br />
20%<br />
0%<br />
Niassa<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
79% 78% 75% 74% 74%73%<br />
85% 81%<br />
70% 67%<br />
87% 83%<br />
87%77%<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambezia<br />
Diferenças regionais semelhantes são<br />
observadas nos rácios de escolarização.<br />
Embora o rácio líquido de escolarização<br />
para o EP1 seja superior a 80 por cento em<br />
cada província, há diferenças provinciais<br />
significativas a nível do EP2. A Cidade de<br />
Maputo é a área com melhor desempenho,<br />
com 43 por cento de escolarização líquida no<br />
EP2 nos rapazes e 57 por cento nas raparigas.<br />
Cabo Delgado, Nampula, Niassa e Zambézia<br />
estão entre as províncias com os piores<br />
desempenhos, tendo cada uma delas um rácio<br />
de escolarização líquida inferior a 15 por cento.<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Meninas<br />
Rapazes<br />
90% 93% 93% 95% 94% 97% 95%<br />
89%<br />
Gaza<br />
Maputo<br />
Província<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
3.4. Disparidades na protecção<br />
da criança<br />
Há grandes disparidades geográficas no<br />
registo de nascimento. Também aqui<br />
as províncias do centro e do norte se<br />
encontram em muito pior situação do que<br />
o sul. Trinta e nove por cento das crianças<br />
menores de cinco anos tiveram seus<br />
nascimentos registados em áreas urbanas,<br />
em comparação com 28 por cento nas zonas<br />
rurais. E 47 por cento das crianças menores<br />
de cinco anos estão registadas na Cidade de<br />
Maputo, enquanto apenas 11 por cento estão<br />
registadas em Tete. 49<br />
Também existem disparidades regionais nas<br />
atitudes para com a violência doméstica.<br />
Por exemplo, a percentagem de mulheres<br />
que consideram que bater na esposa se<br />
justifica em determinadas circunstâncias<br />
varia de 10 por cento na Cidade de Maputo<br />
a quase 70 por cento em Niassa. 50 Um<br />
estudo do Ministério da Mulher e Acção<br />
Social concluiu que essas diferenças estão<br />
fortemente relacionadas com as normas<br />
e práticas socioculturais, bem como com<br />
a falta de escolarização e conhecimento<br />
sobre os direitos das mulheres e crianças na<br />
sociedade. 51 A educação é um factor-chave<br />
na redução da violência contra a criança e a<br />
mulher.<br />
Os dados do MICS 2008 mostram haver<br />
uma diferença significativa nas taxas de<br />
casamento infantil entre o sul, o centro<br />
e o norte de Moçambique. As províncias<br />
do sul – Cidade de Maputo, província de<br />
Maputo, Gaza e Inhambane – têm uma taxa<br />
de casamentos infantis inferior a 10 por<br />
cento. As províncias do centro têm uma taxa<br />
média de 20 por cento, enquanto as duas<br />
províncias mais a norte – Niassa e Cabo<br />
Delgado – têm taxas de 24 e 30 por cento,<br />
respectivamente.<br />
3.5. Conclusões<br />
São evidentes e persistentes as disparidades<br />
provinciais em quase todos os indicadores<br />
de acesso e desempenho dos serviços<br />
sociais básicos. O padrão geral é, para as<br />
províncias do centro e do norte baixas<br />
dotações orçamentais, reduzido acesso<br />
a serviços e mais baixos resultados,<br />
comparativamente às províncias do sul. A<br />
província da Zambézia é frequentemente<br />
a que se encontra em piores condições na<br />
alocação de recursos e nos resultados de<br />
desenvolvimento. Este padrão geral invertese<br />
em relação à prevalência do HIV, com<br />
Figura 6.11: Percentagem de mulheres com 15-49 anos casadas ou em união antes completarem os 15 anos, 2008<br />
35%<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
24%<br />
30%<br />
21% 22%<br />
19%<br />
21%<br />
19%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
9% 9%<br />
Gaza<br />
6%<br />
Maputo<br />
Província<br />
4%<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
Fonte: MICS 2008<br />
196<br />
197
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
as províncias do sul reportando mais altos<br />
níveis de infecção, mas, em contrapartida,<br />
beneficiando também de maior acesso a<br />
serviços de prevenção e tratamento.<br />
Estas disparidades geográficas observadas<br />
em Moçambique provêm de padrões<br />
de assentamento e colonização iniciais<br />
que resultaram em diferenças culturais,<br />
religiosas e linguísticas entre as províncias;<br />
da natureza centralizada e deliberadamente<br />
discriminatória da administração<br />
portuguesa durante o período colonial;<br />
e da falta de um sistema de alocação<br />
de recursos do Estado às províncias<br />
baseado em critérios relacionados com<br />
a situação do desenvolvimento humano.<br />
Além disso, a falta de infra-estruturas<br />
rodoviárias e ferroviárias, incluindo a<br />
ausência (até recentemente) de uma ponte<br />
sobre o rio Zambeze, bem como fraco<br />
acesso aos mercados das zonas rurais em<br />
muitas partes da região centro e norte de<br />
Moçambique também contribuíram para as<br />
diferenças socioeconómicas provinciais no<br />
desenvolvimento económico.<br />
4. HIV e SIDA<br />
A vulnerabilidade de um país aos efeitos<br />
de doenças infecciosas, incluindo HIV e a<br />
SIDA, depende em grande medida do nível<br />
de desenvolvimento humano alcançado<br />
pelo país. Os indivíduos e a sociedade<br />
como um todo estão mais capazes de se<br />
proteger contra o impacto das doenças<br />
nos países desenvolvidos, o que se explica<br />
pelos limitados recursos financeiros a<br />
nível nacional e familiar nos países em<br />
desenvolvimento, bem como pelo reduzido<br />
capital humano de que dispõem devido<br />
à falta de oportunidades de educação e<br />
falta de acesso a outros serviços sociais<br />
básicos. Nos países em desenvolvimento, as<br />
doenças endémicas afectam negativamente<br />
o desenvolvimento e impedem a realização<br />
dos direitos humanos, como se pode ver em<br />
indicadores básicos como esperança de vida<br />
ao nascer, mortalidade infantil, frequência<br />
escolar, alfabetização e rendimento familiar,<br />
entre outros. 52<br />
É ao nível da família e da comunidade que<br />
mais se fará sentir o impacto da pandemia<br />
da SIDA. Doença e morte nos principais<br />
provedores num agregado familiar terão<br />
um impacto negativo sobre toda a família,<br />
acabando por elevar o nível de dependência<br />
de toda a população, pois outros agregados<br />
familiares, incluindo os chefiados por<br />
pessoas idosas que são, elas próprias,<br />
dependentes, assumirão a responsabilidade<br />
de cuidar do crescente número de crianças<br />
órfãs e vulneráveis. Através dos seus efeitos<br />
sobre o número de professores formados,<br />
profissionais de saúde e outros provedores,<br />
a SIDA afecta também os mecanismos<br />
de geração de capital humano futuro.<br />
Prevêem-se graves implicações estruturais<br />
da mortalidade relacionada com o HIV nos<br />
serviços públicos. A mortalidade e longos<br />
períodos de doença nos funcionários<br />
reduzirão a produtividade, aumentarão o<br />
absenteísmo e obrigarão as autoridades<br />
competentes a substituir pessoal perdido ou<br />
a operar com menos funcionários.<br />
A Comissão para o HIV/SIDA e Governação<br />
em África reconhece três generalizações<br />
sobre o impacto da SIDA nas famílias e nos<br />
agregados familiares: 53<br />
• l A presença da SIDA numa casa traduzse<br />
rapidamente em esgotamento da<br />
capacidade de geração de rendimento<br />
do agregado familiar e das poupanças<br />
e bens da família. Muitas famílias<br />
passam rapidamente para uma situação<br />
de pobreza: muito baixo rendimento<br />
ou posse material, dívida, redução do<br />
acesso a serviços, e ainda menos opções<br />
para conseguir alcançar segurança<br />
socioeconómica. As mulheres e as<br />
meninas tendem a ser as mais afectadas;<br />
• l A SIDA agrava e é agravada por<br />
condições económicas. Não é, por si só,<br />
uma condição, mas existe num contexto<br />
socioeconómico que torna mais profunda<br />
a vulnerabilidade das famílias, das<br />
comunidades e das nações;<br />
• l Os custos económicos da SIDA, o<br />
estigma em torno da doença, que leva<br />
a discriminação e afastamento, bem<br />
como a impossibilidade de acesso a<br />
serviços sociais combinam-se, ampliando<br />
as desigualdades socioeconómicas na<br />
sociedade. A SIDA não está apenas a<br />
matar pessoas, está também a dividir as<br />
sociedades nacionais.<br />
4.1. Perfil da epidemia do HIV<br />
em Moçambique<br />
De acordo com estimativas e projecções<br />
baseadas nos resultados de 2007, mais de<br />
1,7 milhões de moçambicanos viviam com<br />
HIV em 2010, cinquenta e cinco por cento<br />
dos quais eram mulheres, nove por cento<br />
(quase 150.000) eram crianças menores de<br />
15 anos, e cinco por cento eram crianças<br />
com menos de cinco anos. 54 O Governo de<br />
Moçambique deverá divulgar no último<br />
198<br />
199
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
trimestre de 2010 estimativas populacionais<br />
actualizadas baseadas em dados de<br />
prevalência do Inquérito Nacional Serocomportamental<br />
do HIV/SIDA realizado em<br />
2009.<br />
A evolução da epidemia em Moçambique<br />
tem sido moldada por vários factores.<br />
Na sua fase incipiente, assumiu-se que<br />
a prevalência era menor que nos países<br />
vizinhos (embora houvesse escassez de<br />
dados na época) pelo facto de o conflito<br />
civil que teve lugar de 1975 a 1992 ter<br />
mantido Moçambique um pouco isolado<br />
dos seus vizinhos. A cessação da violência<br />
e a assinatura de um Acordo de Paz em<br />
1992 foram acompanhados por movimentos<br />
populacionais em massa, pois as pessoas<br />
regressavam de outras partes do país ou<br />
dos países vizinhos às casas de origem,<br />
aumentando a vulnerabilidade à infecção<br />
e as oportunidades de transmissão do<br />
vírus. Devido à sua localização geográfica,<br />
Moçambique é um importante eixo de<br />
transporte de mercadorias para os portos de<br />
Maputo, Beira e Nacala e em trânsito para<br />
países vizinhos sem saída para o mar.<br />
A fraca cobertura dos serviços sociais<br />
básicos, especialmente de saúde e<br />
educação, contribuiu para a propagação da<br />
epidemia no período imediatamente após<br />
a cessação das hostilidades. A pobreza, a<br />
discriminação, a opressão, o analfabetismo,<br />
a mobilidade, ou a migração de pessoas,<br />
o estatuto das mulheres, os níveis de<br />
urbanização, os níveis de violência, o acesso<br />
a cuidados de saúde, e a distribuição da<br />
riqueza, entre outros, todos estes factores<br />
podem ter contribuído para a propagação<br />
da epidemia em Moçambique. Diversos<br />
estudos não encontraram nenhuma ligação<br />
clara entre a infecção pelo HIV e a riqueza. A<br />
pobreza pode mesmo reduzir a propagação<br />
da epidemia, por exemplo se as pessoas<br />
têm menos dinheiro para gastar em<br />
relacionamentos transacionais. O Inquérito<br />
Nacional sobre o HIV de 2009 mostrou que<br />
a prevalência do HIV em Moçambique é<br />
maior entre a população, em especial entre<br />
as mulheres, do quintil mais elevado. As<br />
mulheres, especialmente as que vivem em<br />
áreas rurais, são especialmente vulneráveis<br />
por estarem legal, cultural e socialmente<br />
em desvantagem em relação aos homens.<br />
Muitas mulheres estiveram expostas ao risco<br />
de violência sexual ou estupro ou outras<br />
formas de violência. 55<br />
As relações heterossexuais continuam a ser<br />
a forma mais comum de transmissão do<br />
HIV no país. Estima-se que cerca de 90 por<br />
cento das infecções pelo HIV ocorram por<br />
esta via. Sexo entre pessoas de diferentes<br />
gerações, actividade sexual casual sem<br />
protecção, falta de circuncisão masculina,<br />
múltiplos parceiros sexuais em simultâneo<br />
e baixo uso de preservativos são hipóteses<br />
que se colocam de situações que favorecem<br />
a propagação da epidemia. 56 Estima-se, no<br />
entanto, que uma substancial percentagem<br />
(47 por cento) de novas infecções se<br />
dêem em indivíduos que relatam estar em<br />
relacionamento monogâmico. 57<br />
Estima-se que em Moçambique tenham<br />
morrido 96.000 pessoas com SIDA em<br />
2009. A SIDA está a tornar-se rapidamente<br />
uma das principais causas de morte nas<br />
crianças, calculando-se que em 2009 tenham<br />
morrido 18.000 crianças menores de cinco<br />
anos e 21 mil menores de 15 anos. 58 Dados<br />
do Estudo Nacional sobre a Mortalidade<br />
Infantil 2009 indicam que a SIDA era uma<br />
das quatro condições que mais contribuíam<br />
para a mortalidade de crianças menores de<br />
cinco anos em Moçambique, representando<br />
quase 10 por cento de todas as mortes nesse<br />
grupo. 59<br />
A SIDA é uma causa comum de morte de<br />
crianças menores de cinco anos nas áreas<br />
urbanas. 60 Estima-se que 18 por cento das<br />
mortes de crianças em Maputo e 16 por<br />
cento das mortes de crianças na província<br />
de Gaza se devam à SIDA. Estes números<br />
podem estar subestimados, já que a SIDA,<br />
em muitas situações, pode ser a causa<br />
básica de morte em casos em que outras<br />
infecções oportunistas foram registadas<br />
como causa directa de morte.<br />
O Inquérito Nacional sobre o HIV/SIDA 2009<br />
(INSIDA) revela uma prevalência nacional<br />
Figura 6.12: Distribuição de novas infecções por modo de exposição em Moçambique, 2008<br />
Relacionadas com<br />
comportamentos de<br />
múltiplos parceiros 24%<br />
Parceiros de<br />
pessoas<br />
com MP 18%<br />
Múltiplos parceiros<br />
(MPs) 6%<br />
Um parceiro sexual 47,3%<br />
Mulheres parceiras<br />
de homens que fazem<br />
sexo com homens 0,1%<br />
<strong>Home</strong>ns que<br />
fazem sexo<br />
com homens 5,1%<br />
Trabalhadores<br />
de sexo 2%<br />
Clientes 7%<br />
Parceiros de clientes 10%<br />
Injecções Médicas 1,7%<br />
Transfusões de sangue 0,1%<br />
Uso de drogas injectáveis (UDI) 3%<br />
Parceiros UDI 0,3%<br />
Relacionadas com<br />
trabalho de sexo<br />
19%<br />
Fonte: Joint United Nations Programme on HIV and SIDA, <strong>Mozambique</strong> Modes of HIV Transmission and HIV Prevention Study,<br />
UNAIDS, Geneva, 2009..<br />
de HIV de 11,5 por cento entre os 15 e os 49<br />
anos de idade. A prevalência desagregada<br />
por região confirmou a situação emergente<br />
na vigilância sentinela anterior, com maior<br />
prevalência no sul (17,8 por cento), seguida<br />
pelo centro (12,5 por cento). A região Norte<br />
apresenta uma prevalência muito mais<br />
baixa (5,6 por cento). A prevalência urbana<br />
de HIV, que se situa em 15,9 por cento, é<br />
significativamente superior à prevalência<br />
nas áreas rurais (9,2 por cento), em todas as<br />
regiões. 61<br />
O INSIDA revela também que a prevalência<br />
do HIV tanto na população masculina como<br />
na feminina aumenta com a idade, atingindo<br />
o pico nas mulheres de 25-29 anos (16,8<br />
por cento) e, nos homens, aos 35-39 anos<br />
de idade (14,2 por cento). Acresce que as<br />
raparigas têm uma prevalência três vezes<br />
superior à dos rapazes da mesma idade (11,1<br />
por cento nas raparigas com 15-25 anos de<br />
idade, contra 3,7 por cento nos rapazes da<br />
mesma idade). Esses resultados destacam<br />
a maior vulnerabilidade dos adolescentes e<br />
jovens ao HIV em Moçambique.<br />
Presentemente só é possível analisarem-se<br />
as tendências pela observação da prevalência<br />
do HIV obtida na vigilância epidemiológica de<br />
2004 e 2007, uma vez que as informações do<br />
INSIDA seguem uma metodologia diferente,<br />
não sendo, portanto, comparáveis.<br />
A prevalência do HIV caiu acentuadamente<br />
nas jovens que frequentaram cuidados prénatais<br />
entre os inquéritos epidemiológicos<br />
de 2004 e 2007, mas tal tendência<br />
decrescente não se confirmou em 2009. 62 Em<br />
países com epidemias generalizadas onde<br />
a transmissão do HIV se faz principalmente<br />
através de relações heterossexuais, como<br />
acontece com Moçambique, as tendências<br />
na prevalência em jovens do sexo feminino<br />
de15-24 anos podem ser usadas para<br />
determinar as tendências de incidência<br />
200<br />
201
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
(novas infecções). iii 63 A prevalência do HIV<br />
em frequentadores de cuidados pré-natais<br />
de 15-24 anos atingiu o pico em 2004, nos<br />
16 por cento, apresentando uma diminuição<br />
significativa em 2007 para 11 por cento. Em<br />
2009, no mesmo grupo, a prevalência foi<br />
estimada em 12 por cento. 64 A nível nacional,<br />
não se verificou redução significativa na<br />
prevalência do HIV no período de 2002-2009<br />
nas mulheres de 15-24 anos. Nesta faixa<br />
etária, a região Norte apresentou a menor<br />
taxa de prevalência do país. Em 2009, as<br />
áreas urbanas registaram mais elevadas<br />
taxas de prevalência na mesma faixa etária<br />
do que as áreas rurais. 65<br />
A prevalência reflecte tanto a incidência de<br />
uma doença (ou seja, o número de novos<br />
casos), como a longa e variável incubação<br />
do HIV. Com melhorias na provisão de<br />
terapia anti-retroviral, as pessoas infectadas<br />
com o HIV conseguem ter vidas mais longas,<br />
permanecendo mais saudáveis. As taxas<br />
de prevalência podem, portanto, aumentar,<br />
mesmo estando em queda as taxas de novas<br />
infecções. Com apenas uma medida de<br />
prevalência, é difícil determinar se o número<br />
de novos casos está a aumentar, a diminuir<br />
ou se atingiu um patamar e estabilizou.<br />
Torna-se, portanto, fundamental uma análise<br />
da incidência do HIV para responder a<br />
esta questão, sabendo-se, no entanto, que<br />
todos os métodos usados para determinar a<br />
incidência do HIV têm desvantagens. iv<br />
A análise Spectrum dos dados de vigilância<br />
de 2007 estimou que a incidência anual do<br />
HIV em adultos diminuiu de cerca de 2,2 por<br />
cento em 2000 para cerca de 1,6 por cento<br />
em 2008. Isso traduz-se em 129.000 novas<br />
infecções pelo HIV em adultos em 2008. A<br />
incidência anual estimada é de cerca de 2 por<br />
cento nas regiões centro e sul e muito mais<br />
baixa no norte, rondando os 0,7 por cento.<br />
Segundo estimativas, a incidência do HIV<br />
em crianças menores de 15 anos também<br />
tem vindo a diminuir, de cerca de 38.500<br />
novas infecções em 2005 para cerca de<br />
31.000 em 2009, equivalente a cerca de<br />
85 novas infecções por dia. Esta redução<br />
é principalmente atribuída à expansão da<br />
implantação do Programa de Prevenção<br />
da Transmissão Vertical (PTV) (prevenção<br />
de infecções em recém-nascidos) e do<br />
programa de terapia anti-retroviral (redução<br />
da infecciosidade de mulheres grávidas e a<br />
amamentar em tratamento anti-retroviral). O<br />
principal fardo de novas infecções ocorre na<br />
região centro, que em 2009 representou 60<br />
por cento do total nacional de novos casos.<br />
Tal facto é devido a alta prevalência do HIV,<br />
relativamente baixa cobertura de serviços de<br />
prevenção da transmissão vertical, grande<br />
população e elevada taxa de fertilidade. 66<br />
Como a epidemia do HIV está<br />
principalmente concentrada na parcela<br />
economicamente activa da população, ou<br />
seja, nos que têm entre 15 e 49 anos, os seus<br />
efeitos são desproporcionalmente sentidos<br />
pelos grupos de idade que desempenham<br />
um papel fundamental no desenvolvimento<br />
da economia e dos sectores sociais do país.<br />
Um estudo de simulação realizado em 2002<br />
e baseado em dois cenários (um com SIDA,<br />
outro sem SIDA) concluiu que o HIV e a SIDA<br />
poderiam ter um amplo impacto económico<br />
em Moçambique, com uma visível redução<br />
no crescimento do PIB per capita. 67<br />
De acordo com projecções para o período<br />
2000-2010, a epidemia de HIV resultará<br />
numa perda de cerca de 17 por cento dos<br />
iii Como a maioria dos jovens nesse grupo de idades terão dado início à sua actividade sexual, mudanças na prevalência<br />
nesta faixa etária podem representar mudanças no número de infecções recentes.<br />
iv Obtêm-se dados de incidência reais através de estudos de coorte em grande escala. Embora os dados de incidência<br />
sejam melhores do que os dados de prevalência para monitoria da epidemia de HIV, esses estudos apresentam<br />
desvantagens, entre as quais o custo, considerações éticas, desvios de participação e/ou de selecção e o facto de os<br />
incluídos num coorte virem a ter, inevitavelmente, maior exposição às intervenções no âmbito do HIV. Outros métodos<br />
são também utilizados para estimar a incidência, nomeadamente: estimativas indirectas de incidência de HIV, métodos<br />
laboratoriais e modelação matemática da incidência do HIV.<br />
Figura 6.13: Incidência e prevalência de HIV estimada por região em Moçambique, 1998–2010<br />
20%<br />
18%<br />
16%<br />
14%<br />
12%<br />
10%<br />
8%<br />
6%<br />
4%<br />
2%<br />
0%<br />
1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010<br />
Prevalência (S)<br />
Prevalência (C)<br />
Prevalência (N)<br />
Prevalência (Nac)<br />
Incidência (S)<br />
Incidência (C)<br />
Incidência (N)<br />
Incidência (Nac)<br />
Fonte: CNCS, UNAIDS e GAMET, ‘Draft <strong>Mozambique</strong> Analysis of Modes of HIV Transmission and National Response to HIV and SIDA,’<br />
Maputo, 2009.<br />
funcionários do sector de educação. É<br />
possível que a SIDA leve consigo cerca<br />
de 9.200 professores, de todos os níveis.<br />
Por cada trabalhador perdido no sector<br />
da educação, serão perdidos cerca de 18<br />
meses de tempo de trabalho produtivo. 68 A<br />
epidemia do HIV também tem consequências<br />
negativas para outros sectores dada a<br />
necessidade de se substituir e renovar força<br />
de trabalho qualificada.<br />
O sistema de saúde enfrenta dificuldades<br />
na resposta à crescente demanda dos seus<br />
serviços, agravada pelo efeito da epidemia<br />
do HIV nos seus trabalhadores. O HIV/SIDA<br />
fará provavelmente piorar os já precários<br />
rácios trabalhador de saúde por paciente<br />
e médico por paciente em Moçambique. O<br />
elevado número de pacientes em hospitais<br />
e unidades de saúde requerendo tratamento<br />
relativamente caro para a SIDA e infecções<br />
relacionadas representará também uma<br />
considerável factura para o sector da saúde.<br />
4.2. Acções prioritárias em prol<br />
das crianças no âmbito do<br />
HIV e da SIDA<br />
Moçambique adoptou a Declaração de<br />
Compromisso da Sessão Especial das<br />
Nações Unidas para o HIV e a SIDA de<br />
2001, que inclui acções prioritárias relativas<br />
a crianças e SIDA, depois designadas na<br />
campanha Juntos pelas Crianças, Juntos<br />
contra a SIDA de Quatro Ps: 69<br />
• l P1 – Prevenção primária<br />
• l P2 – Prevenção da transmissão vertical<br />
(PTV)<br />
• l P3 – SIDA pediátrico (Paedriatic AIDS)<br />
• l P4 – Protecção de crianças órfãs e<br />
vulneráveis (COV)<br />
Abordam-se nesta secção cada um dos<br />
quatro Ps.<br />
202<br />
203
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
4.3. P1 – Prevenção primária<br />
Os dados do MICS 2008 mostram uma<br />
tendência global positiva em conhecimento<br />
e consciência da transmissão e prevenção<br />
do HIV, em comparação com dados<br />
anteriores a partir do Inquérito Demográfico<br />
e de Saúde 2003. Melhor conhecimento,<br />
consciência e adopção de práticas seguras<br />
estão correlacionados com viver em área<br />
urbana, ter níveis de ensino mais elevados<br />
e pertencer a um mais elevado quintil de<br />
riqueza. Por exemplo, os dados demonstram<br />
uma melhoria no conhecimento que as<br />
mulheres têm sobre a SIDA e como o HIV<br />
é transmitido. Oitenta e um por cento das<br />
mulheres conhecem pelo menos uma das<br />
três principais formas de prevenção da<br />
infecção pelo HIV, e 13 por cento conhecem<br />
as três principais formas. Embora esse<br />
conhecimento seja geralmente baixo, é<br />
maior entre as mulheres que vivem em áreas<br />
urbanas (17 por cento) do que entre as que<br />
vivem em áreas rurais (10 por cento). Quase<br />
65 por cento das mulheres de 15-49 anos<br />
sabe que o uso do preservativo é uma forma<br />
de evitar a infecção pelo vírus. 70<br />
A percentagem de mulheres de 15-49<br />
anos que não aceitam as três principais<br />
concepções erróneas sobre o HIV e a SIDA<br />
tem crescido nos últimos anos. Quase três<br />
em cada quatro mulheres de 15-49 anos<br />
(72 por cento) sabe que o HIV não pode ser<br />
transmitido através de partilha de alimentos<br />
e que uma pessoa que pareça saudável pode<br />
estar infectada com o vírus, enquanto em<br />
2003 os números eram de 63 por cento e 45<br />
por cento, respectivamente. Da mesma forma,<br />
a percentagem de mulheres que sabem que<br />
o HIV não pode ser transmitido por picada de<br />
mosquito aumentou de 37 por cento em 2003<br />
para 64 por cento em 2008. 71<br />
Embora o conhecimento geral sobre o<br />
HIV e seus modos de transmissão tenha<br />
registado uma evolução positiva nos<br />
últimos cinco anos, muita margem ainda<br />
há para melhorias na prevenção real. Mais<br />
conhecimento não é prova de mudança de<br />
atitudes e comportamentos. Um exemplo<br />
é a discrepância entre saber onde se pode<br />
fazer um teste de HIV, 77 por cento das<br />
mulheres entrevistadas, e ter um teste de<br />
HIV, 31 por cento do mesmo grupo (ver<br />
Figura 6.14). As diferenças geográficas entre<br />
o conhecimento da disponibilidade de testes<br />
e a testagem real podem estar relacionadas<br />
com a disponibilidade de serviços de<br />
aconselhamento e testagem em todo o país,<br />
com maior disponibilidade no sul, seguido<br />
pelas regiões centro e norte. 72<br />
Figura 6.14: Identificação de concepções erróneas sobre o HIV, mulheres de 15-49 anos, 2008<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
47%<br />
1997<br />
Fonte: IDS 1997 e 2003, MICS 2008.<br />
63%<br />
45%<br />
37%<br />
72%<br />
72%<br />
2003 2008<br />
Uma pessoa aparentemente saudável não pode ter HIV<br />
O HIV não pode ser transmitido por partilha de comida<br />
O HIV não pode ser transmitido por picada de mosquito<br />
64%<br />
As mulheres em Moçambique tendem<br />
começar a ter relações sexuais numa idade<br />
relativamente precoce. A nível global, 29 por<br />
cento das mulheres de 15-19 anos teve a sua<br />
primeira relação sexual antes de completar<br />
os 15 anos, e 77 por cento das de 20-24 anos<br />
tiveram a primeira relação sexual antes de<br />
atingir os 18. A percentagem de mulheres<br />
entre os 15 e os 19 anos que referiram ter<br />
começado a ter relações sexuais antes dos<br />
15 anos é maior nas zonas rurais, situando-se<br />
em 32 por cento, do que nas áreas urbanas<br />
(24 por cento). Cerca de 16 por cento das<br />
mulheres sexualmente activas relataram ter<br />
tido relações sexuais com um homem 10 ou<br />
mais anos mais velho que elas nos 12 meses<br />
anteriores à entrevista. Estudos na África<br />
Austral constataram sistematicamente que, a<br />
uma maior disparidade de idade corresponde<br />
uma menor probabilidade de sexo seguro. 73<br />
Portanto, as relações sexuais entre homens<br />
mais velhos e mulheres mais jovens são uma<br />
possível explicação das diferentes taxas de<br />
infecção em adolescentes do sexo masculino<br />
e do sexo feminino.<br />
O uso do preservativo continua a ser<br />
relativamente baixo em Moçambique,<br />
especialmente nas áreas rurais e em<br />
mulheres menos instruídas. Apenas 44<br />
por cento das mulheres de 15-24 anos que<br />
tiveram nos últimos 12 meses relações<br />
sexuais com um parceiro não regular ou com<br />
Figura 6.15: Probabilidade de não uso de preservativo em relação sexual, mulheres de 15-24 anos, 2008<br />
Probabilidade de não uso de preservativo<br />
1<br />
-75<br />
-5<br />
15 17<br />
19 21 23 24<br />
age<br />
Fonte: Cálculos do <strong>UNICEF</strong> baseados no MICS 2008.<br />
Poligâmica<br />
que não coabitam usaram preservativo na<br />
última relação sexual. A percentagem foi<br />
mais elevada nas mulheres do quintil mais<br />
abastado (64 por cento) que nas mulheres<br />
das famílias mais pobres (12 por cento).<br />
Foi efectuada uma análise multivariada<br />
de regressão probabilística (utilizando o<br />
modelo probit) para examinar os factores<br />
correlacionados com a exposição das<br />
mulheres a comportamento sexual de risco.<br />
A variável dependente foi se tinha sido<br />
usado preservativo na última relação sexual<br />
da mulher com um parceiro com que não<br />
coabitava, uma vez que tal se considera<br />
um bom representante (proxy) de atitudes<br />
em relação a comportamento sexual de<br />
risco. A razão básica é que as mulheres<br />
que têm relações sexuais protegidas com<br />
um parceiro com que não coabitam estão<br />
menos dispostas a expor-se ao HIV e outras<br />
doenças de transmissão sexual.<br />
As mulheres que têm o ensino secundário<br />
ou superior são menos propensas a<br />
expor-se a riscos; este grupo apresenta<br />
uma probabilidade quase 50 por cento<br />
inferior de comportamentos de risco que<br />
as mulheres sem instrução. Ter apenas<br />
o ensino primário não parecem estar<br />
correlacionado com atitudes das mulheres<br />
em relação a comportamento sexual de<br />
risco. Surpreendentemente, o modelo<br />
mostra que as mulheres com conhecimento<br />
Monogâmica<br />
204<br />
205
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
correcto sobre a transmissão do HIV são<br />
tão propensas a ter relações sexuais<br />
do HIV. Outro resultado interessante é<br />
relações poligâmicas (ver Figura 6.15).<br />
relação positiva com o uso do preservativo,<br />
enquanto viver em áreas rurais está<br />
positivamente associado a alto risco de<br />
comportamento sexual.<br />
Curiosamente, estes indicadores<br />
comportamentais parecem não corresponder<br />
ao perfil de prevalência do HIV que<br />
recentemente se constatou a partir dos<br />
resultados preliminares do INSIDA:<br />
Tanto nos homens como nas mulheres,<br />
a prevalência foi maior no mais elevado<br />
quintil de riqueza, e maior entre os<br />
indivíduos com instrução do que entre os<br />
possíveis correlações entre as constatações<br />
comportamentais e a seroprevalência.<br />
4.4. P2 – Prevenção da<br />
transmissão vertical do HIV<br />
Em todo o mundo, 700.000 crianças menores<br />
de 15 anos são infectadas anualmente com<br />
o HIV, e mais de 90 por cento das infecções<br />
pediátricas por HIV resultam da transmissão<br />
do vírus da mãe para a criança. 74 Chegam<br />
a dois terços as infecções de crianças que<br />
se verificam durante o parto, o nascimento<br />
e a gestação, ocorrendo um terço durante<br />
o aleitamento. 75 Sem medidas preventivas,<br />
as taxas de transmissão são de15 a 40 por<br />
cento, mas, com tratamento anti-retroviral<br />
eficaz e cuidados, podem ser reduzidas até<br />
dois por cento, como se verifica nos países<br />
desenvolvidos. 76<br />
desprotegidas como as mulheres que não<br />
que a probabilidade de actividade de alto<br />
a mulheres em relações monogâmicas,<br />
Em termos de características do agregado<br />
que não têm instrução. O relatório final do<br />
estão cientes dos canais de transmissão<br />
risco aumenta com a idade no que respeita<br />
enquanto diminui para as mulheres em<br />
familiar e do local, a riqueza parece ter uma<br />
INSIDA trará certamente mais luz sobre as<br />
Em 2008, estimava-se que as intervenções<br />
de PTV em Moçambique tivessem evitado<br />
se traduz numa redução de 15,6 por cento<br />
prevenção tem-se expandido rapidamente,<br />
estavam concentrados e em torno das capitais<br />
provinciais, mas em 2009, as intervenções de<br />
prevenção estavam integradas em serviços<br />
de cuidados pré-natais em todos os distritos,<br />
incluindo várias unidades de saúde periféricas.<br />
A cobertura populacional da PTV e as<br />
intervenções de terapia anti-retroviral<br />
pediátrica foram revistas em 2010, com<br />
base em estimativas mais precisas da<br />
população a partir dos dados do INSIDA. 78<br />
As estimativas revistas indicam que<br />
estudos anteriores haviam sobrestimado<br />
a população de mulheres HIV positivas.<br />
de PTV (cobertura da população) tem,<br />
portanto, aumentado significativamente.<br />
Estimativas prévias 79 indicavam que cerca<br />
de 46 por cento das mulheres grávidas<br />
estavam a receber a profilaxia necessária<br />
para reduzir a transmissão vertical do HIV.<br />
Estimativas revistas indicam que 70 por<br />
cento das mulheres estão realmente a<br />
receber tratamento. 80 A Figura 6.16 mostra<br />
o número absoluto de mulheres grávidas<br />
que recebem tratamento de PTV e a<br />
percentagem de mulheres que recebem antiretrovirais<br />
para PTV com base em estimativas<br />
populacionais anteriores e mais recentes.<br />
Embora as estimativas de tratamento<br />
revistas sejam encorajadoras, é de notar<br />
que o tratamento se distribui de forma<br />
desigual. As mulheres grávidas no sul do<br />
país têm significativamente maior acesso ao<br />
tratamento que as suas congéneres do norte.<br />
cerca de 5.820 novas infecções por HIV<br />
a nível nacional. 77 O programa de PTV foi<br />
a criação do programa nacional, o número de<br />
de oito em 2002 para mais de 800 no final<br />
Estima-se que a percentagem de mulheres<br />
em crianças menores de 15 anos, o que<br />
introduzido em Moçambique em 2002. Desde<br />
unidades de saúde que oferecem serviços de<br />
de 2009. v No início, a maioria dos serviços<br />
seropositivas que estão a receber serviços<br />
Figura 6.16: Tendências na cobertura de PTV entre 2002 e 2009<br />
80.000<br />
70.000<br />
60.000<br />
50.000<br />
40.000<br />
30.000<br />
20.000<br />
10.000<br />
7,690<br />
877<br />
3,182<br />
253<br />
8.9%<br />
0<br />
Políticas de PTV em Moçambique<br />
Em Novembro de 2006, o Ministério da<br />
Saúde emitiu uma directiva 81 introduzindo<br />
várias políticas-chave: testagem por<br />
iniciativa do provedor (testagem `opt-out’),<br />
oferecida tanto nos cuidados pré-natais<br />
como em locais de maternidade; amostras<br />
de sangue para contagem de células<br />
CD4 nas instalações de atendimento prénatal;<br />
testagem da reacção em cadeia da<br />
polimerase (RCP) do ADN para crianças<br />
expostas ao HIV com menos de 18 meses.<br />
Foi introduzido oficialmente o uso de terapia<br />
de combinação para profilaxia (dose única<br />
de nevirapina [NVP] durante o parto, mais<br />
zidovudina [AZT] a partir de 28 semanas), e<br />
o início do tratamento com nevirapina em<br />
mulheres grávidas foi antecipado das 36<br />
semanas para as 28 semanas. Foi reforçada<br />
a integração dos serviços de PTV nos<br />
Recentes mudanças nas orientações<br />
globais para a prevenção da transmissão<br />
vertical requerem uma abordagem mais<br />
abrangente e mais agressiva. Estas<br />
alterações incluem: terapia anti-retroviral<br />
vitalícia para as mulheres seropositivas que<br />
necessitam de tratamento; antecipação do<br />
início de regimes de profilaxia eficazes; e<br />
manutenção desses regimes durante o pósv<br />
Dados do Relatório da UNGASS.<br />
Número de mulheres grávidas seropositivas<br />
a receber profilaxia de PTV<br />
12,150<br />
13.7%<br />
2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009<br />
Número de mulheres grávidas seropositivas a receber profilaxia de ARV<br />
Fonte: Ministry of Health, Annual Report, National Laboratory Services, Maputo, 2009.<br />
24,320<br />
26.4%<br />
16.0%<br />
46,848<br />
49.3%<br />
32.0%<br />
68,248<br />
70.4%<br />
100%<br />
90%<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
45.8% 40%<br />
Percentagem do total estimado de mulheres grávidas seropositivas que receberam PTV (novas estimativas)<br />
Percentagem de mulheres grávidas seropositivas a receber profilaxia de ARV (estimativa da UNGASS)<br />
serviços de saúde materno-infantil, visando<br />
aumentar a adesão à terapia anti-retroviral<br />
por mulheres grávidas. Foi recomendado<br />
que se restaurasse a prática de Consultas<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
para Crianças em Risco para fortalecer o<br />
seguimento das crianças nascidas de mães<br />
seropositivas.<br />
0<br />
Percentagem de necessidades de PTV satisfeitas<br />
A criação pelas unidades de saúde de grupos<br />
de apoio às mães também foi incluída nas<br />
directiva como um passo necessário para<br />
ajudar as mulheres grávidas e a amamentar<br />
a aderirem a intervenções de PTV e posterior<br />
acompanhamento dos seus filhos expostos<br />
ao HIV. As directrizes sobre os grupos de<br />
apoio às mães foram desenvolvidas na<br />
sequência de um mapeamento nacional<br />
desta intervenção em 2008. A versão final<br />
das directrizes aguarda aprovação.<br />
206<br />
207
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
parto e o aleitamento. 82 No início de 2010,<br />
a política do Ministério da Saúde mudou<br />
para reflectir algumas das indicações<br />
internacionais revistas da OMS, incluindo<br />
o aumento dos níveis em que as mulheres<br />
grávidas com baixas contagens de CD4 são<br />
consideradas elegíveis para Terapia Antiretroviral<br />
Altamente Activa (HAART), 83 o<br />
início precoce da profilaxia para mulheres, e<br />
o prosseguimento de nevirapina pela criança<br />
até ao desmame do seio materno.<br />
O sucesso de um programa de PTV depende<br />
de uma complexa cascata de intervenções,<br />
integrada com os serviços de saúde<br />
materno-infantil, como adiante se descreve.<br />
Conhecimento da prevenção da<br />
transmissão vertical do HIV<br />
O nível de conhecimento sobre a<br />
transmissão vertical do HIV na população<br />
moçambicana tem vindo a aumentar. O<br />
Inquérito Demográfico e de Saúde revelou<br />
que apenas 44 por cento das mulheres e<br />
43 por cento dos homens de 15-49 anos<br />
sabia que o HIV podia ser transmitido de<br />
mãe para filho durante a gravidez, o parto<br />
e a amamentação. Os dados do MICS 2008<br />
revelam que nas mulheres da mesma faixa<br />
etária, esse conhecimento aumentou para<br />
78 por cento. Os níveis de conhecimento<br />
Figura 6.17: Testagem e aconselhamento em consultas pré-natais, 2003 e 2008<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
51%<br />
57%<br />
são mais elevados nas áreas urbanas (89<br />
por cento) do que nas rurais (72 por cento).<br />
Além disso, os dados mostram que 70 por<br />
cento das mulheres entrevistadas sabem<br />
que o vírus pode ser transmitido através da<br />
amamentação (em comparação com 50 por<br />
cento das mulheres em 2003). Apenas pouco<br />
mais de metade (55 por cento) das mulheres<br />
conhecem os três principais métodos de<br />
transmissão do HIV (MICS 2008).<br />
Aconselhamento e testagem como<br />
parte dos cuidados pré-natais<br />
Apesar de o aconselhamento sobre o<br />
HIV para mulheres grávidas durante as<br />
consultas pré-natais ter aumentado de 51<br />
por cento em 2003 para 57 por cento em<br />
2008, continua a ser baixo. As disparidades<br />
geográficas na percentagem de mulheres<br />
que receberam aconselhamento sobre o HIV<br />
como parte das suas consultas pré-natais<br />
são grandes, variando de 28 por cento na<br />
província da Zambézia (27 em 2003) para 94<br />
por cento na Cidade de Maputo (81 por cento<br />
em 2003). 84<br />
A percentagem de mulheres que foram<br />
testadas em termos de HIV como parte do<br />
seu atendimento pré-natal tem registado<br />
grande aumento. Em 2008, 46 por cento<br />
das mulheres grávidas de 15-49 anos<br />
3%<br />
0%<br />
Receberam informação sobre a prevenção<br />
Fizerem teste de HIV em consulta pré-natal<br />
do HIV em consulta pré-natal*<br />
2003 2008<br />
Fonte: IDS 2003, MICS 2008.<br />
46%<br />
foram submetidos a um teste de HIV no<br />
âmbito das suas consultas pré-natais, em<br />
comparação com apenas 3 por cento em<br />
2003. A percentagem de mulheres testadas<br />
em termos de HIV varia entre as diferentes<br />
províncias, com apenas 19 por cento<br />
testadas na província da Zambézia em 2008,<br />
em comparação com 95 por cento na Cidade<br />
de Maputo. 85 Quarenta e três por cento das<br />
mulheres receberam os seus resultados.<br />
Entre as mulheres grávidas que receberam<br />
aconselhamento em matéria de HIV, 82 por<br />
cento fizeram teste de HIV, de acordo com<br />
o MICS 2008, o que resulta provavelmente<br />
de testagem por iniciativa do provedor e de<br />
aconselhamento nos serviços de cuidados<br />
pré-natais, bem como da progressiva<br />
normalização da inclusão de um teste de HIV<br />
nos serviços pré-natais.<br />
O acesso a informação sobre o HIV e<br />
testagem nas consultas pré-natais está<br />
altamente correlacionado com a riqueza da<br />
mulher. Apenas 26 por cento das mulheres<br />
Figura 6.18: Testagem e aconselhamento de HIV em consultas pré-natais, por quintil de riqueza, 2008<br />
90%<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
41%<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
26%<br />
48%<br />
33%<br />
Mais baixo Segundo Médio Quarto Mais elevado<br />
Receberam informação sobre a prevenção<br />
do HIV em consulta pré-natal<br />
58%<br />
mais pobres foram testados em termos de<br />
HIV, em comparação com 86 por cento das<br />
mulheres mais abastadas (ver Figura 6.18).<br />
Profilaxia anti-retroviral para mulheres<br />
grávidas<br />
Para reduzir a transmissão vertical do vírus,<br />
bem como para o seu próprio tratamento,<br />
quando elegíveis, as mulheres seropositivas<br />
grávidas recebem medicamentos antiretrovirais<br />
para profilaxia. O acesso à terapia<br />
anti-retroviral tem vindo a aumentar desde<br />
o início do programa em 2002. A cobertura<br />
de profilaxia anti-retroviral para a população<br />
global de mulheres grávidas seropositivas<br />
(testadas e não testadas) foi de 0,2 por cento<br />
em 2002, aumentando para 30 por cento em<br />
2007, 32 por cento em 2008 e 45,8 por cento<br />
em 2009. 86 vi É importante referir que estes<br />
números se referem apenas à cobertura dos<br />
serviços prestados durante os cuidados prénatais,<br />
excluindo as mulheres que acedem<br />
a terapia anti-retroviral em maternidades.<br />
Esta abordagem foi adoptada pelo Ministério<br />
41%<br />
72%<br />
64%<br />
87%<br />
86%<br />
Fizeram o teste de HIV em consulta pré-natal<br />
vi Note-se que a cobertura populacional da PTV e das intervenções anti-retrovirais pediátricas será revista, na última parte<br />
de 2010, com base em estimativas mais precisas da população no INSIDA<br />
208<br />
209
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
da Saúde para evitar a dupla contagem de<br />
mulheres com acesso tanto a serviços prénatais<br />
como a maternidades, mas resulta em<br />
sub-notificação. Espera-se que, num futuro<br />
próximo, o novo Cartão de Cuidados Pré-<br />
Natais, em vias de finalização, torne mais<br />
clara a notificação e permita uma recolha<br />
de informações fiáveis sobre a cobertura da<br />
PTV.<br />
É fundamental que se dê prioridade ao<br />
acesso das mulheres grávidas a TARV. A<br />
HAART minimiza o risco de transmissão<br />
pós-natal em mães a amamentar com<br />
baixa contagem de CD4 e elevada carga<br />
viral, as quais enfrentam desafios na<br />
implementação das opções de alimentação<br />
infantil recomendadas. As mulheres com<br />
CD4 inferior a 200 células /microlitro (µL)<br />
têm cinco vezes mais probabilidade de<br />
transmitir o HIV durante o aleitamento do<br />
que as mulheres com CD4 acima de 500<br />
células /µL. 87 A HAART pode reduzir o risco<br />
de transmissão para aproximadamente<br />
dois por cento, em comparação com outras<br />
intervenções, como, por exemplo, dose única<br />
de nevirapina, que reduz o risco para 10-15<br />
por cento.<br />
Em 2009, de todas as mulheres grávidas<br />
que receberam intervenções de PTV, 48 por<br />
cento receberam dose única de nevirapina,<br />
40 por cento uma combinação de nevirapina<br />
e AZT (biterapia), e 11 por cento HAART para<br />
sua própria saúde. O número de mulheres<br />
seropositivas grávidas que receberam<br />
HAART para sua própria saúde foi de 53<br />
em 2003, aumentando para 3.647 em 2007,<br />
6.388 em 2008 e 7.791 em 2009 (equivalente<br />
a 5 por cento do total estimado de mulheres<br />
seropositivas grávidas no país).<br />
Embora se esteja a registar progresso, o<br />
número de mulheres grávidas que recebem<br />
anti-retrovirais para a sua própria saúde<br />
permanece abaixo das expectativas.<br />
A HAART em 2010 é oferecida apenas<br />
em serviços de saúde seleccionados,<br />
denominados postos de Tratamento Antiretroviral.<br />
Quer isto dizer que as mulheres<br />
grávidas, ao invés de poderem aceder a<br />
HAART como parte integrante dos serviços<br />
de PTV, são encaminhadas principalmente<br />
para postos de Tratamento Anti-retroviral,<br />
que podem localizar-se numa outra unidade<br />
sanitária. Isto interfere com o acesso,<br />
nomeadamente com a triagem para<br />
elegibilidade.<br />
Profilaxia anti-retroviral para bebés<br />
De acordo com as directrizes internacionais<br />
de PTV e o protocolo revisto da Terapia Anti-<br />
Retroviral para mulheres grávidas (opção<br />
A), 88 todas as crianças expostas nascidas<br />
de mães seropositivas devem receber<br />
profilaxia anti-retroviral com nevirapina<br />
no prazo de 72 horas após o parto, e<br />
prosseguir com nevirapina até que deixem<br />
de ser amamentadas. Dados do Ministério<br />
da Saúde revelam, porém, que apenas<br />
uma estimativa de 40-50 por cento das<br />
mulheres grávidas seropositivas dão à luz<br />
em unidades sanitárias em Moçambique. O<br />
facto de os partos institucionais constituírem<br />
apenas cerca de metade dos partos é um<br />
claro nó de estrangulamento na prestação<br />
de profilaxia anti-retroviral para recémnascidos<br />
nas primeiras 72 horas de vida.<br />
Apesar desta restrição, o número de crianças<br />
que receberam profilaxia anti-retroviral<br />
passou de 328 em 2002 para 41.266 em 2009,<br />
correspondendo a 58 por cento de todas<br />
as crianças que se estima terem nascido<br />
de mães seropositivas e 83 por cento das<br />
mulheres grávidas que receberam qualquer<br />
Figura 6.20: Cascata de PTV pré-natal e pós-natal, 2009<br />
tipo de anti-retrovirais para PTV no mesmo<br />
período. O aumento pode ser atribuível,<br />
em parte, à crescente taxa de partos<br />
institucionais de mulheres seropositivas<br />
envolvidas em PTV, bem como ao facto de<br />
os recém-nascidos serem por vezes levados<br />
a serviços de maternidade até 72 horas após<br />
o nascimento para receber tratamento antiretroviral.<br />
Cobertura de Cotrimoxazole para<br />
crianças expostas ao HIV<br />
Directrizes internacionais recomendam<br />
a administração de profilaxia de<br />
Cotrimoxazole a crianças nascidas de<br />
mães seropositivas ou crianças a viver<br />
com HIV. 89 Esta é uma intervenção com<br />
boa relação custo-benefício que pode ser<br />
amplamente aplicada, mesmo em ambientes<br />
com parcos recursos. Directrizes nacionais<br />
indicam que, para as crianças expostas, a<br />
profilaxia deve começar às quatro semanas.<br />
Evidência anedótica de visitas de supervisão<br />
às unidades de saúde indica que essa<br />
intervenção é amplamente implementada no<br />
Figura 6.19: Partos assistidos, 1997, 2003 e 2008<br />
1.000.000<br />
100%<br />
56%<br />
90%<br />
52%<br />
55%<br />
900.000<br />
800.000<br />
888.861<br />
80%<br />
70%<br />
700.000<br />
600.000<br />
649.820<br />
60%<br />
500.000<br />
50%<br />
40%<br />
48%<br />
44%<br />
45%<br />
400.000<br />
300.000<br />
30%<br />
200.000<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
1997 2003 2008<br />
Parteiras tradicionais/outros/ninguém Pessoal qualificado<br />
100.000<br />
0<br />
Grávidas<br />
aconselhadas<br />
e testadas<br />
Grávidas<br />
frequentando<br />
cuidados<br />
pré-natais<br />
150.000<br />
Estimativa<br />
de grávidas<br />
seropositivas<br />
70.289 68.248 41.266<br />
Seropositivas<br />
Grávidas<br />
a receber<br />
profilaxia ARV<br />
Crianças<br />
a receber<br />
profilaxia ARV<br />
Source: DHS 1997 and 2003, MICS 2008.<br />
Fonte: Ministry of Health, Annual Report, National Laboratory Services, Maputo, 2009.<br />
210<br />
211
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
país, mas que ainda não estão disponíveis<br />
números fiáveis sobre a cobertura nacional.<br />
Uma significativa percentagem de mulheres<br />
abandona os serviços em cada fase de uma<br />
cascata de serviços pré-natais e pós-natais<br />
(ver Figura 6.20). Nem todas as mulheres<br />
grávidas que frequentam cuidados pré-natais<br />
receberam aconselhamento e testagem, e<br />
menos ainda receberam a profilaxia antiretroviral.<br />
Da mesma forma, apesar do<br />
crescente número de crianças expostas<br />
ao HIV que podem de aceder a profilaxia<br />
anti-retroviral, são relativamente poucas as<br />
que acabam por ter a sua seropositividade<br />
confirmada através de testes.<br />
Futuros planos e metas<br />
A redução da transmissão vertical do HIV há<br />
vários anos que tem sido uma importante<br />
prioridade do governo. O segundo plano<br />
nacional estratégico para combater o HIV/<br />
SIDA, que cobre 2005-2009, estabeleceu<br />
uma meta de cobertura da PTV de 90 por<br />
cento até ao ano de 2009, com base na meta<br />
do Ministério da Saúde de 60 por cento de<br />
cobertura até ao ano 2008. 90 Moçambique<br />
Figura 6.21: Número estimado de crianças com menos de 15 anos vivendo com HIV, menores de 5 vivendo com<br />
HIV, número de novas infecções em menores de 15, e número de crianças com menos de 15 anos a necessitar de<br />
tratamento/terapia anti-retroviral, 2006–2010<br />
180.000<br />
160.000<br />
140.000<br />
120.000<br />
100.000<br />
80.000<br />
60.000<br />
40.000<br />
20.000<br />
0<br />
2006<br />
2007<br />
comprometeu-se também, para a meta de<br />
acesso universal, a alcançar pelo menos<br />
80 por cento das mulheres grávidas e seus<br />
bebés com as intervenções de PTV em 2010.<br />
As metas definidas em 2009 continuam<br />
abaixo do necessário para se atingir a meta<br />
do acesso universal, com a justificação de<br />
que o país não tem capacidade para atingir<br />
metas mais ambiciosas. As metas foram<br />
revistas em alta em Julho de 2010 dados os<br />
muito positivos progressos alcançados nos<br />
anos anteriores, nomeadamente em 2009<br />
(altura em que o país já tinha alcançado o<br />
que fora inicialmente planeado como meta<br />
para 2011). A meta revista do Ministério da<br />
Saúde visa atingir o valor de referência de<br />
90% de cobertura de serviços de PTV em<br />
mulheres grávidas seropositivas o mais<br />
tardar até ao ano 2015.<br />
4.5. P3 – SIDA Pediátrica<br />
Estima-se que houvesse cerca de 148.000<br />
crianças menores de 15 anos a viver com<br />
HIV em Moçambique em 2009, número que<br />
deverá aumentar para mais de 150.000 mil<br />
em 2010. 91 Mais de metade das crianças<br />
2008 2009<br />
2010<br />
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Todas as crianças com menos de 24 meses<br />
com diagnóstico confirmado de infecção por<br />
HIV devem começar a fazer o tratamento antiretroviral,<br />
independentemente do estágio<br />
clínico ou imunológico, de acordo com as<br />
recomendações internacionais e directrizes<br />
nacionais emitidas em Outubro de 2008. 99 Em<br />
2009, o teste de RCP estava a ser realizado em<br />
dois laboratórios, em Maputo e Nampula, com<br />
um terceiro na Beira que se previa começar<br />
a efectuar testes em 2010. A partir de 2009,<br />
dados relativos ao acesso universal nacional 100<br />
reportaram pelo menos 287 pontos de colecta<br />
de amostras de gotas de sangue seco em<br />
unidades sanitárias a nível periférico para<br />
análise de RCP em laboratórios de referência.<br />
Uma série de constrangimentos dificultam<br />
uma testagem eficaz da RCP, incluindo longos<br />
atrasos devido ao transporte das amostras<br />
e à sistemática falta de materiais utilizados<br />
nos testes. Uma inovação positiva foi a<br />
introdução em 2009, numa base experimental,<br />
de tecnologia de impressão do serviço de<br />
mensagens escritas (sms) para dar feedback<br />
dos resultados da RCP às unidades sanitárias.<br />
Foi planeado para 2010 o lançamento a nível<br />
nacional desta tecnologia, esperando-se que<br />
melhore substancialmente o diagnóstico<br />
infantil precoce no país.<br />
Tabela 6.3: Metas relativas ao HIV pediátrico, 2009<br />
Meta do<br />
Modelo de<br />
Projecção para<br />
crianças em<br />
TARV (limite<br />
inferior)<br />
Em 2005, o Governo fez da expansão do<br />
tratamento pediátrico uma prioridade na<br />
luta contra a SIDA e a pobreza. No PARPA<br />
II, foi estabelecida uma meta de tratamento<br />
para 33.000 crianças até 2009, que, no<br />
entanto, não foi atingida; a avaliação do<br />
PARPA II mostra que apenas 11.000 crianças<br />
estavam a receber tratamento em 2009. Em<br />
2008, o Ministério da Saúde decidiu reduzir<br />
drasticamente as metas anuais para 11.500<br />
crianças em tratamento em 2008, quando<br />
no PARPA II a meta era de 20.826. Esta<br />
meta foi revista com base numa análise<br />
do progresso e nas projecções do número<br />
de novas crianças que iniciaram cada mês<br />
a terapia anti-retroviral no ano anterior.<br />
Depois de intensa acção de advocacia,<br />
e após a adopção por Moçambique das<br />
novas normas para a terapia anti-retroviral<br />
pediátrica vii e a expansão do diagnóstico<br />
infantil precoce através da instalação de<br />
duas máquinas de RCP nas regiões norte e<br />
centro do país, o Ministério da Saúde, em<br />
colaboração com os seus parceiros, decidiu<br />
rever as metas em 2009 (ver Tabela 6.3).<br />
Embora representem uma melhoria, estas<br />
metas revistas continuam muito abaixo dos<br />
objectivos originais do PARPA II e ainda<br />
mais do compromisso de acesso universal.<br />
2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014<br />
Crianças com ARV 6.451 9.393 13.500 18.817 23.818 29.058 34.258 39.743<br />
Crianças com ARV<br />
como percentagem 7,1% 7,3% 8,5% 9,9% 10,7% 11,4% 11,9% 12,3%<br />
do total<br />
Cobertura 21% 28% 37% 45% 52% 58% 64%<br />
Fonte: Ministry of Health, Departamento Nacional de Assistência Médica, HIV Programme Report, Ministério da Saúde, Maputo, 2009.<br />
vii Iniciar a terapia anti-retroviral para todas as crianças seropositivas com 0-1 anos de idade; testagem da RCP para todas<br />
as crianças de 0-9 meses, usando testes rápidos; alterações às normas de contagem de células CD4; utilização das quatro<br />
etapas da Organização Mundial da Saúde, em vez de três; e introdução de comprimidos solúveis em lugar de xaropes.<br />
4.6. P4 – Proteger as crianças<br />
órfãs e vulneráveis<br />
afectadas pela SIDA<br />
Estima-se que haja 1,8 milhões de órfãos em<br />
Moçambique, dos quais 510.000 devido à<br />
SIDA. 101 Este número deverá aumentar, com<br />
a SIDA como causa provável de orfandade<br />
na maioria dos casos, não sendo aqui<br />
consideradas outras crianças eventualmente<br />
vulneráveis devido ao impacto do HIV na<br />
sua família. Uma criança é considerada<br />
órfã ou vulnerável (COV) se um ou ambos<br />
os seus pais naturais tiverem morrido, se<br />
pelo menos um dos seus progenitores está<br />
cronicamente doente, se tiver morrido um<br />
adulto no agregado familiar nos últimos<br />
12 meses após doença prolongada, ou se<br />
houver um adulto cronicamente doente no<br />
agregado familiar.<br />
As crianças órfãs estão mais expostas a<br />
riscos do que as que não órfãs. Estes riscos<br />
incluem: aumento de agregados familiares<br />
chefiados por irmãos ou crianças, mais fraco<br />
ingresso e desempenho escolar, maior risco<br />
de abuso sexual e infecção pelo HIV, risco<br />
de trabalho infantil perigoso, actividade<br />
sexual e casamento precoces, aumento do<br />
risco de graves problemas psicossociais<br />
e problemas de saúde e nutrição. 102 Além<br />
disso, o estigma e a discriminação contra<br />
as pessoas infectadas ou afectadas pelo<br />
HIV/SIDA continuam a ser uma questão<br />
desafiadora. As crianças e os jovens com<br />
familiares doentes ou moribundos estão<br />
particularmente expostos ao estigma.<br />
Podem ser ostracizados pelas suas<br />
comunidades e receber um apoio mínimo<br />
das suas famílias devido à vergonha e<br />
ao estigma presentemente associados a<br />
uma morte relacionada com a SIDA. Nas<br />
escolas, a discriminação contra a criança<br />
exprime-se por provocação e intimidação.<br />
Em alguns casos, as crianças evitam seus<br />
pares seropositivos devido ao receio de<br />
que possam ser infectadas. Um estudo<br />
participativo sobre os mecanismos das<br />
famílias e comunidades para fazer face<br />
às dificuldades no contexto da SIDA,<br />
realizado em todo o país pelo <strong>UNICEF</strong>, em<br />
colaboração com o Ministério da Mulher e<br />
da Acção Social, em 2004, constatou que<br />
cerca de metade dos agregados familiares<br />
pesquisados consideravam que as crianças<br />
órfãs devido à SIDA eram susceptíveis de ser<br />
estigmatizadas. 103<br />
4.7. Nutrição e HIV<br />
A desnutrição, a insegurança alimentar,<br />
a infecção pelo HIV e a SIDA reforçamse<br />
mutuamente. As pessoas que vivem<br />
com HIV têm acrescidas necessidades<br />
energéticas, mas a infecção pelo HIV ou<br />
infecções oportunistas conectas podem<br />
reduzir a sua capacidade de absorver<br />
nutrientes e diminuir o apetite, o que as<br />
pode levar a perder peso e enfraquecer.<br />
Pode seguir-se um ciclo vicioso em que elas<br />
estão menos capazes de trabalhar, manter<br />
um emprego e cuidar de si, tornando-se<br />
assim ainda mais fracas. Além disso, se não<br />
recebem tratamento, ficam mais propensas a<br />
infecções oportunistas e acabam por evoluir<br />
para SIDA. Os membros da sua família<br />
também podem ser afectados se, para a<br />
sua alimentação, despesas e assistência,<br />
dependerem da pessoa com HIV.<br />
Relativamente a crianças, que precisam de<br />
energia e nutrientes para crescer, pode ser<br />
ainda mais severo o impacto da infecção<br />
pelo HIV no seu estado nutricional. As<br />
COV são especialmente vulneráveis à<br />
desnutrição, dependendo de viverem ou<br />
não em ambiente familiar e do seu acesso<br />
aos recursos necessários. O estudo da<br />
pobreza baseada em privações analisou as<br />
COV como grupo, tendo constatado que<br />
22 por cento tinham privação nutricional<br />
severa (acentuada baixa altura para a idade,<br />
insuficiência de peso ou baixo peso para a<br />
altura). 104<br />
O tratamento anti-retroviral pode ajudar a<br />
melhorar o estado nutricional de pessoas<br />
vivendo com HIV, uma vez que melhora o<br />
seu estado de saúde. Ao mesmo tempo,<br />
no entanto, os medicamentos podem ter<br />
efeitos colaterais, que podem ser agravados<br />
quando o consumo de alimentos não é o<br />
adequado. O apetite das pessoas geralmente<br />
214<br />
215
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
aumenta quando a sua saúde melhora, o<br />
que, em ambiente de insegurança alimentar<br />
e pobreza, pode constituir um desafio.<br />
Evidências pontuais sugerem que a falta de<br />
alimentos pode ser uma importante razão<br />
para abandonar o tratamento.<br />
Uma análise do estado nutricional e da<br />
vulnerabilidade de 920 pessoas vivendo<br />
com HIV e recebendo anti-retrovirais em<br />
33 distritos 105 constatou que um quarto<br />
delas estavam desnutridas (índice de massa<br />
corporal inferior a 18,5 kg/m2). Um quinto<br />
recebeu apoio alimentar. A segurança<br />
alimentar e a vulnerabilidade foram medidos<br />
com base no consumo de alimentos e no uso<br />
de estratégias de sobrevivência. O estudo<br />
concluiu que dois terços dos entrevistados<br />
eram vulneráveis e viviam em situação de<br />
insegurança alimentar.<br />
4.8. Conclusões<br />
Estima-se que em 2010 mais de 1.7 milhões<br />
de Moçambicanos estejam a viver com o<br />
HIV, incluindo cerca de 150.000 crianças<br />
menores de 15 anos. Nas áreas urbanas<br />
tais como a cidade de Maputo, a SIDA<br />
está a tornar-se uma causa comum de<br />
morte de crianças menores de cinco anos.<br />
Concentrados na população entre os 15 e 49<br />
anos, o HIV e a SIDA estão a ter um amplo<br />
impacto social e económico. A força de<br />
trabalho qualificada necessária tanto para<br />
o crescimento económico e a provisão de<br />
serviços sociais tais como cuidados de saúde<br />
e educação está a reduzir. Moçambique<br />
está a responder à epidemia do HIV através<br />
da campanha dos Quatro “P”: Prevenção<br />
primária, PTV, SIDA Pediátrico e Protecção<br />
de crianças órfãs e vulneráveis.<br />
Apesar do progresso feito na implementação<br />
do programa de PTV, a falta de seguimento<br />
das mães e das crianças continua um sério<br />
constrangimento. O sistema de saúde faz<br />
face a escassez de recursos humanos que<br />
tem comprometido o acesso a e provisão<br />
de serviços de qualidade. Por outro lado, o<br />
estigma e a discriminação associados com<br />
o HIV podem prevenir que muitas mulheres<br />
grávidas e seus recém-nascidos acedam e<br />
adiram às intervenções de PTV. As mães<br />
receiam que possam perder suas famílias<br />
como resultado de serem testadas ou<br />
comunicarem o seu estado serológico de HIV<br />
aos seus parceiros.<br />
O sistema de saúde em Moçambique<br />
necessita desenvolver estratégias para<br />
criar um ambiente propício que encoraje<br />
o envolvimento activo de parceiros e<br />
famílias na saúde materno-infantil (p.e.<br />
aconselhamento e testagem de casais,<br />
partos assistidos por pessoal qualificado,<br />
etc.). O programa de PTV deve ser tornado<br />
mais abrangente e aceitável à participação<br />
masculina e deveria estar ligado às<br />
intervenções de saúde na comunidade<br />
para facilitar seguimento activo das mães<br />
e crianças que actualmente desistem. A<br />
experiência do Ruanda mostra que quando<br />
os parceiros estão envolvidos e informados,<br />
uma mulher sente-se mais propensa a<br />
participar nos serviços de PTV e procura<br />
activamente outros serviços de saúde<br />
materna e HIV.<br />
5. Questões ambientais e mudança<br />
climática<br />
Crianças de todo o mundo, e<br />
particularmente dos países em<br />
desenvolvimento, estão entre os menos<br />
responsáveis pela degradação ambiental e<br />
pela mudança climática. Da mesma forma,<br />
as crianças não são o principal foco da<br />
maioria das avaliações de impacto ambiental<br />
ou estudos de mudança climática, nem são<br />
os principais alvos da maioria das políticas<br />
e intervenções relacionadas com questões<br />
ambientais ou mudança climática.<br />
As crianças estão entre os mais vulneráveis<br />
aos devastadores impactos de muitos tipos<br />
de riscos ambientais. Mesmo as catástrofes<br />
naturais de duração relativamente curta<br />
podem ter efeitos duradouros sobre o<br />
desenvolvimento das crianças. Os desafios<br />
de saúde, nutrição, água e saneamento<br />
são muitas vezes causados ou agravados<br />
por condições ambientais desfavoráveis,<br />
enquanto as áreas de educação, protecção<br />
da criança e outras também enfrentam<br />
desafios como consequências indirectas<br />
de questões ambientais. Com a mudança<br />
climática ameaçando agravar a incidência e<br />
gravidade de muitos riscos ambientais em<br />
Moçambique, é particularmente importante<br />
centrar a atenção em como as crianças<br />
podem ser poupadas dos seus efeitos<br />
negativos.<br />
Os riscos ambientais afectam as crianças<br />
seja como parte de um agregado familiar<br />
mais vasto seja de formas que lhes são<br />
peculiares. As crianças estão sob maior<br />
risco de muitos potenciais efeitos na saúde<br />
simplesmente devido à sua fisiologia: seus<br />
órgãos, sistemas imunológicos e sistema<br />
nervoso ainda em desenvolvimento;<br />
seus mais rápidos metabolismos e taxas<br />
respiratórias; e sua mais elevada área<br />
superficial com relação à massa corporal<br />
comparativamente aos adultos. O seu<br />
comportamento e a sua curiosidade naturais<br />
também as colocam em maior risco de<br />
contrair certas doenças e ferimentos porque<br />
a sua propensão para explorar o mundo<br />
em redor as leva frequentemente a uma<br />
maior exposição a contaminantes, poluentes<br />
(em especial devido à falta de espaços não<br />
poluídos para brincar em áreas urbanas). As<br />
crianças são mais susceptíveis de apanhar<br />
e mascar terra, pedaços de lixo e minas<br />
terrestres. A sua menor estatura e relativa<br />
falta de força e velocidade também as torna<br />
particularmente vulneráveis em situações<br />
de emergência como inundações, ciclones e<br />
deslizamentos de terra. As crianças têm ainda<br />
maior probabilidade de estar perto das mães<br />
quando estas estão a cozinhar, aumentando<br />
a sua exposição a poluentes provenientes<br />
da queima de combustíveis fósseis. Alguns<br />
pesquisadores afirmam que as alterações<br />
climáticas, devido ao seu impacto de longo<br />
alcance e intersectorial, representam a maior<br />
ameaça para as crianças do mundo. 106<br />
5.1. Questões ambientais<br />
em Moçambique<br />
As 13 maiores bacias hidrográficas do país<br />
são densamente povoadas e caracterizamse<br />
por níveis relativamente elevados de<br />
fertilidade do solo, mas são também áreas<br />
vulneráveis a inundações, secas e intrusão<br />
salina, bem como aos efeitos da demanda de<br />
água, chuvas e poluição nos países vizinhos<br />
em que a maioria dos rios nasce. A região<br />
centro, caracterizada por um delta de um<br />
grande rio (Zambeze) e uma extensa planície<br />
costeira, é particularmente vulnerável a<br />
riscos ambientais, por ser a região com<br />
a maior população costeira e os maiores<br />
riscos de ciclones e inundações. A região<br />
norte é caracterizada por moderada a baixa<br />
fertilidade do solo e uma estreita planície<br />
costeira. A fertilidade do solo é menor e<br />
o risco de seca mais elevado na região<br />
sul, particularmente nas regiões áridas do<br />
interior. 107<br />
216<br />
217
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Mais de 60 por cento da população vive ao<br />
longo da costa, uma bio-região susceptível a<br />
ciclones, pesca excessiva, erosão e intrusão<br />
salina nos sistemas fluviais. Moçambique<br />
pode ser dividido em bio-regiões com<br />
base na latitude (norte, centro e sul) e em<br />
características geográficas (costeira, planície<br />
de cheia e interior).<br />
O estado físico do meio ambiente não<br />
está sujeito apenas a eventos climáticos<br />
incontroláveis, como ciclones e secas, mas<br />
também a efeitos de actividade humana,<br />
tais como uso insustentável, exploração e<br />
poluição do solo, da água e dos recursos<br />
naturais.<br />
Esta secção apresenta as condições<br />
ambientais naturais e os desafios e previsões<br />
para o futuro de Moçambique, seguindo-se<br />
o quadro institucional do país para a gestão<br />
ambiental e de desastres. Neste contexto,<br />
analisa-se a vulnerabilidade transversal<br />
das crianças de Moçambique aos riscos<br />
ambientais, concluindo a secção com as<br />
áreas prioritárias a serem abordadas.<br />
5.2. O desenvolvimento<br />
sustentável em<br />
Moçambique<br />
Diz-nos a teoria económica que existe uma<br />
forte ligação entre alterações na riqueza e<br />
na sustentabilidade do desenvolvimento: se<br />
uma família (ou uma nação) vê depreciaremse<br />
os seus activos, não está a seguir um<br />
caminho sustentável. No capítulo 1 deste<br />
estudo, foram apresentadas análises da<br />
pobreza usando medidas baseadas no<br />
consumo e baseadas em privações. No<br />
entanto, quando se discute a riqueza<br />
de uma criança ou uma nação, também<br />
podemos considerar o acesso a recursos<br />
não renováveis, recursos renováveis e terras<br />
agrícolas. Um estudo de 2009 108 mediu a<br />
riqueza per capita de Moçambique usando<br />
uma definição ampliada de riqueza. Além<br />
dos resultados económicos, os autores<br />
incluíram nos seus cálculos a acumulação de<br />
outros activos: capital humano, o ambiente e<br />
recursos naturais.<br />
Esse estudo constatou que 49 por cento<br />
da riqueza de Moçambique é derivada<br />
de capital natural, designadamente<br />
recursos minerais, terra agrícola, florestas<br />
e reservas marinhas. Esse valor é muito<br />
superior à média subsaariana de 24 por<br />
cento, implicando uma forte dependência<br />
de recursos naturais. O estudo também<br />
constatou que a degradação natural do<br />
capital de Moçambique custa ao país 360<br />
milhões de dólares americanos por ano, ou<br />
cerca de 6 por cento do PIB. A poluição da<br />
água (abastecimento de água, saneamento<br />
e higiene inseguros) constitui o maior<br />
custo ambiental em Moçambique (ver<br />
Figura 6.22). Apesar de a redução de capital<br />
natural se ter revelado relativamente baixa<br />
em Moçambique em geral, viii poderão ser<br />
elevados os efeitos das alterações climáticas.<br />
O desenvolvimento sustentável é uma<br />
questão inerentemente intergeracional e<br />
intrageracional. A realização dos direitos<br />
humanos por parte dos adultos hoje<br />
(por exemplo, o direito à alimentação e<br />
alojamento) afecta a habilidade das crianças<br />
de hoje e das gerações futuras de satisfazer<br />
os seus direitos humanos no futuro.<br />
Padrões de consumo por parte dos adultos<br />
de hoje que destroem o ambiente (por<br />
exemplo, pesca excessiva, sobre-exploração<br />
madeireira, conservação de solos pobres)<br />
terão um sério impacto na capacidade das<br />
gerações futuras de satisfazer seus direitos<br />
humanos.<br />
5.3. O impacto da degradação<br />
ambiental e das situações<br />
de emergência nas crianças<br />
em Moçambique<br />
Poluição<br />
O estudo acima referido constatou serem<br />
consideráveis os custos da poluição ix em<br />
termos ambientais, de saúde e de economia<br />
do país. Só os efeitos provocados por<br />
abastecimentos de água poluída na saúde<br />
foram estimados em cerca de 3 por cento do<br />
PIB em 2008, x enquanto os da poluição do<br />
ar de interiores (principalmente resultante<br />
do monóxido de carbono libertado pela<br />
queima de combustíveis fósseis) custam<br />
mais 1 por cento. 109 Apenas 10 por cento<br />
da população moçambicana se encontrava<br />
conectada à rede de electricidade em 2008, 110<br />
o que tem um duplo impacto ambiental: em<br />
primeiro lugar, aumenta a poluição do ar<br />
por se cozinhar com combustíveis fósseis, e,<br />
em segundo lugar, aumenta a utilização de<br />
recursos naturais para a lenha.<br />
Figura 6.22: Custo da degradação ambiental por ano, 2009<br />
$US (millions)<br />
180<br />
160<br />
140<br />
120<br />
100<br />
80<br />
60<br />
40<br />
20<br />
0<br />
Degradação<br />
do solo<br />
Custos da<br />
desflorestação<br />
Poluição<br />
da água<br />
Ambientes marinhos poluídos e sobreexploração<br />
da pesca têm-se tornado um<br />
problema crescente em muitas áreas<br />
costeiras para as comunidades que<br />
dependem da diminuição das reservas de<br />
peixes para sua subsistência. 111 O PARPA<br />
II destacou explicitamente a importância<br />
económica das pescas, reconhecendo que a<br />
pesca excessiva, a poluição e a degradação<br />
do habitat têm vindo a diminuir a capacidade<br />
das comunidades costeiras de manter<br />
os seus modos de subsistência. O plano<br />
identificou várias acções para promover a<br />
sustentabilidade ambiental, aumentando<br />
simultaneamente a produtividade<br />
económica, 112 mas o relatório de avaliação do<br />
PARPA II indicou que esses objectivos não<br />
foram totalmente satisfeitos. 113<br />
Saúde<br />
Um relatório de 2006 encomendado pela<br />
OMS constatou que, embora 23 por cento<br />
de todas as mortes prematuras tenham<br />
sido atribuíveis a factores ambientais<br />
Poluição do ar Seca Inundações<br />
Fonte: Ollivier, T, et al, Natural Resources, Environment, and Sustainable Growth in <strong>Mozambique</strong>, Agência Francesa de<br />
Desenvolvimento, 2009.<br />
viii O estudo observou, no entanto, que os números nacionais incluem muitas áreas com muito baixa densidade<br />
populacional, podendo obscurecer algumas das práticas de exploração agrícola que se verificam a nível local.<br />
ix Poluição inclui poluição do ar livre, poluição do ar dentro de casa e poluição da água.<br />
x Como discutido no Capítulo 3, menos de metade dos agregados familiares têm acesso a água potável.<br />
218<br />
219
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
modificáveis, esse número subiu para<br />
36 por cento nas crianças menores de 15<br />
anos. Pesquisadores e profissionais de<br />
saúde têm observado há muito tempo a<br />
relação entre factores ambientais, como a<br />
poluição do ar, e efeitos na saúde, como<br />
a asma, mas recentemente começaram a<br />
tocar o alarme com mais urgência. Entre<br />
aqueles cuja saúde está ameaçada por<br />
riscos ambientais, as crianças constituem<br />
o maior grupo. As crianças pequenas são<br />
ainda mais vulneráveis: o número de anos<br />
de vida saudável per capita perdidos devido<br />
a factores ambientais foi cerca de cinco<br />
vezes maior em crianças menores de cinco<br />
anos do que na população total. A malária e<br />
infecções respiratórias, as principais causas<br />
de mortalidade infantil em Moçambique (ver<br />
Capítulo 3), encontram-se também entre as<br />
doenças mais fortemente ligadas a factores<br />
ambientais modificáveis. A diarreia, uma das<br />
principais causas subjacentes à mortalidade<br />
infantil, tem um fardo de doença ambiental<br />
na ordem dos 94 por cento. 114<br />
Os desastres naturais, interrompendo o<br />
acesso aos serviços de saúde, afectam a<br />
saúde das crianças, interrompendo o acesso<br />
a unidades sanitárias. Ciclones e inundações,<br />
em particular, podem danificar infraestrutura<br />
sanitária e estradas, o que pode<br />
dificultar ou impossibilitar o fornecimento<br />
de suprimentos médicos. As famílias<br />
deslocadas de suas casas devido a situações<br />
de emergência ficam frequentemente<br />
incapazes de aceder a cuidados de saúde ou<br />
de dar continuidade a tratamentos regulares,<br />
como, por exemplo, para o HIV.<br />
Água e saneamento<br />
O stress hídrico faz com que aumentem as<br />
ameaças à saúde. Um deficiente saneamento<br />
é frequentemente agravado por condições<br />
ambientais como inundações e secas,<br />
conduzindo geralmente as primeiras a<br />
um aumento das doenças de veiculação<br />
hídrica, como a cólera, e as segundas, ao<br />
aumento das doenças resultantes de falta de<br />
higiene (water-washed diseases), como, por<br />
exemplo, o tracoma. 115 Outro risco de saúde<br />
relacionado com a água que por vezes surge,<br />
sobretudo no norte de Moçambique, é o de<br />
maiores níveis de cianeto se concentrarem<br />
na raiz da mandioca em épocas de seca.<br />
Altas concentrações da toxina são uma<br />
causa de paraparesia espástica (também<br />
conhecida como konzo ou mantakassa),<br />
especialmente em crianças e mulheres que<br />
podem já se encontrar desnutridas. 116 117<br />
A maior parte da vulnerabilidade do país a<br />
riscos ambientais está directamente ligada<br />
à água, seja à falta seja ao excesso. Tanto<br />
as secas como as inundações podem ter<br />
efeitos devastadores sobre o acesso das<br />
crianças a água potável e saneamento. Os<br />
poços pouco profundos que, normalmente,<br />
sustentam as comunidades podem<br />
secar em épocas de seca, colocando<br />
pressão excessiva sobre quaisquer poços<br />
mais profundos que possam existir. As<br />
inundações podem contaminar a água<br />
potável, especialmente em áreas que<br />
também tenham fraco saneamento. Uma<br />
fraca infraestrutura de água e saneamento<br />
pode ser facilmente danificada por cheias e<br />
ciclones, e áreas com drenagem deficiente<br />
podem aumentar o risco de cólera e<br />
outras doenças de veiculação hídrica, bem<br />
como tornar-se locais de reprodução de<br />
mosquitos transmissores de malária e<br />
outras doenças transmitidas por vectores. 118<br />
Como observado anteriormente, as crianças,<br />
devido à sua fisiologia e porque o seu<br />
comportamento muitas vezes as coloca em<br />
maior contacto com água contaminada,<br />
são particularmente vulneráveis a doenças<br />
relacionadas com o saneamento. 119<br />
Nutrição<br />
A segurança alimentar e a nutrição em<br />
Moçambique estão fortemente ligadas<br />
às condições ambientais. Tanto as<br />
inundações como a seca causam amplas<br />
perdas agrícolas às famílias dependentes<br />
da agricultura de subsistência. Mais de<br />
70 por cento da população depende da<br />
agricultura de sequeiro, o que torna o<br />
país particularmente vulnerável ao stress<br />
hídrico que regularmente se verifica,<br />
embora nem sempre nos mesmos lugares<br />
ao mesmo tempo. Por exemplo, em 2001-<br />
2002, as secas no sul de Moçambique<br />
provocaram a perda de cerca de um terço<br />
da safra, levando o Governo a pedir ajuda<br />
internacional adicional para alimentar cerca<br />
de 650.000 pessoas. No mesmo ano, no<br />
entanto, a parte norte do país conheceu<br />
uma produção de alimentos excedentária,<br />
tendo havido muitas vendas através de<br />
mercados informais para o vizinho Malawi. 120<br />
Em 2006, o Secretariado Técnico de<br />
Segurança Alimentar e Nutricional (SETSAN)<br />
determinou que cerca de 35 por cento da<br />
população se encontrava em situação de<br />
insegurança alimentar crónica, 121 embora<br />
o número de pessoas com insegurança<br />
alimentar grave em determinado momento<br />
varie; a cifra de Outubro de 2009 publicada<br />
pelo SETSAN era 281.300, isto é, menos<br />
de 2 por cento da população a necessitar<br />
de assistência imediata. 122 Em média, os<br />
agregados familiares rurais só têm uma<br />
cultura suficientemente estável durante 6-8<br />
meses. 123<br />
Uma segurança alimentar reduzida muitas<br />
leva frequentemente as famílias de fracos<br />
recursos a adoptarem mecanismos para<br />
fazer face a dificuldades que não são no<br />
melhor interesse da nutrição infantil. Os<br />
efeitos da desnutrição em crianças podem<br />
ser graves e permanentes. As principais<br />
estratégias utilizadas por agregados<br />
familiares rurais em situação de insegurança<br />
alimentar são comer alimentos de menos<br />
preferência, reduzir o número de refeições<br />
por dia, e comer a totalidade ou parte das<br />
reservas de sementes para a campanha<br />
seguinte (ver Tabela 6.4). Se os adultos<br />
podem conseguir adaptar-se a essas<br />
mudanças na sua dieta, pelo menos no<br />
curto prazo, os efeitos sobre as crianças<br />
são mais graves devido às suas diferentes<br />
necessidades nutricionais.<br />
O esgotamento e a erosão do solo também<br />
afectam a segurança alimentar em<br />
Moçambique. Sem suficiente fertilizante<br />
para sustentar a terra, os níveis de nutrientes<br />
no solo e, por consequência, a produção<br />
Tabela 6.4: Estratégias para fazer face a dificuldades usadas anualmente na época seca no Moçambique rural,<br />
2009, percentagem<br />
Agregados familiares com carência de alimentos (%)<br />
Campanha agrícola<br />
2005 2006 2007 2008<br />
38 37 27 31<br />
Comer alimentos de menor preferência 88 90 87 87<br />
Reduzir o número de refeições 82 85 82 82<br />
Comer a totalidade ou parte da semente 54 49 41 54<br />
Estratégias usadas para<br />
enfrentar a situação<br />
durante a estação seca<br />
(%)<br />
Incrementar as actividades de geração de<br />
rendimento 38 51 50 41<br />
Partilhar alimentos com a família/os vizinhos 40 38 47 39<br />
Vender bens de maneira fora do comum 18 26 19 18<br />
Pedir dinheiro emprestado 11 17 15 12<br />
Procurar assistência governamental, de igrejas<br />
e ONGs 4 5 4 3<br />
Mandar crianças para outros agregados<br />
familiares 3 3 4 3<br />
Tirar as crianças da escola 2 2 2 2<br />
Outras 2 2 3 2<br />
Fonte: Cunguara, Benedito e Brendan Kelly, ‘Trends in agriculture producers’ income in rural <strong>Mozambique</strong>’, estudo contributivo para<br />
o Impact Evaluation Report of PARPA II, MPD, 2009.<br />
220<br />
221
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
agrícola, decrescem rapidamente. Os<br />
produtores devem, em seguida, limpar e<br />
cultivar novas terras, em detrimento da vida<br />
selvagem e das florestas. Em Moçambique,<br />
por tradição, os agricultores limpam a terra,<br />
cultivam-na e depois mudam de lugar para<br />
limpar mais terra, deixando a anterior em<br />
pousio para recuperar a fertilidade. Em<br />
áreas de maior densidade populacional, no<br />
entanto, os agricultores cultivam colheita<br />
após colheita, minando ou esgotando<br />
os nutrientes do solo sem nada que os<br />
compense. Com pouco acesso a fertilizantes,<br />
os agricultores são obrigados a produzir em<br />
solos menos férteis em terras marginais, em<br />
detrimento da vida selvagem e das florestas.<br />
Desastres ambientais de curto prazo em<br />
áreas que anteriormente tinham sido de<br />
relativa segurança alimentar podem levar a<br />
maiores taxas de subnutrição aguda entre<br />
as crianças, enquanto as crises de longo<br />
prazo são passíveis de aumentar o número<br />
de crianças com insuficiência de peso e<br />
baixa altura para a idade.<br />
Educação<br />
A educação das crianças é outra área que<br />
é afectada por condições ambientais tanto<br />
a longo como a curto prazo. Escolas mal<br />
construídas são muitas vezes danificadas<br />
ou destruídas por tempestades e ciclones.<br />
Em 2008, por exemplo, o ciclone Jokwe<br />
interrompeu as aulas a mais de 38.000<br />
alunos. 124 Desastres de longo prazo, como as<br />
secas, por exemplo, muitas vezes fazem as<br />
crianças abandonarem a escola, seja porque<br />
devem dedicar-se a tarefas adicionais,<br />
como acarretar água, por exemplo, seja<br />
simplesmente porque lhes falta energia<br />
para se concentrarem nos estudos, como<br />
resultado da desnutrição.<br />
A poluição ambiental e a gestão dos<br />
recursos naturais afectam o sucesso das<br />
intervenções do governo na educação.<br />
Doenças causadas por factores ambientais<br />
como a poluição do ar e da água<br />
influenciam as taxas de frequência escolar.<br />
A desnutrição, provocada tanto pelo<br />
esgotamento dos solos como pela perda de<br />
colheitas, afectará a capacidade das crianças<br />
de assimilar as lições. A desflorestação e a<br />
falta de água potável perto dos agregados<br />
familiares também podem afectar as taxas<br />
de participação das crianças, uma vez que<br />
passam mais tempo acarretando lenha<br />
e água. Estas situações podem também<br />
afectar os professores e os seus índices de<br />
assiduidade.<br />
Crianças que tenham sido deslocadas<br />
devido a desastres naturais enfrentam<br />
desafios adicionais na sua escolarização. O<br />
impacto de situações climáticas extremas<br />
e da crescente escassez de água devido<br />
às alterações climáticas é susceptível de<br />
aumentar o número de pessoas deslocadas<br />
em Moçambique. A migração temporária<br />
pode fazer com que as crianças faltem à<br />
escola, bem como causar superlotação<br />
em locais que recebem muitos refugiados<br />
ambientais. Tem sido utilizada a expressão<br />
caos ambiental para descrever situações<br />
com elevados níveis de ruído e acumulação<br />
de pessoas e falta de estrutura ou de<br />
rotinas diárias, que é a situação em que se<br />
encontram muitas crianças em contextos<br />
pós-desastre. Tem-se constatado que<br />
este tipo de caos afecta negativamente a<br />
aprendizagem das crianças e as interacções<br />
sociais. 125<br />
Desflorestação<br />
O corte de madeira para fins comerciais<br />
aumentou drasticamente e, muitas<br />
vezes, ilegalmente, nos últimos anos.<br />
Alguns analistas estimam que madeiras<br />
duras tropicais, de florestas tropicais de<br />
crescimento lento, semi-áridas e secas têm<br />
vindo a diminuir a uma taxa que poderá<br />
fazer com que o recurso se esgote em<br />
5/10 anos. 126 Um estudo de 2006 conclui<br />
que compradores de madeira asiáticos,<br />
homens de negócios locais e membros do<br />
Governo de Moçambique e seus serviços<br />
florestais estão a agir em conluio para tirar<br />
madeiras tropicais preciosas,” 127 estando<br />
a ser exportadas grandes quantidades de<br />
madeiras duras ilegais não processadas<br />
através do porto de Nacala, no norte de<br />
Moçambique. O mesmo estudo estima que<br />
se está a fazer exploração ilegal de madeiras<br />
pelo menos em tão grande escala como a<br />
actividade madeireira legal.<br />
Quase metade da perda florestal de<br />
África é resultado de as pessoas cortarem<br />
árvores para lenha ou carvão. 128 Estimase<br />
que o carvão seja a principal fonte de<br />
combustível de 80 por cento da população<br />
de Moçambique, 129 e que tenha um efeito<br />
ainda maior sobre a desflorestação do que o<br />
corte comercial de madeira. A desflorestação<br />
pode fazer com que as crianças faltem à<br />
escola pois é necessário mais tempo para<br />
colectar lenha para cozinhar. Pode ser<br />
eficaz no combate à desflorestação em<br />
Moçambique uma abordagem baseada em<br />
direitos. Quando os direitos individuais e da<br />
comunidade sobre uma determinada área<br />
são contabilizados e exercidos, as pessoas<br />
podem agir para salvaguardar parte do<br />
seu valor de conservação. É necessária<br />
uma abordagem baseada em direitos<br />
Caixa 6.2. Preparação para Emergências<br />
não apenas para a conservação e gestão<br />
sustentável das florestas, mas também para<br />
responsabilização e retorno económico<br />
equitativo no sector.<br />
Protecção da criança<br />
A protecção das crianças é um desafio<br />
particular em situações de emergência,<br />
uma vez que as crianças estão expostas<br />
a maiores riscos de separação da família,<br />
exploração sexual e trauma psicológico.<br />
A interrupção dos serviços sociais afecta<br />
particularmente as crianças órfãs e<br />
vulneráveis no acesso aos serviços básicos.<br />
Embora tenha havido pouca pesquisa sobre<br />
o impacto das situações de emergência<br />
em questões de protecção da criança<br />
em Moçambique, relatórios de uma<br />
missão do comité estatal de avaliação<br />
da vulnerabilidade de 2005 levantou<br />
preocupação para com o uso de estratégias<br />
No início de 2000, graves inundações devastaram cinco províncias em Moçambique. Além de<br />
cerca de 700 pessoas terem perdido a vida nas enchentes, quase dois milhões de pessoas ficaram<br />
de outras formas gravemente afectadas e necessitando de ajuda externa.130 2001 trouxe novas<br />
cheias, que causaram danos adicionais e pressionaram ainda mais muitas áreas que ainda não<br />
tinham recuperado do desastre do ano anterior. Num seminário financiado pela Representação<br />
da Organização das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (UNOCHA)<br />
realizado em Julho de 2001, cerca de 130 delegados - incluindo governadores e administradores<br />
distritais das províncias afectadas, e outros representantes do Governo, agências das Nações<br />
Unidas, doadores bilaterais e organizações não governamentais - reuniram-se para tirar as lições<br />
das operações de salvamento e socorro. Diversas recomendações e conclusões do grupo incidiram<br />
sobre a preparação, a eficiência e a coordenação. Uma recomendação importante foi a de maior<br />
integração das actividades das diversas partes envolvidas na resposta a emergências. 131<br />
Uma medida-chave do progresso nesta área é a plena integração dos planos sectoriais no plano<br />
de contingência do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC). Em várias secções do<br />
plano de contingência é dada atenção especial às necessidades das crianças em situações de<br />
emergência. Mais recentemente, o INGC, juntamente com a Save the Children, a ONUSIDA, o<br />
FNUAP e o <strong>UNICEF</strong>, desenvolveu e aprovou o Código de Conduta para Trabalhadores Humanitários<br />
no contexto de Moçambique, com base no Boletim do Secretário-Geral das Nações Unidas<br />
sobre Medidas Especiais de Protecção contra a Exploração Sexual e o Abuso Sexual (Outubro de<br />
2003).132 Este esforço tem por base a experiência adquirida durante a resposta de emergência em<br />
2008, a qual revelou que as agências e os trabalhadores humanitários (tanto estatais como não<br />
estatais) a trabalhar no campo têm pouco conhecimento e não tinham desenvolvido mecanismos<br />
ou abordagens para combater o abuso e a exploração sexual cometidos contra mulheres e<br />
crianças pelos seus próprios funcionários.<br />
222<br />
223
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
negativas usadas por crianças para<br />
enfrentar dificuldades em zonas afectadas<br />
por secas, como, por exemplo, ‘sexo de<br />
sobrevivência’ por dinheiro, que aumenta a<br />
sua vulnerabilidade ao HIV e outras infecções<br />
de transmissão sexual.<br />
Minas terrestres<br />
As minas terrestres representam um<br />
desafio ambiental em Moçambique. Apesar<br />
de os esforços de desminagem terem<br />
prosseguido regularmente desde 1993,<br />
e de quatro províncias (Cabo Delgado,<br />
Niassa, Nampula e Zambézia) terem sido<br />
recentemente declaradas livres de minas, o<br />
Instituto Nacional de Desminagem estima<br />
que ainda houvesse mais de dez quilómetros<br />
quadrados de áreas minadas no final de<br />
2008, representando 386 locais espalhados<br />
por 59 distritos nas outras seis províncias. 133<br />
No PARPA II, a desminagem juntou-se a<br />
catástrofes naturais e problemas ambientais<br />
como um tema transversal que deve ser<br />
tratado a fim de se alcançar a redução da<br />
pobreza; a avaliação de 2009 constatou que<br />
têm sido feitos progressos neste domínio,<br />
diminuindo significativamente os riscos<br />
colocados por minas terrestres. 134 O plano de<br />
acção contra minas do governo tem como<br />
objectivo eliminar todos os campos minados<br />
conhecidos antes do prazo de Março de 2014<br />
da extensão do Tratado de Banimento de<br />
Minas.<br />
Mudança climática<br />
Um amplo relatório realizado pelo Instituto<br />
Nacional de Gestão de Calamidades<br />
(INGC) dá um quadro sombrio das<br />
condições ambientais que se esperam<br />
caso se mantenham as actuais tendências<br />
climáticas. 135 Foram usados dados<br />
recolhidos ao longo de várias décadas<br />
para gerar previsões através da aplicação<br />
de sete diferentes modelos de mudança<br />
climática. Têm sido registados em todo o<br />
país aumentos nas temperaturas médias,<br />
temperaturas máximas e duração das ondas<br />
de calor, tendência que deverá continuar a<br />
verificar-se. Prevê-se que as temperaturas<br />
médias aumentem 1,8 a 3,2 °C em 2075. As<br />
chuvas também diminuirão 2 a 9 por cento,<br />
especialmente entre Novembro e Maio, a<br />
época-chave de cultivo. Dados concernentes<br />
a precipitação indicam que já se registam<br />
no país crescentes atrasos no início da<br />
estação das chuvas. Os modelos de mudança<br />
climática antevêem que a precipitação se<br />
torne ainda menos previsível nas próximas<br />
décadas, esperando-se um aumento de<br />
precipitação na maior parte do país de<br />
Dezembro a Maio, superado por aumentos<br />
ainda maiores na evapotranspiração nos<br />
restantes meses do ano.<br />
O aumento do nível do mar constitui um<br />
outro desafio. Devido à falta de dados fiáveis<br />
no passado é difícil saber-se precisamente<br />
em que medida o aumento do nível do<br />
mar já terá afectado Moçambique, mas as<br />
projecções discutidas no relatório do INGC<br />
mostram que este resultado específico da<br />
mudança climática terá necessariamente<br />
graves consequências. Mesmo em cenário<br />
de baixa subida do nível do mar, os ciclones<br />
tropicais apresentarão um maior risco para a<br />
costa, contribuindo para uma maior erosão<br />
costeira. Os centros urbanos sofrerão danos<br />
nas infra-estruturas devido a inundações mais<br />
frequentes e, num cenário de grande subida<br />
do nível do mar, muitos portos e habitações<br />
ao longo da costa estarão completamente<br />
submersos no final do século. Espera-se que a<br />
Beira, Maputo e Quelimane sejam fortemente<br />
afectados mesmo por baixos aumentos do<br />
nível do mar; no cenário de elevada subida do<br />
nível do mar, a Beira actual tornar-se-á uma<br />
ilha, enquanto as áreas do porto de Maputo,<br />
da estação dos caminhos-de-ferro e da Costa<br />
do Sol desaparecerão debaixo de água.<br />
Prevê-se um agravamento de muitos riscos<br />
de saúde relacionados com o ambiente nos<br />
países em desenvolvimento, como resultado<br />
do aquecimento global. Um relatório<br />
da Comissão Lancet de 2009 qualificou<br />
as mudanças climáticas como a maior<br />
ameaça à saúde global do século XXI.” 136<br />
Em Moçambique, uma das consequências<br />
previstas do aumento de temperatura e das<br />
mudanças na precipitação observadas no<br />
estudo do INGC é um aumento na gama e<br />
sazonalidade de doenças transmitidas por<br />
vectores, incluindo a malária e a doença<br />
do sono africana. 137 Outras doenças que<br />
podem aumentar em Moçambique como<br />
resultado de alterações climáticas são a febre<br />
chikungunya, a meningite meningocócica, a<br />
cólera e outras diarreias, bem como doenças<br />
transmitidas por roedores. O aumento da<br />
temperatura e da perda gradual de árvores<br />
de sombra também pode aumentar os efeitos<br />
do stress térmico sobre as crianças. Porque<br />
as crianças (e os idosos) transpiram menos<br />
e têm maiores rácios de área superficial por<br />
massa corporal do que os adultos, tendem a<br />
sofrer maiores efeitos na saúde resultantes<br />
de stress térmico. 138<br />
5.4. O contexto institucional<br />
As questões ambientais em Moçambique<br />
não entraram na agenda nacional até que<br />
terminassem os piores anos da guerra civil.<br />
O Artigo 90 da Constituição confere aos<br />
cidadãos moçambicanos o direito de viver<br />
num ambiente equilibrado, bem como o<br />
dever de o defender. O artigo estabelece<br />
ainda que as autoridades estatais e locais<br />
devem adoptar políticas destinadas a<br />
proteger o meio ambiente e a promover o<br />
uso racional dos recursos naturais. 139 Em<br />
1990 foi formada a Comissão Nacional do<br />
Meio Ambiente, seguindo-se-lhe, em 1994,<br />
a criação do Ministério da Coordenação da<br />
Acção Ambiental. O novo ministério, por sua<br />
vez, desenvolveu o quadro jurídico para a<br />
gestão ambiental, que inclui uma vasta gama<br />
de políticas, legislação, estratégias e planos<br />
de acção. 140<br />
Em 1999, foi criado outro órgão<br />
governamental especificamente para lidar<br />
com a vulnerabilidade do país a crises<br />
ambientais: o INGC. O INGC é separado do<br />
MICOA, embora o Banco Mundial tenha<br />
observado em 2009 que as questões de<br />
coordenação pendentes entre o INGC e o<br />
MICOA” 141 constituem um grande desafio<br />
para a capacidade de Moçambique de<br />
reagir a catástrofes naturais. As questões de<br />
coordenação com outros ministérios estão<br />
a ser gradualmente resolvidas, pelo menos<br />
em termos de como lidar com situações de<br />
emergência; por exemplo, o INGC publica<br />
agora um plano de contingência 142 anual<br />
que inclui actividades específicas de sector<br />
para nove diferentes ministérios executarem<br />
antes, durante e depois de um desastre<br />
natural. A iminente ameaça de mudança<br />
climática, que começou a despertar mais<br />
atenção nos últimos anos, também envolveu<br />
tanto o MICOA como o INGC; por exemplo,<br />
em 2007 o ministério desenvolveu um<br />
plano de acção nacional para adaptação a<br />
alterações climáticas, 143 enquanto em 2009<br />
o INGC produziu um relatório abrangente<br />
detalhando os efeitos previstos das<br />
mudanças climáticas no país. 144<br />
A avaliação do PARPA II 2009 foi em geral<br />
favorável à componente ambiental. A análise<br />
observou que diversas novas estratégias<br />
e políticas foram desenvolvidas durante o<br />
período abrangido pelo PARPA II, e que a<br />
gestão ambiental fora integrada em alguns<br />
dos planos de desenvolvimento urbano.<br />
Enfrentar os desafios colocados pelas<br />
alterações climáticas, pela degradação<br />
ambiental e pela gestão sustentável dos<br />
recursos naturais foi identificado como uma<br />
alta prioridade para o desenvolvimento<br />
de planos do Governo a médio prazo<br />
subsequentes. A avaliação foi complementar<br />
à atenção do Governo à componente do<br />
PARPA II de catástrofes naturais, observando<br />
nomeadamente o reforço do INGC, ao qual<br />
reconheceu a manutenção de um mínimo<br />
de perdas nas cheias de 2007-2008. Entre as<br />
realizações reportadas na avaliação figuram o<br />
incremento de acções de formação junto das<br />
comunidades e outros sectores envolvidos<br />
na redução do risco de desastres, a criação<br />
de comités locais de gestão de risco e o<br />
reassentamento de 44.000 famílias de áreas<br />
de alto risco. Desafios que persistem são a<br />
integração da gestão de desastres nos Planos<br />
Económicos e Sociais e a atribuição de fundos<br />
mais adequados às províncias e distritos. 145<br />
5.5. Conclusões<br />
As questões ambientais afectam as crianças<br />
de inúmeras formas, e os efeitos da<br />
degradação ambiental deverão intensificar-se<br />
nos próximos anos. A degradação ambiental<br />
224<br />
225
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
afecta negativamente o desenvolvimento<br />
de Moçambique como país e tem<br />
profundos efeitos negativos sobre cada<br />
criança. As crianças são particularmente<br />
vulneráveis a situações de emergência nos<br />
domínios de saúde, educação e segurança.<br />
As situações de emergência poderão<br />
intensificar-se à medida que a mudança<br />
climática for aumentando a ocorrência de<br />
ciclones em Moçambique.<br />
O ambiente é considerado pelo Governo<br />
de Moçambique um tema transversal.<br />
No entanto, as acções para abordar as<br />
alterações climáticas, o ambiente e a gestão<br />
de desastres não têm sido suficientemente<br />
integradas nos diversos sectores. Têm<br />
sido atribuídos insuficientes fundos para<br />
lidar com a degradação ambiental, tanto por<br />
parte do Governo de Moçambique como<br />
dos seus parceiros, possivelmente devido<br />
ao demorado retorno desses investimentos.<br />
Sem esses investimentos, no entanto, a<br />
degradação ambiental pode vir a reduzir<br />
significativamente ou até mesmo a reverter<br />
os progressos realizados na sobrevivência<br />
infantil, na educação e na protecção. É<br />
urgente agir-se no sentido de sensibilizar<br />
as comunidades para a necessidade de<br />
se reduzirem as práticas nocivas para o<br />
ambiente e de se garantir que as iniciativas<br />
públicas e privadas sejam conduzidas<br />
de forma ambientalmente sustentável. A<br />
mudança climática é uma questão que deve<br />
ser abordada em cooperação com parceiros<br />
regionais e internacionais de Moçambique.<br />
6. Comunicação para o Desenvolvimento<br />
Na Assembleia Geral da ONU de 1996,<br />
foi aprovada uma resolução salientando<br />
a necessidade de apoiar sistemas<br />
de comunicação bidireccional que<br />
permitam diálogo e que as comunidades<br />
falem, expressem as suas aspirações e<br />
preocupações e participem nas decisões<br />
concernentes ao seu desenvolvimento”. 146<br />
Estes sistemas de comunicação e o<br />
domínio emergente da comunicação para o<br />
desenvolvimento (C4D – Communication for<br />
Development) estão a ser alvo de crescente<br />
reconhecimento em Moçambique por todo<br />
o papel que podem desempenhar para fazer<br />
avançar a situação dos direitos humanos das<br />
crianças e das comunidades.<br />
Desde a adopção de uma nova constituição<br />
em 1990 que Moçambique tem assistido a um<br />
crescimento, em amplitude e profundidade,<br />
do seu sector dos media. Têm proliferado os<br />
meios de comunicação privados, os estatais<br />
têm estado a trabalhar para adoptar o formato<br />
de serviço público, e um número crescente<br />
de estações de rádio comunitárias servem<br />
as áreas rurais. Embora ainda incipiente, o<br />
crescimento da informação, da comunicação<br />
e das indústrias de entretenimento tem<br />
criado um importante ambiente propício<br />
para actividades de comunicação para o<br />
desenvolvimento. A crescente organização<br />
e capacidade de organismos da sociedade<br />
civil, incluindo os que se especializam em<br />
comunicação para o desenvolvimento,<br />
promoção da saúde, prevenção do HIV e<br />
defesa dos direitos humanos da criança,<br />
tem facilitado uma coerente - e cada vez<br />
mais descentralizada - planificação e<br />
implementação da comunicação.<br />
6.1. Desenvolvimento dos<br />
órgãos de comunicação<br />
social em Moçambique<br />
O desenvolvimento do sector dos media<br />
em Moçambique tem vindo a desempenhar<br />
um papel crucial no apoio à governação,<br />
ao desenvolvimento e à divulgação<br />
de informação desde a fundação, em<br />
1975, da Rádio Moçambique (RM), e da<br />
agência nacional de notícias, a Agência<br />
de Informação de Moçambique (AIM),<br />
detidas pelo estado. O surgimento de uma<br />
imprensa livre e independente foi permitido<br />
pela Constituição 147 , que prevê a liberdade<br />
de expressão e o direito do cidadão à<br />
informação. O artigo 74 da Constituição<br />
estabelece que os meios de comunicação<br />
desempenham um papel importante na<br />
implementação destes direitos, bem como<br />
valorizando outros direitos individuais e<br />
colectivos consagrados na Constituição.<br />
Uma ampla Lei de Imprensa, 148 aprovada<br />
em 1991 e em fase de revisão em 2009,<br />
promove ainda mais a liberdade de<br />
imprensa, cobrindo a maior parte dos<br />
aspectos dos meios de comunicação e<br />
da actividade jornalística. O regulamento<br />
da comunicação social de Moçambique<br />
está sob tutela do Gabinete de Informação<br />
(GABINFO), o órgão estatal encarregado do<br />
registo administrativo de todos os meios de<br />
comunicação. O GABINFO também emite<br />
licenças para novos órgãos de imprensa,<br />
rádio e televisão, embora as licenças<br />
para a utilização das frequências de rádio<br />
sejam passadas pelo Instituto Nacional das<br />
Comunicações de Moçambique (INCM), que<br />
faz parte do Ministério dos Transportes e<br />
Comunicações. 149<br />
Reconhecendo que as intervenções<br />
focadas na informação e comunicação são<br />
fundamentais para atrair a participação<br />
de todos os cidadãos, atendendo as suas<br />
necessidades de informação e ouvindo as<br />
suas vozes, o Plano de Acção para a Redução<br />
da Pobreza Absoluta (PARPA II) deu especial<br />
atenção ao acesso à informação e ao<br />
conhecimento como instrumento essencial<br />
para aumentar a participação e o diálogo,<br />
envolvendo os cidadãos na luta contra a<br />
pobreza. Esta aposta estratégica, combinada<br />
com a Constituição e a Lei de Imprensa, tem<br />
facilitado a rápida melhoria do acesso geral<br />
226<br />
227
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
à informação em Moçambique, estando<br />
o país a expandir-se de limitadas redes<br />
públicas para um sector de comunicação<br />
social mais pluralista que inclui a rádio,<br />
a imprensa escrita, canais de televisão,<br />
internet e serviços móveis, pertencentes a e<br />
operados por diversos organismos estatais,<br />
comunitários, de base religiosa e privados.<br />
A rádio continua a ser o meio de<br />
comunicação de massas com maior<br />
cobertura. A emissora pública nacional,<br />
a Rádio Moçambique, chega a 80% da<br />
população, transmitindo através de 11<br />
delegações, em 21 línguas, incluindo<br />
português e inglês no serviço nacional e<br />
línguas locais em noticiários e programas<br />
provinciais. De acordo com um estudo de<br />
2005 realizado pelo Iniciativa Africana para<br />
Desenvolvimento dos Media (Africa Media<br />
Development Initiative), 98 por cento da<br />
população urbana tinha escutado rádio<br />
nos últimos 12 meses, sendo que 91 por<br />
cento dessa percentagem tinham escutado<br />
rádio nos últimos sete dias. 150 Embora a<br />
Rádio Moçambique controle as estações<br />
de rádio mais amplamente escutadas nas<br />
áreas urbanas, o Fórum Nacional de Rádios<br />
Comunitárias (FORCOM), criado em 2004,<br />
registou mais de 60 rádios comunitárias<br />
em todo o país, partindo de apenas<br />
uma em 1994. 151 As rádios comunitárias<br />
cobrem quase metade dos 128 distritos<br />
de Moçambique 152 e transmitem em<br />
português e nas línguas locais. A maioria<br />
são estações de rádio comunitárias sem fins<br />
lucrativos, muitas das quais criadas com<br />
a participação do Projecto dos Média da<br />
UNESCO; outras pertencem a organizações<br />
religiosas (principalmente à Igreja Católica),<br />
às autoridades municipais ou ao Instituto da<br />
Comunicação Social (ICS), um departamento<br />
do estado subordinado ao GABINFO com<br />
a responsabilidade de desenvolver a<br />
comunicação nas zonas rurais.<br />
Num país onde apenas 40 por cento da<br />
população fala português (e apenas 6<br />
por cento como língua materna), 153 estas<br />
estações de rádio baseadas na comunidade<br />
com programação em línguas locais são um<br />
veículo fundamental para mobilizar líderes<br />
comunitários e promover a participação de<br />
crianças, jovens e mulheres nos debates<br />
da comunidade. Uma avaliação de 2006<br />
do impacto de oito estações de rádio<br />
comunitárias revelou que quase 100 por<br />
cento dos entrevistados reportaram ouvir<br />
a rádio comunitária local; muitos foram de<br />
opinião que a rádio pertence à comunidade,<br />
uma vez que fornece informação local, dá<br />
oportunidades para as pessoas expressarem<br />
as suas opiniões e preocupações, e promove<br />
a cultura local. 154<br />
No sector da imprensa escrita, o número<br />
de jornais, revistas, folhetos e boletins<br />
informativos registados cresceu para 254 em<br />
2006. 155 Existem três principais jornais diários<br />
(Notícias, Diário de Moçambique e O País),<br />
e estabeleceram-se vários outros periódicos<br />
no mercado nos últimos anos, incluindo<br />
o primeiro jornal gratuito, @ Verdade.<br />
Apesar do aumento da imprensa escrita, as<br />
questões de disponibilidade e preço a que<br />
se juntam taxas de analfabetismo de 48 por<br />
cento na população com 15 ou mais anos de<br />
idade 156 - resulta em baixo acesso, de modo<br />
que apenas um por cento da população faz<br />
uso dos órgãos impressos. 157<br />
A nível da transmissão televisiva,<br />
existem quatro estações, nas redes de<br />
televisão pública e privada. A Televisão<br />
de Moçambique (TVM), a rede estatal que<br />
começou a funcionar em 1981, continua a<br />
dominar, chegando agora à maior parte do<br />
país graças à instalação de retransmissores<br />
em 1992, a que se seguiu passagem para<br />
satélite. As televisões privadas têm vindo<br />
a ganhar força económica e visibilidade e<br />
estão a dar início ao processo de criação de<br />
delegações e repetidores nas províncias.<br />
Embora a posse de televisão familiar tenha<br />
passado de cinco para dez por cento entre<br />
os anos de 1997 a 2007 158 159 e os padrões<br />
de visualização em grupo signifiquem que,<br />
mesmo quem não tem televisor pode, por<br />
vezes, assistir a transmissões, a televisão<br />
continua fora do alcance da maioria dos<br />
moçambicanos: o acesso à televisão<br />
depende do acesso à electricidade e da<br />
penetração do serviço, e, como tal, continua<br />
confinado aos centros urbanos.<br />
A penetração e o número de assinantes do<br />
serviço móvel em Moçambique aumentou<br />
significativamente durante a primeira<br />
década do novo século, com dois operadores<br />
de rede móvel, a mCel (pertencente à<br />
Telecomunicações de Moçambique) e a<br />
Vodacom, dividindo o mercado. Em 2000,<br />
menos de um por cento da população tinha<br />
acesso a um telefone móvel, número que<br />
aumentou para cerca de 23 por cento 160<br />
em menos de dez anos, com um total de<br />
assinantes calculado em 4,2 milhões em<br />
2008. 161 O acesso à Internet, por outro lado,<br />
é quase inteiramente restrito aos centros<br />
urbanos e continua ainda mais limitado<br />
que a televisão. Dados de 2006 indicam que<br />
havia mais de 18 provedores de Internet<br />
a nível nacional. Apenas dois por cento<br />
da população tem acesso à Internet. 162 No<br />
entanto, a Internet é cada vez mais utilizada<br />
pelo sector dos media, representado<br />
por vários sites de notícias on-line e um<br />
crescente número de blogues e fóruns de<br />
discussão.<br />
6.2. O papel de mudança dos<br />
media: comunicação para<br />
o desenvolvimento e<br />
mobilização da comunidade<br />
Não só se expandiu o alcance dos media<br />
ao longo dos anos, mas também o<br />
conteúdo e o objectivo da programação.<br />
Além do uso tradicional dos meios de<br />
comunicação como um meio de divulgação<br />
de informação ao público e de transmissão<br />
de música, a rádio e outras formas de<br />
comunicação social incluem também<br />
agora programas de educação social e<br />
desenvolvimento comunitário destinados a<br />
levar as pessoas a adoptarem e manterem<br />
comportamentos saudáveis. Têm sido<br />
desenvolvidas actividades e estratégias dos<br />
media para sensibilizar para as questões<br />
de desenvolvimento audiências de massas<br />
e formadores de opinião, para influenciar<br />
atitudes e comportamentos a nível<br />
individual e colectivo, para fortalecer grupos<br />
marginalizados e vulneráveis, incluindo<br />
crianças e jovens.<br />
Este tipo de apoio dos media também tem<br />
recebido atenção especial como factor<br />
fundamental para garantir a participação,<br />
apropriação (ownership) e responsabilidade<br />
necessárias para alcançar os ODM. 163 Nesta<br />
perspectiva, a comunicação para estratégias<br />
e abordagens de desenvolvimento relativas<br />
a intervenções-chaves para a sobrevivência<br />
da criança (como as Semanas de Saúde<br />
da Criança e a Campanha Nacional de<br />
Saneamento), e a promoção dos direitos da<br />
criança (tais como o registo de nascimento e<br />
a prevenção da violência e do abuso) estão a<br />
ser actualmente desenvolvidas e promovidas<br />
a nível nacional. Têm como objectivo munir<br />
os cuidadores e os membros da comunidade<br />
de informações essenciais para desenvolver<br />
habilidades e auto-confiança para tomar<br />
decisões informadas sobre questões que<br />
afectam as suas vidas e o bem estar das<br />
suas crianças.<br />
6.3. Iniciativas promissoras nos<br />
media moçambicanos<br />
Além das formas mais convencionais de<br />
rádio, televisão e imprensa escrita, várias<br />
modalidades alternativas de comunicação<br />
social têm vindo a ganhar uma crescente<br />
popularidade em Moçambique. Ao utilizar<br />
uma abordagem que combina vários tipos<br />
de meios de comunicação e diálogo, estas<br />
iniciativas têm um enorme potencial para<br />
envolver mais pessoas, principalmente<br />
jovens, em actividades educativas, diálogo<br />
e debate públicos. Entre elas, encontramse<br />
Centros Multimedia Comunitários<br />
(CMC), Unidades Móveis Multimedia, Rádio<br />
Criança para Criança, e programas de Teatro<br />
Comunitários.<br />
Os Centros Multimedia Comunitários<br />
combinam rádio comunitária com outras<br />
formas de Tecnologia da Informação e<br />
Comunicação (TIC). Por terem um ‘Telecentro’<br />
físico com computadores, serviço de<br />
internet, telefones, faxes, fotocopiadoras<br />
e impressoras, as pessoas e organizações<br />
da comunidade podem fazer melhor uso<br />
da informação e dos media. Os Centros<br />
Multimedia Comunitários também<br />
228<br />
229
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
proporcionam oportunidades de formação<br />
e permitem que as organizações da<br />
comunidade que os operam obtenham um<br />
pequeno rendimento de taxas cobradas para<br />
formação, utilização da internet, ou outros<br />
serviços. Em 2007, 18 Centros Multimedia<br />
Comunitários estavam operacionais em<br />
todo o país, havendo pelo menos um em<br />
cada província. 164 O quadro institucional dos<br />
Centros Multimedia Comunitários é ainda<br />
fraco 165 ; a sua utilidade e a possibilidade de<br />
serem bem sucedidos dependerão de maior<br />
propriedade e investimento do sector público.<br />
Uma segunda iniciativa promissora, gerida<br />
pelo Instituto da Comunicação Social, faz<br />
uso das Unidades Móveis Multimedia.<br />
As doze unidades estando cada viatura<br />
equipada com um projector de vídeo, um<br />
ecrã gigante de projecção de filmes, um<br />
rádio, uma tenda e materiais para testes<br />
de HIV, e materiais educativos desloca-se<br />
às comunidades rurais, onde normalmente<br />
permanece quatro dias de cada vez. Lá<br />
se encontrando, a equipe da unidade<br />
móvel mobiliza a comunidade em torno<br />
de questões-chave usando apresentações<br />
audiovisuais para envolver os participantes<br />
em diálogo e debate. As actividades são<br />
concebidas com a participação de líderes<br />
locais e, quando disponíveis, membros de<br />
associações de jovens. As unidades também<br />
oferecem uma oportunidade de testagem e<br />
aconselhamento sobre o HIV e a SIDA.<br />
Para estimular o engajamento e a<br />
participação de crianças e jovens na<br />
área dos media e proporcionar-lhes uma<br />
plataforma mais regular para exprimirem<br />
as suas opiniões, a Rádio Moçambique<br />
criou o programa Criança para Criança,<br />
que compreende transmissões de rádio<br />
comunitária feitas por crianças e destinadas<br />
a crianças. O programa Criança para<br />
Criança facilita o vínculo e a comunicação<br />
entre pais e filhos ao nível da comunidade<br />
sobre importantes questões dos direitos<br />
da criança. O programa também contribui<br />
para o cumprimento dos artigos 12, 13 e 14<br />
da Convenção dos Direitos da Criança, que<br />
estabelece os direitos da criança a liberdade<br />
de expressão, liberdade de procurar e<br />
transmitir informações e liberdade de<br />
pensamento, consciência e religião. Mais<br />
de mil crianças e adolescentes na faixa<br />
dos 11 a 18 anos 60 por cento das quais<br />
do sexo feminino 166 estão activamente<br />
envolvidas no desenvolvimento, produção<br />
e apresentação de programas de rádio. Em<br />
2007, o programa da Rádio Moçambique<br />
Criança para Criança ganhou o concurso<br />
do Dia Internacional da Criança na Rádio e<br />
Televisão na categoria ‘Excelência em Rádio’,<br />
em reconhecimento do papel central que<br />
as crianças desempenham na abordagem<br />
das questões dos direitos da criança,<br />
desenvolvendo, produzindo e apresentando<br />
programas de rádio para os seus pares.<br />
Em todo o país, mas especialmente em áreas<br />
com mais limitado acesso a tecnologia, o<br />
teatro comunitário tem provado ser um meio<br />
de comunicação interpessoal eficaz para<br />
fortalecer o conhecimento da comunidade<br />
e estimular e incentivar o debate sobre<br />
assuntos de interesse social, especialmente<br />
respeitantes a crianças e jovens. A Rede de<br />
Teatro Comunitário, com mais de 100 grupos<br />
de teatro a nível nacional, usa a abordagem<br />
Teatro do Oprimido na representação teatral<br />
em palco, abordagem essa que convida<br />
os membros do público a participarem<br />
activamente na representação. Através<br />
das suas representações, sensibilizam e<br />
promovem atitudes e comportamentos<br />
positivos 167 nas áreas de sobrevivência<br />
infantil, educação da rapariga, género e<br />
prevenção do HIV. No final de cada peça,<br />
estabelece-se um diálogo entre os actores e<br />
a plateia.<br />
6.4. Redes e parcerias amigas<br />
da criança<br />
Além das iniciativas que se estão a realizar<br />
a nível local, as redes e parcerias nacionais<br />
com os principais intervenientes na indústria<br />
dos media e da comunicação começam a<br />
mostrar o seu potencial como veículos para<br />
difundir mensagens sobre os direitos das<br />
crianças em todo o país.<br />
Para informar sobre a situação dos<br />
direitos da criança em Moçambique, a<br />
organização não governamental Instituto de<br />
Comunicação Social da África Austral (Media<br />
Institute of Southern Africa) criou uma Rede<br />
de Comunicadores Amigos da Criança) em<br />
2007, envolvendo mais de 300 jornalistas<br />
de todo o país. A rede utiliza os órgãos de<br />
comunicação para publicar artigos sobre os<br />
direitos da criança, divulgar informações e<br />
conhecimentos sobre questões da infância, e<br />
denunciar violações dos direitos da criança.<br />
Além disso, a rede promove acções de<br />
formação para capacitação de jornalistas,<br />
publica análises e recomendações regulares<br />
para os media sobre como cobrir as<br />
questões relacionadas com as crianças,<br />
participa em debates públicos com<br />
especialistas sobre temas relacionados<br />
com os direitos da criança, e participa em<br />
campanhas de sensibilização para a adopção<br />
e implementação de políticas e legislação<br />
amigas da criança. 168<br />
Em termos de parcerias com o sector<br />
privado, têm-se aproveitado os provedores<br />
de serviços de telefonia móvel para divulgar<br />
mensagens pró-sociais ocasionais. A<br />
Mcel, que reivindica mais de 3 milhões de<br />
assinantes e uma quota de mercado de 70<br />
por cento, tem vindo a apoiar actividades<br />
em prol do bem-estar das crianças em<br />
Moçambique. Em 2008, uma parceria para<br />
os Direitos da Criança em Moçambique<br />
conseguiu servir-se do poder de marketing<br />
da Mcel utilizando os seus canais de<br />
distribuição para divulgar mensagens sobre<br />
os direitos da criança. Foram impressas em<br />
mais de 10 milhões de cartões de recarga<br />
da Mcel informações relacionadas com a<br />
Lei da Criança e mensagens gerais sobre<br />
os direitos da criança. Esta colaboração<br />
desenvolveu-se em campanha nacional, com<br />
spots televisivos e de rádio, anúncios de<br />
jornal e órgãos de comunicação externos.<br />
6.5. Privação de informação<br />
Infelizmente, o recente crescimento do<br />
sector dos media ainda tem que reduzir a<br />
incidência de crianças moçambicanas com<br />
privação severa de informação, definida<br />
como a percentagem de crianças com 5<br />
a 18 anos de idade sem posse de ou sem<br />
acesso a uma televisão, rádio ou jornal<br />
no lar. Uma análise da pobreza infantil<br />
de 2009 169 solicitada para a Avaliação do<br />
Impacto do PARPA II, usando uma medida<br />
de pobreza baseada em privações inspirada<br />
nos Indicadores de Bristol 170 revelou que 40<br />
por cento das crianças estavam em situação<br />
de privação severa de informação em 2008.<br />
Não havia nenhuma evidência de qualquer<br />
mudança na percentagem de crianças com<br />
privação severa de informação entre o<br />
Inquérito Demográfico e de Saúde 2003 e<br />
o MICS 2008, em que se baseou a análise<br />
de 2009. A análise também deu a conhecer<br />
que a privação severa de informação está<br />
altamente correlacionada com a riqueza do<br />
agregado familiar da criança. As crianças dos<br />
agregados mais pobres têm quase sete vezes<br />
mais probabilidade de sofrer de privação<br />
severa de informação do que as crianças das<br />
famílias mais ricas.<br />
6.6. Conclusões<br />
Apesar dos progressos realizados no sector<br />
da comunicação, ainda não foi realizado o<br />
pleno potencial dos meios de comunicação<br />
para divulgar informações, envolver<br />
comunidades no debate e contribuir para<br />
um melhor ambiente para as crianças. Em<br />
geral, o alcance dos media e a sua utilidade<br />
na implementação de mudanças no bemestar<br />
da criança são ainda limitados no país,<br />
especialmente no que respeita à imprensa<br />
escrita, à televisão e à internet. O reforço da<br />
liberdade de expressão e a sustentabilidade<br />
das iniciativas mais recentes estão entre os<br />
maiores desafios para o sector dos media.<br />
O elevado e imutável nível de privação<br />
de informação indica que as mensagens<br />
transmitidas através de formas convencionais<br />
de comunicação social podem não atingir um<br />
grande número de crianças. Maior atenção,<br />
portanto, deve ser dada a formas alternativas<br />
de media e comunicação que estão a ganhar<br />
força em Moçambique, especialmente<br />
nas zonas rurais. As estratégias de<br />
comunicação para o desenvolvimento<br />
230<br />
231
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
centrado nas crianças têm de envolver<br />
mais nas intervenções os líderes locais, os<br />
mobilizadores sociais e os activistas.<br />
A Rede de Comunicadores Amigos da<br />
Criança mostra que os jornalistas de todo<br />
o país podem unir-se sob as questões da<br />
infância, mas é ainda preciso que se integre<br />
mais trabalho nas línguas locais usando os<br />
meios de comunicação social e os meios<br />
comunitários para divulgar as mensagens<br />
de comunicação de uma forma mais intensa.<br />
Também podem ser reforçadas parcerias<br />
com o sector privado. Como comprovado<br />
pela campanha Mcel 2008, há espaço para<br />
se explorar o uso sistemático de telefonia<br />
móvel para resultados de desenvolvimento e<br />
orientados para os direitos; outras parcerias<br />
podem também ser de grande potencial se<br />
estrategicamente desenvolvidas.<br />
Um último desafio é que a monitoria e<br />
avaliação das intervenções de comunicação<br />
para o desenvolvimento continuam<br />
dispendiosas e, portanto, limitadas,<br />
dependendo fortemente de dados qualitativos<br />
que são difíceis de aplicar nos vários<br />
programas e localizações geográficas. Esta<br />
situação deverá mudar nos próximos anos<br />
com o crescente reconhecimento de que<br />
a realização dos objectivos do Governo de<br />
redução da pobreza - assim como dos ODM<br />
- dependerão significativamente da expansão,<br />
consolidação e alinhamento dos esforços de<br />
comunicação nos vários sectores, público,<br />
privado e da sociedade civil.<br />
Referências<br />
1 Assembleia Geral das Nações Unidas,<br />
Declaração Universal dos Direitos do <strong>Home</strong>m,<br />
Nações Unidas, Nova Iorque, 1948.<br />
2 Assembleia Geral das Nações Unidas,<br />
Convenção sobre a Eliminação de Todas as<br />
Formas de Discriminação contra a Mulher,<br />
Nações Unidas, Nova Iorque, 1979.<br />
3 United Nations General Assembly, Vienna<br />
Declaration and Programme of Action, World<br />
Conference on Human Rights, Vienna, 14-25<br />
June 1993, A/CONF.157/23, 13 de Julho de<br />
1993.<br />
4 Ministério do Plano e Finanças, Plano de<br />
Acção para a Redução da Pobreza Absoluta,<br />
2001–2005, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2001<br />
5 Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Proposta de Programa do Governo para<br />
2010–2014, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 17 de Fevereiro de 2010.<br />
6 Ibid<br />
7 Tvedten, Inge, Margarida Paulo e Georgina<br />
Montserrat, Gender Policies and Feminization<br />
of Poverty in <strong>Mozambique</strong>, CMI Report, Chr.<br />
Michelsen Institute, Bergen, 2008.<br />
8 Cruzeiro do Sul, ‘Análise multidimensional<br />
da pobreza em três aldeias do norte de<br />
Moçambique, Relatório Final’, Maputo, 2007.<br />
9 Cuangara, Benedito e Brendan Kelly,<br />
‘The impact of the PARPA II in promoting<br />
the agricultural sector in <strong>Mozambique</strong>,’<br />
descarregado de: http://www.open.ac.uk/<br />
technology/mozambique/pics/d119369.pdf,<br />
2009.<br />
10 Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Plano de Acção para a Redução da<br />
Pobreza Absoluta, 2006–2009, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2006.<br />
12 Tvedten, Inge, Margarida Paulo e Georgina<br />
Montserrat, Gender Policies and Feminisation<br />
of Poverty in <strong>Mozambique</strong>, CMI Report, Chr.<br />
Michelsen Institute, Bergen, 2008.<br />
13 Instituto Nacional de Estatística , ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
14 Ministry of Education and Culture, Education<br />
Statistics: Annual school survey, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2004, 2005, 2006, 2007,<br />
2008.<br />
15 Ibid<br />
16 Pinheiro, Paulo Sérgio, World Report on<br />
Violence Against Children, Estudo do<br />
Secretário Geral das Nações Unidas sobre a<br />
Violência contra a Criança, Genebra, 2006.<br />
17 Tvedten, Inge, Margarida Paulo e Georgina<br />
Montserrat, Gender Policies and Feminisation<br />
of Poverty in <strong>Mozambique</strong>, CMI Report, Chr.<br />
Michelsen Institute, Bergen, 2008.<br />
18 United Nations Committee on the Elimination<br />
of Discrimination against Women,<br />
‘Consideration of reports submitted by States<br />
Parties under article 18 of the Convention on<br />
the Elimination of All Forms of Discrimination<br />
against Women, Combined initial and<br />
second periodic reports of States Parties<br />
– <strong>Mozambique</strong>,’ CEDAW/C/MOZ/1-2, Nações<br />
Unidas, Genebra, 14 de Novembro de 2005.<br />
19 Tvedten, Inge, Margarida Paulo e Carmeliza<br />
Rosário, “Opitanha”: Social relations of rural<br />
poverty in northern <strong>Mozambique</strong>, CMI Report<br />
2006:16, Chr. Michelsen Institute, Bergen,<br />
Noruega, 2006.<br />
20 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
21 Ibid<br />
11 Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Ministério da Mulher e da Acção Social e<br />
Grupo de Coordenação de Género, Gender<br />
Development Index no Contexto da Avaliação<br />
do PARPA II, 2006–2009), Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
22 Tvedten, Inge, Margarida Paulo e Carmeliza<br />
Rosário, “Opitanha”: Social relations of rural<br />
poverty in northern <strong>Mozambique</strong>, CMI Report<br />
2006:16, Chr. Michelsen Institute, Bergen,<br />
Noruega, 2006.<br />
232<br />
233
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
23 Tvedten, Inge, Margarida Paulo e Georgina<br />
Montserrat, Gender Policies and Feminisation<br />
of Poverty in <strong>Mozambique</strong>, CMI Report, Chr.<br />
Michelsen Institute, Bergen, 2008.<br />
24 United Nations Committee on the Elimination<br />
of Discrimination against Women,<br />
‘Consideration of reports submitted by States<br />
Parties under article 18 of the Convention on<br />
the Elimination of All Forms of Discrimination<br />
against Women, Combined initial and<br />
second periodic reports of States Parties<br />
– <strong>Mozambique</strong>’, CEDAW/C/MOZ/1-2, Nações<br />
Unidas, Genebra, 14 de Novembro de 2005.<br />
25 United Nations, Declaration of Commitment<br />
on HIV/AIDS, Sessão Especial da Assembleia<br />
Geral das Nações Unidas sobre o HIV/SIDA,<br />
25–27 de Julho 2001.<br />
26 Southern African Research and<br />
Documentation Centre, Instituto Superior de<br />
Relações Internacionais, National Institute<br />
of Statistics e United Nations Development<br />
Programme, <strong>Mozambique</strong> National Human<br />
Development Report 2007, UNDP, Maputo,<br />
2007.<br />
27 Instituto Nacional de Estatística e Ministério<br />
da Saúde, Inquérito Nacional de Prevalência.<br />
Riscos Comportamentais e Informação sobre<br />
o HIV e SIDA em Mocambique (INSIDA),<br />
Relatório Preliminar sobre a Prevalência da<br />
Infecção por HIV, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2009.<br />
28 Instituto Nacional de Estatística, Ministério<br />
da Saúde, Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Centro de Estudos<br />
Africanos da Universidade Eduardo Mondlane,<br />
Conselho Nacional de Combate ao HIV/SIDA e<br />
Faculdade de Medicina, Impacto Demográfico<br />
do HIV/SIDA em Moçambique, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, Setembro de 2008.<br />
29 AIDS Accountability International, ‘The AIDS<br />
Accountability Scorecard on Women 2009’,<br />
Joint United Nations Programme on HIV/<br />
AIDS, Genebra, 2009.<br />
30 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
de Indicadores Múltiplos 2008. Sumário,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2008.<br />
31 Ministry of Planning and Development,<br />
‘Poverty and Wellbeing in <strong>Mozambique</strong>: Third<br />
National Poverty Assessment.’ Governo de<br />
Moçambique, Setembro de 2010.<br />
32 Fox, Louise, Beating the Odds: Sustaining<br />
inclusion in <strong>Mozambique</strong>’s growing economy,<br />
The World Bank, Washington, D.C., 2008.<br />
33 United Nations Development Programme,<br />
<strong>Mozambique</strong> National Human Development<br />
Report 2007, UNDP, Maputo, 2007.<br />
34 Ibid.<br />
35 James, Robert C., Channing Arndt and<br />
Kenneth R. Simler, ‘Has Economic Growth<br />
in <strong>Mozambique</strong> Been Pro-Poor?’ Relatório<br />
de Discussão E8, Moçambique Ministério<br />
do Plano e Finanças, Direcção Nacional<br />
de Estudos e Análise de Políticas, Purdue<br />
University e International Food Policy and<br />
Research Institute, Maputo, 2005.<br />
36 Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Relatório de Avaliação de Impacto do PARPA<br />
II, 30 Outubro de 2009, para. 108, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
37 <strong>UNICEF</strong>, Trends in Child Poverty in<br />
<strong>Mozambique</strong>. A deprivations-based approach,<br />
Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2009.<br />
38 <strong>UNICEF</strong>, Trends in Child Poverty in<br />
<strong>Mozambique</strong>. A deprivations-based approach,<br />
Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2009.<br />
39 Ibid<br />
40 Ibid<br />
41 Instituto Nacional de Estatística e Ministério<br />
da Saúde, Inquérito Nacional de Prevalência.<br />
Riscos Comportamentais e Informação sobre<br />
o HIV e SIDA em Mocambique (INSIDA),<br />
Relatório Preliminar sobre a Prevalência da<br />
Infecção por HIV, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2009.<br />
42 <strong>UNICEF</strong>, Trends in Child Poverty in<br />
<strong>Mozambique</strong>. A deprivations-based approach,<br />
Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2009.<br />
43 McCoy, Simon, and ImarcianaCunamizana,<br />
Provincial Budget Allocations in the Health,<br />
Education and Water Sectors: An analysis<br />
2003–2006, Discussion paper no. 58E,<br />
<strong>UNICEF</strong> Moçambique e Direcção Nacional de<br />
Estudos e Análises de Políticas, Ministério<br />
de Planificação e Desenvolvimento, Maputo,<br />
Janeiro de 2008.<br />
44 Sal e Caldeira e Ximango Consoltores, Análise<br />
do Impacto da Estrutura das Despesas sobre o<br />
Desenvolvimento Económico e as Condições<br />
de Vida em Moçambique, Agência Suíça para<br />
o Desenvolvimento e Cooperação, 2009.<br />
45 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final’, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
46 Ibid.<br />
47 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final’, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
48 Sal e Caldeira e Ximango Consultores, Análise<br />
do Impacto da Estrutura das Despesas sobre o<br />
Desenvolvimento Económico e as Condições<br />
de Vida em Moçambique, Agência Suíça para<br />
o Desenvolvimento e Cooperação, 2009.<br />
49 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
50 Ibid<br />
51 Ministério da Mulher e da Acção Social,<br />
Inquérito sobre Violência Contra a Mulher,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2004.<br />
52 Centro de Documentação e Pesquisa para<br />
a África Austral, Instituto Superior de<br />
Relações Internacionais, Instituto Nacional<br />
de Estatística e Programa das Nações Unidas<br />
para o Desenvolvimento, Relatório Nacional<br />
de Desenvolvimento Humano de Moçambique<br />
2007, PNUD, Maputo, 2007.<br />
53 Commission on HIV/AIDS and Governance in<br />
Africa, ‘The Impacts of HIV/AIDS on Families<br />
and Communities in Africa,’ Comissão<br />
Económica para África, Adis Abeba, 2004.<br />
54 Instituto Nacional de Estatística, Ministério<br />
da Saúde, Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Centro de Estudos<br />
Africanos da Universidade Eduardo<br />
Mondlane, Conselho Nacional de Combate<br />
ao HIV/SIDA e Faculdade de Medicina,<br />
Impacto demográfico do HIV/SIDA em<br />
Moçambique: Actualização - Ronda de<br />
vigilância epidemiológica 2007, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2008.<br />
55 Centro de Documentação e Pesquisa para<br />
a África Austral, Instituto Superior de<br />
Relações Internacionais, Instituto Nacional<br />
de Estatística e Programa das Nações Unidas<br />
para o Desenvolvimento, Relatório Nacional<br />
de Desenvolvimento Humano de Moçambique<br />
2007, PNUD, Maputo, 2007.<br />
56 Ibid.<br />
57 Joint United Nations Programme on HIV/AIDS,<br />
<strong>Mozambique</strong> Modes of HIV Transmission and<br />
HIV Prevention Study, UNAIDS, Genebra,<br />
2009<br />
58 Instituto Nacional de Estatística, Ministério<br />
da Saúde, Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Centro de Estudos Africanos<br />
da Universidade Eduardo Mondlane, Conselho<br />
Nacional de Combate ao HIV/SIDA e<br />
Faculdade de Medicina, Impacto demográfico<br />
do HIV/SIDA em Moçambique. Actualização:<br />
Ronda de vigilância epidemiológica 2007,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2008.<br />
59 <strong>Mozambique</strong> National Institute of Health,<br />
London School of Hygiene and Tropical<br />
Medicine, and <strong>UNICEF</strong>, <strong>Mozambique</strong> National<br />
Childhood Mortality Study 2009, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
60 Ibid.<br />
61 Instituto Nacional de Estatística e Ministério<br />
da Saúde, Inquérito Nacional de Prevalência.<br />
Riscos Comportamentais e Informação sobre<br />
o HIV e SIDA em Mocambique (INSIDA),<br />
Relatório Preliminar sobre a Prevalência da<br />
Infecção por HIV, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2009.<br />
62 Government of <strong>Mozambique</strong> and National<br />
AIDS Council, Progress Report to the United<br />
Nations General Assembly Special Session<br />
on HIV and AIDS, 2008–2009, Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
63 Ghys, P.D., E. Kufa and M.V. George,<br />
‘Measuring trends in prevalence and incidence<br />
of HIV infection in countries with generalized<br />
epidemics,’Sexually Transmitted Infections,<br />
vol. 82, supplement 1, pp. i52–i56.<br />
64 Government of <strong>Mozambique</strong> and National<br />
AIDS Council, Progress Report to the United<br />
Nations General Assembly Special Session<br />
on HIV and AIDS, 2008–2009, Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
65 Ibid.<br />
234<br />
235
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
66 Conselho Nacional de Combate ao HIV/SIDA,<br />
UNAIDS and Global AIDS Monitoring and<br />
Evaluation Team, Mocambique: Modos de<br />
Transmissão do HIV e estudo de prevenção do<br />
HIV, Maputo, 2009.<br />
67 Arnt, Channing, ‘HIV/AIDS, Human Capital and<br />
Economic Prospects for <strong>Mozambique</strong>,’ Trade<br />
and Macroeconomic Division, International<br />
Food Policy Research Institute, Purdue<br />
University, Washington, DC, USA, 2002.<br />
68 Verde Azul Consultant Lda, for the Ministry of<br />
Education, Assessment of the Impact of HIV/<br />
AIDS on the Education Sector in <strong>Mozambique</strong>,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2000.<br />
69 United Nations, Declaration of Commitment<br />
on HIV/AIDS, United Nations General<br />
Assembly Special Session on HIV and AIDS,<br />
Genebra, 25–27 Junho de 2001.<br />
70 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
71 Ibid<br />
72 Ibid<br />
73 Leclerc-Madlala, Suzanne, ‘Intergenerational/<br />
age-disparate sex,’ policy and programme<br />
action brief from the technical meeting<br />
on young women in HIV hyper-endemic<br />
countries of southern Africa, descarregado<br />
de http://www.unaidsrstesa.org/userfiles/file/<br />
womenGirls_AgeDisparate.pdf,2010.<br />
74 Duerr, Ann, Stacey Hurst, Athena P. Kourtis,<br />
Naomi Rutenberg and Denise J. Jamieson,<br />
‘’Integrating family planning and prevention of<br />
mother-to-child HIV transmission in resourcelimited<br />
settings’ The Lancet, Vol. 366, Issue<br />
9481, pp 261-263, 2005.<br />
75 Joint United Nations Programme on HIV and<br />
AIDS, 2008 Report on Global AIDS Epidemic,<br />
UNAIDS, Genebra, 2008.<br />
76 UNAIDS, <strong>UNICEF</strong> and WHO, Children and<br />
AIDS: A stocktaking report – Actions and<br />
progress during the first year of Unite for<br />
Children, Unite against AIDS, <strong>UNICEF</strong>, Nova<br />
Iorque, 2007.<br />
77 Conselho Nacional de Combate ao HIV/SIDA,<br />
UNAIDS e Global AIDS Monitoring and<br />
Evaluation Team, Mocambique: Modos de<br />
Transmissão do HIV e estudo de prevenção do<br />
HIV, Maputo, 2009.<br />
78 Estimativas da ONUSIDA, Junho de 2010<br />
79 Conselho Nacional de Combate de HIV/SIDA<br />
‘UNGASS Relatório de Progresso, 2008-<br />
2009’ Ministério da Saúde, Governo de<br />
Moçambique, 2010.<br />
80 Estimativas da ONUSIDA, Junho de 2010.<br />
81 Ministério da Saúde, Circular No. 7820/GPS-<br />
3/DNS, Governo de Moçambique, Maputo,<br />
Novembro de 2006.<br />
82 World Health Organisation, Rapid Advice: Use<br />
of antiretroviral drugs for treating pregnant<br />
women and preventing HIV infection in<br />
infants, OMS, Genebra, Novembro de 2009.<br />
83 Ministry of Health, National ART guidelines<br />
for adults, adolescents and pregnant women,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2009.<br />
84 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
de Indicadores Múltiplos 2008. Sumário,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2008.<br />
85 Government of <strong>Mozambique</strong>, Multiple<br />
Indicator Cluster Survey 2008, Maputo, 2008.<br />
86 Instituto nacional de Estatística, Ministério<br />
da Saúde, Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Centro de Estudos<br />
Africanos da Universidade Eduardo<br />
Mondlane, Conselho Nacional de Combate<br />
ao HIV/SIDA e Faculdade de Medicina,<br />
Impacto demográfico do HIV/SIDA em<br />
Moçambique. Actualização - Ronda de<br />
Vigilância Epidemiológica 2007, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2008.<br />
87 Sturt,AS, EK Dokubo and TT Stint,<br />
‘Antiretroviral therapy (ART) for treating HIV<br />
infection in ART-eligible pregnant women.’<br />
Cochrane Database Syst Review, Stanford<br />
University, Stanford, USA, Março de 2000.<br />
88 Ministry of Health, National ART guidelines<br />
for adults, adolescents and pregnant women,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2009.<br />
89 World Health Organisation, Use of<br />
Antiretroviral Drugs for Treating Pregnant<br />
Women and Preventing HIV Infection in<br />
Infants: Recommendations for a public health<br />
approach, OMS, Genebra, 2006.<br />
90 Conselho Nacional de Combate de HIV/<br />
SIDA, ‘The National Strategic Plan for the<br />
Combat Against HIV and AIDS,’ Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2004.<br />
91 Instituto nacional de Estatística, Ministério<br />
da Saúde, Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Centro de Estudos Africanos<br />
da Universidade Eduardo Mondlane, Conselho<br />
Nacional de Combate ao HIV/SIDA e<br />
Faculdade de Medicina, Impacto demográfico<br />
do HIV/SIDA em Moçambique. Actualização<br />
- Ronda de Vigilância Epidemiológica 2007,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2008.<br />
92 Ibid<br />
93 Ibid<br />
94 National Institute of Health, London School of<br />
Hygiene and Tropical Medicine and <strong>UNICEF</strong>,<br />
<strong>Mozambique</strong> National Child Mortality Study,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2009.<br />
95 Instituto Nacional de Estatística, Ministério<br />
da Saúde, Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Centro de Estudos Africanos<br />
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