a importância das histórias de vida na formação do professor - pucrs
a importância das histórias de vida na formação do professor - pucrs
a importância das histórias de vida na formação do professor - pucrs
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
190 Wolney Honório Filho<br />
Mas, eu não queria fazê-lo sozinho. Convi<strong>de</strong>i, então,<br />
o <strong>professor</strong> Dr. Braz José Coelho 4 para uma parceria:<br />
formarmos uma dupla, quase sertaneja, para explorar<br />
um pensamento sobre a importância da Narrativa e<br />
Histórias <strong>de</strong> Vi<strong>das</strong> <strong>na</strong> formação <strong>de</strong> <strong>professor</strong>es. Com o<br />
convite aceito, surgiu a i<strong>de</strong>ia <strong>do</strong> título que <strong>de</strong>mos àquele<br />
momento, tira<strong>do</strong> <strong>de</strong> um <strong>de</strong> seus livros, “A <strong>vida</strong> da gente é<br />
feita nos feitos <strong>de</strong> cada dia, <strong>de</strong>vagarinho, com o seguinte<br />
complemento: e segue curso que a gente nunca pensou <strong>de</strong><br />
seguir” (COELHO, 1986).<br />
Assim, da minha parte, coube problematizar a<br />
<strong>na</strong>rrativa que dá forma ao vivi<strong>do</strong> enquanto experiência <strong>de</strong><br />
<strong>vida</strong> e aprendizagem, toman<strong>do</strong>-a como uma experiência<br />
<strong>de</strong> estranhamento no processo <strong>de</strong> ensino-aprendizagem,<br />
sobretu<strong>do</strong> as <strong>na</strong>rrativas <strong>de</strong> <strong>professor</strong>es ou futuros<br />
<strong>professor</strong>es, <strong>na</strong> formação inicial, <strong>na</strong> universida<strong>de</strong>.<br />
1 Abrin<strong>do</strong> c a m i n h o s para a pesquisa<br />
A experiência <strong>do</strong>s meus 22 anos <strong>de</strong> <strong>do</strong>cência fazme<br />
pensar que há algo <strong>de</strong> “estranho” no ar acontecen<strong>do</strong><br />
com os estudantes, principalmente as que eu acompanho,<br />
preten<strong>de</strong>ntes ao título <strong>de</strong> pedagogas. Essa estranheza se<br />
reflete no <strong>de</strong>sânimo, <strong>na</strong> falta <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudar, no<br />
pouco apetite intelectual pela presteza <strong>do</strong> pensamento,<br />
enfim, elas chegam mórbi<strong>das</strong>, e nós, <strong>professor</strong>es, temos<br />
a impressão <strong>de</strong> que precisamos provocar um choque<br />
para que acor<strong>de</strong>m, talvez <strong>de</strong> um esta<strong>do</strong> hipnótico, para<br />
a <strong>vida</strong> acadêmica, a formação profissio<strong>na</strong>l. Trata-se <strong>de</strong><br />
uma in<strong>de</strong>termi<strong>na</strong>ção cultural presente nos projetos <strong>de</strong><br />
profissio<strong>na</strong>lização <strong>de</strong> <strong>professor</strong>es e <strong>professor</strong>as no Ensino<br />
Superior. Tal in<strong>de</strong>termi<strong>na</strong>ção, presente nessa estranheza<br />
entre os atos <strong>do</strong>s discentes e as propostas curriculares<br />
às quais se submetem, levam-nos a indagar sobre o que<br />
fazer. 5<br />
Em outro texto, intitula<strong>do</strong> “Memória e formação<br />
<strong>do</strong>cente: o uso <strong>de</strong> (auto)biografia <strong>na</strong> formação <strong>do</strong><br />
<strong>professor</strong>” (HONÓRIO FILHO, 2010), buscamos<br />
refletir, com um grupo <strong>de</strong> alu<strong>na</strong>s <strong>do</strong> Curso <strong>de</strong> Pedagogia<br />
(UFG-CAC), através <strong>de</strong> um projeto <strong>de</strong> ensino, sobre as<br />
memórias, histórias <strong>de</strong> <strong>vida</strong> como campo pluridiscipli<strong>na</strong>r<br />
<strong>na</strong> investigação e formação <strong>do</strong>cente. Assim, foi realiza<strong>do</strong><br />
um estu<strong>do</strong> comparativo <strong>de</strong> histórias <strong>de</strong> <strong>vida</strong> <strong>de</strong> ex-alu<strong>na</strong>s<br />
<strong>do</strong> Curso que estudaram nos anos 1990 e <strong>das</strong> turmas<br />
<strong>do</strong>s anos 2000. Entrevistar e pensar sobre as histórias<br />
<strong>de</strong> ex-estudantes reverberou, no grupo <strong>de</strong> pesquisa<strong>do</strong>ras<br />
iniciantes, uma atenção às suas próprias histórias <strong>de</strong><br />
<strong>vida</strong>.<br />
No miolo <strong>das</strong> questões refleti<strong>das</strong>, fui sensibiliza<strong>do</strong> pela<br />
seguinte indagação: Em que a <strong>vida</strong> <strong>do</strong> aluno apren<strong>de</strong>nte,<br />
no momento da formação inicial, toca-me? Obviamente,<br />
outros pesquisa<strong>do</strong>res, com motivos diferentes <strong>do</strong>s meus,<br />
embrenha<strong>do</strong>s nos estu<strong>do</strong>s <strong>de</strong> histórias <strong>de</strong> <strong>vida</strong>, teriam<br />
posturas diferentes. O pesquisa<strong>do</strong>r se mistura às pessoas<br />
entrevista<strong>das</strong>. Essa é uma mistura <strong>de</strong> vi<strong>das</strong>, que nos coloca<br />
também no centro <strong>do</strong> problema:<br />
Ao escrevermos em histórias <strong>de</strong> vi<strong>das</strong>, precisamos ter<br />
presente que não estamos simplesmente reproduzin<strong>do</strong><br />
ditos <strong>de</strong> quem pesquisamos, estamos, isto sim, olhan<strong>do</strong><br />
uma <strong>vida</strong> <strong>de</strong> nosso jeito, <strong>de</strong> tal forma que não somente<br />
a ele é possível ver-se no texto, mas, também, nós<br />
mesmos po<strong>de</strong>mos nos enxergar nesse texto (TIMM,<br />
2010, p. 51).<br />
O cuida<strong>do</strong> necessário ao autor/pesquisa<strong>do</strong>r é não se<br />
confundir com os autores <strong>das</strong> vi<strong>das</strong> investiga<strong>das</strong> (TIMM,<br />
2010).<br />
Semeada a questão, ocorrem-me duas possibilida<strong>de</strong>s<br />
subjetivas sobre esse interesse pela formação.<br />
Primeiro, a memória <strong>do</strong> aluno que fui: estudioso, que<br />
a mãe ou o pai nunca precisou dizer “vai estudar menino”,<br />
como era dito ao meu irmão, por exemplo; que além <strong>de</strong> ir à<br />
escola, estudava em casa, principalmente durante o ensino<br />
médio, cursa<strong>do</strong> <strong>na</strong> Escola Estadual <strong>de</strong> Uberlândia, no fi<strong>na</strong>l<br />
<strong>do</strong>s anos 1970 e início <strong>do</strong>s 1980. Mas, ser estudioso não<br />
era suficiente. Lembro-me <strong>de</strong> passagens <strong>de</strong> minha <strong>vida</strong><br />
em que indagava aos <strong>professor</strong>es, principalmente aqueles<br />
<strong>de</strong> quem mais me aproximei e reconhecia o mérito <strong>de</strong><br />
bom educa<strong>do</strong>r, sobre seu méto<strong>do</strong> <strong>de</strong> estu<strong>do</strong>, pois, assim,<br />
eu po<strong>de</strong>ria apren<strong>de</strong>r mais e obter melhores resulta<strong>do</strong>s.<br />
Isso talvez porque estudar muito não era sinônimo <strong>de</strong> ter<br />
as melhores notas, como o caso <strong>de</strong> alguns ex-colegas,<br />
consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s brilhantes, que precisavam <strong>de</strong> poucas horas<br />
<strong>de</strong> esforço para colherem resulta<strong>do</strong>s surpreen<strong>de</strong>ntes.<br />
Segun<strong>do</strong>, o fato <strong>de</strong> ser <strong>professor</strong> e estar <strong>na</strong> condição<br />
<strong>de</strong> ensi<strong>na</strong>r. Nesses 22 anos <strong>de</strong> carreira no Ensino Superior,<br />
constato, juntamente com colegas <strong>de</strong> trabalho, um<br />
crescente distanciamento <strong>do</strong> aluno ingressante <strong>na</strong> Universida<strong>de</strong><br />
(Pedagogia) em relação aos problemas da profissão<br />
<strong>do</strong>cente. Lembro-me que, no início <strong>do</strong>s anos 1990,<br />
a gran<strong>de</strong> maioria <strong>das</strong> alu<strong>na</strong>s tinha cursa<strong>do</strong> o magistério<br />
e já atuava como <strong>professor</strong>a. Tal faor dava um toque <strong>de</strong><br />
qualida<strong>de</strong> <strong>na</strong>s apren<strong>de</strong>ntes, mostran<strong>do</strong> que tinham mais<br />
interesse, eram mais motiva<strong>das</strong> e tinham menos dificulda<strong>de</strong>s<br />
<strong>na</strong> compreensão e escrita <strong>de</strong> textos. Ora, a situação<br />
<strong>do</strong> ensino para essa juventu<strong>de</strong>, que se parece perdida<br />
frente ao re<strong>de</strong>moinho <strong>das</strong> <strong>de</strong>man<strong>das</strong> profissio<strong>na</strong>is, e para<br />
o <strong>professor</strong>, que não sabe o que fazer, realça, consequentemente,<br />
um velho parâmetro conheci<strong>do</strong> <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s: “[...] o<br />
<strong>professor</strong> falan<strong>do</strong> para uma classe <strong>de</strong> alunos que anotam<br />
aquilo que ele diz com os olhares volta<strong>do</strong>s para as provas<br />
<strong>na</strong>s quais serão cobra<strong>do</strong>s exatamente por aquilo que foi<br />
dito e reti<strong>do</strong> <strong>na</strong> memória” (BALZAN, 2008, p. 553).<br />
Balzan (2008, p. 554) ressalta a incongruência<br />
<strong>na</strong>s formas <strong>de</strong> ensi<strong>na</strong>r e apren<strong>de</strong>r: por um la<strong>do</strong>, a<br />
supremacia <strong>das</strong> aulas, on<strong>de</strong> o que se tem é a exposição<br />
Educação, Porto Alegre, v. 34, n. 2, p. 189-197, maio/ago. 2011