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(os) no Centro de Atenção Psicossocial (Caps) - CREPOP

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CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA<br />

CONSELHOS REGIONAIS DE PSICOLOGIA<br />

CENTRO DE REFERÊNCIA TÉCNICA EM PSICOLOGIA<br />

E POLÍTICAS PÚBLICAS<br />

Comissão <strong>de</strong> Elaboração do Documento<br />

Organizadora<br />

Heloiza Helena Mendonça Almeida Massanaro<br />

Especialistas<br />

Elisa Zaneratto R<strong>os</strong>a<br />

Marta Elizabeth <strong>de</strong> Souza<br />

R<strong>os</strong>imeire Aparecida Silva<br />

Colaboração: Sandra Fischete<br />

Técnica Regional: Djanira Sousa<br />

Referências Técnicas para a Atuação <strong>de</strong> Psicólogas(<strong>os</strong>) <strong>no</strong><br />

CAPS - <strong>Centro</strong> <strong>de</strong> Atenção Psic<strong>os</strong>social<br />

Brasília, julho/2013<br />

1ª Edição


É permitida a reprodução <strong>de</strong>sta publicação, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que sem alterações e<br />

citada a fonte. Disponível também em: www.cfp.org.br e em crepop.pol.org.br<br />

1ª edição – 2013<br />

Projeto Gráfico – IDEORAMA<br />

Diagramação – IDEORAMA<br />

Revisão – Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia (CFP)<br />

Ilustração – Jeferson Ribeiro (Gravura apresentada na 3ª M<strong>os</strong>tra <strong>de</strong> Arte<br />

Insensata 2011 – <strong>Centro</strong> <strong>de</strong> Convivência – Cezar Camp<strong>os</strong>)<br />

Coor<strong>de</strong>nação Geral/ CFP<br />

Yvone Duarte<br />

Coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Comunicação Social<br />

Denise <strong>de</strong> Quadr<strong>os</strong><br />

André Almeida (Editoração)<br />

Equipe Técnica do Crepop/CFP<br />

Monalisa Barr<strong>os</strong> e Márcia Mansur Saadallah /Conselheiras responsáveis<br />

Natasha Ram<strong>os</strong> Reis da Fonseca/Coor<strong>de</strong>nadora Técnica<br />

Cibele Cristina Tavares <strong>de</strong> Oliveira /Assessora <strong>de</strong> Metodologia<br />

Klebiston Tchavo d<strong>os</strong> Reis Ferreira /Assistente Administrativo<br />

Equipe Técnica/CRPs<br />

Renata Leporace Farret (CRP 01 – DF), Thelma Torres (CRP 02 – PE), Gisele<br />

Vieira Dourado O. Lopes e Glória Pimentel (CRP 03 – BA), Luciana Franco <strong>de</strong><br />

Assis e Leiliana Sousa (CRP04 – MG), Beatriz Adura e Fernanda Haikal(CRP<br />

05 – RJ), Ana Gonzatto, Marcelo Bittar e Edson Ferreira e Eliane C<strong>os</strong>ta (CRP<br />

06 – SP),Silvia Giugliani e Carolina d<strong>os</strong> Reis (CRP 07 – RS),Carmem Miranda<br />

e Ana Inês Souza (CRP 08 – PR), Marlene Barbaresco (CRP09 – GO/TO),<br />

Letícia Maria S. Palheta (CRP 10 – PA/AP), Renata Alves e Djanira Luiza<br />

Martins <strong>de</strong> Sousa (CRP11 – CE/PI/MA), Juliana Ried (CRP 12 – SC), Katiúska<br />

Araújo Duarte (CRP 13 – PB), Mario R<strong>os</strong>a e Keila <strong>de</strong> Oliveira (CRP14 – MS),<br />

Eduardo Augusto <strong>de</strong> Almeida (CRP15 – AL), Mariana Pass<strong>os</strong> e Patrícia<br />

Matt<strong>os</strong> Cal<strong>de</strong>ira Brant Littig (CRP16 – ES), Ilana Lem<strong>os</strong> e Zilanda Pereira<br />

<strong>de</strong> Lima (CRP17 – RN), Fabiana Tozi Vieira (CRP18 – MT), Lidiane <strong>de</strong> Melo<br />

Drapala (CRP19 – SE), Vanessa Miranda (CRP20 – AM/RR/RO/AC)


Referências bibliográficas conforme ABNT NBR 6022, <strong>de</strong> 2003; 6023,<strong>de</strong><br />

2002; 6029, <strong>de</strong> 2006 e 10520, <strong>de</strong> 2002.<br />

Direit<strong>os</strong> para esta edição – Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia: SAF/SUL Quadra<br />

2,Bloco B, Edifício Via Office, térreo, sala 104, 70070-600, Brasília-DF<br />

(61) 2109-0107 /E-mail: ascom@cfp.org.br /www.cfp.org.br<br />

Impresso <strong>no</strong> Brasil – Julho <strong>de</strong> 2013<br />

Catalogação na publicação<br />

Fundação Biblioteca Nacional<br />

Biblioteca Miguel Cervantes<br />

Fundação Biblioteca Nacional<br />

Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia<br />

Referências Técnicas para Atuação <strong>de</strong> Psicólogas(<strong>os</strong>) <strong>no</strong> CAPS -<br />

<strong>Centro</strong> <strong>de</strong> Atenção Psic<strong>os</strong>social / Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia. -<br />

Brasília: CFP, 2013.<br />

132 p.<br />

ISBN: 978-85-89208-55-0<br />

1. Psicólog<strong>os</strong> 2. Políticas Públicas 3. Saú<strong>de</strong> Mental 4. CAPS


XV Plenário<br />

Gestão 2011-2013<br />

Diretoria<br />

Humberto Cota Verona – Presi<strong>de</strong>nte<br />

Clara Goldman Ribemboim – Vice-presi<strong>de</strong>nte<br />

Monalisa Nascimento d<strong>os</strong> Sant<strong>os</strong> Barr<strong>os</strong> – Tesoureira<br />

Deise Maria do Nascimento – Secretária<br />

Conselheir<strong>os</strong> efetiv<strong>os</strong><br />

Flávia Cristina Silveira Lem<strong>os</strong><br />

Secretária Região Norte<br />

Aluízio Lopes <strong>de</strong> Brito<br />

Secretário Região Nor<strong>de</strong>ste<br />

Heloiza Helena Mendonça A. Massanaro<br />

Secretária Região <strong>Centro</strong>-Oeste<br />

Marilene Proença Rebello <strong>de</strong> Souza<br />

Secretária Região Su<strong>de</strong>ste<br />

Ana Luiza <strong>de</strong> Souza Castro<br />

Secretária Região Sul<br />

Conselheir<strong>os</strong> suplentes<br />

Adriana Eiko Matsumoto<br />

Celso Francisco Tondin<br />

Cynthia Rejane Corrêa Araújo Ciarallo<br />

Henrique J<strong>os</strong>é Leal Ferreira Rodrigues<br />

Márcia Mansur Saadallah<br />

Maria Ermínia Ciliberti<br />

Mariana Cunha Men<strong>de</strong>s Torres<br />

Marilda Castelar<br />

R<strong>os</strong>eli Goffman<br />

Sandra Maria Francisco <strong>de</strong> Amorim<br />

Tânia Suely Azevedo Brasileiro<br />

Psicólogas convidadas<br />

Angela Maria Pires Caniato<br />

Ana Paula Porto Noronha


Conselheiras responsáveis:<br />

Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia:<br />

Márcia Mansur Saadallah e Monalisa Nascimento d<strong>os</strong> Sant<strong>os</strong> Barr<strong>os</strong><br />

CRPs<br />

Carla Maria Manzi Pereira Baracat (CRP 01 – DF), Alessandra <strong>de</strong> Lima<br />

e Silva (CRP 02 – PE), Alessandra Sant<strong>os</strong> Almeida (CRP 03 – BA),<br />

Paula Ângela <strong>de</strong> F. e Paula (CRP04 – MG), Analícia Martins <strong>de</strong> Sousa<br />

(CRP 05 – RJ), Carla Biancha Angelucci (CRP 06 – SP), Vera Lúcia<br />

Pasini (CRP 07 – RS), Maria Sezinei<strong>de</strong> C. <strong>de</strong> Melo (CRP 08 – PR),<br />

Wadson Arantes Gama (CRP 09 – GO/TO), Jureuda Duarte Guerra<br />

(CRP 10 – PA/AP), Adriana <strong>de</strong> Alencar Gomes Pinheiro (CRP 11 – CE/<br />

PI/MA), Marilene Wittitz (CRP 12 – SC), Carla <strong>de</strong> Sant’ana Brandão<br />

C<strong>os</strong>ta (CRP 13 – PB), Elisângela Ficagna (CRP14 – MS), Izolda <strong>de</strong><br />

Araújo Dias (CRP15 – AL), Danielli Merlo <strong>de</strong> Melo (CRP16 – ES),<br />

Alysson Zenildo C<strong>os</strong>ta Alves (CRP17 – RN), Luiz Guilherme Araujo<br />

Gomes (CRP18 – MT) André Luiz Mandari<strong>no</strong> Borges (CRP19 – SE),<br />

Selma <strong>de</strong> Jesus Cobra (CRP20 – AM/RR/RO/AC)


APRESENTAÇÃO


Apresentação<br />

O Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia (CFP) apresenta à categoria<br />

e à socieda<strong>de</strong> em geral o documento <strong>de</strong> Referências Técnicas para<br />

Atuação <strong>de</strong> Psicólogas(<strong>os</strong>) n<strong>os</strong> Centr<strong>os</strong> <strong>de</strong> Atenção Psic<strong>os</strong>social–<br />

CAPS, produzido a partir da metodologia do <strong>Centro</strong> <strong>de</strong> Referência<br />

Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (Crepop). Este documento<br />

busca construir referência sólida para a atuação da Psicologia na área.<br />

As referências construídas p<strong>os</strong>sibilitam a elaboração <strong>de</strong> parâmetr<strong>os</strong><br />

compartilhad<strong>os</strong> e legitimad<strong>os</strong> pela participação crítica e reflexiva da<br />

categoria. Elas refletem o processo <strong>de</strong> diálogo que <strong>os</strong> Conselh<strong>os</strong> vêm<br />

construindo com a categoria, <strong>no</strong> sentido <strong>de</strong> se legitimar como instância<br />

reguladora do exercício profissional.<br />

Por mei<strong>os</strong> cada vez mais <strong>de</strong>mocrátic<strong>os</strong>, esse diálogo tem se<br />

pautado por uma política <strong>de</strong> reconhecimento mútuo entre as(<strong>os</strong>)<br />

profissionais da Psicologia, assim como, pela construção coletiva <strong>de</strong><br />

uma plataforma profissional que seja também ética e política.<br />

Esta publicação marca mais um passo <strong>no</strong> movimento recente <strong>de</strong><br />

aproximação da Psicologia com o campo das Políticas Públicas. Aborda<br />

cenário <strong>de</strong>licado do sofrimento psíquico, da Reforma Psiquiátrica,<br />

assim como o da evolução das políticas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e saú<strong>de</strong> mental <strong>no</strong><br />

Brasil. Evolução esta que encarrega a Psicologia como a profissão<br />

que estimula produção <strong>de</strong> sentid<strong>os</strong> <strong>no</strong>v<strong>os</strong>, substituindo as relações<br />

tutelares pelas relações contratuais para a integração social e familiar<br />

d<strong>os</strong> Usuári<strong>os</strong> do sistema <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental.<br />

A opção pela abordagem <strong>de</strong>ste tema reflete o compromisso d<strong>os</strong><br />

Conselh<strong>os</strong> Fe<strong>de</strong>ral e Regionais <strong>de</strong> Psicologia com a qualificação da<br />

atuação das(<strong>os</strong>) psicólogas(<strong>os</strong>) em tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> seus espaç<strong>os</strong> <strong>de</strong> atuação.<br />

HUMBERTO VERONA<br />

Presi<strong>de</strong>nte do Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia<br />

13


Sumário<br />

APRESENTAÇÃO 13<br />

PREFÁCIO 19<br />

<strong>CREPOP</strong> – <strong>Centro</strong> <strong>de</strong> Referência Técnica em Psicologia<br />

e Políticas Públicas 19<br />

Objetivo e Campo <strong>de</strong> Atuação 19<br />

A Pesquisa do <strong>CREPOP</strong>/CFP 20<br />

Processo <strong>de</strong> elaboração <strong>de</strong> Referência Técnica 22<br />

O Processo <strong>de</strong> Consulta Pública 25<br />

INTRODUÇÃO 27<br />

EIXO I: DIMENSÃO ÉTICO-POLÍTICA DAS POLÍTI-<br />

CAS DE SAÚDE MENTAL 45<br />

Consi<strong>de</strong>rações Sobre as Políticas <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> No Brasil 45<br />

EIXO II – PSICOLOGIA E POLÍTICAS PÚBLICAS DE<br />

SAÚDE MENTAL: A NECESSÁRIA MUDANÇA DE<br />

PERSPECTIVA 73<br />

História da Psicologia e sua Relação com as Políticas<br />

Públicas <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> / Saú<strong>de</strong> Mental 73<br />

A Inserção da Psicologia na Saú<strong>de</strong> Pública e na<br />

Reforma Psiquiátrica 78<br />

Teorias em Psicologia e Atenção à Saú<strong>de</strong> Mental 84<br />

As Práticas das (<strong>os</strong>) Psicólogas(<strong>os</strong>) n<strong>os</strong> CAPS 86<br />

EIXO III: A ATUAÇÃO DA(O) PSICÓLOGA(O) NA<br />

POLÍTICA DO CAPS 93<br />

O Modo <strong>de</strong> Fazer: <strong>de</strong>sinstitucionalização da prática e<br />

intervenção na cultura 93<br />

A Clínica <strong>no</strong> Território e o Confronto com as Verda<strong>de</strong>s<br />

do Manicômio 99<br />

Trabalho em Re<strong>de</strong>: uma resp<strong>os</strong>ta sempre complexa e<br />

necessária à <strong>de</strong>sconstrução do manicômio 103<br />

EIXO IV – GESTÃO DO TRABALHO 109


Consi<strong>de</strong>rações sobre a Gestão d<strong>os</strong> Serviç<strong>os</strong> e Process<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong> Trabalho n<strong>os</strong> CAPS 109<br />

Os Desafi<strong>os</strong> da Gestão Cotidiana do Trabalho n<strong>os</strong><br />

CAPS 111<br />

Formação Profissional 117<br />

Consi<strong>de</strong>rações Finais 119<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 121<br />

ANEXO I 126<br />

16


Prefácio<br />

17


PREFÁCIO<br />

<strong>CREPOP</strong> – <strong>Centro</strong> <strong>de</strong> Referência Técnica em Psicologia e<br />

Políticas Públicas<br />

O <strong>Centro</strong> <strong>de</strong> Referência Técnica em Psicologia e Políticas<br />

Públicas consiste em uma ação do Sistema Conselh<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

Psicologia que dá continuida<strong>de</strong> ao projeto Banco Social <strong>de</strong><br />

Serviç<strong>os</strong> em Psicologia, referindo-se a uma <strong>no</strong>va etapa na<br />

construção da presença social da profissão <strong>de</strong> psicóloga(o) <strong>no</strong><br />

Brasil. Constituiu-se em uma maneira <strong>de</strong> observar a presença<br />

social da (o) psicóloga (o) e do movimento da Psicologia <strong>no</strong> seu<br />

Protagonismo Social.<br />

Nesse sentido, a i<strong>de</strong>ia fundamental é produzir informação<br />

qualificada para que o Sistema Conselh<strong>os</strong> p<strong>os</strong>sa implementar<br />

<strong>no</strong>vas prop<strong>os</strong>tas <strong>de</strong> articulação política visando maior reflexão<br />

e elaboração <strong>de</strong> políticas públicas que valorizem o cidadão<br />

enquanto sujeito <strong>de</strong> direit<strong>os</strong>, além <strong>de</strong> orientar a categoria sobre<br />

<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> étic<strong>os</strong> e <strong>de</strong>mocrátic<strong>os</strong> para cada política pública.<br />

Dessa forma, o objetivo central do Crepop se constituiu para<br />

garantir que esse compromisso social seja ampliado <strong>no</strong> aspecto<br />

da participação das(<strong>os</strong>) psicólogas(<strong>os</strong>) nas políticas públicas.<br />

Dentre as metas do Crepop estão, também, a ampliação da<br />

atuação da(o) psicóloga(o) na esfera pública, contribuindo para<br />

a expansão da Psicologia na socieda<strong>de</strong> e para a promoção d<strong>os</strong><br />

Direit<strong>os</strong> Human<strong>os</strong>, bem como a sistematização e disseminação<br />

do conhecimento da Psicologia e suas práticas nas políticas<br />

públicas, oferecendo referências para atuação profissional<br />

nesse campo.<br />

Cabe também ao Crepop i<strong>de</strong>ntificar oportunida<strong>de</strong>s<br />

estratégicas <strong>de</strong> participação da Psicologia nas políticas públicas,<br />

além <strong>de</strong> promover a interlocução da Psicologia com espaç<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong> formulação, gestão e execução em políticas públicas.<br />

Objetivo e Campo <strong>de</strong> Atuação<br />

O conjunto <strong>de</strong> ações em pesquisa <strong>de</strong>senvolvidas pelo Sistema<br />

Conselh<strong>os</strong> <strong>de</strong> Psicologia, por meio do Crepop, está organizado<br />

a partir da diretriz Investigação Permanente em Psicologia e<br />

19


Políticas Públicas, que consiste em pesquisar nacionalmente<br />

o fazer das(<strong>os</strong>) psicólogas(<strong>os</strong>), diante das especificida<strong>de</strong>s<br />

regionais.<br />

A prop<strong>os</strong>ta <strong>de</strong> investigar a atuação <strong>de</strong> psicólogas(<strong>os</strong>) em<br />

políticas públicas específicas visa apreen<strong>de</strong>r o núcleo da prática<br />

profissional da(o) psicóloga(o), consi<strong>de</strong>rando áreas distintas<br />

nas Políticas Públicas. Todas as áreas são eleitas a partir <strong>de</strong><br />

critéri<strong>os</strong> como: tradição na Psicologia; abrangência territorial;<br />

existência <strong>de</strong> marc<strong>os</strong> lógic<strong>os</strong> e legais e o caráter social ou<br />

emergencial d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> prestad<strong>os</strong>.<br />

A eleição do CAPS como área <strong>de</strong> investigação da atuação<br />

profissional <strong>de</strong> Psicólogas(<strong>os</strong>) surgiu a partir <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>manda<br />

da categoria, observada <strong>no</strong> V Congresso Nacional <strong>de</strong><br />

Psicologia-CNP, realizado em 2004. Esse tema emergiu junto<br />

a tant<strong>os</strong> outr<strong>os</strong> que apontavam para o Sistema Conselh<strong>os</strong> a<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma maior qualificação e orientação para a<br />

prática n<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> públic<strong>os</strong>.<br />

Para tratar <strong>de</strong> tema tão caro para a Psicologia, a comissão <strong>de</strong><br />

elaboração <strong>de</strong>ssa referência e com intuito orientar o texto <strong>de</strong>sta<br />

referência, <strong>de</strong>cifiu por apresentar a seguir a <strong>de</strong>finição do Serviço<br />

<strong>no</strong> <strong>Centro</strong> <strong>de</strong> Atenção Psic<strong>os</strong>social-CAPS, suas estruturas, a<br />

re<strong>de</strong> <strong>de</strong> atendimento para introduzir conceit<strong>os</strong> e contexto sobre<br />

<strong>os</strong> quais esta referência tratará, fomentanto assim o imaginário<br />

e o interesse do leitor.<br />

A Pesquisa do Crepop<br />

A metodologia <strong>de</strong> pesquisa do Crepop se divi<strong>de</strong> em três<br />

circuit<strong>os</strong>: o primeiro é o Levantamento <strong>de</strong> Campo com o objetivo<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>limitar o campo <strong>de</strong> investigação; o segundo trata da<br />

Investigação da Prática com objetivo <strong>de</strong> aplicar, em tod<strong>os</strong> <strong>os</strong><br />

Regionais, <strong>os</strong> instrument<strong>os</strong> <strong>de</strong>finid<strong>os</strong> como necessári<strong>os</strong> para a<br />

investigação nacional; e o terceiro a Produção <strong>de</strong> Referência<br />

consiste <strong>no</strong> processo <strong>de</strong> elaboração <strong>de</strong> referências técnicas,<br />

específicas para cada área investigada.<br />

O processo investigativo da Re<strong>de</strong> Crepop implica na<br />

construção e atualização <strong>de</strong> um banco <strong>de</strong> dad<strong>os</strong> para comportar<br />

20


informações referenciadas, inclusive geograficamente, sobre<br />

profissionais <strong>de</strong> Psicologia, legislações, document<strong>os</strong>, programas<br />

e entida<strong>de</strong>s que <strong>de</strong>senvolvem ações <strong>no</strong> campo das Políticas<br />

Públicas. Faz parte da metodologia a participação voluntária,<br />

tanto na etapa d<strong>os</strong> questionári<strong>os</strong> quanto na etapa d<strong>os</strong> grup<strong>os</strong>.<br />

Processo <strong>de</strong> elaboração <strong>de</strong> Referência Técnica<br />

Os Document<strong>os</strong> <strong>de</strong> Referência, ou Referências Técnicas,<br />

são recurs<strong>os</strong> que o Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia oferece<br />

às (a<strong>os</strong>) psicólogas (<strong>os</strong>) que atuam <strong>no</strong> âmbito das políticas<br />

públicas, como instrumento para qualificação e orientação <strong>de</strong><br />

sua prática profissional.<br />

Sua redação é elaborada por uma Comissão Ad-hoc<br />

comp<strong>os</strong>ta por um grupo <strong>de</strong> especialistas reconhecid<strong>os</strong> por suas<br />

qualificações técnicas e científicas, por um conselheiro do CFP<br />

mais um conselheiro do Comitê Consultivo e um Técnico do<br />

Crepop. O convite a<strong>os</strong> especialistas é feito pelo CFP e não<br />

implica em remuneração, sobretudo, porque muit<strong>os</strong> <strong>de</strong>sses<br />

são profissionais que já vinham trabalhando na organização<br />

daquela política pública específica, e recebem o convite como<br />

uma oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> intervirem na organização da sua área <strong>de</strong><br />

atuação e pesquisa.<br />

Nesta perspectiva, espera-se que esse processo <strong>de</strong><br />

elaboração <strong>de</strong> referências técnicas reflita a realida<strong>de</strong> da prática<br />

profissional e permita também que o trabalho que vem sendo<br />

<strong>de</strong>senvolvido <strong>de</strong> modo pioneiro por muitas (<strong>os</strong>) psicólogas (<strong>os</strong>)<br />

p<strong>os</strong>sa ser compartilhado, criticado e aprimorado, para uma<br />

maior qualificação da prática psicológica <strong>no</strong> âmbito das Políticas<br />

Públicas. (CFP, 2012)<br />

Para construir as Referências Técnicas para atuação <strong>no</strong><br />

CAPS, foi formada uma Comissão em 2009, comp<strong>os</strong>ta por<br />

quatro especialistas que voluntariamente buscaram qualificar a<br />

discussão sobre atuação das (<strong>os</strong>) psicólogas (<strong>os</strong>) <strong>no</strong> campo da<br />

saú<strong>de</strong> mental.<br />

Para elaborar o documento esse grupo precisou, a partir<br />

das análises d<strong>os</strong> dad<strong>os</strong> e resultad<strong>os</strong> da pesquisa, que<br />

apresentavam a participação <strong>de</strong> psicólogas (<strong>os</strong>) atuando nas<br />

21


diferentes modalida<strong>de</strong>s d<strong>os</strong> CAPS, fazer uma <strong>de</strong>limitação na<br />

abordagem da referencia técnica. A Comissão <strong>de</strong> especialistas<br />

do Documento <strong>de</strong> Referência sobre CAPS reconheceu as<br />

diferentes modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> CAPS, suas especificida<strong>de</strong>s e, ao<br />

mesmo tempo, sua organização e funcionamento a partir <strong>de</strong><br />

princípi<strong>os</strong> comuns.<br />

Diante disso, este documento não preten<strong>de</strong> abordar aspect<strong>os</strong><br />

específic<strong>os</strong> a atuação em cada modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> CAPS. A escolha<br />

feita durante o processo <strong>de</strong> elaboração do documento foi tomar<br />

como referência a atuação n<strong>os</strong> CAPS I, II e III. A comissão<br />

enten<strong>de</strong> que essa referência também contribuirá com o trabalho<br />

em outr<strong>os</strong> tip<strong>os</strong> <strong>de</strong> CAPS. Ao mesmo tempo, reconhece que a<br />

atuação da (o) psicóloga (o) <strong>no</strong> CAPSi e <strong>no</strong> CAPS ad requer<br />

referências que respondam a<strong>os</strong> <strong>de</strong>safi<strong>os</strong> específic<strong>os</strong> das<br />

<strong>de</strong>mandas neles atendidas.<br />

Vale <strong>de</strong>stacar que o Sistema Conselh<strong>os</strong> <strong>de</strong> Psicologia, por<br />

meio do Crepop, p<strong>os</strong>sui o compromisso <strong>de</strong> também referenciar<br />

a prática profissional <strong>de</strong> psicólogas (<strong>os</strong>) nas políticas públicas<br />

sobre Álcool e outras Drogas.<br />

O Processo <strong>de</strong> Consulta Pública<br />

A Consulta Pública é um sistema criado e utilizado em várias<br />

instâncias, inclusive governamentais, com o objetivo <strong>de</strong> auxiliar<br />

na elaboração e coleta <strong>de</strong> opiniões da socieda<strong>de</strong> sobre temas<br />

<strong>de</strong> importância. Esse sistema permite intensificar a articulação<br />

entre a representativida<strong>de</strong> e a socieda<strong>de</strong>, permitindo que esta<br />

participe da formulação e <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> politicas públicas. O<br />

sistema <strong>de</strong> consulta pública permite ampliar a discussão da<br />

coisa pública, coletando <strong>de</strong> forma fácil, ágil e com baixo custo<br />

as opiniões da socieda<strong>de</strong>.<br />

Para o Sistema Conselh<strong>os</strong> <strong>de</strong> Psicologia/ Re<strong>de</strong> Crepop, a<br />

ferramenta <strong>de</strong> consulta pública abriu a p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma<br />

ampla discussão sobre a atuação da (o) psicóloga (o) <strong>no</strong><br />

CAPS, permitindo a participação e contribuição <strong>de</strong> setores<br />

especializad<strong>os</strong>, da socieda<strong>de</strong> em geral e, sobretudo, <strong>de</strong> toda<br />

a categoria na construção sobre esse fazer da (o) psicóloga<br />

22


(o). Assim, o processo <strong>de</strong> elaboração do documento torna-se<br />

<strong>de</strong>mocrático e transparente.<br />

Com relação ao documento <strong>de</strong> referências técnicas para<br />

atuação <strong>de</strong> psicóloga (o) <strong>no</strong> CAPS, a consulta pública foi<br />

realizada <strong>no</strong> período <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> abril a 26 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 2012 e<br />

contou com a participação <strong>de</strong> 338 psicólogas (<strong>os</strong>) e gestores<br />

que tiveram acesso ao documento, tendo o texto em consulta<br />

recebido, ao todo, 17 contribuições. Junto a esse processo foi<br />

realizado um <strong>de</strong>bate on-line, <strong>no</strong> dia 23/05/12, sobre o mesmo<br />

tema com a participação <strong>de</strong> 2005 profissionais, gestores,<br />

professores e alun<strong>os</strong> <strong>de</strong> Psicologia.<br />

23


INTRODUÇÃO


INTRODUÇÃO<br />

Para apresentar este tema tão caro para a Psicologia, a<br />

comissão <strong>de</strong> elaboração <strong>de</strong>ssa referência, com intuito <strong>de</strong><br />

orientar o texto, optou por construir uma introdução com a<br />

<strong>de</strong>finição do Serviço <strong>no</strong> <strong>Centro</strong> <strong>de</strong> Atenção Psic<strong>os</strong>social-CAPS,<br />

sua estrutura e a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> atendimento, para <strong>de</strong>pois introduzir<br />

conceit<strong>os</strong> importantes, alem do contexto sobre <strong>os</strong> quais esta<br />

referência tratará.<br />

Os Centr<strong>os</strong>/Núcle<strong>os</strong> <strong>de</strong> Atenção Psic<strong>os</strong>social (CAPS/NAPS)<br />

são serviç<strong>os</strong> da re<strong>de</strong> pública <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> que visam, como parte <strong>de</strong><br />

uma re<strong>de</strong> comunitária, à substituição d<strong>os</strong> h<strong>os</strong>pitais psiquiátric<strong>os</strong><br />

- antig<strong>os</strong> h<strong>os</strong>píci<strong>os</strong> ou manicômi<strong>os</strong> - e <strong>de</strong> seus métod<strong>os</strong> para<br />

cuidar <strong>de</strong> transtorn<strong>os</strong> mentais. Foram instituíd<strong>os</strong> por meio da<br />

Portaria/SNAS Nº 224 - 29 <strong>de</strong> Janeiro <strong>de</strong> 1992 (BRASIL, 2001).<br />

A respeito da constituição do primeiro CAPS <strong>no</strong> Brasil, afirma<br />

Goldberg: “A expectativa d<strong>os</strong> profissionais <strong>de</strong>ssa instituição<br />

era oferecer um cuidado personalizado a<strong>os</strong> pacientes, com a<br />

complexida<strong>de</strong> que cada caso requer, por períod<strong>os</strong> tão long<strong>os</strong><br />

quanto o tipo da evolução <strong>de</strong> sua doença exigisse e sem afastál<strong>os</strong><br />

da família e da comunida<strong>de</strong>” (GOLDBERG, 1998, p.12).<br />

Assim, o CAPS é serviço estratégico na concretização da atual<br />

política <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental do Brasil, que preten<strong>de</strong> oferecer uma<br />

re<strong>de</strong> <strong>de</strong> serviç<strong>os</strong> substitutiva a<strong>os</strong> h<strong>os</strong>pitais psiquiátric<strong>os</strong>, capaz<br />

<strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r às necessida<strong>de</strong>s das pessoas com sofrimento<br />

psíquico respeitando sua cidadania e o cuidado em liberda<strong>de</strong>.<br />

No contexto da Reforma Psiquiátrica, <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> substitutiv<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong>vem ter a missão <strong>de</strong> superar o paradigma manicomial,<br />

direcionad<strong>os</strong> por <strong>no</strong>vas bases e valores étic<strong>os</strong> que venham a<br />

produzir uma <strong>no</strong>va forma <strong>de</strong> convivência solidária e inclusiva.<br />

Os CAPS têm se constituído como disp<strong>os</strong>itiv<strong>os</strong> que buscam<br />

tornarem-se substitutiv<strong>os</strong> às internações psiquiátricas,<br />

oferecendo, além da atenção à crise, um espaço <strong>de</strong> convivência<br />

e a criação <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> relações que se alarguem para além d<strong>os</strong><br />

locais das instituições, atingindo o território da vida cotidiana<br />

d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>.<br />

Atualmente, a Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental é comp<strong>os</strong>ta por<br />

27


um conjunto <strong>de</strong> equipament<strong>os</strong> e serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> atendimento<br />

integral e humanizado, conforme <strong>de</strong>scrito a seguir:<br />

<strong>Centro</strong> <strong>de</strong> Atenção Psic<strong>os</strong>social – CAPS: São instituições<br />

<strong>de</strong>stinadas a acolher pessoas com sofrimento psíquico grave<br />

e persistente, estimulando sua integração social e familiar,<br />

apoiando-<strong>os</strong> em suas iniciativas <strong>de</strong> busca da auto<strong>no</strong>mia.<br />

Apresenta como característica principal a busca da integração<br />

d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> a um ambiente social e cultural concreto, <strong>de</strong>signado<br />

como seu território, o espaço da cida<strong>de</strong> on<strong>de</strong> se <strong>de</strong>senvolve a vida<br />

cotidiana <strong>de</strong> usuári<strong>os</strong> e familiares, promovendo sua reabilitação<br />

psic<strong>os</strong>social. Tem como preceito fundamental ajudar o usuário a<br />

recuperar <strong>os</strong> espaç<strong>os</strong> não protegid<strong>os</strong>, mas socialmente passíveis<br />

à produção <strong>de</strong> sentid<strong>os</strong> <strong>no</strong>v<strong>os</strong>, substituindo as relações tutelares<br />

pelas relações contratuais, especialmente em aspect<strong>os</strong> relativ<strong>os</strong><br />

à moradia, ao trabalho, à família e à criativida<strong>de</strong>.<br />

A atual política prevê a implantação <strong>de</strong> diferentes tip<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

CAPS:<br />

• CAPS I – Serviço <strong>de</strong> atenção à saú<strong>de</strong> mental em municípi<strong>os</strong> com<br />

população <strong>de</strong> 20 mil até 70 mil habitantes. Oferece atendimento<br />

diário <strong>de</strong> 2ª a 6ª feira em pelo men<strong>os</strong> um período/dia.<br />

• CAPS II – Serviço <strong>de</strong> atenção à saú<strong>de</strong> mental em municípi<strong>os</strong> com<br />

população <strong>de</strong> 70 mil a 200 mil habitantes. Oferece atendimento<br />

diário <strong>de</strong> 2ª a 6ª feira em dois períod<strong>os</strong>/dia.<br />

• CAPS III – Serviço <strong>de</strong> atenção à saú<strong>de</strong> mental em municípi<strong>os</strong> com<br />

população acima <strong>de</strong> 200 mil habitantes. Oferece atendimento<br />

em período integral/24h.<br />

• CAPS ad – Serviço especializado para usuári<strong>os</strong> <strong>de</strong> álcool e<br />

outras drogas em municípi<strong>os</strong> <strong>de</strong> 70 mil a 200 mil habitantes.<br />

• CAPS ad III – Serviço especializado para usuári<strong>os</strong> <strong>de</strong> álcool e<br />

outras drogas em municípi<strong>os</strong> com população acima <strong>de</strong> 200 mil<br />

1 - Para conhecer toda metodologia <strong>de</strong> elaboração d<strong>os</strong> document<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

referências técnicas do Sistema Conselh<strong>os</strong>/Re<strong>de</strong> Crepop, ver Documento <strong>de</strong><br />

Metodologia do Crepop 2011, in http://crepop.cfp.org.br<br />

2 - Ver http://crepop.cfp.org.br<br />

28


habitantes, por período integral/24h.<br />

• CAPS i - Serviço especializado para crianças, adolescentes e<br />

jovens (até 25 an<strong>os</strong>) em municípi<strong>os</strong> com população acima <strong>de</strong><br />

200 mil habitantes.<br />

Segundo dad<strong>os</strong> atualizad<strong>os</strong> do Ministério da Saú<strong>de</strong>, existem<br />

hoje <strong>no</strong> Brasil 822 CAPS I; 431 CAPS II; 63 CAPS III; 272<br />

CAPS ad e 149 CAPSi e 5 CAPS ad III perfazendo um total <strong>de</strong><br />

1742 serviç<strong>os</strong>. (Saú<strong>de</strong> Mental em dad<strong>os</strong> 10 - BRASIL, 2012)<br />

Serviç<strong>os</strong> Resi<strong>de</strong>nciais Terapêutic<strong>os</strong> – SRT: São casas<br />

localizadas <strong>no</strong> espaço urba<strong>no</strong>, constituídas para respon<strong>de</strong>r às<br />

necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> moradia <strong>de</strong> pessoas com sofrimento psíquico<br />

graves, egressas <strong>de</strong> h<strong>os</strong>pitais psiquiátric<strong>os</strong> ou h<strong>os</strong>pitais <strong>de</strong><br />

custódia e tratamento psiquiátrico, que per<strong>de</strong>ram <strong>os</strong> víncul<strong>os</strong><br />

familiares e sociais; moradores <strong>de</strong> rua com transtorn<strong>os</strong><br />

mentais sever<strong>os</strong>, quando inserid<strong>os</strong> em projet<strong>os</strong> terapêutic<strong>os</strong><br />

acompanhad<strong>os</strong> n<strong>os</strong> CAPS. São 625 casas implantadas<br />

<strong>no</strong> Brasil, com 3.470 moradores em 2011. (BRASIL, 2012)<br />

Programa <strong>de</strong> Volta para Casa – PVC: Este programa foi<br />

instituído pela Lei Fe<strong>de</strong>ral 10708 <strong>de</strong> 31 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 2003, e<br />

tem por objetivo garantir a assistência, o acompanhamento e a<br />

integração social, fora da unida<strong>de</strong> h<strong>os</strong>pitalar, <strong>de</strong> pessoas com<br />

sofrimento psíquico, com história <strong>de</strong> longa internação psiquiátrica<br />

e também n<strong>os</strong> h<strong>os</strong>pitais <strong>de</strong> custódia e tratamento (02 an<strong>os</strong> ou<br />

mais <strong>de</strong> internação ininterrupt<strong>os</strong>). É parte integrante <strong>de</strong>ste<br />

Programa o auxílio-reabilitação, pago ao próprio beneficiário<br />

durante um a<strong>no</strong>, po<strong>de</strong>ndo ser re<strong>no</strong>vado, caso necessário. São<br />

3.961 beneficiári<strong>os</strong> do PVC <strong>no</strong> país em 2011. (BRASIL, 2012)<br />

Serviço H<strong>os</strong>pitalar <strong>de</strong> Referência para atenção a pessoas<br />

com sofrimento ou transtor<strong>no</strong> mental e com necessida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>correntes do uso <strong>de</strong> álcool, crack e outras<br />

29


drogas: São leit<strong>os</strong> <strong>de</strong> retaguarda em h<strong>os</strong>pital geral com<br />

metas <strong>de</strong> implantação por todo o Brasil. (BRASIL, 2012).<br />

Centr<strong>os</strong> <strong>de</strong> convivência: Os Centr<strong>os</strong> <strong>de</strong> Convivência são<br />

estratégic<strong>os</strong> para a inclusão social das pessoas com transtorn<strong>os</strong><br />

mentais e pessoas que fazem uso <strong>de</strong> crack, álcool e outras<br />

drogas, por meio da construção <strong>de</strong> espaç<strong>os</strong> <strong>de</strong> convívio e<br />

sustentação das diferenças na comunida<strong>de</strong> e em variad<strong>os</strong><br />

espaç<strong>os</strong> da cida<strong>de</strong>. (BRASIL, 2011). Estes disp<strong>os</strong>itiv<strong>os</strong><br />

ainda não recebem financiamento do Ministério da Saú<strong>de</strong>.<br />

Unida<strong>de</strong> Básica <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>: A Unida<strong>de</strong> Básica <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong><br />

como ponto <strong>de</strong> atenção da Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Atenção Psic<strong>os</strong>social tem<br />

a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver ações <strong>de</strong> promoção <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> mental, prevenção e cuidado d<strong>os</strong> transtorn<strong>os</strong> mentais,<br />

ações <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> dan<strong>os</strong> e cuidado para pessoas com<br />

necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>correntes do uso <strong>de</strong> crack, álcool e outras<br />

drogas, compartilhadas, sempre que necessário, com <strong>os</strong> <strong>de</strong>mais<br />

pont<strong>os</strong> da re<strong>de</strong>. As ações da Estratégia <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> da Família<br />

(ESF) e Núcle<strong>os</strong> <strong>de</strong> Apoio à Saú<strong>de</strong> da Família (NASF) estão<br />

referenciadas nas Unida<strong>de</strong>s Básicas <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>. (BRASIL, 2011)<br />

Consultório na Rua: Equipe constituída por profissionais<br />

que atuam <strong>de</strong> forma itinerante, ofertando ações e cuidad<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> para a população em situação <strong>de</strong> rua, consi<strong>de</strong>rando suas<br />

diferentes necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. No âmbito da Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Atenção<br />

Psic<strong>os</strong>social é responsabilida<strong>de</strong> da Equipe do Consultório na<br />

Rua ofertar cuidad<strong>os</strong> em saú<strong>de</strong> mental para (i) pessoas em<br />

situação <strong>de</strong> rua em geral; (ii) pessoas com transtorn<strong>os</strong> mentais<br />

e (iii) usuári<strong>os</strong> <strong>de</strong> crack, álcool e outras drogas, incluindo<br />

ações <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> dan<strong>os</strong>, em parceria com equipes <strong>de</strong><br />

outr<strong>os</strong> pont<strong>os</strong> <strong>de</strong> atenção da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. (BRASIL, 2011)<br />

Escola <strong>de</strong> Redutores <strong>de</strong> Dan<strong>os</strong> (ERD): As Escolas <strong>de</strong> Redutores<br />

<strong>de</strong> Dan<strong>os</strong> do SUS tem como objetivo a qualificação da re<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

serviç<strong>os</strong>, por meio da capacitação teórica e prática <strong>de</strong> segment<strong>os</strong><br />

profissionais e populacionais da comunida<strong>de</strong>, que atuarão na<br />

30


e<strong>de</strong> <strong>de</strong> atenção substitutiva em saú<strong>de</strong> mental, com a oferta <strong>de</strong><br />

ações <strong>de</strong> promoção, prevenção e cuidad<strong>os</strong> primári<strong>os</strong>, intra ou<br />

extramur<strong>os</strong>, que superem a abordagem única <strong>de</strong> abstinência.<br />

(BRASIL, 2010).<br />

Em 2005, o Ministério da Saú<strong>de</strong> apresentou como referência<br />

para constituição <strong>de</strong> re<strong>de</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental o seguinte <strong>de</strong>senho:<br />

Fonte: Extraído do Relatório 15 an<strong>os</strong> após Caracas - Ministério da Saú<strong>de</strong>, 2005, p. 26.<br />

Disponível em http://bvsms.sau<strong>de</strong>.gov.br/bvs/publicacoes/Relatorio15_an<strong>os</strong>_Caracas.pdf.<br />

Nesta perspectiva a implementação da re<strong>de</strong> substitutiva<br />

priorizou <strong>de</strong> forma estratégica a implantação e ampliação d<strong>os</strong><br />

CAPS, tornando acessível outro modo <strong>de</strong> cuidado, a redução<br />

<strong>de</strong> leit<strong>os</strong> em instituições psiquiátricas e consequentemente a<br />

construção <strong>de</strong> uma <strong>no</strong>va cultura assistencial, dando visibilida<strong>de</strong><br />

à questão da saú<strong>de</strong> mental. É importante salientar que <strong>no</strong><br />

processo <strong>de</strong> implantação da reforma psiquiátrica até o a<strong>no</strong><br />

<strong>de</strong> 2010 haviam sido fechad<strong>os</strong> 32.735 leit<strong>os</strong> em H<strong>os</strong>pitais<br />

Psiquiátric<strong>os</strong> <strong>no</strong> Brasil. (BRASIL, 2011)<br />

É pelo papel estratégico d<strong>os</strong> CAPS na re<strong>de</strong> substitutiva<br />

<strong>de</strong> cuidado em saú<strong>de</strong> mental que se justifica sua eleição para<br />

31


pesquisa e produção <strong>de</strong> referência pelo Crepop.<br />

Em Dezembro <strong>de</strong> 2011, o gover<strong>no</strong> brasileiro estabelece entre<br />

suas priorida<strong>de</strong>s na saú<strong>de</strong>, a Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Atenção Psic<strong>os</strong>social<br />

(RAPS) pela Portaria GM/MS nº 3.088/2011 –, preconiza o<br />

atendimento a pessoas com sofrimento ou transtor<strong>no</strong> mental e<br />

com necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>correntes do uso <strong>de</strong> crack, álcool e outras<br />

drogas. Essa portaria impacta diretamente a estrutura da Re<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> atendimento da Saú<strong>de</strong> Mental.<br />

A RAPS passam a serem formadas por sete componentes<br />

da Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a Atenção Básica , passando<br />

pela Atenção Psic<strong>os</strong>social Especializada, a Urgência e<br />

Emergêncian e a Atenção Resi<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> Caráter Transitório.<br />

As RAPS também são comp<strong>os</strong>tas pel<strong>os</strong> componentes da<br />

Atenção H<strong>os</strong>pitalar, Estratégias <strong>de</strong> Desinstitucionalização e a<br />

Reabilitação Psic<strong>os</strong>social.<br />

Resultad<strong>os</strong> da Pesquisa <strong>CREPOP</strong>/CFP<br />

A pesquisa sobre atuação <strong>de</strong> psicólogas(<strong>os</strong>) <strong>no</strong> CAPS<br />

foi realizada <strong>no</strong> a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 2007, entre <strong>os</strong> meses <strong>de</strong> setembro<br />

a <strong>no</strong>vembro, tendo sido realizada em duas etapas, uma<br />

etapa nacional, do tipo <strong>de</strong>scritiva, a partir <strong>de</strong> um instrumento<br />

online; e uma etapa qualitativa, realizada pelas unida<strong>de</strong>s<br />

locais do Crepop, localizadas n<strong>os</strong> Conselh<strong>os</strong> Regionais.<br />

Ressalta-se que, à época, o Sistema Conselh<strong>os</strong> contava<br />

com apenas 16 Crepop’s Regionais. Serão apresentad<strong>os</strong> a<br />

seguir alguns dad<strong>os</strong> relativ<strong>os</strong> à pesquisa realizada com as(<strong>os</strong>)<br />

psicólogas(<strong>os</strong>) que atuavam n<strong>os</strong> CAPS <strong>no</strong> a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 2007.<br />

Etapa Descritiva – Questionário online:<br />

Os resultad<strong>os</strong> da pesquisa <strong>de</strong>scritiva revelaram um conjunto<br />

<strong>de</strong> 382 psicólogas(<strong>os</strong>) respon<strong>de</strong>ntes. Sobre <strong>os</strong> aspect<strong>os</strong><br />

socio<strong>de</strong>mográfico a pesquisa apresentou o seguinte perfil,<br />

82,7% <strong>de</strong> mulheres; 39,1% com até 30 an<strong>os</strong> <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>; 37,2%<br />

encontram-se na região Su<strong>de</strong>ste. Sobre a formação, a pesquisa<br />

i<strong>de</strong>ntificou que 71,1% têm pós-graduação, sendo 81,3%<br />

32


especialização Latu-sensu e 59% é da área da Psicologia<br />

Clínica; 16,1% exercem ativida<strong>de</strong> docente; 30,8% realizaram<br />

pesquisa científica sobre o tema.<br />

Sobre a atuação profissional foi i<strong>de</strong>ntificado que as/<br />

<strong>os</strong> respon<strong>de</strong>ntes atuavam em diferentes modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

atendimento n<strong>os</strong> CAPS. Destes, 43,2% trabalhavam em CAPS<br />

I, 32,5% em CAPS II; 13,4% em CAPS ad; 7,9% em CAPSi<br />

e 3,1% em CAPS III. Quanto ao tempo <strong>de</strong> atuação, 38,1%<br />

atuavam <strong>no</strong> CAPS há men<strong>os</strong> <strong>de</strong> dois (2) an<strong>os</strong>; 85,3% trabalham<br />

em Organizações Públicas; 39,4% têm vínculo <strong>de</strong> trabalho<br />

regido por Estatuto <strong>de</strong> Servidores Públic<strong>os</strong>. Destaca-se como<br />

dado importante para a citada pesquisa, a i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong><br />

que apenas 33,1% do total, embasam seu trabalho na Política<br />

Nacional <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental. Ainda sobre <strong>de</strong>senvolvimento<br />

do trabalho <strong>no</strong> CAPS, 35,5% <strong>de</strong>senvolvem ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

assistência/ tratamento Psicológico; 88% trabalham em<br />

conjunto com equipe multiprofissional reduzida; 52,7% utilizam<br />

frequentemente entrevistas como recurso <strong>de</strong> trabalho;<br />

Ainda na pesquisa <strong>de</strong>scritiva havia quatro questões abertas<br />

acerca das questões do dia-a-dia das(<strong>os</strong>) psicólogas(<strong>os</strong>). A<br />

primeira questão pedia “<strong>de</strong>screva em <strong>de</strong>talhes o que você faz<br />

em uma semana típica <strong>de</strong> trabalho, com ênfase nas ativida<strong>de</strong>s<br />

relacionadas ao campo do CAPS”. A segunda, “Quais são <strong>os</strong><br />

<strong>de</strong>safi<strong>os</strong> específic<strong>os</strong> que você enfrenta <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong> <strong>de</strong> seu<br />

trabalho e como você lida com estes?”. A terceira, “Quais<br />

<strong>no</strong>vas práticas você e/ou seus colegas têm <strong>de</strong>senvolvido ou<br />

conhecem que estão produzindo bons resultad<strong>os</strong> que po<strong>de</strong>m<br />

ser consi<strong>de</strong>radas uma i<strong>no</strong>vação neste campo. Descreva cada<br />

uma <strong>de</strong>ssas <strong>no</strong>vas práticas e indique on<strong>de</strong> po<strong>de</strong>m<strong>os</strong> encontrála<br />

(e-mail ou outra forma <strong>de</strong> contato)”. Por fim, “Sugestões e<br />

comentári<strong>os</strong> adicionais”.<br />

Ao <strong>de</strong>screverem o que fazem <strong>no</strong> dia-a-dia, primeira questão,<br />

as(<strong>os</strong>) psicólogas(<strong>os</strong>) caracterizaram a população atendida<br />

e as ações específicas que realizam sozinh<strong>os</strong> e em equipe<br />

multidisciplinar. Dentre as tarefas cotidianas <strong>de</strong>stas(es)<br />

profissionais, são realizad<strong>os</strong> atendiment<strong>os</strong> individual ou grupal.<br />

Atuam ainda em situações <strong>de</strong> crise, em caráter <strong>de</strong> urgência,<br />

33


aten<strong>de</strong>ndo usuárias/<strong>os</strong> n<strong>os</strong> CAPS, em h<strong>os</strong>pitais ou indo às<br />

suas casas. Alguns profissionais também atuam produzindo<br />

reflexões e conhecimento sobre o trabalho em Psicologia<br />

através da publicação <strong>de</strong> artig<strong>os</strong> ou pesquisas, da divulgação<br />

do trabalho <strong>de</strong>senvolvido por variad<strong>os</strong> mei<strong>os</strong> <strong>de</strong> comunicação<br />

(jornais locais, rádi<strong>os</strong> comunitárias, entre outr<strong>os</strong>).<br />

A análise d<strong>os</strong> <strong>de</strong>safi<strong>os</strong>, segunda questão, foi realizada<br />

i<strong>de</strong>ntificando <strong>os</strong> principais temas presentes nas resp<strong>os</strong>tas.<br />

Quase totalida<strong>de</strong> d<strong>os</strong> registr<strong>os</strong> feit<strong>os</strong> pelas/<strong>os</strong> participantes<br />

da pesquisa, <strong>os</strong> <strong>de</strong>safi<strong>os</strong> estão intimamente associad<strong>os</strong> às<br />

dificulda<strong>de</strong>s vividas <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong>. Foram apontadas questões<br />

políticas e administrativas, que se fizeram presentes quando<br />

falaram sobre: implementação das políticas públicas;<br />

especificida<strong>de</strong>s locais; burocracia; a inexistência e implantação<br />

<strong>de</strong> re<strong>de</strong> <strong>de</strong> assistência integrada a esses serviç<strong>os</strong> específic<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong> atenção em saú<strong>de</strong> mental e mod<strong>os</strong> <strong>de</strong> lidar com <strong>os</strong> <strong>de</strong>safi<strong>os</strong><br />

polític<strong>os</strong>/administrativ<strong>os</strong>. Houve relat<strong>os</strong> que se remeteram<br />

mais diretamente à instituição/local <strong>de</strong> trabalho em que as(<strong>os</strong>)<br />

psicólogas(<strong>os</strong>) atuavam, como espaço físico e recurs<strong>os</strong><br />

materiais; <strong>de</strong>manda e recurs<strong>os</strong> human<strong>os</strong>; as condições <strong>de</strong><br />

trabalho; e mod<strong>os</strong> <strong>de</strong> lidar com <strong>os</strong> <strong>de</strong>safi<strong>os</strong> relativ<strong>os</strong> à instituição/<br />

local <strong>de</strong> trabalho.<br />

Os relat<strong>os</strong> sobre a formação e a prática profissional<br />

foram sobre: capacitação: formação e atualização; exercício<br />

profissional; saú<strong>de</strong> do trabalhador; e reconhecimento da<br />

profissão e/ou da(o) profissional. Sobre <strong>os</strong> mod<strong>os</strong> <strong>de</strong> lidar com<br />

<strong>os</strong> <strong>de</strong>safi<strong>os</strong> relativ<strong>os</strong> à formação e a prática profissional, uma<br />

das principais estratégias adotadas para lidar com <strong>os</strong> déficits<br />

da formação profissional em Psicologia e com a ausência <strong>de</strong><br />

capacitações n<strong>os</strong> locais <strong>de</strong> trabalho é a busca <strong>de</strong> curs<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

especialização, <strong>de</strong> pós-graduação, a organização <strong>de</strong> grup<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

estud<strong>os</strong> para que a equipe toda estu<strong>de</strong> e discuta <strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> do<br />

movimento antimanicomial e a luta para conseguir a supervisão<br />

3 - Informação verbal, são falas <strong>de</strong> psicólogas (<strong>os</strong>) e gestores atuante n<strong>os</strong> Centr<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong> Atenção Psic<strong>os</strong>social, coletadas n<strong>os</strong> grup<strong>os</strong> realizad<strong>os</strong> pel<strong>os</strong> Conselh<strong>os</strong><br />

Regionais, pesquisa qualitativa Crepop, <strong>de</strong> psicólogas (<strong>os</strong>) e gestores atuante<br />

n<strong>os</strong> Centr<strong>os</strong> <strong>de</strong> Atenção Psic<strong>os</strong>social.<br />

34


institucional. Já <strong>os</strong> relat<strong>os</strong> sobre a relação com <strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> são<br />

indicad<strong>os</strong> vári<strong>os</strong> <strong>de</strong>safi<strong>os</strong> relativ<strong>os</strong> ao trabalho <strong>de</strong>senvolvido<br />

com <strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> e seus familiares e a<strong>os</strong> mod<strong>os</strong> como estes<br />

se relacionam com as ativida<strong>de</strong>s prop<strong>os</strong>tas. Outro <strong>de</strong>safio<br />

muito presente nesta relação com o usuário é o <strong>de</strong> lidar com as<br />

dificulda<strong>de</strong>s socioeconômicas d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>, e com sua a<strong>de</strong>são<br />

às ativida<strong>de</strong>s oferecidas. Por fim, nesta segunda questão, foram<br />

relatad<strong>os</strong> <strong>os</strong> <strong>de</strong>safi<strong>os</strong> do trabalho com outr<strong>os</strong> profissionais. No<br />

CAPS o trabalho da(o) psicóloga(o) é realizado muitas vezes<br />

em conjunto com profissionais da equipe multiprofissional que<br />

compõe o CAPS e algumas vezes envolve o trabalho com<br />

profissionais <strong>de</strong> outr<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> e <strong>de</strong> outras áreas.<br />

As resp<strong>os</strong>tas à questão três da pesquisa apresentavam três<br />

eix<strong>os</strong> argumentativ<strong>os</strong> principais: “conheço <strong>no</strong>vas práticas”; “não<br />

conheço <strong>no</strong>vas práticas”; e “não há i<strong>no</strong>vação”. Destaca-se que<br />

as resp<strong>os</strong>tas quanto a conhecer <strong>no</strong>vas práticas na maioria das<br />

vezes, refere-se às experiências da/o própria/o profissional que<br />

participou, praticamente não havendo referências a outras/<strong>os</strong>.<br />

Por fim, a questão quatro era um espaço aberto para<br />

comentári<strong>os</strong> e sugestões, <strong>os</strong> registr<strong>os</strong> feit<strong>os</strong> pelas/<strong>os</strong><br />

participantes foi p<strong>os</strong>sível i<strong>de</strong>ntificar que a maioria das<br />

resp<strong>os</strong>tas era relativa a sugestões dirigidas a diferentes<br />

interlocutores. Entre eles en<strong>de</strong>reçadas principalmente a<br />

esfera governamental/ gestores públic<strong>os</strong>; universida<strong>de</strong>s/<br />

faculda<strong>de</strong>s; e a outras/<strong>os</strong> profissionais da Psicologia que<br />

atuam em CAPS, que fogem ao alcance <strong>de</strong>sta pesquisa. As<br />

sugestões ao Sistema Conselh<strong>os</strong> <strong>de</strong> Psicologia/Crepop foram<br />

<strong>de</strong> <strong>no</strong>vas pesquisas que serão consi<strong>de</strong>radas p<strong>os</strong>teriormente.<br />

Etapa Qualitativa – Reuniões Específicas (RE) e Grup<strong>os</strong><br />

Fechad<strong>os</strong> (GF):<br />

As reuniões específicas e <strong>os</strong> grup<strong>os</strong> fechad<strong>os</strong> têm objetiv<strong>os</strong><br />

diferentes. As reuniões específicas são abertas à participação<br />

<strong>de</strong> profissionais que atuam n<strong>os</strong> CAPS, gestores, estudantes/<br />

estagiári<strong>os</strong>, além das (<strong>os</strong>) psicólogas (<strong>os</strong>), e buscam discutir<br />

a situação do campo pesquisado em <strong>de</strong>terminada região.<br />

35


Diferentemente, <strong>os</strong> grup<strong>os</strong> fechad<strong>os</strong> são comp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> apenas<br />

por profissionais da psicologia que estão trabalhando em<br />

CAPS e têm por objetivo promover a discussão <strong>de</strong> temas mais<br />

específic<strong>os</strong> à realização do trabalho psicológico neste campo.<br />

As Reuniões Específicas foram prop<strong>os</strong>tas pelo Crepop<br />

Nacional e organizadas localmente pel<strong>os</strong> CRPs. As reuniões<br />

foram orientadas a partir <strong>de</strong> roteir<strong>os</strong> previamente elaborad<strong>os</strong>. É<br />

importante ressaltar que alguns CRPs se m<strong>os</strong>traram cientes da<br />

diferença entre o que foi solicitado/orientado e o que foi p<strong>os</strong>sível<br />

realizar. Um d<strong>os</strong> aspect<strong>os</strong> apontado, por técnicas/<strong>os</strong> d<strong>os</strong> CRPs,<br />

foi a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> contatar <strong>os</strong> profissionais d<strong>os</strong> CAPS:<br />

Inicialmente, tentam<strong>os</strong> entrar em contato com a<br />

Coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental – COSAM, através<br />

da Secretaria <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>, mas numa ida ao prédio da<br />

Secretaria on<strong>de</strong> antes funcionava, soubem<strong>os</strong> que a<br />

COSAM não funcionava mais lá. Depois <strong>de</strong> um tempo,<br />

soubem<strong>os</strong> que foi transferida para o local on<strong>de</strong> funciona<br />

o Instituto <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental. (...) Quinze dias após,<br />

recebem<strong>os</strong> uma resp<strong>os</strong>ta com <strong>os</strong> contat<strong>os</strong> d<strong>os</strong> CAPS e<br />

solicitando que n<strong>os</strong> dirigíssem<strong>os</strong> diretamente à gerência<br />

do CAPS pedindo as informações sobre <strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong>.<br />

Neste meio tempo, a técnica já havia entrado em<br />

contato com o Adolescentro, por já conhecer o pessoal<br />

que lá trabalha, e com o COMPP, por ser perto <strong>de</strong> sua<br />

residência. (<strong>CREPOP</strong>/CFP, 2007) 3<br />

Os resultad<strong>os</strong> da pesquisa qualitativa i<strong>de</strong>ntificaram que a<br />

implantação d<strong>os</strong> CAPS ocorria <strong>de</strong> maneira distinta nas diferentes<br />

regiões do Brasil, apontando que <strong>os</strong> principais problemas<br />

eram relativ<strong>os</strong> à ausência <strong>de</strong> políticas locais (estaduais e<br />

municipais) e, consequentemente, <strong>de</strong> investiment<strong>os</strong> n<strong>os</strong> CAPS<br />

e n<strong>os</strong> equipament<strong>os</strong> da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental, visto que, foram<br />

registrad<strong>os</strong> relat<strong>os</strong> <strong>de</strong> que, em muit<strong>os</strong> locais, não existia uma<br />

re<strong>de</strong> <strong>de</strong> atenção à saú<strong>de</strong> mental ou, quando esta existia, não<br />

estava articulada a<strong>de</strong>quadamente.A análise qualitativa d<strong>os</strong> dad<strong>os</strong><br />

apontou também para questões <strong>de</strong> inconsistência técnica diante<br />

das prop<strong>os</strong>tas da Política Nacional <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental, como a<br />

permanência <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> atenção centrado na figura do<br />

36


médico; uma tensão entre uma abordagem psic<strong>os</strong>social e uma<br />

abordagem estritamente clínica; e que em alguns lugares, as<br />

ações <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental ainda estão restritas ao espaço do CAPS,<br />

assim, a forma como a política está estruturada acaba contribuindo<br />

para o “aprisionamento” das ações <strong>no</strong> interior da unida<strong>de</strong>.<br />

“CAPS <strong>de</strong> interior é CAPS tudo(..) eu acho que é a<br />

gran<strong>de</strong> barreira que vam<strong>os</strong> tentar ultrapassar, porque a<br />

história do psicólogo que tá fazendo só <strong>os</strong> grup<strong>os</strong>, isso tá<br />

relacionado à história das APACS. E <strong>no</strong> interior é muito<br />

complicado. A sobrevivência <strong>de</strong> CAPS é muito complexa”<br />

(...) “E outra coisa também é que <strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong> e<br />

profissionais precisam fazer o trabalho extra muro. E<br />

esse trabalho significa não estar ali fazendo as oficinas<br />

e não estar necessariamente gerando uma APAC na<br />

verda<strong>de</strong> fazem<strong>os</strong> enten<strong>de</strong>r que esse é o trabalho mais<br />

importante do CAPS.” (<strong>CREPOP</strong>/CFP, 2007)<br />

Sobre a prática profissional da(o) psicóloga(o), a análise<br />

d<strong>os</strong> dad<strong>os</strong> <strong>de</strong>monstrou que, em geral, aparecem dificulda<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> diversas or<strong>de</strong>ns, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a falta <strong>de</strong> profissionais, ausência <strong>de</strong><br />

supervisão, falta <strong>de</strong> formação continuada, além da dificulda<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> articular uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> referência na região para ampliar as<br />

p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cuidado com <strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>, para transformar o<br />

mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> atenção às pessoas com sofrimento psíquico e garantir<br />

<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> do SUS.<br />

N<strong>os</strong> relat<strong>os</strong> das reuniões foi evi<strong>de</strong>nciado que em muit<strong>os</strong> locais<br />

não existe uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> atenção à saú<strong>de</strong> mental ou esta não está<br />

articulada:<br />

Na maioria das cida<strong>de</strong>s/comunida<strong>de</strong>s não existem serviç<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong> reabilitação psic<strong>os</strong>social, com <strong>os</strong> quais as equipes d<strong>os</strong><br />

CAPS p<strong>os</strong>sam construir uma ação complementar; (...) O<br />

que existe em alguns locais são reuniões entre serviç<strong>os</strong><br />

da re<strong>de</strong> pública. Em geral setoriais, em pouc<strong>os</strong> cas<strong>os</strong><br />

observa-se ações intersetoriais, mas que não chegam a<br />

funcionar como re<strong>de</strong>; (<strong>CREPOP</strong>/CFP, 2007)<br />

Na ausência <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> articulada, quando há necessida<strong>de</strong><br />

37


<strong>de</strong> encaminhamento <strong>de</strong> algum usuário para outro tipo <strong>de</strong> serviço<br />

na área, uma estratégia utilizada para que isso ocorra se dá pelo<br />

conhecimento entre <strong>os</strong> profissionais das diferentes instituições:<br />

Não há re<strong>de</strong> <strong>de</strong> referência articulada; <strong>os</strong> trabalh<strong>os</strong> em<br />

re<strong>de</strong> geralmente têm mais a ver com relações mais<br />

próximas (pessoais) entre o profissional do CAPS com<br />

outr<strong>os</strong>, o que garante uma funcionalida<strong>de</strong> mínima da<br />

re<strong>de</strong>. A própria Coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental do Estado<br />

não estimula nem oferece direção para esse tipo <strong>de</strong><br />

trabalho, nem há relat<strong>os</strong> <strong>de</strong>ssa ativida<strong>de</strong> das secretarias<br />

municipais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. (<strong>CREPOP</strong>/CFP, 2007)<br />

Apareceram divers<strong>os</strong> problemas em relação ao espaço físico e<br />

à falta <strong>de</strong> infraestrutura:<br />

As unida<strong>de</strong>s representadas não p<strong>os</strong>suem uma estrutura<br />

física a<strong>de</strong>quada, há uma gran<strong>de</strong> dificulda<strong>de</strong> em aten<strong>de</strong>r<br />

a<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> <strong>de</strong>vido ao espaço (não apropriado), o que<br />

muitas vezes impe<strong>de</strong> <strong>de</strong> ser realizado um bom trabalho,<br />

inclusive n<strong>os</strong> trabalh<strong>os</strong> das oficinas. (<strong>CREPOP</strong>/CFP,<br />

2007)<br />

Em outra unida<strong>de</strong> o espaço físico do CAPS é compatível<br />

com a <strong>de</strong>manda, mas o que complica é que o ambulatório<br />

psiquiátrico funciona <strong>no</strong> mesmo lugar e em dias <strong>de</strong><br />

atendimento complica um pouco. (<strong>CREPOP</strong>/CFP, 2007)<br />

Muitas foram as queixas referentes à falta <strong>de</strong> recurs<strong>os</strong> materiais.<br />

Esses englobam <strong>de</strong>s<strong>de</strong> material <strong>de</strong> escritório, alimentação para <strong>os</strong><br />

usuári<strong>os</strong>, transporte para visitas domiciliares, até medicament<strong>os</strong>:<br />

Transporte para <strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> – entre as dificulda<strong>de</strong>s<br />

materiais trazidas pelo grupo <strong>de</strong>stacou-se a falta <strong>de</strong><br />

transporte para <strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>. Faltam carr<strong>os</strong> para realização<br />

das visitas e transportes coletiv<strong>os</strong> para ativida<strong>de</strong>s extramur<strong>os</strong><br />

realizadas pelo <strong>Caps</strong>. (<strong>CREPOP</strong>/CFP, 2007)<br />

Os Grup<strong>os</strong> Fechad<strong>os</strong> foram prop<strong>os</strong>t<strong>os</strong> buscando analisar as<br />

38


especificida<strong>de</strong>s do trabalho d<strong>os</strong> profissionais da Psicologia n<strong>os</strong><br />

CAPS, n<strong>os</strong> mod<strong>os</strong> <strong>de</strong> atuação e n<strong>os</strong> principais conflit<strong>os</strong> e dilemas<br />

vivid<strong>os</strong> <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong> da prática profissional.<br />

Os relat<strong>os</strong> indicam que <strong>de</strong> um modo geral as (<strong>os</strong>) psicólogas<br />

(<strong>os</strong>) <strong>de</strong>senvolvem uma multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tarefas <strong>no</strong> contexto do<br />

CAPS e que há <strong>de</strong>mandas tanto para ativida<strong>de</strong>s clínicas quanto<br />

psic<strong>os</strong>sociais, como indica o relato:<br />

Foi relatado, também, que, n<strong>os</strong> CAP’s <strong>os</strong>/as profissionais<br />

<strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong>senvolvem as seguintes ativida<strong>de</strong>s:<br />

triagem, coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> grupo operativo, atendimento<br />

e acompanhamento individual (como técnico <strong>de</strong><br />

referencia), encaminhamento para profissionais<br />

específic<strong>os</strong>, inclusive psicoterapeuta, atendimento à<br />

família, palestra para <strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> e família, tanto na<br />

própria instituição, CAPS, como nas comunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

origem d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>. (ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> caráter preventivo).<br />

Realizam também, reuniões técnicas (com a equipe <strong>de</strong><br />

trabalho para discussão <strong>de</strong> admissões, altas e situações<br />

diversas), reuniões clínicas (com todas as equipes, com<br />

estudo, discussão <strong>de</strong> cas<strong>os</strong>, informes e pont<strong>os</strong> <strong>de</strong> pauta),<br />

reuniões administrativas (abrange tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> funcionári<strong>os</strong><br />

a fim <strong>de</strong> tratar assunt<strong>os</strong> gerais), evolução <strong>de</strong> prontuári<strong>os</strong>,<br />

visitas institucionais para estabelecer parceria e re<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> apoio psic<strong>os</strong>social, visitas a residência d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>,<br />

elaboração <strong>de</strong> laud<strong>os</strong>, organização e elaboração <strong>de</strong><br />

event<strong>os</strong> comemorativ<strong>os</strong> com a participação d<strong>os</strong> técnic<strong>os</strong>,<br />

usuári<strong>os</strong> e familiares, atendimento em situação <strong>de</strong> crise<br />

e supervisão <strong>de</strong> estagiári<strong>os</strong>. Essas ativida<strong>de</strong>s são<br />

<strong>de</strong>senvolvidas tanto individualmente quanto em dupla<br />

ou em grup<strong>os</strong> com outr<strong>os</strong> profissionais. (<strong>CREPOP</strong>/CFP,<br />

2007)<br />

Um aspecto que aparece em vári<strong>os</strong> relat<strong>os</strong> é relativo à<br />

centralida<strong>de</strong> do trabalho em equipe e à importância da articulação<br />

d<strong>os</strong> divers<strong>os</strong> profissionais que compõem as equipes:<br />

Lá a gente não tem esse negócio <strong>de</strong> ‘é meu, é seu’, lá<br />

a gente tenta trabalhar como equipe. (<strong>CREPOP</strong>/CFP,<br />

2007)<br />

39


A atuação multiprofissional é freqüente e valorizada, mas<br />

há alguma insegurança quanto a ações intersetoriais,<br />

principalmente relacionadas a diagn<strong>os</strong>e. É comum, ainda<br />

iniciativas <strong>de</strong> planejamento conjunto das ações e <strong>de</strong><br />

supervisão técnica, além <strong>de</strong> estud<strong>os</strong> <strong>de</strong> caso. (<strong>CREPOP</strong>/<br />

CFP, 2007)<br />

Estam<strong>os</strong> apren<strong>de</strong>ndo a fazer Psicologia <strong>de</strong>ntro d<strong>os</strong><br />

serviç<strong>os</strong>, estam<strong>os</strong> apren<strong>de</strong>ndo a trabalhar em equipe,<br />

porque até então a n<strong>os</strong>sa prática profissional era muito<br />

mais aquela tradicional, em consultório, com hora<br />

marcada, com o seting terapêutico estabelecido. Para o<br />

CAPS nós vam<strong>os</strong> fazer as a<strong>de</strong>quações <strong>de</strong> acordo com a<br />

realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada oficina, levando-se em consi<strong>de</strong>ração<br />

a criativida<strong>de</strong> das pessoas, levando-se em consi<strong>de</strong>ração<br />

também o que está sendo trabalhado naquele momento.<br />

(<strong>CREPOP</strong>/CFP, 2007)<br />

O trabalho em grupo <strong>no</strong> contexto do CAPS também foi muito<br />

valorizado n<strong>os</strong> relat<strong>os</strong> e para alguns este trabalho é um facilitador<br />

da ressocialização:<br />

De acordo com <strong>os</strong> profissionais as potencialida<strong>de</strong>s e<br />

p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s da Psicologia n<strong>os</strong> CAPS tratam-se da<br />

realização <strong>de</strong> atendiment<strong>os</strong> que priorizem o trabalho<br />

em grupo, buscando através <strong>de</strong>stes atendiment<strong>os</strong> a<br />

ressocialização d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> e por meio das oficinas <strong>de</strong><br />

geração <strong>de</strong> renda e reinserção <strong>no</strong> trabalho. (<strong>CREPOP</strong>/<br />

CFP, 2007)<br />

Organização do Documento<br />

O documento <strong>de</strong> referencias técnicas para a prática <strong>de</strong><br />

psicólogas(<strong>os</strong>) <strong>no</strong> centro <strong>de</strong> atenção psic<strong>os</strong>social - CAPS, está<br />

dividido da seguinte forma:<br />

Eixo I – Dimensão Ético-Política das Políticas <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong><br />

Mental A prop<strong>os</strong>ta <strong>de</strong>ste eixo é discutir aspect<strong>os</strong> da evolução<br />

das políticas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e saú<strong>de</strong> mental <strong>no</strong> Brasil, como subsídio<br />

para uma melhor compreensão d<strong>os</strong> aspect<strong>os</strong> históric<strong>os</strong> que<br />

influenciaram a constituição do Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> e o<br />

processo <strong>de</strong> Reforma Psiquiátrica <strong>no</strong> Brasil. O eixo aborda<br />

40


a temática Reforma Psiquiátrica como um marco histórico e<br />

conceitual <strong>de</strong> transformação na saú<strong>de</strong> mental, <strong>de</strong>stacando a<br />

importância <strong>de</strong>ste movimento para essa reestruração das práticas<br />

<strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>no</strong> país.<br />

Eixo II – Psicologia e Políticas Públicas <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental:<br />

a necessária mudança <strong>de</strong> perspectiva<br />

O objetivo <strong>de</strong>ste eixo é buscar compreen<strong>de</strong>r a relação histórica<br />

da Psicologia com as Políticas Públicas <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>, especialmente<br />

<strong>no</strong> âmbito da Saú<strong>de</strong> Mental. Destaca-seDestacando a inserção<br />

da Psicologia na Saú<strong>de</strong> Pública pelo mote do movimento da<br />

Reforma Psiquiátrica, valorizando este como balizador para a<br />

relação da Psicologia e a Saú<strong>de</strong> Metal. O eixo aborda ainda quais<br />

as teorias em Psicologia e Atenção à Saú<strong>de</strong> Mental se relacionam<br />

com as práticas das (<strong>os</strong>) Psicólogas(<strong>os</strong>) n<strong>os</strong> CAPS.<br />

Eixo III – A Atuação da (o) Psicológica (o) na Política do<br />

CAPS<br />

Preten<strong>de</strong>-se neste eixo trazer à reflexão a atuação <strong>de</strong><br />

psicólogas(<strong>os</strong>) n<strong>os</strong> Centr<strong>os</strong> <strong>de</strong> Atenção Psic<strong>os</strong>social – CAPS,<br />

abordando o modo <strong>de</strong> fazer, a <strong>de</strong>sinstitucionalização da prática<br />

e intervenção na cultura, a criação <strong>de</strong> lugares <strong>de</strong> tratamento e<br />

convívio entre diferentes, <strong>de</strong> realização <strong>de</strong> trocas simbólicas e<br />

culturais. O eixo também propõe a reflexão sobre <strong>os</strong> <strong>de</strong>safi<strong>os</strong> da<br />

clínica <strong>no</strong> território e o confronto com as prática da internação,<br />

abordando <strong>os</strong> lugares e as práticas que <strong>de</strong>sconstroem, em seu<br />

fazer cotidia<strong>no</strong>.<br />

Eixo IV – Gestão do Trabalho<br />

O objetivo <strong>de</strong>ste eixo é analisar as relações da Gestão<br />

d<strong>os</strong> Serviç<strong>os</strong> e Process<strong>os</strong> <strong>de</strong> Trabalho n<strong>os</strong> CAPS a partir da<br />

implementação e consolidação do Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>. O<br />

eixo retrata das ações <strong>de</strong> promoção, prevenção e recuperação<br />

na re<strong>de</strong> <strong>de</strong> serviç<strong>os</strong>, n<strong>os</strong> diferentes níveis <strong>de</strong> gestão, refletindo<br />

sobre a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se garantir a perspectiva <strong>de</strong> uma gestão<br />

participativa.<br />

No final, o documento apresenta uma lista <strong>de</strong> referências que<br />

clarificam e complementam questões abordadas <strong>no</strong> texto. Essas<br />

referências são importantes para embasar práticas e estud<strong>os</strong><br />

além <strong>de</strong>ste documento.<br />

41


EIXO I: DIMENSÃO ÉTICO-POLÍTICA<br />

DAS POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL<br />

43


EIXO I: DIMENSÃO ÉTICO-POLÍTICA DAS POLÍTICAS<br />

DE SAÚDE MENTAL<br />

Consi<strong>de</strong>rações Sobre as Políticas <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> No Brasil<br />

Esse eixo tem por objetivo discutir alguns aspect<strong>os</strong> da<br />

evolução das políticas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e saú<strong>de</strong> mental <strong>no</strong> Brasil, como<br />

subsídio para uma melhor compreensão d<strong>os</strong> aspect<strong>os</strong> históric<strong>os</strong><br />

que influenciaram a constituição do Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> e<br />

o processo <strong>de</strong> Reforma Psiquiátrica <strong>no</strong> Brasil. Esse sistema se<br />

sustenta numa concepção <strong>de</strong> política pública na qual o Estado,<br />

entendido como Estado Democrático <strong>de</strong> Direito, se organiza<br />

para oferecer resp<strong>os</strong>tas a<strong>os</strong> problemas sociais, consi<strong>de</strong>rando<br />

<strong>os</strong> direit<strong>os</strong> sociais historicamente conquistad<strong>os</strong> pela socieda<strong>de</strong>,<br />

<strong>de</strong>ntre eles, aqueles relacionad<strong>os</strong> à saú<strong>de</strong>.<br />

No n<strong>os</strong>so país, a situação crítica <strong>no</strong> enfrentamento d<strong>os</strong><br />

problemas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> da população impôs a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

mudanças e <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ou, a partir do final da década <strong>de</strong> 70, o<br />

processo da Reforma Sanitária, que culmi<strong>no</strong>u com a construção<br />

do Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>, garantido pela Constituição Fe<strong>de</strong>ral<br />

<strong>de</strong> 1988, <strong>no</strong> seu capitulo II que trata da Segurida<strong>de</strong> Social,<br />

especificamente na seção II que trata do direito à saú<strong>de</strong> - art. 196<br />

a 200 (Brasil, 1988). A estruturação e a implementação <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

então é um processo dinâmico e permanente. Concomitante a este<br />

processo, impulsionada pelo Movimento <strong>de</strong> Luta Antimanicomial,<br />

foi implementada uma <strong>no</strong>va política <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental, com o foco<br />

prioritário na construção <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> substitutiva a<strong>os</strong> H<strong>os</strong>pitais<br />

Psiquiátric<strong>os</strong>.<br />

Vale <strong>de</strong>stacar uma diferença: <strong>no</strong> campo da saú<strong>de</strong> pública, a<br />

saú<strong>de</strong> mental é o locus da Reforma Psiquiátrica, entretanto, há<br />

entre saú<strong>de</strong> mental e reforma psiquiátrica, diferenças significativas.<br />

Enquanto a primeira po<strong>de</strong> ser compreendida como inscrição <strong>de</strong><br />

diferentes estratégias que visam a produção <strong>de</strong> algum modo <strong>de</strong><br />

inclusão <strong>de</strong> questões subjetivas na produção <strong>de</strong> bem-estar e <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong>, alcançando a diferentes sujeit<strong>os</strong> e situações, por exemplo:<br />

ativida<strong>de</strong>s voltadas para o empo<strong>de</strong>ramento <strong>de</strong> mulheres vítimas<br />

<strong>de</strong> process<strong>os</strong> <strong>de</strong> exclusão ou violência, crianças com dificulda<strong>de</strong>s<br />

45


<strong>de</strong> inserção escolar; a segunda, refere-se a um processo<br />

político <strong>de</strong> transformação da assistência pública ofertada a<strong>os</strong><br />

portadores <strong>de</strong> sofrimento mental. Um processo crítico que propõe<br />

a superação do manicômio ou do h<strong>os</strong>pital psiquiátrico como<br />

resp<strong>os</strong>ta às questões p<strong>os</strong>tas pela loucura, por meio da criação <strong>de</strong><br />

<strong>no</strong>v<strong>os</strong> lugares <strong>de</strong> tratamento – <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> substitutiv<strong>os</strong>, que se<br />

constituem como espaç<strong>os</strong> <strong>de</strong> convívio, sociabilida<strong>de</strong> e cuidado e<br />

ferramentas <strong>de</strong> mudança da percepção social sobre a experiência<br />

da loucura e o cidadão em sofrimento mental.<br />

Tanto a saú<strong>de</strong> mental quanto a reforma psiquiátrica, na resp<strong>os</strong>ta<br />

que dão à <strong>de</strong>manda social, correm sempre o risco <strong>de</strong> servir à<br />

<strong>no</strong>rmalização d<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong>, quando <strong>de</strong>scuidam <strong>de</strong> questionar <strong>os</strong><br />

discurs<strong>os</strong> que em <strong>no</strong>me da boa saú<strong>de</strong>, propõe a anulação das<br />

diferenças, a produção da igualda<strong>de</strong>, não d<strong>os</strong> direit<strong>os</strong>, mas d<strong>os</strong><br />

comportament<strong>os</strong>, como saída exit<strong>os</strong>a <strong>de</strong> um tipo <strong>de</strong> tratamento.<br />

De todo modo, é preciso reconhecer que o Ministério da<br />

Saú<strong>de</strong> fez uma priorização, por meio da política e do processo<br />

da Reforma Psiquiátrica, <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r a população com sofrimento<br />

mental com quadr<strong>os</strong> clínic<strong>os</strong> mais graves, levando em conta<br />

<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> da equida<strong>de</strong> do SUS. Consi<strong>de</strong>ra-se que a saú<strong>de</strong><br />

mental é um conceito muito mais abrangente e abarca uma serie<br />

<strong>de</strong> outras pessoas com sofrimento mental que também merecem<br />

cuidad<strong>os</strong>, bem como intervenções em divers<strong>os</strong> projet<strong>os</strong> da saú<strong>de</strong><br />

pública e outr<strong>os</strong> projet<strong>os</strong> <strong>de</strong> políticas sociais. A construção das<br />

políticas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>no</strong> Brasil tem antece<strong>de</strong>ntes históric<strong>os</strong> que<br />

merecem <strong>de</strong>staque. Apresentarem<strong>os</strong> a seguir alguns <strong>de</strong>les. Vale<br />

salientar que a sistematização que passa a ser apresentada está<br />

baseada na obra <strong>de</strong> alguns autores, aqui citad<strong>os</strong>. A partir da leitura<br />

<strong>de</strong>sses autores, fizem<strong>os</strong> uma divisão por períod<strong>os</strong>, resumindo<br />

o funcionamento da política <strong>de</strong> cada período. Enfatizam<strong>os</strong> que<br />

este trabalho não preten<strong>de</strong> ser uma extensa revisão bibliográfica<br />

sobre histórias <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> pública <strong>no</strong> Brasil, mas situa alguns<br />

marc<strong>os</strong> importantes para uma contextualização básica acerca d<strong>os</strong><br />

4 - Sobre esses aconteciment<strong>os</strong>, ver filme “Políticas <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> <strong>no</strong> Brasil: um<br />

século <strong>de</strong> luta pelo direito à saú<strong>de</strong>” - Documentário do cineasta Renato Tapajós,<br />

lançado pelo Ministério da Saú<strong>de</strong> em 2006. Na verda<strong>de</strong> é uma versão atualizada<br />

<strong>de</strong> um filme <strong>de</strong> 1982.<br />

46


serviç<strong>os</strong> cujas referências para atuação são aqui apresentadas.<br />

No Brasil Colonial, o arcabouço político-administrativo era<br />

marcado por estratégias <strong>de</strong> dominação entre <strong>os</strong> colonizadores<br />

e a população local, transformando as relações sociais, <strong>de</strong><br />

trabalho e produção local até então existentes, numa relação <strong>de</strong><br />

submissão da população da colônia às <strong>no</strong>rmas e gerenciamento<br />

do país colonizador. Segundo Somarriba (1984), n<strong>os</strong> sécul<strong>os</strong> XVI<br />

e XVII, as ações <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> eram quase inexistentes como ações<br />

estatais e existia um número irrisório <strong>de</strong> médic<strong>os</strong>. Práticas d<strong>os</strong><br />

curan<strong>de</strong>ir<strong>os</strong>, parteiras e afins eram predominantes em n<strong>os</strong>sa<br />

socieda<strong>de</strong>. As primeiras ações <strong>de</strong> caráter mais coletivo foram<br />

feitas pel<strong>os</strong> senhores <strong>de</strong> engenho e tais ações eram dirigidas<br />

à mão-<strong>de</strong>-obra escrava. O aumento da <strong>de</strong>manda externa por<br />

produt<strong>os</strong> agrícolas, <strong>de</strong> um lado e, ao mesmo tempo a escassez <strong>de</strong><br />

mão <strong>de</strong> obra, reduzida ao trabalho d<strong>os</strong> escrav<strong>os</strong> nesse período,<br />

tor<strong>no</strong>u interessante e necessário, para <strong>os</strong> senhores <strong>de</strong> engenho,<br />

curar e esten<strong>de</strong>r a vida <strong>de</strong> seus escrav<strong>os</strong>. Algumas medidas<br />

foram tomadas <strong>de</strong> maneira mais homogêneas, como: proteção<br />

à mãe escrava e a<strong>os</strong> recém-nascid<strong>os</strong>, instalação <strong>de</strong> enfermarias<br />

e cuidad<strong>os</strong> com a alimentação, vestuário e higiene nas gran<strong>de</strong>s<br />

fazendas. Em relação à saú<strong>de</strong> mental, existiam algumas<br />

instituições, do tipo abrig<strong>os</strong>, que eram gerenciad<strong>os</strong> pela Igreja<br />

Católica e que abrigavam <strong>os</strong> chamad<strong>os</strong> louc<strong>os</strong>, muito embora,<br />

em gran<strong>de</strong> parte, essas pessoas eram assimiladas e toleradas<br />

nas relações sociais cotidianas. Essa situação se esten<strong>de</strong> até<br />

o período imperial, quando se instalam <strong>no</strong> Brasil as primeiras<br />

instituições h<strong>os</strong>pitalares e o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> práticas<br />

científicas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. A vinda da família real ao Brasil inaugura<br />

process<strong>os</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento social, científico e econômico,<br />

<strong>de</strong> emergência <strong>de</strong> formação intelectual e <strong>de</strong> institucionalização<br />

antes não assistid<strong>os</strong> <strong>no</strong> país. Nesse momento, o Brasil é cenário<br />

<strong>de</strong> fortalecimento e incentivo ao pensamento científico e a todo<br />

aparato institucional <strong>de</strong> sua sustentação. A metrópole é aqui.<br />

Por isso, o Brasil é também cenário on<strong>de</strong> se instalam práticas<br />

higienistas n<strong>os</strong> centr<strong>os</strong> urban<strong>os</strong> em expansão e on<strong>de</strong> o pensamento<br />

eugênico ganha força a serviço da institucionalização <strong>de</strong> formas<br />

<strong>de</strong> pensar e <strong>de</strong> agir que respondam ao projeto emergente para<br />

47


o país nesse momento. Nesse contexto e em plena política <strong>de</strong><br />

higienização, em mead<strong>os</strong> do século XIX, mais precisamente em<br />

1852, ainda <strong>no</strong> Brasil imperial, foi criado pelo Estado o primeiro<br />

h<strong>os</strong>pital psiquiátrico <strong>no</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro, o H<strong>os</strong>pital Dom Pedro II.<br />

Assim, é nesse contexto que o Brasil vai reeditar, num primeiro<br />

momento, em certa medida aquilo que representou n<strong>os</strong> países<br />

europeus ao longo do século XVII a gran<strong>de</strong> internação, como<br />

prática <strong>de</strong> recolhimento daqueles que representam a <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m,<br />

a partir <strong>de</strong> um projeto <strong>de</strong> controle social. Gradativamente e com<br />

o <strong>de</strong>senvolvimento e o fortalecimento da presença do saber<br />

psiquiátrico e <strong>de</strong> outras ciências afins na organização da instituição<br />

médica recém inaugurada, essas práticas se especializam e<br />

ganham cada vez mais cientificida<strong>de</strong>, aprimorando-se diagnóstic<strong>os</strong><br />

e práticas médicas voltadas à cura da doença mental.<br />

Analisando historicamente as políticas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental <strong>no</strong><br />

Brasil, <strong>de</strong>vem<strong>os</strong> consi<strong>de</strong>rar que, do ponto <strong>de</strong> vista das ações do<br />

Estado, a política <strong>de</strong> assistência para o chamado louco, durante<br />

muit<strong>os</strong> an<strong>os</strong>, se pautou pelo oferecimento à população <strong>de</strong><br />

tratamento em H<strong>os</strong>pitais Psiquiátric<strong>os</strong>, manicômi<strong>os</strong> ou h<strong>os</strong>píci<strong>os</strong>.<br />

Sabe-se que essa oferta não se <strong>de</strong>u por acaso, mas estava, e<br />

ainda está, sustentada <strong>no</strong> chamado saber cientifico da psiquiatria,<br />

disciplina da Medicina que se constituiu <strong>de</strong> forma efetiva <strong>no</strong> final<br />

do século XIX e que ganhou através <strong>de</strong> Philipe Pinel, médico<br />

francês, o estatuto <strong>de</strong> ciência. A partir <strong>de</strong> então, a loucura passou<br />

a ser do domínio da medicina e a ser reconhecida como doença<br />

mental. Enquanto tal passou a ser tratada em instituições próprias<br />

e especificas, <strong>de</strong>stinadas a esse fim. Dessa forma surgiu o<br />

manicômio ou h<strong>os</strong>pital psiquiátrico, <strong>de</strong>signado templo da loucura,<br />

mas, sobretudo, da ciência e graças a ele a psiquiatria criou corpo,<br />

enquanto especialida<strong>de</strong>. Essa história se repete, então, <strong>no</strong> Brasil.<br />

Foi <strong>no</strong> espaço d<strong>os</strong> h<strong>os</strong>píci<strong>os</strong> que se criaram as primeiras gerações<br />

<strong>de</strong> psiquiatras brasileir<strong>os</strong>, quando ainda nem havia uma cátedra<br />

<strong>de</strong> psiquiatria nas faculda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> medicina. O manicômio, local<br />

on<strong>de</strong> a loucura <strong>de</strong>ve-se <strong>de</strong>svelar para o conhecimento médico,<br />

representa a própria p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> existência da psiquiatria.<br />

Segundo Filho (1996), com a proclamação da República em<br />

1889, surge a necessida<strong>de</strong> da criação <strong>de</strong> um estado-nação.<br />

48


Isso, contudo, não <strong>de</strong>struiu as Oligarquias Regionais e nem <strong>os</strong><br />

resquíci<strong>os</strong> monarquistas centralizadores. Na Primeira Fase da<br />

República (1889-1930), a saú<strong>de</strong> teve como característica principal<br />

o caráter filantrópico e emergencial. A saú<strong>de</strong> pública é tratada<br />

como área específica e seus recurs<strong>os</strong> <strong>de</strong>stinad<strong>os</strong> à assistência<br />

médico-h<strong>os</strong>pitalar e ações coletivas <strong>de</strong> controle <strong>de</strong> epi<strong>de</strong>mias . 4<br />

Do ponto <strong>de</strong> vista da saú<strong>de</strong> mental, o advento da República<br />

vai concretizar e intensificar a perspectiva citada acima <strong>de</strong><br />

transformação da loucura em doença mental e, portanto, objeto<br />

<strong>de</strong> saber médico especializado. O H<strong>os</strong>pício Pedro II passa a se<br />

chamar H<strong>os</strong>pital Nacional <strong>de</strong> Alienad<strong>os</strong> e é transformado em<br />

instituição pública em 1890. Sua natureza assistencial e seu<br />

caráter religi<strong>os</strong>o per<strong>de</strong>m espaço para o caráter científico e para<br />

o projeto médico curativo orientado pela perspectiva da ciência<br />

p<strong>os</strong>itivista. Também em 1890 é criada a “Assistência Médica e<br />

Legal d<strong>os</strong> Alienad<strong>os</strong>” para organização da assistência psiquiátrica<br />

<strong>no</strong> Brasil. Em 1903 tem<strong>os</strong> a primeira Lei Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Assistência<br />

a<strong>os</strong> Alienad<strong>os</strong>. Percebe-se a clara institucionalização e<br />

cientificização do tratamento à loucura <strong>no</strong> Brasil. Assistiu-se nesse<br />

período a participação da psiquiatria nas ações <strong>de</strong> saneamento<br />

e reorganização da vida urbana. Não à toa, vê-se crescer na<br />

população psiquiátrica em 31% o conjunto <strong>de</strong> estrangeir<strong>os</strong>.<br />

Além disso, <strong>de</strong>staca-se a implementação das colônias agrícolas<br />

como aperfeiçoamento d<strong>os</strong> h<strong>os</strong>píci<strong>os</strong> e a expansão do projeto<br />

medicalizante. Ganham força as i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> prevenção, profilaxia e<br />

higiene mental, apoiadas nas teorias das <strong>de</strong>generescências, que<br />

preveem predisp<strong>os</strong>ições individuais hereditárias para as doenças<br />

mentais. É assim que a análise e o crivo moral adquirem caráter<br />

médico-científico <strong>de</strong> diagnóstico e que o projeto eugenista ganha<br />

legitimida<strong>de</strong> <strong>no</strong> país. Nessa perspectiva, é criada em 1923 a Liga<br />

Brasileira <strong>de</strong> Higiene Mental. Assim, problemas sociais divers<strong>os</strong><br />

e uma série <strong>de</strong> process<strong>os</strong> que representavam <strong>de</strong>gradação<br />

moral são naturalizad<strong>os</strong> e tem sua responsabilida<strong>de</strong> atribuída<br />

às suas vítimas, por meio das perspectivas e leituras biológicas,<br />

hereditárias e organicistas (R<strong>os</strong>a, 2003). Na Segunda Fase da<br />

República (1930-1945), tem<strong>os</strong> um Estado com características<br />

mo<strong>de</strong>rnizadoras, sustentadas por uma coalizão não hegemônica,<br />

49


comp<strong>os</strong>ta <strong>de</strong> grup<strong>os</strong> <strong>de</strong> oligarquias e da burguesia emergente. A<br />

marca do gover<strong>no</strong> foi <strong>de</strong> uma p<strong>os</strong>tura autoritária, instalando uma<br />

estrutura administrativa corporativa, sob o arcabouço político<br />

populista. Dois pont<strong>os</strong> merecem <strong>de</strong>staque <strong>no</strong> que tange à saú<strong>de</strong><br />

(FILHO, 1996). O primeiro <strong>de</strong>les diz respeito ao fato da Constituição<br />

<strong>de</strong> 1934 ter <strong>de</strong>finido as responsabilida<strong>de</strong>s específicas do Estado<br />

<strong>no</strong> que se refere à legislação sobre <strong>no</strong>rmas <strong>de</strong> assistência<br />

social, às estatísticas <strong>de</strong> interesse coletivo, ao exercício das<br />

profissões liberais e técnico-científicas, a<strong>os</strong> cuidad<strong>os</strong> com a<br />

saú<strong>de</strong> e assistência públicas, à fiscalização das leis sociais,<br />

às garantias na legislação trabalhista <strong>de</strong> assistência médica e<br />

sanitária a<strong>os</strong> trabalhadores e à gestante. Em relação ao segundo<br />

ponto que merece <strong>de</strong>staque, afirmam<strong>os</strong> a responsabilida<strong>de</strong> da<br />

União, Estad<strong>os</strong> e Municípi<strong>os</strong> <strong>no</strong> estímulo à educação eugênica,<br />

<strong>no</strong> amparo à maternida<strong>de</strong> e à infância, na adoção <strong>de</strong> medidas<br />

legislativas e administrativas, <strong>no</strong> compromisso com a restrição<br />

da mortalida<strong>de</strong> e morbida<strong>de</strong> infantis e na <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong><br />

ações <strong>de</strong> higiene social, para impedir a propagação <strong>de</strong> doenças<br />

transmissíveis. Nesse contexto, foi prop<strong>os</strong>to o cuidado da higiene<br />

mental e houve incentivo à luta contra <strong>os</strong> venen<strong>os</strong> sociais.<br />

Do ponto <strong>de</strong> vista da assistência psiquiátrica, é promulgada<br />

em 1934 a segunda Lei Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Assistência a<strong>os</strong> Doentes<br />

Mentais que “dispõe sobre a profilaxia mental, a assistência e a<br />

proteção à pessoa d<strong>os</strong> psicopatas e a fiscalização d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong><br />

psiquiátric<strong>os</strong>”. A internação psiquiátrica é reforçada como principal<br />

meio <strong>de</strong> tratamento, assim como o po<strong>de</strong>r do psiquiatra na direção<br />

d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong>. A Lei também é responsável por afirmar, parcial<br />

ou totalmente, a suspensão da cidadania do doente mental.<br />

Ainda como marca da <strong>no</strong>va perspectiva em relação ao papel do<br />

Estado na gestão da saú<strong>de</strong>, a criação do Serviço Nacional <strong>de</strong><br />

Doenças Mentais é responsável pela fe<strong>de</strong>ralização da assistência<br />

psiquiátrica <strong>no</strong> Brasil n<strong>os</strong> an<strong>os</strong> <strong>de</strong> 1940. (ROSA, 2003)<br />

Na Terceira Fase da República (1946-1964) <strong>de</strong>staca-se a<br />

Constituição <strong>de</strong> 1946. A partir <strong>de</strong>la, a União faz a organização<br />

da <strong>de</strong>fesa permanente contra as gran<strong>de</strong>s en<strong>de</strong>mias, começa a<br />

legislar sobre segur<strong>os</strong> e previdência social, promove a <strong>de</strong>fesa<br />

e proteção da saú<strong>de</strong>, legisla sobre o exercício das profissões,<br />

50


assegura a auto<strong>no</strong>mia d<strong>os</strong> municípi<strong>os</strong> quanto à organização <strong>de</strong><br />

alguns serviç<strong>os</strong> públic<strong>os</strong> locais (sem especificar <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong>) e <strong>de</strong>termina a assistência obrigatória à maternida<strong>de</strong>, à<br />

infância e à adolescência. Essa Constituição também estipulou<br />

venciment<strong>os</strong> integrais na ap<strong>os</strong>entadoria <strong>de</strong> trabalhadores<br />

vitimad<strong>os</strong> por aci<strong>de</strong>ntes ou moléstias profissionais contagi<strong>os</strong>as<br />

ou incuráveis.<br />

Em relação à assistência psiquiátrica, é preciso afirmar a<br />

existência, nesse momento, <strong>de</strong> experiências <strong>de</strong> contestação em<br />

relação ao mo<strong>de</strong>lo hegemônico até então existente. O trabalho<br />

<strong>de</strong> Nise da Silveira (1905-1999) que, <strong>no</strong> h<strong>os</strong>pital <strong>de</strong> Engenho<br />

<strong>de</strong> Dentro <strong>no</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro, produz uma importante tensão<br />

e contestação claramente marcada na criação da Seção <strong>de</strong><br />

Terapêutica Ocupacional (que <strong>de</strong>u origem ao Museu <strong>de</strong> Imagens<br />

do Inconsciente) tem como mérito a crítica permanente à redução<br />

do sujeito à doença e a p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dar voz, expressão,<br />

circulação e estabelecer relação a partir d<strong>os</strong> sentid<strong>os</strong> e significad<strong>os</strong><br />

escondid<strong>os</strong> e sufocad<strong>os</strong> pelo tratamento psiquiátrico. Destaca-se<br />

também a experiência anterior <strong>de</strong> Ulysses Pernambuco (1892-<br />

1943) que atuando em Recife ampliou a organização assistencial<br />

para serviç<strong>os</strong> abert<strong>os</strong> e ambulatoriais, opondo-se à visão<br />

organicista e enfatizando fatores psicológic<strong>os</strong> e sociais como<br />

<strong>de</strong>terminantes d<strong>os</strong> process<strong>os</strong> psíquic<strong>os</strong>. Apesar disso, as críticas<br />

então formuladas em relação a<strong>os</strong> mo<strong>de</strong>l<strong>os</strong> <strong>de</strong> assistência não<br />

foram suficientes para sua reversão. A partir <strong>de</strong> 1950, Institut<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong> Ap<strong>os</strong>entadoria e Pensões incorporam internação psiquiátrica<br />

em sua cobertura assistencial, utilizando-se principalmente da<br />

re<strong>de</strong> h<strong>os</strong>pitalar privada. A partir da meta<strong>de</strong> da década <strong>de</strong> 1950,<br />

a disponibilida<strong>de</strong> das drogas psicotrópicas <strong>no</strong> mercado e a<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reparação <strong>de</strong> mão <strong>de</strong> obra para o <strong>de</strong>senvolvimento<br />

capitalista vão tensionar a alteração das estruturas asilares.<br />

(ROSA, 2003).<br />

Na Quarta Fase Republicana (1964-1985), o país esteve sob<br />

o regime <strong>de</strong> Ditadura Militar e as p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> avanç<strong>os</strong> para<br />

5 - Produt<strong>os</strong> expressiv<strong>os</strong> <strong>de</strong>ste período, como a reportagem: “N<strong>os</strong> porões da<br />

loucura” (Nas décadas <strong>de</strong> 1970/1980), <strong>de</strong> Hiram Firmi<strong>no</strong> e o filme “Em <strong>no</strong>me da<br />

razão” (1979), <strong>de</strong> Helvécio Ratton, chocaram a opinião pública.<br />

51


o setor <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> obtid<strong>os</strong> <strong>no</strong> período anterior sofrem um recuo<br />

significativo. As políticas refletidas nas legislações sobre a saú<strong>de</strong><br />

pública têm caráter discriminatório, <strong>de</strong> natureza vaga e evolução<br />

lenta. A Constituição <strong>de</strong> 1967 não imprimiu na Carta Magna o<br />

direito à saú<strong>de</strong> como inerente à cidadania e o <strong>de</strong>ver do Estado na<br />

garantia do seu gozo. Ao contrário, a assistência médica apenas<br />

foi garantida a<strong>os</strong> trabalhadores e <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes vinculad<strong>os</strong> ao<br />

sistema previ<strong>de</strong>nciário, criando uma situação <strong>de</strong> pré-cidadania<br />

para <strong>os</strong> <strong>de</strong>mais brasileir<strong>os</strong> quanto ao direito à saú<strong>de</strong>. Destaquese<br />

que na Constituição <strong>de</strong> 1967 foi feita a organização da polícia<br />

fe<strong>de</strong>ral para o combate ao tráfico <strong>de</strong> entorpecentes; essa mesma<br />

Constituição <strong>de</strong>termi<strong>no</strong>u a competência da União para estabelecer<br />

plan<strong>os</strong> nacionais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e celebrar tratad<strong>os</strong> e convêni<strong>os</strong> com<br />

<strong>os</strong> Estad<strong>os</strong> estrangeir<strong>os</strong> e organizações internacionais, além <strong>de</strong><br />

permitir a colaboração entre entida<strong>de</strong>s religi<strong>os</strong>as e o Estado.<br />

Assegurou, ainda, a auto<strong>no</strong>mia municipal quanto à organização<br />

d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> públic<strong>os</strong> locais. (FILHO, 1996).<br />

Como <strong>de</strong>corrência, do ponto <strong>de</strong> vista da assistência psiquiátrica<br />

a gran<strong>de</strong> herança <strong>de</strong>sse período é a privatização d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong><br />

com características clientelistas e a constituição da chamada<br />

indústria da loucura. A criação do Instituto Nacional <strong>de</strong> Previdência<br />

Social esten<strong>de</strong> a<strong>os</strong> trabalhadores segurad<strong>os</strong> do sistema e seus<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes a assistência psiquiátrica. Esses são remetid<strong>os</strong> a<strong>os</strong><br />

h<strong>os</strong>pitais da re<strong>de</strong> privada por meio da contratação <strong>de</strong> seus leit<strong>os</strong><br />

psiquiátric<strong>os</strong>. Os leit<strong>os</strong> privad<strong>os</strong> passam a crescer <strong>de</strong>z vezes mais<br />

que <strong>os</strong> leit<strong>os</strong> públic<strong>os</strong>. O perfil social da população psiquiátrica<br />

cresce em trabalhadores previ<strong>de</strong>nciári<strong>os</strong> urban<strong>os</strong> acometid<strong>os</strong><br />

por sofriment<strong>os</strong> <strong>de</strong>correntes das condições <strong>de</strong> trabalho imp<strong>os</strong>tas<br />

pelo <strong>de</strong>senvolvimento econômico, o que altera também o perfil<br />

n<strong>os</strong>ológico <strong>de</strong>ssa população, que passa a ser constituída por<br />

diagnóstic<strong>os</strong> como neur<strong>os</strong>es e alcoolism<strong>os</strong>, numa reedição da<br />

psiquiatrização <strong>de</strong> problemas sociais. A perspectiva preventista<br />

se instala com força, exigindo uma reformulação da assistência<br />

psiquiátrica que vai apontar para ambulatorização da assistência<br />

e redução <strong>de</strong> cust<strong>os</strong> com h<strong>os</strong>pitais psiquiátric<strong>os</strong>, sem, contudo,<br />

uma diminuição efetiva <strong>no</strong> financiamento das internações<br />

psiquiátricas. Assim, chegam<strong>os</strong> a um quadro <strong>de</strong> polarização entre<br />

52


a re<strong>de</strong> h<strong>os</strong>pitalar psiquiátrica e <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> ambulatoriais pontuais,<br />

sem um efetivo questionamento da concepção que orientava <strong>os</strong><br />

mo<strong>de</strong>l<strong>os</strong> <strong>de</strong> tratamento. (ROSA, 2003)<br />

Desta forma, em síntese, em relação à assistência psiquiátrica,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o final d<strong>os</strong> an<strong>os</strong> 1950, o Brasil acumulava uma grave<br />

situação n<strong>os</strong> h<strong>os</strong>pitais psiquiátric<strong>os</strong>: superlotação; <strong>de</strong>ficiência<br />

<strong>de</strong> pessoal; maus-trat<strong>os</strong> gr<strong>os</strong>seir<strong>os</strong>; falta <strong>de</strong> vestuário e <strong>de</strong><br />

alimentação; péssimas condições físicas; cuidad<strong>os</strong> técnic<strong>os</strong><br />

escass<strong>os</strong>. Como vim<strong>os</strong>, a partir do golpe militar <strong>de</strong> 1964, até<br />

<strong>os</strong> an<strong>os</strong> 1970, proliferaram amplamente clínicas psiquiátricas<br />

privadas conveniadas com o po<strong>de</strong>r público, obtendo lucro fácil por<br />

meio da “psiquiatrização” d<strong>os</strong> problemas sociais <strong>de</strong> uma ampla<br />

camada da população brasileira. Criou-se assim a chamada<br />

“indústria da loucura”. No final d<strong>os</strong> an<strong>os</strong> 1980, o Brasil chegou a<br />

ter cerca <strong>de</strong> 100.000 leit<strong>os</strong> em 313 h<strong>os</strong>pitais psiquiátric<strong>os</strong>, sendo<br />

20% públic<strong>os</strong> e 80% privad<strong>os</strong>, conveniad<strong>os</strong> ao SUS, concentrad<strong>os</strong><br />

principalmente <strong>no</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro, em São Paulo e em Minas Gerais.<br />

Os gast<strong>os</strong> públic<strong>os</strong> com internações psiquiátricas ocupavam o 2º<br />

lugar entre tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> gast<strong>os</strong> com internações pagas pelo Ministério<br />

da Saú<strong>de</strong>. Eram raras outras alternativas <strong>de</strong> assistência – mesmo<br />

as mais simples, como o atendimento ambulatorial.<br />

Também é preciso citar que se estabeleceu a divisão entre<br />

uma assistência <strong>de</strong>stinada a<strong>os</strong> indigentes – recebid<strong>os</strong> pela<br />

re<strong>de</strong> pública – e outra a<strong>os</strong> previ<strong>de</strong>nciári<strong>os</strong> e seus <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes<br />

– encaminhad<strong>os</strong> a<strong>os</strong> h<strong>os</strong>pitais privad<strong>os</strong> conveniad<strong>os</strong>. De<br />

qualquer forma, as condições d<strong>os</strong> h<strong>os</strong>pitais, privad<strong>os</strong> ou públic<strong>os</strong>,<br />

continuava extremamente precária. Além disso, o po<strong>de</strong>r público<br />

não exercia qualquer controle efetivo da justificativa, da qualida<strong>de</strong><br />

e da duração das internações. Divers<strong>os</strong> ví<strong>de</strong><strong>os</strong>, documentári<strong>os</strong>,<br />

livr<strong>os</strong>, publicações <strong>de</strong>nunciam essa situação em relação à violação<br />

<strong>de</strong> direit<strong>os</strong> e à situação <strong>de</strong>gradante d<strong>os</strong> h<strong>os</strong>pitais psiquiátric<strong>os</strong> . 5<br />

O Brasil ingressa na Quinta Fase Republicana com uma e<strong>no</strong>rme<br />

efervescência <strong>de</strong> moviment<strong>os</strong> sociais, questionando a ausência<br />

do Estado na formulação e na garantia <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> a sua<br />

população. No que tange à saú<strong>de</strong> pública, a socieda<strong>de</strong> se dividia<br />

entre aqueles trabalhadores formais com carteira assinada que<br />

tinham garantia <strong>de</strong> assistência médica e um gran<strong>de</strong> contingente<br />

53


da população sem direito a assistência.<br />

Assim, na Quinta Fase da República (1986-período atual),<br />

com o fim da ditadura, passam<strong>os</strong> à construção do Estado<br />

Democrático <strong>de</strong> Direito. É nessa fase que tem<strong>os</strong> o fortalecimento<br />

e visibilida<strong>de</strong> social do Movimento da Reforma Sanitária e o<br />

Movimento <strong>de</strong> Reforma Psiquiátrica <strong>no</strong> Brasil. Vale <strong>de</strong>stacar que<br />

o Movimento <strong>de</strong> Reforma Sanitária inicia-se <strong>no</strong> final d<strong>os</strong> an<strong>os</strong><br />

1960 e início d<strong>os</strong> an<strong>os</strong> 1970, com recuo <strong>no</strong> período da ditadura,<br />

ganhando força <strong>no</strong>vamente <strong>no</strong> final d<strong>os</strong> an<strong>os</strong> 1970. A partir <strong>de</strong>sse<br />

Movimento, a abordagem d<strong>os</strong> problemas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> se constitui<br />

como a base teórica e i<strong>de</strong>ológica <strong>de</strong> um pensamento médic<strong>os</strong>ocial<br />

que, ao olhar para o processo saú<strong>de</strong>-doença, aponta para<br />

<strong>os</strong> problemas estruturais <strong>no</strong> Brasil. Esse movimento ocorreu <strong>no</strong><br />

interior d<strong>os</strong> Departament<strong>os</strong> <strong>de</strong> Medicina Preventiva e Social das<br />

Universida<strong>de</strong>s Fe<strong>de</strong>rais do Brasil - DMPS. Os DMPS:<br />

[...] foram a base na qual se <strong>de</strong>senvolveram a produção<br />

<strong>de</strong> conheciment<strong>os</strong> sobre o estado <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> da população<br />

e sobre a organização das práticas sanitárias, produção<br />

essa, frequentemente articulada com <strong>os</strong> mo<strong>de</strong>l<strong>os</strong><br />

experimentais <strong>de</strong> organização da prática médica, quer<br />

para efeito <strong>de</strong> <strong>de</strong>monstração, quer para finalida<strong>de</strong><br />

didáticas (DONNAGELO 1993, p. 26)<br />

Paralelo a esse movimento, n<strong>os</strong> interiores das periferias<br />

metropolitanas, principalmente na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, as donas<br />

<strong>de</strong> casa, juntamente com a igreja, estavam se reunindo para<br />

discutir as condições e agrav<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> da comunida<strong>de</strong>, nas<br />

chamadas “comunida<strong>de</strong>s eclesiais <strong>de</strong> base”.<br />

Portanto, <strong>os</strong> an<strong>os</strong> <strong>de</strong> 1970 são an<strong>os</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>núncias e críticas.<br />

Divers<strong>os</strong> segment<strong>os</strong> sociais se organizaram nessa época, ao<br />

longo do processo <strong>de</strong> re<strong>de</strong>mocratização do país. Nesse contexto,<br />

segundo Cézar Camp<strong>os</strong> (2006) (MINAS GERAIS, 2006), “o<br />

Movimento <strong>de</strong> Trabalhadores em Saú<strong>de</strong> Mental começou a tomar<br />

corpo: trabalhadores da área se organizaram, apontando <strong>os</strong><br />

graves problemas do sistema <strong>de</strong> assistência psiquiátrica do país<br />

e propondo formas <strong>de</strong> trabalho que pu<strong>de</strong>ssem romper com esse<br />

54


mo<strong>de</strong>lo.”<br />

A verda<strong>de</strong>ira força <strong>de</strong> sustentação exercida pelo manicômio não<br />

estava em produzir resultad<strong>os</strong> terapêutic<strong>os</strong>, mas sim <strong>de</strong> exclusão<br />

social, <strong>de</strong> exclusão física, bem como <strong>de</strong> exclusão em relação ao<br />

universo da cidadania. Não sendo o louco um cidadão, sustentavase<br />

todo tipo <strong>de</strong> violência contra o mesmo. Com a abertura política<br />

que começa a dar visibilida<strong>de</strong> à luta d<strong>os</strong> moviment<strong>os</strong> sociais,<br />

buscou-se a implementação do regime <strong>de</strong>mocrático, p<strong>os</strong>sibilitando<br />

que, <strong>no</strong> setor da saú<strong>de</strong> mental, <strong>os</strong> trabalhadores se manifestassem<br />

junto à socieda<strong>de</strong> sobre a assistência psiquiátrica brasileira.<br />

Começa então a se <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ar <strong>no</strong> Brasil, principalmente na<br />

Região Su<strong>de</strong>ste, uma série <strong>de</strong> congress<strong>os</strong>, seminári<strong>os</strong> e <strong>de</strong>bates<br />

sobre o tema. O mesmo aconteceu <strong>de</strong> forma geral em relação<br />

à assistência à saú<strong>de</strong> como um todo através do movimento <strong>de</strong><br />

Reforma Sanitária. Assim, o final <strong>de</strong>ssa década foi marcado por<br />

uma série <strong>de</strong> <strong>de</strong>núncias públicas feitas pel<strong>os</strong> trabalhadores <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> mental em relação às péssimas condições a que estavam<br />

submetid<strong>os</strong> <strong>os</strong> portadores <strong>de</strong> sofrimento mental internad<strong>os</strong> n<strong>os</strong><br />

manicômi<strong>os</strong>.<br />

Em Minas Gerais, aconteceu também nesse período, o III<br />

Congresso Mineiro <strong>de</strong> Psiquiatria - 1979, que contou com a<br />

participação <strong>de</strong> dois atores importantíssim<strong>os</strong> que iriam influenciar<br />

<strong>de</strong> maneira <strong>de</strong>cisiva <strong>os</strong> corações e mentes <strong>de</strong> centenas <strong>de</strong><br />

profissionais que atuavam neste setor: a presença do psiquiatra<br />

italia<strong>no</strong> Franco Basaglia e do sociólogo francês Robert Castel.<br />

Amb<strong>os</strong> estavam atuando na Europa juntamente com outr<strong>os</strong><br />

profissionais <strong>no</strong> sentido <strong>de</strong> mudar <strong>os</strong> rum<strong>os</strong> da assistência<br />

psiquiátrica, produzindo text<strong>os</strong>, estimulando discussões teóricas<br />

sobre a psiquiatria, seu papel, função e seus fundament<strong>os</strong><br />

fil<strong>os</strong>ófic<strong>os</strong>.<br />

Instaurou-se a partir <strong>de</strong> então, uma série <strong>de</strong> <strong>de</strong>bates e<br />

seminári<strong>os</strong> sobre a realida<strong>de</strong> das instituições manicomiais. Era<br />

preciso modificar, reformular e, principalmente, humanizar <strong>os</strong><br />

h<strong>os</strong>pitais psiquiátric<strong>os</strong>. Gastou-se quase 10 an<strong>os</strong> em discussões,<br />

implementando programas que visavam a melhoria <strong>de</strong>ssas<br />

instituições. Essas discussões foram extremamente necessárias<br />

a esse processo, mas faltava a<strong>os</strong> profissionais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental<br />

55


uma maior clareza do real significado <strong>de</strong>ssas instituições e <strong>de</strong><br />

seu papel <strong>no</strong>rmalizador. O templo da loucura, bem como sua<br />

existência, permanecia inquestionável.<br />

Em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1987 aconteceu a realização do II Congresso<br />

Nacional d<strong>os</strong> Trabalhadores <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental, em Bauru, São<br />

Paulo. Na ocasião, foi prop<strong>os</strong>ta uma radicalização do movimento<br />

<strong>de</strong> trabalhadores, a partir da constatação <strong>de</strong> que a humanização<br />

d<strong>os</strong> h<strong>os</strong>pitais, com a criação <strong>de</strong> programas ambulatoriais<br />

(constituição <strong>de</strong> equipes <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental em unida<strong>de</strong>s básicas),<br />

não havia sido suficiente para dar conta <strong>de</strong> produzir uma relação<br />

diferente da socieda<strong>de</strong> com o fenôme<strong>no</strong> da loucura. Os louc<strong>os</strong><br />

continuavam a ser internad<strong>os</strong> e segregad<strong>os</strong> do convívio social.<br />

Esse movimento se ampliou e passou a ser <strong>de</strong><strong>no</strong>minado <strong>de</strong><br />

Movimento da Luta Antimanicomial. Des<strong>de</strong> então, o Movimento<br />

se instituiu como um ator e um interlocutor <strong>de</strong> fundamental<br />

importância para o Estado implementar políticas públicas que<br />

atendam realmente às necessida<strong>de</strong>s das pessoas com sofrimento<br />

mental, criando condições para a sua inclusão social. Assim, em<br />

síntese, <strong>os</strong> marc<strong>os</strong> fundamentais <strong>de</strong>sse período são:<br />

• Realização da 8ª Conferência Nacional <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> (junho/1986)<br />

Marco político <strong>de</strong>cisivo para <strong>os</strong> rum<strong>os</strong> da saú<strong>de</strong> pública do Brasil<br />

que apontou claramente para a construção do SUS – Sistema<br />

Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>, quando discutiu o conceito <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> como direito<br />

fundamental da pessoa humana, a necessida<strong>de</strong> da construção <strong>de</strong><br />

um sistema único <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e as bases <strong>de</strong> financiamento para o<br />

setor. Ressaltam<strong>os</strong> a importância da participação popular nessa<br />

conferência, representada pel<strong>os</strong> seus 5000 <strong>de</strong>legad<strong>os</strong>.<br />

• Constituição Fe<strong>de</strong>ral (1988)<br />

6 - A Declaração foi proclamada <strong>no</strong> dia 14 <strong>de</strong> Novembro <strong>de</strong> 1990 pela Conferência<br />

Regional para a reestruturação da Atenção Psiquiátrica na América Latina<br />

<strong>no</strong> contexto d<strong>os</strong> Sistemas Locais <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>. Essa Conferência foi convocada<br />

pela Organização Panamericana <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> e da Justiça, <strong>os</strong> Parlament<strong>os</strong> e a<br />

Previdência Social, entre outr<strong>os</strong> prestadores <strong>de</strong> serviç<strong>os</strong>.<br />

56


Conhecida como a “Constituição Cidadã”, garantiu o direito à<br />

saú<strong>de</strong> <strong>no</strong> Capítulo II – Segurida<strong>de</strong> Social. N<strong>os</strong> seus artig<strong>os</strong> 196<br />

a 200 são express<strong>os</strong> <strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> que <strong>de</strong>finem a saú<strong>de</strong> como<br />

direito <strong>de</strong> tod<strong>os</strong> e <strong>de</strong>ver do Estado.<br />

• O Movimento <strong>de</strong> Luta Antimanicomial<br />

Des<strong>de</strong> o final d<strong>os</strong> an<strong>os</strong> 70, vári<strong>os</strong> trabalhadores estavam<br />

insatisfeit<strong>os</strong> e indignad<strong>os</strong> com a “assistência” oferecida às<br />

pessoas com sofrimento mental do país. Para publicizar tal<br />

situação inúmeras <strong>de</strong>núncias na mídia, <strong>de</strong>bates e seminári<strong>os</strong><br />

foram realizad<strong>os</strong> <strong>no</strong> meio profissional, mas foi somente <strong>no</strong> final<br />

d<strong>os</strong> an<strong>os</strong> 1980, precisamente durante a realização do II Congresso<br />

Nacional d<strong>os</strong> Trabalhadores <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental, realizado em<br />

Bauru-SP, que foi realizada uma profunda avaliação da situação<br />

da assistência psiquiátrica brasileira. Esta avaliação levou <strong>os</strong><br />

profissionais a promoverem uma ruptura <strong>de</strong>cisiva em relação à<br />

situação vigente, propondo mudanças a<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> teóric<strong>os</strong><br />

e étic<strong>os</strong> da assistência, e <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>rem a radicalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma<br />

utopia ativa “Por uma socieda<strong>de</strong> sem manicômi<strong>os</strong>”, como <strong>no</strong>rte<br />

para aqueles que <strong>de</strong>cidiram fazer uma mudança na socieda<strong>de</strong><br />

na sua relação com <strong>os</strong> chamad<strong>os</strong> louc<strong>os</strong>. Fica colocado para<br />

aqueles que fizeram essa opção lutar contra todas as formas <strong>de</strong><br />

opressão social na busca da sua superação. Esse congresso<br />

<strong>de</strong>spertou sonh<strong>os</strong> e <strong>de</strong>sej<strong>os</strong> <strong>de</strong> transformação efetiva das<br />

relações da socieda<strong>de</strong> com a loucura. Uma das invenções mais<br />

significativas <strong>de</strong>ste movimento foi a criação do “18 <strong>de</strong> Maio” – Dia<br />

Nacional da Luta Antimanicomial. A prop<strong>os</strong>ta era <strong>de</strong> que nesse<br />

dia acontecesse em todo país a mobilização <strong>de</strong> núcle<strong>os</strong>, ONGs,<br />

associações e serviç<strong>os</strong> públic<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental i<strong>de</strong>ntificad<strong>os</strong><br />

com <strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> do movimento, fazendo circular <strong>no</strong> âmbito local,<br />

na mídia, na cultura, nas relações sociais as discussões sobre as<br />

políticas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental. Os profissionais, usuári<strong>os</strong>, familiares e<br />

simpatizantes ao movimento vão as ruas manifestar, por meio <strong>de</strong><br />

event<strong>os</strong> culturais expressiv<strong>os</strong>, a questão da loucura e sua relação<br />

com a socieda<strong>de</strong>. O rompimento com a cultura manicomial seria<br />

uma ação constante do Movimento, buscando e construindo<br />

57


p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> convívio com as diferenças, fazendo com que<br />

a socieda<strong>de</strong> enten<strong>de</strong>sse que a diferença é algo que faz parte da<br />

socieda<strong>de</strong>.<br />

É necessário consi<strong>de</strong>rar que a implantação <strong>de</strong> uma <strong>no</strong>va política<br />

<strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental <strong>no</strong> país sofreu a influência <strong>de</strong> aconteciment<strong>os</strong><br />

importantes <strong>no</strong> campo da saú<strong>de</strong> como um todo. Já n<strong>os</strong> referim<strong>os</strong><br />

às conquistas do movimento da Reforma Sanitária, que levou à<br />

reformulação da política <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> expressa na VIII Conferência<br />

Nacional <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>, a qual estabeleceu <strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> e as<br />

diretrizes do Sistema <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Brasileiro. O conceito <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> foi<br />

re<strong>de</strong>finido como sendo um direito inalienável das pessoas e que<br />

diz respeito à sua qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida, transcen<strong>de</strong>ndo, portanto,<br />

às doenças, estando muito mais relacionado com as condições<br />

gerais <strong>de</strong> existência, como moradia, saneamento básico,<br />

alimentação, condições <strong>de</strong> trabalho, educação e lazer. Sendo a<br />

saú<strong>de</strong> um direito do cidadão e um <strong>de</strong>ver do Estado, compete a<br />

este último a construção <strong>de</strong> um Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> (SUS)<br />

predominantemente público, <strong>de</strong>scentralizando, hierarquizado,<br />

equânime, com a participação e controle da população na<br />

implantação das políticas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e com a <strong>de</strong>stinação a<strong>de</strong>quada<br />

<strong>de</strong> recurs<strong>os</strong> para o setor. As políticas <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental estão<br />

submetidas a esses princípi<strong>os</strong> e diretrizes, bem como sofrem<br />

pressões e influências <strong>de</strong> organism<strong>os</strong> internacionais. Assim, em<br />

1990, a Declaração <strong>de</strong> Caracas 6 estabeleceu a reestruturação da<br />

assistência psiquiátrica na América Latina, <strong>de</strong> forma a assegurar<br />

o seu <strong>de</strong>senvolvimento em benefício das populações da região.<br />

Em 17 <strong>de</strong> Dezembro <strong>de</strong> 1991, a Organização das Nações Unidas<br />

propôs em assembleia a proteção das pessoas portadoras <strong>de</strong><br />

enfermida<strong>de</strong> mental e a melhoria da assistência.<br />

Vem<strong>os</strong>, assim, que a experiência <strong>de</strong> Reforma Psiquiátrica<br />

brasileira não está isolada. Há, do ponto <strong>de</strong> vista mundial,<br />

uma revisão das formas <strong>de</strong> relação e tratamento dispensado à<br />

loucura, então concebida como doença mental, que influenciou<br />

o processo brasileiro e com o qual ele, então, passou a compor,<br />

guardando suas especificida<strong>de</strong>s. Nesse sentido, cabe uma rápida<br />

revisão e <strong>de</strong>staque a pont<strong>os</strong> fundamentais <strong>de</strong> alguns process<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong> reformas psiquiátricas realizad<strong>os</strong> na Europa e Estad<strong>os</strong> Unid<strong>os</strong><br />

58


em tor<strong>no</strong> da segunda meta<strong>de</strong> do século XX.<br />

Principalmente <strong>no</strong> final da Segunda Guerra Mundial, com<br />

o projeto <strong>de</strong> Reconstrução Nacional da Europa sob princípi<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong>mocrátic<strong>os</strong>, era necessário rever o funcionamento d<strong>os</strong> h<strong>os</strong>pitais<br />

Psiquiátric<strong>os</strong>. Importante consi<strong>de</strong>rar o e<strong>no</strong>rme contingente<br />

<strong>de</strong> pessoas jovens que estavam traumatizadas pel<strong>os</strong> efeit<strong>os</strong><br />

da guerra e a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> recuperá-las a fim <strong>de</strong> utilizar a<br />

força do seu trabalho <strong>no</strong> projeto <strong>de</strong> reconstrução d<strong>os</strong> países.<br />

A necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> implantar sistemas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e a existência<br />

<strong>de</strong> uma vonta<strong>de</strong> coletiva <strong>de</strong> rever valores, <strong>de</strong> reconstruir as<br />

socieda<strong>de</strong>s sob bases e princípi<strong>os</strong> <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> e <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong><br />

levaram a implantação <strong>de</strong> sistemas sanitári<strong>os</strong> e a necessida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> revisão do funcionamento d<strong>os</strong> h<strong>os</strong>píci<strong>os</strong>. Assim, há um<br />

conjunto <strong>de</strong> moviment<strong>os</strong>, experiências e process<strong>os</strong> <strong>de</strong> Reforma<br />

Psiquiátrica vivenciad<strong>os</strong> principalmente em países europeus, que<br />

produzirão uma revisão das formas <strong>de</strong> tratamento da loucura e<br />

da organização da assistência psiquiátrica. Citem<strong>os</strong> alguns <strong>de</strong>les:<br />

• Psicoterapia Institucional e a Psiquiatria <strong>de</strong> Setor (França)<br />

Segundo Desviat (1999), a diretriz do mo<strong>de</strong>lo assistencial<br />

da Psicoterapia Institucional é a manutenção da instituição<br />

psiquiátrica, a partir da sua radical transformação. A sua<br />

existência não está em questão, pois o que faz a instituição<br />

ser um manicômio são as relações, práticas e lógicas que se<br />

estabelecem na assistência prestada a<strong>os</strong> intern<strong>os</strong>. Nesta lógica,<br />

tod<strong>os</strong> estão doentes e a instituição <strong>de</strong>ve ser tratada em seu<br />

conjunto, alterando-se radicalmente as relações estabelecidas,<br />

<strong>de</strong> modo a horinzotalizá-las e transformar a instituição <strong>de</strong> cuidado<br />

num espaço <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong>, <strong>de</strong> participação, <strong>de</strong><br />

acolhimento das diferenças, <strong>de</strong> valorização <strong>de</strong> cada sujeito.<br />

Do ponto <strong>de</strong> vista sanitário, a França adotou a territorialização e<br />

a setorização da assistência, permitindo um melhor conhecimento<br />

da população, o que propicia a elaboração <strong>de</strong> programas <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> num processo <strong>de</strong> maior aproximação entre <strong>os</strong> profissionais<br />

e <strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>. É a chamada Psiquiatria <strong>de</strong> Setor. Outro principio<br />

do mo<strong>de</strong>lo é a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tratamento ou seja, uma<br />

59


mesma equipe <strong>de</strong>ve se encarregar do paciente n<strong>os</strong> diferentes<br />

serviç<strong>os</strong> e moment<strong>os</strong> do tratamento, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a prevenção até<br />

a cura e a pós cura, tendo como base e referência para o<br />

acompanhamento o território a que pertence. O objetivo <strong>de</strong>sse<br />

mo<strong>de</strong>lo é <strong>de</strong> se evitar que o h<strong>os</strong>pital psiquiátrico seja o centro da<br />

atenção a saú<strong>de</strong> mental, <strong>de</strong>vendo o usuário ser prioritariamente<br />

tratado n<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> extra-h<strong>os</strong>pitalares.<br />

• As comunida<strong>de</strong>s terapêuticas <strong>no</strong> sistema <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> da Grã-<br />

Bretanha<br />

O funcionamento d<strong>os</strong> h<strong>os</strong>pitais psiquiátric<strong>os</strong> como<br />

comunida<strong>de</strong>s terapêuticas foi uma experiência predominante<br />

n<strong>os</strong> países anglo-saxões. Nas comunida<strong>de</strong>s terapêuticas, a<br />

responsabilida<strong>de</strong> pelo tratamento não é apenas do corpo técnico,<br />

mas também <strong>de</strong> outr<strong>os</strong> integrantes da comunida<strong>de</strong>, inclusive e<br />

principalmente d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>. Nestas instituições pressupõe-se<br />

a criação <strong>de</strong> um ambiente <strong>de</strong> co-responsabilida<strong>de</strong> entre tod<strong>os</strong><br />

que estejam na comunida<strong>de</strong>. O mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> anglo-saxão<br />

também previu a implantação <strong>de</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental diário<br />

com a criação <strong>de</strong> unida<strong>de</strong>s psiquiátricas em h<strong>os</strong>pitais gerais. Um<br />

ponto fundamental <strong>de</strong>sse mo<strong>de</strong>lo é a garantia <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong><br />

do tratamento pelo médico <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> da família. Também nesse<br />

mo<strong>de</strong>lo a mesma equipe <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental atendia às <strong>de</strong>mandas<br />

ambulatoriais e h<strong>os</strong>pitalares n<strong>os</strong> diferentes recurs<strong>os</strong> da área,<br />

f<strong>os</strong>sem <strong>de</strong> pacientes crônic<strong>os</strong> ou agud<strong>os</strong>. O sistema <strong>de</strong> saú<strong>de</strong><br />

inglês é dividido em regiões e cada região se divi<strong>de</strong> em áreas.<br />

(COOPER, 1992; DESVIAT pag.37).<br />

• Psiquiatria comunitária ou preventiva (EUA)<br />

É <strong>de</strong> conhecimento <strong>de</strong> tod<strong>os</strong> que o sistema <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> america<strong>no</strong><br />

não é universal e tão pouco se constitui como um direito <strong>de</strong> tod<strong>os</strong><br />

e <strong>de</strong>ver do estado. Os american<strong>os</strong> têm o seu sistema <strong>de</strong> saú<strong>de</strong><br />

ainda hoje dominado pelas seguradoras. No entanto, a saú<strong>de</strong><br />

pública se ocupa <strong>de</strong> dois programas naquele país. O primeiro<br />

60


direcionado para <strong>os</strong> pobres e ao tratamento das tubercul<strong>os</strong>es, <strong>de</strong><br />

portadores <strong>de</strong> doenças venéreas, <strong>de</strong> usuári<strong>os</strong> <strong>de</strong> álcool e outras<br />

drogas e ao atendimento à saú<strong>de</strong> mental; o segundo é o programa<br />

<strong>de</strong> proteção pública contra <strong>os</strong> risc<strong>os</strong> ambientais (DESVIAT, 1999).<br />

N<strong>os</strong> an<strong>os</strong> 1960, o gover<strong>no</strong> Kennedy, criou <strong>os</strong> centr<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong><br />

mental, que tinham <strong>de</strong>ntre <strong>os</strong> seus objetiv<strong>os</strong> a garantia <strong>de</strong> acesso<br />

e <strong>de</strong> informações a<strong>de</strong>quadas à população alvo sobre a existência<br />

e as características d<strong>os</strong> diferentes programas, a gratuida<strong>de</strong>,<br />

a ênfase na prevenção <strong>de</strong> doenças e a responsabilização do<br />

gover<strong>no</strong> pelo doente e sua família. Esses centr<strong>os</strong> <strong>de</strong>veriam<br />

proporcionar atendiment<strong>os</strong> <strong>de</strong> emergência e a h<strong>os</strong>pitalização<br />

d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> 24 horas por dia, tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> dias da semana, as<br />

consultas externas e a educação da comunida<strong>de</strong>. Também foram<br />

implantad<strong>os</strong> programas <strong>de</strong> atenção infantil, casas <strong>de</strong> transição,<br />

programas para <strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> <strong>de</strong> álcool e outras drogas e o sistema<br />

<strong>de</strong> avaliação. No entanto, esta política governamental não teve<br />

êxito, pois <strong>os</strong> centr<strong>os</strong> estavam sem o suporte <strong>de</strong> um sistema<br />

nacional <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> pública e foram implantad<strong>os</strong> em número<br />

insuficiente para a <strong>de</strong>manda existente (DESVIAT, 1999).<br />

Do ponto <strong>de</strong> vista conceitual, a psiquiatria americana foi marcada<br />

pelas i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> prevenção <strong>de</strong> Gerald Kaplan, que consistia num<br />

conceito <strong>de</strong> prevenção em saú<strong>de</strong> mental articulado em três níveis.<br />

O nível primário consistia em se intervir nas condições individuais<br />

e ambientais <strong>de</strong> formação da doença mental; o segundo nível<br />

ocupava-se do diagnóstico precoce das doenças mentais; e o<br />

terceiro nível referia-se à readaptação do usuário à vida social<br />

após o seu momento <strong>de</strong> crise e consequente melhora. O recurso<br />

à internação psiquiátrica apenas ocorria quando esgotada outras<br />

p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> tratamento e apenas por curt<strong>os</strong> períod<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

tempo (DESVIAT, 1999, pag. 60 a 61).<br />

• A Psiquiatria <strong>de</strong>mocrática italiana<br />

A implantação do mo<strong>de</strong>lo italia<strong>no</strong> tem na figura do psiquiatra<br />

Franco Basaglia e <strong>de</strong> outr<strong>os</strong> psiquiatras que integraram o<br />

seu grupo, como Franco Rotelli, a construção <strong>de</strong> uma <strong>no</strong>va<br />

realida<strong>de</strong> para a psiquiatria, colocando em questão a existência<br />

61


da instituição psiquiátrica <strong>no</strong> centro da discussão do processo<br />

<strong>de</strong> reforma por entendê-la como uma instituição <strong>de</strong> violência e<br />

violadora permanente d<strong>os</strong> direit<strong>os</strong> human<strong>os</strong> e <strong>de</strong> cidadania. O<br />

mo<strong>de</strong>lo italia<strong>no</strong> <strong>de</strong> assistência também pressupõe o mo<strong>de</strong>lo<br />

territorializado, com a superação gradativa d<strong>os</strong> h<strong>os</strong>pitais<br />

psiquiátric<strong>os</strong> e sua substituição por uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> mental cujo funcionamento é integrado <strong>de</strong>ntro do território,<br />

prevendo que uma mesma equipe <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental <strong>de</strong>ve fazer<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> as visitas domiciliares e <strong>de</strong>mais acompanhamento do<br />

paciente em tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> seus moment<strong>os</strong>. O projeto essencial é<br />

<strong>de</strong>volver a<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> sua condição <strong>de</strong> cidadania e participação<br />

social.<br />

Tod<strong>os</strong> esses mo<strong>de</strong>l<strong>os</strong> apresentam alguns pont<strong>os</strong> em comum<br />

que merecem <strong>de</strong>staque, tais como:<br />

- Os mo<strong>de</strong>l<strong>os</strong> se <strong>de</strong>senvolveram <strong>de</strong> maneira <strong>de</strong>sigual <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong><br />

cada país conforme cada região.<br />

- Regiões on<strong>de</strong> se tem uma gama diferenciada <strong>de</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> mental e projet<strong>os</strong> efetiv<strong>os</strong> <strong>de</strong> reinserção social <strong>de</strong>monstram<br />

que é p<strong>os</strong>sível prescindir d<strong>os</strong> h<strong>os</strong>pitais psiquiátric<strong>os</strong>.<br />

- Evi<strong>de</strong>nciam necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> investiment<strong>os</strong> <strong>de</strong> recurs<strong>os</strong><br />

financeir<strong>os</strong> e a firme <strong>de</strong>cisão d<strong>os</strong> grup<strong>os</strong> condutores da política<br />

em se fazer a reforma com clareza d<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> conceituais e<br />

étic<strong>os</strong> que p<strong>os</strong>sibilitem efetivamente que <strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong><br />

mental p<strong>os</strong>sam se tratar em liberda<strong>de</strong> e ter uma existência<br />

digna, com seus direit<strong>os</strong> human<strong>os</strong> respeitad<strong>os</strong>.<br />

- Guardada as <strong>de</strong>vidas diferenças entre <strong>os</strong> mo<strong>de</strong>l<strong>os</strong>, fica claro<br />

que tod<strong>os</strong> buscam diminuir ou prescindir do h<strong>os</strong>pital psiquiátrico<br />

como centro do tratamento.<br />

- As reformas psiquiátricas evoluem melhor quando realizadas<br />

juntamente com as reformas sanitárias <strong>de</strong> cada país.<br />

62


- Os process<strong>os</strong> <strong>de</strong> reforma psiquiátrica estão inserid<strong>os</strong> n<strong>os</strong><br />

context<strong>os</strong> sociais e polític<strong>os</strong> <strong>de</strong> cada país e sofrem <strong>os</strong><br />

reflex<strong>os</strong> das políticas mais amplas d<strong>os</strong> govern<strong>os</strong> em relação à<br />

constituição <strong>de</strong> seus sistemas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>.<br />

O processo <strong>de</strong> reforma psiquiátrica <strong>no</strong> Brasil<br />

• O processo <strong>de</strong> mudança <strong>no</strong> campo da assistência em<br />

saú<strong>de</strong> mental que tem<strong>os</strong> assistido <strong>no</strong> Brasil n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong><br />

an<strong>os</strong>, conhecido como Reforma Psiquiátrica, apresenta uma<br />

e<strong>no</strong>rme complexida<strong>de</strong>, seja <strong>no</strong> campo político, assistencial<br />

ou cultural a que está referida. A Reforma Psiquiátrica<br />

Brasileira tem antece<strong>de</strong>ntes históric<strong>os</strong> distantes e múltipl<strong>os</strong>,<br />

que estão ao mesmo tempo vinculad<strong>os</strong> a moviment<strong>os</strong><br />

sociais, experiências <strong>de</strong> assistência e transformação <strong>de</strong><br />

marc<strong>os</strong> teóric<strong>os</strong> e conceituais relativ<strong>os</strong> ao campo. No geral<br />

e consi<strong>de</strong>rando a pluralida<strong>de</strong> que constitui essa trajetória,<br />

tem<strong>os</strong> como marca comum um processo <strong>no</strong> qual, em vári<strong>os</strong><br />

países do mundo, e inclusive <strong>no</strong> Brasil, trabalhadores da<br />

saú<strong>de</strong> mental se p<strong>os</strong>icionaram contra as condições <strong>de</strong> vida<br />

e a forma exclu<strong>de</strong>nte e <strong>de</strong>sumana <strong>de</strong> atenção a que estavam<br />

submetidas as pessoas portadoras <strong>de</strong> sofrimento mental. A<br />

reforma psiquiátrica brasileira sofreu e sofre a influência <strong>de</strong><br />

tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> process<strong>os</strong> <strong>de</strong> reforma acima citad<strong>os</strong> e apresenta<br />

também suas particularida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> acordo com a diversida<strong>de</strong><br />

política cultural brasileira. N<strong>os</strong>sa reforma é influenciada pel<strong>os</strong><br />

princípi<strong>os</strong> conceituais <strong>de</strong> importantes autores da Europa<br />

e Estad<strong>os</strong> Unid<strong>os</strong>, mas também sofrem<strong>os</strong> a influência da<br />

produção recente <strong>de</strong> inúmer<strong>os</strong> profissionais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental<br />

<strong>de</strong> diferentes pont<strong>os</strong> do país que constroem <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong> <strong>de</strong><br />

seu trabalho referências importantes que compõem a n<strong>os</strong>sa<br />

extensa re<strong>de</strong> nacional <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental, conforme buscam<strong>os</strong><br />

elencar ao final <strong>de</strong>sse trabalho. De todo modo, é importante<br />

consi<strong>de</strong>rar que em cada país esse processo se <strong>de</strong>u a partir<br />

das condições objetivas e concretas configuradas. No Brasil,<br />

como vim<strong>os</strong>, a instituição do SUS é referência fundamental<br />

para organização da Política <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental, p<strong>os</strong>to que é<br />

63


nesse Sistema que ela se realiza. Consi<strong>de</strong>rando o processo<br />

<strong>no</strong> qual esse se tor<strong>no</strong>u p<strong>os</strong>sível, a produção <strong>de</strong> uma série<br />

<strong>de</strong> marc<strong>os</strong> legais influíram <strong>de</strong>cisivamente na implantação<br />

da reforma psiquiátrica brasileira. Assim, passam<strong>os</strong> a citar<br />

marc<strong>os</strong> essenciais para a consolidação e institucionalização<br />

da Reforma Psiquiátrica como política <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental <strong>no</strong><br />

Brasil: a I Conferencia Nacional <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental (1987). A<br />

realização <strong>de</strong>sta conferência, como <strong>de</strong>sdobramento da VIII<br />

Conferência Nacional <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>, já citada anteriormente,<br />

foi um momento importante <strong>de</strong> discussão da construção<br />

<strong>de</strong> <strong>no</strong>vas políticas assistenciais, <strong>de</strong> uma <strong>no</strong>va legislação<br />

psiquiátrica e da cidadania enquanto um eixo orientador<br />

<strong>de</strong>stas discussões. Nesta conferência aconteceu uma<br />

reunião “paralela”, que <strong>de</strong>u origem ao Encontro <strong>de</strong> Bauru.<br />

• Encontro <strong>de</strong> Bauru (1987). Criação do movimento<br />

da Luta Antimanicomial com uma utopia ativa “Por<br />

Uma Socieda<strong>de</strong> Sem Manicômi<strong>os</strong>”. Criação do dia 18<br />

<strong>de</strong> Maio como Dia Nacional <strong>de</strong> Luta Antimanicomial.<br />

• Lei 8080. Dispõe sobre as condições para a promoção,<br />

proteção e recuperação da saú<strong>de</strong>, a organização e o<br />

funcionamento d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> correspon<strong>de</strong>ntes e dá outras<br />

providências. Esta lei entrou em vigor em 19 <strong>de</strong> Setembro<br />

<strong>de</strong> 1990. A partir <strong>de</strong>la foi <strong>de</strong>finida a responsabilização da<br />

União, Estad<strong>os</strong>, Distrito Fe<strong>de</strong>ral e Municípi<strong>os</strong>, com as<br />

atribuições <strong>de</strong> elaborar as <strong>no</strong>rmas para regular as ações e<br />

serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> executad<strong>os</strong> isoladamente ou em conjunto<br />

por pessoas naturais ou jurídicas, <strong>de</strong> direito público ou<br />

privado. Começou-se a estruturar o Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>.<br />

• Lei 8142, 28 <strong>de</strong> Dezembro <strong>de</strong> 1990. Esta lei surgiu<br />

<strong>de</strong>vido a<strong>os</strong> vet<strong>os</strong> que a Lei 8080/90 recebeu em relação<br />

à participação da comunida<strong>de</strong> (Artigo 11-vetado) e ao<br />

repasse direto <strong>de</strong> recurs<strong>os</strong> (§§2º e 3º, do Art.33e § 5º Art.35-<br />

vetad<strong>os</strong>). Com esta lei foi p<strong>os</strong>sível garantir a participação da<br />

64


comunida<strong>de</strong> <strong>no</strong> controle e fiscalização do SUS, mediante<br />

a criação d<strong>os</strong> Conselh<strong>os</strong> <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> e das Conferências <strong>de</strong><br />

Saú<strong>de</strong>, visto que estes disp<strong>os</strong>itiv<strong>os</strong> são <strong>de</strong> fundamental<br />

importância para o crescimento do SUS. Também foi<br />

disciplinada a transferência d<strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> arrecadad<strong>os</strong><br />

pela União para <strong>os</strong> Estad<strong>os</strong>, Distrito Fe<strong>de</strong>ral e Municípi<strong>os</strong>.<br />

• Projeto <strong>de</strong> Lei Paulo Delgado (1989). Mecanismo<br />

importante para garantir a discussão por todo o território<br />

nacional da prop<strong>os</strong>ta <strong>de</strong> criação <strong>de</strong> uma lei com o objetivo<br />

<strong>de</strong> proteger, promover e melhorar a vida das pessoas com<br />

transtorn<strong>os</strong> mentais, por serem particularmente pessoas<br />

vulneráveis e vítimas <strong>de</strong> abus<strong>os</strong> e violação d<strong>os</strong> seus direit<strong>os</strong>.<br />

O projeto refletiria uma socieda<strong>de</strong> que respeita e cuida <strong>de</strong><br />

seu povo. A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> se fazer uma lei surgiu d<strong>os</strong> militantes<br />

da luta antimanicomial, com o apoio total <strong>de</strong> um parlamentar<br />

comprometido com um projeto <strong>de</strong> transformação nacional,<br />

o ex-<strong>de</strong>putado fe<strong>de</strong>ral Paulo Delgado. A lei <strong>de</strong>veria ser um<br />

marco referencial para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> mental, para garantir atenção, tratament<strong>os</strong> a<strong>de</strong>quad<strong>os</strong> e<br />

apropriad<strong>os</strong> à proteção d<strong>os</strong> direit<strong>os</strong> <strong>de</strong> pessoas com transtorn<strong>os</strong><br />

mentais e a promoção <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental das populações.<br />

• Intervenção <strong>no</strong> H<strong>os</strong>pital Psiquiátrico “Anchieta” em Sant<strong>os</strong><br />

(1989). Marco <strong>de</strong>cisivo para viabilização e a <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong><br />

que era p<strong>os</strong>sível prescindir do h<strong>os</strong>pital psiquiátrico e realizar<br />

sua substituição efetiva por uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> serviç<strong>os</strong> abert<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

atenção contínua, orientad<strong>os</strong> pelo respeito à cidadania d<strong>os</strong><br />

usuári<strong>os</strong>. A construção <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> substitutiva ao h<strong>os</strong>pital<br />

psiquiátrico <strong>no</strong> município <strong>de</strong> Sant<strong>os</strong> em São Paulo inspirou a<br />

criação em vári<strong>os</strong> municípi<strong>os</strong> do país <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental.<br />

• II Conferencia Nacional <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental (1992).<br />

Marco <strong>de</strong> consolidação da participação d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> na<br />

conferência e aprofundamento das discussões a respeito<br />

das legislações, assistência e cidadania d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>. A III<br />

Conferência Nacional <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental (2001) contou com<br />

65


gran<strong>de</strong> participação d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> e ampliou o <strong>de</strong>bate sobre<br />

mo<strong>de</strong>lo assistencial, recurs<strong>os</strong> human<strong>os</strong> e financiamento. A<br />

IV Conferência Nacional Intersetorial <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental foi<br />

conquistada pela Marcha d<strong>os</strong> Usuári<strong>os</strong> a Brasília, em 2010.<br />

• Encontro Nacional d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>. I Encontro Nacional em<br />

São Paulo (1991), II Encontro Nacional <strong>no</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro<br />

(1992), III Encontro Nacional em Sant<strong>os</strong> (1993), IV Encontro<br />

Nacional em Goiânia (2000). Marc<strong>os</strong> da participação crescente<br />

<strong>de</strong> usuári<strong>os</strong> e familiares <strong>no</strong> movimento da Luta Antimanicomial.<br />

Um d<strong>os</strong> resultad<strong>os</strong> <strong>de</strong>sses encontr<strong>os</strong> foi a aprovação da carta<br />

<strong>de</strong> direit<strong>os</strong> e <strong>de</strong>veres d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>, <strong>no</strong> encontro <strong>de</strong> Sant<strong>os</strong>.<br />

• I Encontro Nacional da Luta Antimanicomial em Salvador<br />

(1993) - Marco <strong>de</strong> consolidação <strong>de</strong> um movimento social <strong>de</strong><br />

abrangência nacional com a participação <strong>de</strong> profissionais,<br />

usuári<strong>os</strong> e familiares. No encontro houve a <strong>de</strong>finição do<br />

processo organizativo do movimento e o importante espaço<br />

<strong>de</strong> troca <strong>de</strong> experiências antimanicomiais <strong>de</strong> todo país. O<br />

movimento realiza ainda, o II Encontro Nacional em Betim/<br />

MG (1995), III Encontro Nacional em Porto Alegre/RS (1997),<br />

IV Encontro Nacional em Paripueira/AL (1999), V Encontro<br />

Nacional em Miguel Pereira/RJ (2001). Que <strong>de</strong>ram origem a<br />

dois moviment<strong>os</strong>: MLA – Movimento da Luta Antimanicomial e a<br />

RENILA – Re<strong>de</strong> Nacional Internúcle<strong>os</strong> da Luta Antimanicomial.<br />

• A Lei 10216 <strong>de</strong> 06/04/2001. Esta Lei foi fruto <strong>de</strong> um longo<br />

trabalho <strong>no</strong> Congresso Nacional a partir do projeto <strong>de</strong> lei <strong>de</strong><br />

autoria do <strong>de</strong>putado Paulo Delgado, acima citado. Em todo<br />

período <strong>de</strong> sua tramitação houve inúmeras discussões,<br />

<strong>de</strong>bates, seminári<strong>os</strong>, <strong>no</strong> Congresso Nacional e por todo país,<br />

tendo finalmente sido aprovada uma legislação que, embora<br />

não se expresse com a <strong>de</strong>terminação do projeto original em<br />

relação à efetiva extinção d<strong>os</strong> h<strong>os</strong>pitais psiquiátric<strong>os</strong>, aponta<br />

para a reorientação do mo<strong>de</strong>lo assistencial e garante direit<strong>os</strong><br />

human<strong>os</strong> mínim<strong>os</strong> a<strong>os</strong> portadores <strong>de</strong> sofrimento mental.<br />

66


Apesar <strong>de</strong> term<strong>os</strong>, com a <strong>no</strong>va Constituição, uma legislação<br />

i<strong>no</strong>vadora e progressista, com diretrizes para a criação <strong>de</strong> políticas<br />

fortes, ainda não alteram<strong>os</strong> significativamente as <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s<br />

sociais para a efetiva criação <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> mais justa e<br />

igualitária <strong>no</strong> que tange principalmente ao acesso e garantia<br />

<strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> das políticas públicas. Os direit<strong>os</strong> sociais ainda<br />

estão sendo tratad<strong>os</strong> por áreas ou setores segmentad<strong>os</strong>. Apesar<br />

d<strong>os</strong> avanç<strong>os</strong> <strong>de</strong> uma Constituição que instituiu a segurida<strong>de</strong><br />

social, afirmando saú<strong>de</strong>, previdência e assistência como áreas<br />

integradas <strong>de</strong> proteção social e exigindo a garantia <strong>de</strong> proteção<br />

a risc<strong>os</strong> que po<strong>de</strong>m atingir indistintamente tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> cidadã<strong>os</strong>,<br />

o que se vê atualmente são setores que funcionam ainda <strong>de</strong><br />

maneira fragmentada. Embora cada área tenha por diretriz a<br />

<strong>de</strong>scentralização <strong>de</strong> suas ações, ainda funcionam <strong>de</strong> maneira<br />

vertical em tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> níveis <strong>de</strong> gover<strong>no</strong>.<br />

Os reflex<strong>os</strong> <strong>de</strong>ssas formas <strong>de</strong> estruturação <strong>de</strong> políticas públicas<br />

aparecem cotidianamente n<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> ofertad<strong>os</strong> às populações,<br />

especialmente a<strong>os</strong> grup<strong>os</strong> que necessitam <strong>de</strong> formas e estratégias<br />

<strong>de</strong> proteção que requerem ações transversais e integradas,<br />

especialmente <strong>os</strong> portadores <strong>de</strong> sofrimento mental, usuári<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

álcool e outras drogas, id<strong>os</strong><strong>os</strong>, crianças e adolescentes e outr<strong>os</strong><br />

grup<strong>os</strong> vulneráveis <strong>de</strong> n<strong>os</strong>sa socieda<strong>de</strong>.<br />

Como foi visto anteriormente, o processo <strong>de</strong> construção das<br />

políticas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>no</strong> Brasil vem <strong>de</strong> um longo período, marcado<br />

por um permanente tensionamento entre <strong>os</strong> ansei<strong>os</strong> da socieda<strong>de</strong><br />

na conquista e garantia <strong>de</strong> seus direit<strong>os</strong> e a própria organização<br />

e direção política do Estado Brasileiro.<br />

O direito à saú<strong>de</strong> é um d<strong>os</strong> pilares na constituição <strong>de</strong> uma<br />

socieda<strong>de</strong> mais justa e <strong>de</strong>mocrática. Efetivá-lo significa ir além<br />

d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> assistenciais sanitári<strong>os</strong>. Saú<strong>de</strong> é um conceito que<br />

expressa um processo complexo e a garantia <strong>de</strong> seu direito<br />

revela essa complexida<strong>de</strong> também na medida em que se torna<br />

necessária a construção <strong>de</strong> políticas específicas <strong>no</strong> interior da<br />

política pública <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, como é o caso da política <strong>de</strong> saú<strong>de</strong><br />

mental.<br />

A conquista da saú<strong>de</strong> como direito <strong>de</strong> tod<strong>os</strong> e política pública<br />

estatal é, ao mesmo tempo, ainda uma luta. Inúmeras resistências<br />

67


se reapresentam a cada momento sob <strong>no</strong>v<strong>os</strong> <strong>de</strong>senh<strong>os</strong>. As<br />

atuais tendências e o fortalecimento efetivo da perspectiva da<br />

privatização, na medida em que se realiza em gestões concretas,<br />

explicitam dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> avançar o SUS, <strong>de</strong> realizar a qualida<strong>de</strong><br />

da assistência, <strong>de</strong> constituir re<strong>de</strong>s, <strong>de</strong> fazer concretizar <strong>os</strong><br />

princípi<strong>os</strong> da atenção integral e do controle social. Embora<br />

afirmada como direito, na construção das políticas locais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>,<br />

estaduais e municipais, assistiu-se uma e<strong>no</strong>rme diversida<strong>de</strong>, com<br />

a existência <strong>de</strong> gestões que resistem à implementação <strong>de</strong> uma<br />

re<strong>de</strong> pública <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e <strong>de</strong> políticas sociais intersetoriais, o que<br />

se <strong>de</strong>sdobra em inúmeras dificulda<strong>de</strong>s na assistência prestada<br />

pel<strong>os</strong> trabalhadores n<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> existentes. No campo da saú<strong>de</strong><br />

mental, embora exista um redirecionamento e ampliação d<strong>os</strong><br />

recurs<strong>os</strong> para o setor, existe um constante tensionamento em<br />

tor<strong>no</strong> da inversão da lógica do mo<strong>de</strong>lo assistencial h<strong>os</strong>pitalar para<br />

a implantação <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo assistencial aberto e comunitário.<br />

A construção da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> serviç<strong>os</strong> substitutiv<strong>os</strong> (Centr<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

Atenção Psic<strong>os</strong>sociais - CAPS, Centr<strong>os</strong> <strong>de</strong> Convivência, Serviç<strong>os</strong><br />

Resi<strong>de</strong>nciais Terapêutic<strong>os</strong>, Núcle<strong>os</strong> <strong>de</strong> Trabalh<strong>os</strong> Cooperad<strong>os</strong>,<br />

leit<strong>os</strong> em h<strong>os</strong>pitais gerais, consultóri<strong>os</strong> <strong>de</strong> rua, atenção à saú<strong>de</strong><br />

mental na atenção básica) tem sido implementada por inúmer<strong>os</strong><br />

municípi<strong>os</strong> como <strong>no</strong>v<strong>os</strong> espaç<strong>os</strong> assistenciais, que objetivam<br />

pôr fim ao silenciamento e à exclusão que milhares <strong>de</strong> pessoas<br />

trazem do chamado “tratamento n<strong>os</strong> h<strong>os</strong>pitais psiquiátric<strong>os</strong>”.<br />

Contudo, há municípi<strong>os</strong> e estad<strong>os</strong> que ainda encontram fortes<br />

resistências e gestões que insistem em retomar e fortalecer<br />

antig<strong>os</strong> mo<strong>de</strong>l<strong>os</strong> e perspectivas, fazendo, por exemplo, coexistir<br />

o h<strong>os</strong>pital psiquiátrico, sucateando a re<strong>de</strong> substitutiva, ou (re)<br />

investindo em mo<strong>de</strong>l<strong>os</strong> ambulatoriais.<br />

O objetivo maior <strong>de</strong>sses <strong>no</strong>v<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> e da re<strong>de</strong> substitutiva é<br />

acolher e resgatar a subjetivida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada um e, ao mesmo tempo,<br />

p<strong>os</strong>sibilitar a construção <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s relacionais e <strong>de</strong> convivência<br />

social. A implantação <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo psic<strong>os</strong>social implica numa<br />

mudança <strong>de</strong> concepção acerca das pessoas com sofrimento<br />

mental e na busca <strong>de</strong> saídas e construção <strong>de</strong> estratégias em<br />

divers<strong>os</strong> camp<strong>os</strong> que fazem conexão direta ou indiretamente com<br />

o campo da saú<strong>de</strong> mental, para fazer caber entre nós aquilo que<br />

68


muit<strong>os</strong> consi<strong>de</strong>ram não ter cabimento: a loucura.<br />

Esse <strong>de</strong>safio é especialmente complexo n<strong>os</strong> dias atuais, dado<br />

o momento <strong>de</strong>licado pelo qual passa o Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong><br />

– SUS: as forças contrárias ao sistema se unem buscando a sua<br />

privatização, aliad<strong>os</strong> a<strong>os</strong> tec<strong>no</strong>cratas do próprio sistema que<br />

ce<strong>de</strong>m a essas pressões. Isso coloca em risco uma conquista<br />

histórica do povo brasileiro: ter a saú<strong>de</strong> como um direito inalienável<br />

e inequívoco.<br />

69


EIXO II – PSICOLOGIA E POLÍTICAS<br />

PÚBLICAS DE SAÚDE MENTAL:<br />

A NECESSÁRIA MUDANÇA DE<br />

PERSPECTIVA<br />

71


EIXO II – PSICOLOGIA E POLÍTICAS PÚBLICAS DE<br />

SAÚDE MENTAL: A NECESSÁRIA MUDANÇA DE<br />

PERSPECTIVA<br />

História da Psicologia e sua Relação com as Políticas Públicas<br />

<strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> / Saú<strong>de</strong> Mental<br />

As mudanças que se <strong>de</strong>senvolveram <strong>no</strong> Brasil a partir do<br />

final do século XIX, relativas principalmente às transformações<br />

econômicas, <strong>de</strong> organização social e seus <strong>de</strong>sdobrament<strong>os</strong><br />

<strong>no</strong> campo cultural, foram <strong>de</strong> fundamental importância para a<br />

expansão do saber psicológico nas áreas da saú<strong>de</strong>, da educação<br />

e do trabalho. O crescimento do processo <strong>de</strong> urbanização e<br />

industrialização do país e o agravamento <strong>de</strong> problemas sociais<br />

enfrentad<strong>os</strong> <strong>de</strong>mandaram resp<strong>os</strong>tas que viriam a se concretizar<br />

com a presença da Psicologia e <strong>de</strong> outras disciplinas subsidiando<br />

<strong>os</strong> process<strong>os</strong> <strong>de</strong> administração científica do trabalho, da saú<strong>de</strong> e<br />

da educação. (ANTUNES, 2001)<br />

Coinci<strong>de</strong>nte com esse processo, vem<strong>os</strong> surgir nesse momento<br />

<strong>os</strong> primeir<strong>os</strong> h<strong>os</strong>píci<strong>os</strong> brasileir<strong>os</strong>, como resp<strong>os</strong>ta às <strong>de</strong>mandas<br />

<strong>de</strong> organização social impulsionadas pelo progresso e as <strong>no</strong>vas<br />

configurações do cenário brasileiro. Nesse contexto, “(...) a<br />

medicina higiênica – como a medicina mental – vai constituir um<br />

discurso sobre todas as instâncias da vida, invadindo as esferas<br />

das relações pessoais para moldá-las segundo <strong>os</strong> propósit<strong>os</strong> da<br />

or<strong>de</strong>m e da disciplina urbana” (CUNHA, 1986, p.35).<br />

Os h<strong>os</strong>píci<strong>os</strong> representarão, então, uma forma <strong>de</strong> manejo<br />

da população consi<strong>de</strong>rada resídu<strong>os</strong> improdutiv<strong>os</strong> e <strong>de</strong> uma<br />

e<strong>no</strong>rme massa <strong>de</strong> sujeit<strong>os</strong> que não respondiam às exigências <strong>de</strong><br />

contratualida<strong>de</strong> das <strong>no</strong>vas formas <strong>de</strong> organização da vida social.<br />

No interior d<strong>os</strong> h<strong>os</strong>píci<strong>os</strong> e <strong>de</strong> instituições médicas correlatas, o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento e a expansão d<strong>os</strong> conheciment<strong>os</strong> psicológic<strong>os</strong><br />

representavam a contribuição da Psicologia como ciência afim<br />

à Psiquiatria. A Psicologia subsidiava não apenas as finalida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> higienização social, como apontava para um conjunto <strong>de</strong><br />

práticas clínicas, <strong>de</strong> origem profilática e direcionadas a<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />

consi<strong>de</strong>rad<strong>os</strong> <strong>no</strong>rmais (ANTUNES, 2001).<br />

73


Sem dúvida, essa direção não representava a totalida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

práticas psicológicas <strong>de</strong>stinadas a<strong>os</strong> chamad<strong>os</strong> louc<strong>os</strong>, alienad<strong>os</strong>,<br />

ou doentes mentais. Perspectivas contra-hegemônicas, num<br />

primeiro momento claramente orientadas pelas contribuições<br />

da Psicanálise, apresentavam-se na direção <strong>de</strong> resgatar as<br />

singularida<strong>de</strong>s, <strong>os</strong> sentid<strong>os</strong> e as trajetórias expressas nas<br />

experiências tomadas e reduzidas pelo saber médico-psicológico<br />

como doença.<br />

No século seguinte o <strong>de</strong>senvolvimento da Psicologia como<br />

ciência, a expansão do seu ensi<strong>no</strong> em diferentes curs<strong>os</strong> e seus<br />

<strong>de</strong>sdobrament<strong>os</strong> em práticas <strong>de</strong> intervenção como resp<strong>os</strong>ta a<br />

<strong>de</strong>mandas da socieda<strong>de</strong> brasileira naquele momento levaram<br />

à regulamentação da profissão, que se <strong>de</strong>u em 1962. A<br />

profissionalização da Psicologia e a perspectiva da formação<br />

superior como p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ascensão para as camadas<br />

médias da população levaram ao aumento do número <strong>de</strong> curs<strong>os</strong><br />

e da procura <strong>de</strong> estudantes para <strong>os</strong> mesm<strong>os</strong>. “Em 1975, vam<strong>os</strong><br />

assistir a um verda<strong>de</strong>iro boom <strong>de</strong> psicólogas(<strong>os</strong>) e <strong>de</strong> escolas <strong>de</strong><br />

Psicologia” (BOCK, 1999, p. 75). Além disso, é preciso consi<strong>de</strong>rar<br />

que a institucionalização da profissão, por meio da criação legal<br />

d<strong>os</strong> Conselh<strong>os</strong> <strong>de</strong> Psicologia em 1971, e ainda sua organização<br />

em associações e socieda<strong>de</strong>s extra-universitárias tem um papel<br />

importante na consolidação da profissão. Ao lado d<strong>os</strong> Conselh<strong>os</strong><br />

profissionais, outras entida<strong>de</strong>s e associações organizativas<br />

da Psicologia vão se constituindo, representando processo<br />

importante para o crescimento e o reconhecimento da profissão.<br />

O resultado <strong>de</strong>sse processo po<strong>de</strong> ser claramente observado hoje,<br />

numa Psicologia que conta com cerca <strong>de</strong> 220 mil profissionais<br />

inscrit<strong>os</strong> ativ<strong>os</strong> <strong>no</strong> Sistema Conselh<strong>os</strong> <strong>de</strong> Psicologia e com um<br />

conjunto <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s relativas ao campo sindical, ao campo da<br />

formação e ainda outras tantas relativas a áreas específicas <strong>de</strong><br />

atuação e produção <strong>de</strong> conhecimento em Psicologia.<br />

O crescimento da profissão e sua frágil incorporação <strong>no</strong> mercado<br />

formal <strong>de</strong> trabalho, assim como a tradição <strong>de</strong> formação presente<br />

n<strong>os</strong> curs<strong>os</strong>, caracterizará a Psicologia da década <strong>de</strong> 1970, cujas<br />

marcas ainda estão fortemente presentes na profissão. Segundo<br />

Bock (1999), as(<strong>os</strong>) psicólogas(<strong>os</strong>) brasileiras(<strong>os</strong>) concentram<br />

74


sua atuação <strong>no</strong> campo da clínica privada, <strong>de</strong>senvolvendo uma<br />

prática elitista e <strong>de</strong>scolada do movimento histórico do país. É<br />

apenas a partir da década <strong>de</strong> 1980 que, por meio <strong>de</strong> moviment<strong>os</strong><br />

encabeçad<strong>os</strong> inicialmente pelas entida<strong>de</strong>s organizativas da<br />

categoria, a profissão começa a pautar pont<strong>os</strong> relativ<strong>os</strong> às<br />

p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> resp<strong>os</strong>tas da Psicologia às urgências das lutas<br />

sociais travadas na direção da <strong>de</strong>mocratização da socieda<strong>de</strong> e<br />

da promoção da justiça social. É assim que as(<strong>os</strong>) psicólogas(<strong>os</strong>),<br />

talvez mais claramente algumas <strong>de</strong> suas entida<strong>de</strong>s organizativas,<br />

passam a se implicar em process<strong>os</strong> como a luta por melhores<br />

condições <strong>de</strong> trabalho, as necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> proteção<br />

integral às crianças e adolescentes, a luta por uma política<br />

pública <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> universal e integral, <strong>de</strong>ntre outr<strong>os</strong>. A Psicologia<br />

passa a ter em sua pauta as graves <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s da socieda<strong>de</strong><br />

brasileira e a promoção <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> proteção e garantia <strong>de</strong><br />

direit<strong>os</strong> sociais.<br />

É nesse momento histórico que as(<strong>os</strong>) profissionais<br />

psicólogas(<strong>os</strong>) participam ativamente d<strong>os</strong> moviment<strong>os</strong> pela<br />

Reforma Sanitária <strong>no</strong> país, citad<strong>os</strong> <strong>no</strong> capítulo anterior, essenciais<br />

para a futura instituição do Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> (SUS), ao<br />

mesmo tempo em que também nesse momento há uma importante<br />

participação da categoria <strong>no</strong> Movimento d<strong>os</strong> Trabalhadores da<br />

Saú<strong>de</strong> Mental, que em 1987 se transforma em Movimento da Luta<br />

Antimanicomial, com a participação <strong>de</strong> usuári<strong>os</strong>, familiares e da<br />

socieda<strong>de</strong> civil organizada, como vim<strong>os</strong> anteriormente.<br />

Segundo De Oliveira Silva (2003), o Movimento d<strong>os</strong><br />

Trabalhadores <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Mental (MTSM) forjado nas jornadas<br />

antiditatoriais d<strong>os</strong> fins d<strong>os</strong> an<strong>os</strong> <strong>de</strong> 1970 foi uma das fontes que<br />

ofereceu bases e referências políticas iniciais para que, an<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong>pois, pu<strong>de</strong>sse se reaglutinar o polo crítico da saú<strong>de</strong> mental <strong>no</strong><br />

Brasil, a partir do Movimento Nacional da Luta Antimanicomial.<br />

A existência <strong>de</strong> um movimento social, plural e <strong>de</strong>mocrático<br />

nas bases instituídas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1993 pelo Movimento<br />

Antimanicomial, com seus espaç<strong>os</strong> plenári<strong>os</strong> nacionais,<br />

com suas campanhas, com suas potencialida<strong>de</strong>s<br />

enquanto espaç<strong>os</strong> <strong>de</strong> expressão pessoal, coloca-se,<br />

evi<strong>de</strong>ntemente, como uma importante referência <strong>de</strong><br />

75


<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> aprendizagem para tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> que<br />

nele se envolvem: usuári<strong>os</strong>, técnic<strong>os</strong> e familiares. Afinal<br />

<strong>de</strong> contas, é nesse microc<strong>os</strong>mo social que se exercita<br />

até as últimas consequências (ou pelo men<strong>os</strong> <strong>de</strong>veria ser<br />

assim) o experimento que propom<strong>os</strong> a toda a socieda<strong>de</strong><br />

e que consiste em admitir e garantir a convivência plural<br />

<strong>de</strong> louc<strong>os</strong> e <strong>de</strong> sup<strong>os</strong>t<strong>os</strong> <strong>no</strong>rmais (DE OLIVEIRA SILVA,<br />

2003, p.97)<br />

Em função <strong>de</strong> todo esse processo <strong>de</strong> envolvimento da<br />

Psicologia com a garantia <strong>de</strong> direit<strong>os</strong> e com as ações necessárias<br />

diante do acirramento das <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s na socieda<strong>de</strong> brasileira,<br />

com especial <strong>de</strong>staque ao seu compromisso com a garantia da<br />

promoção e da atenção integral à saú<strong>de</strong> como política pública,<br />

assistiu-se ao longo das décadas que se suce<strong>de</strong>m a um<br />

significativo crescimento da presença das (<strong>os</strong>) psicólogas (<strong>os</strong>) nas<br />

políticas públicas, em especial nas políticas públicas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>.<br />

Uma pesquisa realizada pelo Conselho Regional <strong>de</strong> Psicologia<br />

do Estado <strong>de</strong> São Paulo em 1981 apontava que nesse Estado,<br />

d<strong>os</strong> 20.000 psicólog<strong>os</strong> inscrit<strong>os</strong>, 66% atuavam na profissão, d<strong>os</strong><br />

quais 45% trabalhavam como autô<strong>no</strong>m<strong>os</strong> e 57% concentravamse<br />

na área clínica. As <strong>de</strong>mais áreas <strong>de</strong> atuação indicadas pela<br />

categoria eram a Psicologia Organizacional e a Psicologia<br />

Escolar, que respectivamente concentravam a atuação <strong>de</strong> 21%<br />

e 12% da categoria. Apenas 4% d<strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong> <strong>de</strong>senvolviam<br />

suas ativida<strong>de</strong>s <strong>no</strong> serviço público. (Bock, 1999). No a<strong>no</strong> <strong>de</strong><br />

1988, a pesquisa “Quem é o Psicólogo Brasileiro” indicava que<br />

<strong>no</strong> Brasil cerca <strong>de</strong> 40% da categoria concentrava sua ativida<strong>de</strong><br />

na área Clínica, aparecendo ainda como áreas <strong>de</strong> atuação o<br />

campo Organizacional e Escolar, concentrando 17% e 7% das<br />

ativida<strong>de</strong>s profissionais, respectivamente. Há uma frágil presença<br />

em ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> docência e pesquisa (5%), mas a incipiente<br />

participação d<strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong> em um <strong>no</strong>vo campo <strong>de</strong> trabalho,<br />

indicado como área comunitária e concentrando a atuação <strong>de</strong><br />

cerca <strong>de</strong> 2% da categoria. A atualização da mesma pesquisa <strong>no</strong><br />

a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 2009 indica que, apesar da permanência <strong>de</strong> pouco mais<br />

<strong>de</strong> 50% da categoria na ativida<strong>de</strong> clínica, na sua imensa maioria<br />

<strong>de</strong>senvolvida <strong>de</strong> forma privada e autô<strong>no</strong>ma, há uma expansão<br />

76


<strong>de</strong> áreas <strong>de</strong> atuação da categoria e uma maior presença da<br />

Psicologia nas políticas públicas, especialmente <strong>no</strong> campo<br />

da saú<strong>de</strong>. Segundo dad<strong>os</strong> da pesquisa, 17% da categoria tem<br />

como sua principal área <strong>de</strong> atuação o campo organizacional/<br />

institucional e 11% <strong>de</strong>senvolve suas ativida<strong>de</strong>s principalmente<br />

na área educacional, refletindo ainda a história <strong>de</strong> inserção e<br />

institucionalização da Psicologia na socieda<strong>de</strong> brasileira. As<br />

ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> docência, pesquisa, psicologia jurídica e outras não<br />

especificadas aparecem como principais para 7% da categoria.<br />

11% da categoria indica como principal área <strong>de</strong> atuação na<br />

Psicologia políticas públicas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, segurança e educação.<br />

Indica a pesquisa que, excetuando-se cerca da meta<strong>de</strong> da<br />

categoria que <strong>de</strong>senvolve suas ativida<strong>de</strong>s profissionais como<br />

autô<strong>no</strong>m<strong>os</strong>, o setor público caracteriza-se hoje como o maior<br />

empregador (d<strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong> empregad<strong>os</strong>, 40,3% estão <strong>no</strong> setor<br />

público, 24,4% em empresas e organizações privadas e 35,3% em<br />

organizações sem fins lucrativ<strong>os</strong>), sendo a maior concentração<br />

na saú<strong>de</strong> pública.<br />

Recente levantamento realizado pelo Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong><br />

Psicologia indica que tem<strong>os</strong> hoje: 29.212 psicólog<strong>os</strong> atuando<br />

<strong>no</strong> SUS; 20.463 psicólog<strong>os</strong> atuando <strong>no</strong> SUAS (CENSO SUAS,<br />

2011); 1.103 psicólogas(<strong>os</strong>) atuando <strong>no</strong> Judiciário.<br />

Assim, há nas últimas duas décadas e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a instituição do<br />

Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> uma importante ampliação da presença<br />

<strong>de</strong> psicólog<strong>os</strong> nas políticas públicas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e uma importante<br />

implicação da categoria com a garantia do direito à atenção integral<br />

à saú<strong>de</strong>, por meio <strong>de</strong> sua participação nas lutas e <strong>no</strong> trabalho<br />

cotidia<strong>no</strong> do SUS. Do mesmo modo, é significativa a participação<br />

d<strong>os</strong> trabalhadores psicólog<strong>os</strong> na reorientação do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong><br />

assistência em saú<strong>de</strong> mental na saú<strong>de</strong> pública, levando a uma<br />

reconstrução d<strong>os</strong> compromiss<strong>os</strong> e das práticas tradicionalmente<br />

acumuladas e <strong>de</strong>senvolvidas pela profissão.<br />

77


A Inserção da Psicologia na Saú<strong>de</strong> Pública e na Reforma<br />

Psiquiátrica<br />

O campo <strong>de</strong> fenômen<strong>os</strong> para o qual se orientam as políticas<br />

públicas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a instituição do SUS<br />

apresenta-se como processo social complexo. O objeto <strong>de</strong>ixa<br />

<strong>de</strong> ser a doença ou a doença mental como processo natural ou<br />

abstrato e converte-se <strong>no</strong> conjunto <strong>de</strong> condições concretas <strong>de</strong><br />

existência da população, seus <strong>de</strong>terminantes n<strong>os</strong> process<strong>os</strong><br />

saú<strong>de</strong>-doença, suas expressões em experiências <strong>de</strong> sofrimento <strong>de</strong><br />

sujeit<strong>os</strong> singulares. Assim, <strong>os</strong> profissionais que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a instituição<br />

do SUS passam a compor as equipes d<strong>os</strong> divers<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> da<br />

re<strong>de</strong> <strong>de</strong> atenção à saú<strong>de</strong> estão orientad<strong>os</strong> para intervenções que<br />

representem transformações sob o território, compreendido não<br />

apenas como espaço físico, com suas características e condições<br />

próprias, mas como campo <strong>de</strong> relações, <strong>de</strong> víncul<strong>os</strong> e <strong>de</strong> mod<strong>os</strong><br />

e formas <strong>de</strong> organização da vida produzidas pel<strong>os</strong> homens que<br />

nele habitam. Como resultado, do ponto <strong>de</strong> vista da construção<br />

histórica d<strong>os</strong> conheciment<strong>os</strong> e práticas <strong>no</strong> campo das ciências e<br />

profissões da saú<strong>de</strong>, fom<strong>os</strong> forçad<strong>os</strong> a um redirecionamento, que<br />

se coloca <strong>no</strong> sentido da exigência da produção <strong>de</strong> estratégias que<br />

respondam às diretrizes do Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> e, <strong>no</strong> caso<br />

da saú<strong>de</strong> mental, à política <strong>de</strong> Reforma Psiquiátrica <strong>de</strong>senvolvida<br />

<strong>no</strong> âmbito do SUS.<br />

Portanto, a significativa inserção d<strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong> <strong>no</strong> Sistema<br />

Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> e n<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental do SUS,<br />

impulsionad<strong>os</strong> pelo projeto antimanicomial forjado <strong>de</strong>s<strong>de</strong> um<br />

movimento social, produziu um redirecionamento da Psicologia,<br />

ao lado <strong>de</strong> outras profissões da saú<strong>de</strong>, em relação à sua tradição<br />

histórica relativa às orientações éticas, teóricas e metodológicas.<br />

O transtor<strong>no</strong> mental, tomado como situação limite <strong>de</strong> um<br />

processo social complexo e problemático, que se expressa e se<br />

constitui como sofrimento na experiência <strong>de</strong> sujeit<strong>os</strong> singulares,<br />

força a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> uma <strong>no</strong>va forma <strong>de</strong> atuação para a Clínica,<br />

exigindo transformações metodológicas e tec<strong>no</strong>lógicas para o<br />

atendimento em saú<strong>de</strong> mental. Os transtorn<strong>os</strong> mentais graves<br />

78


com que lidam essa clínica são, antes <strong>de</strong> serem tomad<strong>os</strong> como<br />

uma patologia, portanto, doença mental, tomad<strong>os</strong> como process<strong>os</strong><br />

complex<strong>os</strong>, que implicam a trajetória <strong>de</strong> vida <strong>de</strong> sujeit<strong>os</strong> singulares<br />

em condições objetivas e concretas <strong>de</strong> existência.<br />

É bem verda<strong>de</strong> que a análise histórica da constituição d<strong>os</strong><br />

disp<strong>os</strong>itiv<strong>os</strong> do saber e das práticas psiquiátricas n<strong>os</strong> m<strong>os</strong>tra<br />

que o ponto <strong>de</strong> corte para a construção do comportamento<br />

bizarro ou <strong>de</strong>sviante como alvo das intervenções psiquiátricas,<br />

sobretudo na geração das <strong>de</strong>mandas <strong>de</strong> internações, situou-se<br />

antes em marcadores sociais do que em marcadores clínic<strong>os</strong><br />

ou da sintomatologia estritamente psíquica. (DE OLIVEIRA<br />

SILVA, 2009, p.41). A esse respeito, a obra <strong>de</strong> Cunha (1986) é<br />

<strong>de</strong> especial valia, na medida em que, ao analisar <strong>os</strong> prontuári<strong>os</strong><br />

das pessoas internadas <strong>no</strong> h<strong>os</strong>pício do Juquery, um d<strong>os</strong> primeir<strong>os</strong><br />

h<strong>os</strong>pitais psiquiátric<strong>os</strong> brasileir<strong>os</strong>, na primeira meta<strong>de</strong> do século<br />

XX, evi<strong>de</strong>ncia como <strong>os</strong> criv<strong>os</strong> para a construção d<strong>os</strong> diagnóstic<strong>os</strong><br />

e para a <strong>de</strong>terminação das medidas <strong>de</strong> internação e tratamento<br />

estão, antes <strong>de</strong> tudo, <strong>no</strong> <strong>de</strong>svio social do comportamento, quando<br />

não nas expressões culturais ou físicas próprias <strong>de</strong> uma raça.<br />

Vale citar alguns exempl<strong>os</strong>:<br />

(...) Freqüentou o colégio, on<strong>de</strong> apren<strong>de</strong>u a ler e escrever.<br />

Não consta que houvesse pa<strong>de</strong>cido <strong>de</strong> moléstias graves.<br />

Foi sempre um pouco débil <strong>de</strong> constituição, como <strong>de</strong><br />

regra suce<strong>de</strong> com <strong>os</strong> mestiç<strong>os</strong> entre nós. Por morte<br />

<strong>de</strong> seu progenitor é que começa a sua história mental<br />

propriamente dita. Usufruindo peque<strong>no</strong> rendimento <strong>de</strong><br />

herança, entregue a si mesma, começou a revelar-se<br />

incapaz <strong>de</strong> gerir seus bens, que dissipava sem conta (...).<br />

Um pouco mais tar<strong>de</strong>, sua conduta entrou a manifestar<br />

singularida<strong>de</strong>s. Certa vez, comprou trajes masculin<strong>os</strong> e<br />

saiu a viajar nesse estado. Foi reconhecida como mulher<br />

e presa pela polícia (...). Acham<strong>os</strong>, pelo exp<strong>os</strong>to, que se<br />

trata <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>generada fraca <strong>de</strong> espírito em que se<br />

vai instalando pouco a pouco a <strong>de</strong>mência - Prontuário,<br />

Antonia P. <strong>de</strong> A., 22 an<strong>os</strong>, parda, solteira, proce<strong>de</strong>nte da<br />

capital, internada em 22-6-1918. (CUNHA, 1986, p. 143)<br />

Os estigmas <strong>de</strong> <strong>de</strong>generação física que apresenta são <strong>os</strong><br />

comuns <strong>de</strong> sua raça: lábi<strong>os</strong> gr<strong>os</strong>s<strong>os</strong>, nariz esborrachado,<br />

79


sei<strong>os</strong> e<strong>no</strong>rmes, pés chat<strong>os</strong> - Prontuário, Maria J<strong>os</strong>é, 22<br />

an<strong>os</strong>, negra, internada em 12-3-1920. (CUNHA, 1986, p.<br />

124)<br />

A p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa leitura crítica sobre o campo do<br />

saber psiquiátrico, o qual permitiu a abordagem d<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />

consi<strong>de</strong>rad<strong>os</strong> louc<strong>os</strong> pelo diagnóstico da doença mental, alerta<br />

para o fato <strong>de</strong> que as formas <strong>de</strong> gerenciamento historicamente<br />

produzidas <strong>no</strong> campo médico-sanitário foram, originalmente,<br />

formas <strong>de</strong> agenciamento da vida social. Portanto, há que se<br />

produzir uma <strong>no</strong>va perspectiva <strong>de</strong> leitura sobre o objeto que<br />

inaugura a psiquiatria e outras ciências psis, leitura essa que<br />

supere sua redução à patologia, a qual serve à manutenção <strong>de</strong><br />

dimensões historicamente ocultadas.<br />

Esse esforço marca, com diferentes resultad<strong>os</strong> em term<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

referências teóricas, o ponto <strong>de</strong> partida e a direção para a qual<br />

apontam importantes experiências <strong>de</strong> Reforma Psiquiátrica. Em<br />

term<strong>os</strong> da experiência brasileira, enten<strong>de</strong>m<strong>os</strong> que a o conceito<br />

<strong>de</strong> atenção psic<strong>os</strong>social orienta um <strong>no</strong>vo olhar sobre o objeto<br />

das ciências, práticas e políticas do campo da saú<strong>de</strong> mental.<br />

Constituindo-se como um paradigma <strong>no</strong> campo da saú<strong>de</strong> mental<br />

coletiva, a atenção psic<strong>os</strong>social orienta o <strong>de</strong>senvolvimento do<br />

projeto institucional d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> da re<strong>de</strong> substitutiva <strong>de</strong> saú<strong>de</strong><br />

mental, sobretudo <strong>os</strong> CAPSs, estratégic<strong>os</strong> nessa re<strong>de</strong> substitutiva.<br />

Segundo C<strong>os</strong>ta-R<strong>os</strong>a, Luzio e Yassui (2003 ) o conceito<br />

psic<strong>os</strong>social tem suas origens ligadas, <strong>de</strong> um lado, às<br />

transformações <strong>no</strong> campo da medicina que apontaram para a<br />

integração da dimensão social constitutiva das enfermida<strong>de</strong>s e<br />

para a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dimensionar efeit<strong>os</strong> individuais e coletiv<strong>os</strong><br />

nas práticas em saú<strong>de</strong> (Medicina Integral, Medicina Preventiva<br />

e Medicina Comunitária) e, ao mesmo tempo, suas origens<br />

remontam às transformações das práticas psiquiátricas operadas<br />

<strong>no</strong> segundo pós guerra pel<strong>os</strong> moviment<strong>os</strong> <strong>de</strong> críticas ao H<strong>os</strong>pital<br />

Psiquiátrico, sua visão <strong>de</strong> doença mental e tratamento, portanto,<br />

ao domínio do conhecimento responsável por sua sustentação.<br />

Para <strong>os</strong> autores, o conceito psic<strong>os</strong>social <strong>de</strong>signa as “(...) práticas<br />

em Saú<strong>de</strong> Mental Coletiva que se inscrevem como transição<br />

paradigmática da psiquiatria” (COSTA-ROSA, LUZIO E YASSUI,<br />

80


2003, p. 19).<br />

A atenção psic<strong>os</strong>social “tem sustentado um conjunto <strong>de</strong> ações<br />

teórico-práticas, político-i<strong>de</strong>ológicas e éticas <strong>no</strong>rteadas pela<br />

aspiração <strong>de</strong> substituírem o Mo<strong>de</strong>lo Asilar, e algumas vezes o<br />

próprio paradigma da Psiquiatria” (C<strong>os</strong>ta-R<strong>os</strong>a, Luzio e Yassui,<br />

2003, p. 31). A transformação <strong>de</strong>sejada refere-se ao campo teóricoassistencial,<br />

ao campo técnico-assistencial, ao campo jurídicopolítico<br />

e ao campo sociocultural. A compreensão do primeiro<br />

<strong>de</strong>les é essencial para referenciar a <strong>de</strong>finição relativa ao objeto<br />

<strong>de</strong> estudo e intervenção capaz <strong>de</strong> substituir a referência à doença<br />

mental. Ao invés da doença, o trabalho com pessoas com graves<br />

transtorn<strong>os</strong> mentais refere-se ao sofrimento <strong>de</strong> sujeit<strong>os</strong> concret<strong>os</strong><br />

e singulares, tomando-se como referência a <strong>de</strong>terminação<br />

psíquica e sociocultural d<strong>os</strong> problemas. O paradigma “doençacura”<br />

é substituído pelo paradigma “existência-sofrimento”. Nas<br />

palavras <strong>de</strong> C<strong>os</strong>ta-R<strong>os</strong>a, Luzio e Yassui (2003, p. 32):<br />

No campo teórico assistencial tem se operado, antes <strong>de</strong><br />

tudo, a <strong>de</strong>sconstrução <strong>de</strong> conceit<strong>os</strong> e práticas sustentad<strong>os</strong> pela<br />

psiquiatria e pela psicologia nas suas visões acerca da doença<br />

mental. Em contrapartida tem-se construído <strong>no</strong>ções e conceit<strong>os</strong><br />

como “existência-sofrimento” do sujeito na sua relação com o corpo<br />

social, paradigma estético, acolhimento, cuidado, emancipação e<br />

contratualida<strong>de</strong> social. (COSTA-ROSA, LUZIO E YASSUI, 2003,<br />

p.32)<br />

Aponta-se para a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produzir intervenções<br />

tendo em vista as condições <strong>de</strong> existência <strong>de</strong> sujeit<strong>os</strong> concret<strong>os</strong>,<br />

intervenções complexas e individualizadas, que respondam à<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada caso e se orientem para as re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> relação<br />

e circulação d<strong>os</strong> indivídu<strong>os</strong>. A atenção psic<strong>os</strong>social aponta para<br />

a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> construir disp<strong>os</strong>itiv<strong>os</strong> e re<strong>de</strong>s que representem<br />

a superação do mo<strong>de</strong>lo asilar, assim como intervenções que<br />

direcionem a assistência para as transformações necessárias nas<br />

configurações subjetivas e n<strong>os</strong> process<strong>os</strong> <strong>de</strong> produção social. Do<br />

ponto <strong>de</strong> vista teórico-conceitual, essa perspectiva exige, como<br />

afirmado acima, a substituição da referência à doença mental e<br />

sua cura para uma leitura sobre a existência concreta d<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />

e seus sofriment<strong>os</strong>. Finalmente, a orientação ético-política aponta<br />

81


para a construção permanente, <strong>de</strong>ntro e fora d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong>, da<br />

condição <strong>de</strong> cidadania daqueles historicamente invalidad<strong>os</strong> nas<br />

relações sociais.<br />

Nas palavras <strong>de</strong> Oliveira Silva (2009, p.41):<br />

Portanto o paradigma da clínica psic<strong>os</strong>social das psic<strong>os</strong>es<br />

preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>volver à clinica a condição <strong>de</strong> operar com a<br />

complexida<strong>de</strong> do seu objeto, manejando um conjunto<br />

heterodoxo <strong>de</strong> recurs<strong>os</strong> e p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s que extrapolam<br />

<strong>os</strong> limites disciplinares, acadêmic<strong>os</strong> e/ou corporativ<strong>os</strong><br />

que, tradicionalmente, moldaram <strong>de</strong> forma reducionista<br />

<strong>os</strong> fenômen<strong>os</strong> sobre <strong>os</strong> quais preten<strong>de</strong> intervir, <strong>de</strong><br />

modo a submetê-l<strong>os</strong> às conveniências protocolares das<br />

instituições. ( DE OLIVEIRA SILVA; 2009)<br />

Essa perspectiva <strong>de</strong> linha <strong>de</strong> cuidad<strong>os</strong> para as pessoas com<br />

transtorn<strong>os</strong> mentais (que é também hoje uma perspectiva <strong>de</strong><br />

orientação para o cuidado <strong>de</strong> outras doenças crônicas) pauta uma<br />

transformação importante às profissões <strong>no</strong> campo da assistência,<br />

marcadas tradicionalmente por uma forte vocação ambulatorial.<br />

Ela exigiu e exige do sistema <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e das profissões nele<br />

inseridas um processo longo e complexo <strong>de</strong> cuidad<strong>os</strong>, orientad<strong>os</strong><br />

pela p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> da pessoa se apropriar do seu processo <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> e doença, conseguindo protagonizar <strong>no</strong>vas formas <strong>de</strong><br />

lidar com seu adoecimento e construir <strong>no</strong>vas p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> vida comunitária, familiar, <strong>no</strong>vas formas <strong>de</strong> construção <strong>de</strong><br />

relações afetivas, <strong>no</strong>v<strong>os</strong> trânsit<strong>os</strong> em camp<strong>os</strong> e espaç<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

trabalho. As p<strong>os</strong>turas profissionais <strong>de</strong>vem estar orientadas para<br />

essa finalida<strong>de</strong>. Desse modo, <strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong> precisam buscar e<br />

construir leituras que respondam a essas exigências. O psicólogo<br />

necessita perceber as dificulda<strong>de</strong>s relativas a cada território<br />

<strong>de</strong> convivência e <strong>os</strong> <strong>de</strong>safi<strong>os</strong> p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> na busca por direit<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

cidadania das pessoas com as quais trabalha, como dimensão<br />

essencial na constituição d<strong>os</strong> process<strong>os</strong> <strong>de</strong> sofrimento sob <strong>os</strong><br />

quais intervém.<br />

De certo modo, po<strong>de</strong>m<strong>os</strong> dizer que <strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong>, na medida<br />

em que carregam como especificida<strong>de</strong> nesse campo uma leitura<br />

sobre a dimensão do sofrimento produzido nas múltiplas relações<br />

82


e <strong>de</strong>terminações relativas a cada caso, tem como <strong>de</strong>safio<br />

a p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> construir a crítica ao discurso que reduz<br />

experiências humanas e process<strong>os</strong> complex<strong>os</strong> à psicopatologia.<br />

Como ensi<strong>no</strong>u Basaglia (1985 ), é preciso negar a doença como<br />

objeto e, em seu lugar, tomar a existência-sofrimento do sujeito<br />

na sua relação com o corpo social. É preciso <strong>de</strong>sconstruir a<br />

intervenção orientada pela cura, portanto, e construir ações<br />

orientadas para a finalida<strong>de</strong> da emancipação e comprometidas<br />

com a criação <strong>de</strong> p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> produção da vida e <strong>de</strong><br />

participação e convivência social.<br />

Des<strong>de</strong> uma perspectiva antropológica sobre o fenôme<strong>no</strong> da<br />

loucura, o trabalho do psicólogo inci<strong>de</strong> men<strong>os</strong> sobre a cura <strong>de</strong> uma<br />

doença ou um sintoma e mais sobre a produção <strong>de</strong> subjetivida<strong>de</strong>s<br />

que, po<strong>de</strong>m<strong>os</strong> dizer, <strong>de</strong>vem se produzir como subjetivida<strong>de</strong>s<br />

inconformadas. Inconformadas <strong>no</strong> sentido da recusa à reprodução<br />

apática, homogênea e pasteurizada imp<strong>os</strong>ta pela socieda<strong>de</strong><br />

mo<strong>de</strong>rna, por suas formas <strong>de</strong> controle, pela organização <strong>de</strong> suas<br />

relações <strong>de</strong> trabalho e pel<strong>os</strong> process<strong>os</strong> <strong>de</strong> sustentação do modo<br />

<strong>de</strong> produção vigente. Subjetivida<strong>de</strong> é processo vivido e tecido<br />

a longo da trajetória do sujeito. Para ser insurgente, primeiro é<br />

preciso acolher <strong>no</strong> próprio corpo a sua inquietação e o seu traço<br />

<strong>de</strong> diferença. Os psicólog<strong>os</strong>, como outr<strong>os</strong> trabalhadores <strong>de</strong>ssa<br />

clínica, não produzem apenas intervenções técnicas, mas antes<br />

disso disponibilizam acolhimento para dar suporte à travessia que<br />

o outro <strong>de</strong>ve construir em sua experiência como sujeito huma<strong>no</strong>.<br />

Nessa travessia, cada um <strong>de</strong>ve encontrar as condições e <strong>os</strong><br />

lugares p<strong>os</strong>síveis para a afirmação da sua diferença como valor<br />

p<strong>os</strong>itivo. Isso representa a construção <strong>de</strong> coletiv<strong>os</strong> responsáveis,<br />

que assumem p<strong>os</strong>ições na socieda<strong>de</strong> em <strong>no</strong>me <strong>de</strong> uma direção<br />

ético-política. A ética que querem<strong>os</strong> afirmar está pautada n<strong>os</strong><br />

valores da igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> direit<strong>os</strong> e do respeito às diversida<strong>de</strong>s<br />

e cabe a<strong>os</strong> profissionais, parceir<strong>os</strong> nesse empreendimento<br />

<strong>de</strong> tecer <strong>no</strong>vas biografias e produzir <strong>no</strong>vas subjetivida<strong>de</strong>s, o<br />

questionamento permanente acerca da direção da transformação<br />

que estão construindo na realida<strong>de</strong> por meio <strong>de</strong> sua atuação.<br />

83


Teorias em Psicologia e Atenção à Saú<strong>de</strong> Mental<br />

Nessa discussão, cabe a pergunta acerca <strong>de</strong> quais <strong>os</strong> referenciais<br />

teóric<strong>os</strong> <strong>no</strong> campo da Psicologia que, como orientadores <strong>de</strong>sse<br />

trabalho, po<strong>de</strong>m subsidiar <strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong> na leitura e na prática <strong>de</strong><br />

atenção psic<strong>os</strong>social que estejam orientadas por esses princípi<strong>os</strong>.<br />

A construção <strong>de</strong>ssa <strong>no</strong>va perspectiva <strong>de</strong> intervenção e <strong>de</strong>sse<br />

<strong>no</strong>vo direcionamento na construção das políticas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> exige<br />

a sustentação <strong>de</strong> uma p<strong>os</strong>ição teórica frente ao fenôme<strong>no</strong> da<br />

loucura. Em relação ao <strong>de</strong>bate relativo a<strong>os</strong> referenciais teóric<strong>os</strong><br />

d<strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong> <strong>no</strong> campo da atenção psic<strong>os</strong>social, algumas<br />

reflexões preliminares <strong>de</strong> tornam necessárias.<br />

A primeira <strong>de</strong>las diz respeito ao reconhecimento <strong>de</strong> que a<br />

produção do saber científico não é neutra e que, portanto, <strong>os</strong><br />

conjunt<strong>os</strong> teóric<strong>os</strong> disponíveis expressam diferentes projet<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong> ciência, que apontam para distint<strong>os</strong> projet<strong>os</strong> <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong><br />

e, portanto, referenciam intervenções na direção <strong>de</strong>sses<br />

projet<strong>os</strong>. Isso <strong>de</strong>ve n<strong>os</strong> lançar, <strong>no</strong> campo da Psicologia, a um<br />

diálogo interrogante em relação a<strong>os</strong> compromiss<strong>os</strong> e diretrizes<br />

que se <strong>de</strong>sdobram d<strong>os</strong> divers<strong>os</strong> camp<strong>os</strong> teóric<strong>os</strong>. Portanto, <strong>os</strong><br />

referenciais que <strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong> assumem e n<strong>os</strong> quais buscam<br />

referências para a orientação teórico-prática <strong>de</strong> seu trabalho,<br />

expressam que concepção <strong>de</strong> homem e socieda<strong>de</strong> e <strong>de</strong> que<br />

forma se comprometem com a transformação da realida<strong>de</strong>?<br />

Outra reflexão importante diz respeito ao reconhecimento<br />

<strong>de</strong> que o fenôme<strong>no</strong> com o qual trabalham<strong>os</strong> n<strong>os</strong> CAPS impõe<br />

embasament<strong>os</strong> oriund<strong>os</strong> <strong>de</strong> diferentes camp<strong>os</strong> do saber. Assim, a<br />

apreensão da complexida<strong>de</strong> do fenôme<strong>no</strong> com o qual se trabalha,<br />

a loucura, requer, como já anunciado, uma leitura para além d<strong>os</strong><br />

referenciais médico-sanitári<strong>os</strong> e, portanto, é bem-vindo o diálogo<br />

com o campo da sociologia, do direito, da fil<strong>os</strong>ofia, da antropologia.<br />

É nesse campo interdisciplinar que a Psicologia apresenta suas<br />

contribuições a partir <strong>de</strong> referenciais teórico-técnic<strong>os</strong>.<br />

Assim, não obstante a pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> leituras que po<strong>de</strong>m<br />

construir n<strong>os</strong>so olhar, sem dúvida a construção do trabalho<br />

intensivo e cotidia<strong>no</strong> <strong>de</strong> cuidad<strong>os</strong> busca ferramentas oriundas<br />

do campo teórico relativo à constituição da subjetivida<strong>de</strong>, do<br />

84


psiquismo, do comportamento huma<strong>no</strong>, qual seja, a Psicologia.<br />

A respeito disso, é preciso que <strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong> tenham clareza<br />

do lugar da teoria na construção <strong>de</strong> seu trabalho profissional na<br />

re<strong>de</strong> substitutiva <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental. É preciso reconhecer que o<br />

campo <strong>de</strong> intervenção produzido <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a Reforma Psiquiátrica<br />

Antimanicomial não se fundou a partir <strong>de</strong> uma teoria ou <strong>de</strong> um<br />

conjunto teórico específico da Psicologia. Ao contrário disso, a<br />

busca ou a produção <strong>de</strong> conheciment<strong>os</strong> teóric<strong>os</strong> em Psicologia<br />

que expressassem e subsidiassem esse trabalho se <strong>de</strong>u a partir<br />

da construção cotidiana <strong>de</strong> práticas e da discussão teórica e<br />

epistemológica construída ao longo d<strong>os</strong> moviment<strong>os</strong> <strong>de</strong> Reforma<br />

Psiquiátrica e também da constituição do SUS. Desse modo, <strong>os</strong><br />

psicólog<strong>os</strong> <strong>de</strong>vem reconhecer que o conhecimento teórico da<br />

Psicologia <strong>de</strong>ve respon<strong>de</strong>r, ao longo <strong>de</strong> sua prática n<strong>os</strong> CAPS, ao<br />

referencial e às diretrizes orientadoras do processo da Reforma.<br />

Ou seja, é necessário perguntar se <strong>os</strong> referenciais adotad<strong>os</strong><br />

respon<strong>de</strong>m à direção <strong>de</strong> uma ética inclusiva, libertária e que<br />

aponte para o respeito e a construção da cidadania da pessoa<br />

com transtor<strong>no</strong> mental. Assim, é um campo ético que <strong>de</strong>limita <strong>os</strong><br />

limites d<strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> teóric<strong>os</strong> e técnic<strong>os</strong> que po<strong>de</strong>m ser tomad<strong>os</strong><br />

e disponibilizad<strong>os</strong> para o trabalho n<strong>os</strong> CAPS.<br />

Obras como a <strong>de</strong> Castel (1978) e Delgado (1992 ) evi<strong>de</strong>nciam<br />

uma <strong>de</strong>sconstrução necessária: a fundação da doença mental,<br />

que se colocou como condição e p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> ao estatuto <strong>de</strong> tutela<br />

que recai, como necessida<strong>de</strong> da <strong>no</strong>va or<strong>de</strong>m vigente, sobre <strong>os</strong><br />

louc<strong>os</strong> na Mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>. Assim, é necessário recusar referências<br />

que reduzem o sujeito à condição <strong>de</strong> objeto da investigação<br />

científica, assim como é preciso recusar perspectivas a partir<br />

das quais o saber científico tenha primazia sobre a garantia <strong>de</strong><br />

direit<strong>os</strong> d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>. Também é preciso recusar teorias que<br />

apontem <strong>no</strong> sentido da <strong>no</strong>rmalização e da mera adaptação d<strong>os</strong><br />

sujeit<strong>os</strong>. É necessário, <strong>no</strong> lugar disso, buscar referenciais que<br />

subsidiem a perspectiva <strong>de</strong> atuar para produzir saú<strong>de</strong>, transformar<br />

subjetivida<strong>de</strong>s e emancipar <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong>. O referencial teórico <strong>de</strong>ve<br />

ser capaz <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r a um projeto ético. Esse projeto ético está<br />

orientado para a p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> da convivência, da diversida<strong>de</strong>,<br />

da sustentação <strong>de</strong> diferentes existentes, garantida a condição<br />

85


<strong>de</strong> uma cidadania. A cidadania não é fazer do louco não louco,<br />

não é fazer do louco um sujeito <strong>de</strong> razão, mas é compreen<strong>de</strong>r<br />

um campo da cidadania constituído como espaço da pluralida<strong>de</strong>.<br />

A universalida<strong>de</strong> do acesso a<strong>os</strong> direit<strong>os</strong> <strong>de</strong>ve comportar as<br />

singularida<strong>de</strong>s.<br />

A pesquisa realizada pelo <strong>CREPOP</strong> com <strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong> que<br />

trabalham n<strong>os</strong> CAPS, a qual subsidiou a elaboração <strong>de</strong>ssas<br />

referências, aponta para a utilização <strong>de</strong> uma pluralida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> referenciais teórico, técnic<strong>os</strong> e conceituais, com maior<br />

presença <strong>de</strong> abordagens <strong>de</strong> base psicanalítica, abordagens a<br />

partir do referencial da psicologia social e abordagens <strong>de</strong> base<br />

comportamental. Não cabe apontar <strong>os</strong> marc<strong>os</strong> epistemológic<strong>os</strong>,<br />

teóric<strong>os</strong> e conceituais que melhor respon<strong>de</strong>m ou dialogam com<br />

<strong>os</strong> parâmetr<strong>os</strong> étic<strong>os</strong> e as diretrizes do campo da Reforma<br />

Psiquiátrica, indicando ou limitando a princípio a utilização<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>terminad<strong>os</strong> conjunt<strong>os</strong> teóric<strong>os</strong>. Mas é preciso afirmar o<br />

compromisso do profissional psicólogo se perguntar, na busca<br />

<strong>de</strong> referenciais teóric<strong>os</strong> <strong>no</strong> campo da Psicologia (consi<strong>de</strong>rando,<br />

sobretudo, sua construção histórica), que resp<strong>os</strong>tas esses<br />

referenciais lhe oferecem <strong>no</strong> encontro com a loucura, sua<br />

coerência com <strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> orientadores da Reforma e sua<br />

p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> subsidiar as práticas da atenção psic<strong>os</strong>social<br />

conforme afirmadas acima.<br />

As Práticas das(<strong>os</strong>) Psicólogas(<strong>os</strong>) n<strong>os</strong> CAPS<br />

Do mesmo modo que as teorias, <strong>os</strong> referenciais relativ<strong>os</strong> às<br />

práticas e às técnicas <strong>de</strong>senvolvidas <strong>no</strong> serviço <strong>de</strong>vem estar<br />

submetid<strong>os</strong> às diretrizes do SUS e da Reforma Psiquiátrica e<br />

a ética do projeto antimanicomial. A pesquisa realizada com <strong>os</strong><br />

psicólog<strong>os</strong> apresenta um conjunto significativo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s<br />

como acolhimento, discussão <strong>de</strong> cas<strong>os</strong> em equipe, psicoterapias,<br />

atendimento às crises, elaboração <strong>de</strong> plan<strong>os</strong> individuais <strong>de</strong><br />

cuidado, grup<strong>os</strong> e oficinas, ativida<strong>de</strong>s dirigidas diretamente à<br />

reinserção social, <strong>de</strong>ntre outras. No que tange ao <strong>de</strong>staque <strong>de</strong><br />

práticas ou experiências i<strong>no</strong>vadoras, apresentam-se estratégias<br />

para aproximação do serviço a<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> em regiões rurais,<br />

86


experiências <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s em contato direto com a comunida<strong>de</strong>,<br />

oficinas com utilização <strong>de</strong> diferentes recurs<strong>os</strong> (música, leitura e<br />

escrita, cuidad<strong>os</strong> com corpo e beleza, informática), programas <strong>de</strong><br />

geração <strong>de</strong> trabalho e eco<strong>no</strong>mia solidária, <strong>de</strong>ntre outr<strong>os</strong>.<br />

Novamente, não cabe a essas referências listar as práticas<br />

que <strong>de</strong>vem ser <strong>de</strong>senvolvidas pel<strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong> n<strong>os</strong> CAPS,<br />

nem tampouco um conjunto <strong>de</strong> intervenções que p<strong>os</strong>sam se<br />

caracterizar como práticas i<strong>no</strong>vadoras. Salientam<strong>os</strong>, <strong>no</strong> lugar<br />

disso, que as práticas serão tanto mais exit<strong>os</strong>as quanto mais<br />

respon<strong>de</strong>rem às exigências e <strong>de</strong>safi<strong>os</strong> <strong>de</strong> cada contexto, na<br />

direção da atenção psic<strong>os</strong>social referenciada. Do mesmo modo,<br />

a i<strong>no</strong>vação das práticas <strong>de</strong>ve ter como critério a produção <strong>de</strong><br />

resp<strong>os</strong>tas diante da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> intervenções d<strong>os</strong> projet<strong>os</strong><br />

terapêutic<strong>os</strong> individualizad<strong>os</strong> e as condições <strong>de</strong> cada território.<br />

Sem dúvida, do ponto <strong>de</strong> vista das intervenções tradicionalmente<br />

consolidadas <strong>no</strong> campo da Psicologia, isso <strong>de</strong>verá representar<br />

uma reinvenção <strong>de</strong> práticas e <strong>de</strong> tec<strong>no</strong>logias <strong>de</strong> intervenção.<br />

Pela relevância do seu lugar na orientação das práticas<br />

psicológicas e também na orientação das medidas <strong>de</strong> assistência<br />

em saú<strong>de</strong> mental, cabe uma reflexão final sobre a questão do<br />

diagnóstico e seu papel na construção das ações <strong>de</strong> atenção<br />

psic<strong>os</strong>social e, portanto, na construção das intervenções n<strong>os</strong><br />

CAPS. A prevalência do diagnóstico psicopatológico representa<br />

um reducionismo e, em última instância, a prevalência do discurso<br />

técnico, médico, científico e racional sobre a loucura. É a captura<br />

da lógica científica da <strong>no</strong>rmalida<strong>de</strong> que reduz a experiência da<br />

loucura à doença. Nessa perspectiva, o diagnóstico se apresenta<br />

como conclusão e <strong>de</strong>scrição imutável da condição do sujeito, que<br />

aponta para a previsão <strong>de</strong> um <strong>de</strong>sti<strong>no</strong>.<br />

Na clínica da saú<strong>de</strong> mental, <strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong> <strong>de</strong>vem construir<br />

diagnóstic<strong>os</strong> que se apresentem como ponto <strong>de</strong> orientação<br />

num percurso a ser construído na história do sujeito. Ele <strong>de</strong>ve<br />

significar a p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>, muito men<strong>os</strong> <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r sobre uma<br />

doença e muito mais <strong>de</strong> indicar as p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> projet<strong>os</strong><br />

a partir do que se i<strong>de</strong>ntifica como um modo do sujeito atuar na<br />

vida, estabelecer relações e constituir sua experiência subjetiva.<br />

Assim, a construção do diagnóstico <strong>de</strong>ve apontar um dado da<br />

87


iografia do sujeito que aju<strong>de</strong> a pensar transformações p<strong>os</strong>síveis<br />

nessa biografia. O diagnóstico não <strong>de</strong>ve, por isso, ser buscado<br />

para respon<strong>de</strong>r ao psicólogo ou à equipe quem é o sujeito ou<br />

qual a sua doença, mas para apresentar dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong>sse<br />

sujeito que apontem as p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> assistência da equipe e<br />

do profissional na construção parceira <strong>de</strong> uma <strong>no</strong>va trajetória <strong>de</strong><br />

vida.<br />

Portanto, do ponto <strong>de</strong> vista do diagnóstico, das teorias e das<br />

referências <strong>de</strong> projet<strong>os</strong> <strong>de</strong> intervenção para a prática d<strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong><br />

n<strong>os</strong> CAPS, <strong>de</strong>vem<strong>os</strong> n<strong>os</strong> orientar sempre pela indagação acerca<br />

<strong>de</strong> que a servem <strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> utilizad<strong>os</strong> e se eles estão a serviço<br />

da atenção psic<strong>os</strong>social orientada pel<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> da reforma<br />

psiquiátrica antimanicomial. Sem dúvida, essa reflexão levará<br />

<strong>os</strong> psicólog<strong>os</strong> à produção permanente <strong>de</strong> saberes e <strong>de</strong> práticas<br />

profissionais. Nesse sentido, po<strong>de</strong>m<strong>os</strong> afirmar que o campo da<br />

atenção à saú<strong>de</strong> mental orientado por tais princípi<strong>os</strong> pauta uma<br />

transformação necessária à própria Psicologia, consi<strong>de</strong>rada a<br />

tradição a partir da qual esta se produziu.<br />

biografia do sujeito que aju<strong>de</strong> a pensar transformações<br />

p<strong>os</strong>síveis nessa biografia. O diagnóstico não <strong>de</strong>ve, por isso,<br />

ser buscado para respon<strong>de</strong>r ao psicólogo ou à equipe quem é o<br />

sujeito ou qual a sua doença, mas para apresentar dificulda<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong>sse sujeito que apontem as p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> assistência da<br />

equipe e do profissional na construção parceira <strong>de</strong> uma <strong>no</strong>va<br />

trajetória <strong>de</strong> vida.<br />

Portanto, do ponto <strong>de</strong> vista do diagnóstico, das teorias e das<br />

88


EIXO III: A ATUAÇÃO DA(O)<br />

PSICÓLOGA(O) NA POLÍTICA<br />

DO CAPS<br />

91


EIXO III: A ATUAÇÃO DA (O) PSICÓLOGA (O) NA<br />

POLÍTICA DO CAPS<br />

O modo <strong>de</strong> fazer: <strong>de</strong>sinstitucionalização da prática e<br />

intervenção na cultura.<br />

A Reforma Psiquiátrica, política pública do Estado brasileiro<br />

<strong>de</strong> cuidado com as pessoas <strong>de</strong> sofrimento mental, é, em<br />

sua concepção e prop<strong>os</strong>ta, muito mais que uma reforma da<br />

assistência pública em saú<strong>de</strong> mental. É, antes, e, sobretudo, um<br />

complexo processo <strong>de</strong> transformação assistencial e cultural que,<br />

ao <strong>de</strong>slocar o tratamento do espaço restrito e especializado <strong>de</strong><br />

cuidado da loucura: o h<strong>os</strong>pital psiquiátrico, para a cida<strong>de</strong>, que<br />

provoca mudanças <strong>no</strong> modo como a socieda<strong>de</strong> se relaciona com<br />

esta experiência. O que coloca, <strong>de</strong> saída, para tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> outr<strong>os</strong><br />

disp<strong>os</strong>itiv<strong>os</strong> inventad<strong>os</strong> por esta política, a saber, <strong>os</strong> chamad<strong>os</strong><br />

serviç<strong>os</strong> substitutiv<strong>os</strong>, e <strong>os</strong> CAPS são um <strong>de</strong>stes serviç<strong>os</strong>, uma<br />

dupla missão: a <strong>de</strong> serem lugares <strong>de</strong> cuidado, sociabilida<strong>de</strong> e<br />

convívio da cida<strong>de</strong> com a loucura que a habita.<br />

Lugares <strong>de</strong> tratamento e convívio entre diferentes, <strong>de</strong> realização<br />

<strong>de</strong> trocas simbólicas e culturais, enfim, lugares e práticas que<br />

<strong>de</strong>sconstroem, em seu fazer cotidia<strong>no</strong>, uma arraigada cultura<br />

<strong>de</strong> exclusão, invalidação e silenciamento d<strong>os</strong> dit<strong>os</strong> louc<strong>os</strong>, ao<br />

promover intervenções <strong>no</strong> território que revelam p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> encontro, geram conexões, questionam <strong>os</strong> preconceit<strong>os</strong> e<br />

fazem aparecer a <strong>no</strong>vida<strong>de</strong>: a presença cidadã d<strong>os</strong> portadores <strong>de</strong><br />

sofrimento mental.<br />

Os CAPS – Centr<strong>os</strong> <strong>de</strong> Atenção Psic<strong>os</strong>social - são uma das<br />

invenções <strong>de</strong>ste processo que se articulam e ganham potência<br />

<strong>no</strong> pulsar da re<strong>de</strong> na qual se inserem, e cumprem, <strong>de</strong>ntro da<br />

arquitetura aberta, livre e territorializada da reforma, um importante<br />

papel.<br />

Cabe a este estratégico serviço a resp<strong>os</strong>ta pela atenção<br />

diária e intensiva às pessoas com sofrimento mental, oferecendo<br />

acolhimento, cuidado e suporte <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o momento mais grave<br />

_ a crise, senha <strong>de</strong> ingresso <strong>no</strong> manicômio, até a reconstrução<br />

d<strong>os</strong> laç<strong>os</strong> com a vida. Materializando uma máxima psicanalítica,<br />

93


cabe a<strong>os</strong> CAPS, suas equipes e recurs<strong>os</strong> clínic<strong>os</strong>, não recuar<br />

frente à loucura ou ao sofrimento psíquico, tomando p<strong>os</strong>ição e<br />

se contrapondo à exclusão como método <strong>de</strong> tratamento, mas<br />

também oferecendo ao estrangeiro da razão (LIMA, 2002)<br />

h<strong>os</strong>pitalida<strong>de</strong>, manej<strong>os</strong> criativ<strong>os</strong> e singulares para fazer contor<strong>no</strong><br />

à dor intensa e assegurar ao sujeito <strong>os</strong> direit<strong>os</strong> <strong>de</strong> um cidadão.<br />

Cabe ainda ao CAPS, a invenção, pretensão que contrariaria a<br />

lógica que o instituiu, contudo, é importante salientar que a clínica<br />

antimanicomial não é um fazer eclético, nem tampouco <strong>de</strong>stituído<br />

<strong>de</strong> sentido. Ao contrário, a criação, a invenção <strong>de</strong>sta <strong>no</strong>va prática<br />

<strong>de</strong> trato e relação com a loucura sustenta-se em princípi<strong>os</strong> étic<strong>os</strong><br />

clar<strong>os</strong> e <strong>de</strong>finid<strong>os</strong>. O direito à liberda<strong>de</strong>, o consentimento com<br />

o tratamento, o respeito à cidadania e a<strong>os</strong> direit<strong>os</strong> human<strong>os</strong>, a<br />

participação do usuário <strong>no</strong> serviço; articulam-se a<strong>os</strong> conceit<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

território, <strong>de</strong>sinstitucionalização, porta aberta, vínculo, trabalho em<br />

equipe e em re<strong>de</strong>. Este conjunto formam <strong>os</strong> pont<strong>os</strong> <strong>de</strong> orientação<br />

que organizam e dão sentido ao cuidado nestes lugares.<br />

A pergunta: o que se faz num lugar como este, como é<br />

o tratamento <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um CAPS, quais são <strong>os</strong> recurs<strong>os</strong><br />

terapêutic<strong>os</strong> adotad<strong>os</strong> por esta prática <strong>de</strong> cuidado, questões<br />

sempre en<strong>de</strong>reçadas à Reforma Psiquiátrica, é antecedida,<br />

portanto, por uma orientação ética que diz por que se faz assim e<br />

não <strong>de</strong> outro modo.<br />

Tor<strong>no</strong>u-se lugar comum a afirmação <strong>de</strong> que n<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong><br />

substitutiv<strong>os</strong> ocorre uma prática inventiva, <strong>de</strong>sinstitucionalizadora.<br />

E isto é absolutamente verda<strong>de</strong>iro. N<strong>os</strong> <strong>no</strong>v<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong>, n<strong>os</strong><br />

CAPS, muito do que é feito, gran<strong>de</strong> parte da experiência cotidiana<br />

<strong>de</strong> técnic<strong>os</strong>, usuári<strong>os</strong> e familiares não encontra referência em<br />

nenhuma teoria ou disciplina. Não está previsto em nenhum<br />

manual <strong>de</strong> Psicologia ou qualquer outra disciplina e nem sempre<br />

se formaliza como saber teórico. “Práticas que – é importante<br />

assinalar– ocorrem ao lado <strong>de</strong>, e convivem com intervenções<br />

absolutamente legitimadas e aceitas pelo saber técnicocientífico”.<br />

(Desinstitucionalização da prática e práticas da<br />

<strong>de</strong>sinstitucionalização. Texto apresentado <strong>no</strong> Encontro Nacional<br />

“20 an<strong>os</strong> <strong>de</strong> Bauru” mimeo. Bauru, 2007. CFP). Ou seja, a<br />

invenção convive com a tradição, sempre balizada, contudo, por<br />

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uma ética: a da liberda<strong>de</strong> e do respeito às diferenças. Segue-se<br />

a tradição quando a mesma, suas prescrições e <strong>no</strong>rmas “não se<br />

constituem em obstácul<strong>os</strong> à vida e ao direito huma<strong>no</strong>”.<br />

Po<strong>de</strong>-se afirmar, portanto, que em essência a prática n<strong>os</strong><br />

CAPS é um embate entre a tradição e a invenção, a construção<br />

do <strong>no</strong>vo na negação do velho; ou ainda, a construção diária <strong>de</strong><br />

outro paradigma para o cuidado com a loucura que insere entre<br />

seus recurs<strong>os</strong> e como condição preliminar para o tratamento,<br />

a cidadania <strong>de</strong> quem é cuidado e <strong>de</strong> quem cuida. Uma relação<br />

<strong>de</strong> cuidado, on<strong>de</strong> n<strong>os</strong> dois pol<strong>os</strong> – terapeuta/paciente, <strong>de</strong>vem<strong>os</strong><br />

sempre encontrar um cidadão.<br />

A liberda<strong>de</strong> é um d<strong>os</strong> direit<strong>os</strong> <strong>de</strong> todo cidadão. E, para a<br />

Reforma Psiquiátrica, é o ponto <strong>de</strong> partida da clínica. O que é feito<br />

tem na liberda<strong>de</strong> sua causa e consequência. Cuidar em liberda<strong>de</strong><br />

é, mais que uma máxima, uma diretriz. É p<strong>os</strong>ição que se traduz<br />

na prática e em sentid<strong>os</strong> variad<strong>os</strong>. Inicia-se na supressão das<br />

gra<strong>de</strong>s, na eliminação d<strong>os</strong> espaç<strong>os</strong> <strong>de</strong> isolamento e segregação,<br />

ou seja, na substituição da arquitetura da exclusão, para alcançar<br />

um ponto subjetivo e cidadão: o consentimento com o tratamento.<br />

Para tratar, rigor<strong>os</strong>amente, é necessário ser livre para <strong>de</strong>cidir<br />

quando e porque tratar-se, sendo igualmente importante, para<br />

esta clínica, tratar sem trancar, tratar <strong>de</strong>ntro da cida<strong>de</strong>, buscando<br />

<strong>os</strong> laç<strong>os</strong> sociais, o fortalecimento ou a reconstrução das re<strong>de</strong>s<br />

que sustentam a vida <strong>de</strong> cada usuário.<br />

Liberda<strong>de</strong> e responsabilida<strong>de</strong> são, portanto, conceit<strong>os</strong><br />

orientadores da prática clínica d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> substitutiv<strong>os</strong> e d<strong>os</strong><br />

CAPS, em particular. A responsabilida<strong>de</strong> foi problematizada pela<br />

reforma psiquiátrica e a gran<strong>de</strong> <strong>no</strong>vida<strong>de</strong> foi a introdução do<br />

reconhecimento da vonta<strong>de</strong> e da responsabilida<strong>de</strong> na experiência<br />

da loucura. Ao modular a internação – artigo 4º da lei 10216 <strong>de</strong><br />

2001, dá a esta o estatuto <strong>de</strong> um recurso entre outr<strong>os</strong> e não mais<br />

o recurso, a ser usado quando <strong>os</strong> <strong>de</strong>mais houverem se esgotado.<br />

Deste modo, produziu um corte em relação às práticas <strong>de</strong><br />

sequestro da loucura. Além disso, distinguiu a aplicação jurídica<br />

da terapêutica. No campo do tratamento, a internação po<strong>de</strong> se<br />

dar em acordo com a vonta<strong>de</strong> do sujeito, voluntariamente, e em<br />

<strong>de</strong>sacordo com seu querer, involuntariamente. E neste ponto<br />

95


esi<strong>de</strong> a <strong>no</strong>vida<strong>de</strong>, a subversão: se o ato se faz contra a vonta<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> um sujeito, é porque há aí o reconhecimento da expressão <strong>de</strong><br />

um querer, da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> manifestar e <strong>de</strong>cidir sobre sua vida<br />

e seus at<strong>os</strong>, mesmo que em crise ou surto. E visando minimizar<br />

<strong>os</strong> risc<strong>os</strong> <strong>de</strong> p<strong>os</strong>síveis abus<strong>os</strong> da razão <strong>no</strong> uso do po<strong>de</strong>r sobre<br />

a loucura, o responsável por este ato fica obrigado a prestar<br />

contas do mesmo, informando-o ao Ministério Público, instância<br />

convocada pela lei, a avaliar e <strong>de</strong>cidir quanto a pertinência da<br />

<strong>de</strong>cisão e <strong>os</strong> efeit<strong>os</strong> que provocou <strong>no</strong> exercício da cidadania do<br />

sujeito à mesma submetido. Este é o sentido dado pela Lei da<br />

Reforma Psiquiátrica a internação involuntária.<br />

Completamente distinta é a internação compulsória. Nesta não<br />

há manifestação <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>, mas imp<strong>os</strong>ição <strong>de</strong> pena. Aqui tem<strong>os</strong><br />

um ato jurídico, uma prescrição legal <strong>de</strong>terminada por um juiz e<br />

<strong>de</strong>cidida <strong>no</strong> curso <strong>de</strong> um processo e nunca fora <strong>de</strong>le.<br />

O projeto antimanicomial é comumente compreendido como<br />

uma ética que apenas beneficia as pessoas com sofrimento<br />

mental.<br />

Uma “leitura simplista e equivocada, que confun<strong>de</strong> direito<br />

com privilégio, dimensão que a luta antimanicomial jamais<br />

reivindicou para <strong>os</strong> dit<strong>os</strong> louc<strong>os</strong>. A <strong>de</strong>fesa do direito à<br />

liberda<strong>de</strong> e a cida<strong>de</strong> para <strong>os</strong> portadores <strong>de</strong> sofrimento<br />

mental, reconhece a exclusão <strong>de</strong> que eles foram e ainda<br />

são vítimas e reclama o seu direito por cidadania por<br />

compreen<strong>de</strong>r que esta é uma condição preliminar para a<br />

clínica”. (SILVA, 2010, pg. 147)<br />

Tratar em liberda<strong>de</strong> é não pressupor a reclusão como modo <strong>de</strong><br />

tratar, subvertendo tanto a lógica quanto o pensamento clínic<strong>os</strong>.<br />

Abertas as portas, suprimidas as gra<strong>de</strong>s _ primeira tomada <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>cisão, outra mudança <strong>de</strong>ve se operar. Faz-se necessário<br />

abandonar a p<strong>os</strong>ição <strong>de</strong> tutores d<strong>os</strong> louc<strong>os</strong> e da loucura,<br />

recusando, ainda, a condição <strong>de</strong> agentes da or<strong>de</strong>m, inventando ou<br />

<strong>de</strong>scobrindo o <strong>no</strong>vo lugar e função a ser exercida: o <strong>de</strong> parceir<strong>os</strong><br />

da loucura.<br />

Uma das máximas basaglianas ensina que é “preciso colocar<br />

entre parênteses a doença para encontrar o homem”. Deslocar<br />

o olhar da doença para o cidadão que sofre e para o sujeito que<br />

96


se manifesta e assim se expressa é um giro na p<strong>os</strong>ição <strong>de</strong> quem<br />

cuida que p<strong>os</strong>sibilita <strong>de</strong>svelar, na manifestação do sofrimento, <strong>os</strong><br />

sentid<strong>os</strong> ou significad<strong>os</strong> que o mesmo revela ou expressa, mas<br />

também, as conexões e rupturas que põem em jogo.<br />

O sofrimento psíquico ou a crise - sua expressão mais<br />

intensa - po<strong>de</strong>m assim ser percebid<strong>os</strong> para além da dimensão<br />

psicopatológica. Entra em jogo aqui, a necessária escuta e o<br />

reconhecimento do sujeito e do laço social. Assim, tem<strong>os</strong> a<br />

psicopatologia articulada à dimensão subjetiva e ao laço social.<br />

A crise do sujeito, ou o conflito que não encontrou lugar na<br />

subjetivida<strong>de</strong> e por isso tor<strong>no</strong>u-se insuportável e transbordou,<br />

precisa ser escutada naquilo que esta produz <strong>de</strong> tensionamento,<br />

ruptura ou conexão com <strong>os</strong> laç<strong>os</strong> sociais. Mudando a abordagem,<br />

muda-se, também, a resp<strong>os</strong>ta. Não mais traduzida como senha<br />

para a perda da cidadania, a crise po<strong>de</strong> ser inscrita e tratada<br />

buscando a responsabilização p<strong>os</strong>sível, naquele momento<br />

e o consentimento do sujeito/cidadão com o tratamento. As<br />

intervenções, não mais exteriores e traduzidas pela razão,<br />

orientam-se pela palavra do sujeito.<br />

Tomar a fala do louco como orientador da intervenção sobre seu<br />

sofrimento é uma <strong>no</strong>vida<strong>de</strong>, uma ruptura com a institucionalização<br />

que culmi<strong>no</strong>u na consagração da loucura como sinônimo <strong>de</strong><br />

doença mental e esvaziou esta experiência <strong>de</strong> sua verda<strong>de</strong>,<br />

tornando inócuo e <strong>de</strong>stituído <strong>de</strong> sentido o seu dizer.<br />

No meio do mundo sere<strong>no</strong> da doença mental, o homem<br />

mo<strong>de</strong>r<strong>no</strong> não se comunica mais com o louco; há <strong>de</strong> um<br />

lado, o homem <strong>de</strong> razão que <strong>de</strong>lega para a loucura o<br />

médico, não autorizando, assim, relacionamento senão<br />

através da universalida<strong>de</strong> abstrata da doença... a<br />

linguagem da psiquiatria, que é monólogo da razão sobre<br />

a loucura, só pô<strong>de</strong> estabelecer-se sobre um tal silêncio.<br />

(FOUCAULT, pg. 153, 2002. Prefácio (folie et déraison)<br />

in Dit<strong>os</strong> e Escrit<strong>os</strong> nº I. Problematização do sujeito:<br />

psicologia, psiquiatria e psicanálise.<br />

Neste ponto é preciso <strong>de</strong>stacar outro importante conceito: o<br />

vínculo ou a transferência e um <strong>de</strong>sdobramento ou efeito <strong>de</strong>ste, a<br />

97


eferência. Mais que qualquer outro recurso, o que a prática n<strong>os</strong><br />

CAPS revela <strong>de</strong> mais potente é que é o vínculo o recurso que<br />

melhor trata o sofrimento. É esta ferramenta, se quiserm<strong>os</strong> assim<br />

<strong>no</strong>mear, que reveste tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> disponíveis e p<strong>os</strong>síveis <strong>de</strong><br />

serem utilizad<strong>os</strong> <strong>de</strong> sentido terapêutico e <strong>os</strong> tornam potentes na<br />

resp<strong>os</strong>ta. Assim, um remédio tem tanto valor <strong>de</strong> alívio quanto um<br />

simples passeio, ou uma festa, ou ainda, a conquista <strong>de</strong> condições<br />

dignas <strong>de</strong> vida, a elaboração ou a subjetivação da experiência do<br />

sofrimento e a construção <strong>de</strong> um saber sobre a mesma.<br />

E aqui é preciso consi<strong>de</strong>rar as dimensões singular e coletiva<br />

d<strong>os</strong> víncul<strong>os</strong>. No pla<strong>no</strong> micro, a importância do vínculo com um<br />

técnico específico e <strong>no</strong> coletivo ou macro, o vínculo com um serviço.<br />

A <strong>de</strong>sconstrução do manicômio é também e <strong>de</strong> modo sensível,<br />

um processo <strong>de</strong> substituição <strong>de</strong> referências, <strong>de</strong> reen<strong>de</strong>reçamento<br />

do pedido <strong>de</strong> resp<strong>os</strong>ta à dor, antes dirigido à instituição total,<br />

a lugares e sujeit<strong>os</strong> que assumem a responsabilida<strong>de</strong> ética <strong>de</strong><br />

cuidar e funcionar como suporte para a vida <strong>de</strong> sujeit<strong>os</strong>/cidadã<strong>os</strong><br />

vulneráveis e sempre em vias <strong>de</strong> exclusão social.<br />

Não mais assentada sobre o princípio único da totalização e<br />

homogeneização, buscando resp<strong>os</strong>tas singulares e complexas, a<br />

prática n<strong>os</strong> CAPS assume o <strong>de</strong>safio <strong>de</strong> construir seu conhecimento<br />

na partilha d<strong>os</strong> saberes. Um trabalho, portanto, coletivo, feito a<br />

muitas mã<strong>os</strong> e fruto <strong>de</strong> diferentes perspectivas que se orienta<br />

pelo saber do louco e neste se baseia para <strong>de</strong>senhar o projeto <strong>de</strong><br />

tratamento a ser ofertado. Sempre singular e distinto, na medida<br />

mesma da singularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada experiência <strong>de</strong> sofrimento e do<br />

momento <strong>de</strong> vida <strong>de</strong> cada usuário, esta metodologia introduz na<br />

prática clínica um operador – o projeto terapêutico singular, que<br />

articula o sentido d<strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> colocad<strong>os</strong> à disp<strong>os</strong>ição <strong>de</strong> cada<br />

um.<br />

Bússola que orienta usuári<strong>os</strong> e equipes <strong>no</strong> percurso pelo serviço<br />

e pela re<strong>de</strong>, o projeto terapêutico singular, articula <strong>os</strong> recurs<strong>os</strong><br />

colocad<strong>os</strong> à disp<strong>os</strong>ição pela política, mas também aqueles que<br />

n<strong>os</strong> trazem cada usuário, seus familiares e suas referências.<br />

Instrumento mutável que busca respon<strong>de</strong>r às necessida<strong>de</strong>s,<br />

naquele momento e para cada usuário, sendo ainda a expressão<br />

e o espaço <strong>de</strong> inscrição das soluções e estratégias criadas por<br />

98


cada um na reconstrução <strong>de</strong> sua história e vida.<br />

Para um, a permanência diária e h<strong>os</strong>pitalida<strong>de</strong> <strong>no</strong>turna farão<br />

o contor<strong>no</strong> ao sofrimento; para outro, a oferta <strong>de</strong> uma ida ao<br />

cinema e ao teatro, a participação na assembleia e na festa; o<br />

medicamento e a terapia, a negociação e a acolhida d<strong>os</strong> familiares<br />

ou, a conquista <strong>de</strong> uma moradia, o acesso ao trabalho; e para<br />

tod<strong>os</strong> a porta aberta que permite o acesso direto e <strong>no</strong> momento<br />

que uma questão fizer urgência e <strong>de</strong>sorganizar o ritmo do viver,<br />

sem mediações e burocracias. O acesso ao serviço, à proteção e<br />

à palavra para fazer valer <strong>os</strong> direit<strong>os</strong> e a subjetivida<strong>de</strong>.<br />

Mas, a clínica d<strong>os</strong> CAPS distancia-se, e muito, da i<strong>de</strong>ia corrente<br />

que referencia a percepção social acerca do fazer clínico. Ou seja,<br />

a clínica <strong>de</strong> um CAPS não se faz só <strong>de</strong> colóqui<strong>os</strong> íntim<strong>os</strong>. Conjuga<br />

elaboração subjetiva e reabilitação <strong>no</strong> processo <strong>de</strong> construção da<br />

auto<strong>no</strong>mia e da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada usuário. Por isso, agrega à<br />

psicoterapia e ao medicamento, a potência <strong>de</strong> outr<strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> e<br />

intervenções.<br />

Oficinas, assembleias, permanência, h<strong>os</strong>pitalida<strong>de</strong>, mediação<br />

das relações entre <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> e seus familiares, suas referências<br />

e re<strong>de</strong>s têm tanto valor quanto <strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> da ciência e da técnica.<br />

Tratar - para esta clínica, é construir as condições <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> e<br />

capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se inserir na cida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> fazer caber a diferença -<br />

sempre singular, <strong>no</strong> universal da cidadania, com cada usuário.<br />

A clínica <strong>no</strong> território e o confronto com as verda<strong>de</strong>s do manicômio.<br />

As crônicas do cotidia<strong>no</strong> <strong>de</strong> um CAPS são repletas <strong>de</strong> cenas<br />

que <strong>de</strong>monstram, em ato, <strong>os</strong> sentid<strong>os</strong> da <strong>de</strong>sinstitucionalização.<br />

O inusitado presente nas mesmas é efeito <strong>de</strong> uma ap<strong>os</strong>ta que<br />

<strong>de</strong>sconstrói pont<strong>os</strong> <strong>de</strong> “verda<strong>de</strong>” da tradição. Por exemplo:<br />

a convocação à responsabilida<strong>de</strong> do sujeito não se dá pela<br />

imp<strong>os</strong>ição da autorida<strong>de</strong>, nem, apenas, <strong>no</strong> momento da<br />

recuperação da saú<strong>de</strong>. Passa, pela <strong>de</strong>scoberta da luci<strong>de</strong>z e da<br />

capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão, mesmo <strong>no</strong> momento da crise, o que joga<br />

por terra e <strong>de</strong>sconstrói a crença <strong>de</strong> que a crise é momento on<strong>de</strong><br />

a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir e respon<strong>de</strong>r por seus at<strong>os</strong> encontra-se<br />

99


suspensa e o sujeito necessita, sempre, <strong>de</strong> tutela.<br />

A necessida<strong>de</strong> do manicômio como resp<strong>os</strong>ta para alguns<br />

cas<strong>os</strong> é hoje um d<strong>os</strong> argument<strong>os</strong> que <strong>de</strong>safiam a capacida<strong>de</strong><br />

criativa, criadora ética <strong>de</strong> um CAPS. Quase sempre <strong>os</strong> cas<strong>os</strong><br />

sup<strong>os</strong>t<strong>os</strong> como imp<strong>os</strong>síveis para um CAPS apresentam maior<br />

fragilida<strong>de</strong> d<strong>os</strong> laç<strong>os</strong>, ou uma situação <strong>de</strong> abando<strong>no</strong> e ausência<br />

<strong>de</strong> referências. Para estes, a prévia receita da exclusão.<br />

A a<strong>de</strong>quação do sujeito à <strong>no</strong>rma, lembram<strong>os</strong>, não respon<strong>de</strong><br />

à sua necessida<strong>de</strong> singular. O manicômio, resp<strong>os</strong>ta da razão<br />

à loucura, apenas agudiza e torna mais miserável e indigna<br />

qualquer vida. Ou seja, não é solução, mas resp<strong>os</strong>ta simplista<br />

da racionalida<strong>de</strong>. Desconstruí-lo, em tais situações, requer e<br />

introduz <strong>no</strong> cuidado em saú<strong>de</strong> mental situações que extrapolam,<br />

transcen<strong>de</strong>m o arsenal terapêutico, ou melhor, que enriquecem<br />

a clínica ao nesta introduzir as questões relativas à vida e não à<br />

doença.<br />

No texto “Da instituição negada a instituição inventada”,<br />

Franco Roteli n<strong>os</strong> diz que a instituição em questão era o conjunto<br />

<strong>de</strong> aparat<strong>os</strong> científic<strong>os</strong>, legislativ<strong>os</strong>, administrativ<strong>os</strong>, <strong>de</strong> códig<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong> referência cultural e <strong>de</strong> relações <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r estruturad<strong>os</strong> em<br />

tor<strong>no</strong> <strong>de</strong> um objeto bem preciso: “a doença”, à qual se sobrepõe<br />

<strong>no</strong> manicômio o objeto “pericul<strong>os</strong>ida<strong>de</strong>”. Por que querem<strong>os</strong><br />

esta <strong>de</strong>sinstitucionalização? Porque, a n<strong>os</strong>so ver, o objeto da<br />

Psiquiatria não po<strong>de</strong> nem <strong>de</strong>ve ser a pericul<strong>os</strong>ida<strong>de</strong> ou a doença<br />

(entendida como algo que está <strong>no</strong> corpo ou <strong>no</strong> psiquismo <strong>de</strong> uma<br />

pessoa). Para nós, o objeto sempre foi a “existência-sofrimento<br />

d<strong>os</strong> pacientes e sua relação com o corpo social”. O mal obscuro<br />

da Psiquiatria está em haver constituído instituições sobre a<br />

separação <strong>de</strong> um objeto fictício - a doença - da existência global,<br />

complexa e concreta do paciente e do corpo da socieda<strong>de</strong>.<br />

Deste modo, percebe-se que as ações/intervenções<br />

prioritárias na prática clínica d<strong>os</strong> CAPS não provêm da química<br />

nem da elaboração, importantes e necessárias, mas parte do<br />

conjunto <strong>de</strong> estratégias típicas da reabilitação psic<strong>os</strong>social, que<br />

evi<strong>de</strong>nciam a ausência <strong>de</strong> direit<strong>os</strong>, a <strong>de</strong>sabilitação promovida<br />

pela institucionalização <strong>de</strong> um modo <strong>de</strong> vida doente e promovem,<br />

como forma <strong>de</strong> superar tais limites, o acesso ao campo d<strong>os</strong><br />

100


direit<strong>os</strong> e o exercício do protagonismo d<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong>, tecendo junto<br />

com este, re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> suporte e sustentação para seu modo próprio<br />

<strong>de</strong> experimentar o sofrimento e conduzir a vida.<br />

Na perspectiva da <strong>de</strong>sinstitucionazação as terapias – seja<br />

químicas ou psicoterápicas, são mer<strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> <strong>de</strong> mediação<br />

num processo amplo <strong>de</strong> reconstrução d<strong>os</strong> mod<strong>os</strong> <strong>de</strong> viver <strong>de</strong><br />

cada sujeito.<br />

Contudo, é preciso lembrar que como processo em curso,<br />

a prática d<strong>os</strong> CAPS e a ética libertária da reforma psiquiátrica<br />

convivem e se <strong>de</strong>frontam, cotidianamente, com <strong>os</strong> mit<strong>os</strong> da<br />

incapacida<strong>de</strong>, pericul<strong>os</strong>ida<strong>de</strong>, com <strong>os</strong> mandat<strong>os</strong> <strong>de</strong> tutela e<br />

exclusão, ou seja, com a lógica manicomial que interpela a<br />

Reforma Psiquiátrica e <strong>os</strong> CAPS na valida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua resp<strong>os</strong>ta,<br />

mesmo frente à sensível i<strong>no</strong>vação <strong>de</strong> sua prática e seus efeit<strong>os</strong><br />

transformadores.<br />

Um tema frequente e que angustia as equipes d<strong>os</strong> CAPS e<br />

<strong>de</strong>mais serviç<strong>os</strong> da re<strong>de</strong> substitutiva, a a<strong>de</strong>são ao tratamento<br />

revela, um d<strong>os</strong> limites da ap<strong>os</strong>ta da clínica antimanicomial: o<br />

consentimento com o tratamento. Operar <strong>de</strong> forma avessa à<br />

tradição exige criativida<strong>de</strong>, disp<strong>os</strong>ição e ap<strong>os</strong>ta n<strong>os</strong> efeit<strong>os</strong><br />

subjetiv<strong>os</strong> da implicação responsável <strong>de</strong> cada um com o<br />

sofrimento e o modo <strong>de</strong> tratá-lo. Tradicionalmente, a resp<strong>os</strong>ta<br />

seria dada, sem questionament<strong>os</strong>, pelo polo da razão, ou seja,<br />

pela tradução dada pelo técnico à expressão do sofrimento.<br />

Na <strong>de</strong>sinstitucionalização um giro se produzirá e aí, o que era<br />

simples, ou melhor, simplificado, torna-se complexo. Entra em<br />

cena o sujeito louco e sua responsabilida<strong>de</strong>.<br />

Deste modo enquanto o sujeito que sofre não reconhece<br />

quem o cuida como recurso <strong>de</strong> alívio para sua dor, ainda que<br />

frequente ao serviço, mesmo que se m<strong>os</strong>tre obediente à<br />

prop<strong>os</strong>ta <strong>de</strong> organização do tratamento, a eficácia <strong>de</strong>ste percurso<br />

permanecerá reduzida. E o <strong>de</strong>senlace ou o abando<strong>no</strong> <strong>de</strong> um<br />

projeto <strong>de</strong> tratamento po<strong>de</strong> significar, entre outras coisas, um<br />

<strong>de</strong>sencontro entre oferta e <strong>de</strong>manda, uma recusa ativa <strong>de</strong> quem<br />

é tratado à oferta que lhe é feita, ou ainda, a adoção <strong>de</strong> outra<br />

solução - às vezes construída <strong>no</strong> silêncio e na solidão subjetiva,<br />

que não coloca o usuário em conexão com o serviço.<br />

101


A a<strong>de</strong>são ao tratamento ou sua ausência <strong>de</strong>ve ser sempre<br />

problematizada <strong>no</strong> movimento e curso <strong>de</strong> uma história <strong>de</strong><br />

tratamento, implicando a quem conduzo tratamento na tarefa<br />

e responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> buscar contorn<strong>os</strong> que impliquem <strong>os</strong><br />

envolvid<strong>os</strong> - usuári<strong>os</strong>, familiares, equipes, gestores e a cida<strong>de</strong>,<br />

<strong>no</strong> compromisso com a vida, o cuidado e <strong>os</strong> direit<strong>os</strong>.<br />

Uma clínica com tal nível <strong>de</strong> complexida<strong>de</strong> pe<strong>de</strong> formação<br />

à altura. Formação acadêmica, mas, sobretudo, formação<br />

eticamente orientada para a liberda<strong>de</strong>, capaz, portanto, <strong>de</strong> refletir<br />

criticamente sobre o seu fazer, cujo <strong>de</strong>safio é<br />

[...] fazer da teoria uma elaboração permanente, que<br />

sustente, sem conformar, uma prática clínica que, por<br />

sua vez, não perca <strong>de</strong> vista o compromisso terapêutico<br />

que a legitima. A indagação sobre a loucura a serviço do<br />

interesse pel<strong>os</strong> louc<strong>os</strong>. A busca da verda<strong>de</strong> a serviço da<br />

liberda<strong>de</strong> e da solidarieda<strong>de</strong>. (BEZERRA,1992. pag.37. )<br />

Franco Rotelli aponta que<br />

[...] <strong>de</strong> alguma forma somente eles (<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>) n<strong>os</strong><br />

obrigam, se não fecharm<strong>os</strong> n<strong>os</strong>s<strong>os</strong> olh<strong>os</strong>, a esta busca<br />

contínua por <strong>no</strong>vas estratégias. São eles <strong>os</strong> n<strong>os</strong>s<strong>os</strong><br />

formadores. No momento em que aceitam<strong>os</strong> este papel<br />

<strong>de</strong> ser formad<strong>os</strong> por eles, então finalmente começam<strong>os</strong><br />

a enten<strong>de</strong>r alguma coisa do que fazem<strong>os</strong> e, neste<br />

momento, muda-se a relação, e até mesmo o n<strong>os</strong>so<br />

paciente percebe que algo mudou. (ROTELLI,2008 pag.<br />

44)<br />

Desinstitucionalizar a prática implica em abandonar o<br />

manicômio como causa, como sentido lógico que prescreve<br />

mod<strong>os</strong> <strong>de</strong> vida limitad<strong>os</strong>, anônim<strong>os</strong> e sem voz. E para isso não<br />

há manual ou código <strong>de</strong> conduta, mas há uma ética. A ética da<br />

liberda<strong>de</strong>. E há saber. Saber que quase nada se sabe e que o<br />

outro, o louco, po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve n<strong>os</strong> orientar quanto às p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> saída para sua dor.<br />

102


Trabalho em re<strong>de</strong>: uma resp<strong>os</strong>ta sempre complexa e<br />

necessária à <strong>de</strong>sconstrução do manicômio.<br />

A escolha da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> re<strong>de</strong> como modo <strong>de</strong> organizar <strong>os</strong><br />

serviç<strong>os</strong> toma como ponto <strong>de</strong> partida a negação da arquitetura<br />

rígida e hierárquica do manicômio, ou melhor, do sempre vertical<br />

e fechado h<strong>os</strong>pital psiquiátrico, mesmo quando mo<strong>de</strong>r<strong>no</strong> e<br />

asséptico, propondo em seu lugar a instituição <strong>de</strong> estações <strong>de</strong><br />

cuidado, <strong>de</strong> pont<strong>os</strong> <strong>de</strong> referência horizontais e abert<strong>os</strong>. Este é um<br />

d<strong>os</strong> sentid<strong>os</strong>.<br />

Estar em re<strong>de</strong> também é estar em movimento. Nenhum<br />

d<strong>os</strong> disp<strong>os</strong>itiv<strong>os</strong> ou pont<strong>os</strong> <strong>de</strong> cuidado funciona fechado em si<br />

mesmo, e aumentam sua potência quando se articulam em re<strong>de</strong>.<br />

Guimarães R<strong>os</strong>a <strong>de</strong>finiu re<strong>de</strong> como “uma porção <strong>de</strong> burac<strong>os</strong><br />

atad<strong>os</strong> por pedaç<strong>os</strong> <strong>de</strong> barbante”. Ou seja, malha aberta, com<br />

fur<strong>os</strong> ou espaç<strong>os</strong> para a criação <strong>de</strong> p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s. Mas ainda,<br />

malha na qual <strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> po<strong>de</strong>m <strong>de</strong>scansar sua loucura. Uma,<br />

entre as múltiplas re<strong>de</strong>s que compõem a cida<strong>de</strong>, uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> mental é ponto <strong>de</strong> ancoragem. É lugar <strong>de</strong> h<strong>os</strong>pitalida<strong>de</strong> e<br />

fio que ajuda a construir laç<strong>os</strong> com o outro.<br />

Escolher a cida<strong>de</strong> como lócus da experiência clínica com<br />

psicótic<strong>os</strong> pe<strong>de</strong> um trabalho em re<strong>de</strong> como condição para superar<br />

a totalização e a exclusão. Mais que um conjunto <strong>de</strong> serviç<strong>os</strong>,<br />

a re<strong>de</strong> é, <strong>de</strong> modo muito sutil e sensível, aquilo que a anima, a<br />

pulsação do <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> cada um d<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong>, protagonistas das<br />

cenas da <strong>de</strong>sinstitucionalização.<br />

É uma cida<strong>de</strong> igual a um sonho: tudo o que po<strong>de</strong> ser<br />

imaginado po<strong>de</strong> ser sonhado, mas mesmo o mais<br />

inesperado d<strong>os</strong> sonh<strong>os</strong> é um quebra-cabeças que<br />

escon<strong>de</strong> um <strong>de</strong>sejo, ou então o seu op<strong>os</strong>to, um medo.<br />

As cida<strong>de</strong>s, como <strong>os</strong> sonh<strong>os</strong>, são construídas por<br />

<strong>de</strong>sej<strong>os</strong> e med<strong>os</strong>, ainda que o fio condutor <strong>de</strong> seu<br />

discurso seja secreto, que suas regras sejam absurdas,<br />

as suas perspectivas engan<strong>os</strong>as, e que todas as coisas<br />

escondam uma outra coisa. (CALVINO, 2002, p. 44)<br />

103


Lugar da contradição, mas também das p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

encontr<strong>os</strong> e saídas, da tessitura <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s afetivas e materiais,<br />

entre outras, a cida<strong>de</strong> é a escolha ética da reforma psiquiátrica<br />

par inscrição e exercício da clínica cidadã do sofrimento psíquico.<br />

Como na Raíssa <strong>de</strong> Calvi<strong>no</strong> pelo traçado das cida<strong>de</strong>s correm<br />

fi<strong>os</strong> invisíveis que ligam, por instantes, um sujeito a outro e <strong>no</strong><br />

movimento <strong>de</strong> conexão e <strong>de</strong>sconexão traçam formas mutantes.<br />

A cida<strong>de</strong> feliz contém seu avesso e assim sucessivamente, <strong>no</strong><br />

movimento próprio do viver. Dialético, por isso, vivo; contraditório<br />

e real, eis o modo ético da prática clínica da reforma psiquiátrica<br />

revelado <strong>no</strong> espelho da cida<strong>de</strong>.<br />

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EIXO IV – GESTÃO DO TRABALHO<br />

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EIXO IV – GESTÃO DO TRABALHO<br />

Consi<strong>de</strong>rações sobre a Gestão d<strong>os</strong> Serviç<strong>os</strong> e Process<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

Trabalho n<strong>os</strong> CAPS<br />

A implementação e consolidação do Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>,<br />

das ações <strong>de</strong> promoção, prevenção e recuperação na re<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

serviç<strong>os</strong> que o constitui envolve vári<strong>os</strong> níveis <strong>de</strong> gestão, <strong>de</strong>ntre<br />

eles a gestão política, a gestão financeira e gestão <strong>de</strong> pessoas.<br />

Para o êxito e consolidação da política pública <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>no</strong> SUS,<br />

é fundamental a garantia da perspectiva da gestão participativa.<br />

Isso implica a execução <strong>de</strong> uma gestão, por parte do profissional<br />

que ocupa o papel <strong>de</strong> gestor, que envolva a participação efetiva<br />

<strong>de</strong> tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> atores sociais <strong>no</strong> SUS. Dessa forma, é p<strong>os</strong>sível<br />

term<strong>os</strong> compromiss<strong>os</strong> reais e garantirm<strong>os</strong> a continuida<strong>de</strong> e<br />

aprimoramento do Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> <strong>no</strong> n<strong>os</strong>so país.<br />

Fazer a gestão significa estar numa p<strong>os</strong>ição dialogante com<br />

<strong>os</strong> divers<strong>os</strong> atores sociais, sejam eles favoráveis ou contrári<strong>os</strong><br />

ao SUS. O importante é buscar a construção <strong>de</strong> consens<strong>os</strong><br />

coletiv<strong>os</strong>, consi<strong>de</strong>rando tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> atores <strong>no</strong> processo, garantida<br />

a p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> discussão e disputa d<strong>os</strong> diferentes projet<strong>os</strong><br />

polític<strong>os</strong> por eles trazid<strong>os</strong>, afim <strong>de</strong> que a implementação das<br />

ações tenham caráter duradouro e sejam eficazes. As diretrizes<br />

e <strong>de</strong>cisões firmadas nesse processo <strong>de</strong>vem respeitar sempre <strong>os</strong><br />

princípi<strong>os</strong> constitucionais que regem o Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>.<br />

A gestão exige uma p<strong>os</strong>tura firme em relação a<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> do<br />

SUS e ao mesmo tempo uma p<strong>os</strong>tura flexível na compreensão<br />

das inúmeras forças políticas que se apresentam na cena pública<br />

quando estam<strong>os</strong> implantando um <strong>de</strong>terminado programa ou<br />

projeto <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>.<br />

O gestor <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> sabe que <strong>os</strong> conflit<strong>os</strong> e as contradições<br />

fazem parte do cotidia<strong>no</strong> <strong>de</strong> seu trabalho. Orientad<strong>os</strong> pelo<br />

compromisso <strong>de</strong> garantia do acesso ao direito à saú<strong>de</strong>, cabe ao<br />

gestor trabalhar esses conflit<strong>os</strong> e contradições, consi<strong>de</strong>rando<br />

que as ações próprias da clínica, da política e da gestão são<br />

indissociáveis.<br />

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Po<strong>de</strong>m<strong>os</strong> citar inúmer<strong>os</strong> fatores que interferem na implantação<br />

<strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental e <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> geral:<br />

• Atravessament<strong>os</strong> polític<strong>os</strong> partidári<strong>os</strong>, que revelam que a<br />

política <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> ainda é uma política <strong>de</strong> gover<strong>no</strong> e não <strong>de</strong><br />

Estado;<br />

• As diferentes concepções técnicas e teóricas d<strong>os</strong> trabalhadores<br />

do sistema;<br />

• Falta efetiva <strong>de</strong> investiment<strong>os</strong> financeir<strong>os</strong> na consolidação do<br />

sistema, restringindo o acesso da população;<br />

• Precarização das condições <strong>de</strong> trabalho;<br />

• Pouca participação da socieda<strong>de</strong> <strong>no</strong> efetivo controle e<br />

fiscalização d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong>;<br />

• Falta <strong>de</strong> qualificação a<strong>de</strong>quada d<strong>os</strong> profissionais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> para<br />

atuação <strong>no</strong> sistema, entre outras.<br />

A diversida<strong>de</strong> sociopolítica, econômica e as particularida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

cada município influenciam diretamente na gestão, implantação<br />

d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> e na constituição das equipes <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental<br />

<strong>no</strong> âmbito local. A própria realida<strong>de</strong> local impõe à equipe que<br />

reorganize seu processo <strong>de</strong> trabalho. Por exemplo, o processo<br />

<strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> um CAPS <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> do Vale do Jequitinhonha<br />

não é o mesmo <strong>de</strong> uma equipe do CAPS <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />

e, por mais que <strong>os</strong> trabalhadores estejam capacitad<strong>os</strong> técnica e<br />

politicamente em relação a<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> da Reforma Psiquiátrica,<br />

o trabalho exigirá criativida<strong>de</strong> permanente, pois <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong><br />

a equipe se <strong>de</strong>para com pessoas que vivem experiências<br />

específicas e, portanto, com especificida<strong>de</strong>s na constituição da<br />

subjetivida<strong>de</strong>.<br />

Apesar <strong>de</strong> todas essas adversida<strong>de</strong>s, inúmeras experiências<br />

<strong>de</strong>senvolvidas n<strong>os</strong> CAPS <strong>de</strong>monstram que é p<strong>os</strong>sível que<br />

pessoas com transtorn<strong>os</strong> mentais graves se tratem em serviç<strong>os</strong><br />

abert<strong>os</strong>, substitutiv<strong>os</strong> a<strong>os</strong> h<strong>os</strong>pitais psiquiátric<strong>os</strong>. Isto ocorre<br />

quando se realiza um trabalho em equipe, <strong>de</strong> forma articulada<br />

e integrada, quando <strong>os</strong> diferentes profissionais que compõem o<br />

CAPS se reúnem para discutir <strong>os</strong> cas<strong>os</strong> clínic<strong>os</strong>, as dificulda<strong>de</strong>s<br />

administrativas e políticas do serviço, quando compreen<strong>de</strong>m<br />

110


o papel e a função do serviço e se apropriam das diretrizes da<br />

Reforma, quando tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> trabalhadores p<strong>os</strong>suem uma p<strong>os</strong>ição<br />

acolhedora <strong>no</strong> serviço, quando se tem uma gestão com clareza<br />

do significado do papel do CAPS na implantação do processo <strong>de</strong><br />

Reforma Psiquiátrica.<br />

Os Desafi<strong>os</strong> da Gestão Cotidiana do Trabalho n<strong>os</strong> CAPS<br />

O cotidia<strong>no</strong> d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> envolve moment<strong>os</strong> árdu<strong>os</strong> para as<br />

equipes <strong>de</strong>vido a<strong>os</strong> inúmer<strong>os</strong> e complex<strong>os</strong> <strong>de</strong>safi<strong>os</strong> a serem<br />

enfrentad<strong>os</strong>, tais como: infraestrutura ina<strong>de</strong>quada; falta <strong>de</strong> apoio<br />

logístico (materiais <strong>de</strong> higienização, <strong>de</strong> escritório, medicament<strong>os</strong>,<br />

transporte); falta <strong>de</strong> profissionais; entre outr<strong>os</strong>. Inúmeras<br />

condições objetivas relacionadas à gestão do SUS atravessam o<br />

trabalho das equipes, restringindo sobremaneira as p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> intervenções.<br />

Também o conjunto <strong>de</strong> condições que caracterizam a socieda<strong>de</strong><br />

brasileira se expressa como necessida<strong>de</strong>s d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> e estão<br />

presentes <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong> do serviço. Questões como precarieda<strong>de</strong><br />

ou falta <strong>de</strong> moradia, falta <strong>de</strong> trabalho e consequentemente<br />

falta <strong>de</strong> recurs<strong>os</strong> financeir<strong>os</strong> são trazid<strong>os</strong> para as equipes d<strong>os</strong><br />

CAPS e <strong>de</strong>mais serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, gerando pont<strong>os</strong> <strong>de</strong> angústia,<br />

sensação <strong>de</strong> impotência n<strong>os</strong> trabalhadores. Apresentam-se n<strong>os</strong><br />

serviç<strong>os</strong> situações complexas a serem enfrentadas, até porque<br />

as necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>mandadas pel<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> do sistema são<br />

muito abrangentes diante da formação d<strong>os</strong> profissionais e seus<br />

diferentes olhares e fazeres <strong>no</strong> campo da saú<strong>de</strong>.<br />

Diante <strong>de</strong>sses <strong>de</strong>safi<strong>os</strong>, alguns aspect<strong>os</strong> são fundamentais.<br />

O primeiro <strong>de</strong>les é relativo à forma ou método <strong>de</strong> gestão. O<br />

segundo é relativo a<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> que a orientam. Em relação ao<br />

primeiro aspecto, é preciso consi<strong>de</strong>rar que três atores operam<br />

<strong>no</strong> campo da saú<strong>de</strong> pública e são <strong>de</strong> fundamental importância<br />

para o êxito do SUS, quais sejam: <strong>os</strong> gestores, <strong>os</strong> trabalhadores<br />

e <strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>. As alianças ou disputas entre eles, a garantia<br />

<strong>de</strong> espaç<strong>os</strong> <strong>de</strong> discussão e <strong>de</strong>liberação, o reconhecimento do<br />

caráter indissociável do campo para o qual se orientam seus<br />

interesses, são essenciais para a conformação <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo<br />

111


<strong>de</strong> atenção à saú<strong>de</strong> sustentado n<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> do SUS e da<br />

Reforma Psiquiátrica. O mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> atenção será <strong>de</strong>finido a partir<br />

da maneira como esses três atores expressam suas intenções,<br />

lugares e <strong>de</strong>sej<strong>os</strong>, d<strong>os</strong> espaç<strong>os</strong> <strong>de</strong> força política que ocupam,<br />

do modo como se articulam <strong>no</strong> cenário e <strong>de</strong> suas acumulações.<br />

É <strong>de</strong>sse campo <strong>de</strong> <strong>de</strong>bates e embates que emerge a <strong>de</strong>finição<br />

do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> atenção à saú<strong>de</strong> a ser <strong>de</strong>senvolvido e da forma <strong>de</strong><br />

gestão das práticas institucionais e técnicas na re<strong>de</strong> <strong>de</strong> serviç<strong>os</strong>.<br />

Em relação ao segundo aspecto, para o campo da saú<strong>de</strong> e da<br />

saú<strong>de</strong> mental em particular, <strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> que <strong>no</strong>rteiam a gestão<br />

do trabalho são:<br />

1) Trabalho em equipe<br />

O trabalho n<strong>os</strong> CAPS <strong>de</strong>ve ser feito por equipes<br />

multiprofissionais, com uma dimensão interdisciplinar. Na<br />

lida com o sofrimento mental, <strong>os</strong> profissionais d<strong>os</strong> divers<strong>os</strong><br />

camp<strong>os</strong> <strong>de</strong>vem estar preparad<strong>os</strong> para situações inusitadas, que<br />

<strong>de</strong>mandarão intervenções que p<strong>os</strong>sibilitem a construção <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s<br />

personalizadas para cada cidadão que <strong>de</strong>manda o serviço. Isso<br />

exige a análise <strong>de</strong> situações e a produção <strong>de</strong> rep<strong>os</strong>tas à luz <strong>de</strong><br />

diferentes conheciment<strong>os</strong> e intervenções.<br />

Para tanto, é necessária a valorização d<strong>os</strong> divers<strong>os</strong> olhares e<br />

práticas profissionais sobre o objeto (a saú<strong>de</strong> mental), <strong>de</strong>slocando<br />

o centro do saber médico (a psiquiatria) para outr<strong>os</strong> camp<strong>os</strong> do<br />

conhecimento. Do ponto <strong>de</strong> vista d<strong>os</strong> <strong>de</strong>sdobrament<strong>os</strong> <strong>de</strong>ssa<br />

prerrogativa na prática, <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental <strong>de</strong>vem realizar<br />

reuniões clínicas, discutir cada caso e <strong>de</strong>pois fazer a construção<br />

do quadro clínico <strong>de</strong>finindo as estratégias estabelecidas pela<br />

equipe para cada pessoa em tratamento <strong>no</strong> CAPS. Nesse caso,<br />

a responsabilida<strong>de</strong> pelo cuidado com o usuário passa a ser<br />

compartilhada pela equipe e não mais <strong>de</strong> um único profissional.<br />

Neste sentido a equipe não po<strong>de</strong> organizar-se em tor<strong>no</strong> do<br />

saber <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada categoria profissional. Sabem<strong>os</strong> que,<br />

na trajetória histórica da atenção à saú<strong>de</strong> mental, as práticas e <strong>os</strong><br />

conheciment<strong>os</strong> da categoria médica colocaram-se como centrais<br />

na organização e <strong>de</strong>finição das estratégias <strong>de</strong> cuidado. Diante<br />

112


<strong>de</strong>sse campo, <strong>os</strong> outr<strong>os</strong> saberes e profissionais tinham meramente<br />

um papel auxiliar. Na lógica <strong>de</strong> cuidado que <strong>de</strong>ve orientar a<br />

organização do trabalho e da atenção n<strong>os</strong> CAPS, nenhum saber<br />

em específico ocupa o centro, mas as contribuições relativas<br />

ao campo <strong>de</strong> conhecimento e prática das diversas profissões<br />

da saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>vem se colocar a serviço d<strong>os</strong> enfrentament<strong>os</strong><br />

necessári<strong>os</strong> na condução e acompanhamento <strong>de</strong> cada caso. O<br />

trabalho em equipe é fundamental <strong>no</strong> sentido <strong>de</strong> compartilhar as<br />

dificulda<strong>de</strong>s e buscar soluções coletivas para <strong>os</strong> problemas.<br />

2) Atenção e cuidado integral ao sujeito<br />

É essencial que <strong>os</strong> trabalhadores d<strong>os</strong> CAPS priorizem <strong>os</strong> cas<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong> maior complexida<strong>de</strong>, que em geral envolvem questões sociais,<br />

fragilida<strong>de</strong> da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> suporte social do sujeito em sofrimento,<br />

ausência <strong>de</strong> <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> tratamento, não a<strong>de</strong>são a<strong>os</strong> tratament<strong>os</strong><br />

prop<strong>os</strong>t<strong>os</strong>, patologias e psicopatologias em outr<strong>os</strong> membr<strong>os</strong> da<br />

família. Estes <strong>de</strong>safi<strong>os</strong> se constituem como tarefa e função d<strong>os</strong><br />

trabalhadores do CAPS, <strong>no</strong> sentido <strong>de</strong> agenciar estratégias <strong>de</strong><br />

cuidado exatamente por causa e para o enfrentamento da situação<br />

precária em que se encontra o sujeito em sofrimento, situação<br />

que é <strong>de</strong>terminante fundamental <strong>de</strong>sse mesmo sofrimento e da<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atenção.<br />

A dimensão cuidadora na produção <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve ser<br />

incorporada ao processo <strong>de</strong> trabalho, que <strong>de</strong>ve ter como objetivo<br />

principal a produção <strong>de</strong> at<strong>os</strong> <strong>de</strong> cuidado e <strong>de</strong> intervenções sociais<br />

visando à construção <strong>de</strong> auto<strong>no</strong>mia n<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>. É finalida<strong>de</strong><br />

das intervenções clínicas, na perspectiva da clínica ampliada,<br />

a p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> do sujeito cuidar mais <strong>de</strong> si, <strong>de</strong>senvolver e<br />

agenciar estratégias e projet<strong>os</strong> <strong>de</strong> vida a partir <strong>de</strong> sua inserção<br />

e participação social e das condições imp<strong>os</strong>tas pelo manejo<br />

necessário do transtor<strong>no</strong> por ele vivido. Esta é a essência do<br />

trabalho em saú<strong>de</strong> mental: a construção permanente do sujeito<br />

na relação com a socieda<strong>de</strong>.<br />

Sem dúvida, esse é um trabalho individual, a ser criado e tecido<br />

em parceria com cada sujeito e em função das especificida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> cada caso. Se em outr<strong>os</strong> camp<strong>os</strong> da saú<strong>de</strong> as chamadas<br />

113


tec<strong>no</strong>logias encobrem essa necessida<strong>de</strong> e dão a falsa ilusão <strong>de</strong><br />

que a saú<strong>de</strong> p<strong>os</strong>sa operar com uma lógica racional que prescinda<br />

do usuário, na saú<strong>de</strong> mental se impõe outra lógica <strong>de</strong> atenção,<br />

cuja <strong>de</strong>manda central como tec<strong>no</strong>logia são as relações. A primeira<br />

etapa <strong>de</strong>ste processo é o acolhimento. Conforme referenda o<br />

Código <strong>de</strong> Ética Profissional do Psicólogo, se faz necessário<br />

contemplar a diversida<strong>de</strong> que configura o exercício da profissão e<br />

a crescente inserção do psicólogo em context<strong>os</strong> institucionais e em<br />

equipes multiprofissionais, e estimular reflexões que consi<strong>de</strong>rem a<br />

profissão como um todo e não em suas práticas particulares, uma<br />

vez que <strong>os</strong> principais dilemas étic<strong>os</strong> não se restringem a práticas<br />

específicas e surgem em quaisquer context<strong>os</strong> <strong>de</strong> atuação. (CFP,<br />

2005)<br />

3) Acolhimento e referência<br />

Quando um usuário <strong>de</strong>manda um serviço <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> em geral<br />

ou um serviço <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental, dirigindo-se a um trabalhador <strong>de</strong><br />

uma unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, para além da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cuidado<br />

esse cidadão está exercendo o seu direito. Assim, é compromisso<br />

do serviço <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r a este usuário, dando a cada<br />

um as resp<strong>os</strong>tas a<strong>de</strong>quadas para a sua <strong>de</strong>manda. Isto exige<br />

uma p<strong>os</strong>tura acolhedora <strong>de</strong> tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> trabalhadores e gestores.<br />

Acolhimento é pilar para o avanço do SUS e consequentemente<br />

da Reforma Psiquiátrica.<br />

Contudo, <strong>de</strong>finitivamente, acolhimento efetivo <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da<br />

responsabilização da equipe sobre <strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>. Isso requer, por<br />

sua vez, discussões constantes <strong>de</strong> projet<strong>os</strong> coletiv<strong>os</strong> entre <strong>os</strong><br />

membr<strong>os</strong> das equipes por meio <strong>de</strong> uma interlocução permanente<br />

com <strong>os</strong> gestores e usuári<strong>os</strong>. Quando isso não ocorre <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> aumentam o grau <strong>de</strong> burocratização <strong>de</strong> seu funcionamento,<br />

o acesso da população se torna mais difícil, <strong>os</strong> jog<strong>os</strong> <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r<br />

entre <strong>os</strong> três atores se acirram e o resultado é sempre negativo.<br />

O acolhimento <strong>no</strong> CAPS <strong>de</strong>ve ser feito por um profissional <strong>de</strong><br />

nível superior da equipe, que po<strong>de</strong>rá necessitar <strong>de</strong> apoio imediato<br />

<strong>de</strong> outro profissional, ou <strong>de</strong>verá ele próprio tomar as primeiras<br />

<strong>de</strong>cisões quanto às condutas a serem adotadas. Neste momento,<br />

114


é muito importante uma escuta atenta em relação às <strong>de</strong>mandas<br />

trazidas pel<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>.<br />

Provavelmente o profissional da equipe <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental que<br />

acolherá o usuário será o seu Técnico <strong>de</strong> Referência. O técnico <strong>de</strong><br />

referência é responsável pela condução do caso, pela elaboração<br />

<strong>de</strong> estratégias <strong>de</strong> construção do vínculo do usuário com o serviço<br />

e por traçar as linhas do seu projeto terapêutico individual,<br />

<strong>de</strong>finindo com ele a frequência e caracterização d<strong>os</strong> atendiment<strong>os</strong><br />

e do comparecimento ao serviço. Também esse técnico <strong>de</strong>verá<br />

traçar as necessida<strong>de</strong>s e assumir responsabilida<strong>de</strong> sobre <strong>os</strong><br />

contat<strong>os</strong> com a família e com outras pessoas <strong>de</strong> seu espaço social<br />

sempre que necessário. Ou seja, ele <strong>de</strong>ve construir o percurso<br />

do tratamento junto com o usuário. Neste caminho, o técnico <strong>de</strong><br />

referência po<strong>de</strong> necessitar <strong>de</strong> recurs<strong>os</strong> que são disponibilizad<strong>os</strong><br />

por outr<strong>os</strong> profissionais, como por exemplo: prescrição médica<br />

para o uso <strong>de</strong> medicament<strong>os</strong>, oficinas <strong>de</strong> artes conduzidas por<br />

agentes culturais, discussão do caso com <strong>os</strong> colegas da equipe<br />

ou supervisão clinica institucional. Tod<strong>os</strong> esses disp<strong>os</strong>itiv<strong>os</strong><br />

utilizad<strong>os</strong> pelo técnico <strong>de</strong> referência objetivam facilitar e ajudar a<br />

pessoa com sofrimento mental a encontrar p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s diante<br />

da condição em que se encontra. Para que isso seja efetivo, esse<br />

técnico <strong>de</strong>ve ter a clareza <strong>de</strong> que a construção e execução do<br />

projeto terapêutico se produzem na sua relação com o usuário,<br />

<strong>de</strong> modo que <strong>de</strong>ve cuidar daquilo que se processa nesse campo<br />

<strong>de</strong> intersubjetivida<strong>de</strong>.<br />

Compete ao técnico <strong>de</strong> referencia alinhavar a re<strong>de</strong> necessária<br />

ao percurso do usuário, consi<strong>de</strong>rando sua trajetória e <strong>os</strong> projet<strong>os</strong><br />

que apontam como significativ<strong>os</strong> para cada sujeito. Assim, o<br />

técnico <strong>de</strong> referência articula outras equipes e instituições que<br />

<strong>de</strong>vem compor <strong>os</strong> itinerári<strong>os</strong> <strong>de</strong> cuidado do usuário.<br />

Por fim, cabe <strong>de</strong>stacar que <strong>os</strong> CAPS funcionam a partir da<br />

constituição <strong>de</strong> equipes multiprofissionais e interdisciplinares<br />

(psicólog<strong>os</strong>, assistentes sociais, médic<strong>os</strong> psiquiatras, médic<strong>os</strong><br />

clínic<strong>os</strong>, enfermeir<strong>os</strong>, terapeutas ocupacionais, fo<strong>no</strong>audiólog<strong>os</strong>,<br />

115


técnic<strong>os</strong> <strong>de</strong> enfermagem, profissionais administrativ<strong>os</strong> e outr<strong>os</strong>).<br />

Estes profissionais <strong>de</strong>vem organizar o processo <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong><br />

modo a garantir que durante todo o período <strong>de</strong> funcionamento do<br />

serviço o usuário e seu familiar p<strong>os</strong>sam ser acolhid<strong>os</strong> <strong>no</strong> mesmo,<br />

seja quando encaminhad<strong>os</strong> por outr<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, seja<br />

quando encaminhad<strong>os</strong> por instituições <strong>de</strong> naturezas e áreas<br />

diversas ou ainda quando se trata <strong>de</strong> <strong>de</strong>manda espontânea.<br />

4) Vínculo e co-responsabilida<strong>de</strong> pelo cuidado<br />

O vínculo começa pelo acolhimento. Ser bem recebido e<br />

acolhido pel<strong>os</strong> profissionais é condição para o estabelecimento <strong>de</strong><br />

vínculo com o serviço e o tratamento. Mas para que este vínculo<br />

seja p<strong>os</strong>sível é fundamental que o trabalhador se reconheça<br />

como sujeito <strong>de</strong> direit<strong>os</strong> e efetivamente reconheça o usuário da<br />

mesma forma: como um cidadão, que <strong>de</strong>ve ser respeitado em<br />

suas necessida<strong>de</strong>s. Essas necessida<strong>de</strong>s são únicas, na medida<br />

em que expressam as diferenças e singularida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cada<br />

pessoa, e ao mesmo tempo comuns, do ponto <strong>de</strong> vista do direito<br />

<strong>de</strong> participação e convivência social.<br />

O vínculo é uma construção que tem por objetivo buscar uma coresponsabilização<br />

do profissional e do usuário <strong>no</strong> seu tratamento.<br />

No caso d<strong>os</strong> portadores <strong>de</strong> sofrimento mental grave, a construção<br />

<strong>de</strong>sse vínculo muitas vezes é o maior <strong>de</strong>safio para o tratamento,<br />

seja <strong>de</strong>vido às especificida<strong>de</strong>s d<strong>os</strong> transtorn<strong>os</strong> mentais graves,<br />

seja <strong>de</strong>vido à trajetória <strong>de</strong> institucionalização <strong>de</strong>ssas pessoas,<br />

ou ainda <strong>de</strong>vido às dificulda<strong>de</strong>s quanto às p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

relações sociais e <strong>de</strong> convivência na n<strong>os</strong>sa socieda<strong>de</strong>. Diante<br />

disso, o vínculo estabelecido não <strong>de</strong>ve resultar em <strong>de</strong>pendência<br />

do usuário em relação ao profissional, ou mesmo em relação ao<br />

serviço.<br />

5) Participação do usuário na gestão do serviço<br />

Aspecto fundamental a ser consi<strong>de</strong>rado na organização do<br />

processo <strong>de</strong> trabalho d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> é a escuta e participação d<strong>os</strong><br />

própri<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>, seja em relação ao funcionamento da unida<strong>de</strong>,<br />

116


a<strong>os</strong> tratament<strong>os</strong> ofertad<strong>os</strong>, à dinâmica e ao cotidia<strong>no</strong> d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong>.<br />

Neste sentido, <strong>de</strong>vem<strong>os</strong> usar disp<strong>os</strong>itiv<strong>os</strong> como a realização <strong>de</strong><br />

assembleias e rodas <strong>de</strong> conversas, a fim <strong>de</strong> term<strong>os</strong> oportunida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> encontrar soluções para o funcionamento cotidia<strong>no</strong> da unida<strong>de</strong>,<br />

que muitas vezes não são encontradas em espaç<strong>os</strong> <strong>de</strong> discussão,<br />

avaliação e planejamento realizad<strong>os</strong> apenas entre <strong>os</strong> gestores e<br />

trabalhadores.<br />

Formação Profissional<br />

Em tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> event<strong>os</strong>, seminári<strong>os</strong>, congress<strong>os</strong> e conferências<br />

<strong>no</strong> campo da saú<strong>de</strong>, a questão da formação profissional se<br />

apresenta como um nó crítico permanente em relação à distância<br />

entre aquilo que se apren<strong>de</strong> na universida<strong>de</strong> e a realida<strong>de</strong> d<strong>os</strong><br />

serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>.<br />

Em 2004, o Ministério da Saú<strong>de</strong> apresentou a Educação<br />

Permanente em Saú<strong>de</strong> “como uma ação estratégica, capaz <strong>de</strong><br />

contribuir para a transformação d<strong>os</strong> process<strong>os</strong> formativ<strong>os</strong>, das<br />

práticas pedagógicas e <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, para organização d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong>,<br />

empreen<strong>de</strong>ndo um trabalho articulado entre <strong>os</strong> sistemas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong><br />

e suas várias esferas <strong>de</strong> gestão e as instituições formadoras”<br />

(BRASIL, 2004). É importante ressaltar que o campo da Saú<strong>de</strong><br />

Mental foi consi<strong>de</strong>rado como prioritário na política <strong>de</strong> educação<br />

permanente. No entanto, a maioria d<strong>os</strong> municípi<strong>os</strong> não incluiu<br />

em seus projet<strong>os</strong> as equipes <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental como público alvo<br />

<strong>de</strong>sse processo <strong>de</strong> educação.<br />

A <strong>no</strong>ção <strong>de</strong> Educação Permanente em Saú<strong>de</strong> assume<br />

que nenhum curso <strong>de</strong> formação esgota as necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

qualificação para a atuação profissional <strong>no</strong> SUS. A educação<br />

permanente está muito além <strong>de</strong> treinament<strong>os</strong> centrad<strong>os</strong> em teorias<br />

e técnicas para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> habilida<strong>de</strong>s específicas.<br />

Ela objetiva o <strong>de</strong>senvolvimento do profissional como um todo,<br />

com a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ajudá-lo a atuar <strong>de</strong> modo efetivo e eficaz <strong>no</strong><br />

cotidia<strong>no</strong> <strong>de</strong> seu trabalho. Instrument<strong>os</strong> como participação em<br />

supervisões, discussão e construção <strong>de</strong> cas<strong>os</strong> clínic<strong>os</strong>, realização<br />

<strong>de</strong> assembleias com <strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>, criação <strong>de</strong> fóruns <strong>de</strong> discussão,<br />

rodas <strong>de</strong> conversas, reuniões <strong>de</strong> equipes são ferramentas<br />

117


importantes que contribuem para <strong>de</strong>senvolvimento profissional.<br />

Estratégias que se efetivam como <strong>de</strong>mocratização das relações<br />

entre <strong>os</strong> trabalhadores, conferindo a tod<strong>os</strong> eles, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong><br />

sua formação profissional, o direito <strong>de</strong> voz e voto, produzem maior<br />

responsabilida<strong>de</strong> do profissional diante do usuário e do projeto<br />

<strong>de</strong> trabalho e, nessa medida, contribuem para a sua qualificação<br />

profissional.<br />

No complexo campo da saú<strong>de</strong>, a busca pela auto<strong>no</strong>mia<br />

d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> e d<strong>os</strong> profissionais é um <strong>de</strong>safio, na medida em<br />

que <strong>os</strong> indivídu<strong>os</strong> autô<strong>no</strong>m<strong>os</strong> são protagonistas n<strong>os</strong> coletiv<strong>os</strong><br />

em que participam, co-responsáveis pelo cuidado <strong>de</strong> si e do<br />

mundo em que vivem, ou seja, co-responsáveis <strong>no</strong> processo <strong>de</strong><br />

produção <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Este tipo <strong>de</strong> construção p<strong>os</strong>sibilita enriquecer<br />

as subjetivida<strong>de</strong>s, contemplando a educação em serviço,<br />

complementando a formação técnica <strong>de</strong> graduação e pósgraduação,<br />

qualificando a organização do trabalho n<strong>os</strong> divers<strong>os</strong><br />

níveis <strong>de</strong> gestão d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e <strong>no</strong> controle social.<br />

Tem<strong>os</strong> que reconhecer que a maioria das capacitações não<br />

se m<strong>os</strong>tram eficientes e eficazes, seja em relação a<strong>os</strong> seus<br />

<strong>de</strong>sdobrament<strong>os</strong> na gestão, na atenção ou <strong>no</strong> controle social. Isso<br />

porque muitas <strong>de</strong>las são prop<strong>os</strong>tas com objetivo <strong>de</strong> transmissão<br />

<strong>de</strong> conheciment<strong>os</strong>/informações. Assim, muitas vezes nessas<br />

capacitações <strong>os</strong> <strong>de</strong>safi<strong>os</strong> do cotidia<strong>no</strong> não são publicizad<strong>os</strong> e<br />

discutid<strong>os</strong>, pois isso revelaria <strong>os</strong> <strong>de</strong>sconfort<strong>os</strong> das equipes. Neste<br />

sentido, a presença e a participação d<strong>os</strong> gestores, consultores,<br />

assessores, supervisores clínic<strong>os</strong> institucionais nestes process<strong>os</strong><br />

é fundamental para a construção <strong>de</strong> uma atenção a Saú<strong>de</strong> mais<br />

humanizada e <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>. Essas discussões coletivas do<br />

cotidia<strong>no</strong> do trabalho po<strong>de</strong>m trazer à cena aquilo que n<strong>os</strong> <strong>no</strong>rteia<br />

<strong>no</strong> trabalho tão complexo e <strong>de</strong>licado que é a produção <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>,<br />

ou seja, sua dimensão ética e política. É preciso ter a coragem <strong>de</strong><br />

construir junto com as equipes e <strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> as saídas para seus<br />

impasses, numa p<strong>os</strong>tura <strong>de</strong>mocrática e dialogante.<br />

118


Consi<strong>de</strong>rações Finais<br />

Devido à complexida<strong>de</strong> do significado do processo saú<strong>de</strong>/<br />

doença para <strong>os</strong> profissionais e população, o cotidia<strong>no</strong> do trabalho<br />

<strong>de</strong>ve estar sempre sob análise, pois é nesse cotidia<strong>no</strong> que se<br />

transformam e se reconstroem <strong>os</strong> sentid<strong>os</strong> produzid<strong>os</strong> sobre tal<br />

processo, tanto para <strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> quanto para <strong>os</strong> profissionais <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong>.<br />

A partir <strong>de</strong>sta compreensão, enten<strong>de</strong>-se que é necessário, e<br />

p<strong>os</strong>sível, produzir a a<strong>de</strong>são d<strong>os</strong> trabalhadores a<strong>os</strong> process<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

mudança do cotidia<strong>no</strong>. Tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> instrument<strong>os</strong> e recurs<strong>os</strong> para<br />

a formação técnica po<strong>de</strong>m e <strong>de</strong>vem ser utilizad<strong>os</strong>. No entanto,<br />

precisa-se romper com um certo mito <strong>de</strong> que <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e<br />

<strong>os</strong> CAPS só alcançarão a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sejada se <strong>os</strong> trabalhadores<br />

tiverem certas habilida<strong>de</strong>s e comportament<strong>os</strong> para o setor. Isso<br />

se alcança num processo <strong>de</strong> construção cotidiana n<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong>.<br />

Não se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar que para se realizar o trabalho em<br />

saú<strong>de</strong> é necessário um nível <strong>de</strong> sensibilida<strong>de</strong> para a atuação em<br />

tão complexo campo. No entanto, o maior <strong>de</strong>safio consiste em se<br />

ter a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reconhecer que <strong>os</strong> trabalhadores são atores<br />

ativ<strong>os</strong> e estratégic<strong>os</strong> <strong>no</strong> or<strong>de</strong>namento das práticas que tanto se<br />

almejam: práticas acolhedoras e resolutivas <strong>de</strong> atenção e gestão<br />

<strong>de</strong> saú<strong>de</strong>.<br />

A implicação d<strong>os</strong> trabalhadores <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>no</strong> Sistema <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da sua participação e das transformações operadas <strong>no</strong><br />

cotidia<strong>no</strong> do trabalho e esta implicação, por sua vez, é necessária<br />

para respon<strong>de</strong>r a<strong>os</strong> ansei<strong>os</strong> da população e d<strong>os</strong> gestores.<br />

Ainda não se alcaçou a organização d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> maneira integrada; ela ocorre hoje <strong>de</strong> maneira fragmentada.<br />

N<strong>os</strong> CAPS, as equipes po<strong>de</strong>m ter uma impressão <strong>de</strong> um trabalho<br />

articulado e integrado <strong>no</strong> âmbito relativo ao interior do serviço.<br />

Contudo, quando esse trabalho necessita <strong>de</strong> articulações mais<br />

firmes e duradouras com outr<strong>os</strong> setores da saú<strong>de</strong> e setores afins<br />

é revelado o seu caráter fragmentado e as falhas das re<strong>de</strong>s ficam<br />

mais evi<strong>de</strong>ntes.<br />

Cabe afirmar que o maior <strong>de</strong>safio do processo <strong>de</strong> trabalho<br />

<strong>de</strong>ntro do campo da saú<strong>de</strong> mental é superar a divisão que <strong>os</strong><br />

119


profissionais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> ten<strong>de</strong>m a trazer para a cena cotidiana<br />

do serviço, a partir d<strong>os</strong> seus camp<strong>os</strong> <strong>de</strong> saber e po<strong>de</strong>r. As<br />

diversida<strong>de</strong>s das experiências e vivências d<strong>os</strong> profissionais e<br />

d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> levam <strong>os</strong> atores envolvid<strong>os</strong> a ter que apren<strong>de</strong>r a<br />

apren<strong>de</strong>r, trabalhar em equipe, compartilhando saberes, trocas e<br />

estabelecendo comunicações nas situações simples do cotidia<strong>no</strong>.<br />

Porém, para se chegar a esse ponto é necessário a construção<br />

<strong>de</strong> espaç<strong>os</strong> coletiv<strong>os</strong>, n<strong>os</strong> quais existam discussões entre <strong>os</strong><br />

membr<strong>os</strong> da equipe sobre o cotidia<strong>no</strong> do trabalho, <strong>os</strong> cas<strong>os</strong><br />

atendid<strong>os</strong>, as estratégias traçadas, para a instalação do diálogo e<br />

a construção <strong>de</strong> <strong>no</strong>v<strong>os</strong> saberes. Se isso <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da compreensão<br />

da complexida<strong>de</strong> do processo <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, ao mesmo<br />

tempo a constrói e reformula na experiência vivida.<br />

Finalmente, com a apresentação <strong>de</strong>ssa referência técnica não<br />

se tem – e nem se po<strong>de</strong>ria ter – a pretensão <strong>de</strong> finalizar <strong>os</strong> estud<strong>os</strong><br />

que <strong>de</strong>vem ser constantemente realizad<strong>os</strong> pel<strong>os</strong> profissionais.<br />

O CAPS como um disp<strong>os</strong>itivo na Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Atenção Psic<strong>os</strong>social<br />

<strong>de</strong>manda uma busca permanente <strong>de</strong> referências bibliográficas<br />

concernentes à Reforma Psiquiátrica. O presente documento não<br />

se propõe a ser um guia, mas um subsídio as(<strong>os</strong>) psicólogas(<strong>os</strong>)<br />

e gestores que atuam <strong>no</strong> CAPS.<br />

120


REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS<br />

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sobre sua constituição.São Paulo: Unimarco Editora/Educ, 1998,<br />

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São Paulo: Ática, 1996.<br />

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DF: Senado, 1988.<br />

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sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação<br />

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correspon<strong>de</strong>ntes. Institui o Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>. Brasília; DF,<br />

1990.<br />

________. Lei No 8182 <strong>de</strong> 19 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1990. Esta lei<br />

surgiu <strong>de</strong>vido a<strong>os</strong> vet<strong>os</strong> que a Lei 8080/90 recebeu em relação<br />

à participação da comunida<strong>de</strong> (Artigo 11-vetado) e ao repasse<br />

direto <strong>de</strong> recurs<strong>os</strong> (§§2º e 3º, do Art.33e § 5º Art.35- vetad<strong>os</strong>).<br />

Brasília; DF, 1990.<br />

________. SECRETARIA NACIONAL DE ASSISTÊNCIA A<br />

SAÚDE. Portaria/SNAS Nº 224 - 29 <strong>de</strong> Janeiro <strong>de</strong> 1992. Brasília;<br />

MS, 2011.<br />

________. Lei No 10.2016- <strong>de</strong> 06 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 2001. Dispõe<br />

121


sobre a proteção e <strong>os</strong> direit<strong>os</strong> das pessoas portadoras <strong>de</strong><br />

transtorn<strong>os</strong> mentais e redireciona o mo<strong>de</strong>lo assistencial em saú<strong>de</strong><br />

mental. Brasília; DF, 2001.<br />

________. Lei No 10.708- <strong>de</strong> 31 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 2003. Lei<br />

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acometid<strong>os</strong> <strong>de</strong> transtorn<strong>os</strong> mentais egress<strong>os</strong> <strong>de</strong> internações.<br />

Brasília; DF, 2003.<br />

________. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria <strong>de</strong> Gestão do<br />

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após Caracas - Ministério da Saú<strong>de</strong>, 2005, p. 26. Disponível em<br />

http://bvsms.sau<strong>de</strong>.gov.br/bvs/publicacoes/Relatorio15_an<strong>os</strong>_<br />

Caracas.pdf; ùltimmo acesso em 04/07/2013<br />

________. MINISTERIO DA SAÚDE. Portaria GM/MS nº<br />

3.088/2011 –, preconiza o atendimento a pessoas com sofrimento<br />

ou transtor<strong>no</strong> mental e com necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>correntes do uso <strong>de</strong><br />

crack, álcool e outras drogas. Brasília; MS, 2011.<br />

BOCK, Ana Mercês Bahia. A Psicologia a caminho do <strong>no</strong>vo<br />

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CASTEL, R. A Or<strong>de</strong>m Psiquiátrica - A ida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ouro do<br />

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122


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Profissional do Psicólogo. Brasília: CFP, 2005.<br />

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Políticas Públicas-<strong>CREPOP</strong>. Atuação d<strong>os</strong> Psicólog<strong>os</strong> <strong>no</strong> CAPS.<br />

Relatório Descritivo Preliminar <strong>de</strong> Pesquisa, Brasília, 2007<br />

______. <strong>Centro</strong> <strong>de</strong> Referências Técnicas Em Psicologia e<br />

Políticas Públicas-<strong>CREPOP</strong>. <strong>Centro</strong> <strong>de</strong> Estud<strong>os</strong> <strong>de</strong> Administração<br />

Pública e Gover<strong>no</strong> da Escola <strong>de</strong> Administração <strong>de</strong> Empresas <strong>de</strong><br />

São Paulo da Fundação Getúlio Vargas-CEAP/FGV. Documento<br />

Relatório preliminar <strong>de</strong> análise qualitativa d<strong>os</strong> dad<strong>os</strong> da<br />

pesquisa sobre a atuação d<strong>os</strong>/as psicólog<strong>os</strong>/as <strong>no</strong> CAPS,<br />

São Paulo, 2008<br />

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um asilo. Rio <strong>de</strong> Janeiro, Paz e Terra.1986.<br />

DE OLIVEIRA SILVA, M. V. O Movimento da Luta<br />

Antimanicomial e o Movimento d<strong>os</strong> Usuári<strong>os</strong> e Familiares.<br />

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2010.<br />

DELGADO, P. G. G.. As Razões da Tutela. Ed. Te Corá. Rio<br />

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123


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LISTA REFERÊNCIA CAPS<br />

125


ANEXO I- LISTA DE REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFI-<br />

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v. 1000. 382p.<br />

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v. 01.<br />

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130


131


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