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CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />
6CAPÍTULO<br />
Questões transversais<br />
177
1. Introdução<br />
Questões<br />
transversais<br />
6CAPÍTULO<br />
Melhorar a situação dos membros mais<br />
vulneráveis da sociedade exige que se<br />
saiba quem são, onde vivem e quais<br />
os desafios e riscos que enfrentam.<br />
Moçambique não é um país homogéneo,<br />
e crianças vivendo em áreas diferentes, e<br />
inclusivamente sob o mesmo tecto, nem<br />
sempre enfrentam os mesmos níveis de<br />
vulnerabilidade. Determinadas crianças,<br />
famílias e comunidades inteiras estão<br />
ameaçadas pela presença de perigos físicos,<br />
ambientais ou sociais com que outras não<br />
têm que se preocupar. Além disso, há uma<br />
série de factores que afectam a capacidade<br />
de certos subgrupos da população de lidar<br />
com a presença de ameaças ao seu bemestar.<br />
Questões relacionadas com género,<br />
disparidades geográficas, HIV e SIDA, falta<br />
de informação e condições ambientais<br />
tornam mais complexos e desafiam cada<br />
um dos sectores discutidos nos últimos três<br />
capítulos: sobrevivência da criança, educação<br />
e protecção. Para que as intervenções a<br />
serem projectadas e implementadas para<br />
diminuir a vulnerabilidade global sejam<br />
eficazes, é fundamental uma análise<br />
aprofundada destas questões transversais<br />
e dos sistemas institucionais e sociais que<br />
estão implantados para as abordar.<br />
Este capítulo incide sobre cinco temas<br />
transversais: género, HIV e SIDA,<br />
disparidades regionais, comunicação para o<br />
desenvolvimento e meio ambiente.<br />
179
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
2. Género<br />
<strong>Home</strong>ns e mulheres usufruírem dos direitos<br />
humanos em condições de igualdade é<br />
um princípio consagrado na Declaração<br />
Universal dos Direitos do <strong>Home</strong>m. 1 Em 1979,<br />
as Nações Unidas aprovaram a Convenção<br />
sobre a Eliminação de Todas as Formas de<br />
Discriminação contra a Mulher (CEDAW), que<br />
definiu ainda os direitos legais e humanos<br />
das mulheres. 2 O princípio da igualdade<br />
no gozo de direitos foi depois reafirmado<br />
pela Declaração de Viena, adoptada por 171<br />
Estados na Conferência Mundial sobre os<br />
Direitos Humanos em Junho de 1993. 3<br />
O <strong>UNICEF</strong> está empenhado em promover<br />
a igualdade de direitos das mulheres e<br />
meninas e apoiar a sua plena participação<br />
no desenvolvimento político, social e<br />
económico das suas comunidades. Só<br />
assegurando iguais oportunidades a<br />
homens e mulheres, raparigas e rapazes, as<br />
sociedades podem esperar criar condições<br />
para acabar com a pobreza e permitir a cada<br />
indivíduo desenvolver plenamente o seu<br />
potencial.<br />
Género e desenvolvimento de género não<br />
têm unicamente a ver com os direitos<br />
das mulheres e meninas; pelo contrário,<br />
abordam todas as formas de discriminação<br />
ou preconceitos baseados no sexo das<br />
pessoas com que nos confrontamos na<br />
realização dos direitos humanos ou nos<br />
esforços para alcançar desenvolvimento.<br />
Em muitos casos, as mulheres e meninas<br />
são mais frequentemente vítimas de<br />
discriminação de género, embora também<br />
possa haver situações de meninos ou<br />
homens serem discriminados, que deverão<br />
merecer igual consideração.<br />
Moçambique ratificou a Convenção das<br />
Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas<br />
as Formas de Discriminação contra a Mulher<br />
em 1993, que entrou em vigor em 1997, bem<br />
como o Protocolo Facultativo à Convenção.<br />
Moçambique é também signatário da Carta<br />
Africana dos Direitos do <strong>Home</strong>m e dos Povos<br />
e dos Direitos da Mulher de 2005.<br />
O Ministério da Mulher e da Acção Social foi<br />
criado em 2005. i Compete-lhe implementar<br />
e coordenar as iniciativas relativas aos<br />
direitos das mulheres e crianças. O Conselho<br />
Nacional para o Avanço da Mulher é uma<br />
plataforma de coordenação multissectorial<br />
através da qual o Ministério da Mulher e da<br />
Acção Social monitora a implementação do<br />
Plano Nacional para o Avanço da Mulher.<br />
Apesar dos progressos no quadro jurídico,<br />
a discriminação com base no género, e<br />
especialmente a discriminação contra as<br />
mulheres é uma realidade em Moçambique.<br />
Ela reflecte-se em aspectos da vida social,<br />
cultural, política e económica das mulheres,<br />
incluindo os seguintes: 4<br />
• Na família, as mulheres são discriminadas<br />
pelos seus familiares directos e não<br />
recebem o mesmo tratamento que os<br />
homens. Por exemplo, os meninos são<br />
muitas vezes favorecidos em decisões<br />
sobre que membros da família deverão<br />
beneficiar de educação formal, embora<br />
a desigualdade de género na educação<br />
tenha diminuído nos últimos anos. As<br />
decisões são muitas vezes tomadas com<br />
base em práticas costumeiras, onde os<br />
meninos e os homens são definidos<br />
como os que ganham para o sustento da<br />
família, e as meninas e mulheres como<br />
i<br />
Em 2000, foi criado o Ministério para a Coordenação da Acção Social. Em 2005, o Ministério foi reestruturado passando<br />
a ser conhecido por Ministério da Mulher e da Acção Social, nome que reflecte a elevação das questões de igualdade de<br />
género em Moçambique.<br />
180
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
donas de casa. Os maiores níveis de<br />
analfabetismo nas mulheres e a falta de<br />
conhecimento dos seus direitos significam<br />
que os casos de discriminação contra<br />
as mulheres raramente são levados a<br />
um tribunal de direito. Na área laboral,<br />
são poucas as oportunidades existentes<br />
para as mulheres no sector formal,<br />
especialmente para posições de nível<br />
sénior;<br />
• Tanto os homens como as mulheres são<br />
relutantes em resolver os seus conflitos<br />
nos tribunais judiciais formais. Nas zonas<br />
rurais, os tribunais podem ficar distantes.<br />
As vítimas de violência doméstica podem<br />
estar relutantes em levar o seu parceiro<br />
a tribunal. A violência doméstica ainda<br />
não é vista como crime, mas considerada<br />
normal nas relações entre homens e<br />
mulheres.<br />
O Plano Quinquenal do Governo 2010-2014<br />
estabelece como objectivo a promoção da<br />
igualdade de oportunidades económicas,<br />
sociais e culturais para homens e mulheres. 5<br />
2.1. Aspectos de género da<br />
pobreza em Moçambique<br />
Conforme discutido no Capítulo 1, a redução<br />
da pobreza em Moçambique entre 1996/97 e<br />
2002/03 não beneficiou todos os segmentos<br />
da população da mesma forma. A pobreza<br />
foi reduzida mais significativamente nas<br />
famílias chefiadas por homens do que nas<br />
famílias chefiadas por mulheres. Embora<br />
a pobreza tenha registado uma redução<br />
de 26 por cento nos agregados familiares<br />
chefiados por homens (passando de cerca<br />
de 70 por cento em 1996/97 para 52 por<br />
cento em 2002/03), foi apenas uma redução<br />
de 6 por cento nos agregados familiares<br />
chefiados por mulheres (de cerca de 67<br />
por cento para 63 por cento entre 1996/97<br />
e 2002/03). Desta situação podem advir<br />
implicações para as crianças órfãs, uma<br />
vez que é nos agregados chefiados por<br />
mulheres que aqueles mais frequentemente<br />
se encontram. O Inquérito à Força de<br />
Trabalho (IFTRAB) 2004/05 indicou que 54<br />
por cento do total de crianças órfãs viviam<br />
em agregados familiares chefiados por<br />
mulheres, em comparação com 46 por cento<br />
em agregados chefiados por homens. 6<br />
Estudos recentes indicam que a tendência<br />
de feminização da pobreza se deve,<br />
pelo menos parcialmente, ao facto de<br />
as mulheres estarem mais fortemente<br />
envolvidas no sector agrícola do que os<br />
homens (89 por cento comparativamente<br />
a 68 por cento). 7 Ao mesmo tempo, as<br />
mulheres têm menos acesso à educação,<br />
menos oportunidades de emprego<br />
formal, mais baixos rendimentos e menos<br />
oportunidades para diversificar suas fontes<br />
de renda. Estudos mostraram também<br />
que os agregados familiares chefiados por<br />
mulheres, além de serem mais pobres em<br />
termos monetários do que os chefiados<br />
por homens, têm reduzido acesso dos<br />
social como consequência das estruturas<br />
predominantemente patriarcais da sociedade<br />
moçambicana. 8<br />
Outra prova da feminização da pobreza<br />
provém de uma análise de três Inquéritos<br />
Nacionais Agrícolas (2002, 2005 e 2008),<br />
segundo os quais, nos três anos do<br />
inquérito, os agregados familiares chefiados<br />
por mulheres estavam sobre-representados<br />
entre os agregados mais pobres. 9 Em<br />
contrapartida, a percentagem de domicílios<br />
chefiados por homens tende a aumentar à<br />
medida que sobe o quintil de rendimento<br />
(ver figura 6.1).<br />
A tendência de feminização da pobreza<br />
é suportada pela percepção da mudança<br />
registada nos agregados familiares<br />
chefiados por homens e por mulheres,<br />
respectivamente. Uma maior percentagem<br />
de agregados chefiados por mulheres<br />
do que por homens considera que a sua<br />
situação piorou nos últimos cinco anos. Ao<br />
mesmo tempo, a percepção de deterioração<br />
das condições nos domicílios chefiados por<br />
mulheres é mais pronunciada nas zonas<br />
rurais que nas urbanas, o que pode indicar<br />
melhores oportunidades para os agregados<br />
familiares chefiados por mulheres nas áreas<br />
urbanas.<br />
181
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
Figura 6.1: Percentagem de agregados familiares chefiados por homens por quintil de riqueza, 2002, 2005 e 2008<br />
Percentagem de agregados familiares<br />
chefiados por homens<br />
100%<br />
80%<br />
60%<br />
40%<br />
20%<br />
0%<br />
2002 2005 2008 2002 2005 2008 2002 2005 2008 2002 2005 2008 2002 2005 2008<br />
Quintil inferior Segundo Médio Quarto Quintil superior<br />
Fonte: Cunguara, Benedito e Brendan Kelly, ‘Trends in agriculture producers’ income in rural <strong>Mozambique</strong>’, study as input to Impact<br />
Evaluation Report of PARPA II, MPD, 2009<br />
Os níveis gerais de participação no mercado<br />
de trabalho são ligeiramente mais elevados<br />
nas mulheres em idade activa (15-59<br />
anos), 82 por cento, do que nos homens da<br />
mesma idade (79 por cento). A participação<br />
das mulheres na força de trabalho está<br />
principalmente concentrada na agricultura<br />
de subsistência nas zonas rurais, onde<br />
elas constituem 62 por cento da população<br />
activa, enquanto os homens predominam<br />
em todos os outros principais sectores da<br />
economia, onde mais se pode ganhar. As<br />
mulheres que se encontram na força de<br />
trabalho têm habilitações de níveis mais<br />
baixos que os homens: 15 por cento dos<br />
homens no mercado de trabalho chegaram<br />
ao segundo nível do ensino primário ou<br />
acima disso, comparados com apenas cinco<br />
por cento das mulheres participantes. 10<br />
Embora as mulheres constituam a maior<br />
parte da população economicamente activa,<br />
estão principalmente envolvidas no sector<br />
agrícola, principalmente na produção<br />
familiar com limitados excedentes. Quando<br />
existem oportunidades de geração de<br />
rendimento, os homens tendem a ter uma<br />
maior probabilidade de aceder a estas<br />
oportunidades e a delas beneficiar. Nas áreas<br />
urbanas, as mulheres são mais propensas<br />
a depender do sector informal devido aos<br />
mais baixos requisitos de ingresso e ao<br />
facto de o acesso ao emprego formal ser<br />
amplamente controlado pelo capital social<br />
(contactos sociais), que favorece os homens<br />
por ainda serem vistos como o ganha-pão da<br />
família.<br />
2.2. Desenvolvimento<br />
ajustado ao género e<br />
empoderamento com base<br />
em género<br />
No Relatório de Desenvolvimento Humano<br />
2009, Moçambique ocupa o 145º lugar em<br />
155 países, e é-lhe atribuído um Índice de<br />
Desenvolvimento Ajustado ao Género de<br />
0,395 em 2007. Em 1995, Moçambique<br />
alcançou um Índice de Desenvolvimento<br />
Ajustado ao Género (IDG) de 0,229,<br />
colocando-se em 123º lugar entre os 130<br />
países para os quais o índice foi calculado.<br />
Quer isto dizer que embora Moçambique<br />
tenha melhorado em matéria de igualdade<br />
de género em termos absolutos, não<br />
melhorou tanto quanto outros países. O<br />
IDG nas províncias do centro e do norte foi<br />
menor do que no sul.<br />
O IDG utilizado baseou-se em três<br />
indicadores a que se atribuiu peso igual:<br />
• Esperança de vida ao nascer;<br />
• Uma combinação da taxa de alfabetização<br />
de adultos com a taxa líquida de<br />
182
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
escolarização combinada nos níveis<br />
primário, secundário e terciário;<br />
• Produto Interno Bruto per capita expresso<br />
como paridade do poder de compra em<br />
dólares americanos<br />
Foi solicitado, como parte da avaliação<br />
do impacto do PARPA II 2009, 11 um estudo<br />
para actualizar o IDG do Programa de<br />
Desenvolvimento das Nações Unidas<br />
concernente a Moçambique.<br />
O IDG foi calculado de acordo com quatro<br />
cenários diferentes: três utilizando diferentes<br />
métodos de determinação da diferença<br />
salarial entre homens e mulheres, e um<br />
usando uma esperança de vida ajustada<br />
considerando o impacto da SIDA:<br />
• Cenário A: diferença salarial não agrícola<br />
calculada com base em diferentes níveis<br />
de qualificação de homens e mulheres;<br />
• Cenário B: diferença salarial global<br />
(agrícola e não agrícola), com base em<br />
diferentes níveis de qualificação de<br />
homens e mulheres;<br />
• Cenário C: diferença salarial não agrícola<br />
com base no pressuposto do Programa de<br />
Desenvolvimento das Nações Unidas de<br />
que, em média, as mulheres ganham 75<br />
por cento do salário de seus congéneres<br />
do sexo masculino;<br />
• Cenário D: usando estimativas de<br />
esperança de vida ajustadas tendo em<br />
conta a SIDA. O Cenário D fornece uma<br />
ilustração do impacto do HIV sobre o<br />
Índice de Desenvolvimento Ajustado ao<br />
Género na ausência de intervenções de<br />
prevenção e tratamento da SIDA.<br />
De acordo com os cenários A e C, a meta do<br />
PARPA II para o IDG foi atingida em 2008,<br />
resultado que o relatório atribuiu ao elevado<br />
nível de equidade de género alcançado nas<br />
matrículas na escola primária.<br />
Moçambique saiu-se muito melhor na<br />
Medida de Participação Segundo o Género<br />
(MPG) que foi calculada em 0,350, o que<br />
coloca o país em 61º lugar de entre 116<br />
países. A MPG foi mais um reflexo da<br />
percentagem relativamente elevada de<br />
assentos parlamentares ocupados por<br />
Figura 6.2: IDG baseado em diferentes métodos de determinação da diferença salarial, 2009<br />
Índice de Desenvolvimento Ajustado ao Género<br />
0.430<br />
0.410<br />
0.390<br />
0.370<br />
0.350<br />
0.330<br />
0.310<br />
0.290<br />
0.270<br />
0.250<br />
2004 2005 2006 2007 2008<br />
Ano<br />
Cenário A Cenário B Cenário C Cenário D<br />
Fonte: Ministério de Planificação e desenvolvimento, Ministério da Mulher e da Acção Social e Grupo de Coordenação de Género<br />
(GCG), ‘Calculando o Gender Development Index no Contexto da Avaliação do PARPA II (2006–2009)’, Maputo, 2009.<br />
183
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
mulheres em Moçambique (15 por cento<br />
em 1994) e da parcela de rendimento<br />
proporcional auferida pelas mulheres (40<br />
por cento em 1994), que foi mais elevadas<br />
do que para vários outros países nos<br />
rankings. Não é apresentada nenhuma<br />
MPG para Moçambique no Relatório do<br />
Desenvolvimento Humano 2009. Existe um<br />
elevado grau de disparidade regional na<br />
MPG, situando-se no norte do país as quatro<br />
províncias com os menores (piores) índices.<br />
Defende-se que a área em que mais<br />
progressos se têm feito em termos de<br />
igualdade de género em Moçambique é<br />
a da participação política das mulheres.<br />
Moçambique possui uma elevada<br />
percentagem de mulheres em órgãos de<br />
tomada de decisões como o Parlamento,<br />
onde, após as eleições de 2004, 36 por<br />
cento dos assentos estavam ocupados<br />
por mulheres. Antes do novo Governo<br />
anunciado em 2010, o cargo de primeiroministro<br />
era ocupado por uma mulher. 12<br />
Embora tenha havido uma redução da<br />
percentagem de mulheres no Governo<br />
na sequência das eleições de 2009, a<br />
participação política das mulheres em<br />
Moçambique é elevada para os padrões<br />
regionais. Actualmente, 18 por cento dos<br />
ministros e vice-ministros e 27 por cento dos<br />
governadores provinciais são mulheres.<br />
2.3. Disparidades de género<br />
Um estudo realizado pelo Ministério de<br />
Planificação e Desenvolvimento no âmbito<br />
da Avaliação do Impacto do PARPA II<br />
2009 não revelou nenhuma diferença na<br />
percentagem de meninas e rapazes em<br />
situação de pobreza absoluta medida pela<br />
abordagem baseada em privações (ver<br />
Capítulo 1, A pobreza em Moçambique,<br />
para uma discussão mais detalhada da<br />
pobreza baseada em privações). É mais<br />
elevada a percentagem de rapazes que sofre<br />
de deficiência nutricional severa do que<br />
a de meninas (23 por cento versus 17 por<br />
cento). São inúmeras as hipóteses sobre<br />
as razões que explicam essa diferença,<br />
incluindo diferenças nas necessidades<br />
nutricionais, hábitos alimentares, acesso a<br />
alimentos e cuidados infantis, mas não há<br />
provas suficientes para confirmar ou refutar<br />
qualquer dessas possíveis explicações.<br />
As meninas têm maior probabilidade de<br />
estar severamente privadas de educação<br />
do que os meninos (13 e 10 por cento,<br />
respectivamente). No entanto, a privação<br />
de educação reduziu-se significativamente<br />
tanto nas meninas como nos rapazes entre<br />
2003 e 2008. As taxas de conclusão e de<br />
alfabetização das meninas são também são<br />
inferiores às dos rapazes, especialmente no<br />
nível secundário.<br />
2.4. Questões de género na<br />
educação<br />
O PARPA II discute a relação entre educação,<br />
redução da pobreza e crescimento<br />
económico, dando especial ênfase ao papel<br />
da educação das raparigas. Os objectivos do<br />
PARPA II para os níveis primário, secundário<br />
e terciário do sistema de ensino referem-se<br />
explicitamente a inclusão na base de género,<br />
vulnerabilidade e necessidades especiais.<br />
São também apresentadas estratégias para<br />
aumentar a educação da rapariga, incluindo<br />
lidar com a sensível, mas fundamental<br />
questão de reduzir a incidência do abuso<br />
sexual nas escolas. O Plano Quinquenal<br />
do Governo 2010-14 também define como<br />
prioritária a paridade de género na escola<br />
primária.<br />
Baixos níveis de alfabetização,<br />
especialmente nas mulheres, têm sido,<br />
desde há muitos anos, uma característica<br />
constante da sociedade moçambicana.<br />
Por exemplo, o Inquérito Demográfico<br />
e de Saúde 2003 registou uma taxa<br />
de analfabetismo de 62 por cento nas<br />
mulheres, em comparação com 33 por<br />
cento nos homens. Os relatórios de do<br />
MICS 2008 reportam que 41 por cento dos<br />
moçambicanos com 20-24 anos de idade são<br />
alfabetizados, número que sobe para 53 por<br />
cento nas jovens de 15-19 anos. 13<br />
No período 1992-2009, o número de alunos<br />
nas escolas primárias e secundárias registou<br />
184
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
um enorme aumento tanto nos rapazes<br />
como nas meninas, mas continua a haver<br />
diferenças de género em todos os níveis da<br />
educação. A diferença absoluta de género<br />
na escolarização bruta no primeiro nível do<br />
ensino primário tem diminuído desde 1999,<br />
mas continua elevada, situando-se nos 14<br />
por cento. 14<br />
A disparidade de género no número de<br />
matrículas revela uma variação geográfica<br />
considerável, com menos meninas<br />
matriculadas nas regiões centro e norte,<br />
enquanto em algumas províncias do<br />
sul, como Maputo e Inhambane, estão<br />
matriculadas ligeiramente mais raparigas do<br />
que rapazes. Em 2007, a taxa de conclusão<br />
da primeira fase do ensino primário foi de 65<br />
por cento nas raparigas e 80 por cento nos<br />
rapazes. Este diferencial de género continua<br />
a verificar-se na segunda fase do ensino<br />
primário, com taxas de conclusão de 39<br />
por cento nas raparigas e 53 por cento nos<br />
rapazes. 15<br />
O género é um importante factor de impacto<br />
no sector da educação: é particularmente<br />
forte o seu efeito nas famílias mais pobres,<br />
nas zonas rurais e nas províncias do Centro<br />
e do Norte. A disparidade de género<br />
também está a prejudicar alguns notórios<br />
ganhos, com taxas de conclusão nas<br />
meninas substancialmente inferiores às dos<br />
rapazes. Embora a diferença de género tenha<br />
diminuído nos últimos anos, continuam a<br />
existir fortes disparidades que têm de ser<br />
examinadas contemplando a situação de<br />
pobreza, o local de residência, e práticas e<br />
tradições culturais.<br />
Para promover a educação das raparigas,<br />
o Ministério da Educação tem dado grande<br />
atenção à melhoria da segurança nas<br />
escolas, definindo inclusivamente passos<br />
básicos para reagir ao abuso sexual nas<br />
escolas. Foram também empreendidos<br />
esforços para fortalecer a capacidade da<br />
unidade do Ministério responsável pelo<br />
género a fim de melhor se integrar o género<br />
e a SIDA na planificação, implementação e<br />
monitoria de processos iniciados e trabalhar<br />
com as comunidades na prevenção da<br />
educação das raparigas, do abuso sexual<br />
precoce e da gravidez. Além disso, a<br />
capacidade das unidades de género deve<br />
ser reforçada no respeitante a monitoria<br />
e notificação de abuso sexual e violência.<br />
Focalizar a educação das meninas é tanto um<br />
meio de resolver a disparidade de género<br />
como uma estratégia para alavancar ganhos<br />
ao lidar com outras disparidades.<br />
2.5. Violência, abuso e<br />
exploração<br />
Algumas formas de violência contra as<br />
mulheres e crianças estão enraizadas<br />
em dinâmicas de género da sociedade<br />
discriminatórias e de desigualdade. 16<br />
Estudos e dados disponíveis parecem indicar<br />
que a ordem social dominada por uma<br />
cultura tradicional e patriarcal machista é<br />
forte em Moçambique. 17 Continua a haver,<br />
por exemplo, casamento infantil, apesar das<br />
disposições da Lei da Família de 1997, o que<br />
parece estar relacionado com a persistência<br />
dos papéis de género tradicionalmente<br />
atribuídos a mulheres e meninas como mães<br />
e cuidadoras na sociedade.<br />
Muitas meninas vítimas não denunciam<br />
casos de estupro ou abuso sexual às<br />
autoridades, em parte devido ao estigma<br />
que envolve a questão do abuso sexual.<br />
No seu primeiro e segundo relatórios<br />
combinados ao Comité das Nações Unidas<br />
para a Convenção sobre a Eliminação da<br />
Discriminação contra as Mulheres (CEDAW),<br />
Moçambique informou que a maioria<br />
das famílias prefere resolver os casos de<br />
abuso sexual fora dos tribunais, por via de<br />
indemnização ou casamentos. O relatório<br />
também reconhece a falta de conhecimento<br />
sobre o sistema legal e atrasos excessivos<br />
no sistema judicial como obstáculos<br />
adicionais a uma solução jurídica para esses<br />
casos. 18 Fraco acesso ao sistema de justiça,<br />
insuficiente conhecimento dos direitos das<br />
mulheres, e falta de um sistema de aplicação<br />
de penas legais agravam o problema.<br />
A violência doméstica contra as mulheres<br />
é também um sério problema em<br />
185
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
Moçambique. Embora escasseiem dados<br />
quantitativos, os dados de 2004 indicam<br />
que 54 por cento das mulheres inquiridas<br />
relataram ter sido vítimas de abuso, como<br />
discutido no Capítulo 5. Revelam também<br />
esses dados uma aceitação generalizada do<br />
uso da violência. Em 2008, a percentagem<br />
de mulheres que afirmaram que os homens<br />
tinham o direito de lhes bater em certas<br />
circunstâncias, tais como sair de casa sem<br />
informar o marido ou recusar sexo, foi de<br />
36 por cento, uma redução relativamente<br />
aos 54 por cento de 2003. As mulheres mais<br />
escolarizadas são menos propensas a aceitar<br />
a violência doméstica, tal como as mulheres<br />
que vivem em áreas urbanas (ver Capítulo<br />
5). Apesar da aparente aceitação cultural da<br />
violência doméstica, outros estudos 19 têm<br />
revelado que a violência extrema resultando<br />
em danos corporais é inaceitável para as<br />
comunidades, bem como para os homens e<br />
mulheres individualmente.<br />
A prevalência de trabalho infantil é<br />
ligeiramente maior entre as meninas (24<br />
por cento) do que entre os rapazes (21 por<br />
cento). Uma maior percentagem de meninas<br />
do que meninos trabalha em tarefas<br />
domésticas (oito por cento contra cinco por<br />
cento, respectivamente). A percentagem de<br />
crianças que trabalham para apoiar negócios<br />
familiares é a mesma para ambos os sexos<br />
(16 por cento). 20<br />
São as mulheres e meninas que<br />
tradicionalmente acarretam água para a<br />
família. O MICS constatou que em 86 por<br />
cento dos agregados familiares é uma<br />
mulher adulta que se dedica a essa tarefa,<br />
enquanto em 7 por cento dos agregados<br />
familiares é uma menina (menor de 15 anos).<br />
As fontes de água situam-se normalmente<br />
muito longe de casa, uma média de cerca<br />
de 50 minutos a pé (excluindo os agregados<br />
familiares com água nas suas instalações - 9<br />
por cento). Normalmente, são feitas várias<br />
deslocações por dia para a fonte de água. 21<br />
2.6. Sistemas de Linhagem<br />
Em Moçambique, existem os dois sistemas<br />
de linhagem, patrilinear e matrilinear. Sob<br />
o sistema patriarcal, a mulher e os filhos<br />
pertencem ao marido e sua família, e é<br />
o marido que concede ao seu cônjuge do<br />
sexo feminino acesso à terra. No sistema<br />
matriarcal, a mulher e os filhos continuam<br />
a ser considerados membros da família<br />
matrilinear da mulher. Sob o sistema<br />
matriarcal, é o tio da mulher que dá acesso<br />
à terra, enquanto as crianças pertencem<br />
a familiares consanguíneos da mãe. 22 Em<br />
ambos os sistemas, patrilinear e matrilinear,<br />
as posições das mulheres baseiam-se em<br />
submissão aos membros masculinos da<br />
família - ou seja, ao marido/pai ou irmãos,<br />
respectivamente. 23<br />
Os direitos à terra são de certa forma<br />
problemáticos em Moçambique devido à<br />
existência de dois sistemas contraditórios.<br />
Oficialmente, e em conformidade com a<br />
Constituição e a Lei de Terras, a terra é<br />
propriedade inalienável do Estado. No<br />
entanto, ao abrigo do direito consuetudinário<br />
e tradição, a terra pertence à comunidade<br />
que vive em seu redor e aos antepassados<br />
dessa comunidade. O acesso à terra é gerido<br />
por uma complexa rede de tradições sociais<br />
que se constitui em torno do casamento,<br />
como base de alianças entre as famílias.<br />
Assim, os direitos hereditários à terra<br />
dependem da idade, do sexo e da condição<br />
social, inclusive do parentesco ou outros<br />
vínculos com as famílias que foram as<br />
primeiras a povoar a região. Os títulos de<br />
propriedade da terra formais não parecem<br />
ser relevantes para fins de herança. Nas<br />
sociedades patriarcais, surgem problemas<br />
em caso de divórcio ou morte do marido,<br />
onde uma mulher corre o risco de perder<br />
as suas terras e todos os seus pertences<br />
a favor de outros membros da família<br />
do falecido marido, mesmo tendo ela a<br />
responsabilidade de cuidar dos seus filhos e<br />
outros familiares. 24<br />
2.7. HIV e género<br />
A Declaração de Compromisso de 2001<br />
sobre o HIV/SIDA reconhece que as<br />
mulheres são desproporcionalmente<br />
afectadas pela SIDA no quadro global,<br />
devendo merecer prioridade nas respostas<br />
186
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
nacionais e globais. 25 A dimensão de género<br />
do HIV e da SIDA tem uma componente<br />
biológica e uma componente social.<br />
Biologicamente, as mulheres são mais<br />
vulneráveis à infecção pelo HIV do que<br />
homens, sendo as meninas ainda mais<br />
vulneráveis. No entanto, o mais importante<br />
para determinar o diferencial na transmissão<br />
e no impacto nas mulheres é a componente<br />
social. Em Moçambique, é ensinado às<br />
mulheres que o sexo é uma estratégia de<br />
sobrevivência, pelo que é frequente elas<br />
se submeterem às decisões dos homens,<br />
tendo menos capacidade para negociar<br />
sexo seguro, fidelidade ou abstinência.<br />
Sexo coagido ou forçado e violência sexual<br />
exacerbam as vulnerabilidades biológicas e<br />
sociais das mulheres à infecção. As meninas<br />
tendem a iniciar relações sexuais regulares<br />
mais cedo do que meninos, aumentando o<br />
risco de transmissão. 26<br />
Como resultado destes dois grupos de<br />
factores, a prevalência de infecção em<br />
mulheres de 15-49 anos (13,1 por cento) é<br />
mais de um terço superior à dos homens<br />
da mesma faixa etária (9,2 por cento). Entre<br />
as mulheres na faixa etária de 15-24 anos,<br />
a prevalência do HIV é 3 vezes superior à<br />
dos homens da mesma idade. 27 28 A AIDS<br />
Accountability International preparou um<br />
Scorecard on Woman que classifica as<br />
respostas dos Governos à epidemia de SIDA<br />
a partir de uma perspectiva de género. Os<br />
seis elementos fundamentais incluídos no<br />
Scorecard são: recolha de dados, género,<br />
ambiente político e legal, programas<br />
nacionais, conhecimento, comportamento<br />
e impacto. É atribuída aos países uma<br />
classificação de A (muito bom) a E (muito<br />
fraco) para cada elemento. Ver Tabela 6.1<br />
abaixo com a pontuação de Moçambique. 29<br />
187
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
Tabela 6.1: Scorecard para a resposta do Governo de Moçambique à SIDA numa perspectiva de género<br />
Recolha de dados<br />
Integração sistemática de género<br />
Ambiente de políticas e legal<br />
Programas nacionais<br />
Conhecimento e comportamento<br />
Impacto<br />
Pontuação<br />
A – Muito bom<br />
C – Médio<br />
C – Médio<br />
B – Bom<br />
A – Muito bom<br />
C – Médio<br />
Fonte: AIDS Accountability International, ‘The AIDS Accountability Scorecard on Women 2009’, Joint United Nations Programme on<br />
HIV/AIDS, Geneva, 2009.<br />
2.8. Conclusões<br />
As mulheres têm maior probabilidade de<br />
viver em situação de pobreza do que os<br />
homens em Moçambique. A incidência<br />
da pobreza em agregados familiares<br />
chefiados por mulheres é superior à<br />
dos agregados familiares chefiados por<br />
homens. As mulheres têm menos acesso<br />
ao emprego formal do que os homens, e<br />
tendem a trabalhar em indústrias de menor<br />
remuneração. Há indícios, no entanto, de<br />
que a desigualdade entre os homens e as<br />
mulheres tem diminuído em Moçambique<br />
nos últimos anos.<br />
Existe uma clara relação entre o bemestar<br />
das mulheres e o bem-estar de<br />
seus filhos. Mães instruídas são mais<br />
propensas a ter filhos mais instruídos,<br />
mais saudáveis, menos vulneráveis. Tendo<br />
como alvo raparigas a frequentarem<br />
escolas, os programas de saúde e protecção<br />
podem não só melhorar o bem-estar das<br />
pessoas abrangidas, como também gerar<br />
significativos efeitos secundários positivos<br />
nos futuros filhos dessas meninas.<br />
A paridade de género na educação, em<br />
termos de taxas de frequência, tem vindo<br />
a melhorar. No que respeita a taxas de<br />
alfabetização e conclusão, no entanto,<br />
persistem consideráveis disparidades.<br />
Na promoção do acesso das mulheres à<br />
educação é fundamental melhorar-se a<br />
segurança nas escolas. Para isso, é preciso<br />
que se reforce a capacidade das unidades<br />
de género para monitorar e reportar abuso e<br />
violência sexual.<br />
A violência contra a mulher é comum e<br />
é considerada aceitável por uma grande<br />
percentagem de mulheres, bem como<br />
pela sociedade em geral. Para diminuir<br />
a incidência de violência de género são<br />
necessárias iniciativas de sensibilização para<br />
mudar as mentes e divulgação de melhor<br />
informação.<br />
188
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
3. Disparidades geográficas<br />
Moçambique é um país grande com uma<br />
densidade populacional relativamente baixa.<br />
Cobre uma superfície de aproximadamente<br />
802.000 km2 e tem um litoral que se estende<br />
por quase 2.500 km, desde a África do<br />
Sul, no sul, até à Tanzânia, no norte. A<br />
densidade populacional média é de cerca de<br />
26 habitantes por km2. Relacionada com a<br />
grande extensão geográfica do país está a<br />
sua diversidade linguística, cultural e étnica.<br />
São diferentes as tradições e costumes<br />
entre as várias regiões. Mais de uma dezena<br />
de línguas locais, algumas das quais com<br />
seus próprios dialectos, são faladas em<br />
Moçambique. O português é a língua oficial<br />
e da administração, mas menos de dez<br />
por cento da população o fala como língua<br />
materna, e apenas cerca de 40 por cento o<br />
aprendeu a falar. 30<br />
Os dados revelam a existência de claras<br />
disparidades na incidência da pobreza entre<br />
as províncias. Por exemplo, a incidência<br />
da pobreza no inquérito de 2008/09 varia<br />
entre 71 por cento em Inhambane e 31 por<br />
cento no Niassa. Continua a haver uma<br />
significativa demarcação urbano/rural em<br />
termos de taxas de pobreza: 57 por cento<br />
dos habitantes rurais vivem em pobreza<br />
absoluta em comparação com 50 por cento<br />
da população urbana. 31<br />
O acesso aos serviços sociais básicos é<br />
geralmente mais elevado no sul do país. As<br />
disparidades no Índice de Desenvolvimento<br />
Humano (IDH) e no IDG do Programa das<br />
Nações Unidas para o Desenvolvimento<br />
têm feito ver que as províncias do norte do<br />
país geralmente apresentam mais baixos<br />
níveis de desenvolvimento humano do que<br />
as do centro ou do sul. 32 Todas as províncias<br />
do país apresentaram melhorias nos seus<br />
IDG entre 2001 e 2006. 33 Outros indicadoreschave,<br />
incluindo o PIB per capita, também<br />
apresentam uma variação considerável entre<br />
as províncias. 34 Há alguma evidência de que<br />
as desigualdades no consumo que existem<br />
em Moçambique são frequentemente<br />
mais pronunciadas no seio das regiões e<br />
províncias do que entre elas. 35<br />
No seu primeiro Plano de Acção para a<br />
Redução da Pobreza Absoluta (PARPA I),<br />
o governo de Moçambique reconheceu a<br />
desigualdades económicas e sociais entre<br />
a área Maputo-Matola e arredores e o<br />
resto do país como sendo “a característica<br />
mais visível” do país. Essa desigualdade<br />
é atribuída a vários factores, incluindo a<br />
guerra civil. O segundo Plano de Acção para<br />
a Redução da Pobreza Absoluta (PARPA<br />
II) também observou que as medidas de<br />
pobreza, tanto baseada no consumo como<br />
não baseada no rendimento variavam<br />
consideravelmente entre as províncias. Lidar<br />
com as disparidades regionais foi objectivo<br />
prioritário do PARPA I, bem como do PARPA<br />
II. A avaliação de impacto do PARPA II<br />
realizada em 2009 concluiu ter havido uma<br />
ligeira redução das disparidades, embora<br />
estas, no que respeita a agricultura, tenham<br />
aumentado, enquanto as dos sectores de<br />
saúde e educação se continuam a manter a<br />
níveis elevados. 36<br />
Também se vêm disparidades provinciais<br />
em relação às medidas da pobreza não<br />
baseadas no rendimento. Um estudo sobre a<br />
privação severa nas crianças efectuado como<br />
parte da avaliação do PARPA II (ver Capítulo<br />
1) revelou que, em 2003 e 2008, a maior<br />
percentagem de crianças com privações<br />
severas vivia na província da Zambézia, 80<br />
por cento em 2003 e 64 por cento em 2008<br />
(ver Tabela 6.2). 37 A Cidade de Maputo tem,<br />
de longe, os mais baixos níveis de pobreza<br />
infantil, como este método de medição, com<br />
apenas cerca de 4 por cento das crianças<br />
vivendo duas ou mais privações severas.<br />
Uma comparação dos níveis de pobreza<br />
em 2008, medidos utilizando a abordagem<br />
baseada no consumo e a abordagem<br />
baseada em privações severas permite<br />
189
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
Tabela 6.2: Percentagem de crianças que enfrentam duas ou mais privações severas, 2003 e 2008<br />
2003 2008<br />
Global 59% 48%<br />
Urbana 30% 22%<br />
Rural 73% 60%<br />
Província<br />
Niassa 58% 35%<br />
Cabo Delgado 62% 45%<br />
Nampula 66% 59%<br />
Zambézia 80% 64%<br />
Tete 65% 60%<br />
Manica 58% 52%<br />
Sofala 68% 53%<br />
Inhambane 48% 37%<br />
Gaza 53% 39%<br />
Maputo Província 24% 18%<br />
Maputo Cidade 11% 4%<br />
Quintil de riqueza:<br />
Mais baixo 95% 91%<br />
Segundo 87% 65%<br />
Médio 60% 41%<br />
Quarto 36% 33%<br />
Mais elevado 13% 5%<br />
Fonte: <strong>UNICEF</strong>, Trends in Child Poverty in <strong>Mozambique</strong>: A deprivations-based approach, Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Maputo, 2009.<br />
algumas interessantes constatações. Para a<br />
maioria das províncias nas regiões norte e<br />
centro do país, os níveis de pobreza medidos<br />
com os dois métodos são bastante similares.<br />
No entanto, no sul do país, o índice de<br />
incidência da pobreza é muito maior que a<br />
percentagem de crianças com duas ou mais<br />
privações severas. Verifica-se essa diferença<br />
porque a abordagem baseada em privações<br />
incorpora uma medida de acesso aos<br />
serviços sociais básicos, incluindo saúde,<br />
educação, água e saneamento, enquanto<br />
a incidência da pobreza não captura<br />
directamente esses aspectos.<br />
Uma análise da percentagem de crianças<br />
que enfrentam cada uma das privações<br />
revela também um padrão de disparidade<br />
entre as províncias. Tais resultados são<br />
apresentados mais pormenorizadamente nos<br />
capítulos deste relatório correspondentes a<br />
cada sector, resumindo-se ao seguinte:<br />
• Os níveis de privação nutricional severa<br />
são mais elevados nas províncias do<br />
Norte, seguindo-se as do centro e, na<br />
mais baixa posição, as províncias do sul; 38<br />
• Além de disparidades entre as zonas<br />
urbanas e as rurais no acesso a serviços<br />
de saneamento, existem também grandes<br />
disparidades entre as províncias. Na<br />
Zambézia, 73 por cento das crianças<br />
vivem com privações severas de<br />
saneamento, comparativamente a menos<br />
de um por cento na Cidade de Maputo; 39<br />
• Também se podem verificar disparidades<br />
provinciais em relação à privação de<br />
saúde. Cinco por cento das crianças na<br />
Cidade de Maputo sofrem privação severa<br />
de saúde, em comparação com 19 por<br />
cento na Zambézia e em Nampula; 40<br />
190
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
• São vincadas as disparidades na<br />
prevalência do HIV e no acesso a serviços<br />
de prevenção e tratamento entre as<br />
províncias e regiões do país, havendo<br />
mais elevada prevalência e tratamento no<br />
sul. A prevalência de HIV varia entre 25<br />
por cento em Gaza, no sul, e 4 por cento<br />
em Niassa, no norte; 41<br />
• Apenas três por cento das crianças<br />
em Gaza sofreram privação severa de<br />
educação em 2008, em comparação com<br />
22 por cento em Tete, 15 por cento em<br />
Niassa e 12 por cento na Zambézia. 42<br />
3.1. Disparidades nas dotações<br />
orçamentais<br />
Em A pobreza na Infância em Moçambique:<br />
Uma Análise da Situação e das Tendências<br />
2006, de sua autoria, o <strong>UNICEF</strong> constatou<br />
ser particularmente notório que as dotações<br />
do Orçamento do Estado para sectoreschave<br />
muitas vezes não correspondem ao<br />
padrão dos indicadores de desenvolvimento<br />
infantil, recomendando a necessária revisão,<br />
baseada em evidências, dos critérios<br />
utilizados para alocar fundos do orçamento<br />
do Estado e alcançar uma distribuição mais<br />
equitativa. Um estudo recente aprofundou<br />
esta questão das províncias menos<br />
desenvolvidas receberem uma mais baixa<br />
dotação do orçamento do estado do que<br />
outras províncias mais desenvolvidas. 43<br />
O estudo confirma a percepção de<br />
desigualdade e reporta que os padrões<br />
provinciais de atribuição de financiamento<br />
observados são fortemente indicativos de<br />
uma desigual distribuição geográfica de<br />
recursos, com as províncias mais populosas<br />
de Nampula e Zambézia recebendo<br />
sistematicamente menos do que deveriam<br />
com base no tamanho das suas populações.<br />
Por exemplo, em 2008, a despesa per capita<br />
na Zambézia foi de 69 por cento da média<br />
nacional para a saúde e 73 por cento da<br />
média na educação 2008. 44<br />
As disparidades provinciais nas dotações<br />
orçamentais não se têm reduzido nos<br />
últimos anos. Como pode ser observado<br />
na Figura 6.3 abaixo, a despesa per capita<br />
aumentou de 2005 a 2008, mas as dotações<br />
provinciais relativas permaneceram<br />
razoavelmente constantes. A dotação per<br />
capita é mais elevada nas províncias do Sul<br />
Figura 6.3: Despesa per capita combinada para saúde, educação e justiça, 2005, 2006 e 2008<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
Fonte: Sal e Caldeira e Ximango Consultores, ‘Análise do Impacto da Estrutura das Despesas sobre o Desenvolvimento Económico e<br />
as Condições de Vida em Moçambique,’ Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação, 2009.<br />
191
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
do que no centro e no norte do país. É de<br />
notar que o custo da prestação de serviços<br />
não é igual nas diferentes províncias.<br />
Nas áreas rurais, os custos per capita são<br />
geralmente mais elevados.<br />
Os sectores e os ministérios tendem<br />
a planificar as suas actividades e,<br />
consequentemente, a afectar os seus<br />
fundos de acordo com importantes temas,<br />
programas e projectos que abarcam<br />
várias províncias, ao invés de planificarem<br />
intervenções por província. Como resultado,<br />
os fundos administrados centralmente<br />
não são explicitamente atribuídos e<br />
contabilizados numa base provincial, o que<br />
dificulta a quantificação do total de fundos<br />
recebido a nível de província. As despesas<br />
correntes, entre as quais os salários, revelam<br />
geralmente uma estreita concordância entre<br />
as contas centrais e os relatóri os financeiros<br />
provinciais e sectoriais. Muito mais variação<br />
se observa com relação aos gastos de<br />
investimento.<br />
3.2. Disparidades na saúde<br />
Há grandes disparidades na despesa de<br />
saúde per capita por província. A Zambézia<br />
recebe a menor distribuição per capita, 60<br />
por cento da média nacional, enquanto<br />
Niassa recebe 156 por cento. A Zambézia<br />
tem o pior desempenho com relação a<br />
muitos indicadores de resultados de saúde<br />
infantil.<br />
Mortalidade infantil<br />
Existem diferenças significativas nas taxas<br />
provinciais de mortalidade de menores de<br />
cinco. As taxas mais elevadas registam-se<br />
na Zambézia (206 mortes por mil nascidos<br />
vivos) e Cabo Delgado (181 mortes por<br />
1.000 nados vivos). Tete tem a terceira mais<br />
elevada taxa de mortalidade de menores<br />
de cinco, com 175 por mil nados vivos.<br />
A Província de Maputo e a Cidade de<br />
Maputo reportam as mais baixas taxas de<br />
mortalidade de menores de cinco anos (103<br />
e 109, respectivamente. 45 Uma comparação<br />
da taxa de sobrevivência infantil com os<br />
gastos com saúde por província revela uma<br />
correlação significativa. Províncias com<br />
baixas despesas de saúde também tendem a<br />
ter baixas taxas de sobrevivência infantil (ver<br />
Figura 6.5).<br />
A cobertura de cuidados pré-natais varia<br />
entre as províncias, com um intervalo que<br />
vai de 81 por cento, na Zambézia, a uma<br />
cobertura universal em Gaza e na Cidade de<br />
Maputo. A percentagem de partos atendidos<br />
por um agente qualificado também varia<br />
entre as províncias. As províncias com<br />
Figura 6.4: Despesa de saúde per capita, percentagem da média nacional, 2008<br />
160%<br />
140%<br />
120%<br />
100%<br />
80%<br />
60%<br />
40%<br />
20%<br />
0%<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Gaza<br />
Maputo<br />
Província<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
Fonte: Sal e Caldeira e Ximango Consultores, ‘Análise do Impacto da Estrutura das Despesas sobre o Desenvolvimento Económico e<br />
as Condições de Vida em Moçambique,’ Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação, 2009.<br />
192
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
menor percentagem de partos assistidos por<br />
um agente qualificado foram Manica (33 por<br />
cento) e Zambézia (38 por cento). 46<br />
HIV e SIDA<br />
A prevalência de HIV apresenta também<br />
fortes disparidades geográficas, com as<br />
maiores taxas registadas nas províncias<br />
do sul de Gaza e Maputo (25,1 e 19,8 por<br />
cento, respectivamente) e as menores<br />
nas províncias de Niassa, Nampula e<br />
Cabo Delgado (3,7; 4,6 e 9,4 por cento,<br />
respectivamente) (ver Figura 6.6).<br />
São grandes as disparidades geográficas na<br />
percentagem de mulheres que receberam<br />
aconselhamento sobre o HIV integrado na<br />
sua consulta pré-natal, variando de apenas<br />
28 por cento na Zambézia a 94 por cento<br />
na Cidade de Maputo. A percentagem<br />
de mulheres com teste de HIV em 2008<br />
também variou consideravelmente entre as<br />
províncias, com apenas 19 por cento das<br />
Figura 6.5: Despesa per capita na saúde (2008) e sobrevivência da criança (1998-2008)<br />
Child survival rate (10 year average)<br />
920<br />
900<br />
880<br />
860<br />
840<br />
820<br />
800<br />
780<br />
760<br />
740<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Gaza<br />
Maputo<br />
Província<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
180<br />
160<br />
140<br />
120<br />
100<br />
80<br />
60<br />
40<br />
20<br />
0<br />
Despesa per capita (Mzn)<br />
Taxa de sobrevivência infantil<br />
Despesa de saúde per capita<br />
Fonte: Sal e Caldeira e Ximango Consultores, ‘Análise do Impacto da Estrutura das Despesas sobre o Desenvolvimento<br />
Económico e as Condições de Vida em Moçambique,’ Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação, 2009 e MICS 2008.<br />
Figura 6.6: Prevalência de HIV por província, 2009<br />
35%<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
3% 4% 6% 3%<br />
Niassa<br />
8% 6%<br />
10% 9% 10%<br />
6%<br />
15%<br />
9%<br />
16% 15%<br />
18%<br />
13%<br />
Nampula<br />
Tete Cabo Inhambane<br />
Zambezia<br />
Manica Sofala<br />
Delgado<br />
20%20% 21% 12%<br />
Maputo<br />
Província<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
30%<br />
17%<br />
Gaza<br />
Mulheres15-49 <strong>Home</strong>ns 15-49<br />
Fonte: Instituto Nacional de Estatística, Ministério da Saúde, ‘Inquérito Nacional de Prevalência. Riscos Comportamentais e<br />
Informação sobre o HIV e SIDA em Moçambique (INSIDA), Relatório Preliminar sobre a Prevalência da Infecção por HIV, 2009.<br />
193
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
Figura 6.7: Percentagem de mulheres que receberam informação sobre o HIV e fizeram teste em consultas de<br />
cuidados pré-natais, 2008<br />
100%<br />
80%<br />
73% 68% 85% 74% 69%<br />
79%<br />
72% 91% 86% 96% 97% 59%<br />
60%<br />
40%<br />
20%<br />
60%<br />
29%<br />
49%<br />
34%<br />
52%<br />
31% 28%<br />
19%<br />
52%<br />
39%<br />
61%<br />
47%<br />
0%<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Gaza<br />
Maputo Maputo<br />
Província Cidade<br />
Total<br />
Receberam informação sobre a prevenção do HIV em consulta pré-natal<br />
Fizeram teste de HIV em consulta pré-natal<br />
Fonte: Instituto Nacional de Estatística. ‘Inquérito de Indicadores Múltiplos 2008. Sumário’, Maputo, Moçambique, 2008.<br />
mulheres grávidas testadas na Zambézia,<br />
em comparação com 95 por cento na Cidade<br />
de Maputo. Quarenta e três por cento das<br />
mulheres receberam os seus resultados. 47<br />
Em 2006, 68 por cento do total de crianças<br />
que receberam tratamento para a SIDA viviam<br />
nas quatro províncias do sul do país, e 55<br />
por cento na Cidade de Maputo. Em 2008, as<br />
províncias do sul foram responsáveis por 56<br />
por cento de todas as crianças que receberam<br />
medicamentos anti-retrovirais, e a Cidade<br />
de Maputo por 33 por cento. A distribuição<br />
geográfica das crianças com acesso ao<br />
tratamento ainda é bastante desigual: na<br />
região sul do país, cerca de metade das que<br />
necessitam de tratamento anti-retroviral<br />
conseguem ter-lhe acesso, enquanto nas<br />
regiões centro e norte é muito maior a<br />
percentagem de necessidades não satisfeitas.<br />
3.3. Disparidades no acesso à<br />
educação<br />
Uma análise da despesa de educação per<br />
capita revela uma situação semelhante à da<br />
despesa de saúde. As províncias da Zambézia<br />
e Nampula recebem a mais baixa dotação<br />
de fundos (ver Figura 6.8). Uma vez mais<br />
as províncias do centro e do norte recebem<br />
uma dotação substancialmente menor que<br />
as províncias do sul. 48<br />
As províncias do centro e do norte recebem<br />
mais baixa dotação orçamental e têm<br />
mais baixos resultados na educação do<br />
que as províncias do sul. Os resultados<br />
educacionais em termos de alfabetização<br />
estão intimamente relacionados com as<br />
despesas per capita da educação (ver Figura<br />
6.9). As taxas de alfabetização das mulheres<br />
variam consideravelmente por província, de<br />
84 por cento na Cidade de Maputo a menos<br />
de 50 por cento em Cabo Delgado, Zambézia<br />
e Nampula. Às três últimas províncias cabem<br />
também os mais baixos níveis de despesa<br />
com a educação.<br />
Embora o rácio bruto de escolarização ii de<br />
2008 para a primeira fase do ensino primário<br />
(EP1) tenha ultrapassado os 100 por cento<br />
independentemente da região, província<br />
ou género, a taxa bruta de escolarização<br />
na segunda fase do ensino primário (EP2)<br />
revela fortes disparidades geográficas. Na<br />
ii O rácio bruto de escolarização é a percentagem de crianças de qualquer idade a frequentar a última classe de<br />
determinado nível de educação. Um rácio superior a 100 por cento indica crianças ‘acima da idade’.<br />
194
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Figura 6.8: Despesa per capita na educação, percentagem da média nacional, 2008<br />
180%<br />
160%<br />
140%<br />
120%<br />
100%<br />
80%<br />
60%<br />
40%<br />
20%<br />
0%<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambezia<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
Gaza<br />
Maputo<br />
Province<br />
Maputo<br />
City<br />
Fonte: Sal e Caldeira e Ximango Consultores, ‘Análise do Impacto da Estrutura das Despesas sobre o Desenvolvimento Económico e<br />
as Condições de Vida em Moçambique,’ Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação, 2009 e MICS 2008.<br />
Figura 6.9: Despesa per capita na Educação e taxas de alfabetização, 2008<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
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<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
Fonte: Sal e Caldeira e Ximango Consultores, ‘Análise do Impacto da Estrutura das Despesas sobre o Desenvolvimento Económico e<br />
as Condições de Vida em Moçambique,’ Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação, 2009 e MICS 2008.<br />
Cidade de Maputo e na província de Maputo,<br />
que registaram os mais elevados níveis de<br />
matrículas, o rácio bruto de escolarização<br />
das raparigas no EP2 excedeu o dos rapazes.<br />
Outras províncias registaram rácios brutos<br />
de escolarização inferiores a 100 por cento<br />
no EP2, sendo, na maioria delas, o das<br />
meninas inferiores aos dos rapazes. A nível<br />
regional, as províncias com mais baixos<br />
rácios brutos de escolarização no EP2 e as<br />
maiores diferenças de género foram as das<br />
regiões norte e centro do país.<br />
195
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
Figura 6.10: Rácio líquido de escolarização no ensino primário (EP1 & EP2) por província, 2008<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
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<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
Diferenças regionais semelhantes são<br />
observadas nos rácios de escolarização.<br />
Embora o rácio líquido de escolarização<br />
para o EP1 seja superior a 80 por cento em<br />
cada província, há diferenças provinciais<br />
significativas a nível do EP2. A Cidade de<br />
Maputo é a área com melhor desempenho,<br />
com 43 por cento de escolarização líquida no<br />
EP2 nos rapazes e 57 por cento nas raparigas.<br />
Cabo Delgado, Nampula, Niassa e Zambézia<br />
estão entre as províncias com os piores<br />
desempenhos, tendo cada uma delas um rácio<br />
de escolarização líquida inferior a 15 por cento.<br />
3.4. Disparidades na protecção<br />
da criança<br />
Há grandes disparidades geográficas no<br />
registo de nascimento. Também aqui<br />
as províncias do centro e do norte se<br />
encontram em muito pior situação do que<br />
o sul. Trinta e nove por cento das crianças<br />
menores de cinco anos tiveram seus<br />
nascimentos registados em áreas urbanas,<br />
em comparação com 28 por cento nas zonas<br />
rurais. E 47 por cento das crianças menores<br />
de cinco anos estão registadas na Cidade de<br />
Figura 6.11: Percentagem de mulheres com 15-49 anos casadas ou em união antes completarem os 15 anos, 2008<br />
35%<br />
30%<br />
25%<br />
20%<br />
15%<br />
24%<br />
30%<br />
21% 22%<br />
19%<br />
21%<br />
19%<br />
10%<br />
5%<br />
0%<br />
Niassa<br />
Cabo<br />
Delgado<br />
Nampula<br />
Zambézia<br />
Tete Manica Sofala Inhambane<br />
9% 9%<br />
Gaza<br />
6%<br />
Maputo<br />
Província<br />
4%<br />
Maputo<br />
Cidade<br />
Fonte: MICS 2008<br />
196
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Maputo, enquanto apenas 11 por cento estão<br />
registadas em Tete. 49<br />
Também existem disparidades regionais nas<br />
atitudes para com a violência doméstica.<br />
Por exemplo, a percentagem de mulheres<br />
que consideram que bater na esposa se<br />
justifica em determinadas circunstâncias<br />
varia de 10 por cento na Cidade de Maputo<br />
a quase 70 por cento em Niassa. 50 Um<br />
estudo do Ministério da Mulher e Acção<br />
Social concluiu que essas diferenças estão<br />
fortemente relacionadas com as normas<br />
e práticas socioculturais, bem como com<br />
a falta de escolarização e conhecimento<br />
sobre os direitos das mulheres e crianças na<br />
sociedade. 51 A educação é um factor-chave<br />
na redução da violência contra a criança e a<br />
mulher.<br />
Os dados do MICS 2008 mostram haver<br />
uma diferença significativa nas taxas de<br />
casamento infantil entre o sul, o centro<br />
e o norte de Moçambique. As províncias<br />
do sul – Cidade de Maputo, província de<br />
Maputo, Gaza e Inhambane – têm uma taxa<br />
de casamentos infantis inferior a 10 por<br />
cento. As províncias do centro têm uma taxa<br />
média de 20 por cento, enquanto as duas<br />
províncias mais a norte – Niassa e Cabo<br />
Delgado – têm taxas de 24 e 30 por cento,<br />
respectivamente.<br />
3.5. Conclusões<br />
São evidentes e persistentes as disparidades<br />
provinciais em quase todos os indicadores<br />
de acesso e desempenho dos serviços<br />
sociais básicos. O padrão geral é, para as<br />
províncias do centro e do norte baixas<br />
dotações orçamentais, reduzido acesso<br />
a serviços e mais baixos resultados,<br />
comparativamente às províncias do sul. A<br />
província da Zambézia é frequentemente<br />
a que se encontra em piores condições na<br />
alocação de recursos e nos resultados de<br />
desenvolvimento. Este padrão geral invertese<br />
em relação à prevalência do HIV, com<br />
197
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
as províncias do sul reportando mais altos<br />
níveis de infecção, mas, em contrapartida,<br />
beneficiando também de maior acesso a<br />
serviços de prevenção e tratamento.<br />
Estas disparidades geográficas observadas<br />
em Moçambique provêm de padrões<br />
de assentamento e colonização iniciais<br />
que resultaram em diferenças culturais,<br />
religiosas e linguísticas entre as províncias;<br />
da natureza centralizada e deliberadamente<br />
discriminatória da administração<br />
portuguesa durante o período colonial;<br />
e da falta de um sistema de alocação<br />
de recursos do Estado às províncias<br />
baseado em critérios relacionados com<br />
a situação do desenvolvimento humano.<br />
Além disso, a falta de infra-estruturas<br />
rodoviárias e ferroviárias, incluindo a<br />
ausência (até recentemente) de uma ponte<br />
sobre o rio Zambeze, bem como fraco<br />
acesso aos mercados das zonas rurais em<br />
muitas partes da região centro e norte de<br />
Moçambique também contribuíram para as<br />
diferenças socioeconómicas provinciais no<br />
desenvolvimento económico.<br />
198
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
4. HIV e SIDA<br />
A vulnerabilidade de um país aos efeitos<br />
de doenças infecciosas, incluindo HIV e a<br />
SIDA, depende em grande medida do nível<br />
de desenvolvimento humano alcançado<br />
pelo país. Os indivíduos e a sociedade<br />
como um todo estão mais capazes de se<br />
proteger contra o impacto das doenças<br />
nos países desenvolvidos, o que se explica<br />
pelos limitados recursos financeiros a<br />
nível nacional e familiar nos países em<br />
desenvolvimento, bem como pelo reduzido<br />
capital humano de que dispõem devido<br />
à falta de oportunidades de educação e<br />
falta de acesso a outros serviços sociais<br />
básicos. Nos países em desenvolvimento, as<br />
doenças endémicas afectam negativamente<br />
o desenvolvimento e impedem a realização<br />
dos direitos humanos, como se pode ver em<br />
indicadores básicos como esperança de vida<br />
ao nascer, mortalidade infantil, frequência<br />
escolar, alfabetização e rendimento familiar,<br />
entre outros. 52<br />
É ao nível da família e da comunidade que<br />
mais se fará sentir o impacto da pandemia<br />
da SIDA. Doença e morte nos principais<br />
provedores num agregado familiar terão<br />
um impacto negativo sobre toda a família,<br />
acabando por elevar o nível de dependência<br />
de toda a população, pois outros agregados<br />
familiares, incluindo os chefiados por<br />
pessoas idosas que são, elas próprias,<br />
dependentes, assumirão a responsabilidade<br />
de cuidar do crescente número de crianças<br />
órfãs e vulneráveis. Através dos seus efeitos<br />
sobre o número de professores formados,<br />
profissionais de saúde e outros provedores,<br />
a SIDA afecta também os mecanismos<br />
de geração de capital humano futuro.<br />
Prevêem-se graves implicações estruturais<br />
da mortalidade relacionada com o HIV nos<br />
serviços públicos. A mortalidade e longos<br />
períodos de doença nos funcionários<br />
reduzirão a produtividade, aumentarão o<br />
absenteísmo e obrigarão as autoridades<br />
competentes a substituir pessoal perdido ou<br />
a operar com menos funcionários.<br />
A Comissão para o HIV/SIDA e Governação<br />
em África reconhece três generalizações<br />
sobre o impacto da SIDA nas famílias e nos<br />
agregados familiares: 53<br />
• A presença da SIDA numa casa traduzse<br />
rapidamente em esgotamento da<br />
capacidade de geração de rendimento<br />
do agregado familiar e das poupanças<br />
e bens da família. Muitas famílias<br />
passam rapidamente para uma situação<br />
de pobreza: muito baixo rendimento<br />
ou posse material, dívida, redução do<br />
acesso a serviços, e ainda menos opções<br />
para conseguir alcançar segurança<br />
socioeconómica. As mulheres e as<br />
meninas tendem a ser as mais afectadas;<br />
• A SIDA agrava e é agravada por<br />
condições económicas. Não é, por si só,<br />
uma condição, mas existe num contexto<br />
socioeconómico que torna mais profunda<br />
a vulnerabilidade das famílias, das<br />
comunidades e das nações;<br />
• Os custos económicos da SIDA, o<br />
estigma em torno da doença, que leva<br />
a discriminação e afastamento, bem<br />
como a impossibilidade de acesso a<br />
serviços sociais combinam-se, ampliando<br />
as desigualdades socioeconómicas na<br />
sociedade. A SIDA não está apenas a<br />
matar pessoas, está também a dividir as<br />
sociedades nacionais.<br />
4.1. Perfil da epidemia do HIV<br />
em Moçambique<br />
De acordo com estimativas e projecções<br />
baseadas nos resultados de 2007, mais de<br />
1,7 milhões de moçambicanos viviam com<br />
HIV em 2010, cinquenta e cinco por cento<br />
dos quais eram mulheres, nove por cento<br />
(quase 150.000) eram crianças menores de<br />
15 anos, e cinco por cento eram crianças<br />
com menos de cinco anos. 54 O Governo de<br />
Moçambique deverá divulgar no último<br />
199
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
trimestre de 2010 estimativas populacionais<br />
actualizadas baseadas em dados de<br />
prevalência do Inquérito Nacional Serocomportamental<br />
do HIV/SIDA realizado em<br />
2009.<br />
A evolução da epidemia em Moçambique<br />
tem sido moldada por vários factores.<br />
Na sua fase incipiente, assumiu-se que<br />
a prevalência era menor que nos países<br />
vizinhos (embora houvesse escassez de<br />
dados na época) pelo facto de o conflito<br />
civil que teve lugar de 1975 a 1992 ter<br />
mantido Moçambique um pouco isolado<br />
dos seus vizinhos. A cessação da violência<br />
e a assinatura de um Acordo de Paz em<br />
1992 foram acompanhados por movimentos<br />
populacionais em massa, pois as pessoas<br />
regressavam de outras partes do país ou<br />
dos países vizinhos às casas de origem,<br />
aumentando a vulnerabilidade à infecção<br />
e as oportunidades de transmissão do<br />
vírus. Devido à sua localização geográfica,<br />
Moçambique é um importante eixo de<br />
transporte de mercadorias para os portos de<br />
Maputo, Beira e Nacala e em trânsito para<br />
países vizinhos sem saída para o mar.<br />
A fraca cobertura dos serviços sociais<br />
básicos, especialmente de saúde e<br />
educação, contribuiu para a propagação da<br />
epidemia no período imediatamente após<br />
a cessação das hostilidades. A pobreza, a<br />
discriminação, a opressão, o analfabetismo,<br />
a mobilidade, ou a migração de pessoas,<br />
o estatuto das mulheres, os níveis de<br />
urbanização, os níveis de violência, o acesso<br />
a cuidados de saúde, e a distribuição da<br />
riqueza, entre outros, todos estes factores<br />
podem ter contribuído para a propagação<br />
da epidemia em Moçambique. Diversos<br />
estudos não encontraram nenhuma ligação<br />
clara entre a infecção pelo HIV e a riqueza. A<br />
pobreza pode mesmo reduzir a propagação<br />
da epidemia, por exemplo se as pessoas<br />
têm menos dinheiro para gastar em<br />
relacionamentos transacionais. O Inquérito<br />
Nacional sobre o HIV de 2009 mostrou que<br />
a prevalência do HIV em Moçambique é<br />
maior entre a população, em especial entre<br />
as mulheres, do quintil mais elevado. As<br />
mulheres, especialmente as que vivem em<br />
áreas rurais, são especialmente vulneráveis<br />
por estarem legal, cultural e socialmente<br />
em desvantagem em relação aos homens.<br />
Muitas mulheres estiveram expostas ao risco<br />
de violência sexual ou estupro ou outras<br />
formas de violência. 55<br />
As relações heterossexuais continuam a ser<br />
a forma mais comum de transmissão do<br />
HIV no país. Estima-se que cerca de 90 por<br />
cento das infecções pelo HIV ocorram por<br />
esta via. Sexo entre pessoas de diferentes<br />
gerações, actividade sexual casual sem<br />
protecção, falta de circuncisão masculina,<br />
múltiplos parceiros sexuais em simultâneo<br />
e baixo uso de preservativos são hipóteses<br />
que se colocam de situações que favorecem<br />
a propagação da epidemia. 56 Estima-se, no<br />
entanto, que uma substancial percentagem<br />
(47 por cento) de novas infecções se<br />
dêem em indivíduos que relatam estar em<br />
relacionamento monogâmico. 57<br />
Estima-se que em Moçambique tenham<br />
morrido 96.000 pessoas com SIDA em<br />
2009. A SIDA está a tornar-se rapidamente<br />
uma das principais causas de morte nas<br />
crianças, calculando-se que em 2009 tenham<br />
morrido 18.000 crianças menores de cinco<br />
anos e 21 mil menores de 15 anos. 58 Dados<br />
do Estudo Nacional sobre a Mortalidade<br />
Infantil 2009 indicam que a SIDA era uma<br />
das quatro condições que mais contribuíam<br />
para a mortalidade de crianças menores de<br />
cinco anos em Moçambique, representando<br />
quase 10 por cento de todas as mortes nesse<br />
grupo. 59<br />
A SIDA é uma causa comum de morte de<br />
crianças menores de cinco anos nas áreas<br />
urbanas. 60 Estima-se que 18 por cento das<br />
mortes de crianças em Maputo e 16 por<br />
cento das mortes de crianças na província<br />
de Gaza se devam à SIDA. Estes números<br />
podem estar subestimados, já que a SIDA,<br />
em muitas situações, pode ser a causa<br />
básica de morte em casos em que outras<br />
infecções oportunistas foram registadas<br />
como causa directa de morte.<br />
O Inquérito Nacional sobre o HIV/SIDA 2009<br />
(INSIDA) revela uma prevalência nacional<br />
200
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Figura 6.12: Distribuição de novas infecções por modo de exposição em Moçambique, 2008<br />
Um parceiro sexual 47,3%<br />
Relacionadas com<br />
comportamentos de<br />
múltiplos parceiros 24%<br />
Parceiros de<br />
pessoas<br />
com MP 18%<br />
Múltiplos parceiros<br />
(MPs) 6%<br />
Mulheres parceiras<br />
de homens que fazem<br />
sexo com homens 0,1%<br />
<strong>Home</strong>ns que<br />
fazem sexo<br />
com homens 5,1%<br />
Clientes 7%<br />
Parceiros de clientes 10%<br />
Injecções Médicas 1,7%<br />
Transfusões de sangue 0,1%<br />
Uso de drogas injectáveis (UDI) 3%<br />
Trabalhadores<br />
de sexo 2%<br />
Parceiros UDI 0,3%<br />
Relacionadas com<br />
trabalho de sexo<br />
19%<br />
Fonte: Joint United Nations Programme on HIV and SIDA, <strong>Mozambique</strong> Modes of HIV Transmission and HIV Prevention Study,<br />
UNAIDS, Geneva, 2009..<br />
de HIV de 11,5 por cento entre os 15 e os 49<br />
anos de idade. A prevalência desagregada<br />
por região confirmou a situação emergente<br />
na vigilância sentinela anterior, com maior<br />
prevalência no sul (17,8 por cento), seguida<br />
pelo centro (12,5 por cento). A região Norte<br />
apresenta uma prevalência muito mais<br />
baixa (5,6 por cento). A prevalência urbana<br />
de HIV, que se situa em 15,9 por cento, é<br />
significativamente superior à prevalência<br />
nas áreas rurais (9,2 por cento), em todas as<br />
regiões. 61<br />
O INSIDA revela também que a prevalência<br />
do HIV tanto na população masculina como<br />
na feminina aumenta com a idade, atingindo<br />
o pico nas mulheres de 25-29 anos (16,8<br />
por cento) e, nos homens, aos 35-39 anos<br />
de idade (14,2 por cento). Acresce que as<br />
raparigas têm uma prevalência três vezes<br />
superior à dos rapazes da mesma idade (11,1<br />
por cento nas raparigas com 15-25 anos de<br />
idade, contra 3,7 por cento nos rapazes da<br />
mesma idade). Esses resultados destacam<br />
a maior vulnerabilidade dos adolescentes e<br />
jovens ao HIV em Moçambique.<br />
Presentemente só é possível analisarem-se<br />
as tendências pela observação da prevalência<br />
do HIV obtida na vigilância epidemiológica de<br />
2004 e 2007, uma vez que as informações do<br />
INSIDA seguem uma metodologia diferente,<br />
não sendo, portanto, comparáveis.<br />
A prevalência do HIV caiu acentuadamente<br />
nas jovens que frequentaram cuidados prénatais<br />
entre os inquéritos epidemiológicos<br />
de 2004 e 2007, mas tal tendência<br />
decrescente não se confirmou em 2009. 62 Em<br />
países com epidemias generalizadas onde<br />
a transmissão do HIV se faz principalmente<br />
através de relações heterossexuais, como<br />
acontece com Moçambique, as tendências<br />
na prevalência em jovens do sexo feminino<br />
de15-24 anos podem ser usadas para<br />
determinar as tendências de incidência<br />
201
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
(novas infecções). iii 63 A prevalência do HIV<br />
em frequentadores de cuidados pré-natais<br />
de 15-24 anos atingiu o pico em 2004, nos<br />
16 por cento, apresentando uma diminuição<br />
significativa em 2007 para 11 por cento. Em<br />
2009, no mesmo grupo, a prevalência foi<br />
estimada em 12 por cento. 64 A nível nacional,<br />
não se verificou redução significativa na<br />
prevalência do HIV no período de 2002-2009<br />
nas mulheres de 15-24 anos. Nesta faixa<br />
etária, a região Norte apresentou a menor<br />
taxa de prevalência do país. Em 2009, as<br />
áreas urbanas registaram mais elevadas<br />
taxas de prevalência na mesma faixa etária<br />
do que as áreas rurais. 65<br />
A prevalência reflecte tanto a incidência de<br />
uma doença (ou seja, o número de novos<br />
casos), como a longa e variável incubação<br />
do HIV. Com melhorias na provisão de<br />
terapia anti-retroviral, as pessoas infectadas<br />
com o HIV conseguem ter vidas mais longas,<br />
permanecendo mais saudáveis. As taxas<br />
de prevalência podem, portanto, aumentar,<br />
mesmo estando em queda as taxas de novas<br />
infecções. Com apenas uma medida de<br />
prevalência, é difícil determinar se o número<br />
de novos casos está a aumentar, a diminuir<br />
ou se atingiu um patamar e estabilizou.<br />
Torna-se, portanto, fundamental uma análise<br />
da incidência do HIV para responder a<br />
esta questão, sabendo-se, no entanto, que<br />
todos os métodos usados para determinar a<br />
incidência do HIV têm desvantagens. iv<br />
A análise Spectrum dos dados de vigilância<br />
de 2007 estimou que a incidência anual do<br />
HIV em adultos diminuiu de cerca de 2,2 por<br />
cento em 2000 para cerca de 1,6 por cento<br />
em 2008. Isso traduz-se em 129.000 novas<br />
infecções pelo HIV em adultos em 2008. A<br />
incidência anual estimada é de cerca de 2 por<br />
cento nas regiões centro e sul e muito mais<br />
baixa no norte, rondando os 0,7 por cento.<br />
Segundo estimativas, a incidência do HIV<br />
em crianças menores de 15 anos também<br />
tem vindo a diminuir, de cerca de 38.500<br />
novas infecções em 2005 para cerca de<br />
31.000 em 2009, equivalente a cerca de<br />
85 novas infecções por dia. Esta redução<br />
é principalmente atribuída à expansão da<br />
implantação do Programa de Prevenção<br />
da Transmissão Vertical (PTV) (prevenção<br />
de infecções em recém-nascidos) e do<br />
programa de terapia anti-retroviral (redução<br />
da infecciosidade de mulheres grávidas e a<br />
amamentar em tratamento anti-retroviral). O<br />
principal fardo de novas infecções ocorre na<br />
região centro, que em 2009 representou 60<br />
por cento do total nacional de novos casos.<br />
Tal facto é devido a alta prevalência do HIV,<br />
relativamente baixa cobertura de serviços de<br />
prevenção da transmissão vertical, grande<br />
população e elevada taxa de fertilidade. 66<br />
Como a epidemia do HIV está<br />
principalmente concentrada na parcela<br />
economicamente activa da população, ou<br />
seja, nos que têm entre 15 e 49 anos, os seus<br />
efeitos são desproporcionalmente sentidos<br />
pelos grupos de idade que desempenham<br />
um papel fundamental no desenvolvimento<br />
da economia e dos sectores sociais do país.<br />
Um estudo de simulação realizado em 2002<br />
e baseado em dois cenários (um com SIDA,<br />
outro sem SIDA) concluiu que o HIV e a SIDA<br />
poderiam ter um amplo impacto económico<br />
em Moçambique, com uma visível redução<br />
no crescimento do PIB per capita. 67<br />
De acordo com projecções para o período<br />
2000-2010, a epidemia de HIV resultará<br />
numa perda de cerca de 17 por cento dos<br />
iii Como a maioria dos jovens nesse grupo de idades terão dado início à sua actividade sexual, mudanças na prevalência<br />
nesta faixa etária podem representar mudanças no número de infecções recentes.<br />
iv Obtêm-se dados de incidência reais através de estudos de coorte em grande escala. Embora os dados de incidência<br />
sejam melhores do que os dados de prevalência para monitoria da epidemia de HIV, esses estudos apresentam<br />
desvantagens, entre as quais o custo, considerações éticas, desvios de participação e/ou de selecção e o facto de os<br />
incluídos num coorte virem a ter, inevitavelmente, maior exposição às intervenções no âmbito do HIV. Outros métodos<br />
são também utilizados para estimar a incidência, nomeadamente: estimativas indirectas de incidência de HIV, métodos<br />
laboratoriais e modelação matemática da incidência do HIV.<br />
202
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Figura 6.13: Incidência e prevalência de HIV estimada por região em Moçambique, 1998–2010<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
Fonte: CNCS, UNAIDS e GAMET, ‘Draft <strong>Mozambique</strong> Analysis of Modes of HIV Transmission and National Response to HIV and SIDA,’<br />
Maputo, 2009.<br />
funcionários do sector de educação. É<br />
possível que a SIDA leve consigo cerca<br />
de 9.200 professores, de todos os níveis.<br />
Por cada trabalhador perdido no sector<br />
da educação, serão perdidos cerca de 18<br />
meses de tempo de trabalho produtivo. 68 A<br />
epidemia do HIV também tem consequências<br />
negativas para outros sectores dada a<br />
necessidade de se substituir e renovar força<br />
de trabalho qualificada.<br />
O sistema de saúde enfrenta dificuldades<br />
na resposta à crescente demanda dos seus<br />
serviços, agravada pelo efeito da epidemia<br />
do HIV nos seus trabalhadores. O HIV/SIDA<br />
fará provavelmente piorar os já precários<br />
rácios trabalhador de saúde por paciente<br />
e médico por paciente em Moçambique. O<br />
elevado número de pacientes em hospitais<br />
e unidades de saúde requerendo tratamento<br />
relativamente caro para a SIDA e infecções<br />
relacionadas representará também uma<br />
considerável factura para o sector da saúde.<br />
4.2. Acções prioritárias em prol<br />
das crianças no âmbito do<br />
HIV e da SIDA<br />
Moçambique adoptou a Declaração de<br />
Compromisso da Sessão Especial das<br />
Nações Unidas para o HIV e a SIDA de<br />
2001, que inclui acções prioritárias relativas<br />
a crianças e SIDA, depois designadas na<br />
campanha Juntos pelas Crianças, Juntos<br />
contra a SIDA de Quatro Ps: 69<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
P1 – Prevenção primária<br />
P2 – Prevenção da transmissão vertical<br />
(PTV)<br />
P3 – SIDA pediátrico (Paedriatic AIDS)<br />
P4 – Protecção de crianças órfãs e<br />
vulneráveis (COV)<br />
Abordam-se nesta secção cada um dos<br />
quatro Ps.<br />
203
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
4.3. P1 – Prevenção primária<br />
Os dados do MICS 2008 mostram uma<br />
tendência global positiva em conhecimento<br />
e consciência da transmissão e prevenção<br />
do HIV, em comparação com dados<br />
anteriores a partir do Inquérito Demográfico<br />
e de Saúde 2003. Melhor conhecimento,<br />
consciência e adopção de práticas seguras<br />
estão correlacionados com viver em área<br />
urbana, ter níveis de ensino mais elevados<br />
e pertencer a um mais elevado quintil de<br />
riqueza. Por exemplo, os dados demonstram<br />
uma melhoria no conhecimento que as<br />
mulheres têm sobre a SIDA e como o HIV<br />
é transmitido. Oitenta e um por cento das<br />
mulheres conhecem pelo menos uma das<br />
três principais formas de prevenção da<br />
infecção pelo HIV, e 13 por cento conhecem<br />
as três principais formas. Embora esse<br />
conhecimento seja geralmente baixo, é<br />
maior entre as mulheres que vivem em áreas<br />
urbanas (17 por cento) do que entre as que<br />
vivem em áreas rurais (10 por cento). Quase<br />
65 por cento das mulheres de 15-49 anos<br />
sabe que o uso do preservativo é uma forma<br />
de evitar a infecção pelo vírus. 70<br />
A percentagem de mulheres de 15-49<br />
anos que não aceitam as três principais<br />
concepções erróneas sobre o HIV e a SIDA<br />
tem crescido nos últimos anos. Quase três<br />
em cada quatro mulheres de 15-49 anos<br />
(72 por cento) sabe que o HIV não pode ser<br />
transmitido através de partilha de alimentos<br />
e que uma pessoa que pareça saudável pode<br />
estar infectada com o vírus, enquanto em<br />
2003 os números eram de 63 por cento e 45<br />
por cento, respectivamente. Da mesma forma,<br />
a percentagem de mulheres que sabem que<br />
o HIV não pode ser transmitido por picada de<br />
mosquito aumentou de 37 por cento em 2003<br />
para 64 por cento em 2008. 71<br />
Embora o conhecimento geral sobre o<br />
HIV e seus modos de transmissão tenha<br />
registado uma evolução positiva nos<br />
últimos cinco anos, muita margem ainda<br />
há para melhorias na prevenção real. Mais<br />
conhecimento não é prova de mudança de<br />
atitudes e comportamentos. Um exemplo<br />
é a discrepância entre saber onde se pode<br />
fazer um teste de HIV, 77 por cento das<br />
mulheres entrevistadas, e ter um teste de<br />
HIV, 31 por cento do mesmo grupo (ver<br />
Figura 6.14). As diferenças geográficas entre<br />
o conhecimento da disponibilidade de testes<br />
e a testagem real podem estar relacionadas<br />
com a disponibilidade de serviços de<br />
aconselhamento e testagem em todo o país,<br />
com maior disponibilidade no sul, seguido<br />
pelas regiões centro e norte. 72<br />
Figura 6.14: Identificação de concepções erróneas sobre o HIV, mulheres de 15-49 anos, 2008<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
47%<br />
1997<br />
72%<br />
72%<br />
63%<br />
64%<br />
45%<br />
37%<br />
2003 2008<br />
Uma pessoa aparentemente saudável não pode ter HIV<br />
O HIV não pode ser transmitido por partilha de comida<br />
O HIV não pode ser transmitido por picada de mosquito<br />
Fonte: IDS 1997 e 2003, MICS 2008.<br />
204
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
As mulheres em Moçambique tendem<br />
começar a ter relações sexuais numa idade<br />
relativamente precoce. A nível global, 29 por<br />
cento das mulheres de 15-19 anos teve a sua<br />
primeira relação sexual antes de completar<br />
os 15 anos, e 77 por cento das de 20-24 anos<br />
tiveram a primeira relação sexual antes de<br />
atingir os 18. A percentagem de mulheres<br />
entre os 15 e os 19 anos que referiram ter<br />
começado a ter relações sexuais antes dos<br />
15 anos é maior nas zonas rurais, situando-se<br />
em 32 por cento, do que nas áreas urbanas<br />
(24 por cento). Cerca de 16 por cento das<br />
mulheres sexualmente activas relataram ter<br />
tido relações sexuais com um homem 10 ou<br />
mais anos mais velho que elas nos 12 meses<br />
anteriores à entrevista. Estudos na África<br />
Austral constataram sistematicamente que, a<br />
uma maior disparidade de idade corresponde<br />
uma menor probabilidade de sexo seguro. 73<br />
Portanto, as relações sexuais entre homens<br />
mais velhos e mulheres mais jovens são uma<br />
possível explicação das diferentes taxas de<br />
infecção em adolescentes do sexo masculino<br />
e do sexo feminino.<br />
O uso do preservativo continua a ser<br />
relativamente baixo em Moçambique,<br />
especialmente nas áreas rurais e em<br />
mulheres menos instruídas. Apenas 44<br />
por cento das mulheres de 15-24 anos que<br />
tiveram nos últimos 12 meses relações<br />
sexuais com um parceiro não regular ou com<br />
que não coabitam usaram preservativo na<br />
última relação sexual. A percentagem foi<br />
mais elevada nas mulheres do quintil mais<br />
abastado (64 por cento) que nas mulheres<br />
das famílias mais pobres (12 por cento).<br />
Foi efectuada uma análise multivariada<br />
de regressão probabilística (utilizando o<br />
modelo probit) para examinar os factores<br />
correlacionados com a exposição das<br />
mulheres a comportamento sexual de risco.<br />
A variável dependente foi se tinha sido<br />
usado preservativo na última relação sexual<br />
da mulher com um parceiro com que não<br />
coabitava, uma vez que tal se considera<br />
um bom representante (proxy) de atitudes<br />
em relação a comportamento sexual de<br />
risco. A razão básica é que as mulheres<br />
que têm relações sexuais protegidas com<br />
um parceiro com que não coabitam estão<br />
menos dispostas a expor-se ao HIV e outras<br />
doenças de transmissão sexual.<br />
As mulheres que têm o ensino secundário<br />
ou superior são menos propensas a<br />
expor-se a riscos; este grupo apresenta<br />
uma probabilidade quase 50 por cento<br />
inferior de comportamentos de risco que<br />
as mulheres sem instrução. Ter apenas<br />
o ensino primário não parecem estar<br />
correlacionado com atitudes das mulheres<br />
em relação a comportamento sexual de<br />
risco. Surpreendentemente, o modelo<br />
mostra que as mulheres com conhecimento<br />
Figura 6.15: Probabilidade de não uso de preservativo em relação sexual, mulheres de 15-24 anos, 2008<br />
Probabilidade de não uso de preservativo<br />
1<br />
-75<br />
-5<br />
15 17<br />
19 21 23 24<br />
age<br />
Poligâmica<br />
Monogâmica<br />
Fonte: Cálculos do <strong>UNICEF</strong> baseados no MICS 2008.<br />
205
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
correcto sobre a transmissão do HIV são<br />
tão propensas a ter relações sexuais<br />
desprotegidas como as mulheres que não<br />
estão cientes dos canais de transmissão<br />
do HIV. Outro resultado interessante é<br />
que a probabilidade de actividade de alto<br />
risco aumenta com a idade no que respeita<br />
a mulheres em relações monogâmicas,<br />
enquanto diminui para as mulheres em<br />
relações poligâmicas (ver Figura 6.15).<br />
Em termos de características do agregado<br />
familiar e do local, a riqueza parece ter uma<br />
relação positiva com o uso do preservativo,<br />
enquanto viver em áreas rurais está<br />
positivamente associado a alto risco de<br />
comportamento sexual.<br />
Curiosamente, estes indicadores<br />
comportamentais parecem não corresponder<br />
ao perfil de prevalência do HIV que<br />
recentemente se constatou a partir dos<br />
resultados preliminares do INSIDA:<br />
Tanto nos homens como nas mulheres,<br />
a prevalência foi maior no mais elevado<br />
quintil de riqueza, e maior entre os<br />
indivíduos com instrução do que entre os<br />
que não têm instrução. O relatório final do<br />
INSIDA trará certamente mais luz sobre as<br />
possíveis correlações entre as constatações<br />
comportamentais e a seroprevalência.<br />
4.4. P2 – Prevenção da<br />
transmissão vertical do HIV<br />
Em todo o mundo, 700.000 crianças menores<br />
de 15 anos são infectadas anualmente com<br />
o HIV, e mais de 90 por cento das infecções<br />
pediátricas por HIV resultam da transmissão<br />
do vírus da mãe para a criança. 74 Chegam<br />
a dois terços as infecções de crianças que<br />
se verificam durante o parto, o nascimento<br />
e a gestação, ocorrendo um terço durante<br />
o aleitamento. 75 Sem medidas preventivas,<br />
as taxas de transmissão são de15 a 40 por<br />
cento, mas, com tratamento anti-retroviral<br />
eficaz e cuidados, podem ser reduzidas até<br />
dois por cento, como se verifica nos países<br />
desenvolvidos. 76<br />
Em 2008, estimava-se que as intervenções<br />
de PTV em Moçambique tivessem evitado<br />
cerca de 5.820 novas infecções por HIV<br />
em crianças menores de 15 anos, o que<br />
se traduz numa redução de 15,6 por cento<br />
a nível nacional. 77 O programa de PTV foi<br />
introduzido em Moçambique em 2002. Desde<br />
a criação do programa nacional, o número de<br />
unidades de saúde que oferecem serviços de<br />
prevenção tem-se expandido rapidamente,<br />
de oito em 2002 para mais de 800 no final<br />
de 2009. v No início, a maioria dos serviços<br />
estavam concentrados e em torno das capitais<br />
provinciais, mas em 2009, as intervenções de<br />
prevenção estavam integradas em serviços<br />
de cuidados pré-natais em todos os distritos,<br />
incluindo várias unidades de saúde periféricas.<br />
A cobertura populacional da PTV e as<br />
intervenções de terapia anti-retroviral<br />
pediátrica foram revistas em 2010, com<br />
base em estimativas mais precisas da<br />
população a partir dos dados do INSIDA. 78<br />
As estimativas revistas indicam que<br />
estudos anteriores haviam sobrestimado<br />
a população de mulheres HIV positivas.<br />
Estima-se que a percentagem de mulheres<br />
seropositivas que estão a receber serviços<br />
de PTV (cobertura da população) tem,<br />
portanto, aumentado significativamente.<br />
Estimativas prévias 79 indicavam que cerca<br />
de 46 por cento das mulheres grávidas<br />
estavam a receber a profilaxia necessária<br />
para reduzir a transmissão vertical do HIV.<br />
Estimativas revistas indicam que 70 por<br />
cento das mulheres estão realmente a<br />
receber tratamento. 80 A Figura 6.16 mostra<br />
o número absoluto de mulheres grávidas<br />
que recebem tratamento de PTV e a<br />
percentagem de mulheres que recebem antiretrovirais<br />
para PTV com base em estimativas<br />
populacionais anteriores e mais recentes.<br />
Embora as estimativas de tratamento<br />
revistas sejam encorajadoras, é de notar<br />
que o tratamento se distribui de forma<br />
desigual. As mulheres grávidas no sul do<br />
país têm significativamente maior acesso ao<br />
tratamento que as suas congéneres do norte.<br />
v Dados do Relatório da UNGASS.<br />
206
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Figura 6.16: Tendências na cobertura de PTV entre 2002 e 2009<br />
Número de mulheres grávidas seropositivas<br />
a receber profilaxia de PTV<br />
80.000<br />
70.000<br />
60.000<br />
50.000<br />
40.000<br />
30.000<br />
20.000<br />
10.000<br />
0<br />
253<br />
877<br />
3,182<br />
7,690<br />
8.9%<br />
12,150<br />
13.7%<br />
24,320<br />
26.4%<br />
16.0%<br />
46,848<br />
49.3%<br />
32.0%<br />
2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009<br />
68,248<br />
70.4%<br />
45.8%<br />
100%<br />
90%<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0<br />
Percentagem de necessidades de PTV satisfeitas<br />
Número de mulheres grávidas seropositivas a receber profilaxia de ARV<br />
Percentagem do total estimado de mulheres grávidas seropositivas que receberam PTV (novas estimativas)<br />
Percentagem de mulheres grávidas seropositivas a receber profilaxia de ARV (estimativa da UNGASS)<br />
Fonte: Ministry of Health, Annual Report, National Laboratory Services, Maputo, 2009.<br />
Políticas de PTV em Moçambique<br />
Em Novembro de 2006, o Ministério da<br />
Saúde emitiu uma directiva 81 introduzindo<br />
várias políticas-chave: testagem por<br />
iniciativa do provedor (testagem `opt-out’),<br />
oferecida tanto nos cuidados pré-natais<br />
como em locais de maternidade; amostras<br />
de sangue para contagem de células<br />
CD4 nas instalações de atendimento prénatal;<br />
testagem da reacção em cadeia da<br />
polimerase (RCP) do ADN para crianças<br />
expostas ao HIV com menos de 18 meses.<br />
Foi introduzido oficialmente o uso de terapia<br />
de combinação para profilaxia (dose única<br />
de nevirapina [NVP] durante o parto, mais<br />
zidovudina [AZT] a partir de 28 semanas), e<br />
o início do tratamento com nevirapina em<br />
mulheres grávidas foi antecipado das 36<br />
semanas para as 28 semanas. Foi reforçada<br />
a integração dos serviços de PTV nos<br />
serviços de saúde materno-infantil, visando<br />
aumentar a adesão à terapia anti-retroviral<br />
por mulheres grávidas. Foi recomendado<br />
que se restaurasse a prática de Consultas<br />
para Crianças em Risco para fortalecer o<br />
seguimento das crianças nascidas de mães<br />
seropositivas.<br />
A criação pelas unidades de saúde de grupos<br />
de apoio às mães também foi incluída nas<br />
directiva como um passo necessário para<br />
ajudar as mulheres grávidas e a amamentar<br />
a aderirem a intervenções de PTV e posterior<br />
acompanhamento dos seus filhos expostos<br />
ao HIV. As directrizes sobre os grupos de<br />
apoio às mães foram desenvolvidas na<br />
sequência de um mapeamento nacional<br />
desta intervenção em 2008. A versão final<br />
das directrizes aguarda aprovação.<br />
Recentes mudanças nas orientações<br />
globais para a prevenção da transmissão<br />
vertical requerem uma abordagem mais<br />
abrangente e mais agressiva. Estas<br />
alterações incluem: terapia anti-retroviral<br />
vitalícia para as mulheres seropositivas que<br />
necessitam de tratamento; antecipação do<br />
início de regimes de profilaxia eficazes; e<br />
manutenção desses regimes durante o pós-<br />
207
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
parto e o aleitamento. 82 No início de 2010,<br />
a política do Ministério da Saúde mudou<br />
para reflectir algumas das indicações<br />
internacionais revistas da OMS, incluindo<br />
o aumento dos níveis em que as mulheres<br />
grávidas com baixas contagens de CD4 são<br />
consideradas elegíveis para Terapia Antiretroviral<br />
Altamente Activa (HAART), 83 o<br />
início precoce da profilaxia para mulheres, e<br />
o prosseguimento de nevirapina pela criança<br />
até ao desmame do seio materno.<br />
O sucesso de um programa de PTV depende<br />
de uma complexa cascata de intervenções,<br />
integrada com os serviços de saúde<br />
materno-infantil, como adiante se descreve.<br />
Conhecimento da prevenção da<br />
transmissão vertical do HIV<br />
O nível de conhecimento sobre a<br />
transmissão vertical do HIV na população<br />
moçambicana tem vindo a aumentar. O<br />
Inquérito Demográfico e de Saúde revelou<br />
que apenas 44 por cento das mulheres e<br />
43 por cento dos homens de 15-49 anos<br />
sabia que o HIV podia ser transmitido de<br />
mãe para filho durante a gravidez, o parto<br />
e a amamentação. Os dados do MICS 2008<br />
revelam que nas mulheres da mesma faixa<br />
etária, esse conhecimento aumentou para<br />
78 por cento. Os níveis de conhecimento<br />
são mais elevados nas áreas urbanas (89<br />
por cento) do que nas rurais (72 por cento).<br />
Além disso, os dados mostram que 70 por<br />
cento das mulheres entrevistadas sabem<br />
que o vírus pode ser transmitido através da<br />
amamentação (em comparação com 50 por<br />
cento das mulheres em 2003). Apenas pouco<br />
mais de metade (55 por cento) das mulheres<br />
conhecem os três principais métodos de<br />
transmissão do HIV (MICS 2008).<br />
Aconselhamento e testagem como<br />
parte dos cuidados pré-natais<br />
Apesar de o aconselhamento sobre o<br />
HIV para mulheres grávidas durante as<br />
consultas pré-natais ter aumentado de 51<br />
por cento em 2003 para 57 por cento em<br />
2008, continua a ser baixo. As disparidades<br />
geográficas na percentagem de mulheres<br />
que receberam aconselhamento sobre o HIV<br />
como parte das suas consultas pré-natais<br />
são grandes, variando de 28 por cento na<br />
província da Zambézia (27 em 2003) para 94<br />
por cento na Cidade de Maputo (81 por cento<br />
em 2003). 84<br />
A percentagem de mulheres que foram<br />
testadas em termos de HIV como parte do<br />
seu atendimento pré-natal tem registado<br />
grande aumento. Em 2008, 46 por cento<br />
das mulheres grávidas de 15-49 anos<br />
Figura 6.17: Testagem e aconselhamento em consultas pré-natais, 2003 e 2008<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
51%<br />
57%<br />
46%<br />
0%<br />
Fonte: IDS 2003, MICS 2008.<br />
Receberam informação sobre a prevenção<br />
do HIV em consulta pré-natal*<br />
2003 2008<br />
3%<br />
Fizerem teste de HIV em consulta pré-natal<br />
208
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
foram submetidos a um teste de HIV no<br />
âmbito das suas consultas pré-natais, em<br />
comparação com apenas 3 por cento em<br />
2003. A percentagem de mulheres testadas<br />
em termos de HIV varia entre as diferentes<br />
províncias, com apenas 19 por cento<br />
testadas na província da Zambézia em 2008,<br />
em comparação com 95 por cento na Cidade<br />
de Maputo. 85 Quarenta e três por cento das<br />
mulheres receberam os seus resultados.<br />
Entre as mulheres grávidas que receberam<br />
aconselhamento em matéria de HIV, 82 por<br />
cento fizeram teste de HIV, de acordo com<br />
o MICS 2008, o que resulta provavelmente<br />
de testagem por iniciativa do provedor e de<br />
aconselhamento nos serviços de cuidados<br />
pré-natais, bem como da progressiva<br />
normalização da inclusão de um teste de HIV<br />
nos serviços pré-natais.<br />
O acesso a informação sobre o HIV e<br />
testagem nas consultas pré-natais está<br />
altamente correlacionado com a riqueza da<br />
mulher. Apenas 26 por cento das mulheres<br />
mais pobres foram testados em termos de<br />
HIV, em comparação com 86 por cento das<br />
mulheres mais abastadas (ver Figura 6.18).<br />
Profilaxia anti-retroviral para mulheres<br />
grávidas<br />
Para reduzir a transmissão vertical do vírus,<br />
bem como para o seu próprio tratamento,<br />
quando elegíveis, as mulheres seropositivas<br />
grávidas recebem medicamentos antiretrovirais<br />
para profilaxia. O acesso à terapia<br />
anti-retroviral tem vindo a aumentar desde<br />
o início do programa em 2002. A cobertura<br />
de profilaxia anti-retroviral para a população<br />
global de mulheres grávidas seropositivas<br />
(testadas e não testadas) foi de 0,2 por cento<br />
em 2002, aumentando para 30 por cento em<br />
2007, 32 por cento em 2008 e 45,8 por cento<br />
em 2009. 86 vi É importante referir que estes<br />
números se referem apenas à cobertura dos<br />
serviços prestados durante os cuidados prénatais,<br />
excluindo as mulheres que acedem<br />
a terapia anti-retroviral em maternidades.<br />
Esta abordagem foi adoptada pelo Ministério<br />
Figura 6.18: Testagem e aconselhamento de HIV em consultas pré-natais, por quintil de riqueza, 2008<br />
90%<br />
80%<br />
87%<br />
86%<br />
70%<br />
72%<br />
60%<br />
50%<br />
40%<br />
30%<br />
41%<br />
48%<br />
33%<br />
58%<br />
41%<br />
64%<br />
20%<br />
26%<br />
10%<br />
0%<br />
Mais baixo Segundo Médio Quarto Mais elevado<br />
Receberam informação sobre a prevenção<br />
do HIV em consulta pré-natal<br />
Fizeram o teste de HIV em consulta pré-natal<br />
Fonte: MICS 2008.<br />
vi Note-se que a cobertura populacional da PTV e das intervenções anti-retrovirais pediátricas será revista, na última parte<br />
de 2010, com base em estimativas mais precisas da população no INSIDA<br />
209
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
da Saúde para evitar a dupla contagem de<br />
mulheres com acesso tanto a serviços prénatais<br />
como a maternidades, mas resulta em<br />
sub-notificação. Espera-se que, num futuro<br />
próximo, o novo Cartão de Cuidados Pré-<br />
Natais, em vias de finalização, torne mais<br />
clara a notificação e permita uma recolha<br />
de informações fiáveis sobre a cobertura da<br />
PTV.<br />
É fundamental que se dê prioridade ao<br />
acesso das mulheres grávidas a TARV. A<br />
HAART minimiza o risco de transmissão<br />
pós-natal em mães a amamentar com<br />
baixa contagem de CD4 e elevada carga<br />
viral, as quais enfrentam desafios na<br />
implementação das opções de alimentação<br />
infantil recomendadas. As mulheres com<br />
CD4 inferior a 200 células /microlitro (µL)<br />
têm cinco vezes mais probabilidade de<br />
transmitir o HIV durante o aleitamento do<br />
que as mulheres com CD4 acima de 500<br />
células /µL. 87 A HAART pode reduzir o risco<br />
de transmissão para aproximadamente<br />
dois por cento, em comparação com outras<br />
intervenções, como, por exemplo, dose única<br />
de nevirapina, que reduz o risco para 10-15<br />
por cento.<br />
Em 2009, de todas as mulheres grávidas<br />
que receberam intervenções de PTV, 48 por<br />
cento receberam dose única de nevirapina,<br />
40 por cento uma combinação de nevirapina<br />
e AZT (biterapia), e 11 por cento HAART para<br />
sua própria saúde. O número de mulheres<br />
seropositivas grávidas que receberam<br />
HAART para sua própria saúde foi de 53<br />
em 2003, aumentando para 3.647 em 2007,<br />
6.388 em 2008 e 7.791 em 2009 (equivalente<br />
a 5 por cento do total estimado de mulheres<br />
seropositivas grávidas no país).<br />
Embora se esteja a registar progresso, o<br />
número de mulheres grávidas que recebem<br />
anti-retrovirais para a sua própria saúde<br />
permanece abaixo das expectativas.<br />
A HAART em 2010 é oferecida apenas<br />
em serviços de saúde seleccionados,<br />
denominados postos de Tratamento Antiretroviral.<br />
Quer isto dizer que as mulheres<br />
grávidas, ao invés de poderem aceder a<br />
HAART como parte integrante dos serviços<br />
de PTV, são encaminhadas principalmente<br />
para postos de Tratamento Anti-retroviral,<br />
que podem localizar-se numa outra unidade<br />
sanitária. Isto interfere com o acesso,<br />
nomeadamente com a triagem para<br />
elegibilidade.<br />
Figura 6.19: Partos assistidos, 1997, 2003 e 2008<br />
100%<br />
56%<br />
90%<br />
80%<br />
70%<br />
60%<br />
52%<br />
55%<br />
50%<br />
40%<br />
44%<br />
48%<br />
45%<br />
30%<br />
20%<br />
10%<br />
0%<br />
1997 2003 2008<br />
Parteiras tradicionais/outros/ninguém<br />
Pessoal qualificado<br />
Source: DHS 1997 and 2003, MICS 2008.<br />
210
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Profilaxia anti-retroviral para bebés<br />
De acordo com as directrizes internacionais<br />
de PTV e o protocolo revisto da Terapia Anti-<br />
Retroviral para mulheres grávidas (opção<br />
A), 88 todas as crianças expostas nascidas<br />
de mães seropositivas devem receber<br />
profilaxia anti-retroviral com nevirapina<br />
no prazo de 72 horas após o parto, e<br />
prosseguir com nevirapina até que deixem<br />
de ser amamentadas. Dados do Ministério<br />
da Saúde revelam, porém, que apenas<br />
uma estimativa de 40-50 por cento das<br />
mulheres grávidas seropositivas dão à luz<br />
em unidades sanitárias em Moçambique. O<br />
facto de os partos institucionais constituírem<br />
apenas cerca de metade dos partos é um<br />
claro nó de estrangulamento na prestação<br />
de profilaxia anti-retroviral para recémnascidos<br />
nas primeiras 72 horas de vida.<br />
Apesar desta restrição, o número de crianças<br />
que receberam profilaxia anti-retroviral<br />
passou de 328 em 2002 para 41.266 em 2009,<br />
correspondendo a 58 por cento de todas<br />
as crianças que se estima terem nascido<br />
de mães seropositivas e 83 por cento das<br />
mulheres grávidas que receberam qualquer<br />
tipo de anti-retrovirais para PTV no mesmo<br />
período. O aumento pode ser atribuível,<br />
em parte, à crescente taxa de partos<br />
institucionais de mulheres seropositivas<br />
envolvidas em PTV, bem como ao facto de<br />
os recém-nascidos serem por vezes levados<br />
a serviços de maternidade até 72 horas após<br />
o nascimento para receber tratamento antiretroviral.<br />
Cobertura de Cotrimoxazole para<br />
crianças expostas ao HIV<br />
Directrizes internacionais recomendam<br />
a administração de profilaxia de<br />
Cotrimoxazole a crianças nascidas de<br />
mães seropositivas ou crianças a viver<br />
com HIV. 89 Esta é uma intervenção com<br />
boa relação custo-benefício que pode ser<br />
amplamente aplicada, mesmo em ambientes<br />
com parcos recursos. Directrizes nacionais<br />
indicam que, para as crianças expostas, a<br />
profilaxia deve começar às quatro semanas.<br />
Evidência anedótica de visitas de supervisão<br />
às unidades de saúde indica que essa<br />
intervenção é amplamente implementada no<br />
Figura 6.20: Cascata de PTV pré-natal e pós-natal, 2009<br />
1.000.000<br />
900.000<br />
800.000<br />
888.861<br />
700.000<br />
600.000<br />
649.820<br />
500.000<br />
400.000<br />
300.000<br />
200.000<br />
100.000<br />
150.000<br />
0<br />
Grávidas<br />
aconselhadas<br />
e testadas<br />
Grávidas<br />
frequentando<br />
cuidados<br />
pré-natais<br />
Estimativa<br />
de grávidas<br />
seropositivas<br />
70.289 68.248 41.266<br />
Seropositivas<br />
Grávidas<br />
a receber<br />
profilaxia ARV<br />
Crianças<br />
a receber<br />
profilaxia ARV<br />
Fonte: Ministry of Health, Annual Report, National Laboratory Services, Maputo, 2009.<br />
211
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
país, mas que ainda não estão disponíveis<br />
números fiáveis sobre a cobertura nacional.<br />
Uma significativa percentagem de mulheres<br />
abandona os serviços em cada fase de uma<br />
cascata de serviços pré-natais e pós-natais<br />
(ver Figura 6.20). Nem todas as mulheres<br />
grávidas que frequentam cuidados pré-natais<br />
receberam aconselhamento e testagem, e<br />
menos ainda receberam a profilaxia antiretroviral.<br />
Da mesma forma, apesar do<br />
crescente número de crianças expostas<br />
ao HIV que podem de aceder a profilaxia<br />
anti-retroviral, são relativamente poucas as<br />
que acabam por ter a sua seropositividade<br />
confirmada através de testes.<br />
Futuros planos e metas<br />
A redução da transmissão vertical do HIV há<br />
vários anos que tem sido uma importante<br />
prioridade do governo. O segundo plano<br />
nacional estratégico para combater o HIV/<br />
SIDA, que cobre 2005-2009, estabeleceu<br />
uma meta de cobertura da PTV de 90 por<br />
cento até ao ano de 2009, com base na meta<br />
do Ministério da Saúde de 60 por cento de<br />
cobertura até ao ano 2008. 90 Moçambique<br />
comprometeu-se também, para a meta de<br />
acesso universal, a alcançar pelo menos<br />
80 por cento das mulheres grávidas e seus<br />
bebés com as intervenções de PTV em 2010.<br />
As metas definidas em 2009 continuam<br />
abaixo do necessário para se atingir a meta<br />
do acesso universal, com a justificação de<br />
que o país não tem capacidade para atingir<br />
metas mais ambiciosas. As metas foram<br />
revistas em alta em Julho de 2010 dados os<br />
muito positivos progressos alcançados nos<br />
anos anteriores, nomeadamente em 2009<br />
(altura em que o país já tinha alcançado o<br />
que fora inicialmente planeado como meta<br />
para 2011). A meta revista do Ministério da<br />
Saúde visa atingir o valor de referência de<br />
90% de cobertura de serviços de PTV em<br />
mulheres grávidas seropositivas o mais<br />
tardar até ao ano 2015.<br />
4.5. P3 – SIDA Pediátrica<br />
Estima-se que houvesse cerca de 148.000<br />
crianças menores de 15 anos a viver com<br />
HIV em Moçambique em 2009, número que<br />
deverá aumentar para mais de 150.000 mil<br />
em 2010. 91 Mais de metade das crianças<br />
Figura 6.21: Número estimado de crianças com menos de 15 anos vivendo com HIV, menores de 5 vivendo com<br />
HIV, número de novas infecções em menores de 15, e número de crianças com menos de 15 anos a necessitar de<br />
tratamento/terapia anti-retroviral, 2006–2010<br />
180.000<br />
160.000<br />
140.000<br />
120.000<br />
100.000<br />
80.000<br />
60.000<br />
40.000<br />
20.000<br />
0<br />
2006<br />
2007<br />
2008 2009<br />
2010<br />
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
infectadas vivem nas quatro províncias<br />
do centro do país. Entre as infectadas,<br />
ligeiramente acima de metade têm menos de<br />
cinco anos. Estimativas mostram que, após<br />
um aumento inicial das novas infecções em<br />
crianças no período 2002-2005, o número<br />
de novas infecções, parece ter começado<br />
a diminuir depois de 2006 (possivelmente<br />
devido ao impacto do programa de PTV, bem<br />
como à progressão natural da epidemia),<br />
embora ainda permaneça extremamente<br />
elevado. Calcula-se que tenha havido<br />
mais de 30.941 novas infecções em 2009,<br />
representando cerca de 85 novas infecções<br />
por dia (ver Figura 6.21). 92<br />
É provável que mais de metade das<br />
crianças vivendo com HIV em Moçambique<br />
morram antes de completar o seu segundo<br />
aniversário, a menos que sejam tratadas<br />
de infecções oportunistas e comecem<br />
precocemente a terapia anti-retroviral. A<br />
SIDA começa a tornar-se uma das principais<br />
causas de mortalidade nas crianças,<br />
estimando-se que tenha provocado 19.000<br />
mortes de crianças em 2008. 93 O Estudo<br />
sobre a Mortalidade Infantil Nacional 2008<br />
estima em 10 por cento a percentagem de<br />
óbitos por SIDA em crianças menores de<br />
cinco anos. 94 A SIDA ameaça reverter os<br />
ganhos obtidos por Moçambique na redução<br />
da mortalidade infantil nos últimos anos,<br />
representando um dos maiores obstáculos à<br />
consecução da meta dos ODM de reduzir em<br />
dois terços a mortalidade infantil até 2015.<br />
As crianças infectadas pelo HIV por<br />
transmissão vertical por via da mãe,<br />
no parto ou durante a amamentação,<br />
necessitam de tratamento com antiretrovirais<br />
mais cedo do que os adultos<br />
infectados por contacto sexual. As<br />
directrizes pediátricas nacionais abordam<br />
esta questão pondo todas as crianças<br />
seropositivas (com menos de 12 meses)<br />
imediatamente em tratamento anti-retroviral.<br />
O Ministério da Saúde estima que em 2009<br />
eram 47.500 as crianças menores de 15 anos<br />
a necessitar de tratamento anti-retroviral,<br />
total que deveria aumentar para ligeiramente<br />
acima de 50 mil em 2010. 95<br />
O número de crianças menores de 15<br />
anos a receber tratamento no país subiu<br />
de menos de 500 em 2004 para 9.393 em<br />
2008 e para 13.510 em todo país no final de<br />
Dezembro de 2009. Este valor representa<br />
19 por cento das crianças consideradas<br />
elegíveis pelo Ministério da Saúde, com<br />
base na aplicação do modelo Spectrum<br />
actualizado. 96 Embora represente uma<br />
melhoria significativa partindo dos três por<br />
cento de cobertura registada em 2005, a<br />
cobertura de tratamento das crianças ainda<br />
está longe de ser satisfatória. Apesar do<br />
aumento do número absoluto de crianças<br />
em tratamento anti-retroviral, a cobertura<br />
revela uma tendência de redução devido ao<br />
maior número de crianças elegíveis como<br />
resultado da aplicação das orientações<br />
pediátricas re vistas acima referidas.<br />
De igual modo, rápido tem sido o aumento<br />
no número de postos oferecendo terapia<br />
anti-retroviral. Em 2009, prestavam serviços<br />
de terapia anti-retroviral 220 unidades de<br />
saúde, 173 das quais (78 por cento) tratavam<br />
crianças seropositivas, comparativamente a<br />
32 dos 150 postos em 2006 (21 por cento).<br />
Em 2009, 95 por cento de todos os postos<br />
proporcionando tratamento anti-retroviral<br />
estavam a tratar também crianças, embora<br />
muitos deles ainda não estivessem a<br />
funcionar a plena capacidade. 97<br />
O diagnóstico infantil precoce continua a ser<br />
fundamental para garantir acesso oportuno<br />
a cuidados pediátricos e tratamento para<br />
crianças, uma vez que a SIDA progride<br />
rapidamente em lactentes e crianças com<br />
menos de cinco anos de idade. 98 De acordo<br />
com orientações da OMS, todas as crianças<br />
nascidas de mães seropositivas devem ser<br />
submetidas a um teste de reacção em cadeia<br />
da polimerase (RCP) do ADN às 4-6 semanas.<br />
A OMS recomenda também que as crianças<br />
com desnutrição grave e crescimento<br />
comprometido devem ser submetidas a uma<br />
avaliação clínica que inclua o teste de HIV.<br />
Quando o teste de RCP não está disponível,<br />
a criança deve ser submetida a testes de<br />
anticorpos após os 9 meses e novamente<br />
aos 18 meses.<br />
213
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
Todas as crianças com menos de 24 meses<br />
com diagnóstico confirmado de infecção por<br />
HIV devem começar a fazer o tratamento antiretroviral,<br />
independentemente do estágio<br />
clínico ou imunológico, de acordo com as<br />
recomendações internacionais e directrizes<br />
nacionais emitidas em Outubro de 2008. 99 Em<br />
2009, o teste de RCP estava a ser realizado em<br />
dois laboratórios, em Maputo e Nampula, com<br />
um terceiro na Beira que se previa começar<br />
a efectuar testes em 2010. A partir de 2009,<br />
dados relativos ao acesso universal nacional 100<br />
reportaram pelo menos 287 pontos de colecta<br />
de amostras de gotas de sangue seco em<br />
unidades sanitárias a nível periférico para<br />
análise de RCP em laboratórios de referência.<br />
Uma série de constrangimentos dificultam<br />
uma testagem eficaz da RCP, incluindo longos<br />
atrasos devido ao transporte das amostras<br />
e à sistemática falta de materiais utilizados<br />
nos testes. Uma inovação positiva foi a<br />
introdução em 2009, numa base experimental,<br />
de tecnologia de impressão do serviço de<br />
mensagens escritas (sms) para dar feedback<br />
dos resultados da RCP às unidades sanitárias.<br />
Foi planeado para 2010 o lançamento a nível<br />
nacional desta tecnologia, esperando-se que<br />
melhore substancialmente o diagnóstico<br />
infantil precoce no país.<br />
Em 2005, o Governo fez da expansão do<br />
tratamento pediátrico uma prioridade na<br />
luta contra a SIDA e a pobreza. No PARPA<br />
II, foi estabelecida uma meta de tratamento<br />
para 33.000 crianças até 2009, que, no<br />
entanto, não foi atingida; a avaliação do<br />
PARPA II mostra que apenas 11.000 crianças<br />
estavam a receber tratamento em 2009. Em<br />
2008, o Ministério da Saúde decidiu reduzir<br />
drasticamente as metas anuais para 11.500<br />
crianças em tratamento em 2008, quando<br />
no PARPA II a meta era de 20.826. Esta<br />
meta foi revista com base numa análise<br />
do progresso e nas projecções do número<br />
de novas crianças que iniciaram cada mês<br />
a terapia anti-retroviral no ano anterior.<br />
Depois de intensa acção de advocacia,<br />
e após a adopção por Moçambique das<br />
novas normas para a terapia anti-retroviral<br />
pediátrica vii e a expansão do diagnóstico<br />
infantil precoce através da instalação de<br />
duas máquinas de RCP nas regiões norte e<br />
centro do país, o Ministério da Saúde, em<br />
colaboração com os seus parceiros, decidiu<br />
rever as metas em 2009 (ver Tabela 6.3).<br />
Embora representem uma melhoria, estas<br />
metas revistas continuam muito abaixo dos<br />
objectivos originais do PARPA II e ainda<br />
mais do compromisso de acesso universal.<br />
Tabela 6.3: Metas relativas ao HIV pediátrico, 2009<br />
Meta do<br />
Modelo de<br />
Projecção para<br />
crianças em<br />
TARV (limite<br />
inferior)<br />
2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014<br />
Crianças com ARV 6.451 9.393 13.500 18.817 23.818 29.058 34.258 39.743<br />
Crianças com ARV<br />
como percentagem<br />
do total<br />
7,1% 7,3% 8,5% 9,9% 10,7% 11,4% 11,9% 12,3%<br />
Cobertura 21% 28% 37% 45% 52% 58% 64%<br />
Fonte: Ministry of Health, Departamento Nacional de Assistência Médica, HIV Programme Report, Ministério da Saúde, Maputo, 2009.<br />
vii Iniciar a terapia anti-retroviral para todas as crianças seropositivas com 0-1 anos de idade; testagem da RCP para todas<br />
as crianças de 0-9 meses, usando testes rápidos; alterações às normas de contagem de células CD4; utilização das quatro<br />
etapas da Organização Mundial da Saúde, em vez de três; e introdução de comprimidos solúveis em lugar de xaropes.<br />
214
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
4.6. P4 – Proteger as crianças<br />
órfãs e vulneráveis<br />
afectadas pela SIDA<br />
Estima-se que haja 1,8 milhões de órfãos em<br />
Moçambique, dos quais 510.000 devido à<br />
SIDA. 101 Este número deverá aumentar, com<br />
a SIDA como causa provável de orfandade<br />
na maioria dos casos, não sendo aqui<br />
consideradas outras crianças eventualmente<br />
vulneráveis devido ao impacto do HIV na<br />
sua família. Uma criança é considerada<br />
órfã ou vulnerável (COV) se um ou ambos<br />
os seus pais naturais tiverem morrido, se<br />
pelo menos um dos seus progenitores está<br />
cronicamente doente, se tiver morrido um<br />
adulto no agregado familiar nos últimos<br />
12 meses após doença prolongada, ou se<br />
houver um adulto cronicamente doente no<br />
agregado familiar.<br />
As crianças órfãs estão mais expostas a<br />
riscos do que as que não órfãs. Estes riscos<br />
incluem: aumento de agregados familiares<br />
chefiados por irmãos ou crianças, mais fraco<br />
ingresso e desempenho escolar, maior risco<br />
de abuso sexual e infecção pelo HIV, risco<br />
de trabalho infantil perigoso, actividade<br />
sexual e casamento precoces, aumento do<br />
risco de graves problemas psicossociais<br />
e problemas de saúde e nutrição. 102 Além<br />
disso, o estigma e a discriminação contra<br />
as pessoas infectadas ou afectadas pelo<br />
HIV/SIDA continuam a ser uma questão<br />
desafiadora. As crianças e os jovens com<br />
familiares doentes ou moribundos estão<br />
particularmente expostos ao estigma.<br />
Podem ser ostracizados pelas suas<br />
comunidades e receber um apoio mínimo<br />
das suas famílias devido à vergonha e<br />
ao estigma presentemente associados a<br />
uma morte relacionada com a SIDA. Nas<br />
escolas, a discriminação contra a criança<br />
exprime-se por provocação e intimidação.<br />
Em alguns casos, as crianças evitam seus<br />
pares seropositivos devido ao receio de<br />
que possam ser infectadas. Um estudo<br />
participativo sobre os mecanismos das<br />
famílias e comunidades para fazer face<br />
às dificuldades no contexto da SIDA,<br />
realizado em todo o país pelo <strong>UNICEF</strong>, em<br />
colaboração com o Ministério da Mulher e<br />
da Acção Social, em 2004, constatou que<br />
cerca de metade dos agregados familiares<br />
pesquisados consideravam que as crianças<br />
órfãs devido à SIDA eram susceptíveis de ser<br />
estigmatizadas. 103<br />
4.7. Nutrição e HIV<br />
A desnutrição, a insegurança alimentar,<br />
a infecção pelo HIV e a SIDA reforçamse<br />
mutuamente. As pessoas que vivem<br />
com HIV têm acrescidas necessidades<br />
energéticas, mas a infecção pelo HIV ou<br />
infecções oportunistas conectas podem<br />
reduzir a sua capacidade de absorver<br />
nutrientes e diminuir o apetite, o que as<br />
pode levar a perder peso e enfraquecer.<br />
Pode seguir-se um ciclo vicioso em que elas<br />
estão menos capazes de trabalhar, manter<br />
um emprego e cuidar de si, tornando-se<br />
assim ainda mais fracas. Além disso, se não<br />
recebem tratamento, ficam mais propensas a<br />
infecções oportunistas e acabam por evoluir<br />
para SIDA. Os membros da sua família<br />
também podem ser afectados se, para a<br />
sua alimentação, despesas e assistência,<br />
dependerem da pessoa com HIV.<br />
Relativamente a crianças, que precisam de<br />
energia e nutrientes para crescer, pode ser<br />
ainda mais severo o impacto da infecção<br />
pelo HIV no seu estado nutricional. As<br />
COV são especialmente vulneráveis à<br />
desnutrição, dependendo de viverem ou<br />
não em ambiente familiar e do seu acesso<br />
aos recursos necessários. O estudo da<br />
pobreza baseada em privações analisou as<br />
COV como grupo, tendo constatado que<br />
22 por cento tinham privação nutricional<br />
severa (acentuada baixa altura para a idade,<br />
insuficiência de peso ou baixo peso para a<br />
altura). 104<br />
O tratamento anti-retroviral pode ajudar a<br />
melhorar o estado nutricional de pessoas<br />
vivendo com HIV, uma vez que melhora o<br />
seu estado de saúde. Ao mesmo tempo,<br />
no entanto, os medicamentos podem ter<br />
efeitos colaterais, que podem ser agravados<br />
quando o consumo de alimentos não é o<br />
adequado. O apetite das pessoas geralmente<br />
215
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
aumenta quando a sua saúde melhora, o<br />
que, em ambiente de insegurança alimentar<br />
e pobreza, pode constituir um desafio.<br />
Evidências pontuais sugerem que a falta de<br />
alimentos pode ser uma importante razão<br />
para abandonar o tratamento.<br />
Uma análise do estado nutricional e da<br />
vulnerabilidade de 920 pessoas vivendo<br />
com HIV e recebendo anti-retrovirais em<br />
33 distritos 105 constatou que um quarto<br />
delas estavam desnutridas (índice de massa<br />
corporal inferior a 18,5 kg/m2). Um quinto<br />
recebeu apoio alimentar. A segurança<br />
alimentar e a vulnerabilidade foram medidos<br />
com base no consumo de alimentos e no uso<br />
de estratégias de sobrevivência. O estudo<br />
concluiu que dois terços dos entrevistados<br />
eram vulneráveis e viviam em situação de<br />
insegurança alimentar.<br />
4.8. Conclusões<br />
Estima-se que em 2010 mais de 1.7 milhões<br />
de Moçambicanos estejam a viver com o<br />
HIV, incluindo cerca de 150.000 crianças<br />
menores de 15 anos. Nas áreas urbanas<br />
tais como a cidade de Maputo, a SIDA<br />
está a tornar-se uma causa comum de<br />
morte de crianças menores de cinco anos.<br />
Concentrados na população entre os 15 e 49<br />
anos, o HIV e a SIDA estão a ter um amplo<br />
impacto social e económico. A força de<br />
trabalho qualificada necessária tanto para<br />
o crescimento económico e a provisão de<br />
serviços sociais tais como cuidados de saúde<br />
e educação está a reduzir. Moçambique<br />
está a responder à epidemia do HIV através<br />
da campanha dos Quatro “P”: Prevenção<br />
primária, PTV, SIDA Pediátrico e Protecção<br />
de crianças órfãs e vulneráveis.<br />
Apesar do progresso feito na implementação<br />
do programa de PTV, a falta de seguimento<br />
das mães e das crianças continua um sério<br />
constrangimento. O sistema de saúde faz<br />
face a escassez de recursos humanos que<br />
tem comprometido o acesso a e provisão<br />
de serviços de qualidade. Por outro lado, o<br />
estigma e a discriminação associados com<br />
o HIV podem prevenir que muitas mulheres<br />
grávidas e seus recém-nascidos acedam e<br />
adiram às intervenções de PTV. As mães<br />
receiam que possam perder suas famílias<br />
como resultado de serem testadas ou<br />
comunicarem o seu estado serológico de HIV<br />
aos seus parceiros.<br />
O sistema de saúde em Moçambique<br />
necessita desenvolver estratégias para<br />
criar um ambiente propício que encoraje<br />
o envolvimento activo de parceiros e<br />
famílias na saúde materno-infantil (p.e.<br />
aconselhamento e testagem de casais,<br />
partos assistidos por pessoal qualificado,<br />
etc.). O programa de PTV deve ser tornado<br />
mais abrangente e aceitável à participação<br />
masculina e deveria estar ligado às<br />
intervenções de saúde na comunidade<br />
para facilitar seguimento activo das mães<br />
e crianças que actualmente desistem. A<br />
experiência do Ruanda mostra que quando<br />
os parceiros estão envolvidos e informados,<br />
uma mulher sente-se mais propensa a<br />
participar nos serviços de PTV e procura<br />
activamente outros serviços de saúde<br />
materna e HIV.<br />
216
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
5. Questões ambientais e mudança<br />
climática<br />
Crianças de todo o mundo, e<br />
particularmente dos países em<br />
desenvolvimento, estão entre os menos<br />
responsáveis pela degradação ambiental e<br />
pela mudança climática. Da mesma forma,<br />
as crianças não são o principal foco da<br />
maioria das avaliações de impacto ambiental<br />
ou estudos de mudança climática, nem são<br />
os principais alvos da maioria das políticas<br />
e intervenções relacionadas com questões<br />
ambientais ou mudança climática.<br />
As crianças estão entre os mais vulneráveis<br />
aos devastadores impactos de muitos tipos<br />
de riscos ambientais. Mesmo as catástrofes<br />
naturais de duração relativamente curta<br />
podem ter efeitos duradouros sobre o<br />
desenvolvimento das crianças. Os desafios<br />
de saúde, nutrição, água e saneamento<br />
são muitas vezes causados ou agravados<br />
por condições ambientais desfavoráveis,<br />
enquanto as áreas de educação, protecção<br />
da criança e outras também enfrentam<br />
desafios como consequências indirectas<br />
de questões ambientais. Com a mudança<br />
climática ameaçando agravar a incidência e<br />
gravidade de muitos riscos ambientais em<br />
Moçambique, é particularmente importante<br />
centrar a atenção em como as crianças<br />
podem ser poupadas dos seus efeitos<br />
negativos.<br />
Os riscos ambientais afectam as crianças<br />
seja como parte de um agregado familiar<br />
mais vasto seja de formas que lhes são<br />
peculiares. As crianças estão sob maior<br />
risco de muitos potenciais efeitos na saúde<br />
simplesmente devido à sua fisiologia: seus<br />
órgãos, sistemas imunológicos e sistema<br />
nervoso ainda em desenvolvimento;<br />
seus mais rápidos metabolismos e taxas<br />
respiratórias; e sua mais elevada área<br />
superficial com relação à massa corporal<br />
comparativamente aos adultos. O seu<br />
comportamento e a sua curiosidade naturais<br />
também as colocam em maior risco de<br />
contrair certas doenças e ferimentos porque<br />
a sua propensão para explorar o mundo<br />
em redor as leva frequentemente a uma<br />
maior exposição a contaminantes, poluentes<br />
(em especial devido à falta de espaços não<br />
poluídos para brincar em áreas urbanas). As<br />
crianças são mais susceptíveis de apanhar<br />
e mascar terra, pedaços de lixo e minas<br />
terrestres. A sua menor estatura e relativa<br />
falta de força e velocidade também as torna<br />
particularmente vulneráveis em situações<br />
de emergência como inundações, ciclones e<br />
deslizamentos de terra. As crianças têm ainda<br />
maior probabilidade de estar perto das mães<br />
quando estas estão a cozinhar, aumentando<br />
a sua exposição a poluentes provenientes<br />
da queima de combustíveis fósseis. Alguns<br />
pesquisadores afirmam que as alterações<br />
climáticas, devido ao seu impacto de longo<br />
alcance e intersectorial, representam a maior<br />
ameaça para as crianças do mundo. 106<br />
5.1. Questões ambientais<br />
em Moçambique<br />
As 13 maiores bacias hidrográficas do país<br />
são densamente povoadas e caracterizamse<br />
por níveis relativamente elevados de<br />
fertilidade do solo, mas são também áreas<br />
vulneráveis a inundações, secas e intrusão<br />
salina, bem como aos efeitos da demanda de<br />
água, chuvas e poluição nos países vizinhos<br />
em que a maioria dos rios nasce. A região<br />
centro, caracterizada por um delta de um<br />
grande rio (Zambeze) e uma extensa planície<br />
costeira, é particularmente vulnerável a<br />
riscos ambientais, por ser a região com<br />
a maior população costeira e os maiores<br />
riscos de ciclones e inundações. A região<br />
norte é caracterizada por moderada a baixa<br />
fertilidade do solo e uma estreita planície<br />
costeira. A fertilidade do solo é menor e<br />
o risco de seca mais elevado na região<br />
sul, particularmente nas regiões áridas do<br />
interior. 107<br />
217
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
Mais de 60 por cento da população vive ao<br />
longo da costa, uma bio-região susceptível a<br />
ciclones, pesca excessiva, erosão e intrusão<br />
salina nos sistemas fluviais. Moçambique<br />
pode ser dividido em bio-regiões com<br />
base na latitude (norte, centro e sul) e em<br />
características geográficas (costeira, planície<br />
de cheia e interior).<br />
O estado físico do meio ambiente não<br />
está sujeito apenas a eventos climáticos<br />
incontroláveis, como ciclones e secas, mas<br />
também a efeitos de actividade humana,<br />
tais como uso insustentável, exploração e<br />
poluição do solo, da água e dos recursos<br />
naturais.<br />
Esta secção apresenta as condições<br />
ambientais naturais e os desafios e previsões<br />
para o futuro de Moçambique, seguindo-se<br />
o quadro institucional do país para a gestão<br />
ambiental e de desastres. Neste contexto,<br />
analisa-se a vulnerabilidade transversal<br />
das crianças de Moçambique aos riscos<br />
ambientais, concluindo a secção com as<br />
áreas prioritárias a serem abordadas.<br />
5.2. O desenvolvimento<br />
sustentável em<br />
Moçambique<br />
Diz-nos a teoria económica que existe uma<br />
forte ligação entre alterações na riqueza e<br />
na sustentabilidade do desenvolvimento: se<br />
uma família (ou uma nação) vê depreciaremse<br />
os seus activos, não está a seguir um<br />
caminho sustentável. No capítulo 1 deste<br />
estudo, foram apresentadas análises da<br />
pobreza usando medidas baseadas no<br />
consumo e baseadas em privações. No<br />
entanto, quando se discute a riqueza<br />
de uma criança ou uma nação, também<br />
podemos considerar o acesso a recursos<br />
não renováveis, recursos renováveis e terras<br />
agrícolas. Um estudo de 2009 108 mediu a<br />
riqueza per capita de Moçambique usando<br />
uma definição ampliada de riqueza. Além<br />
dos resultados económicos, os autores<br />
incluíram nos seus cálculos a acumulação de<br />
outros activos: capital humano, o ambiente e<br />
recursos naturais.<br />
Esse estudo constatou que 49 por cento<br />
da riqueza de Moçambique é derivada<br />
de capital natural, designadamente<br />
recursos minerais, terra agrícola, florestas<br />
e reservas marinhas. Esse valor é muito<br />
superior à média subsaariana de 24 por<br />
cento, implicando uma forte dependência<br />
de recursos naturais. O estudo também<br />
constatou que a degradação natural do<br />
capital de Moçambique custa ao país 360<br />
milhões de dólares americanos por ano, ou<br />
cerca de 6 por cento do PIB. A poluição da<br />
água (abastecimento de água, saneamento<br />
e higiene inseguros) constitui o maior<br />
custo ambiental em Moçambique (ver<br />
Figura 6.22). Apesar de a redução de capital<br />
natural se ter revelado relativamente baixa<br />
em Moçambique em geral, viii poderão ser<br />
elevados os efeitos das alterações climáticas.<br />
O desenvolvimento sustentável é uma<br />
questão inerentemente intergeracional e<br />
intrageracional. A realização dos direitos<br />
humanos por parte dos adultos hoje<br />
(por exemplo, o direito à alimentação e<br />
alojamento) afecta a habilidade das crianças<br />
de hoje e das gerações futuras de satisfazer<br />
os seus direitos humanos no futuro.<br />
Padrões de consumo por parte dos adultos<br />
de hoje que destroem o ambiente (por<br />
exemplo, pesca excessiva, sobre-exploração<br />
madeireira, conservação de solos pobres)<br />
terão um sério impacto na capacidade das<br />
gerações futuras de satisfazer seus direitos<br />
humanos.<br />
viii O estudo observou, no entanto, que os números nacionais incluem muitas áreas com muito baixa densidade<br />
populacional, podendo obscurecer algumas das práticas de exploração agrícola que se verificam a nível local.<br />
218
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
5.3. O impacto da degradação<br />
ambiental e das situações<br />
de emergência nas crianças<br />
em Moçambique<br />
Poluição<br />
O estudo acima referido constatou serem<br />
consideráveis os custos da poluição ix em<br />
termos ambientais, de saúde e de economia<br />
do país. Só os efeitos provocados por<br />
abastecimentos de água poluída na saúde<br />
foram estimados em cerca de 3 por cento do<br />
PIB em 2008, x enquanto os da poluição do<br />
ar de interiores (principalmente resultante<br />
do monóxido de carbono libertado pela<br />
queima de combustíveis fósseis) custam<br />
mais 1 por cento. 109 Apenas 10 por cento<br />
da população moçambicana se encontrava<br />
conectada à rede de electricidade em 2008, 110<br />
o que tem um duplo impacto ambiental: em<br />
primeiro lugar, aumenta a poluição do ar<br />
por se cozinhar com combustíveis fósseis, e,<br />
em segundo lugar, aumenta a utilização de<br />
recursos naturais para a lenha.<br />
Ambientes marinhos poluídos e sobreexploração<br />
da pesca têm-se tornado um<br />
problema crescente em muitas áreas<br />
costeiras para as comunidades que<br />
dependem da diminuição das reservas de<br />
peixes para sua subsistência. 111 O PARPA<br />
II destacou explicitamente a importância<br />
económica das pescas, reconhecendo que a<br />
pesca excessiva, a poluição e a degradação<br />
do habitat têm vindo a diminuir a capacidade<br />
das comunidades costeiras de manter<br />
os seus modos de subsistência. O plano<br />
identificou várias acções para promover a<br />
sustentabilidade ambiental, aumentando<br />
simultaneamente a produtividade<br />
económica, 112 mas o relatório de avaliação do<br />
PARPA II indicou que esses objectivos não<br />
foram totalmente satisfeitos. 113<br />
Saúde<br />
Um relatório de 2006 encomendado pela<br />
OMS constatou que, embora 23 por cento<br />
de todas as mortes prematuras tenham<br />
sido atribuíveis a factores ambientais<br />
Figura 6.22: Custo da degradação ambiental por ano, 2009<br />
180<br />
160<br />
140<br />
120<br />
$US (millions)<br />
100<br />
80<br />
60<br />
40<br />
20<br />
0<br />
Degradação<br />
do solo<br />
Custos da<br />
desflorestação<br />
Poluição<br />
da água<br />
Poluição do ar Seca Inundações<br />
Fonte: Ollivier, T, et al, Natural Resources, Environment, and Sustainable Growth in <strong>Mozambique</strong>, Agência Francesa de<br />
Desenvolvimento, 2009.<br />
ix Poluição inclui poluição do ar livre, poluição do ar dentro de casa e poluição da água.<br />
x Como discutido no Capítulo 3, menos de metade dos agregados familiares têm acesso a água potável.<br />
219
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
modificáveis, esse número subiu para<br />
36 por cento nas crianças menores de 15<br />
anos. Pesquisadores e profissionais de<br />
saúde têm observado há muito tempo a<br />
relação entre factores ambientais, como a<br />
poluição do ar, e efeitos na saúde, como<br />
a asma, mas recentemente começaram a<br />
tocar o alarme com mais urgência. Entre<br />
aqueles cuja saúde está ameaçada por<br />
riscos ambientais, as crianças constituem<br />
o maior grupo. As crianças pequenas são<br />
ainda mais vulneráveis: o número de anos<br />
de vida saudável per capita perdidos devido<br />
a factores ambientais foi cerca de cinco<br />
vezes maior em crianças menores de cinco<br />
anos do que na população total. A malária e<br />
infecções respiratórias, as principais causas<br />
de mortalidade infantil em Moçambique (ver<br />
Capítulo 3), encontram-se também entre as<br />
doenças mais fortemente ligadas a factores<br />
ambientais modificáveis. A diarreia, uma das<br />
principais causas subjacentes à mortalidade<br />
infantil, tem um fardo de doença ambiental<br />
na ordem dos 94 por cento. 114<br />
Os desastres naturais, interrompendo o<br />
acesso aos serviços de saúde, afectam a<br />
saúde das crianças, interrompendo o acesso<br />
a unidades sanitárias. Ciclones e inundações,<br />
em particular, podem danificar infraestrutura<br />
sanitária e estradas, o que pode<br />
dificultar ou impossibilitar o fornecimento<br />
de suprimentos médicos. As famílias<br />
deslocadas de suas casas devido a situações<br />
de emergência ficam frequentemente<br />
incapazes de aceder a cuidados de saúde ou<br />
de dar continuidade a tratamentos regulares,<br />
como, por exemplo, para o HIV.<br />
Água e saneamento<br />
O stress hídrico faz com que aumentem as<br />
ameaças à saúde. Um deficiente saneamento<br />
é frequentemente agravado por condições<br />
ambientais como inundações e secas,<br />
conduzindo geralmente as primeiras a<br />
um aumento das doenças de veiculação<br />
hídrica, como a cólera, e as segundas, ao<br />
aumento das doenças resultantes de falta de<br />
higiene (water-washed diseases), como, por<br />
exemplo, o tracoma. 115 Outro risco de saúde<br />
relacionado com a água que por vezes surge,<br />
sobretudo no norte de Moçambique, é o de<br />
maiores níveis de cianeto se concentrarem<br />
na raiz da mandioca em épocas de seca.<br />
Altas concentrações da toxina são uma<br />
causa de paraparesia espástica (também<br />
conhecida como konzo ou mantakassa),<br />
especialmente em crianças e mulheres que<br />
podem já se encontrar desnutridas. 116 117<br />
A maior parte da vulnerabilidade do país a<br />
riscos ambientais está directamente ligada<br />
à água, seja à falta seja ao excesso. Tanto<br />
as secas como as inundações podem ter<br />
efeitos devastadores sobre o acesso das<br />
crianças a água potável e saneamento. Os<br />
poços pouco profundos que, normalmente,<br />
sustentam as comunidades podem<br />
secar em épocas de seca, colocando<br />
pressão excessiva sobre quaisquer poços<br />
mais profundos que possam existir. As<br />
inundações podem contaminar a água<br />
potável, especialmente em áreas que<br />
também tenham fraco saneamento. Uma<br />
fraca infraestrutura de água e saneamento<br />
pode ser facilmente danificada por cheias e<br />
ciclones, e áreas com drenagem deficiente<br />
podem aumentar o risco de cólera e<br />
outras doenças de veiculação hídrica, bem<br />
como tornar-se locais de reprodução de<br />
mosquitos transmissores de malária e<br />
outras doenças transmitidas por vectores. 118<br />
Como observado anteriormente, as crianças,<br />
devido à sua fisiologia e porque o seu<br />
comportamento muitas vezes as coloca em<br />
maior contacto com água contaminada,<br />
são particularmente vulneráveis a doenças<br />
relacionadas com o saneamento. 119<br />
Nutrição<br />
A segurança alimentar e a nutrição em<br />
Moçambique estão fortemente ligadas<br />
às condições ambientais. Tanto as<br />
inundações como a seca causam amplas<br />
perdas agrícolas às famílias dependentes<br />
da agricultura de subsistência. Mais de<br />
70 por cento da população depende da<br />
agricultura de sequeiro, o que torna o<br />
país particularmente vulnerável ao stress<br />
hídrico que regularmente se verifica,<br />
220
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
embora nem sempre nos mesmos lugares<br />
ao mesmo tempo. Por exemplo, em 2001-<br />
2002, as secas no sul de Moçambique<br />
provocaram a perda de cerca de um terço<br />
da safra, levando o Governo a pedir ajuda<br />
internacional adicional para alimentar cerca<br />
de 650.000 pessoas. No mesmo ano, no<br />
entanto, a parte norte do país conheceu<br />
uma produção de alimentos excedentária,<br />
tendo havido muitas vendas através de<br />
mercados informais para o vizinho Malawi. 120<br />
Em 2006, o Secretariado Técnico de<br />
Segurança Alimentar e Nutricional (SETSAN)<br />
determinou que cerca de 35 por cento da<br />
população se encontrava em situação de<br />
insegurança alimentar crónica, 121 embora<br />
o número de pessoas com insegurança<br />
alimentar grave em determinado momento<br />
varie; a cifra de Outubro de 2009 publicada<br />
pelo SETSAN era 281.300, isto é, menos<br />
de 2 por cento da população a necessitar<br />
de assistência imediata. 122 Em média, os<br />
agregados familiares rurais só têm uma<br />
cultura suficientemente estável durante 6-8<br />
meses. 123<br />
Uma segurança alimentar reduzida muitas<br />
leva frequentemente as famílias de fracos<br />
recursos a adoptarem mecanismos para<br />
fazer face a dificuldades que não são no<br />
melhor interesse da nutrição infantil. Os<br />
efeitos da desnutrição em crianças podem<br />
ser graves e permanentes. As principais<br />
estratégias utilizadas por agregados<br />
familiares rurais em situação de insegurança<br />
alimentar são comer alimentos de menos<br />
preferência, reduzir o número de refeições<br />
por dia, e comer a totalidade ou parte das<br />
reservas de sementes para a campanha<br />
seguinte (ver Tabela 6.4). Se os adultos<br />
podem conseguir adaptar-se a essas<br />
mudanças na sua dieta, pelo menos no<br />
curto prazo, os efeitos sobre as crianças<br />
são mais graves devido às suas diferentes<br />
necessidades nutricionais.<br />
O esgotamento e a erosão do solo também<br />
afectam a segurança alimentar em<br />
Moçambique. Sem suficiente fertilizante<br />
para sustentar a terra, os níveis de nutrientes<br />
no solo e, por consequência, a produção<br />
Tabela 6.4: Estratégias para fazer face a dificuldades usadas anualmente na época seca no Moçambique rural,<br />
2009, percentagem<br />
Agregados familiares com carência de alimentos (%)<br />
Estratégias usadas para<br />
enfrentar a situação<br />
durante a estação seca<br />
(%)<br />
Campanha agrícola<br />
2005 2006 2007 2008<br />
38 37 27 31<br />
Comer alimentos de menor preferência 88 90 87 87<br />
Reduzir o número de refeições 82 85 82 82<br />
Comer a totalidade ou parte da semente 54 49 41 54<br />
Incrementar as actividades de geração de<br />
rendimento 38 51 50 41<br />
Partilhar alimentos com a família/os vizinhos 40 38 47 39<br />
Vender bens de maneira fora do comum 18 26 19 18<br />
Pedir dinheiro emprestado 11 17 15 12<br />
Procurar assistência governamental, de igrejas<br />
e ONGs 4 5 4 3<br />
Mandar crianças para outros agregados<br />
familiares 3 3 4 3<br />
Tirar as crianças da escola 2 2 2 2<br />
Outras 2 2 3 2<br />
Fonte: Cunguara, Benedito e Brendan Kelly, ‘Trends in agriculture producers’ income in rural <strong>Mozambique</strong>’, estudo contributivo para<br />
o Impact Evaluation Report of PARPA II, MPD, 2009.<br />
221
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
agrícola, decrescem rapidamente. Os<br />
produtores devem, em seguida, limpar e<br />
cultivar novas terras, em detrimento da vida<br />
selvagem e das florestas. Em Moçambique,<br />
por tradição, os agricultores limpam a terra,<br />
cultivam-na e depois mudam de lugar para<br />
limpar mais terra, deixando a anterior em<br />
pousio para recuperar a fertilidade. Em<br />
áreas de maior densidade populacional, no<br />
entanto, os agricultores cultivam colheita<br />
após colheita, minando ou esgotando<br />
os nutrientes do solo sem nada que os<br />
compense. Com pouco acesso a fertilizantes,<br />
os agricultores são obrigados a produzir em<br />
solos menos férteis em terras marginais, em<br />
detrimento da vida selvagem e das florestas.<br />
Desastres ambientais de curto prazo em<br />
áreas que anteriormente tinham sido de<br />
relativa segurança alimentar podem levar a<br />
maiores taxas de subnutrição aguda entre<br />
as crianças, enquanto as crises de longo<br />
prazo são passíveis de aumentar o número<br />
de crianças com insuficiência de peso e<br />
baixa altura para a idade.<br />
Educação<br />
A educação das crianças é outra área que<br />
é afectada por condições ambientais tanto<br />
a longo como a curto prazo. Escolas mal<br />
construídas são muitas vezes danificadas<br />
ou destruídas por tempestades e ciclones.<br />
Em 2008, por exemplo, o ciclone Jokwe<br />
interrompeu as aulas a mais de 38.000<br />
alunos. 124 Desastres de longo prazo, como as<br />
secas, por exemplo, muitas vezes fazem as<br />
crianças abandonarem a escola, seja porque<br />
devem dedicar-se a tarefas adicionais,<br />
como acarretar água, por exemplo, seja<br />
simplesmente porque lhes falta energia<br />
para se concentrarem nos estudos, como<br />
resultado da desnutrição.<br />
A poluição ambiental e a gestão dos<br />
recursos naturais afectam o sucesso das<br />
intervenções do governo na educação.<br />
Doenças causadas por factores ambientais<br />
como a poluição do ar e da água<br />
influenciam as taxas de frequência escolar.<br />
A desnutrição, provocada tanto pelo<br />
esgotamento dos solos como pela perda de<br />
colheitas, afectará a capacidade das crianças<br />
de assimilar as lições. A desflorestação e a<br />
falta de água potável perto dos agregados<br />
familiares também podem afectar as taxas<br />
de participação das crianças, uma vez que<br />
passam mais tempo acarretando lenha<br />
e água. Estas situações podem também<br />
afectar os professores e os seus índices de<br />
assiduidade.<br />
Crianças que tenham sido deslocadas<br />
devido a desastres naturais enfrentam<br />
desafios adicionais na sua escolarização. O<br />
impacto de situações climáticas extremas<br />
e da crescente escassez de água devido<br />
às alterações climáticas é susceptível de<br />
aumentar o número de pessoas deslocadas<br />
em Moçambique. A migração temporária<br />
pode fazer com que as crianças faltem à<br />
escola, bem como causar superlotação<br />
em locais que recebem muitos refugiados<br />
ambientais. Tem sido utilizada a expressão<br />
caos ambiental para descrever situações<br />
com elevados níveis de ruído e acumulação<br />
de pessoas e falta de estrutura ou de<br />
rotinas diárias, que é a situação em que se<br />
encontram muitas crianças em contextos<br />
pós-desastre. Tem-se constatado que<br />
este tipo de caos afecta negativamente a<br />
aprendizagem das crianças e as interacções<br />
sociais. 125<br />
Desflorestação<br />
O corte de madeira para fins comerciais<br />
aumentou drasticamente e, muitas<br />
vezes, ilegalmente, nos últimos anos.<br />
Alguns analistas estimam que madeiras<br />
duras tropicais, de florestas tropicais de<br />
crescimento lento, semi-áridas e secas têm<br />
vindo a diminuir a uma taxa que poderá<br />
fazer com que o recurso se esgote em<br />
5/10 anos. 126 Um estudo de 2006 conclui<br />
que compradores de madeira asiáticos,<br />
homens de negócios locais e membros do<br />
Governo de Moçambique e seus serviços<br />
florestais estão a agir em conluio para tirar<br />
madeiras tropicais preciosas,” 127 estando<br />
a ser exportadas grandes quantidades de<br />
madeiras duras ilegais não processadas<br />
através do porto de Nacala, no norte de<br />
Moçambique. O mesmo estudo estima que<br />
222
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
se está a fazer exploração ilegal de madeiras<br />
pelo menos em tão grande escala como a<br />
actividade madeireira legal.<br />
Quase metade da perda florestal de<br />
África é resultado de as pessoas cortarem<br />
árvores para lenha ou carvão. 128 Estimase<br />
que o carvão seja a principal fonte de<br />
combustível de 80 por cento da população<br />
de Moçambique, 129 e que tenha um efeito<br />
ainda maior sobre a desflorestação do que o<br />
corte comercial de madeira. A desflorestação<br />
pode fazer com que as crianças faltem à<br />
escola pois é necessário mais tempo para<br />
colectar lenha para cozinhar. Pode ser<br />
eficaz no combate à desflorestação em<br />
Moçambique uma abordagem baseada em<br />
direitos. Quando os direitos individuais e da<br />
comunidade sobre uma determinada área<br />
são contabilizados e exercidos, as pessoas<br />
podem agir para salvaguardar parte do<br />
seu valor de conservação. É necessária<br />
uma abordagem baseada em direitos<br />
não apenas para a conservação e gestão<br />
sustentável das florestas, mas também para<br />
responsabilização e retorno económico<br />
equitativo no sector.<br />
Protecção da criança<br />
A protecção das crianças é um desafio<br />
particular em situações de emergência,<br />
uma vez que as crianças estão expostas<br />
a maiores riscos de separação da família,<br />
exploração sexual e trauma psicológico.<br />
A interrupção dos serviços sociais afecta<br />
particularmente as crianças órfãs e<br />
vulneráveis no acesso aos serviços básicos.<br />
Embora tenha havido pouca pesquisa sobre<br />
o impacto das situações de emergência<br />
em questões de protecção da criança<br />
em Moçambique, relatórios de uma<br />
missão do comité estatal de avaliação<br />
da vulnerabilidade de 2005 levantou<br />
preocupação para com o uso de estratégias<br />
Caixa 6.2. Preparação para Emergências<br />
No início de 2000, graves inundações devastaram cinco províncias em Moçambique. Além de<br />
cerca de 700 pessoas terem perdido a vida nas enchentes, quase dois milhões de pessoas ficaram<br />
de outras formas gravemente afectadas e necessitando de ajuda externa.130 2001 trouxe novas<br />
cheias, que causaram danos adicionais e pressionaram ainda mais muitas áreas que ainda não<br />
tinham recuperado do desastre do ano anterior. Num seminário financiado pela Representação<br />
da Organização das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (UNOCHA)<br />
realizado em Julho de 2001, cerca de 130 delegados - incluindo governadores e administradores<br />
distritais das províncias afectadas, e outros representantes do Governo, agências das Nações<br />
Unidas, doadores bilaterais e organizações não governamentais - reuniram-se para tirar as lições<br />
das operações de salvamento e socorro. Diversas recomendações e conclusões do grupo incidiram<br />
sobre a preparação, a eficiência e a coordenação. Uma recomendação importante foi a de maior<br />
integração das actividades das diversas partes envolvidas na resposta a emergências. 131<br />
Uma medida-chave do progresso nesta área é a plena integração dos planos sectoriais no plano<br />
de contingência do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC). Em várias secções do<br />
plano de contingência é dada atenção especial às necessidades das crianças em situações de<br />
emergência. Mais recentemente, o INGC, juntamente com a Save the Children, a ONUSIDA, o<br />
FNUAP e o <strong>UNICEF</strong>, desenvolveu e aprovou o Código de Conduta para Trabalhadores Humanitários<br />
no contexto de Moçambique, com base no Boletim do Secretário-Geral das Nações Unidas<br />
sobre Medidas Especiais de Protecção contra a Exploração Sexual e o Abuso Sexual (Outubro de<br />
2003).132 Este esforço tem por base a experiência adquirida durante a resposta de emergência em<br />
2008, a qual revelou que as agências e os trabalhadores humanitários (tanto estatais como não<br />
estatais) a trabalhar no campo têm pouco conhecimento e não tinham desenvolvido mecanismos<br />
ou abordagens para combater o abuso e a exploração sexual cometidos contra mulheres e<br />
crianças pelos seus próprios funcionários.<br />
223
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
negativas usadas por crianças para<br />
enfrentar dificuldades em zonas afectadas<br />
por secas, como, por exemplo, ‘sexo de<br />
sobrevivência’ por dinheiro, que aumenta a<br />
sua vulnerabilidade ao HIV e outras infecções<br />
de transmissão sexual.<br />
Minas terrestres<br />
As minas terrestres representam um<br />
desafio ambiental em Moçambique. Apesar<br />
de os esforços de desminagem terem<br />
prosseguido regularmente desde 1993,<br />
e de quatro províncias (Cabo Delgado,<br />
Niassa, Nampula e Zambézia) terem sido<br />
recentemente declaradas livres de minas, o<br />
Instituto Nacional de Desminagem estima<br />
que ainda houvesse mais de dez quilómetros<br />
quadrados de áreas minadas no final de<br />
2008, representando 386 locais espalhados<br />
por 59 distritos nas outras seis províncias. 133<br />
No PARPA II, a desminagem juntou-se a<br />
catástrofes naturais e problemas ambientais<br />
como um tema transversal que deve ser<br />
tratado a fim de se alcançar a redução da<br />
pobreza; a avaliação de 2009 constatou que<br />
têm sido feitos progressos neste domínio,<br />
diminuindo significativamente os riscos<br />
colocados por minas terrestres. 134 O plano de<br />
acção contra minas do governo tem como<br />
objectivo eliminar todos os campos minados<br />
conhecidos antes do prazo de Março de 2014<br />
da extensão do Tratado de Banimento de<br />
Minas.<br />
Mudança climática<br />
Um amplo relatório realizado pelo Instituto<br />
Nacional de Gestão de Calamidades<br />
(INGC) dá um quadro sombrio das<br />
condições ambientais que se esperam<br />
caso se mantenham as actuais tendências<br />
climáticas. 135 Foram usados dados<br />
recolhidos ao longo de várias décadas<br />
para gerar previsões através da aplicação<br />
de sete diferentes modelos de mudança<br />
climática. Têm sido registados em todo o<br />
país aumentos nas temperaturas médias,<br />
temperaturas máximas e duração das ondas<br />
de calor, tendência que deverá continuar a<br />
verificar-se. Prevê-se que as temperaturas<br />
médias aumentem 1,8 a 3,2 °C em 2075. As<br />
chuvas também diminuirão 2 a 9 por cento,<br />
especialmente entre Novembro e Maio, a<br />
época-chave de cultivo. Dados concernentes<br />
a precipitação indicam que já se registam<br />
no país crescentes atrasos no início da<br />
estação das chuvas. Os modelos de mudança<br />
climática antevêem que a precipitação se<br />
torne ainda menos previsível nas próximas<br />
décadas, esperando-se um aumento de<br />
precipitação na maior parte do país de<br />
Dezembro a Maio, superado por aumentos<br />
ainda maiores na evapotranspiração nos<br />
restantes meses do ano.<br />
O aumento do nível do mar constitui um<br />
outro desafio. Devido à falta de dados fiáveis<br />
no passado é difícil saber-se precisamente<br />
em que medida o aumento do nível do<br />
mar já terá afectado Moçambique, mas as<br />
projecções discutidas no relatório do INGC<br />
mostram que este resultado específico da<br />
mudança climática terá necessariamente<br />
graves consequências. Mesmo em cenário<br />
de baixa subida do nível do mar, os ciclones<br />
tropicais apresentarão um maior risco para a<br />
costa, contribuindo para uma maior erosão<br />
costeira. Os centros urbanos sofrerão danos<br />
nas infra-estruturas devido a inundações mais<br />
frequentes e, num cenário de grande subida<br />
do nível do mar, muitos portos e habitações<br />
ao longo da costa estarão completamente<br />
submersos no final do século. Espera-se que a<br />
Beira, Maputo e Quelimane sejam fortemente<br />
afectados mesmo por baixos aumentos do<br />
nível do mar; no cenário de elevada subida do<br />
nível do mar, a Beira actual tornar-se-á uma<br />
ilha, enquanto as áreas do porto de Maputo,<br />
da estação dos caminhos-de-ferro e da Costa<br />
do Sol desaparecerão debaixo de água.<br />
Prevê-se um agravamento de muitos riscos<br />
de saúde relacionados com o ambiente nos<br />
países em desenvolvimento, como resultado<br />
do aquecimento global. Um relatório<br />
da Comissão Lancet de 2009 qualificou<br />
as mudanças climáticas como a maior<br />
ameaça à saúde global do século XXI.” 136<br />
Em Moçambique, uma das consequências<br />
previstas do aumento de temperatura e das<br />
mudanças na precipitação observadas no<br />
estudo do INGC é um aumento na gama e<br />
224
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
sazonalidade de doenças transmitidas por<br />
vectores, incluindo a malária e a doença<br />
do sono africana. 137 Outras doenças que<br />
podem aumentar em Moçambique como<br />
resultado de alterações climáticas são a febre<br />
chikungunya, a meningite meningocócica, a<br />
cólera e outras diarreias, bem como doenças<br />
transmitidas por roedores. O aumento da<br />
temperatura e da perda gradual de árvores<br />
de sombra também pode aumentar os efeitos<br />
do stress térmico sobre as crianças. Porque<br />
as crianças (e os idosos) transpiram menos<br />
e têm maiores rácios de área superficial por<br />
massa corporal do que os adultos, tendem a<br />
sofrer maiores efeitos na saúde resultantes<br />
de stress térmico. 138<br />
5.4. O contexto institucional<br />
As questões ambientais em Moçambique<br />
não entraram na agenda nacional até que<br />
terminassem os piores anos da guerra civil.<br />
O Artigo 90 da Constituição confere aos<br />
cidadãos moçambicanos o direito de viver<br />
num ambiente equilibrado, bem como o<br />
dever de o defender. O artigo estabelece<br />
ainda que as autoridades estatais e locais<br />
devem adoptar políticas destinadas a<br />
proteger o meio ambiente e a promover o<br />
uso racional dos recursos naturais. 139 Em<br />
1990 foi formada a Comissão Nacional do<br />
Meio Ambiente, seguindo-se-lhe, em 1994,<br />
a criação do Ministério da Coordenação da<br />
Acção Ambiental. O novo ministério, por sua<br />
vez, desenvolveu o quadro jurídico para a<br />
gestão ambiental, que inclui uma vasta gama<br />
de políticas, legislação, estratégias e planos<br />
de acção. 140<br />
Em 1999, foi criado outro órgão<br />
governamental especificamente para lidar<br />
com a vulnerabilidade do país a crises<br />
ambientais: o INGC. O INGC é separado do<br />
MICOA, embora o Banco Mundial tenha<br />
observado em 2009 que as questões de<br />
coordenação pendentes entre o INGC e o<br />
MICOA” 141 constituem um grande desafio<br />
para a capacidade de Moçambique de<br />
reagir a catástrofes naturais. As questões de<br />
coordenação com outros ministérios estão<br />
a ser gradualmente resolvidas, pelo menos<br />
em termos de como lidar com situações de<br />
emergência; por exemplo, o INGC publica<br />
agora um plano de contingência 142 anual<br />
que inclui actividades específicas de sector<br />
para nove diferentes ministérios executarem<br />
antes, durante e depois de um desastre<br />
natural. A iminente ameaça de mudança<br />
climática, que começou a despertar mais<br />
atenção nos últimos anos, também envolveu<br />
tanto o MICOA como o INGC; por exemplo,<br />
em 2007 o ministério desenvolveu um<br />
plano de acção nacional para adaptação a<br />
alterações climáticas, 143 enquanto em 2009<br />
o INGC produziu um relatório abrangente<br />
detalhando os efeitos previstos das<br />
mudanças climáticas no país. 144<br />
A avaliação do PARPA II 2009 foi em geral<br />
favorável à componente ambiental. A análise<br />
observou que diversas novas estratégias<br />
e políticas foram desenvolvidas durante o<br />
período abrangido pelo PARPA II, e que a<br />
gestão ambiental fora integrada em alguns<br />
dos planos de desenvolvimento urbano.<br />
Enfrentar os desafios colocados pelas<br />
alterações climáticas, pela degradação<br />
ambiental e pela gestão sustentável dos<br />
recursos naturais foi identificado como uma<br />
alta prioridade para o desenvolvimento<br />
de planos do Governo a médio prazo<br />
subsequentes. A avaliação foi complementar<br />
à atenção do Governo à componente do<br />
PARPA II de catástrofes naturais, observando<br />
nomeadamente o reforço do INGC, ao qual<br />
reconheceu a manutenção de um mínimo<br />
de perdas nas cheias de 2007-2008. Entre as<br />
realizações reportadas na avaliação figuram o<br />
incremento de acções de formação junto das<br />
comunidades e outros sectores envolvidos<br />
na redução do risco de desastres, a criação<br />
de comités locais de gestão de risco e o<br />
reassentamento de 44.000 famílias de áreas<br />
de alto risco. Desafios que persistem são a<br />
integração da gestão de desastres nos Planos<br />
Económicos e Sociais e a atribuição de fundos<br />
mais adequados às províncias e distritos. 145<br />
5.5. Conclusões<br />
As questões ambientais afectam as crianças<br />
de inúmeras formas, e os efeitos da<br />
degradação ambiental deverão intensificar-se<br />
nos próximos anos. A degradação ambiental<br />
225
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
afecta negativamente o desenvolvimento<br />
de Moçambique como país e tem<br />
profundos efeitos negativos sobre cada<br />
criança. As crianças são particularmente<br />
vulneráveis a situações de emergência nos<br />
domínios de saúde, educação e segurança.<br />
As situações de emergência poderão<br />
intensificar-se à medida que a mudança<br />
climática for aumentando a ocorrência de<br />
ciclones em Moçambique.<br />
O ambiente é considerado pelo Governo<br />
de Moçambique um tema transversal.<br />
No entanto, as acções para abordar as<br />
alterações climáticas, o ambiente e a gestão<br />
de desastres não têm sido suficientemente<br />
integradas nos diversos sectores. Têm<br />
sido atribuídos insuficientes fundos para<br />
lidar com a degradação ambiental, tanto por<br />
parte do Governo de Moçambique como<br />
dos seus parceiros, possivelmente devido<br />
ao demorado retorno desses investimentos.<br />
Sem esses investimentos, no entanto, a<br />
degradação ambiental pode vir a reduzir<br />
significativamente ou até mesmo a reverter<br />
os progressos realizados na sobrevivência<br />
infantil, na educação e na protecção. É<br />
urgente agir-se no sentido de sensibilizar<br />
as comunidades para a necessidade de<br />
se reduzirem as práticas nocivas para o<br />
ambiente e de se garantir que as iniciativas<br />
públicas e privadas sejam conduzidas<br />
de forma ambientalmente sustentável. A<br />
mudança climática é uma questão que deve<br />
ser abordada em cooperação com parceiros<br />
regionais e internacionais de Moçambique.<br />
226
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
6. Comunicação para o Desenvolvimento<br />
Na Assembleia Geral da ONU de 1996,<br />
foi aprovada uma resolução salientando<br />
a necessidade de apoiar sistemas<br />
de comunicação bidireccional que<br />
permitam diálogo e que as comunidades<br />
falem, expressem as suas aspirações e<br />
preocupações e participem nas decisões<br />
concernentes ao seu desenvolvimento”. 146<br />
Estes sistemas de comunicação e o<br />
domínio emergente da comunicação para o<br />
desenvolvimento (C4D – Communication for<br />
Development) estão a ser alvo de crescente<br />
reconhecimento em Moçambique por todo<br />
o papel que podem desempenhar para fazer<br />
avançar a situação dos direitos humanos das<br />
crianças e das comunidades.<br />
Desde a adopção de uma nova constituição<br />
em 1990 que Moçambique tem assistido a um<br />
crescimento, em amplitude e profundidade,<br />
do seu sector dos media. Têm proliferado os<br />
meios de comunicação privados, os estatais<br />
têm estado a trabalhar para adoptar o formato<br />
de serviço público, e um número crescente<br />
de estações de rádio comunitárias servem<br />
as áreas rurais. Embora ainda incipiente, o<br />
crescimento da informação, da comunicação<br />
e das indústrias de entretenimento tem<br />
criado um importante ambiente propício<br />
para actividades de comunicação para o<br />
desenvolvimento. A crescente organização<br />
e capacidade de organismos da sociedade<br />
civil, incluindo os que se especializam em<br />
comunicação para o desenvolvimento,<br />
promoção da saúde, prevenção do HIV e<br />
defesa dos direitos humanos da criança,<br />
tem facilitado uma coerente - e cada vez<br />
mais descentralizada - planificação e<br />
implementação da comunicação.<br />
6.1. Desenvolvimento dos<br />
órgãos de comunicação<br />
social em Moçambique<br />
O desenvolvimento do sector dos media<br />
em Moçambique tem vindo a desempenhar<br />
um papel crucial no apoio à governação,<br />
ao desenvolvimento e à divulgação<br />
de informação desde a fundação, em<br />
1975, da Rádio Moçambique (RM), e da<br />
agência nacional de notícias, a Agência<br />
de Informação de Moçambique (AIM),<br />
detidas pelo estado. O surgimento de uma<br />
imprensa livre e independente foi permitido<br />
pela Constituição 147 , que prevê a liberdade<br />
de expressão e o direito do cidadão à<br />
informação. O artigo 74 da Constituição<br />
estabelece que os meios de comunicação<br />
desempenham um papel importante na<br />
implementação destes direitos, bem como<br />
valorizando outros direitos individuais e<br />
colectivos consagrados na Constituição.<br />
Uma ampla Lei de Imprensa, 148 aprovada<br />
em 1991 e em fase de revisão em 2009,<br />
promove ainda mais a liberdade de<br />
imprensa, cobrindo a maior parte dos<br />
aspectos dos meios de comunicação e<br />
da actividade jornalística. O regulamento<br />
da comunicação social de Moçambique<br />
está sob tutela do Gabinete de Informação<br />
(GABINFO), o órgão estatal encarregado do<br />
registo administrativo de todos os meios de<br />
comunicação. O GABINFO também emite<br />
licenças para novos órgãos de imprensa,<br />
rádio e televisão, embora as licenças<br />
para a utilização das frequências de rádio<br />
sejam passadas pelo Instituto Nacional das<br />
Comunicações de Moçambique (INCM), que<br />
faz parte do Ministério dos Transportes e<br />
Comunicações. 149<br />
Reconhecendo que as intervenções<br />
focadas na informação e comunicação são<br />
fundamentais para atrair a participação<br />
de todos os cidadãos, atendendo as suas<br />
necessidades de informação e ouvindo as<br />
suas vozes, o Plano de Acção para a Redução<br />
da Pobreza Absoluta (PARPA II) deu especial<br />
atenção ao acesso à informação e ao<br />
conhecimento como instrumento essencial<br />
para aumentar a participação e o diálogo,<br />
envolvendo os cidadãos na luta contra a<br />
pobreza. Esta aposta estratégica, combinada<br />
com a Constituição e a Lei de Imprensa, tem<br />
facilitado a rápida melhoria do acesso geral<br />
227
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
à informação em Moçambique, estando<br />
o país a expandir-se de limitadas redes<br />
públicas para um sector de comunicação<br />
social mais pluralista que inclui a rádio,<br />
a imprensa escrita, canais de televisão,<br />
internet e serviços móveis, pertencentes a e<br />
operados por diversos organismos estatais,<br />
comunitários, de base religiosa e privados.<br />
A rádio continua a ser o meio de<br />
comunicação de massas com maior<br />
cobertura. A emissora pública nacional,<br />
a Rádio Moçambique, chega a 80% da<br />
população, transmitindo através de 11<br />
delegações, em 21 línguas, incluindo<br />
português e inglês no serviço nacional e<br />
línguas locais em noticiários e programas<br />
provinciais. De acordo com um estudo de<br />
2005 realizado pelo Iniciativa Africana para<br />
Desenvolvimento dos Media (Africa Media<br />
Development Initiative), 98 por cento da<br />
população urbana tinha escutado rádio<br />
nos últimos 12 meses, sendo que 91 por<br />
cento dessa percentagem tinham escutado<br />
rádio nos últimos sete dias. 150 Embora a<br />
Rádio Moçambique controle as estações<br />
de rádio mais amplamente escutadas nas<br />
áreas urbanas, o Fórum Nacional de Rádios<br />
Comunitárias (FORCOM), criado em 2004,<br />
registou mais de 60 rádios comunitárias<br />
em todo o país, partindo de apenas<br />
uma em 1994. 151 As rádios comunitárias<br />
cobrem quase metade dos 128 distritos<br />
de Moçambique 152 e transmitem em<br />
português e nas línguas locais. A maioria<br />
são estações de rádio comunitárias sem fins<br />
lucrativos, muitas das quais criadas com<br />
a participação do Projecto dos Média da<br />
UNESCO; outras pertencem a organizações<br />
religiosas (principalmente à Igreja Católica),<br />
às autoridades municipais ou ao Instituto da<br />
Comunicação Social (ICS), um departamento<br />
do estado subordinado ao GABINFO com<br />
a responsabilidade de desenvolver a<br />
comunicação nas zonas rurais.<br />
Num país onde apenas 40 por cento da<br />
população fala português (e apenas 6<br />
por cento como língua materna), 153 estas<br />
estações de rádio baseadas na comunidade<br />
com programação em línguas locais são um<br />
veículo fundamental para mobilizar líderes<br />
comunitários e promover a participação de<br />
crianças, jovens e mulheres nos debates<br />
da comunidade. Uma avaliação de 2006<br />
do impacto de oito estações de rádio<br />
comunitárias revelou que quase 100 por<br />
cento dos entrevistados reportaram ouvir<br />
a rádio comunitária local; muitos foram de<br />
opinião que a rádio pertence à comunidade,<br />
uma vez que fornece informação local, dá<br />
oportunidades para as pessoas expressarem<br />
as suas opiniões e preocupações, e promove<br />
a cultura local. 154<br />
No sector da imprensa escrita, o número<br />
de jornais, revistas, folhetos e boletins<br />
informativos registados cresceu para 254 em<br />
2006. 155 Existem três principais jornais diários<br />
(Notícias, Diário de Moçambique e O País),<br />
e estabeleceram-se vários outros periódicos<br />
no mercado nos últimos anos, incluindo<br />
o primeiro jornal gratuito, @ Verdade.<br />
Apesar do aumento da imprensa escrita, as<br />
questões de disponibilidade e preço a que<br />
se juntam taxas de analfabetismo de 48 por<br />
cento na população com 15 ou mais anos de<br />
idade 156 - resulta em baixo acesso, de modo<br />
que apenas um por cento da população faz<br />
uso dos órgãos impressos. 157<br />
A nível da transmissão televisiva,<br />
existem quatro estações, nas redes de<br />
televisão pública e privada. A Televisão<br />
de Moçambique (TVM), a rede estatal que<br />
começou a funcionar em 1981, continua a<br />
dominar, chegando agora à maior parte do<br />
país graças à instalação de retransmissores<br />
em 1992, a que se seguiu passagem para<br />
satélite. As televisões privadas têm vindo<br />
a ganhar força económica e visibilidade e<br />
estão a dar início ao processo de criação de<br />
delegações e repetidores nas províncias.<br />
Embora a posse de televisão familiar tenha<br />
passado de cinco para dez por cento entre<br />
os anos de 1997 a 2007 158 159 e os padrões<br />
de visualização em grupo signifiquem que,<br />
mesmo quem não tem televisor pode, por<br />
vezes, assistir a transmissões, a televisão<br />
continua fora do alcance da maioria dos<br />
moçambicanos: o acesso à televisão<br />
depende do acesso à electricidade e da<br />
penetração do serviço, e, como tal, continua<br />
confinado aos centros urbanos.<br />
228
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
A penetração e o número de assinantes do<br />
serviço móvel em Moçambique aumentou<br />
significativamente durante a primeira<br />
década do novo século, com dois operadores<br />
de rede móvel, a mCel (pertencente à<br />
Telecomunicações de Moçambique) e a<br />
Vodacom, dividindo o mercado. Em 2000,<br />
menos de um por cento da população tinha<br />
acesso a um telefone móvel, número que<br />
aumentou para cerca de 23 por cento 160<br />
em menos de dez anos, com um total de<br />
assinantes calculado em 4,2 milhões em<br />
2008. 161 O acesso à Internet, por outro lado,<br />
é quase inteiramente restrito aos centros<br />
urbanos e continua ainda mais limitado<br />
que a televisão. Dados de 2006 indicam que<br />
havia mais de 18 provedores de Internet<br />
a nível nacional. Apenas dois por cento<br />
da população tem acesso à Internet. 162 No<br />
entanto, a Internet é cada vez mais utilizada<br />
pelo sector dos media, representado<br />
por vários sites de notícias on-line e um<br />
crescente número de blogues e fóruns de<br />
discussão.<br />
6.2. O papel de mudança dos<br />
media: comunicação para<br />
o desenvolvimento e<br />
mobilização da comunidade<br />
Não só se expandiu o alcance dos media<br />
ao longo dos anos, mas também o<br />
conteúdo e o objectivo da programação.<br />
Além do uso tradicional dos meios de<br />
comunicação como um meio de divulgação<br />
de informação ao público e de transmissão<br />
de música, a rádio e outras formas de<br />
comunicação social incluem também<br />
agora programas de educação social e<br />
desenvolvimento comunitário destinados a<br />
levar as pessoas a adoptarem e manterem<br />
comportamentos saudáveis. Têm sido<br />
desenvolvidas actividades e estratégias dos<br />
media para sensibilizar para as questões<br />
de desenvolvimento audiências de massas<br />
e formadores de opinião, para influenciar<br />
atitudes e comportamentos a nível<br />
individual e colectivo, para fortalecer grupos<br />
marginalizados e vulneráveis, incluindo<br />
crianças e jovens.<br />
Este tipo de apoio dos media também tem<br />
recebido atenção especial como factor<br />
fundamental para garantir a participação,<br />
apropriação (ownership) e responsabilidade<br />
necessárias para alcançar os ODM. 163 Nesta<br />
perspectiva, a comunicação para estratégias<br />
e abordagens de desenvolvimento relativas<br />
a intervenções-chaves para a sobrevivência<br />
da criança (como as Semanas de Saúde<br />
da Criança e a Campanha Nacional de<br />
Saneamento), e a promoção dos direitos da<br />
criança (tais como o registo de nascimento e<br />
a prevenção da violência e do abuso) estão a<br />
ser actualmente desenvolvidas e promovidas<br />
a nível nacional. Têm como objectivo munir<br />
os cuidadores e os membros da comunidade<br />
de informações essenciais para desenvolver<br />
habilidades e auto-confiança para tomar<br />
decisões informadas sobre questões que<br />
afectam as suas vidas e o bem estar das<br />
suas crianças.<br />
6.3. Iniciativas promissoras nos<br />
media moçambicanos<br />
Além das formas mais convencionais de<br />
rádio, televisão e imprensa escrita, várias<br />
modalidades alternativas de comunicação<br />
social têm vindo a ganhar uma crescente<br />
popularidade em Moçambique. Ao utilizar<br />
uma abordagem que combina vários tipos<br />
de meios de comunicação e diálogo, estas<br />
iniciativas têm um enorme potencial para<br />
envolver mais pessoas, principalmente<br />
jovens, em actividades educativas, diálogo<br />
e debate públicos. Entre elas, encontramse<br />
Centros Multimedia Comunitários<br />
(CMC), Unidades Móveis Multimedia, Rádio<br />
Criança para Criança, e programas de Teatro<br />
Comunitários.<br />
Os Centros Multimedia Comunitários<br />
combinam rádio comunitária com outras<br />
formas de Tecnologia da Informação e<br />
Comunicação (TIC). Por terem um ‘Telecentro’<br />
físico com computadores, serviço de<br />
internet, telefones, faxes, fotocopiadoras<br />
e impressoras, as pessoas e organizações<br />
da comunidade podem fazer melhor uso<br />
da informação e dos media. Os Centros<br />
Multimedia Comunitários também<br />
229
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
proporcionam oportunidades de formação<br />
e permitem que as organizações da<br />
comunidade que os operam obtenham um<br />
pequeno rendimento de taxas cobradas para<br />
formação, utilização da internet, ou outros<br />
serviços. Em 2007, 18 Centros Multimedia<br />
Comunitários estavam operacionais em<br />
todo o país, havendo pelo menos um em<br />
cada província. 164 O quadro institucional dos<br />
Centros Multimedia Comunitários é ainda<br />
fraco 165 ; a sua utilidade e a possibilidade de<br />
serem bem sucedidos dependerão de maior<br />
propriedade e investimento do sector público.<br />
Uma segunda iniciativa promissora, gerida<br />
pelo Instituto da Comunicação Social, faz<br />
uso das Unidades Móveis Multimedia.<br />
As doze unidades estando cada viatura<br />
equipada com um projector de vídeo, um<br />
ecrã gigante de projecção de filmes, um<br />
rádio, uma tenda e materiais para testes<br />
de HIV, e materiais educativos desloca-se<br />
às comunidades rurais, onde normalmente<br />
permanece quatro dias de cada vez. Lá<br />
se encontrando, a equipe da unidade<br />
móvel mobiliza a comunidade em torno<br />
de questões-chave usando apresentações<br />
audiovisuais para envolver os participantes<br />
em diálogo e debate. As actividades são<br />
concebidas com a participação de líderes<br />
locais e, quando disponíveis, membros de<br />
associações de jovens. As unidades também<br />
oferecem uma oportunidade de testagem e<br />
aconselhamento sobre o HIV e a SIDA.<br />
Para estimular o engajamento e a<br />
participação de crianças e jovens na<br />
área dos media e proporcionar-lhes uma<br />
plataforma mais regular para exprimirem<br />
as suas opiniões, a Rádio Moçambique<br />
criou o programa Criança para Criança,<br />
que compreende transmissões de rádio<br />
comunitária feitas por crianças e destinadas<br />
a crianças. O programa Criança para<br />
Criança facilita o vínculo e a comunicação<br />
entre pais e filhos ao nível da comunidade<br />
sobre importantes questões dos direitos<br />
da criança. O programa também contribui<br />
para o cumprimento dos artigos 12, 13 e 14<br />
da Convenção dos Direitos da Criança, que<br />
estabelece os direitos da criança a liberdade<br />
de expressão, liberdade de procurar e<br />
transmitir informações e liberdade de<br />
pensamento, consciência e religião. Mais<br />
de mil crianças e adolescentes na faixa<br />
dos 11 a 18 anos 60 por cento das quais<br />
do sexo feminino 166 estão activamente<br />
envolvidas no desenvolvimento, produção<br />
e apresentação de programas de rádio. Em<br />
2007, o programa da Rádio Moçambique<br />
Criança para Criança ganhou o concurso<br />
do Dia Internacional da Criança na Rádio e<br />
Televisão na categoria ‘Excelência em Rádio’,<br />
em reconhecimento do papel central que<br />
as crianças desempenham na abordagem<br />
das questões dos direitos da criança,<br />
desenvolvendo, produzindo e apresentando<br />
programas de rádio para os seus pares.<br />
Em todo o país, mas especialmente em áreas<br />
com mais limitado acesso a tecnologia, o<br />
teatro comunitário tem provado ser um meio<br />
de comunicação interpessoal eficaz para<br />
fortalecer o conhecimento da comunidade<br />
e estimular e incentivar o debate sobre<br />
assuntos de interesse social, especialmente<br />
respeitantes a crianças e jovens. A Rede de<br />
Teatro Comunitário, com mais de 100 grupos<br />
de teatro a nível nacional, usa a abordagem<br />
Teatro do Oprimido na representação teatral<br />
em palco, abordagem essa que convida<br />
os membros do público a participarem<br />
activamente na representação. Através<br />
das suas representações, sensibilizam e<br />
promovem atitudes e comportamentos<br />
positivos 167 nas áreas de sobrevivência<br />
infantil, educação da rapariga, género e<br />
prevenção do HIV. No final de cada peça,<br />
estabelece-se um diálogo entre os actores e<br />
a plateia.<br />
6.4. Redes e parcerias amigas<br />
da criança<br />
Além das iniciativas que se estão a realizar<br />
a nível local, as redes e parcerias nacionais<br />
com os principais intervenientes na indústria<br />
dos media e da comunicação começam a<br />
mostrar o seu potencial como veículos para<br />
difundir mensagens sobre os direitos das<br />
crianças em todo o país.<br />
230
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Para informar sobre a situação dos<br />
direitos da criança em Moçambique, a<br />
organização não governamental Instituto de<br />
Comunicação Social da África Austral (Media<br />
Institute of Southern Africa) criou uma Rede<br />
de Comunicadores Amigos da Criança) em<br />
2007, envolvendo mais de 300 jornalistas<br />
de todo o país. A rede utiliza os órgãos de<br />
comunicação para publicar artigos sobre os<br />
direitos da criança, divulgar informações e<br />
conhecimentos sobre questões da infância, e<br />
denunciar violações dos direitos da criança.<br />
Além disso, a rede promove acções de<br />
formação para capacitação de jornalistas,<br />
publica análises e recomendações regulares<br />
para os media sobre como cobrir as<br />
questões relacionadas com as crianças,<br />
participa em debates públicos com<br />
especialistas sobre temas relacionados<br />
com os direitos da criança, e participa em<br />
campanhas de sensibilização para a adopção<br />
e implementação de políticas e legislação<br />
amigas da criança. 168<br />
Em termos de parcerias com o sector<br />
privado, têm-se aproveitado os provedores<br />
de serviços de telefonia móvel para divulgar<br />
mensagens pró-sociais ocasionais. A<br />
Mcel, que reivindica mais de 3 milhões de<br />
assinantes e uma quota de mercado de 70<br />
por cento, tem vindo a apoiar actividades<br />
em prol do bem-estar das crianças em<br />
Moçambique. Em 2008, uma parceria para<br />
os Direitos da Criança em Moçambique<br />
conseguiu servir-se do poder de marketing<br />
da Mcel utilizando os seus canais de<br />
distribuição para divulgar mensagens sobre<br />
os direitos da criança. Foram impressas em<br />
mais de 10 milhões de cartões de recarga<br />
da Mcel informações relacionadas com a<br />
Lei da Criança e mensagens gerais sobre<br />
os direitos da criança. Esta colaboração<br />
desenvolveu-se em campanha nacional, com<br />
spots televisivos e de rádio, anúncios de<br />
jornal e órgãos de comunicação externos.<br />
6.5. Privação de informação<br />
Infelizmente, o recente crescimento do<br />
sector dos media ainda tem que reduzir a<br />
incidência de crianças moçambicanas com<br />
privação severa de informação, definida<br />
como a percentagem de crianças com 5<br />
a 18 anos de idade sem posse de ou sem<br />
acesso a uma televisão, rádio ou jornal<br />
no lar. Uma análise da pobreza infantil<br />
de 2009 169 solicitada para a Avaliação do<br />
Impacto do PARPA II, usando uma medida<br />
de pobreza baseada em privações inspirada<br />
nos Indicadores de Bristol 170 revelou que 40<br />
por cento das crianças estavam em situação<br />
de privação severa de informação em 2008.<br />
Não havia nenhuma evidência de qualquer<br />
mudança na percentagem de crianças com<br />
privação severa de informação entre o<br />
Inquérito Demográfico e de Saúde 2003 e<br />
o MICS 2008, em que se baseou a análise<br />
de 2009. A análise também deu a conhecer<br />
que a privação severa de informação está<br />
altamente correlacionada com a riqueza do<br />
agregado familiar da criança. As crianças dos<br />
agregados mais pobres têm quase sete vezes<br />
mais probabilidade de sofrer de privação<br />
severa de informação do que as crianças das<br />
famílias mais ricas.<br />
6.6. Conclusões<br />
Apesar dos progressos realizados no sector<br />
da comunicação, ainda não foi realizado o<br />
pleno potencial dos meios de comunicação<br />
para divulgar informações, envolver<br />
comunidades no debate e contribuir para<br />
um melhor ambiente para as crianças. Em<br />
geral, o alcance dos media e a sua utilidade<br />
na implementação de mudanças no bemestar<br />
da criança são ainda limitados no país,<br />
especialmente no que respeita à imprensa<br />
escrita, à televisão e à internet. O reforço da<br />
liberdade de expressão e a sustentabilidade<br />
das iniciativas mais recentes estão entre os<br />
maiores desafios para o sector dos media.<br />
O elevado e imutável nível de privação<br />
de informação indica que as mensagens<br />
transmitidas através de formas convencionais<br />
de comunicação social podem não atingir um<br />
grande número de crianças. Maior atenção,<br />
portanto, deve ser dada a formas alternativas<br />
de media e comunicação que estão a ganhar<br />
força em Moçambique, especialmente<br />
nas zonas rurais. As estratégias de<br />
comunicação para o desenvolvimento<br />
231
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
centrado nas crianças têm de envolver<br />
mais nas intervenções os líderes locais, os<br />
mobilizadores sociais e os activistas.<br />
A Rede de Comunicadores Amigos da<br />
Criança mostra que os jornalistas de todo<br />
o país podem unir-se sob as questões da<br />
infância, mas é ainda preciso que se integre<br />
mais trabalho nas línguas locais usando os<br />
meios de comunicação social e os meios<br />
comunitários para divulgar as mensagens<br />
de comunicação de uma forma mais intensa.<br />
Também podem ser reforçadas parcerias<br />
com o sector privado. Como comprovado<br />
pela campanha Mcel 2008, há espaço para<br />
se explorar o uso sistemático de telefonia<br />
móvel para resultados de desenvolvimento e<br />
orientados para os direitos; outras parcerias<br />
podem também ser de grande potencial se<br />
estrategicamente desenvolvidas.<br />
Um último desafio é que a monitoria e<br />
avaliação das intervenções de comunicação<br />
para o desenvolvimento continuam<br />
dispendiosas e, portanto, limitadas,<br />
dependendo fortemente de dados qualitativos<br />
que são difíceis de aplicar nos vários<br />
programas e localizações geográficas. Esta<br />
situação deverá mudar nos próximos anos<br />
com o crescente reconhecimento de que<br />
a realização dos objectivos do Governo de<br />
redução da pobreza - assim como dos ODM<br />
- dependerão significativamente da expansão,<br />
consolidação e alinhamento dos esforços de<br />
comunicação nos vários sectores, público,<br />
privado e da sociedade civil.<br />
232
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
Referências<br />
1 Assembleia Geral das Nações Unidas,<br />
Declaração Universal dos Direitos do <strong>Home</strong>m,<br />
Nações Unidas, Nova Iorque, 1948.<br />
2 Assembleia Geral das Nações Unidas,<br />
Convenção sobre a Eliminação de Todas as<br />
Formas de Discriminação contra a Mulher,<br />
Nações Unidas, Nova Iorque, 1979.<br />
3 United Nations General Assembly, Vienna<br />
Declaration and Programme of Action, World<br />
Conference on Human Rights, Vienna, 14-25<br />
June 1993, A/CONF.157/23, 13 de Julho de<br />
1993.<br />
4 Ministério do Plano e Finanças, Plano de<br />
Acção para a Redução da Pobreza Absoluta,<br />
2001–2005, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2001<br />
5 Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Proposta de Programa do Governo para<br />
2010–2014, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 17 de Fevereiro de 2010.<br />
6 Ibid<br />
7 Tvedten, Inge, Margarida Paulo e Georgina<br />
Montserrat, Gender Policies and Feminization<br />
of Poverty in <strong>Mozambique</strong>, CMI Report, Chr.<br />
Michelsen Institute, Bergen, 2008.<br />
8 Cruzeiro do Sul, ‘Análise multidimensional<br />
da pobreza em três aldeias do norte de<br />
Moçambique, Relatório Final’, Maputo, 2007.<br />
9 Cuangara, Benedito e Brendan Kelly,<br />
‘The impact of the PARPA II in promoting<br />
the agricultural sector in <strong>Mozambique</strong>,’<br />
descarregado de: http://www.open.ac.uk/<br />
technology/mozambique/pics/d119369.pdf,<br />
2009.<br />
10 Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Plano de Acção para a Redução da<br />
Pobreza Absoluta, 2006–2009, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2006.<br />
11 Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Ministério da Mulher e da Acção Social e<br />
Grupo de Coordenação de Género, Gender<br />
Development Index no Contexto da Avaliação<br />
do PARPA II, 2006–2009), Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
12 Tvedten, Inge, Margarida Paulo e Georgina<br />
Montserrat, Gender Policies and Feminisation<br />
of Poverty in <strong>Mozambique</strong>, CMI Report, Chr.<br />
Michelsen Institute, Bergen, 2008.<br />
13 Instituto Nacional de Estatística , ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
14 Ministry of Education and Culture, Education<br />
Statistics: Annual school survey, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2004, 2005, 2006, 2007,<br />
2008.<br />
15 Ibid<br />
16 Pinheiro, Paulo Sérgio, World Report on<br />
Violence Against Children, Estudo do<br />
Secretário Geral das Nações Unidas sobre a<br />
Violência contra a Criança, Genebra, 2006.<br />
17 Tvedten, Inge, Margarida Paulo e Georgina<br />
Montserrat, Gender Policies and Feminisation<br />
of Poverty in <strong>Mozambique</strong>, CMI Report, Chr.<br />
Michelsen Institute, Bergen, 2008.<br />
18 United Nations Committee on the Elimination<br />
of Discrimination against Women,<br />
‘Consideration of reports submitted by States<br />
Parties under article 18 of the Convention on<br />
the Elimination of All Forms of Discrimination<br />
against Women, Combined initial and<br />
second periodic reports of States Parties<br />
– <strong>Mozambique</strong>,’ CEDAW/C/MOZ/1-2, Nações<br />
Unidas, Genebra, 14 de Novembro de 2005.<br />
19 Tvedten, Inge, Margarida Paulo e Carmeliza<br />
Rosário, “Opitanha”: Social relations of rural<br />
poverty in northern <strong>Mozambique</strong>, CMI Report<br />
2006:16, Chr. Michelsen Institute, Bergen,<br />
Noruega, 2006.<br />
20 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
21 Ibid<br />
22 Tvedten, Inge, Margarida Paulo e Carmeliza<br />
Rosário, “Opitanha”: Social relations of rural<br />
poverty in northern <strong>Mozambique</strong>, CMI Report<br />
2006:16, Chr. Michelsen Institute, Bergen,<br />
Noruega, 2006.<br />
233
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
23 Tvedten, Inge, Margarida Paulo e Georgina<br />
Montserrat, Gender Policies and Feminisation<br />
of Poverty in <strong>Mozambique</strong>, CMI Report, Chr.<br />
Michelsen Institute, Bergen, 2008.<br />
24 United Nations Committee on the Elimination<br />
of Discrimination against Women,<br />
‘Consideration of reports submitted by States<br />
Parties under article 18 of the Convention on<br />
the Elimination of All Forms of Discrimination<br />
against Women, Combined initial and<br />
second periodic reports of States Parties<br />
– <strong>Mozambique</strong>’, CEDAW/C/MOZ/1-2, Nações<br />
Unidas, Genebra, 14 de Novembro de 2005.<br />
25 United Nations, Declaration of Commitment<br />
on HIV/AIDS, Sessão Especial da Assembleia<br />
Geral das Nações Unidas sobre o HIV/SIDA,<br />
25–27 de Julho 2001.<br />
26 Southern African Research and<br />
Documentation Centre, Instituto Superior de<br />
Relações Internacionais, National Institute<br />
of Statistics e United Nations Development<br />
Programme, <strong>Mozambique</strong> National Human<br />
Development Report 2007, UNDP, Maputo,<br />
2007.<br />
27 Instituto Nacional de Estatística e Ministério<br />
da Saúde, Inquérito Nacional de Prevalência.<br />
Riscos Comportamentais e Informação sobre<br />
o HIV e SIDA em Mocambique (INSIDA),<br />
Relatório Preliminar sobre a Prevalência da<br />
Infecção por HIV, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2009.<br />
28 Instituto Nacional de Estatística, Ministério<br />
da Saúde, Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Centro de Estudos<br />
Africanos da Universidade Eduardo Mondlane,<br />
Conselho Nacional de Combate ao HIV/SIDA e<br />
Faculdade de Medicina, Impacto Demográfico<br />
do HIV/SIDA em Moçambique, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, Setembro de 2008.<br />
29 AIDS Accountability International, ‘The AIDS<br />
Accountability Scorecard on Women 2009’,<br />
Joint United Nations Programme on HIV/<br />
AIDS, Genebra, 2009.<br />
30 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />
de Indicadores Múltiplos 2008. Sumário,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2008.<br />
31 Ministry of Planning and Development,<br />
‘Poverty and Wellbeing in <strong>Mozambique</strong>: Third<br />
National Poverty Assessment.’ Governo de<br />
Moçambique, Setembro de 2010.<br />
32 Fox, Louise, Beating the Odds: Sustaining<br />
inclusion in <strong>Mozambique</strong>’s growing economy,<br />
The World Bank, Washington, D.C., 2008.<br />
33 United Nations Development Programme,<br />
<strong>Mozambique</strong> National Human Development<br />
Report 2007, UNDP, Maputo, 2007.<br />
34 Ibid.<br />
35 James, Robert C., Channing Arndt and<br />
Kenneth R. Simler, ‘Has Economic Growth<br />
in <strong>Mozambique</strong> Been Pro-Poor?’ Relatório<br />
de Discussão E8, Moçambique Ministério<br />
do Plano e Finanças, Direcção Nacional<br />
de Estudos e Análise de Políticas, Purdue<br />
University e International Food Policy and<br />
Research Institute, Maputo, 2005.<br />
36 Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Relatório de Avaliação de Impacto do PARPA<br />
II, 30 Outubro de 2009, para. 108, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
37 <strong>UNICEF</strong>, Trends in Child Poverty in<br />
<strong>Mozambique</strong>. A deprivations-based approach,<br />
Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2009.<br />
38 <strong>UNICEF</strong>, Trends in Child Poverty in<br />
<strong>Mozambique</strong>. A deprivations-based approach,<br />
Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2009.<br />
39 Ibid<br />
40 Ibid<br />
41 Instituto Nacional de Estatística e Ministério<br />
da Saúde, Inquérito Nacional de Prevalência.<br />
Riscos Comportamentais e Informação sobre<br />
o HIV e SIDA em Mocambique (INSIDA),<br />
Relatório Preliminar sobre a Prevalência da<br />
Infecção por HIV, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2009.<br />
42 <strong>UNICEF</strong>, Trends in Child Poverty in<br />
<strong>Mozambique</strong>. A deprivations-based approach,<br />
Ministério de Planificação e Desenvolvimento,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2009.<br />
43 McCoy, Simon, and ImarcianaCunamizana,<br />
Provincial Budget Allocations in the Health,<br />
Education and Water Sectors: An analysis<br />
2003–2006, Discussion paper no. 58E,<br />
<strong>UNICEF</strong> Moçambique e Direcção Nacional de<br />
Estudos e Análises de Políticas, Ministério<br />
de Planificação e Desenvolvimento, Maputo,<br />
Janeiro de 2008.<br />
234
CAPÍTULO 6: QUESTÕES TRANSVERSAIS<br />
44 Sal e Caldeira e Ximango Consoltores, Análise<br />
do Impacto da Estrutura das Despesas sobre o<br />
Desenvolvimento Económico e as Condições<br />
de Vida em Moçambique, Agência Suíça para<br />
o Desenvolvimento e Cooperação, 2009.<br />
45 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final’, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
46 Ibid.<br />
47 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final’, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
48 Sal e Caldeira e Ximango Consultores, Análise<br />
do Impacto da Estrutura das Despesas sobre o<br />
Desenvolvimento Económico e as Condições<br />
de Vida em Moçambique, Agência Suíça para<br />
o Desenvolvimento e Cooperação, 2009.<br />
49 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
50 Ibid<br />
51 Ministério da Mulher e da Acção Social,<br />
Inquérito sobre Violência Contra a Mulher,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2004.<br />
52 Centro de Documentação e Pesquisa para<br />
a África Austral, Instituto Superior de<br />
Relações Internacionais, Instituto Nacional<br />
de Estatística e Programa das Nações Unidas<br />
para o Desenvolvimento, Relatório Nacional<br />
de Desenvolvimento Humano de Moçambique<br />
2007, PNUD, Maputo, 2007.<br />
53 Commission on HIV/AIDS and Governance in<br />
Africa, ‘The Impacts of HIV/AIDS on Families<br />
and Communities in Africa,’ Comissão<br />
Económica para África, Adis Abeba, 2004.<br />
54 Instituto Nacional de Estatística, Ministério<br />
da Saúde, Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Centro de Estudos<br />
Africanos da Universidade Eduardo<br />
Mondlane, Conselho Nacional de Combate<br />
ao HIV/SIDA e Faculdade de Medicina,<br />
Impacto demográfico do HIV/SIDA em<br />
Moçambique: Actualização - Ronda de<br />
vigilância epidemiológica 2007, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2008.<br />
55 Centro de Documentação e Pesquisa para<br />
a África Austral, Instituto Superior de<br />
Relações Internacionais, Instituto Nacional<br />
de Estatística e Programa das Nações Unidas<br />
para o Desenvolvimento, Relatório Nacional<br />
de Desenvolvimento Humano de Moçambique<br />
2007, PNUD, Maputo, 2007.<br />
56 Ibid.<br />
57 Joint United Nations Programme on HIV/AIDS,<br />
<strong>Mozambique</strong> Modes of HIV Transmission and<br />
HIV Prevention Study, UNAIDS, Genebra,<br />
2009<br />
58 Instituto Nacional de Estatística, Ministério<br />
da Saúde, Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Centro de Estudos Africanos<br />
da Universidade Eduardo Mondlane, Conselho<br />
Nacional de Combate ao HIV/SIDA e<br />
Faculdade de Medicina, Impacto demográfico<br />
do HIV/SIDA em Moçambique. Actualização:<br />
Ronda de vigilância epidemiológica 2007,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2008.<br />
59 <strong>Mozambique</strong> National Institute of Health,<br />
London School of Hygiene and Tropical<br />
Medicine, and <strong>UNICEF</strong>, <strong>Mozambique</strong> National<br />
Childhood Mortality Study 2009, Governo de<br />
Moçambique, Maputo, 2009.<br />
60 Ibid.<br />
61 Instituto Nacional de Estatística e Ministério<br />
da Saúde, Inquérito Nacional de Prevalência.<br />
Riscos Comportamentais e Informação sobre<br />
o HIV e SIDA em Mocambique (INSIDA),<br />
Relatório Preliminar sobre a Prevalência da<br />
Infecção por HIV, Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2009.<br />
62 Government of <strong>Mozambique</strong> and National<br />
AIDS Council, Progress Report to the United<br />
Nations General Assembly Special Session<br />
on HIV and AIDS, 2008–2009, Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
63 Ghys, P.D., E. Kufa and M.V. George,<br />
‘Measuring trends in prevalence and incidence<br />
of HIV infection in countries with generalized<br />
epidemics,’Sexually Transmitted Infections,<br />
vol. 82, supplement 1, pp. i52–i56.<br />
64 Government of <strong>Mozambique</strong> and National<br />
AIDS Council, Progress Report to the United<br />
Nations General Assembly Special Session<br />
on HIV and AIDS, 2008–2009, Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
65 Ibid.<br />
235
POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />
66 Conselho Nacional de Combate ao HIV/SIDA,<br />
UNAIDS and Global AIDS Monitoring and<br />
Evaluation Team, Mocambique: Modos de<br />
Transmissão do HIV e estudo de prevenção do<br />
HIV, Maputo, 2009.<br />
67 Arnt, Channing, ‘HIV/AIDS, Human Capital and<br />
Economic Prospects for <strong>Mozambique</strong>,’ Trade<br />
and Macroeconomic Division, International<br />
Food Policy Research Institute, Purdue<br />
University, Washington, DC, USA, 2002.<br />
68 Verde Azul Consultant Lda, for the Ministry of<br />
Education, Assessment of the Impact of HIV/<br />
AIDS on the Education Sector in <strong>Mozambique</strong>,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2000.<br />
69 United Nations, Declaration of Commitment<br />
on HIV/AIDS, United Nations General<br />
Assembly Special Session on HIV and AIDS,<br />
Genebra, 25–27 Junho de 2001.<br />
70 Instituto Nacional de Estatística, ‘MICS 2008,<br />
Relatório Final,’ Governo de Moçambique,<br />
Maputo, 2010.<br />
71 Ibid<br />
72 Ibid<br />
73 Leclerc-Madlala, Suzanne, ‘Intergenerational/<br />
age-disparate sex,’ policy and programme<br />
action brief from the technical meeting<br />
on young women in HIV hyper-endemic<br />
countries of southern Africa, descarregado<br />
de http://www.unaidsrstesa.org/userfiles/file/<br />
womenGirls_AgeDisparate.pdf,2010.<br />
74 Duerr, Ann, Stacey Hurst, Athena P. Kourtis,<br />
Naomi Rutenberg and Denise J. Jamieson,<br />
‘’Integrating family planning and prevention of<br />
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da Saúde, Ministério de Planificação e<br />
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da Universidade Eduardo Mondlane, Conselho<br />
Nacional de Combate ao HIV/SIDA e<br />
Faculdade de Medicina, Impacto demográfico<br />
do HIV/SIDA em Moçambique. Actualização<br />
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Governo de Moçambique, Maputo, 2008.<br />
92 Ibid<br />
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Governo de Moçambique, Maputo, 2009.<br />
95 Instituto Nacional de Estatística, Ministério<br />
da Saúde, Ministério de Planificação e<br />
Desenvolvimento, Centro de Estudos Africanos<br />
da Universidade Eduardo Mondlane, Conselho<br />
Nacional de Combate ao HIV/SIDA e<br />
Faculdade de Medicina, Impacto demográfico<br />
do HIV/SIDA em Moçambique. Actualização<br />
- Ronda de Vigilância Epidemiológica 2007,<br />
Governo de Moçambique, Maputo, 2008.<br />
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240