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Leituras de nós – ciberespaço e literatura. Alckmar - Itaú Cultural

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na extensão <strong>de</strong> um e <strong>de</strong> outro, e que se torna, <strong>de</strong> fato, mero arremedo <strong>de</strong> profundida<strong>de</strong>. Para retomar a<br />

questão em termos mais simples (emprestados à lingüística tradicional), po<strong>de</strong>-se dizer que temos uma<br />

multiplicação <strong>de</strong> significantes admitindo uma produção imediata, simplista e atropelada <strong>de</strong> significados,<br />

sem que uns permitam <strong>de</strong>ambular pelos outros, sem que se estabeleçam movimentos <strong>de</strong> significação que<br />

sejam verda<strong>de</strong>iramente plurais. Na verda<strong>de</strong>, é como se significados e significantes se ignorassem<br />

mutuamente, multiplicando-se à exaustão, feito dois jogos <strong>de</strong> espelhos paralelos e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes, sem<br />

nenhuma possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> formar uma terceira imagem, um local intermédio, um espaço <strong>de</strong><br />

reversibilida<strong>de</strong>s. Esse excesso <strong>de</strong> significantes e significados remeteria então ao mesmo movimento, à<br />

idêntica fôrma, à igual forma, a um ruído monótono e hipnótico, tantra <strong>de</strong>sgastado <strong>de</strong> uma transcendência<br />

falha e frágil, um nirvana eletrônico em que a consciência do todo não está nem prevista na lógica <strong>de</strong><br />

programação, nem po<strong>de</strong> ser inserta no horizonte <strong>de</strong> leitura. Ou ainda, como se os dois sistemas <strong>de</strong> espelhos,<br />

embora in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes um do outro, marcassem a mesma data: a <strong>de</strong> um tempo vazio sem vida e sem<br />

perspectivas, igualados apenas pela mão malévola <strong>de</strong> um malin génie ocupado em produzir ilusões e<br />

simulacros. Mas é claro que não há malin génie algum, afora nossa tendência em ler torto, em ler pouco.<br />

De outro lado – e temos aqui a segunda conseqüência –, esse excesso concreto e imediato do texto em<br />

espaço eletrônico po<strong>de</strong> também estabelecer uma proliferação <strong>de</strong> significantes e <strong>de</strong> significados que não<br />

impliquem uma fuga cega para diante. Teríamos então a alavancagem <strong>de</strong> significantes e <strong>de</strong> significados em<br />

direção a novas possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> expressão, trazendo para o espaço <strong>de</strong> leitura sempre outros níveis <strong>de</strong><br />

significação. Tal espaço <strong>de</strong> leitura po<strong>de</strong> se tornar, assim, ao mesmo tempo, o espaço <strong>de</strong> instalação <strong>de</strong> um<br />

corpo <strong>de</strong> leitor e <strong>de</strong> um corpus <strong>de</strong> leitura, um remetendo ao outro, um lendo o outro. E é importante insistir<br />

na concretu<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses movimentos, tanto os dos textos abrindo percursos e multiplicando <strong>de</strong>rivas quanto<br />

aqueles do leitor, como que levantando ombros e esticando o pescoço em busca <strong>de</strong> esten<strong>de</strong>r a vista para<br />

novos horizontes <strong>de</strong> significações. Com isso, são outros campos <strong>de</strong> sentidos que se entreabrem à construção<br />

<strong>de</strong> distintos percursos <strong>de</strong> leitura, tal como se vê em Antologia Labiríntica, em que as ligações hipertextuais<br />

pré-programadas não dão conta das possibilida<strong>de</strong>s todas <strong>de</strong> leitura: <strong>de</strong> fato, nada nos impe<strong>de</strong> <strong>de</strong> abrirmos<br />

duas (ou mais) janelas do navegador, partindo da mesma URL inicial e seguindo em cada janela um percurso<br />

diferente, mas sempre comparado, justaposto, inserido à primeira (neste instante, é obrigatório parar <strong>de</strong> ler<br />

este texto e voltar-se para esse outro <strong>de</strong> que aqui se fala, o texto eletrônico acima citado como exemplo;<br />

será possível ver que ao limitado – mesmo que numeroso – das ligações e dos caminhos pré-programados<br />

pelo autor vêm-se somar as possibilida<strong>de</strong>s – mesmo que limitadas – dos programas <strong>de</strong> hiperleitura, sem<br />

contar o ilimitado dos gestos e das leituras que a todos nós, leitores, é dado).<br />

Assim, essa imediatez entre os nós colocados um ao lado do outro (pela imposição das ligações<br />

preestabelecidas na programação do hipertexto) po<strong>de</strong>-se per<strong>de</strong>r e se alargar ao mesmo tempo: per<strong>de</strong>-se ao<br />

se <strong>de</strong>ixar guiar cega e exclusivamente por uma lógica <strong>de</strong> leitura rígida e imposta a priori na programação,<br />

por um autor ex-machina; alarga-se pela <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong> um exercício <strong>de</strong> pluralização que vem acompanhado<br />

obrigatoriamente (para que seja pluralização) <strong>de</strong> um refinamento da leitura e do próprio leitor. 2 Daí a<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fazermos uma distinção entre o excesso e o excessivo. Excesso seria justamente esse<br />

transbordo <strong>de</strong> significantes e <strong>de</strong> significados, permitindo estabelecer significações coerentes e articuladas a<br />

um percurso <strong>de</strong> leitura dotado <strong>de</strong> coerências e <strong>de</strong> lógicas. É o que se po<strong>de</strong> fazer com o texto eletrônico <strong>de</strong><br />

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