pintura realista russa no século xx - Revista de História e Estudos ...
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Fênix – <strong>Revista</strong> <strong>de</strong> História e <strong>Estudos</strong> Culturais<br />
Outubro/ Novembro/ Dezembro <strong>de</strong> 2008 Vol. 5 A<strong>no</strong> V nº 4<br />
ISSN: 1807-6971<br />
Disponível em: www.revistafenix.pro.br<br />
4<br />
pré-<strong>de</strong>terminado para recebê-las. Esta imobilida<strong>de</strong> não é, por si só, um atributo que<br />
comprometa a dimensão estética da imagem, até porque, sabemos que toda arte é uma<br />
ficção, e seja qual for o gênero <strong>de</strong> figuração que a obra apresente, ela jamais <strong>de</strong>ve ser<br />
avaliada a partir do grau <strong>de</strong> semelhança com objetos ou pessoas do mundo concreto. O<br />
problema estético concernente a esta e outras imagens do período emerge quando <strong>no</strong>s<br />
lembramos que os artistas da AKRR, conquanto conscientes da ficção que produziam,<br />
se <strong>de</strong>clarassem documentaristas da história. Talvez seja por essa discrepância que o<br />
espírito <strong>realista</strong> não sobreviva, e talvez isto explique a sensação <strong>de</strong> artificialida<strong>de</strong> que<br />
experimentamos ao visualizar a imagem.<br />
A análise <strong>de</strong>sta obra <strong>no</strong>s remete <strong>no</strong>vamente ao problema do realismo, um<br />
conceito que, na <strong>pintura</strong> soviética dos a<strong>no</strong>s 20, não foi assimilado <strong>de</strong> forma idêntica por<br />
todos os grupos. Ao observarmos as figuras humanas inertes ali apresentadas como<br />
trabalhadores reais, o que constatamos é uma espécie <strong>de</strong> coisificação do huma<strong>no</strong>, o<br />
homem transmutado em objeto. Este ponto é discutido exaustivamente por Vazquez na<br />
obra As Idéias Estéticas <strong>de</strong> Marx, on<strong>de</strong> o autor afirma que o sentido do realismo não<br />
resi<strong>de</strong> na mimese <strong>de</strong> coisas e pessoas, mas <strong>no</strong> sucesso do sujeito criador em instilar<br />
humanida<strong>de</strong> nestas formas genéricas <strong>de</strong> pessoas, casas, objetos, árvores, fazendo com<br />
que estas ultrapassem o nível da mera reprodução e sejam formas humanizadas pela<br />
relação que estabelecem com homens concretos vivendo em socieda<strong>de</strong>s concretas.<br />
Neste sentido, o ilusionismo per<strong>de</strong> completamente a relevância, pois, como afirma o<br />
autor,<br />
[...] o verda<strong>de</strong>iro realismo começa quando estas formas e figuras<br />
visíveis são transformadas para se fazer <strong>de</strong>las uma chave do mundo<br />
que se quer refletir e expressar. Devemos dizer por isso que o realismo<br />
necessita superar a barreira da figuração, numa superação dialética<br />
que reabsorva as figuras e formas reais para elevar-se a uma síntese<br />
superior. A figura real, exterior, é um obstáculo que tem <strong>de</strong> ser<br />
superado para que o realismo não seja simplesmente, propriamente,<br />
figuração, mas transfiguração. Transfigurar é colocar a figura em<br />
estado huma<strong>no</strong>. 1<br />
Diante <strong>de</strong>sta <strong>de</strong>finição, somos instigados a indagar qual seria o sentido da arte<br />
<strong>realista</strong> <strong>no</strong> contexto soviético. Já refutamos a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> que a arte seja um<br />
registro ou documentário dos fatos como alegavam os membros da AKRR em suas<br />
<strong>de</strong>clarações; tampouco po<strong>de</strong>mos abordá-la como mera propaganda política, embora a<br />
1<br />
VAZQUEZ, Adolfo Sanchez. As idéias estéticas <strong>de</strong> Marx. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Paz e Terra, 1978, p. 43.