OCULTOS E EXCLUÃDOS - Claudio Di Mauro
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Ao relatar procedimentos eleitorais do início da década de 1960, a<br />
autora chama à atenção o uso recorrente do ambíguo discurso que tenta somar<br />
tradição com mudança. Ao mesmo tempo em que os candidatos enfatizam<br />
representar a tradição conservadora, apregoam a necessidade de mudanças,<br />
alimentando as expectativas por implantação de novas indústrias para geração<br />
de emprego e valorização imobiliária.<br />
A idéia de “renovação” naquele momento é carro-chefe dos discursos,<br />
quando se apregoava “renovação administrativa e idealista”, “renovação<br />
radical” e “renovação pela juventude”. Ressalta a socióloga, “as diferentes<br />
concepções de “renovação” prendiam-se igualmente à idéia de “renovar<br />
homens no poder” como meio de renovar a administração, impulsionar a<br />
indústria, comércio etc., não significando mudança estrutural, mas<br />
simplesmente a alternância de grupos no centro de decisões políticas”.<br />
Dentro deste item cabem ainda os depoimentos de dois políticos<br />
daquele momento. Um deles, embora sua origem seja das mais humildes,<br />
reconhece a força dos componentes tradicionais na estrutura eleitoral e explica<br />
como a eles se adaptou, alinhando que, “eleição no interior é muito engraçado,<br />
a gente fala uma coisa e está fazendo outra; eu já não falo nada, faço<br />
campanha pessoal, arranjo emprego, faço promessa, dou camisa de futebol,<br />
bola, danço com preta e coroei rainha. Todos têm interesses baixos, é muito<br />
difícil haver sinceridade de propósitos”. Outra perspectiva é a do profissional<br />
liberal que, não se dispondo a comprar votos nem a fazer campanha nos<br />
moldes tradicionais, se queixa. “Os votos que recebi são de gente esclarecida.<br />
Esclarecimento não há no povo porque o povo não está à altura de o receber. O<br />
povo sempre escolhe o pior porque é enganado em praça pública e isto é em<br />
âmbito nacional”, finaliza.<br />
O expurgo histórico a que foi submetida a memória local sobre como<br />
tenha ocorrido no município a ruptura da ordem institucional pelo Golpe de<br />
1964, fica em condições de ser superado em muitos aspectos através dos<br />
registros apresentados por Neusa Costa Davids. Seu trabalho relata episódios<br />
vividos junto à Câmara Municipal, passíveis de resgate.<br />
Consolidado o golpe, já no dia primeiro de abril foi convocada sessão<br />
extraordinária para “tomada de posição em consonância às gloriosas tradições<br />
de defesa dos postulados democráticos”, como dizia o presidente abrindo a<br />
sessão.<br />
Ali se decidiu pelo envio de “Moção Democrática” ao Comando<br />
Revolucionário, assinado pelos presentes, excluindo-se dois vereadores que<br />
ainda reconheciam, àquela altura, o senhor João Goulart como presidente do<br />
Brasil e, por fidelidade partidária não assinaram.