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Existencialismo, Marxismo e Antropologia: Considerações sobre o Debate entre Jean-Paul Sartre e Claude Lévi-Strauss<br />
76<br />
R<br />
E<br />
V<br />
I<br />
S<br />
T<br />
A<br />
ber o devir histórico como um desenrolar contínuo, começando<br />
numa pré-história codifica<strong>da</strong> em dezenas ou em centenas de<br />
milênios, prosseguindo na escala dos milênios, [...] e continuando,<br />
em segui<strong>da</strong>, sob a forma de uma história secular entremea<strong>da</strong>,<br />
à vontade de ca<strong>da</strong> autor, de pe<strong>da</strong>ços <strong>da</strong> história anual, dentro do<br />
século, ou diária, dentro do ano, se não, mesmo, horária, dentro<br />
do dia. To<strong>da</strong>s estas <strong>da</strong>tas não formam uma série: provêm de espécies<br />
diferentes.<br />
[...] A história biográfica e anedótica, que está bem embaixo na<br />
escala, é uma história fraca, que não contém em si mesma sua<br />
própria inteligibili<strong>da</strong>de, que lhe vem, apenas, quando é transporta<strong>da</strong>,<br />
em bloco, para dentro de uma história mais forte do que<br />
ela; e esta mantém a mesma relação com uma classe de categoria<br />
mais eleva<strong>da</strong>. To<strong>da</strong>via, seria errado pensar que estes encaixes<br />
reconstituem progressivamente uma história total; porque o que<br />
se ganha de um lado, perde-se do outro. A história biográfica e<br />
anedótica é a menos explicativa; mas é a mais rica, sob o ponto<br />
de vista <strong>da</strong> informação, já que ela considera os indivíduos na sua<br />
particulari<strong>da</strong>de e que detalha, para ca<strong>da</strong> um deles, os matizes do<br />
caráter, as sinuosi<strong>da</strong>des de seus motivos, as fases de suas deliberações.<br />
Esta informação se esquematiza, depois se apaga, depois<br />
fica aboli<strong>da</strong>, quando se passa a história ca<strong>da</strong> vez mais ‘fortes’.<br />
Por conseguinte, e conforme o nível em que o historiador se coloca,<br />
perde em informação o que ganha em compreensão. (LÉVI-<br />
STRAUSS, 2008, p. 296; 298)<br />
Neste sentido, em substituição à oposição entre povos “com” e povos “sem história”, ele<br />
propôs a distinção – com finali<strong>da</strong>de heurística - entre “socie<strong>da</strong>des quentes” e “socie<strong>da</strong>des frias”.<br />
Enquanto as primeiras fariam uso do devir histórico para o seu desenvolvimento, as do segundo<br />
tipo, de modo inverso às demais, procurariam neutralizar os efeitos que os eventos históricos<br />
poderiam ter em sua estrutura, resistindo desta forma, a modificações.<br />
A história para Lévi-Strauss seria algo imprevisível, ou aleatório, e o intuito do antropólogo<br />
estruturalista estaria direcionado no sentido de demonstrar que, apesar disto, as transformações que<br />
ocorrem não são acidentais, mas fazem parte de uma série de possibili<strong>da</strong>des que é <strong>da</strong><strong>da</strong> pelo sistema.<br />
Assim, se por um lado, pode-se afirmar que Lévi-Strauss enfatiza a importância <strong>da</strong> história<br />
para a etnologia, por outro percebe-se que em sua perspectiva a história acabou subordina<strong>da</strong> à<br />
estrutura. Além disto, pode ser percebido que, apesar de suas contribuições, em seus trabalhos a<br />
dimensão diacrônica acabou permanecendo ausente na medi<strong>da</strong> em que este autor manteve uma<br />
certa dicotomia entre mito e história.<br />
Caberia ain<strong>da</strong> destacar do interior <strong>da</strong> argumentação de Lévi-Strauss que sua concepção<br />
sobre o pensamento selvagem reconhece como uma <strong>da</strong>s características peculiares deste, o fato<br />
de ser totalizante e intemporal. Assim, nele estaria presente uma busca de apreender o mundo,<br />
simultaneamente, como uma totali<strong>da</strong>de sincrônica e diacrônica.<br />
Isto possibilita compreender como em sua perspectiva, se por um lado to<strong>da</strong>s as socie<strong>da</strong>des<br />
estariam na história, por outro, existiriam diferentes modos de reagir a esta mesma<br />
condição comum.<br />
TERRA E CULTURA - N o 47 - Ano 24 - Agosto a Dezembro de 2008