OCULTOS E EXCLUÃDOS - Claudio Di Mauro
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de um sol ardente. Sentindo-se mal, procurou a varanda de uma casa, mas<br />
tombou desalentado”.<br />
Prossegue o relato.<br />
“As autoridades logo o recolheram à enfermaria militar do Campinho.<br />
Ali foi tratado com todo desvelo. O diretor, major Fausto de Souza, depois seu<br />
biógrafo, acolheu humanamente o desconhecido. Cuidaram dele o médico e o<br />
farmacêutico militar. Mudaram-lhe as roupas e deram-lhe uns caldos. Apenas<br />
respondia por monossílabos e com movimentos de cabeça, tal a sua fadiga. Um<br />
pouco reanimado com os cuidados, manifestou ao médico e ao enfermeiro o seu<br />
reconhecimento, dizendo-lhes que desejava ficar só com Deus e voltou-se com<br />
dificuldade para a parede, parecendo dormir sossegadamente. Conceição morria<br />
em tais condições. Era festiva noite de Natal”.<br />
O major Fausto de Souza e o subdelegado Honório Gurgel resolveram<br />
dar-lhe um enterro decente. Foi sepultado no cemitério do Irajá, como<br />
indigente, ignorada sua identidade. Há controvérsias sobre como o corpo teria<br />
sido enfim identificado. Uma das versões diz que alguém enviado de Blackford<br />
teria chegado a tempo de representar “a igreja evangélica naquela solenidade”.<br />
Temudo Lessa, ainda registra: “<strong>Di</strong>vulgada a morte de Conceição, a<br />
Igreja exultou. O bispo Dom Lacerda intimou à sua presença o capelão de<br />
Campinho e o vigário de Irajá pelo crime de haverem permitido a sepultura no<br />
terreno sagrado”. Em apaixonado relato, Lessa prossegue registrando que<br />
ambos, capelão e vigário, teriam sido ameaçados de excomunhão, “de que só<br />
escaparam pelo fato de alegarem não saber de quem se tratava”. Segundo<br />
Lessa, ter-se-ia falado inclusive em exumação do corpo, “o que não se realizou<br />
por haver alguém ameaçado de levar o fato ao conhecimento de Ganganelli, o<br />
destemido Saldanha Marinho, que então desfechava golpes contra o clero em<br />
suas pregações políticas”.<br />
Lessa conclui, “ainda assim, antes de terminar o prazo legal de cinco<br />
anos, no final de três anos, os restos foram exumados, sendo o cemitério<br />
novamente benzido”. Em 1877, portanto, os despojos foram trasladados para o<br />
Cemitério dos Protestantes de São Paulo. José Manoel da Conceição está<br />
sepultado ao lado do pioneiro Simonton.<br />
<strong>Di</strong>z a tradição que católicos aproveitaram-se do desconcertante fim do<br />
ex-padre para divulgar através da imprensa que os protestantes haviam<br />
desprezado o seu ministro, que, maltrapilho e faminto, morrera abandonado.<br />
Para contestar tais versões, Blackford requereu certificados do subdelegado<br />
Gurgel e do major Fausto de Souza, que teriam atestado a realidade dos fatos<br />
como eles têm sido narrados até hoje.<br />
Boanerges Ribeiro completa seu estudo sobre Conceição afirmando<br />
crer que “no fundo sempre o feriu o sentimento da própria excentricidade, da