21.11.2014 Views

Baixar PDF - UNICEF Mozambique - Home page

Baixar PDF - UNICEF Mozambique - Home page

Baixar PDF - UNICEF Mozambique - Home page

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

CAPÍTULO 4: A EDUCAÇÃO E O DIREITO DAS CRIANÇAS AO DESENVOLVIMENTO<br />

CAPÍTULO<br />

5<br />

PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

139


Protecção<br />

da criança<br />

5CAPÍTULO<br />

1. Introdução<br />

A Convenção sobre os Direitos da Criança,<br />

a Carta Africana sobre os Direitos e Bemestar<br />

da Criança e outros instrumentos a<br />

nível internacional e regional apresentam<br />

uma ampla análise da necessidade de<br />

protecção da criança. Esses ordenamentos<br />

jurídicos reconhecem que as crianças são<br />

vulneráveis a violações dos seus direitos<br />

humanos básicos, e, consequentemente,<br />

concedem-lhes o direito fundamental a<br />

protecção jurídica e social, antes e após<br />

o nascimento. O dever de protecção das<br />

crianças recai tanto sobre entidades públicas<br />

como privadas, que têm a responsabilidade<br />

de proteger meninos e meninas de violência,<br />

abuso, exploração e negligência, incluindo<br />

separação desnecessária do seu ambiente<br />

familiar, e dos efeitos de situações de<br />

emergência. Através de sistemas e serviços<br />

legislativos, sociais e administrativos<br />

apropriados, entre os quais programas<br />

de protecção social, podem ser tratados<br />

os riscos de violação dos direitos das<br />

crianças conhecidos, o que poderá reduzir<br />

a vulnerabilidade das crianças e fortalecer a<br />

sua resistência.<br />

Entre as várias formas de maus tratos e<br />

abuso que ameaçam as crianças encontramse<br />

o abuso e a exploração sexual, o tráfico,<br />

trabalho perigoso, violência, viver ou<br />

trabalhar nas ruas, deficiência, SIDA, e<br />

práticas prejudiciais como o casamento<br />

prematuro, a falta de acesso a uma<br />

justiça amiga da criança, a separação e a<br />

institucionalização desnecessárias, entre<br />

outros. Uma protecção efectiva da criança<br />

mitiga os riscos e vulnerabilidades que<br />

contribuem para estes abusos. Um ambiente<br />

protector para as crianças apoiado por<br />

um sólido sistema e infra-estruturas de<br />

protecção é uma abordagem baseada em<br />

direitos para impulsionar o progresso do<br />

desenvolvimento humano e económico,<br />

melhorando a saúde, a educação e o bemestar<br />

das crianças bem como as capacidades<br />

que estão a desenvolver para serem<br />

pais, cidadãos e membros produtivos da<br />

sociedade. Pelo contrário, um sistema de<br />

protecção da criança difuso e fragmentado<br />

agrava a pobreza, a exclusão social e<br />

a susceptibilidade a infecção pelo HIV,<br />

aumentando também a probabilidade de<br />

sucessivas gerações virem a enfrentar riscos<br />

semelhantes.<br />

Os principais ministérios de Moçambique<br />

responsáveis pela educação, fortalecimento<br />

e manutenção de um sistema de protecção<br />

da criança são o Ministério da Mulher e<br />

da Acção Social, o Ministério da Justiça, o<br />

Ministério do Interior e os tribunais judiciais.<br />

Todos os ramos do governo, a sociedade<br />

civil e as organizações internacionais,<br />

juntamente com os sistemas informais,<br />

como as famílias e as comunidades, têm a<br />

responsabilidade de cooperar, coordenar e<br />

colaborar para nutrir e sustentar os esforços<br />

de protecção dos direitos das crianças.<br />

141


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

Embora se tenham registado importantes<br />

avanços na protecção dos direitos das<br />

crianças em Moçambique, muito ainda há<br />

a alcançar: aumentar o acesso das crianças<br />

a serviços sociais básicos de protecção<br />

e outros, harmonizar as ferramentas<br />

de monitoria para melhorar a recolha e<br />

análise de dados para o acompanhamento<br />

e planificação efectiva do bem-estar das<br />

crianças ao longo do tempo, e fortalecer<br />

as capacidades dos ministérios relevantes.<br />

O objectivo é o desenvolvimento de uma<br />

abordagem sistémica e robusta à protecção<br />

das crianças que torne os ministérios mais<br />

responsáveis e melhore a coordenação entre<br />

eles nos diversos níveis administrativos<br />

para proteger eficazmente as crianças. É<br />

necessário que se concentrem também<br />

esforços na sensibilização a todos os<br />

níveis da sociedade, incluindo crianças,<br />

famílias e comunidades, para os direitos<br />

das crianças e a obrigação de todos os<br />

intervenientes de promover a protecção da<br />

criança. Este capítulo descreve a situação<br />

da protecção da criança em Moçambique,<br />

analisa os progressos realizados e apresenta<br />

uma análise das lacunas e problemas no<br />

ambiente de protecção da criança.<br />

142


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

2. Reforma legislativa e das políticas<br />

O amplo pacote de legislação aprovado em<br />

2008 demonstra o compromisso do Governo<br />

de Moçambique para com a protecção dos<br />

direitos da criança e o melhoramento da<br />

situação das crianças e mulheres vítimas<br />

de violência, abuso e exploração. Para<br />

além disso, foram criados quatro tribunais<br />

especializados para menores visando reduzir<br />

o atraso de decisões judiciais pendentes e<br />

melhorar as capacidades do sistema judicial<br />

para gerir eficazmente os casos de crianças<br />

em conflito com a lei e melhorar a protecção<br />

dos direitos da criança.<br />

Também o Ministério do Interior, no âmbito<br />

dos serviços policiais para proteger os<br />

direitos das crianças e mulheres, tem vindo<br />

a criar e racionalizar procedimentos-padrão<br />

bem como a aplicar abordagens mais<br />

sistemáticas. Foi ainda criado pelo Ministério<br />

da Mulher e da Acção Social, em 2009,<br />

um grupo de trabalho multissectorial para<br />

prevenção da violência contra as crianças,<br />

na sequência do Estudo das Nações Unidas<br />

sobre a Violência e do III Congresso Mundial<br />

contra a Exploração Sexual de Crianças e<br />

Adolescentes, onde o Governo reconheceu<br />

a necessidade urgente de uma abordagem<br />

multissectorial de prevenção e resposta<br />

à violência contra crianças e da criação<br />

de um sistema de encaminhamento para<br />

assistência às vítimas. 1<br />

Os sistemas nacionais de protecção<br />

da criança eficazes começam por leis,<br />

políticas e regulamentos concebidos para<br />

defender os direitos da criança em todas<br />

as circunstâncias. A falta de um quadro de<br />

políticas adequado agrava a vulnerabilidade<br />

da criança e aumenta a probabilidade de lhe<br />

ser negada uma série de direitos que vão<br />

para além dos estritamente associados à<br />

protecção. A responsabilidade de respeitar,<br />

proteger e cumprir direitos é compartilhada<br />

por vários actores, mas é o Estado o<br />

primeiro garante de direitos seja nos termos<br />

do direito internacional seja nos termos da<br />

Constituição moçambicana. O Estado deve,<br />

e tanto quanto possível, garantir que exista<br />

protecção na lei, criar e fortalecer instituições<br />

eficazes para fazer cumprir a lei e trabalhar<br />

com a sociedade civil e o sector privado na<br />

promoção de valores e práticas positivas<br />

para melhorar a eficácia da protecção legal.<br />

Com a aprovação de três instrumentos - a<br />

Lei da Criança, a Lei da Justiça Juvenil e a<br />

Lei sobre a Violência Doméstica – promoveuse<br />

um Sistema de Protecção da Criança<br />

nacional efectivo, cujo quadro tem vindo<br />

a ser desenvolvido. Outras medidas que<br />

vêm sendo adoptadas pelo governo são a<br />

criação do Conselho Nacional da Criança<br />

e da Comissão de Direitos Humanos<br />

e do Parlamento Infantil, bem como a<br />

sensibilização para as questões de direitos<br />

da criança nos media. Foram criados em<br />

cinco províncias tribunais de menores para<br />

fortalecer a protecção das crianças em<br />

conflito e em contacto com a lei.<br />

Moçambique ratificou diversos importantes<br />

instrumentos internacionais e regionais<br />

de direitos humanos sobre a protecção<br />

da criança, o que reflecte o compromisso<br />

do Governo para com a harmonização<br />

da legislação nacional com as normas<br />

internacionais. A Constituição de 2004<br />

estabelece claramente que todas as acções<br />

relativas às crianças, empreendidas tanto<br />

por entidades públicas como por instituições<br />

privadas, devem considerar o melhor<br />

interesse da criança, em conformidade com<br />

a Convenção sobre os Direitos da Criança.<br />

A Constituição define os contornos do<br />

quadro jurídico e de políticas concernente às<br />

crianças, como abaixo descrito. Ver Caixa 5.1<br />

para desenvolvimentos recentes e futuros no<br />

quadro jurídico de protecção das crianças.<br />

As políticas e os programas de protecção<br />

social têm-se revelado eficazes na resposta<br />

às necessidades das famílias e crianças<br />

vulneráveis uma vez que a protecção social<br />

desempenha um papel fundamental na<br />

redução da pobreza, superação da exclusão<br />

143


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

social e constituição de capital humano<br />

para se atenuarem os riscos enfrentados<br />

por grupos vulneráveis, particularmente<br />

crianças e suas famílias. Várias formas de<br />

política de protecção social existiram em<br />

Moçambique desde 1975, variando ao longo<br />

dos anos o papel pretendido para o Estado,<br />

desde o de ambicioso provedor de todos os<br />

serviços (após a independência) até ao de<br />

fornecedor marginal de regimes de pensões<br />

extremamente limitados, ajuda de resposta<br />

a situações de emergência e subsídios<br />

alimentares para idosos (na sequência de<br />

programas de ajustamento estrutural).<br />

Nos últimos anos, no entanto, tem-se dado<br />

uma atenção mais centrada no reforço da<br />

protecção social em todo o país, começando<br />

a reconhecer-se a importância da protecção<br />

das crianças vulneráveis no diálogo sobre<br />

políticas nacionais. Além disso, os sectores de<br />

Saúde e Educação têm programas específicos<br />

para crianças com necessidades específicas<br />

(serviços de saúde gratuitos para crianças<br />

menores de cinco anos e crianças padecendo<br />

de desnutrição, e apoio em material educativo<br />

para crianças vulneráveis).<br />

A Lei sobre a Protecção Social, aprovada<br />

em 2007, exige que se ofereça segurança<br />

social básica a pessoas e crianças pobres<br />

em situações difíceis. Nela se define<br />

protecção social como “um conjunto de<br />

medidas que visam mitigar, em sintonia<br />

com as condições económicas do país, a<br />

pobreza absoluta da população, garantindo a<br />

subsistência dos trabalhadores em situações<br />

de privação ou diminuição de capacidade<br />

para o trabalho, bem como a sobrevivência<br />

de outros membros da família caso o<br />

dito trabalhador tenha falecido, e garantir<br />

condições para a sua sobrevivência.” 2 A<br />

lei reparte ainda a protecção social por<br />

três pilares: protecção social obrigatória<br />

(seguro social sob tutela dos Ministérios<br />

do Trabalho e das Finanças para os que<br />

se encontram no mercado de trabalho<br />

formal); protecção social complementar<br />

(iniciativas adicionais através dos sectores<br />

privado e de voluntariado) e protecção<br />

social básica, o que tem maior potencial<br />

para chegar às crianças vulneráveis. A<br />

protecção social básica abrange os cidadãos<br />

que estão impossibilitados de trabalhar ou<br />

que não têm meios para satisfazer as suas<br />

necessidades básicas, a saber:<br />

• Pessoas em situação de pobreza absoluta;<br />

• Crianças em difíceis circunstâncias;<br />

• Idosos em situação de pobreza;<br />

• Pessoas portadoras de deficiência em<br />

situação de pobreza absoluta;<br />

• Pessoas com doenças crónicas ou<br />

doenças degenerativas.<br />

As Normas da Estratégia se Segurança Social<br />

Básica aprovadas em 2009, subdividem a<br />

segurança social básica em acção social<br />

directa, acção social relacionada com a saúde,<br />

acção social relacionada com a educação e<br />

rede de segurança produtiva. A Estratégia<br />

de Segurança Social Básica multissectorial,<br />

que foi aprovada pelo Conselho de Ministros<br />

em 2010, identifica quatro programas<br />

constituintes do pacote de segurança social<br />

básico: dois programas de transferência de<br />

dinheiro (o actual Programa Subsídio de<br />

Alimentos [PSA] e um novo programa de<br />

subsídios para a criança destinado a famílias<br />

com crianças órfãs e vulneráveis a seu cargo);<br />

o actual Programa de Apoio Social Directo<br />

(PASD) e um novo programa da rede de<br />

segurança produtiva. Planeia-se expandir o<br />

PSA para que dê maior enfoque a crianças<br />

órfãs e vulneráveis como beneficiários<br />

indirectos. A operacionalização do programa<br />

de subsídios para crianças proposto depende<br />

das conclusões da avaliação contínua do<br />

impacto do PSA e de outros estudos de<br />

viabilidade. O alcance actualmente limitado<br />

do PASD inclui ainda uma percentagem<br />

relativamente elevada de crianças<br />

beneficiárias. Prevê-se a instauração de um<br />

mecanismo para garantir que as famílias<br />

vulneráveis tenham acesso a um conjunto de<br />

serviços básicos e protecção, possivelmente<br />

partindo da experiência do atestado de<br />

pobreza actual. Deverá ser finalizado até<br />

ao final de 2010 um plano operacional para<br />

complementar a estratégia, o qual constituirá<br />

um importante instrumento para procurar<br />

influenciar no sentido de maiores fundos do<br />

governo para implementar esses programas.<br />

144


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

Caixa 5.1: Legislação e políticas de protecção social recentemente aprovadas<br />

2010<br />

2009<br />

2008<br />

A Estratégia de Protecção Social Básica inclui, como parte integrante, subsídios para<br />

crianças.<br />

A Lei da Violência Doméstica tem por objectivo aumentar a protecção das mulheres e das<br />

crianças contra o abuso e a exploração sexual em casa e nas comunidades. Criminaliza<br />

pela primeira vez a violência doméstica em Moçambique, requer penalizações acrescidas<br />

para os infractores e atribui ao Estado a obrigação de assistir as vítimas oferecendo<br />

serviços como investigação policial e tratamento médico.<br />

A Lei da Criança e a Lei da Justiça Juvenil, ambas aprovadas em 2008, traduzem a<br />

Convenção sobre os Direitos da Criança na legislação nacional de direitos da criança, um<br />

passo importante para a criação de um quadro jurídico e político concernente à criança.<br />

A Lei sobre o Tráfico de Pessoas, Especialmente Mulheres e Crianças define o tráfico de<br />

pessoas em consonância com os instrumentos jurídicos internacionais (nomeadamente o<br />

Protocolo de Palermo, ratificado em 2006) e criminaliza o tráfico, sobretudo de crianças e<br />

mulheres. Tem de ser elaborado e aprovado o regulamento desta lei.<br />

A Lei do Trabalho proíbe explicitamente as piores formas de trabalho infantil para crianças<br />

menores de 18 anos. Estabelece que as crianças entre os 15 e os 18 anos só podem<br />

trabalhar um máximo de 38 horas por semana ou 7 horas por dia. Em reconhecimento da<br />

realidade económica do país, permite que as crianças de 12 a 15 anos trabalhem, desde<br />

que o façam com a permissão de um dos seus progenitores ou outro responsável legal.<br />

A Lei de Protecção Social exige a provisão de segurança social básica a pessoas pobres<br />

e crianças em situações difíceis. A lei define protecção social como “um conjunto de<br />

medidas que visam mitigar ... a pobreza absoluta da população, garantindo a subsistência<br />

dos trabalhadores em situações de privação ou capacidade para o trabalho diminuída,<br />

bem como a de familiares sobrevivos em caso de morte do referido trabalhador, e garantir<br />

condições para a sua sobrevivência.”<br />

2006<br />

2005<br />

2004<br />

O Plano Nacional para Crianças Órfãs e Vulneráveis identifica seis serviços essenciais<br />

para atender às principais necessidades das crianças: saúde, educação, apoio nutricional e<br />

alimentar, apoio financeiro, apoio jurídico e apoio psicológico. O Governo de Moçambique<br />

comprometeu-se a garantir que as crianças tenham acesso a pelo menos três desses seis<br />

serviços, com particular incidência sobre as crianças que vivem abaixo da linha de pobreza<br />

absoluta, incluindo órfãos e crianças a viver com e afectadas pela SIDA. A implementação<br />

do plano é coordenada pelo Ministério da Mulher e Acção Social com o apoio de um grupo<br />

de trabalho técnico multissectorial e do Grupo de Trabalho Técnico para Crianças Órfãs e<br />

Vulneráveis.<br />

O Plano Nacional de Acção para a Criança 2006-2010 visa proteger os direitos civis e<br />

humanos e a segurança de todas as crianças desenvolvendo e coordenando actividades<br />

das principais partes interessadas.<br />

A Lei da Família articula novas normas jurídicas para responsabilidades parentais, guarda,<br />

adopção e herança, e eleva a idade de casamento de 16 para 18 anos tanto para rapazes<br />

como para raparigas.<br />

O Código do Registo Civil alarga o período de registo de nascimento gratuito de 30 para<br />

120 dias a contar do nascimento da criança.<br />

145


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

3. Violência, abuso e exploração<br />

A violência contra as crianças é uma<br />

grave violação dos direitos humanos com<br />

devastadoras consequências para a saúde<br />

física e mental a curto e longo prazo.<br />

Crianças vítimas de violência incluem<br />

crianças que foram abusadas sexualmente<br />

ou submetidas a violência como punição;<br />

crianças forçadas a trabalhar em condições<br />

deploráveis ou traficadas em condições<br />

de trabalho exploratórias, ou crianças<br />

forçadas a casamento prematuro. Tal<br />

violência ultrapassa fronteiras geográficas,<br />

atravessando culturas, classes, raças e<br />

religiões. Pode ser expressa como agressão<br />

ou abuso físico ou sexual, maus tratos<br />

psicológicos ou emocionais, privação ou<br />

negligência. O risco de violência é agravado<br />

pela pobreza, que muitas vezes anda de<br />

mãos dadas com a falta de protecção<br />

adequada por parte dos cuidadores e<br />

limitado acesso a serviços essenciais.<br />

Estatísticas do Ministério do Interior revelam<br />

terem sido reportados à polícia mais de<br />

3.500 casos de violência infantil em 2009. 3 É<br />

possível que o número de crianças vítimas<br />

de violência, abuso e exploração supere em<br />

muito o número de casos notificados.<br />

O Estudo das Nações Unidas sobre a<br />

Violência constata que a violência contra<br />

as crianças é importante em termos de<br />

escala, alcance e subnotificação, três<br />

aspectos agravados pela aceitação social<br />

do fenómeno. 4 Algumas formas de violência<br />

estão enraizadas em dinâmicas de género<br />

discriminatórias e desiguais e práticas<br />

nocivas, e Moçambique não constitui<br />

excepção. Estudos e dados disponíveis<br />

constituem uma base para se afirmar que é<br />

excepcionalmente forte em Moçambique a<br />

cultura patriarcal existente e ordem social<br />

dominada pelo sexo masculino. 5 O baixo<br />

nível de conhecimento que as vítimas<br />

possuem dos seus direitos e uma cultura<br />

de silêncio e aceitação da violência são os<br />

principais obstáculos ao lidar-se com esta<br />

questão.<br />

São limitados os dados quantitativos recentes,<br />

mas pesquisas anteriores relataram uma alta<br />

incidência de exploração e abuso sexual de<br />

crianças e mulheres no lar, no trabalho e na<br />

escola. O abuso sexual de crianças e mulheres<br />

continua a ser uma grande preocupação<br />

em Moçambique. Em 2001, o Inquérito<br />

Nacional de saúde sexual e reprodutiva e<br />

comportamento sexual dos jovens indicou que<br />

30 por cento das mulheres e 37 por cento dos<br />

homens, quando crianças ou adolescentes,<br />

tinham testemunhado directamente violência<br />

entre os seus pais, e que 15 por cento das<br />

mulheres e 20 por cento dos homens sofreram<br />

abuso físico de um parente na sua juventude. 6<br />

Um estudo realizado pelo Ministério da Mulher<br />

e da Acção Social em 2004 indicou que mais<br />

de 54 por cento das mulheres pesquisadas<br />

relataram ter sido espancadas, e 23 por cento<br />

dos inquiridos reportaram ter sido submetidos<br />

a alguma forma de abuso sexual. 7 A maioria<br />

dos infractores é conhecida das vítimas e,<br />

muitas vezes, familiares próximos e amigos.<br />

As leis para proteger crianças e adolescentes<br />

contra o abuso sexual deixam considerável<br />

margem de manobra para o sistema judiciário<br />

interpretar se uma criança foi vítima de abuso<br />

sexual. Por exemplo, apenas com crianças<br />

menores de 12 são proibidas relações sexuais<br />

em qualquer circunstância (inclusive se se<br />

tiver estabelecido consenso) e as penas<br />

criminais podem ser em qualquer lugar, de<br />

dois a oito anos. No que respeita a crianças<br />

com mais de doze anos, é conferida ao juiz<br />

autoridade para determinar se ocorreu abuso<br />

sexual, mesmo no caso de adolescentes<br />

vítimas de abuso cometido por adultos.<br />

3.1. Violência e abuso sexual nas<br />

escolas<br />

O abuso sexual nas escolas constitui uma<br />

área de particular preocupação, como<br />

observou o Comité dos Direitos da Criança. 8<br />

Um inquérito do Ministério da Educação<br />

(MINED) de 2008 revelou que 70 por cento<br />

146


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

das meninas inquiridas relataram que<br />

alguns professores usam a relação sexual<br />

como condição para passar de classe,<br />

tendo 50 por cento afirmado que não são<br />

unicamente os professores que delas<br />

abusam sexualmente, mas também rapazes<br />

do seu grupo de colegas. Além disso, 80 por<br />

cento das raparigas reconheceram que o<br />

abuso e o assédio sexuais ocorrem não só<br />

nas escolas mas também nas comunidades.<br />

Muitas meninas não sabiam se esses actos<br />

eram proibidos por lei nem onde reportá-los<br />

quando ocorrem. 9<br />

A resposta institucional aos abusos sexuais<br />

nas escolas é limitada. O estudo também<br />

analisou o nível de consciencialização dos<br />

funcionários do MINED sobre o assunto.<br />

70 por cento dos funcionários provinciais<br />

de unidades provinciais de género e 65<br />

por cento dos coordenadores distritais de<br />

género reconheceram que o abuso sexual<br />

contra meninas e a gravidez precoce eram<br />

as principais preocupações e importantes<br />

obstáculos à provisão de um ambiente<br />

de aprendizagem seguro para a rapariga.<br />

Os membros dos Conselhos da Escola<br />

mostraram também preocupação com<br />

o abuso e assédio sexual nas escolas e<br />

tentaram medidas disciplinares estritas<br />

contra os professores que abusam de<br />

meninas na escola.<br />

O MINED tem uma política de ‘tolerância<br />

zero’ para o abuso sexual nas escolas, mas<br />

a continua fraca a sua aplicação. Em 2003,<br />

o MINED emitiu um decreto (Despacho<br />

39/GM/2003) proibindo os professores de<br />

terem relações sexuais com estudantes do<br />

sexo feminino e declarou ‘tolerância zero’ ao<br />

abuso sexual nas escolas. A Lei da Criança<br />

moçambicana de 2008 reafirma a obrigação<br />

da direcção da escola de comunicar às<br />

autoridades competentes os casos de<br />

maus tratos a alunos. No entanto, tanto o<br />

acompanhamento de actos de violência<br />

nas escolas como a implementação do<br />

decreto permanecem fracos. A revisão<br />

da estratégia de género e do decreto<br />

39/GM/2003 para enfatizar a notificação<br />

de violência e abuso sexual faz parte do<br />

plano de trabalho do MINED para 2010. A<br />

integração de questões de abuso sexual<br />

nas directrizes de planificação de 2010 é um<br />

avanço significativo que está a conduzir ao<br />

desenvolvimento de acções definidas para<br />

reforçar a capacidade dos pontos focais de<br />

género provinciais em matéria de monitoria<br />

e notificação de casos de abuso sexual nas<br />

escolas.<br />

Continuam a ser permitidos os castigos<br />

corporais em casa e na escola, sendo<br />

muitas vezes considerados a única forma<br />

de disciplinar as crianças. O Comité dos<br />

Direitos da Criança expressou preocupação<br />

pelo facto de “a Lei de Protecção dos<br />

Direitos da Criança (de Moçambique) não<br />

proibir explicitamente os castigos corporais<br />

em casa e nas escolas... que, apesar de<br />

os regulamentos internos do MINED, que<br />

proíbe os castigos corporais, continuam a ser<br />

infligidos às crianças por pais e professores.”<br />

O Estudo das Nações Unidas sobre Violência<br />

contra Crianças considera essencial haver<br />

sensibilização para influenciar as normas<br />

sociais, não só para as comunidades,<br />

incluindo as escolas, mas também para os<br />

profissionais em contacto com crianças.<br />

Uma adequada atenção dos media também<br />

consciencializa, promove discussão aberta<br />

e encoraja as comunidades a reagirem em<br />

casos de abuso e exploração. Tornar os<br />

serviços de apoio e reabilitação disponíveis é<br />

outro aspecto fundamental. Essas respostas<br />

tornam-se significativamente mais eficazes<br />

pela existência de um mecanismo de<br />

coordenação eficaz. Em 2009, o Ministério<br />

da Mulher e da Acção Social criou um grupo<br />

de trabalho multissectorial para questões<br />

de prevenção da violência contra crianças<br />

na sequência do Estudo das Nações Unidas<br />

para a Violência e do III Congresso Mundial<br />

contra a Exploração Sexual de Crianças e<br />

Adolescentes. Embora o processo de reforma<br />

legal tenha progredido, a tradução da nova<br />

legislação em regulamentação e programas<br />

eficazes continua a constituir, em virtude da<br />

falta de fundos, um desafio.<br />

O Plano de Acção para Prevenção da<br />

Violência Contra as Crianças está agora<br />

em fase de conclusão. O plano delineia<br />

147


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

actividades relativas à protecção das<br />

crianças contra violência, negligência e<br />

exploração sexual estejam a ter lugar. 10<br />

A promulgação da Lei sobre a Violência<br />

Doméstica de 2009 pode impulsionar o<br />

fortalecimento de mecanismos para proteger<br />

as mulheres e as crianças de abuso sexual.<br />

Parceiros da sociedade civil prestaram<br />

acções de sensibilização a nível da<br />

comunidade, entre as quais uma campanha<br />

da Action Aid contra o abuso sexual de<br />

raparigas na escola.<br />

3.2. A violência doméstica<br />

Cinquenta e quatro por cento das<br />

mulheres que participaram num estudo<br />

do Ministério da Mulher e da Acção Social<br />

de 2004 informaram ter sido espancadas.<br />

A aceitação cultural da violência é um<br />

importante factor que muito contribui para a<br />

violência doméstica. 11 O perpetrador foi mais<br />

frequentemente o marido ou um parente<br />

próximo ou um conhecido. Dez por cento<br />

das respondentes relataram ter sido vítimas<br />

de algum tipo de abuso sexual. Nas áreas<br />

rurais foram reportados mais elevados níveis<br />

de violência contra as mulheres do que nas<br />

áreas urbanas. I<br />

A percentagem de mulheres que consideram<br />

que os homens têm o direito de lhes bater<br />

em certas circunstâncias desceu de 54<br />

por cento em 2003 para 36 por cento em<br />

2008. II,III Embora a redução seja positiva,<br />

continua muito elevada a aceitação da<br />

violência contra as mulheres. A razão<br />

mais comummente citada no Inquérito de<br />

Indicadores Múltiplos (MICS) de 2008 para<br />

bater na esposa é o marido aperceber-se de<br />

que a esposa está a ser negligente com as<br />

crianças. Este motivo foi citado por 21 por<br />

cento dos inquiridos (ver Figura 5.1).<br />

Há disparidades regionais nas atitudes<br />

de violência doméstica. A educação dos<br />

Figura 5.1: Percentagem de mulheres de 15-49 anos que acham que um marido pode bater na sua esposa, por<br />

motivo específico, 2008<br />

40%<br />

35%<br />

30%<br />

25%<br />

20%<br />

15%<br />

10%<br />

5%<br />

0%<br />

21%<br />

19%<br />

18%<br />

19%<br />

Quando ela<br />

sai de casa<br />

sem informar<br />

Quando é<br />

negligente<br />

com as crianças<br />

Quando<br />

discute<br />

com ele<br />

Quando<br />

recusa fazer<br />

sexo com ele<br />

13%<br />

Quando<br />

deixa a comida<br />

queimar-se<br />

36%<br />

Por qualquer<br />

destas razões<br />

Fonte: MICS 2008.<br />

I<br />

O estudo, realizado em 2004 para o Ministério pela Universidade Eduardo Mondlane, Centro de Estudos da População,<br />

incluiu 2052 mulheres com idades compreendidas entre os 18 e os 45 anos na Cidade de Maputo, Província de Maputo,<br />

Sofala, Manica, Zambézia e Nampula (Universidade Eduardo Mondlane, 2004).<br />

II Este valor é significativamente mais baixo que a média dos países da África Austral, onde 65 por cento das raparigas<br />

e mulheres com 15-49 anos pensam que se justifica um marido espancar ou bater na mulher em determinadas<br />

circunstâncias. Fonte : <strong>UNICEF</strong>, Progress for Children – A Report Card on Child Protecction, Número 8, <strong>UNICEF</strong>, Nova<br />

Iorque, Setembro de 2009.<br />

III O Indicador do IDS é a percentagem de mulheres com 15 e 49 anos que afirma justificar-se que um marido bata na mulher<br />

por uma das seguintes razões: roubar comida, discutir com o marido, sair de casa sem informar o marido, recusar sexo<br />

com o marido, e não cuidar das crianças.<br />

148


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

homens e das mulheres é o factor-chave<br />

na redução da violência contra crianças e<br />

mulheres. A percentagem de mulheres que<br />

acreditam que bater na esposa se justifica<br />

em certas circunstâncias varia de 10 por<br />

cento na Cidade de Maputo para perto de<br />

70 por cento em Niassa (ver Figura 5.2). 12<br />

O MICS 2008 também assinala que 24 por<br />

cento das mulheres que frequentavam o<br />

ensino secundário e superior aceitam a<br />

violência, em comparação com 38 por cento<br />

das mulheres que nunca frequentaram a<br />

escola. O estudo do Ministério da Mulher e<br />

da Acção Social de 2004 concluiu que essas<br />

diferenças estão fortemente relacionadas<br />

com as normas e práticas socioculturais,<br />

bem como com a falta de educação e<br />

conhecimento dos direitos das mulheres e<br />

crianças na sociedade. 13<br />

Foi realizada uma análise de regressão<br />

probabilística multivariada para examinar<br />

os factores correlacionados com a aceitação<br />

de violência doméstica pelas mulheres<br />

(ver Figura 5.3). A variável dependente<br />

é se uma mulher (15-49 anos) aceita ser<br />

Figura 5.2: Percentagem de mulheres (15-49 anos) que acreditam que bater na esposa se justifica em determinadas<br />

circunstâncias, 2008<br />

80%<br />

70%<br />

60%<br />

50%<br />

40%<br />

30%<br />

20%<br />

10%<br />

0%<br />

69%<br />

Niassa<br />

48%<br />

Cabo<br />

Delgado<br />

42%<br />

35%<br />

Nampula<br />

Zambézia<br />

26% 27%<br />

35%<br />

26%<br />

Tete Manica Sofala Inhambane<br />

51%<br />

Gaza<br />

20%<br />

Maputo<br />

Província<br />

10%<br />

Maputo<br />

Cidade<br />

Fonte: MICS 2008.<br />

Probabilidade de a mulher aceitar que o<br />

Figura 5.3: Probabilidade de aceitação da violência doméstica pelas mulheres, 2008<br />

marido lhe bata 15-49<br />

probabilidade de a mulher aceitar<br />

que o marido lhe bata<br />

0 .1 .2 .3 .4<br />

-1 0 1 2<br />

3<br />

Classificação da riqueza<br />

Primário Secundário Superior<br />

Fonte: Cálculos do <strong>UNICEF</strong> baseados no MICS 2008<br />

149


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

espancada pelo marido. A análise revelou<br />

que as mulheres com ensino secundário<br />

ou superior são muito menos propensas<br />

a considerar aceitável bater na mulher do<br />

que mulheres sem qualquer instrução. Ter<br />

o ensino primário, no entanto, não parece<br />

influenciar as atitudes das mulheres. A<br />

riqueza é estatisticamente relacionada com<br />

a protecção das mulheres apenas em níveis<br />

muito elevados (ver Figura 5.3), que muito<br />

poucos agregados familiares alcançam.<br />

Dados os enormes desafios na promoção<br />

da riqueza da mulher a este nível, promover<br />

o acesso à educação pode ser a resposta<br />

política mais viável para corresponder à<br />

atitude das mulheres para com a violência<br />

doméstica.<br />

O modelo não apresenta diferenças<br />

estatisticamente fiáveis nas atitudes para<br />

com a violência doméstica de mulheres em<br />

relações poligâmicas versus monogâmicas.<br />

O mesmo acontece com a idade das<br />

mulheres, ou a diferença de idades entre<br />

marido e mulher. Em termos de geografia,<br />

todas as mulheres que vivem em províncias<br />

que não Maputo (especialmente no norte)<br />

têm uma maior probabilidade de aceitar a<br />

violência, não parecendo haver diferença de<br />

atitudes entre as mulheres rurais e urbanas.<br />

Quebrar a cultura do silêncio sobre o abuso<br />

de crianças e mulheres exige um diálogo<br />

aberto, uma maior sensibilização e sistemas<br />

externos de protecção para intervir quando<br />

se identificam casos de abuso. Não é fácil<br />

fazê-lo onde a violência baseada no género<br />

e o abuso sexual, especialmente de crianças,<br />

são admitidos por algumas comunidades<br />

e indivíduos. Apesar dos progressos<br />

realizados no reforço do Governo e no<br />

desenvolvimento de um quadro jurídico e<br />

político para proteger as crianças contra a<br />

violência, o abuso e exploração, a limitada<br />

capacidade do Governo para fazer cumprir<br />

essas leis e o pouco conhecimento dos<br />

membros da comunidade sobre as questões<br />

permite que essas práticas continuem<br />

inabaláveis. Além disso, é frequente<br />

prevalecer o direito consuetudinário em<br />

muitas áreas rurais do país, particularmente<br />

no que respeita a casamento e herança.<br />

Enfrentar as convenções e normas sociais<br />

que contribuem para a violência, a<br />

exploração e o abuso é o primeiro passo<br />

para travar tais práticas em Moçambique.<br />

3.3. Exploração e abuso sexual<br />

comercial<br />

Embora os dados sejam extremamente<br />

limitados, há evidências de que ocorre em<br />

Moçambique exploração e abuso sexual<br />

de crianças. As crianças são muitas vezes<br />

forçadas a participar em actos sexuais<br />

comerciais para obter ajuda de adultos<br />

para fazer face às suas despesas ou<br />

como estratégia para enfrentar pobreza<br />

extrema. As vítimas de exploração sexual<br />

comercial são geralmente pobres e<br />

sofreram anteriormente algum grau de<br />

violência ou abuso. Embora a exploração<br />

sexual comercial se verifique com rapazes<br />

e raparigas, estas são consideradas mais<br />

comummente vítimas. Um estudo também<br />

mostra que a pressão de pares é um factor<br />

importante na introdução de meninas na<br />

indústria de exploração sexual comercial<br />

infantil. 14 Esse mesmo estudo constatou que<br />

as meninas que são vítimas de exploração<br />

sexual correm um risco acrescido por<br />

praticarem sexo sem preservativo para<br />

maiores benefícios económicos. Muitas<br />

crianças que são exploradas em sexo<br />

comercial servem-se da droga para lidar<br />

com a situação, o que também afecta o<br />

uso do preservativo. 15 Os perpetradores de<br />

exploração comercial de crianças provêm<br />

de todas as esferas da vida: membros da<br />

comunidade local, turistas nacionais e<br />

estrangeiros em resorts de Moçambique<br />

e motoristas de transportes em centros<br />

populacionais por onde passam as principais<br />

estradas.<br />

3.4. Tráfico de crianças e<br />

migração<br />

Num relatório publicado em 2002/03<br />

pela Organização Internacional para<br />

as Migrações (OIM), foi estimado que<br />

aproximadamente mil crianças e mulheres<br />

são traficadas anualmente para a África<br />

150


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

do Sul para exploração da sua força de<br />

trabalho e exploração sexual comercial. 16<br />

O tráfico de crianças não só as retira do<br />

ambiente protector da família, como também<br />

aumenta a sua vulnerabilidade à violência,<br />

exploração e abuso. iv Indica o relatório que<br />

o tráfico de pessoas está ainda relacionado<br />

com a extracção de órgãos humanos<br />

para fins rituais, embora esta questão<br />

ainda seja contestada por organismos<br />

governamentais. 17<br />

Num estudo publicado pela Save the<br />

Children em 2009, as respostas das crianças<br />

parecem indicar que o tráfico e a exploração<br />

internos em Moçambique geralmente<br />

ocorrem por ‘trapaça’, fraude ou engano,<br />

em grande parte cometido por familiares<br />

das crianças e pares. 18 O tráfico de crianças<br />

ocorre geralmente num contexto regional<br />

mais amplo, só podendo ser combatido de<br />

forma eficaz fortalecendo-se os mecanismos<br />

regionais e transfronteiriços para uma<br />

resposta multifacetada e coordenada<br />

adaptada às diferenças regionais e<br />

nacionais. Por exemplo, a Cooperação<br />

Regional dos Chefes de Polícia da África<br />

Austral tem trabalhado com a Comunidade<br />

de Desenvolvimento da África Austral em<br />

medidas comunitárias de combate ao tráfico,<br />

entre as quais formação da polícia regional.<br />

A migração infantil voluntária é muitas<br />

vezes decorrente da pobreza ou do facto de<br />

a criança ser órfã ou ter sido abandonada.<br />

Em Moçambique as crianças deslocamse<br />

das aldeias para as cidades ou, por<br />

vezes, atravessam a fronteira ilegalmente<br />

e desacompanhadas para países vizinhos,<br />

principalmente para a África do Sul, numa<br />

tentativa de melhorar a sua vida ou a<br />

vida de suas famílias. Esses padrões de<br />

migração tornam os meninos e meninas<br />

vulneráveis ao abuso e à exploração tanto<br />

durante as viagens como no seu lugar de<br />

destino. Um relatório da Save the Children<br />

de 2008 19 compila as experiências das<br />

crianças migrantes na sub-região, e indica<br />

que as meninas, em particular, viajam<br />

de Moçambique para a África do Sul em<br />

busca de trabalho, mas acabam por ser<br />

vítimas de abuso sexual e exploradas. As<br />

que não conseguem arranjar emprego e<br />

não conseguem ou não querem regressar a<br />

Moçambique, recorrem, por vezes, à falta de<br />

alternativas, a trabalho sexual.<br />

3.5. Trabalho infantil<br />

O trabalho infantil é outra grave forma<br />

de abuso e exploração em Moçambique.<br />

Os dados revelam que 22 por cento das<br />

crianças de 5-14 anos estão envolvidas<br />

em trabalho infantil, registando-se uma<br />

grande disparidade entre as zonas urbanas<br />

e as rurais (15 por cento e 25 por cento,<br />

respectivamente). 20 v A proporção de crianças<br />

envolvidas em trabalho infantil também<br />

varia de acordo com a idade da criança: uma<br />

em cada cinco de 5 a 11 anos de idade está<br />

envolvida em trabalho infantil, chegando a<br />

uma em cada quatro as crianças com 12 a 14<br />

anos. São visíveis as disparidades entre as<br />

províncias; quase 40 por cento das crianças<br />

em Inhambane estão envolvidas em trabalho<br />

infantil, em comparação com menos de 10<br />

por cento das crianças em Niassa.<br />

A prevalência de trabalho infantil está<br />

relacionada com o nível de escolaridade<br />

da mãe. Vinte e quatro por cento das<br />

crianças cujas mães não têm nenhuma<br />

escolaridade estão envolvidas em trabalho<br />

infantil, em comparação com 10 por<br />

cento das crianças cujas mães têm, pelo<br />

menos, ensino secundário. A prevalência<br />

de trabalho infantil é ligeiramente maior<br />

nas meninas (24 por cento) que nos<br />

iv Tráfico designa o transporte ilegal de seres humanos, em particular mulheres e crianças, para os vender ou para explorar<br />

a sua força de trabalho.<br />

v Uma criança é considerada envolvida em trabalho infantil se durante a semana que antecedeu a pesquisa tiver estado<br />

envolvida em: (i) pelo menos uma hora de trabalho económico ou 28 horas de trabalho doméstico por semana, se a<br />

criança tiver 5 a 11 anos de idade, (ii) pelo menos 14 horas de trabalho económico ou 28 horas de trabalho doméstico<br />

por semana, se a criança tiver 12 a 14 anos de idade.<br />

151


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

Figura 5.4: Percentagem de crianças de 5-14 anos que estão envolvidas em trabalho infantil, por província e<br />

sexo, 2008<br />

45%<br />

40%<br />

35%<br />

39%<br />

30%<br />

25%<br />

20%<br />

15%<br />

10%<br />

5%<br />

9%<br />

26%<br />

16%<br />

25%<br />

24%<br />

26%<br />

30%<br />

27%<br />

10% 11%<br />

22%<br />

0%<br />

Niassa<br />

Cabo<br />

Delgado<br />

Nampula<br />

Zambézia<br />

Tete Manica Sofala Inhambane<br />

Gaza<br />

Maputo<br />

Província<br />

Maputo<br />

Cidade<br />

Total<br />

Fonte: MICS 2008.<br />

rapazes (21 por cento). Além disso, as<br />

meninas trabalham mais que os rapazes<br />

apoiando as tarefas domésticas (8 por cento<br />

contra 5 por cento, respectivamente). A<br />

percentagem de crianças que trabalham<br />

para apoiar negócios familiares é a mesma<br />

para ambos os sexos (16 por cento). Não<br />

há grande correlação entre riqueza e<br />

trabalho infantil. A prevalência de trabalho<br />

infantil é relativamente estável para os<br />

quatro quintis inferiores, só reduzindo nas<br />

famílias em melhor situação. Um estudo de<br />

2009 indica que as crianças trabalhadoras<br />

são acrescidamente exploradas por más<br />

condições de trabalho, incluindo abuso<br />

verbal e sexual, e ainda salários pagos com<br />

atraso ou não pagos na totalidade. 21<br />

O MICS de 2008 revela que 86 por cento<br />

das crianças que trabalham em áreas<br />

urbanas também frequentam a escola, em<br />

comparação com 76 por cento nas zonas<br />

rurais. Quase 30 por cento dos estudantes<br />

das zonas rurais estão envolvidos em algum<br />

tipo de trabalho infantil, antes ou depois das<br />

aulas.<br />

Figura 5.5: Prevalência de trabalho infantil por nível de escolaridade da mãe, 2008<br />

30%<br />

25%<br />

20%<br />

15%<br />

10%<br />

5%<br />

0%<br />

24%<br />

22%<br />

10%<br />

Nunca frequentou a escola Primário Secundário+<br />

Fonte: MICS 2008.<br />

152


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

Figura 5.6: Trabalho infantil e frequência escolar, por área geográfica, 2008<br />

100%<br />

90%<br />

80%<br />

70%<br />

60%<br />

50%<br />

40%<br />

30%<br />

20%<br />

10%<br />

0%<br />

25%<br />

15%<br />

Percentagem de crianças em trabalho infantil<br />

Urbana<br />

Rural<br />

86%<br />

76%<br />

Percentagem de crianças trabalhadoras<br />

que estão a frequentar a escola<br />

Fonte: MICS 2008.<br />

Em Moçambique, o Ministério do Trabalho<br />

é responsável por orientar e coordenar<br />

as acções relacionadas com o trabalho<br />

infantil. As respostas nacionais ao trabalho<br />

infantil incidem sobre quatro áreas:<br />

desenvolvimento de uma legislação nacional<br />

que reflicta os padrões internacionais que<br />

Moçambique ratificou; desenvolvimento<br />

de mecanismos eficazes para fazer cumprir<br />

a legislação existente e complementar,<br />

incluindo a legislação sobre o ensino<br />

obrigatório; melhoramento da capacidade<br />

das instituições governamentais e outros<br />

actores para identificar e agir sobre a<br />

questão do trabalho infantil; e, finalmente,<br />

sensibilização do público em geral para<br />

a questão. A eficácia das iniciativas será<br />

reforçada por um maior compromisso<br />

para com a recolha de dados sobre a<br />

natureza (incluindo a dimensão do género)<br />

e as dinâmicas do trabalho infantil em<br />

Moçambique.<br />

A Lei da Criança de 2008 proíbe o trabalho<br />

infantil e qualquer forma de trabalho a<br />

menores de 15 anos, prevendo medidas<br />

punitivas a serem tomadas contra o<br />

empregador. A Lei da Criança define<br />

também formas de trabalho proibidas,<br />

incluindo a exploração sexual comercial e<br />

trabalho que possa ser prejudicial à saúde<br />

e bem-estar da criança. Contudo, uma<br />

aplicação eficaz exige a divulgação da lei<br />

a todos os interessados, bem como um<br />

considerável reforço da capacidade de todas<br />

as autoridades encarregadas da aplicação<br />

das suas disposições. Finalmente, as<br />

pressões económicas e sociais que obrigam<br />

os pais a impelir os seus filhos para trabalho<br />

infantil exploratório devem ser tratadas por<br />

via de uma protecção social mais eficaz.<br />

Reduzir a carga de trabalho sobre as<br />

crianças depende da garantia de que as<br />

crianças e suas famílias, especialmente as<br />

mais pobres e mais vulneráveis, beneficiem<br />

de programas de redução da pobreza.<br />

Enquanto o trabalho infantil continuar<br />

a ser uma necessidade económica de<br />

determinadas famílias, o Governo deverá<br />

concentrar a sua acção no garantir que<br />

qualquer actividade económica empreendida<br />

seja adequada à idade e capacidade da<br />

criança e que em nada comprometa a<br />

sua sobrevivência, saúde, educação,<br />

desenvolvimento ou bem-estar geral.<br />

153


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

3.6. Casamento infantil<br />

Em Moçambique, é ilegal o casamento<br />

antes dos 16 anos. Pela Lei de Família de<br />

2004, o Governo de Moçambique elevou a<br />

idade legal de casamento não carecendo de<br />

consentimento dos pais dos 16 para os 18<br />

anos. A idade mínima em que o casamento<br />

pode ocorrer com o consentimento dos<br />

pais foi elevada de 14 para 16. No entanto,<br />

é limitada a capacidade de aplicar a lei, e os<br />

casamentos tradicionais ao abrigo do direito<br />

consuetudinário continuam a constituir<br />

um desafio ao estabelecimento dos 18<br />

anos como idade mínima de casamento.<br />

Em muitas comunidades, as meninas são<br />

consideradas prontas para casar ao atingir a<br />

puberdade. 22<br />

Dados recentes revelam que 18 por cento<br />

das raparigas entre os 20 e os 24 anos se<br />

casaram antes de fazerem 15 anos, e 52<br />

antes dos 18 anos. 23 A percentagem de<br />

meninas que se envolve em casamento<br />

infantil decaiu ligeiramente desde 2003.<br />

Há diferenças significativas nas taxas de<br />

casamento infantil entre as regiões sul,<br />

centro e norte de Moçambique: as províncias<br />

do sul, designadamente Gaza, Inhambane,<br />

Maputo e Cidade de Maputo, têm uma taxa<br />

de casamento infantil inferior a 10 por cento;<br />

as províncias do centro têm uma taxa média<br />

de 20 por cento, enquanto Niassa e Cabo<br />

Delgado, no norte, têm índices de 24 e 30<br />

por cento, respectivamente.<br />

O casamento infantil não só é uma grave<br />

violação dos direitos da criança em si,<br />

mas também compromete seriamente<br />

a materialização de uma série de outros<br />

direitos. Por exemplo, o casamento na<br />

adolescência pode ter graves implicações<br />

para a saúde das meninas. A gravidez e o<br />

parto na adolescência estão associados a<br />

problemas de saúde e fracos resultados<br />

nutricionais para a mãe e seus filhos. Isto<br />

acontece particularmente com raparigas que<br />

são mães pela primeira vez muito jovens. 24<br />

Adolescentes casadas muitas vezes recebem<br />

menos informações sobre saúde reprodutiva<br />

que seus pares não casados. 25 As meninas<br />

casadas têm muito menor probabilidade que<br />

seus pares casados de frequentar a escola,<br />

e são muitas vezes retiradas da escola para<br />

se casarem ou por estarem grávidas, o que<br />

às vezes pode estar relacionado com abuso<br />

sexual. 26<br />

O casamento infantil é influenciado pelas<br />

relações de género tradicionais e pelos<br />

valores que a sociedade atribui às mulheres e<br />

meninas. O casamento pode reflectir o valor<br />

atribuído à virgindade de uma menina e ser<br />

visto pelos pais como um meio para evitar<br />

Figura 5.7: Mulheres de 20-24 anos que se casaram antes dos 15 e dos 18 anos, 2003 e 2008<br />

60%<br />

50%<br />

40%<br />

56%<br />

51%<br />

30%<br />

42%<br />

20%<br />

10%<br />

11%<br />

21%<br />

18%<br />

0%<br />

Urbana Rural Total<br />

Percentagem de casadas antes dos 15 anos<br />

Percentagem de casadas antes dos 18 anos<br />

Fonte: IDS 2003 e MICS 2008.<br />

154


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

as relações sexuais antes do casamento e da<br />

gravidez. Nas comunidades, muitas meninas<br />

vítimas não denunciam às autoridades os<br />

casos de abuso sexual, em parte devido ao<br />

estigma e mitos em torno da questão do<br />

abuso sexual. Mesmo quando a polícia ou<br />

outras autoridades querem avançar com os<br />

casos de abuso sexual, é frequente os pais<br />

interromperem o processo por consideraremno<br />

um problema a ser resolvido no seio da<br />

família ou entre as famílias. A falta de um<br />

instrumento legal rígido para punir casos de<br />

abuso sexual agrava o problema.<br />

Em muitos casos, o casamento infantil,<br />

tanto de rapazes como de meninas, tem<br />

uma motivação económica. O casamento<br />

infantil é uma estratégia de sobrevivência<br />

para aliviar a família do que consideram<br />

ser, face à pobreza extrema, um encargo<br />

financeiro. Embora a situação económica<br />

seja uma causa do casamento infantil,<br />

não é a única motivação. A prevalência<br />

de casamento infantil está também ligada<br />

a práticas culturais de grupos étnicos<br />

específicos. 27 Apesar de serem realizadas<br />

nas escolas campanhas de sensibilização<br />

sobre saúde sexual e gravidez, o uso do<br />

preservativo ainda é baixo em crianças. O<br />

casamento é, por vezes, organizado numa<br />

idade precoce, com as meninas começando<br />

a viver com o marido na puberdade. Um<br />

mapeamento efectivo do casamento infantil<br />

em Moçambique por grupo étnico apoiaria<br />

os esforços do programa e aumentaria a<br />

eficácia das campanhas de prevenção.<br />

São também comuns em Moçambique<br />

relações poligâmicas, encontrando-se quase<br />

um quarto das mulheres de 15-49 anos num<br />

relacionamento poligâmico. 28 Embora a<br />

poligamia não seja legal em Moçambique,<br />

é muito frequente nas províncias do centro,<br />

em particular, encontrando-se um terço<br />

das mulheres de Manica, Tete e Sofala, em<br />

uniões desse tipo.<br />

155


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

4. As crianças e o sector da justiça<br />

Foi reconhecida, tanto pelo Governo como<br />

pela sociedade civil em Moçambique, a<br />

necessidade de se melhorar o sector da<br />

justiça como uma prioridade fundamental<br />

para melhorar os sistemas de protecção<br />

infantil. Isto inclui a protecção de crianças<br />

que entram em contacto com o sistema<br />

de justiça como vítimas, testemunhas ou<br />

infractoras visando pôr fim à impunidade<br />

de crimes contra as crianças. Importantes<br />

progressos foram feitos, incluindo a criação<br />

de uma secção para menores no tribunal<br />

em três províncias e a criação de mais de<br />

200 centros policiais de apoio à vítima<br />

(Gabinetes de Atendimento da Mulher<br />

e da Criança) em todas as províncias. A<br />

criação destas novas estruturas de apoio<br />

tem ajudado a garantir que os direitos da<br />

criança sejam protegidos e que esta receba<br />

um tratamento amigo da criança e sensível,<br />

em conformidade com normas e padrões<br />

internacionais, quando entra em contacto<br />

com o sistema de justiça.<br />

Os sistemas de justiça ainda não são eficazes<br />

para a maioria das crianças. Observações<br />

finais do Comité dos Direitos da Criança<br />

referiram, no segundo relatório periódico<br />

de Moçambique, por exemplo, que os<br />

perpetradores de violência e abuso raramente<br />

são levados à justiça, que o encarceramento<br />

de crianças em conflito com a lei não é usado<br />

como medida de último recurso, e que é<br />

frequente a prisão preventiva. 29<br />

O Ministério da Justiça e o Ministério do<br />

Interior carecem de recursos financeiros<br />

e humanos para melhorar a eficácia do<br />

sistema para as crianças. As dotações<br />

orçamentais do estado em 2008 destinadas<br />

ao Ministério da Justiça e ao Ministério do<br />

Interior, que inclui a polícia, foram de dois<br />

e três por cento, respectivamente, com<br />

limitados recursos destinados a crianças e<br />

programas de justiça juvenil.<br />

Grandes têm sido os progressos de<br />

Moçambique na área da reforma legislativa<br />

para fazer com que a legislação nacional<br />

fique em consonância com a Convenção<br />

sobre os Direitos da Criança. Continuam<br />

a ser tratadas algumas inconsistências<br />

internas, devendo reforçar-se iniciativas e<br />

medidas preventivas, especialmente em<br />

relação às crianças em conflito com a lei,<br />

incluindo a aplicação de medidas correctivas<br />

alternativas que estejam em conformidade<br />

com as normas internacionais. As crianças<br />

em conflito com a lei em Moçambique<br />

muitas vezes não beneficiam da protecção<br />

estipulada nos instrumentos internacionais,<br />

incluindo os Artigos 37 e 40 da Convenção<br />

sobre os Direitos da Criança, as Regras de<br />

Beijing para a Administração da Justiça<br />

Juvenil (1985), e as Directrizes de Riade para<br />

a Prevenção da Delinquência Juvenil (1998).<br />

As crianças em conflito com a lei são<br />

frequentemente colocadas em prisões<br />

para adultos, embora a lei estabeleça que<br />

devem ser mantidas em celas separadas. A<br />

polícia tem autoridade para deter menores<br />

que supostamente tenham cometido<br />

uma infracção por um período máximo<br />

de 30 dias, após o que a criança deve ser<br />

apresentada em Tribunal de Menores ou<br />

Secções Civis. O ideal seria um centro de<br />

transição ou instalação intermédia e que se<br />

tivessem atenções particulares para garantir<br />

que esses casos fossem levados a tribunal<br />

de forma expedita. Essa não é, no entanto, a<br />

prática comum em Moçambique.<br />

É frequente não se cumprirem políticas<br />

prisionais que exigem que os presos sejam<br />

separados por sexo e idade, e fiquem, de<br />

preferência, em instalações separadas, e<br />

as condições de segurança e sanitárias<br />

nas prisões são um problema. 30 O Serviço<br />

Nacional de Prisões reporta que nenhum<br />

centro para crianças em conflito com a<br />

lei está operacional neste momento; foi<br />

reabilitado um (Centro de Reabilitação de<br />

Chiango), mas não está a funcionar por falta<br />

de recursos. Estão previstos ou operacionais<br />

três centros de detenção juvenil para menores<br />

156


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

com 16 a 18 anos (assim como jovens até<br />

aos 21 anos, e excepcionalmente até aos 25).<br />

Estas instalações estão situadas em Nampula,<br />

em Matutuíne, na província de Maputo (ainda<br />

em construção), e na Beira (prevista).<br />

Trinta e cinco por cento do total da<br />

população prisional em Moçambique tem<br />

16-21 anos de idade. Dados divulgados pelo<br />

Serviço Nacional de Prisões de menores<br />

com 16 a 18 anos de idade em conflito com<br />

a lei revelam que 898 do sexo masculino<br />

e 8 do sexo feminino estão actualmente<br />

em prisões em todo o país. Existe apenas<br />

uma prisão para mulheres, localizada em<br />

Ndlavela, em Maputo, com capacidade<br />

para albergar cerca de 300 presidiárias,<br />

mas existem secções femininas em todas<br />

as prisões provinciais. Em 2008, havia 297<br />

presos do sexo feminino numa população<br />

prisional total de 14.309 pessoas. O Estudo<br />

sobre o Acesso à Justiça realizado no âmbito<br />

da avaliação do PARPA II (2009) relata que<br />

o governo está a empreender esforços para<br />

conferir tratamento especial a mulheres e<br />

menores; esses esforços, no entanto, ainda<br />

não se traduzem em prática correspondente<br />

aos objectivos da política prisional e às<br />

regras e padrões mínimos dos instrumentos<br />

internacionais. 31<br />

4.1.<br />

Para proteger as mulheres e crianças<br />

vulneráveis e promover o acesso à justiça, o<br />

Governo decidiu aumentar a capacidade do<br />

sector da justiça, definindo como prioridade<br />

o direito constitucional a representação.<br />

Para isso, aumentaram os fundos atribuídos<br />

ao Instituto de Patrocínio e Assistência<br />

Jurídica [IPAJ], que foi incluído em 2008,<br />

pela primeira vez, no orçamento do Estado.<br />

O recrutamento de profissionais em 2007 e<br />

2008 elevou o número de funcionários que<br />

recebem um salário do Estado de 10 em<br />

2002 32 para 138 no primeiro semestre de<br />

2008. 33 No mesmo período, o número total<br />

de funcionários do IPAJ subiu de 360 para<br />

700. A cobertura dos serviços prestados pelo<br />

IPAJ aumentou de 41 filiais em 2005 para<br />

57 no primeiro semestre de 2008. O número<br />

de pessoas que beneficiam destes serviços<br />

aumentou de 7.327 em 2007 para 9.615 na<br />

primeira metade de 2008. 34, 35<br />

Acesso das crianças a<br />

propriedade e herança<br />

Os direitos das mulheres e crianças à<br />

propriedade e herança estão ameaçados<br />

pela pandemia da SIDA, pois são cada<br />

vez mais as viúvas e os órfãos que se<br />

confrontam com apropriação cobiçosa<br />

de propriedade. Em Moçambique,<br />

as leis de sucessão estabelecidas no<br />

Livro de Sucessão do Código Civil<br />

de 1966 conferem iguais direitos a<br />

herdeiros do sexo feminino e do sexo<br />

masculino. Todavia, nos termos do direito<br />

consuetudinário, os homens estão mais<br />

protegidos, encontrando-se as viúvas<br />

vulneráveis a apropriação cobiçosa de<br />

propriedade.<br />

Um estudo realizado em quatro províncias<br />

de Moçambique revelou que as viúvas e<br />

os órfãos tendem a sofrer, após a morte<br />

de seu marido ou pai, algum tipo de perda<br />

de material. 36 Como a herança é encarada<br />

como assunto privado da família, os<br />

outros membros da comunidade em geral<br />

optam por não interferir nesses casos.<br />

Um estudo de seguimento realizado em<br />

2009 observa que a maioria das pesquisas<br />

abordando a questão da apropriação<br />

cobiçosa de propriedade incide sobre os<br />

aspectos legais da sucessão, e observa<br />

haver falta de dados quantitativos sobre a<br />

situação dos direitos de propriedade das<br />

crianças e mulheres. 37 O estudo destaca a<br />

necessidade de: (i) uma avaliação do grau<br />

de apropriação cobiçosa de propriedade<br />

de crianças e viúvas em Moçambique,<br />

(ii) prevenção de apropriação cobiçosa<br />

de propriedade, (iii) garantia de que as<br />

viúvas e seus filhos beneficiam de justiça,<br />

seja através de mecanismos locais de<br />

resolução de conflitos seja no quadro do<br />

sistema jurídico formal. Para atender a<br />

essas necessidades, é necessário fazeremse<br />

acções para defesa e promoção de<br />

mudanças na legislação e nas políticas<br />

do governo, bem como para melhorar<br />

a monitoria e o apoio e promover<br />

mudança comportamental ao nível das<br />

comunidades.<br />

157


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

4.2. Registo de nascimento<br />

O registo de nascimento dá à criança<br />

existência legal e autoridade para<br />

reivindicar cidadania, bem como os direitos,<br />

benefícios e obrigações resultantes dessa<br />

cidadania. Assim, o registo de nascimento<br />

é reconhecido como um direito tanto pela<br />

Convenção sobre os Direitos da Criança<br />

(Artigo 7) como pela Carta Africana sobre<br />

os Direitos e Bem-estar da Criança (Artigo<br />

6). A obrigação de Moçambique de se<br />

registarem as crianças imediatamente após<br />

o nascimento está legalmente reconhecida<br />

no Código do Registo Civil. A falta de registo<br />

de nascimento viola o direito humano<br />

inalienável da criança a uma identidade<br />

e coloca em situação de risco o seu<br />

desenvolvimento e protecção.<br />

O registo de nascimento é especialmente<br />

importante numa altura em que a pandemia<br />

da SIDA está a privar cada vez mais crianças<br />

de cuidados parentais. A falta de uma certidão<br />

de nascimento pode resultar em problemas<br />

na determinação de relações familiares,<br />

relações legais e direitos de herança, bem<br />

como trazer dificuldades no acesso a serviços<br />

sociais básicos, como a matrícula escolar<br />

e a assistência social. Embora o uso de um<br />

registo de nascimento para crianças esteja<br />

ainda numa fase rudimentar em Moçambique,<br />

o processo de modernização e a instauração<br />

do distrito como pólo de desenvolvimento<br />

está a tornar um documento de identificação<br />

legal cada vez mais importante para<br />

protecção jurídica e prevenção de exclusão<br />

socioeconómica, especialmente dos mais<br />

vulneráveis na sociedade.<br />

Moçambique tem aumentado<br />

significativamente o acesso a serviços de<br />

registo de nascimento em todo o país. Foi<br />

desenvolvido em 2004 um plano nacional<br />

de acção para o registo de nascimento, e o<br />

registo de nascimento é parte integrante do<br />

plano nacional de acção para a criança 2006-<br />

2010. Foi lançada em 2006, pela Direcção<br />

Nacional dos Registos e Notariado, do<br />

Ministério da Justiça, uma campanha de<br />

registo de nascimento de longa duração. Os<br />

objectivos da campanha são dar resposta ao<br />

grande acumular de crianças por registar,<br />

sensibilizar para a importância do registo<br />

(precoce) e melhorar o acesso do público aos<br />

serviços de registo de nascimento levandoos<br />

para mais perto das populações.<br />

Desde a adopção do plano nacional de<br />

acção para o registo de nascimento e o<br />

lançamento da campanha, cerca de 4,2<br />

milhões de crianças menores de 18 anos<br />

foram registadas, o que representa 40 por<br />

cento de todas as crianças em Moçambique.<br />

A percentagem de crianças menores de<br />

cinco anos que tiveram o seu registo de<br />

nascimento [aumentou] de 8 por cento<br />

em 2003 38 para 31 por cento em 2008.<br />

vi Há grandes disparidades geográficas<br />

no registo: 39 por cento das crianças com<br />

menos de cinco anos tiveram os seus<br />

nascimentos registados em áreas urbanas,<br />

em comparação com 28 por cento nas<br />

zonas rurais, e enquanto 47 por cento<br />

das crianças menores de cinco anos são<br />

registadas na Cidade de Maputo, apenas<br />

11 por cento são registadas na província de<br />

Tete. A pesquisa também constatou que os<br />

entrevistados citaram as principais barreiras<br />

ao registo como sendo a complexidade dos<br />

procedimentos envolvidos (25 por cento),<br />

a distância para os serviços de registo (22<br />

por cento) e os custos (20 por cento), com<br />

apenas uma parte relativamente pequena<br />

citando a falta de conhecimento do serviço<br />

(9 por cento) ou não reconhecendo a<br />

importância do registo de nascimento (6 por<br />

cento). (Ver Figura 5.8).<br />

Num país com baixos índices de<br />

alfabetização (com índices de analfabetismo<br />

mais elevados e mais baixas taxas<br />

de registo nas áreas rurais), as rádios<br />

comunitárias desempenharam um papelchave<br />

na mobilização das famílias para<br />

matricularem as suas crianças. Spots<br />

vi Nem todos os distritos da pesquisa tinham realizado actividades de registo de nascimento na altura da pesquisa, pelo<br />

que os dados podem estar a subestimar a média nacional.<br />

158


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

Figura 5.8: Razões para não registar os nascimentos, 2008<br />

Não é<br />

importante<br />

6%<br />

É complicado<br />

25%<br />

Fonte: MICS 2008.<br />

Outras<br />

17%<br />

Custo<br />

20%<br />

Distância<br />

23%<br />

produzidos e difundidos em línguas locais<br />

proporcionam fortes canais de comunicação<br />

aos activistas locais, os quais não só<br />

divulgam informações básicas sobre o<br />

registo de nascimento, como também<br />

ajudam as famílias a superar algumas das<br />

barreiras socioculturais para registarem<br />

os recém-nascidos em tempo oportuno.<br />

Em algumas comunidades, por exemplo,<br />

práticas tradicionais na escolha do nome<br />

podem estender-se para além do prazo de<br />

120 dias durante o qual os nascimentos<br />

podem ser registados gratuitamente. O<br />

impedimento cultural de as mães registarem<br />

uma criança sem a presença do pai é outro<br />

desafio, especialmente nos casos em que o<br />

pai fica ausente de casa por longos períodos,<br />

devido, por exemplo, a trabalho migratório.<br />

As actividades da campanha de registo<br />

de nascimento vêm dar um impulso<br />

fundamental à introdução de serviços<br />

de registo de nascimento de rotina que<br />

aproximam o registo das comunidades e<br />

evitam um futuro acumular de registos,<br />

criando uma cultura de registo (precoce)<br />

das crianças. Soluções de longo prazo,<br />

sustentáveis e de rotina, estão a ser<br />

desenvolvidas com a participação dos<br />

Ministérios da Saúde, da Educação, da<br />

Administração Estatal e da Mulher e da<br />

Acção Social. Será importante uma estreita<br />

cooperação com estes organismos do Estado<br />

para estabelecer um sistema eficaz, eficiente<br />

e sustentável, centrado especificamente<br />

no registo de nascimento. Para curto<br />

a médio prazo, até que os ministérios<br />

acima mencionados tenham capacidade<br />

institucional para conduzir o processo de<br />

registo, estão a ser oferecidos por agentes<br />

de serviços de registo alternativos que ligam<br />

as comunidades e o Governo e facilitam o<br />

estabelecimento de uma cultura de registo<br />

precoce da criança.<br />

Figura 5.9: Percentagem de crianças com menos de cinco anos com registo de nascimento, por província, 2008<br />

50%<br />

45%<br />

40%<br />

35%<br />

30%<br />

25%<br />

20%<br />

28%<br />

34%<br />

24%<br />

34%<br />

36%<br />

40%<br />

45% 46% 47%<br />

15%<br />

10%<br />

5%<br />

15%<br />

11%<br />

0%<br />

Niassa<br />

Cabo<br />

Delgado<br />

Nampula<br />

Zambézia<br />

Tete Manica Sofala Inhambane<br />

Gaza<br />

Maputo<br />

Província<br />

Maputo<br />

Cidade<br />

Fonte: MICS 2008.<br />

159


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

4.3. Crianças portadoras de<br />

deficiência<br />

Moçambique não é signatário da Convenção<br />

das Nações Unidas sobre os Direitos das<br />

Pessoas Portadoras de Deficiência e seu<br />

Protocolo Facultativo. A política nacional<br />

para pessoas com deficiência responsabiliza<br />

o Ministério da Mulher e da Acção Social<br />

pela promoção da integração efectiva das<br />

crianças portadoras de deficiência em<br />

actividades pré-escolares e por garantir a<br />

protecção social das pessoas com deficiência<br />

e suas famílias por meio de medidas<br />

destinadas a promover a sua autonomia e<br />

integração na comunidade.<br />

O programa estatal Subsídio de Alimentos<br />

(um pequeno valor mensal em dinheiro<br />

para pessoas especialmente vulneráveis)<br />

está disponível unicamente para cidadãos<br />

maiores de 18 anos e, portanto, exclui<br />

crianças portadoras de deficiência. 39 A<br />

política nacional de educação prevê a<br />

possibilidade de as crianças com deficiências<br />

moderadas frequentarem escolas regulares<br />

e as crianças com deficiências mais graves<br />

frequentarem escolas especiais. Conforme<br />

descrito no Capítulo 4, “Educação e<br />

desenvolvimento da criança”, as crianças<br />

portadoras de deficiência têm menos 40<br />

por cento de probabilidade de frequentar<br />

a escola primária do que as crianças sem<br />

deficiência. Dados indicam que 13 por cento<br />

das crianças com idades compreendidas<br />

entre os 2 e os 9 anos vivem com pelo<br />

menos uma deficiência (ver Figura 5.10). 40<br />

A deficiência mais comum foi a demora<br />

em sentar-se, pôr-se em pé ou andar (6 por<br />

cento das crianças).<br />

4.4. Mecanismos de cuidados<br />

alternativos<br />

Na prática, Moçambique tem dois tipos de<br />

sistemas alternativos de cuidados: formal<br />

e informal. O Governo de Moçambique<br />

incentiva o fortalecimento do papel protector<br />

das famílias como primeiro passo para a<br />

realização dos direitos das crianças. No<br />

entanto, são necessárias acções específicas<br />

para lidar com mecanismos alternativos de<br />

cuidados a crianças que não se encontrem<br />

sob cuidados parentais ou familiares.<br />

Os sistemas tradicionais de cuidados<br />

alternativos têm vindo a sofrer uma pressão<br />

cada vez maior devido às mudanças<br />

sociais decorrentes de desenvolvimento<br />

económico, migração e urbanização, e à<br />

pandemia da SIDA. As famílias alargadas e<br />

as comunidades têm sido a primeira linha<br />

de resposta à situação das crianças órfãs e<br />

vulneráveis em Moçambique.<br />

Os cuidados formais inscrevem-se no<br />

âmbito da jurisdição civil, sob a forma<br />

de guarda (tutor), acolhimento (família<br />

de acolhimento) e adopção. Nos termos<br />

da legislação moçambicana, as decisões<br />

concernentes a cuidados formais são<br />

tomadas através de uma autoridade judicial<br />

e em conformidade com o princípio do<br />

melhor interesse da criança, e a colocação<br />

Figura 5.10: Percentagem de crianças (2-9 anos) com pelo menos uma deficiência relatada, 2008<br />

25%<br />

20%<br />

15%<br />

10%<br />

5%<br />

0%<br />

9%<br />

Niassa<br />

17%<br />

Cabo<br />

Delgado<br />

14%<br />

15%<br />

Nampula<br />

Zambézia<br />

12%<br />

8%<br />

5%<br />

21%<br />

Tete Manica Sofala Inhambane<br />

19%<br />

Gaza<br />

15%<br />

Maputo<br />

Província<br />

12%<br />

Maputo<br />

Cidade<br />

14%<br />

Total<br />

Fonte: MICS 2008.<br />

160


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

em famílias de acolhimento ou instituições<br />

é usada apenas como último recurso.<br />

Os cuidados residenciais também são<br />

considerados um meio de cuidados formais,<br />

mas a decisão de colocar uma criança<br />

numa instituição é tomada principalmente<br />

por via de procedimentos administrativos,<br />

sob a responsabilidade do Ministério da<br />

Mulher e da Acção Social. Foi recentemente<br />

desenvolvido o Regulamento dos Centros<br />

de Acolhimento da Criança para garantir<br />

a qualidade dos serviços de assistência à<br />

infância e a aplicação de padrões mínimos,<br />

regulamento esse que aguarda a aprovação<br />

final do Ministério da Mulher e da Acção<br />

Social. Este quadro regulamentar também<br />

especifica como se devem realizar as<br />

inspecções e como deve ser monitorado o<br />

bem-estar das crianças nessas instituições.<br />

O conceito de família de acolhimento para<br />

crianças que carecem de cuidados parentais<br />

foi introduzido pela Lei da Família. Precisam,<br />

no entanto, de ser desenvolvidos os<br />

processos de execução e o regulamento, a<br />

fim de se levar avante a iniciativa. É também<br />

necessário (i) melhorar a rede de instituições<br />

para crianças e instituições infantis do tipo<br />

internato, transferindo instituições estatais<br />

infantis para centros de apoio familiar, (ii)<br />

criar um sistema alternativo de serviços<br />

de cuidados (baseados na comunidade e<br />

na família, guarda, tutoria, acolhimento,<br />

adopção), e (iii) implementar mecanismos<br />

para ampliar e estimular a integração das<br />

crianças em assistência familiar (família<br />

biológica ou alternativa).<br />

A legislação actual não faz distinção entre<br />

a adopção internacional e a adopção<br />

doméstica. Os processos de adopção devem<br />

ser harmonizados nas várias instituições e<br />

ministérios para garantir procedimentos de<br />

colocação e supervisão adequados durante<br />

o período de integração. Quanto à adopção<br />

internacional, Moçambique não assinou<br />

a Convenção de Haia n º 33, relativa à<br />

Protecção das Crianças e à Cooperação em<br />

Matéria de Adopção Internacional de 1993,<br />

ou quaisquer outros acordos bilaterais sobre<br />

a adopção, o que representa uma lacuna no<br />

quadro legal. A Ratificação da Convenção<br />

de Haia sobre a Adopção criará o quadro<br />

jurídico necessário para assegurar o devido<br />

processo para casos de adopção e também<br />

que o melhor interesse da criança seja o<br />

principal aspecto a considerar. A assinatura<br />

da Convenção de Haia foi recomendada pelo<br />

Comité dos Direitos da Criança em 2009. 41<br />

É necessário que se forneçam ao público<br />

em geral informações completas sobre<br />

a adopção, para desenvolver uma<br />

regulamentação específica para as adopções<br />

nacionais e internacionais, bem como para<br />

harmonizar os procedimentos de adopção<br />

com a Convenção sobre os Direitos da<br />

Criança e outros acordos globais de modo<br />

a assegurar supervisão do processo de<br />

adopção pelos Serviços de Acção Social e<br />

órgãos judiciais apropriados. Por exemplo,<br />

embora a Lei da Criança adopte a definição<br />

de criança da Convenção sobre os Direitos<br />

da Criança como qualquer pessoa até aos<br />

18 anos de idade, o Código Civil define a<br />

maioridade como sendo os 21. Decorrem<br />

tentativas para compatibilizar outros<br />

aspectos da legislação nacional com os<br />

padrões dos direitos humanos.<br />

Embora sejam limitados os dados<br />

quantitativos de Moçambique sobre a<br />

colocação de crianças vulneráveis em<br />

diferentes tipos de assistência, há evidências<br />

de estarem a proliferar os centros de<br />

cuidados residenciais. A partir de 2010, os<br />

dados registados pela Direcção Provincial<br />

da Mulher e Acção Social indicaram um<br />

total de 12.767 crianças a serem atendidas<br />

em 143 instituições de acolhimento em<br />

todo o país. Em 2009 e 2010, o Ministério da<br />

Mulher e da Acção Social avaliou 113 dessas<br />

instituições para determinar a qualidade<br />

dos cuidados e dos serviços prestados às<br />

crianças. Verificou-se que a maioria dos<br />

centros não estavam legalmente registados,<br />

não tinham sustentabilidade e dependiam<br />

da ajuda externa ou de doações. Além<br />

disso, a maioria dos centros não oferece<br />

actividades ocupacionais e não tem um<br />

programa de saída para crianças por volta<br />

dos 18 anos de idade. Os empregados<br />

carecem de suficientes conhecimentos e<br />

habilidades em matéria de cuidados infantis<br />

161


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

e desenvolvimento da criança. Estão a<br />

decorrer acções em todas as províncias para<br />

a resolução de problemas encontrados nas<br />

visitas de monitoria. Embora ainda esteja<br />

muito por fazer, têm-se registado alguns<br />

progressos: foi desenvolvida uma base de<br />

dados nacional para se seguir a situação de<br />

cada centro, e tem-se realizado uma série de<br />

workshops de formação com o pessoal dos<br />

centros para resolver as carências em termos<br />

de recursos humanos.<br />

4.5. Crianças órfãs e vulneráveis<br />

e outras crianças<br />

marginalizadas<br />

A vulnerabilidade das crianças não se limita à<br />

sua condição de órfãs ou não órfãs, nem está<br />

exclusivamente ligada a ser afectada pelo<br />

HIV e pela SIDA. As crianças que perderam<br />

os seus pais devido à SIDA são parte de um<br />

grupo muito maior de crianças com sérias<br />

e urgentes necessidades. É a tripla ameaça<br />

de SIDA, pobreza e insegurança alimentar<br />

interligadas que torna vulnerável uma ampla<br />

gama de crianças. Com efeito, a análise<br />

mostra que em contextos de pobreza extrema<br />

generalizada as diferenças entre órfãos e<br />

não órfãos ou não se manifestam ou são<br />

muito pequenas quando comparadas com a<br />

privação e o sofrimento que todas as crianças<br />

vulneráveis enfrentam 42 .<br />

Consequentemente, alguns especialistas<br />

recomendam que se redefina o grupo-alvo<br />

para uma intervenção de protecção social<br />

de ‘órfãos’ considerando um mais amplo<br />

grupo de crianças vulneráveis, embora essa<br />

medida venha a apresentar as suas próprias<br />

dificuldades, como, por exemplo, chegar<br />

a consenso sobre onde estabelecer limites<br />

ou poder vir a aumentar significativamente<br />

o número de beneficiários dos programas<br />

existentes.<br />

Actualmente, o número de crianças órfãs<br />

devido à SIDA tem sido adoptado como<br />

medida para avaliar a gravidade do<br />

impacto da epidemia nas crianças, famílias,<br />

comunidades e país em geral. Apoiar as<br />

crianças que perderam os pais continua a<br />

ser visto como imperativo. No quadro do<br />

HIV e da SIDA, as crianças são consideradas<br />

Crianças Órfãs ou Vulneráveis (COV) se<br />

um ou ambos os seus progenitores tiver<br />

morrido, se no seu agregado familiar tiver<br />

morrido algum adulto nos últimos 12<br />

meses após doença prolongada, se vivem<br />

em famílias chefiadas por adultos com<br />

doença crónica, ou se vivem em domicílios<br />

chefiados por outras crianças ou por jovens,<br />

mulheres ou idosos.<br />

Estima-se que existam 1,8 milhões de<br />

órfãos em Moçambique, dos quais 510 mil<br />

devido à SIDA. 43 Prevê-se que o número de<br />

órfãos aumente, tornando-se as doenças<br />

relacionadas com a SIDA, cada vez mais, a<br />

principal causa de orfandade. O número de<br />

órfãos não toma em conta as outras crianças<br />

eventualmente vulneráveis devido ao HIV<br />

ou a viver em agregados familiares com<br />

pessoas a viver com HIV. Há 100.000 crianças<br />

de 0-14 anos vivendo com HIV. 44 O MICS<br />

refere ainda que 17,2 por cento das crianças<br />

moçambicanas são órfãs ou vulneráveis<br />

(COV) devido à SIDA.<br />

O quadro legislativo pelo qual se orienta<br />

a resposta nacional a COVs compreende<br />

dois principais planos de acção: o Plano<br />

Nacional de Acção para a Criança 2006-<br />

2010 e o Plano de Acção para Crianças<br />

Órfãs e Vulneráveis (PACOV). O PACOV<br />

também se aplica a crianças que ficaram<br />

vulneráveis devido a outros factores que<br />

não o HIV e a SIDA. Engloba as crianças que<br />

vivem na rua, as que vivem em instituições<br />

(orfanatos, prisões, instituições de saúde<br />

mental), as que entram em conflito com a<br />

lei, as portadoras de deficiência, as vítimas<br />

de violência, de abuso e exploração sexual,<br />

de tráfico e das piores forma de trabalho<br />

infantil, as que se casam antes da idade<br />

legal, e as refugiadas ou deslocadas.<br />

O PACOV identificou seis serviços básicos<br />

para atender às principais necessidades<br />

das crianças: cuidados de saúde,<br />

educação, apoio nutricional e alimentar,<br />

apoio financeiro, apoio jurídico e apoio<br />

psicossocial. O Governo de Moçambique<br />

comprometeu-se a garantir que as crianças<br />

tenham acesso a pelo menos três desses<br />

162


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

seis serviços, com particular incidência sobre<br />

as crianças que vivem abaixo da linha de<br />

pobreza absoluta, incluindo crianças órfãs e<br />

crianças vivendo com ou afectadas pelo HIV<br />

e pela SIDA. Além do PACOV, a estratégia<br />

de redução da pobreza 2005-2009 (PARPA<br />

II) incluiu também metas específicas para<br />

COV, incluindo a necessidade de desenvolver<br />

e consolidar as redes de segurança social<br />

para crianças órfãs e garantir que os rácios<br />

de frequência escolar e de desnutrição entre<br />

as crianças órfãs sejam idênticos aos das<br />

crianças não órfãs.<br />

Algumas das ameaças à protecção que as<br />

crianças órfãs enfrentam são um aumento<br />

de agregados familiares chefiados por<br />

irmãos ou crianças, menores índices de<br />

matrículas e mais fraco desempenho<br />

escolar, e maior risco de abuso sexual e<br />

infecção por HIV, trabalho infantil perigoso,<br />

actividade sexual precoce e casamento<br />

prematuro, graves problemas psicossociais<br />

e problemas de saúde e nutrição. 45 Além<br />

disso, o estigma e discriminação contra as<br />

pessoas afectadas pela SIDA continua a ser<br />

uma questão desafiadora. Crianças e jovens<br />

com familiares doentes ou moribundos<br />

estão particularmente expostas ao estigma.<br />

Podem ser condenadas ao ostracismo pelas<br />

suas comunidades e receber um apoio<br />

mínimo das suas famílias devido à vergonha<br />

e ao estigma frequentemente associados<br />

às mortes relacionadas com a SIDA. Nas<br />

escolas, a discriminação da criança traduzse<br />

em provocação e bullying [intimidação].<br />

Em alguns casos, as crianças evitam os seus<br />

pares seropositivos por terem medo de ficar<br />

infectadas.<br />

O MICS constatou que doze por cento<br />

das crianças moçambicanas eram órfãs<br />

(das quais 11 por cento órfãs de um dos<br />

seus progenitores e 1 por cento órfãs de<br />

pai e mãe), enquanto outros 6 por cento<br />

eram crianças consideradas ‘vulneráveis’. 46<br />

Também foram observadas diferenças<br />

geográficas, havendo mais COV em áreas<br />

urbanas do que em áreas rurais (20 e 16 por<br />

cento, respectivamente), e nas províncias do<br />

sul do que nas regiões centro e norte do país<br />

(ver Figura 5.11). Apenas 68 por cento das<br />

crianças moravam com ambos os pais em<br />

2008.<br />

Não há nenhuma evidência de uma maior<br />

taxa de privação severa de educação em<br />

COV do que em não órfãos. Há, no entanto,<br />

diferença nas taxas de frequência escolar<br />

entre órfãos de pai e mãe e não órfãos,<br />

sendo 0,90 o rácio de rapazes órfãos de pai e<br />

mãe e 0,92 o de meninas órfãs de pai e mãe,<br />

com relação aos seus pares não órfãos.<br />

O MICS mostra ainda que apenas 22 por<br />

cento das famílias com COV recebem algum<br />

apoio externo; a maior parte desse apoio<br />

vai para a educação, com dois por cento<br />

dos agregados familiares recebendo apoio<br />

material ou financeiro, e menos de um por<br />

cento recebendo apoio médico. Apenas<br />

20 por cento das crianças do quintil mais<br />

pobre recebem apoio externo grátis, em<br />

comparação com 27 por cento no segundo<br />

quintil mais pobre.<br />

As crianças órfãs e vulneráveis tendem<br />

a viver em famílias pobres chefiadas por<br />

idosos. O MICS constatou que 10 por cento<br />

dos agregados familiares são chefiados<br />

por uma pessoa idosa, mais de metade<br />

dos quais tem pelo menos um dependente<br />

menor. Um estudo realizado em 2006<br />

revelou que fazer face a custos associados a<br />

cuidar de crianças era um fardo impossível<br />

para os idosos: cuidar de uma criança órfã<br />

ou vulnerável custa, em média, 21 dólares<br />

americanos por mês e cuidar de uma<br />

pessoa vivendo com HIV custa 30 dólares<br />

americanos, enquanto os idosos tinham um<br />

rendimento médio mensal de 12,5 dólares<br />

americanos. 47<br />

Algumas famílias também são chefiadas<br />

por uma criança, ou têm uma criança que<br />

se vê forçada a funcionar como principal<br />

provedor devido a doença ou deficiência dos<br />

membros da família adultos (cerca de um<br />

e dois por cento, respectivamente, de<br />

acordo com o MICS). Em tais situações,<br />

as crianças têm normalmente meios de<br />

geração de rendimento muito limitados,<br />

sendo obrigadas a recorrer a estratégias<br />

de risco, como o casamento precoce,<br />

sexo transaccional e trabalho infantil<br />

163


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

prejudicial. É também limitado o acesso<br />

dessas crianças a serviços básicos como<br />

os de saúde, educação e alimentação,<br />

jurídicos, financeiros e psicossociais. Além<br />

desses desafios, as crianças órfãs em<br />

consequência da SIDA muitas vezes são<br />

estigmatizadas e socialmente discriminadas,<br />

sendo susceptíveis a exclusão das suas<br />

comunidades. Por exemplo, um estudo<br />

realizado pelo Ministério de Planificação<br />

e Desenvolvimento realizado em 2005<br />

constatou que nas famílias pobres existe<br />

discriminação na alocação de recursos<br />

a crianças que não são descendentes<br />

biológicas do chefe de família. O estudo<br />

verificou que as crianças sem relação<br />

Figura 5.11: Percentagem de crianças órfãs e<br />

vulneráveis devido à SIDA, 2008<br />

Tete<br />

12%<br />

Gaza<br />

31%<br />

Maputo<br />

19%<br />

Manica<br />

19%<br />

Fonte: MICS, 2008.<br />

Sofala<br />

20%<br />

Inhambane<br />

15%<br />

Maputo Cidade<br />

20%<br />

Niassa<br />

9%<br />

Zambézia<br />

19%<br />

Cabo Delgado<br />

17%<br />

Nampula<br />

13%<br />

biológica directa com o chefe da família<br />

eram vítimas de discriminação em termos<br />

de acesso à educação, tanto nas áreas rurais<br />

como nas áreas urbanas. 48<br />

O Inquérito Demográfico e de Saúde de<br />

2003 constatou que as órfãs com 15-17 anos<br />

de idade têm maior probabilidade que as<br />

não órfãs de se ter iniciado sexualmente e<br />

as órfãs de mãe têm maior probabilidade<br />

que as não órfãs de estar casadas, 49 o que<br />

significa que os adolescentes, especialmente<br />

as meninas, são particularmente vulneráveis.<br />

Um estudo constatou que os órfãos<br />

eram mais propensos a intimidações e<br />

depressões, e menos propensos a ter um<br />

adulto ou amigos de confiança. Pessoas<br />

com órfãos a seu cargo também reportaram<br />

depressão e isolamento similares. 50<br />

4.6. Protecção Social Básica<br />

Presentemente, o Instituto Nacional<br />

de Acção Social supervisiona cinco<br />

programas de protecção social: dois<br />

programas de assistência (um programa de<br />

transferências de dinheiro e um programa<br />

de transferências sociais em espécie) e três<br />

programas de promoção e desenvolvimento<br />

(Benefício Social pelo Trabalho, Geração<br />

de Rendimentos e Desenvolvimento<br />

Comunitário).<br />

Destes, o Programa Subsídio de Alimentos<br />

(PSA) é, de longe, o de maior alcance. Este<br />

programa de transferências incondicionais<br />

de dinheiro foi introduzido em 1990,<br />

destinando-se a idosos, deficientes e doentes<br />

crónicos e seus dependentes no estrato<br />

mais pobre da sociedade. Actualmente, os<br />

seus principais beneficiários directos são<br />

idosos (93 por cento), pessoas portadoras<br />

de deficiência (6 por cento) e doentes<br />

crónicos (1 por cento). Tem, portanto, as<br />

características de pensão (de velhice) não<br />

contributiva. Moçambique é um dos poucos<br />

países de baixo rendimento africanos com<br />

tal programa de transferências de dinheiro<br />

de longa duração suportado por fundos do<br />

estado e legislação nacional. Em 2007, o PSA<br />

atingiu 128 mil famílias com transferências<br />

mensais de dinheiro, aumentando para<br />

164


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

143.455 agregados familiares em 2008 e<br />

166.824 em 2009. No total, o programa<br />

alcançou 166.824 beneficiários directos<br />

e 140.643 beneficiários indirectos<br />

(dependentes) em 2009. Uma significativa<br />

percentagem de beneficiários indirectos<br />

são crianças, incluindo filhos biológicos<br />

do beneficiário directo, órfãos e crianças<br />

vulneráveis que vivem no agregado.<br />

Em 2008, o PSA passou por duas<br />

importantes reformas: o aumento gradual<br />

da escala do subsídio, e um maior enfoque<br />

na inclusão de dependentes elegíveis<br />

como beneficiários indirectos no regime<br />

de pagamento. Parte significativa desses<br />

beneficiários indirectos são crianças, o<br />

que até agora tem sido problemático em<br />

virtude de muitas vezes não cumprirem<br />

os critérios de elegibilidade. No caso das<br />

crianças, isso deve-se frequentemente<br />

à falta de um documento de registo de<br />

nascimento ou de orfandade. De acordo<br />

com os procedimentos do programa, não<br />

órfãos que vivem com os idosos, mesmo<br />

não recebendo nenhum apoio financeiro<br />

de seus pais, não são beneficiários<br />

elegíveis do PSA. Consequentemente,<br />

fica excluído do programa um número<br />

significativo de crianças extremamente<br />

vulneráveis. Um inventário e actualização<br />

das fichas de registo dos beneficiários<br />

directos e indirectos planeado para 2010<br />

irá trazer mais luz sobre o número de<br />

crianças potencialmente elegíveis nas<br />

famílias beneficiárias a que não está a ser<br />

presentemente conferido um direito. Essas<br />

informações irão alimentar o novo sistema<br />

de gestão do programa que entrará em<br />

funcionamento em 2011 e garantirão uma<br />

melhor cobertura dos dependentes elegíveis.<br />

Está prevista uma revisão do manual do<br />

programa integrada no plano operacional<br />

da Estratégia de Segurança Social Básica,<br />

que incluirá discussões sobre os critérios<br />

que determinam a inclusão de dependentes<br />

menores. A presente campanha de registo<br />

de nascimento deverá abordar o problema<br />

de não se ter um documento de registo de<br />

nascimento, facilitando assim a inclusão de<br />

crianças vulneráveis como portadoras de<br />

direitos.<br />

Está em curso uma avaliação do impacto<br />

do PSA, na qual um grupo de tratamento<br />

(1.016 famílias) e controlo (1.650 famílias)<br />

participa numa pesquisa para determinar<br />

o impacto das transferências mensais<br />

de dinheiro no consumo, na saúde e na<br />

educação (incluindo acesso a serviços), no<br />

emprego, na habitação e nas alterações<br />

demográficas intra-agregados familiares. O<br />

levantamento inicial foi realizado em 2008,<br />

estando previstas pesquisas de seguimento<br />

para 2009 (já realizada), 2011 e 2013. É seu<br />

objectivo analisar o impacto do PSA nos<br />

beneficiários e famílias visando informar o<br />

diálogo técnico e político com o Governo<br />

e os parceiros sobre o rumo do programa.<br />

Prevê-se que evidências empíricas geradas<br />

por essa avaliação venham a influenciar<br />

as principais decisões programáticas, tais<br />

como montantes e a gama da escala de<br />

benefícios, o número de beneficiários,<br />

a constituição do grupo-alvo, etc. Os<br />

resultados da avaliação deverão também<br />

informar o diálogo técnico e político sobre<br />

a introdução de um subsídio para crianças<br />

como proposto na Estratégia de Segurança<br />

Social Básica.<br />

A Estratégia prevê ampliar o programa PSA<br />

para 452.000 agregados familiares até 2014.<br />

Espera-se que estes agregados representem<br />

1.356.000 beneficiários directos e indirectos,<br />

dos quais 795.520 beneficiários indirectos<br />

serão provavelmente crianças.<br />

Além do PSA, o programa de transferências<br />

em espécie identifica crianças órfãs e<br />

vulneráveis como beneficiários directos. É<br />

fornecido material de apoio a indivíduos<br />

e famílias que necessitam de assistência<br />

imediata sob a forma de produtos<br />

alimentares, material escolar, utensílios<br />

domésticos e material de construção. Em<br />

2008, este apoio chegou a 24 por cento<br />

dos agregados familiares. O maior grupo<br />

de beneficiários são as crianças, incluindo<br />

26 por cento de crianças órfãs, 23 por<br />

cento de crianças desnutridas; 12 por<br />

cento de gémeos; 10 por cento de crianças<br />

abandonadas; 6 por cento de bebés que não<br />

podem ser amamentados; 6 por cento de<br />

crianças chefes de agregados familiares; 2<br />

165


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

por cento de adolescentes e 0,24 por cento<br />

de trigémeos. Embora esse apoio seja um<br />

valioso contributo para aliviar a privação<br />

das famílias em extrema necessidade, é<br />

dado como fornecimento, sendo a cobertura<br />

limitada e insuficiente para atender à<br />

presente demanda.<br />

O programa de subsídio para as crianças<br />

proposto terá como alvo famílias que<br />

cuidam de órfãos e crianças vulneráveis.<br />

Está previsto introduzir-se o subsídio numa<br />

abordagem faseada (ver Tabela 5.2), mas os<br />

fundos estatais para a sua introdução não<br />

foram ainda assegurados, pelo que não foi<br />

viável o lançamento do programa em 2010.<br />

4.7. Atestados de Pobreza<br />

O Governo criou um sistema em que<br />

são emitidos atestados de pobreza para<br />

os agregados mais vulneráveis visando<br />

garantir o livre acesso das crianças a<br />

serviços de educação, saúde e registo<br />

civil. Os agregados familiares beneficiários<br />

são definidos como sendo os que não<br />

têm recursos para sobreviver sem ajuda<br />

do Estado. O processo de obtenção de<br />

atestados de pobreza requer interacção<br />

com o registo local (para confirmar o local<br />

de residência), depois com os serviços<br />

de acção social a nível distrital (para<br />

verificar as informações sobre a condição<br />

social do requerente) e, finalmente, com a<br />

administração do distrito (para emissão do<br />

atestado). Relatórios de organizações não<br />

governamentais que apoiam o acesso das<br />

famílias a este programa têm revelado que<br />

morosos procedimentos e falta de clareza<br />

sobre a que serviços se aplicam os atestados<br />

(mesmo entre os prestadores de serviços<br />

e agentes da administração), bem como a<br />

falta de meios dos prestadores de serviço<br />

para aceitar gratuitamente os beneficiários<br />

representam grandes constrangimentos.<br />

4.8. Análise de capacidade<br />

O estudo Acesso à Justiça 2009, realizado<br />

por incumbência do Ministério da<br />

Planificação e Desenvolvimento no âmbito<br />

do processo de avaliação do PARPA II<br />

concluiu que durante o período 2005-2009<br />

o acesso à justiça em Moçambique não<br />

Tabela 5.1: Transferências de dinheiro projectadas para agregados familiares chefiados por idosos,<br />

portadores de deficiência e doentes crónicos, 2010-2014<br />

2010 2011 2012 2013 2014<br />

Número de famílias alargadas 242.296 312.592 382.888 453.183 523.479<br />

Montante atribuído (Milhões de Mts) 668,74 862,75 1,056,77 1,250,79 1,444,80<br />

Percentagem de fundos do estado 0,24% 0,29% 0,34% 0,38% 0,42%<br />

Número de idosos beneficiários<br />

directos e indirectos 300.447 387.614 474.781 561.947 649.114<br />

Fonte: Governo de Moçambique, “Estratégia Nacional de Segurança Social Básica,” Maputo, Março 2010.<br />

Tabela 5.2: Transferências de dinheiro para famílias com crianças órfãs e vulneráveis, 2010-2014<br />

2010 2011 2012 2013 2014<br />

Número de famílias alargadas 66.780 133.559 200.339 267.119 333.899<br />

Montante atribuído (milhões de Mts) 186,51 373,03 559,54 746,06 932,57<br />

Percentagem de fundos do estado 0,20% 0,39% 0,55% 0,71% 0,85%<br />

Número de crianças beneficiárias 203.531 407.062 610.594 814.125 1.017,656<br />

Fonte: Governo de Moçambique, “Estratégia Nacional de Segurança Social Básica,” Maputo, Março 2010.<br />

166


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

melhorou (embora também não se tenha<br />

reduzido). 51 Persistem falhas no assegurar<br />

que os benefícios dos serviços públicos<br />

oferecidos pelo sector da justiça (ou seja, os<br />

Tribunais, a Procuradoria Geral da República,<br />

o Ministério da Justiça e o Instituto de<br />

Assistência Jurídica alcancem de facto a<br />

maioria dos cidadãos, especialmente os mais<br />

vulneráveis.<br />

A avaliação de impacto do PARPA II revelou<br />

que, das 36 acções previstas nas áreas<br />

de reforma da justiça, legalidade, ordem<br />

e segurança pública, apenas seis foram<br />

totalmente concluídas, e que em dez<br />

acções não registou qualquer progresso.<br />

Entre as importantes acções que não<br />

foram concluídas constam a nova lei<br />

sobre o Instituto de Assistência Jurídica, a<br />

digitalização dos dados do tribunal judicial,<br />

a aprovação da Política Nacional de Direitos<br />

Humanos, e a reforma da Unidade de<br />

Investigação Criminal da Polícia.<br />

Todo o sector de justiça, e particularmente<br />

as forças policiais, deve desempenhar um<br />

papel mais activo no sentido de garantir<br />

que as famílias, comunidades e escolas<br />

proporcionem ambientes seguros e de<br />

protecção para as crianças, aplicando as<br />

leis penais e ampliando iniciativas como os<br />

Gabinetes de Atendimento. Foram criados<br />

mais de 200 centros em todo o país desde<br />

o primeiro Gabinete de Atendimento na<br />

Beira, em 2002. 52 Estes gabinetes foram<br />

criados com vista a proporcionar às vítimas<br />

um espaço seguro para denunciarem à<br />

polícia casos de violência e para serem<br />

encaminhadas, pelo Ministério da Mulher<br />

e Acção Social, o Ministério da Saúde e<br />

ministérios afins, incluindo trabalhadores de<br />

saúde e assistentes sociais, para os serviços<br />

necessários. Entre Janeiro e Setembro de<br />

2009, mais de 14.000 vítimas de violência,<br />

abuso e exploração, das quais 2.721<br />

crianças (1.219 rapazes e 1.502 raparigas),<br />

foram apoiadas através desses gabinetes<br />

por todo o país. No entanto, continuam a<br />

verificar-se carências significativas até que<br />

esses gabinetes possam ser considerados<br />

plenamente operacionais. Os recursos<br />

humanos e logísticos disponíveis são<br />

insuficientes para permitir que a maioria dos<br />

gabinetes funcione 24 horas por dia. Apenas<br />

sete dos 200 Gabinetes de Atendimento têm<br />

os seus próprios veículos, o que representa<br />

uma séria limitação na mobilidade para<br />

investigar casos de violência contra crianças<br />

e mulheres, para prestar cuidados e apoiar<br />

as vítimas. Deve ser mobilizado mais apoio<br />

para reforçar a capacidade dos centros<br />

visando facilitar um rápido encaminhamento<br />

dos casos para prestadores de serviços<br />

básicos e assegurar às crianças e mulheres<br />

vítimas de violência serviços de qualidade.<br />

A recolha de dados fiáveis sobre as<br />

questões relacionadas com a protecção da<br />

criança no sector da justiça é fundamental<br />

para melhorar essa protecção, mas<br />

extremamente difícil em Moçambique,<br />

nomeadamente a nível provincial e distrital.<br />

Tal situação é devida, por um lado à<br />

tradição de se lidar com os casos no seio<br />

das famílias e dos agregados, ao invés dos<br />

canais formais legais, e, por outro, à falta<br />

de capacidade técnica e material a nível do<br />

Governo e do sistema de justiça. A violência,<br />

a exploração e o abuso desenvolvem-se<br />

em condições de ilegalidade e falta de<br />

transparência, tornando difícil as estatísticas<br />

dos Ministérios da Justiça e do Interior<br />

reflectirem a verdadeira dimensão e<br />

extensão dos problemas. 53<br />

A realidade para a maioria dos<br />

moçambicanos é que os tribunais judiciais<br />

são inacessíveis, bloqueados por uma série<br />

de obstáculos, incluindo custos elevados<br />

em relação ao rendimento, distância e<br />

fracas redes de transporte. Moçambique<br />

enfrenta desafios significativos na oferta<br />

de acesso à justiça à maioria dos seus<br />

cidadãos, bem como no cumprimento dos<br />

padrões constitucionais e internacionais de<br />

justiça. 54 Os principais centros do sistema<br />

de justiça encontram-se em áreas urbanas,<br />

principalmente em Maputo, ficando as áreas<br />

rurais por servir. O relatório sobre o Sector<br />

da Justiça e o Estado de Direito publicado<br />

pela Open Society Foundation (Sociedade<br />

Aberta) citou constrangimentos no acesso<br />

à justiça, incluindo um insuficiente número<br />

de funcionários nos tribunais e a falta de<br />

167


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

pessoal qualificado, tais como magistrados,<br />

procuradores gerais e escrivães. Mais<br />

obstáculos verificados foram a acumulação<br />

de processos nas várias secções, a falta<br />

de equipamentos e infra-estrutura (apenas<br />

estão cobertas neste momento capitais<br />

provinciais e pouco mais de metade das<br />

capitais de distrito) e a falta de advogados<br />

disponíveis para representar as crianças<br />

acusadas de crime, especialmente fora<br />

da Cidade de Maputo. Esses importantes<br />

obstáculos no sistema de justiça impedem<br />

os tribunais de satisfazer os crescentes<br />

pedidos de guarda, bem como outras<br />

questões de justiça juvenil e contribuem<br />

para um atraso cada vez maior de casos<br />

pendentes.<br />

Embora a capacidade dos sistemas<br />

de justiça para prevenir e responder a<br />

diferentes formas de violência, abuso e<br />

exploração tenha sido reforçada, a resposta<br />

global continua a ser fragmentada, reactiva,<br />

fraca e insuficiente. É urgentemente<br />

necessária uma melhoria da capacidade<br />

dos Ministérios da Justiça e do Interior para<br />

proporcionar a devida atenção e protecção<br />

às vítimas de violência, abuso e exploração.<br />

A capacidade dos sectores de acção social,<br />

do interior e de justiça para prevenir e<br />

responder a casos de violência contra<br />

as crianças, tanto a nível nacional como<br />

provincial também tem de ser reforçada<br />

através de recolha de dados, monitoria e<br />

mecanismos de apresentação de relatórios a<br />

todos os níveis.<br />

Em termos de capacidade neste domínio<br />

falta também um banco de dados<br />

nacional sobre violência e abuso sexual. O<br />

desenvolvimento de um sistema nacional<br />

eficaz aumentaria consideravelmente a<br />

capacidade do Governo para registar,<br />

acompanhar, avaliar e responder a padrões<br />

de abuso e violência. Esse desenvolvimento<br />

seria especialmente útil para ministérioschave<br />

como o Ministério do Interior<br />

(para notificação de casos criminais),<br />

o Ministério da Mulher e Acção Social<br />

(para aos assistentes sociais fornecerem<br />

informações sobre casos de género), e o<br />

Ministério da Educação (para notificação<br />

de incidentes em escolas), bem como para<br />

reforçar a capacidade das comunidades para<br />

prevenirem e responderem à violência nas<br />

famílias ou na rua. As observações finais do<br />

Comité dos Direitos da Criança ao relatório<br />

periódico de Moçambique reconhecem que<br />

o reforço da base de evidências sobre a<br />

protecção das crianças no sector da justiça<br />

é fundamental, sobretudo para se garantir<br />

que se usem os dados para melhorar as leis,<br />

políticas e práticas. 55<br />

Outro grande desafio para o sector da justiça<br />

é a necessidade de se coordenar, dinamizar<br />

e maximizar o impacto do desenvolvimento<br />

de capacidades e esforços de sensibilização<br />

por uma grande variedade de partes<br />

interessadas. Doadores, organizações nãogovernamentais<br />

e agências das NU estão<br />

a definir como alvo juízes, funcionários<br />

judiciais, agentes prisionais e policiais,<br />

tanto a nível nacional como comunitário. No<br />

entanto, o Governo não estabeleceu padrões<br />

para materiais de formação e mensagens<br />

de sensibilização, e não existe uma<br />

abordagem sistemática e coordenada para<br />

a formação e sensibilização. Para melhor<br />

institucionalizar os esforços de capacitação,<br />

tanto o Ministério da Justiça como o<br />

Ministério do Interior têm vindo a integrar<br />

módulos de formação que descrevem<br />

pormenorizadamente como proteger os<br />

direitos das crianças na qualidade de<br />

vítimas, testemunhas e infractoras no<br />

sistema de justiça criminal nos manuais<br />

de formação utilizados pelo Instituto de<br />

Formação Jurídica e Judiciária nacional e<br />

pela academia nacional da polícia, dando por<br />

esse meio uma atenção sistémica a questões<br />

de protecção infantil.<br />

Apesar das limitações acima mencionadas,<br />

registaram-se melhorias, nomeadamente<br />

no âmbito dos tribunais e do Ministério<br />

Público. De acordo com o segundo Plano<br />

Estratégico Integrado do Sector da Justiça<br />

(Plano Estratégico Integrado II) um total de<br />

1.173 pessoas formaram-se nas diferentes<br />

faculdades de direito no país desde 2000.<br />

Desde que o Centro de Formação Jurídica<br />

e Judiciária iniciou suas actividades em<br />

2001, cerca de 136 juízes e procuradores,<br />

168


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

343 funcionários de tribunal, 51 assistentes<br />

jurídicos e 45 notários públicos se formaram<br />

a partir do Centro, estimando-se que 90<br />

por cento dos licenciados entraram depois<br />

numa das instituições do sector. Desde 2004,<br />

a Academia da Polícia concedeu os graus<br />

equivalentes a Licenciado e Mestrado em<br />

ciências policiais a cerca de 85 candidatos<br />

por ano, e 1.200 agentes policiais se<br />

graduam anualmente a partir da escola<br />

básica da polícia.<br />

O Ministério da Mulher e da Acção Social<br />

tem recebido apoio técnico e financeiro de<br />

uma série de parceiros para implementar<br />

o PACOV. No entanto, uma avaliação<br />

constatou que o Ministério opera com<br />

limitados recursos e competências a nível<br />

distrital, o que enfraquece a sua capacidade<br />

de responder de forma abrangente às<br />

necessidades das crianças existentes. 56<br />

Assim, está a ser encomendado um estudo<br />

para gerar mais evidências relativas a onde<br />

residem as lacunas de capacidade ou pontos<br />

fracos a nível distrital e, consequentemente,<br />

como podem essas carências ser<br />

transformadas em pontos fortes.<br />

Para avaliar o impacto da implementação do<br />

PACOV, o Ministério da Mulher e da Acção<br />

Social encomendou uma avaliação. Os<br />

resultados dirão da relevância e eficiência do<br />

PACOV na prestação de assistência e apoio<br />

às crianças, em especial às que vivem em<br />

situação de vulnerabilidade. A elaboração<br />

dos Padrões Mínimos de Assistência a<br />

Crianças Órfãs e Vulneráveis centrando-se<br />

especificamente nos seis serviços básicos<br />

definidos pelo PACOV, agora em curso, será<br />

um importante guia para a implementação<br />

no país de actividades respeitantes a<br />

crianças<br />

Conforme estabelecido na Lei da Criança, o<br />

Conselho de Ministros aprovou o Conselho<br />

Nacional dos Direitos da Criança em<br />

2009. Este será um importante fórum para<br />

diferentes instituições governamentais e<br />

organizações da sociedade civil definirem<br />

as principais estratégias para os direitos<br />

das crianças e coordenarem futuramente as<br />

acções de uma forma eficaz.<br />

4.9. Parcerias da sociedade civil<br />

Também a sociedade civil participa<br />

activamente em acções de advocacia,<br />

no diálogo político, na capacitação e<br />

sensibilização da comunidade sobre<br />

questões de protecção da criança no sistema<br />

de justiça. Os parceiros da sociedade civil<br />

têm assumido um papel activo na divulgação<br />

de diversas leis, entre as quais da Lei da<br />

Criança, na sua versão ‘amiga da criança’.<br />

Organizações da sociedade civil em<br />

Moçambique também desempenham um<br />

papel vital na provisão de serviços básicos,<br />

especialmente no apoio a famílias e crianças<br />

vulneráveis que fazem face ao HIV e à SIDA.<br />

Embora não estejam disponíveis dados<br />

específicos sobre o apoio a crianças órfãs e<br />

vulneráveis prestado por organizações da<br />

sociedade civil, note-se que só o Plano de<br />

Emergência do Presidente dos EUA para o<br />

Alívio da SIDA ajudou 16 organizações nãogovernamentais<br />

a alcançarem 242.800 COV<br />

em 2008. 57 As organizações da sociedade<br />

civil despenderam cerca de 38 por cento do<br />

total de fundos gastos no domínio do HIV de<br />

2004 a 2006. 58<br />

É necessário que se melhore a coordenação<br />

das actividades das organizações da<br />

sociedade civil para evitar duplicação,<br />

expandir o que, muitas vezes, é apoio<br />

localizado e garantir sustentabilidade, uma<br />

vez que chega a 70 por cento o apoio de<br />

organizações da sociedade civil que provém<br />

de fontes externas. 59 Uma meta-análise 60 de<br />

grupos comunitários a trabalhar no domínio<br />

da protecção e bem-estar da criança ressaltou<br />

a necessidade de financiamento de longo<br />

prazo para permitir o desenvolvimento de<br />

grupos de protecção da criança pertencentes<br />

a e assumidos pelas próprias comunidades.<br />

4.10. Financiamento do sector<br />

e dotações orçamentais<br />

O Ministério da Mulher e da Acção Social<br />

recebe baixos níveis de apoio financeiro do<br />

Governo de Moçambique: em 2010, foi-lhe<br />

atribuído apenas 1,1 por cento do PIB, uma<br />

redução de 0,3 por cento da verba de 2009. 61<br />

169


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

Além disso, a capacidade das Direcções<br />

Provinciais da Mulher e Acção Social para<br />

desempenhar efectivamente as suas funções<br />

e responsabilidades tem sido limitada pela<br />

falta de recursos humanos e formação<br />

adequada (em termos seja de trabalho social<br />

seja de gestão do programa).<br />

Desde 2003, as dotações orçamentais<br />

para o sector da justiça têm-se mantido<br />

relativamente estáveis, representando<br />

entre seis e sete por cento do orçamento<br />

do Estado. 62 O Ministério do Interior<br />

absorve cerca de 70 por cento dos recursos<br />

alocados. vii Em termos nominais, as verbas<br />

aumentaram de 22 por cento para 25 por<br />

cento cada ano, com excepção de 2006<br />

(um aumento de 5 por cento). As dotações<br />

orçamentais por instituição para as despesas<br />

de investimento foram irregulares, não se<br />

podendo observar nenhuma clara tendência.<br />

As dotações orçamentais para o nível<br />

provincial estão a aumentar, mas apenas<br />

proporcionalmente ao aumento do<br />

orçamento total. As dotações para o nível<br />

provincial representam aproximadamente<br />

cerca de 25 por cento do total das<br />

dotações para o sector da justiça em 2008.<br />

Poucas evidências há de uma efectiva<br />

descentralização de recursos ou sua<br />

administração a nível provincial.<br />

vii O orçamento do Ministério do Interior não está desagregado, não permitindo, portanto, que se identifique a parcela<br />

atribuída às forças policiais.<br />

170


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

5. Conclusões<br />

São muito diversos os problemas de<br />

protecção que se colocam às crianças em<br />

Moçambique. A violência física e sexual,<br />

o casamento precoce, o trabalho infantil<br />

e o tráfico de crianças continuam a ser<br />

comuns; embora os dados nessas áreas<br />

sejam escassos, a informação disponível<br />

indica que as tendências não melhoraram<br />

significativamente nos últimos anos. O<br />

número de crianças órfãs e vulneráveis<br />

tem-se mantido, principalmente como<br />

resultado do HIV e da SIDA. Embora as<br />

famílias alargadas e as comunidades em<br />

Moçambique tenham sempre constituído a<br />

primeira linha de resposta, este sistema de<br />

apoio tradicional está sujeito a uma pressão<br />

cada vez maior, uma vez que tem vindo a<br />

subir o número de crianças a necessitar<br />

de assistência. Além disso, registou-se<br />

um progresso significativo na área dos<br />

serviços de registo de nascimento por todo<br />

o país, com cerca de 7 milhões de crianças<br />

registadas desde 2005; o desafio nesta área<br />

consistirá em assegurar que se mantenham<br />

as iniciativas em curso para se alcançar uma<br />

cobertura universal.<br />

Nos últimos anos foi alcançado um<br />

significativo progresso no quadro legal e<br />

de políticas respeitantes à protecção da<br />

criança, nomeadamente a aprovação da<br />

Lei sobre a Violência Doméstica, da Lei da<br />

Criança e da Lei da Justiça Juvenil, entre<br />

outros. Apesar dessas melhorias, a resposta<br />

global continua a ser fragmentada, reactiva,<br />

fraca e insuficientemente provida de fundos,<br />

e é necessário que esta nova legislação<br />

se traduza em regulamentos e programas<br />

eficazes. A Estratégia de Segurança Social<br />

Básica, recentemente aprovada pelo<br />

Conselho de Ministros e actualmente em<br />

vias de operacionalização apresenta um<br />

cenário promissor no que respeita a lidar<br />

com crianças e vulnerabilidade familiar,<br />

especialmente porque incorpora uma<br />

componente de subsídio para crianças. Os<br />

progressos alcançados no programa de<br />

transferência social do PSA, onde o número<br />

de agregados familiares passou de 90.000<br />

em 2005 para cerca de 170.000 em 2009,<br />

são um exemplo encorajador de como as<br />

crianças poderiam beneficiar das iniciativas<br />

de protecção social.<br />

As políticas e os programas de protecção<br />

social são meios eficazes de responder<br />

às necessidades das famílias e crianças<br />

vulneráveis, dado o fundamental papel da<br />

protecção social na redução da pobreza, na<br />

superação da exclusão social e na formação<br />

de capital humano para se reduzirem os<br />

riscos e a vulnerabilidade enfrentados por<br />

grupos vulneráveis, particularmente crianças<br />

e pessoas que delas cuidam. De forma mais<br />

específica, é necessário que se enfrentem<br />

três importantes desafios para ir ao encontro<br />

das necessidades e proporcionar resultados<br />

efectivos e benéficos às crianças vulneráveis<br />

e suas famílias:<br />

• O apoio e os serviços liderados pelo<br />

governo devem chegar a todas as crianças<br />

que deles precisam em comunidades<br />

pobres afectadas pelo HIV e pela SIDA.<br />

Isto inclui crianças que perderam os pais,<br />

mas também muitas outras, incluindo as<br />

vítimas de violência, abuso e exploração;<br />

• As políticas e os programas para<br />

crianças vulneráveis devem fortalecer<br />

a capacidade das famílias alargadas e<br />

comunidades para cuidar das crianças a<br />

nível da base;<br />

• É necessário que se abordem os<br />

problemas de pobreza familiar e<br />

desigualdade de género com vista a<br />

obterem-se melhores resultados para as<br />

crianças.<br />

Apesar dos importantes avanços na área<br />

da defesa dos direitos das crianças em<br />

Moçambique, muito mais há a fazer para<br />

desenvolver um sistema holístico de<br />

protecção da criança, que procure sinergias<br />

171


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

entre os sectores de acção social e justiça<br />

para aumentar o acesso das crianças a<br />

serviços de protecção e outros importantes<br />

serviços sociais. Isso envolve principalmente<br />

o melhoramento dos dados e mecanismos<br />

de monitoria; o desenvolvimento de uma<br />

abordagem mais sistémica e coordenada<br />

dentro de e entre os ministérios-chave;<br />

e o fortalecimento de capacidades dos<br />

ministérios relevantes para desenvolver<br />

uma abordagem robusta e sistémica à<br />

protecção da criança. Além disso, como as<br />

normas culturais e sociais desempenham tão<br />

importante papel no contexto da protecção<br />

das crianças, é contínua a necessidade de<br />

se proceder a uma divulgação efectiva de<br />

informação sobre questões-chave e de se<br />

sensibilizar a sociedade em geral para os<br />

direitos da criança e a obrigação que todos<br />

têm de as proteger. No entanto, sem que<br />

haja mais recursos, continuará limitada<br />

a capacidade do Ministério da Mulher<br />

e da Acção Social aos níveis nacional e<br />

subnacional para levar a cabo as tarefas<br />

que lhe competem. É fundamental que as<br />

respostas das políticas governamentais<br />

às ameaças que se colocam às crianças<br />

vulneráveis tenham o devido financiamento<br />

e uma implementação adequada para que se<br />

possam proteger os direitos dessas crianças.<br />

172


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

Referências<br />

1 United Nations Secretary-General, Study on<br />

Violence against Children and Adolescents,<br />

Documentos de resultados do III Congresso<br />

Mundial, Brasil, 2008.<br />

2 Governo de Moçambique, ‘Lei nº 3/2007, de<br />

7 de Fevereiro, sobre a Protecção Social,’<br />

Maputo, 2007.<br />

3 Ministério do Interior, Departamento da<br />

Mulher e da Criança, Relatório Anual de 2009,<br />

Governo de Moçambique, Maputo, 2009.<br />

4 Pinheiro, Paulo Sérgio, Report of the<br />

independent expert for the United Nations<br />

study on violence against children, Nações<br />

Unidas, Nova Iorque, 2006<br />

5 Tvedten, Inge, Margarida Paulo and Georgina<br />

Montserrat, Gender Policies and Feminisation<br />

of Poverty in <strong>Mozambique</strong>, CMI Report, Chr.<br />

Michelsen Institute, Bergen, 2008.<br />

6 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />

Nacional sobre Saúde Reprodutiva e<br />

Comportamento Sexual dos Jovens<br />

e Adolescentes (INJAD), Governo de<br />

Moçambique, Maputo, 2001.<br />

7 Universidade Eduardo Mondlane, Centro de<br />

Estudos da População, Inquérito Internacional<br />

sobre a Violência contra a Mulher (IVAWS-<br />

2004) em Moçambique, Maputo, Abril de<br />

2005.<br />

8 United Nations Committee on the Rights of<br />

the Child, 52nd session, Consideration of<br />

Reports Submitted by States Parties Under<br />

Article 44 of the Convention, Concluding<br />

Observations of the Committee on the Rights<br />

of the Child: <strong>Mozambique</strong>, Nações Unidas,<br />

Genebra, 2009.<br />

9 Ministério da Educação e Cultura, Relatório<br />

da Auscultação Através das Unidades de<br />

Género, dos Conselhos Escolas, e Jovens<br />

Raparigas sobre Que Mecanismo a Adoptar<br />

para Prevenção, Combate, Denúncia e<br />

Encaminhamento de Casos de Assédio e Todo<br />

o Tipo de Abuso, Incluindo o Abuso Sexual<br />

na Escola, Governo de Moçambique, Maputo,<br />

2008.<br />

10 Ministério da Mulher e da Acção Social, Plano<br />

Nacional de Acção para a Criança, Governo<br />

de Moçambique, Maputo, 2005.<br />

11 Ministério da Mulher e da Acção Social,<br />

Inquérito sobre Violência Contra a Mulher,<br />

Governo de Moçambique, Maputo, 2004.<br />

12 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />

de Indicadores Múltiplos 2008, Governo de<br />

Moçambique, Maputo, 2010.<br />

13 Ministério da Mulher e da Acção Social,<br />

Inquérito sobre Violência Contra a Mulher,<br />

Governo de Moçambique, Maputo, 2004.<br />

14 Ibid.<br />

15 Ibid.<br />

16 International Organization for Migration,<br />

Regional Office for Southern Africa,<br />

Seduction, Sale and Slavery:Trafficking in<br />

Women and Children for Sexual Exploitation<br />

in Southern Africa, 3rd ed., Pretoria, 2003.<br />

17 <strong>Mozambique</strong> Human Rights League,<br />

Trafficking Body Parts in <strong>Mozambique</strong> and<br />

South Africa, Moçambique Liga dos Direitos<br />

Humanos, Maputo, 2008.<br />

18 deSasKropiwinicki, Zosa,The Internal<br />

Trafficking and Exploitation of Women and<br />

Children in <strong>Mozambique</strong>, Save the Children,<br />

Noruega, 2009.<br />

19 Save the Children, Our Broken Dreams:<br />

Child migration in southern Africa, Save the<br />

Children UK e Save the Children Norway em<br />

<strong>Mozambique</strong>, Maputo, 2008.<br />

20 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />

de Indicadores Múltiplos 2008, Governo de<br />

Moçambique, Maputo, 2010.<br />

21 deSasKropiwinicki, Zosa, The Internal<br />

Trafficking and Exploitation of Women and<br />

Children in <strong>Mozambique</strong>, Save the Children,<br />

Noruega,2009.<br />

22 Population Council, ‘Child Marriage Briefing:<br />

<strong>Mozambique</strong>’, 2004, descarregado de: http://<br />

www.popcouncil.org/pdfs/briefingsheets/<br />

MOZAMBIQUE_2005.pdf, acedido a 8 de<br />

Novembro de 2010.<br />

23 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />

de Indicadores Múltiplos, Governo de<br />

Moçambique, Maputo, 2010.<br />

24 Population Council, ‘Child Marriage Briefing:<br />

<strong>Mozambique</strong>’, 2004, descarregado de: http://<br />

173


POBREZA INFANTIL E DISPARIDADES EM MOÇAMBIQUE 2010<br />

www.popcouncil.org/pdfs/briefingsheets/<br />

MOZAMBIQUE_2005.pdf, acedido a 8 de<br />

Novembro de 2010.<br />

25 Haberland, Nicole, Erica Chong and Hillary<br />

Bracken, ‘Married Adolescents: An overview’,<br />

document preparado para o WHO/UNFPA/<br />

Population Council Technical Consultation on<br />

Married Adolescents, Organização Mundial de<br />

Saúde, Genebra, 2003.<br />

26 Ministério da Educação e Cultura, Direcção<br />

de Programas Especiais, Relatório da<br />

Auscultação Através das Unidades de<br />

Género, dos Conselhos das Escolas e Jovens<br />

Raparigas sobre Que Mecanismo Adoptar<br />

para Prevenção, Combate, Denúncia e<br />

Encaminhamento de Casos de Assédio e Todo<br />

o Tipo de Abuso, Incluindo o Abuso Sexual<br />

na Escola, Governo de Moçambique, Maputo,<br />

2008.<br />

27 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />

Demográfico e de Saúde 2003, Governo de<br />

Moçambique, Maputo, 2005.<br />

28 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />

de Indicadores Múltiplos, Governo de<br />

Moçambique, Maputo, 2010.<br />

29 United Nations Committee on the Rights of the<br />

Child, 52nd session, ‘Consideration of Reports<br />

Submitted by States Parties Under Article 44<br />

of the Convention, Concluding Observations<br />

of the Committee on the Rights of the Child:<br />

<strong>Mozambique</strong>’, Nações Unidas, Genebra, 2009.<br />

30 Graça, J. et al., ‘Impacto das realizações do<br />

PARPA II no acesso à Justiça’, Maputo, 2009.<br />

31 MGA Consultoria e Lexterra. ‘Avaliação<br />

sumária do impacto das realizações do PARPA<br />

II no acesso à justiça,’ Moçambique, Maputo,<br />

2009<br />

32 Open Society Institute for Southern Africa,<br />

‘<strong>Mozambique</strong>: Justice Sector and the Rule of<br />

Law’, OSISA, Londres, 2006.<br />

33 Legal Aid Institute, ‘Report to the Consultative<br />

Council of the Ministry of Justice,’ Instituto de<br />

Patrocínio e Assistência Jurídica, Junho de<br />

2008.<br />

34 Ministry of Planning and Development,<br />

Balanço do Plano Económico e Social,<br />

Governo de Moçambique, Maputo, Janeiro a<br />

Junho, 2008.<br />

35 Ministry of Foreign Affairs of Denmark, ‘Final<br />

Programme Document: Support to the Justice<br />

Sector in <strong>Mozambique</strong> 2008–2013’, Ref. No.<br />

104.MOZ.106, Outubro de 2008.<br />

36 Save the Children, ‘Denied our Rights: Children,<br />

women and inheritance in <strong>Mozambique</strong>,’ Save<br />

the Children, Maputo, 2007.<br />

37 Save the Children and the Food and<br />

Agriculture Organisation, ‘Children and<br />

women’s rights to property and inheritance<br />

in <strong>Mozambique</strong>,’ Save the Children, Maputo,<br />

2009.<br />

38 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />

Demográfico e de Saúde 2003, Governo de<br />

Moçambique, Maputo, 2005.<br />

39 Ministério da Educação e Cultura,<br />

Responsabilidades do Estado Moçambicano<br />

em Relação à Pessoa Portadora de<br />

Deficiência, Governo de Moçambique,<br />

Maputo, 2000.<br />

40 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />

de Indicadores Múltiplos, Governo de<br />

Moçambique, Maputo, 2010.<br />

41 United Nations Committee on the Rights of the<br />

Child, 52nd session, ‘Consideration of Reports<br />

Submitted by States Parties Under Article 44<br />

of the Convention, Concluding Observations<br />

of the Committee on the Rights of the Child:<br />

<strong>Mozambique</strong>,’ Nações Unidas, Genebra, 2009.<br />

42 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />

de Indicadores Múltiplos, Governo de<br />

Moçambique, Maputo, 2010.<br />

43 Instituto Nacional de Estatística, Ministry<br />

of Health, Ministry of Planning and<br />

Development, Centro de Estudos Africanos da<br />

Universidade Eduardo Mondlane, Conselho<br />

Nacional de Combate ao HIV/SIDA,<br />

Faculdade de Medicina, Impacto demográfico<br />

do HIV/SIDA em Moçambique: Actualização<br />

- Ronda de vigilância epidemiológica 2008,<br />

Governo de Moçambique, Maputo, 2009.<br />

44 UNAIDS, <strong>Mozambique</strong> Country Response,<br />

descarregado de: http://www.unaids.org/en/<br />

CountryResponses/Countries/mozambique.<br />

asp, acedido a 14 de Junho de 2010.<br />

45 United Nations Children’s Fund, The Human<br />

Rights Situation of Children in <strong>Mozambique</strong>,<br />

<strong>UNICEF</strong>, 2009<br />

174


CAPÍTULO 5: PROTECÇÃO DA CRIANÇA<br />

46 Instituto Nacional de Estatística, Inquérito<br />

de Indicadores Múltiplos, Governo de<br />

Moçambique, Maputo, 2010.<br />

47 HelpAge International, Mind the Gap. HIV and<br />

AIDS and older people in Africa, HelpAge<br />

International, Londres, 2008.<br />

48 Nhate, Virgulino, et al., Orphans and<br />

Discrimination in <strong>Mozambique</strong>: An outlay<br />

equivalence analaysis, International Food<br />

Policy Research Institute, Washington, D.C.,<br />

2005.<br />

49 Palermo, Tia, and Amber Peterman, ‘Are<br />

Female Orphans at Risk for Early Marriage,<br />

Early Sexual Debut, and Teen Pregnancy?<br />

Evidence from Sub-Saharan Africa’, Studies<br />

in Family Planning, vol. 40, no. 2, 2009; pp.<br />

101–112.<br />

50 Cluver, Lucie, and F. Gardner, ‘The Mental<br />

Health of Children Orphaned by AIDS: A<br />

review of international and southern African<br />

research’, Journal of Child and Adolescent<br />

Mental Health, vol. 19, no. 1, 2007, pp. 1–17.<br />

51 MGA Consultoria e Lexterra, Avaliação sumária<br />

do impacto das realizações do PARPA II no<br />

acesso à justiça. Moçambique, Maputo, 2009<br />

52 Ministério do Interior, Departamento da<br />

Mulher e da Crinaça, Relatório Anual de 2009,<br />

Governo de Moçambique, Maputo, 2009.<br />

53 MGA Consultoria e Lexterra. ‘Avaliação<br />

sumária do impacto das realizações do PARPA<br />

II no acesso à justiça,’ Moçambique, Maputo,<br />

2009.<br />

54 Open Society Initiative for Southern Africa,<br />

‘<strong>Mozambique</strong> Justice Sector and the Rule of<br />

Law Discussion Paper,’ Open Society Initiative<br />

for Southern Africa, Londres, 2006.<br />

55 United Nations Committee on the Rights of the<br />

Child, Concluding Observations to the State<br />

Report by the Government of <strong>Mozambique</strong>,<br />

Nações Unidas, Genebra, 2009.<br />

56 Austral Cowi, Assessment of <strong>UNICEF</strong> NGO<br />

– Government Partnership Programme,<br />

<strong>UNICEF</strong>, Maputo, 2010.<br />

57 The United States President’s Emergency Plan<br />

for AIDS Relief, Partnership to Fight HIV/AIDS<br />

in <strong>Mozambique</strong>, retrieved from: http://www.<br />

pepfar.gov/countries/mozambique/index.htm,<br />

accessed 14 March 2010. www.pepfar.gov/<br />

countries/mozambique/index.htm, acedido<br />

em 14 de Março de 2010.<br />

58 Amoaten, Susan, e Claire Bader, Rapid Review<br />

of Support to NGOs and Civil Society on AIDS<br />

in <strong>Mozambique</strong>, 2008. Inédito.<br />

59 Francisco, António, et al., Mozambican Civil<br />

Society Within: Evaluation, challenges,<br />

opportunities and action, Foundation for<br />

Community Development and United Nations<br />

Development Programme, Nova Iorque, 2007.<br />

60 Wessells, Mike. What Are We Learning<br />

About Community-Based Child Protection<br />

Mechanisms?2009. Draft.<br />

61 United Nations Childrens Fund, O que diz o<br />

Orçamento do Estado para 2010 sobre os<br />

chamados Sectores Prioritários? Informe 10,<br />

<strong>UNICEF</strong>, Nova Iorque, Maio de 2010.<br />

62 Sal &Caldeira, ‘The Justice Sector in<br />

<strong>Mozambique</strong>: Budget Allocations and<br />

Expenditure 2003 to 2010’, Maputo, Dezembro<br />

de 2007.<br />

175

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!