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OCULTOS E EXCLUÍDOS - Claudio Di Mauro

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Rio Claro do começo do século deixa claro o tipo de tratamento que negros e<br />

mulatos recebiam no noticiário policial.<br />

Aviltar mulheres negras era um hábito. A idéia de que os<br />

abolicionistas, mesmo os mais inflamados, estavam livres do preconceito racial<br />

contra os negros é um mito. Muitos, apesar da contribuição libertária, viram-se<br />

como brancos superiores lutando por uma causa de seres inferiores. Em Rio<br />

Claro tivemos bons exemplos disso. Lucas Ribeiro do Prado foi um de nossos<br />

mais exaltados abolicionistas, não obstante, insistia continuamente sobre a sua<br />

superioridade moral diante dos ex-escravos. (Warren Dean, 1977)<br />

Numa situação, insultado por uma liberta, retorquiu: “Cala a boca,<br />

negra, eu não te arranquei do tronco, do vira mundo, do bacalhau, da escada<br />

da gargalheira e da senzala para sofrer desaforo seu!”<br />

A história oficial de Rio Claro conta com orgulho, até certo ponto<br />

justificado, de seu pioneirismo em antecipada libertação dos escravos. Esquecese<br />

de que o Ceará antecipou-se na Abolição em quatro anos. Aqui no município,<br />

o fato aconteceu em 5 de fevereiro de 1888, meses antes da promulgação da<br />

Lei Áurea. Falta ver, no entanto, que a lei não tinha poderes superiores à<br />

legislação nacional. Na prática, escravos continuaram a existir no município.<br />

A Câmara Municipal, por sua vez, sempre foi contra as anteriores<br />

tentativas de libertação ou quaisquer outras iniciativas que facilitassem a vida<br />

dos escravos. E mais, da grande festa da Abolição Municipal, que reuniu perto<br />

de 3 mil pessoas na praça central, não há qualquer registro de que negros e<br />

mulatos tenham dela participado. Foi uma festa exclusivamente de brancos<br />

jogando confetes em si próprios. <strong>Di</strong>ante disso tudo, nada mais natural que as<br />

comemorações da Abolição da Escravatura tenham sido repudiadas pelas<br />

gerações atuais.<br />

O grande comandante da festa da libertação antecipada de Rio Claro<br />

foi o presidente da Câmara Municipal e ao mesmo tempo prefeito, Barão do<br />

Grão Mogol. Até hoje ele é conhecido por seu amplo relacionamento sexual com<br />

as escravas (chegou a reconhecer 15 filhos mulatos no fim da vida), justificado<br />

pela desculpa de que sua mulher era louca e, por isso, precisava ser mantida<br />

presa no sótão da casa.<br />

Enquanto sua esposa ficava trancada no sótão, a preferência do barão<br />

estava no porão. Seu capanga, um negro baiano que continuou a viver na casagrande<br />

da fazenda muito depois da morte do barão (e partilhou de suas<br />

propriedades), deixava atônita a família de imigrantes que cuidava dele em<br />

seus últimos anos, com as histórias das orgias sádicas presididas pelo barão no<br />

seu porão. Seus convidados eram todos distintos membros da elite local e as<br />

escravas do barão, acorrentadas a postes e grades. (Warren Dean, 1977)

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