22.10.2014 Views

Faça o download da revista completa - UniFil

Faça o download da revista completa - UniFil

Faça o download da revista completa - UniFil

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Existencialismo, Marxismo e Antropologia: Considerações sobre o Debate entre Jean-Paul Sartre e Claude Lévi-Strauss<br />

vezes nefastas, sobretudo as relaciona<strong>da</strong>s ao stalinismo.<br />

[...] curiosamente, este marxismo stalinizado toma um aspecto<br />

de imobilismo, um operário não é um ser real que mu<strong>da</strong> com o<br />

mundo: é uma idéia platônica. De fato, em Platão, as idéias são<br />

o Eterno, o Universal e o Ver<strong>da</strong>deiro. [...] No mundo stalinista, o<br />

acontecimento é um mito edificante. [...] A materiali<strong>da</strong>de do fato<br />

não interessa a estes idealistas: apenas conta, a seus olhos, seu<br />

alcance simbólico. [...] os marxistas stalinistas são cegos aos<br />

acontecimentos. (SARTRE, 1979, p. 103)<br />

72<br />

R<br />

E<br />

V<br />

I<br />

S<br />

T<br />

A<br />

Também, em virtude <strong>da</strong> falta <strong>da</strong> compreensão <strong>da</strong> existência enquanto seu fun<strong>da</strong>mento<br />

humano, o âmbito <strong>da</strong>s análises do marxismo teria ficado bastante reduzido. Quanto a este ponto,<br />

as críticas que Sartre dirige ao marxismo são tão severas, ao ponto de <strong>da</strong>r-lhe a designação de<br />

positivista.<br />

Cumpre rejeitar resolutamente o pretenso “positivismo” que impregna o marxismo de hoje e<br />

que o coage a negar a existência destas últimas significações. A mistificação suprema do positivismo<br />

é que pretende abor<strong>da</strong>r a experiência social sem a priori, quando decidiu desde o início negar uma de<br />

suas estruturas fun<strong>da</strong>mentais e substituí-la pelo seu contrário. (SARTRE, 1979, p. 126). Assim, Sartre<br />

destaca que a contradição existente entre as classes sociais não explica tudo.<br />

É certo que o capitalista possui os instrumentos de trabalho e o operário não os possui: eis uma<br />

contradição pura. Mas, justamente, esta contradição não chega a <strong>da</strong>r conta de ca<strong>da</strong> acontecimento: ela<br />

é seu quadro, ela cria a tensão permanente do meio social, o dilaceramento <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de capitalista;<br />

apenas esta estrutura fun<strong>da</strong>mental de todo acontecimento contemporâneo (em nossas socie<strong>da</strong>des burguesas)<br />

não esclarece nenhum deles na sua reali<strong>da</strong>de concreta. (SARTRE, 1967, p. 105)<br />

Em virtude de ficar restrito por estas limitações, o marxismo em sua ótica se tornaria um<br />

inumanismo.<br />

Por outro lado, uma vez preserva<strong>da</strong>s as especifici<strong>da</strong>des inerentes à problemática do<br />

marxismo na ótica deste autor - o que se constituiu no objeto desta exposição até o presente<br />

momento – a antropologia também pecaria por não reconhecer a importância do projeto, na<br />

perspectiva existencialista de Sartre, ou, talvez melhor dizendo, por não considerar a importância<br />

<strong>da</strong> intencionali<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s ações dos sujeitos:<br />

Era legítimo que as ciências <strong>da</strong> natureza se libertassem do antropomorfismo que consiste<br />

em emprestar proprie<strong>da</strong>des humanas a objetos inanimados. Mas é perfeitamente absurdo introduzir<br />

por analogia o desprezo do antropomorfismo na antropologia: que se pode fazer de mais<br />

exato, de mais rigoroso, quando se estu<strong>da</strong> o homem, do que reconhecer-lhe proprie<strong>da</strong>des humanas?<br />

A simples inspeção do campo social deveria ter feito descobrir que a relação aos fins é uma<br />

estrutura permanente <strong>da</strong>s empresas e que é nessa relação que os homens reais julgam as ações,<br />

as instituições ou os estabelecimentos econômicos. Dever-se-ia ter constatado, então, que nossa<br />

compreensão do outro se faz necessariamente pelos fins. (SARTRE, 1979, p. 126)<br />

Segundo Sartre, <strong>da</strong> mesma forma que Husserl questiona a mecânica clássica por esta se<br />

utilizar do espaço e do tempo como meios homogêneos e contínuos, sem, no entanto, se interrogar<br />

nem sobre o tempo, nem sobre o espaço, nem sobre o movimento, caberia questionar às ciências<br />

do homem, que não têm interrogado sobre o homem.<br />

Em síntese, pode-se dizer que Sartre ressalta a importância <strong>da</strong>s análises existencialistas,<br />

que operariam através de um método de investigação, que seria ao mesmo tempo progressivo-<br />

TERRA E CULTURA - N o 47 - Ano 24 - Agosto a Dezembro de 2008

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!