Clique aqui para acessar o livro completo (em PDF) - Unifesp
Clique aqui para acessar o livro completo (em PDF) - Unifesp
Clique aqui para acessar o livro completo (em PDF) - Unifesp
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN<br />
Núcleo Interdepartamental de Segurança<br />
Alimentar e Nutricional<br />
2008/2009
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN<br />
Núcleo Interdepartamental de<br />
Segurança Alimentar e Nutricional<br />
2008/2009<br />
coordenação<br />
José Augusto de A. C. Taddei<br />
Kelly de Jesus Viana<br />
Maria Sylvia de Souza Vitalle
Copyright © 2013 Editora Manole Ltda., por meio de contrato de coedição com a Fundação de Apoio à Universidade Federal de<br />
São Paulo (FAP-<strong>Unifesp</strong>).<br />
logotipos Copyright © Núcleo Interdepartamental de Segurança Alimentar e Nutricional (Nisan)<br />
Copyright © Universidade Federal de São Paulo (<strong>Unifesp</strong>)<br />
Copyright © Fundação de Apoio à <strong>Unifesp</strong> (FAP)<br />
Minha Editora é um selo editorial Manole<br />
editor gestor Walter Luiz Coutinho<br />
editora Karin Gutz Inglez<br />
produção editorial Tamiris Prystaj, Juliana Morais e Cristiana Gonzaga S. Corrêa<br />
projeto gráfico Daniel Justi<br />
diagramação e revisão Departamento Editorial da Editora Manole<br />
capa Departamento de Arte da Editora Manole<br />
imagens da capa <strong>Unifesp</strong> e Stock Exchange<br />
ilustrações André E. Stefanini<br />
dados internacionais de catalogação na publicação (cip)<br />
(câmara brasileira do <strong>livro</strong>, sp, brasil)<br />
Jornadas científicas do NISAN : Núcleo Interdepartamental de Segurança Alimentar e Nutricional 2008/2009/<br />
coordenação José Augusto de A. C. Taddei, Kelly Viana, Maria Sylvia S. Vitalle . -- Barueri, SP : Minha Editora, 2013.<br />
Bibliografia<br />
ISBN 978-85-7868-081-7<br />
1. Alimentação escolar 2. Alimentos - Tabelas de composição 3. Antropometria 4. Educação<br />
5. Hábitos alimentares 6. Nutrição 7. Obesidade <strong>em</strong> crianças e adolescentes 8. Publicidade - Alimentos<br />
9. Segurança alimentar I. Taddei, José Augusto de A. C.. II. Viana, Kelly. III. Vitalle, Maria Sylvia S.<br />
13-02697 CDD-613.2<br />
índices <strong>para</strong> catálogo sist<strong>em</strong>ático:<br />
1. Segurança alimentar e nutricional : Promoção da saúde 613.2<br />
Todos os direitos reservados.<br />
Nenhuma parte deste <strong>livro</strong> poderá ser reproduzida, por qualquer processo, s<strong>em</strong> a permissão expressa dos editores.<br />
É proibida a reprodução por xerox.<br />
A Editora Manole é filiada à ABDR – Associação Brasileira de Direitos Reprográficos.<br />
1 a edição – 2013<br />
Editora Manole Ltda.<br />
Avenida Ceci, 672 – Tamboré<br />
06460-120 – Barueri – SP – Brasil<br />
Tel.: (11) 4196-6000 – Fax: (11) 4196-6021<br />
www.manole.com.br | info@manole.com.br<br />
Impresso no Brasil | Printed in Brazil<br />
Este <strong>livro</strong> cont<strong>em</strong>pla as regras do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, que entrou <strong>em</strong> vigor no Brasil <strong>em</strong> 2009.<br />
São de responsabilidade dos coordenadores e autores as informações contidas nesta obra.
MEMBROS DO NISAN<br />
2008/2009<br />
José Augusto de A. C. Taddei<br />
Coordenador do Núcleo Interdepartamental de Segurança Alimentar e<br />
Nutricional (Nisan). Professor-associado da Disciplina de Nutrologia do<br />
Departamento de Pediatria da Universidade Federal de São Paulo (<strong>Unifesp</strong>).<br />
Myrian Spinola Najas<br />
Vice-coordenadora no Nisan. Professora-assistente da Disciplina Geriatria<br />
e Gerontologia do Departamento de Medicina da <strong>Unifesp</strong>.<br />
Ana Cristina Freitas de Vilhena Abrão<br />
Tesoureira do Nisan. Professora Adjunta da Disciplina Enfermag<strong>em</strong><br />
Obstétrica do Departamento de Enfermag<strong>em</strong> e Coordenadora do Centro<br />
de Incentivo e Apoio ao Aleitamento Materno (Ciaam) da <strong>Unifesp</strong>.<br />
Ana Lúcia Medeiros de Souza<br />
Nutricionista do Setor de Política, Planejamento e Gestão <strong>em</strong> Saúde do<br />
Departamento de Medicina Preventiva da <strong>Unifesp</strong>.<br />
Anita Sachs<br />
Professora Adjunta da Disciplina Nutrição do Departamento de Medicina<br />
Preventiva da <strong>Unifesp</strong>.<br />
Conceição Vieira da Silva<br />
Professora-associada do Departamento de Enfermag<strong>em</strong> da <strong>Unifesp</strong>.
VI<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Gisela Maria Bernardes Solymos<br />
Diretora de Projetos do Centro de Recuperação e Educação Nutricional<br />
(Cren) – Núcleo Salus Paulista (Salus), órgão supl<strong>em</strong>entar da<br />
<strong>Unifesp</strong>.<br />
Glaura César Pedroso<br />
Médica do Programa Docente-assistencial do Embu (Pida-Embu) da<br />
Disciplina Pediatria Geral e Comunitária do Departamento de Pediatria<br />
da <strong>Unifesp</strong>.<br />
Kelly de Jesus Viana<br />
Secretária do Nisan. Nutricionista. Especialista <strong>em</strong> Saúde, Nutrição e<br />
Alimentação Infantil pela <strong>Unifesp</strong>.<br />
Mauro Batista de Morais<br />
Livre-docente da Disciplina Gastroenterologia Pediátrica do Departamento<br />
de Pediatria da <strong>Unifesp</strong>.<br />
Meide Silva Anção<br />
Professor-associado do Departamento de Informática <strong>em</strong> Saúde e Diretor<br />
do Departamento de Tecnologia da Informação da <strong>Unifesp</strong>.<br />
Nilce Piva Adami<br />
Professora Titular da Disciplina Enfermag<strong>em</strong> de Saúde Pública e Administração<br />
aplicada à Enfermag<strong>em</strong> do Departamento de Enfermag<strong>em</strong> e<br />
Diretora do Departamento de Assuntos Comunitários da <strong>Unifesp</strong>.<br />
Cristina Pereira Gaglianone<br />
Professora Doutora do Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior<br />
<strong>em</strong> Saúde (Cedess) e Representante do Curso de Nutrição da <strong>Unifesp</strong> –<br />
Campus Baixada Santista.
MEMBROS DO NISAN<br />
VII<br />
Maria Sylvia de Souza Vitalle<br />
Chefe do Setor de Medicina do Adolescente do Departamento de Pediatria<br />
da Escola Paulista de Medicina (EPM) da <strong>Unifesp</strong>. Professora Permanente<br />
do Programa de Pós-graduação <strong>em</strong> Educação e Saúde na Infância<br />
e Adolescência da <strong>Unifesp</strong>. M<strong>em</strong>bro da International Association<br />
for Adolescent Health (IAAH). Vice-presidente do Departamento de<br />
Adolescência da Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP).<br />
Sarah Warkentin<br />
Secretária do Nisan. Nutricionista. Mestranda <strong>em</strong> Ciências. Especialista<br />
<strong>em</strong> Saúde, Nutrição e Alimentação Infantil pela <strong>Unifesp</strong>.<br />
EX-MEMBROS DO NISAN<br />
Rosana Fiorini Puccini<br />
Ex-coordenadora Fundadora do Nisan. Professora Titular da Disciplina<br />
Pediatria Geral e Comunitária do Departamento de Pediatria da <strong>Unifesp</strong>.<br />
Lucila Amaral Carneiro Vianna<br />
Ex-vice-coordenadora Fundadora do Nisan. Professora Titular da Disciplina<br />
Enfermag<strong>em</strong> <strong>em</strong> Saúde Pública e Administração Aplicada à Enfermag<strong>em</strong><br />
do Departamento de Enfermag<strong>em</strong> e Chefe de Gabinete da Reitoria<br />
da <strong>Unifesp</strong>.<br />
Eunice Akiyama<br />
Ex-secretária do Nisan. Secretária do Gabinete da Reitoria da <strong>Unifesp</strong>.<br />
Olga Maria Silvério Amancio<br />
Professora Adjunta do Laboratório de Pesquisa da Disciplina Nutrologia<br />
do Departamento de Pediatria da <strong>Unifesp</strong>.
VIII<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Nildo Alves Batista<br />
Coordenador do Cedess e Coordenador Acadêmico da <strong>Unifesp</strong> – Campus<br />
Baixada Santista.<br />
Sofia Beatriz Machado de Mendonça<br />
Médica Sanitarista, Antropóloga e Coordenadora da Formação de Recursos<br />
Humanos do Projeto Xingu da Unidade de Saúde e Meio Ambiente<br />
do Departamento de Medicina Preventiva da <strong>Unifesp</strong>.<br />
Josefina Aparecida Pellegrini Braga<br />
Professora Adjunta, Doutora e Chefe do Setor de H<strong>em</strong>atologia Pediátrica<br />
do Departamento de Pediatria da Disciplina Especialidades<br />
Pediátricas da <strong>Unifesp</strong>.<br />
Mariana de Novaes Oliveira<br />
Ex-secretária do Nisan.
AUTORES<br />
Anna Helena Pedreira de Freitas<br />
Nutricionista. Especialista <strong>em</strong> Saúde, Nutrição e Alimentação Infantil<br />
pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo<br />
(EPM-<strong>Unifesp</strong>). Mestre <strong>em</strong> Ciências pelo Programa de Pós-Graduação<br />
<strong>em</strong> Pediatria e Ciências Aplicadas à Pediatria da EPM-<strong>Unifesp</strong>.<br />
Camila Maria de Melo<br />
Especialista <strong>em</strong> Fisiologia do Exercício pela <strong>Unifesp</strong>. Mestre <strong>em</strong> Ciências<br />
dos Alimentos pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade<br />
de São Paulo (FCF/USP).<br />
Claudia Ridel Juzwiak<br />
Professora-adjunta do Curso de Nutrição do Departamento de Ciências<br />
do Movimento Humano da <strong>Unifesp</strong> – Campus Baixada Santista.<br />
Claudio Leone<br />
Professor Titular do Departamento de Saúde Materno-infantil da Faculdade<br />
de Saúde Pública (FSP) da USP. Doutor e Professor Livre-docente<br />
<strong>em</strong> Pediatria Preventiva e Social pelo Departamento de Pediatria da Faculdade<br />
de Medicina da USP.<br />
Clóvis de Barros Filho<br />
Professor Livre-docente da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP.<br />
Eliana Bistriche Giuntini<br />
Doutora <strong>em</strong> Nutrição Humana Aplicada pela USP.
X<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Elizabete Wenzel de Menezes<br />
Nutricionista. Mestre e Doutora <strong>em</strong> Ciências dos Alimentos pela USP.<br />
Professora-associada do Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental<br />
da FCF/USP.<br />
Fernanda Cobayashi<br />
Nutricionista. Especialista <strong>em</strong> Saúde, Nutrição e Alimentação Infantil<br />
pela EPM-<strong>Unifesp</strong>. Doutora <strong>em</strong> Ciências pela <strong>Unifesp</strong>. Pesquisadora<br />
Colaboradora de Nutrição da USP.<br />
Fernando A. B. Colugnati<br />
Pesquisador-associado do Instituto de Pesquisas <strong>em</strong> Tecnologia e Inovação<br />
(IPTI). Pós-doutorando do Departamento de Política Científica<br />
e Tecnológica do Instituto de Geociências da Universidade Estadual de<br />
Campinas (DPCT-IG-Unicamp).<br />
Franco Maria Lajolo<br />
Doutor <strong>em</strong> Ciências dos Alimentos pela USP. Professor Titular do Departamento<br />
de Alimentos e Nutrição Experimental da FCF/USP.<br />
Giovana Longo-Silva<br />
Nutricionista. Especialista <strong>em</strong> Nutrição <strong>em</strong> Saúde Pública pela <strong>Unifesp</strong>.<br />
Mestre <strong>em</strong> Ciências pela <strong>Unifesp</strong>. Doutora <strong>em</strong> Ciências pelo Programa de<br />
Pós-graduação <strong>em</strong> Pediatria e Ciências Aplicadas à Pediatria da<br />
EPM-<strong>Unifesp</strong>.<br />
Glaura César Pedroso<br />
Médica. Pediatra da EPM-<strong>Unifesp</strong>. Doutora <strong>em</strong> Ciências pela <strong>Unifesp</strong>.<br />
M<strong>em</strong>bro do Departamento de Saúde Escolar da Sociedade de Pediatria<br />
de São Paulo (SPSP).
AUTORES<br />
XI<br />
Greisse Viero da Silva Leal<br />
Nutricionista. Mestre <strong>em</strong> Saúde Pública pela FSP/USP. Doutoranda <strong>em</strong><br />
Nutrição <strong>em</strong> Saúde Pública da FSP/USP.<br />
Helio Vannucchi<br />
Professor Titular da Divisão de Nutrologia do Departamento de Clínica<br />
Médica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP (FMRP/<br />
USP).<br />
João Lopes Guimarães Júnior<br />
Promotor de Justiça do Consumidor do Ministério Público de São Paulo<br />
(MP-SP).<br />
José Augusto de A. C. Taddei (coordenação)<br />
Professor-associado da Disciplina de Nutrologia do Departamento de<br />
Pediatria da <strong>Unifesp</strong>.<br />
Kelly de Jesus Viana (coordenação)<br />
Nutricionista. Especialista <strong>em</strong> Saúde, Nutrição e Alimentação Infantil<br />
pela EPM-<strong>Unifesp</strong>.<br />
Luciana da Silva Sampaio Jorge<br />
Especialista <strong>em</strong> Saúde, Nutrição e Alimentação Infantil pela EPM-<br />
-<strong>Unifesp</strong>. Mestre <strong>em</strong> Ciências, com Área de Concentração <strong>em</strong> Saúde<br />
Coletiva, pela Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Tutora<br />
da Estratégia Nacional <strong>para</strong> Alimentação Compl<strong>em</strong>entar Saudável<br />
(Enpacs). Nutricionista do Programa Saúde da Criança da Secretaria<br />
de Saúde do Município de Osasco/São Paulo. M<strong>em</strong>bro da International<br />
Baby Food Action Network – Brasil (IBFAN-Brasil).
XII<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Luciana Rosa de Souza<br />
Doutora <strong>em</strong> Desenvolvimento Econômico pela Unicamp.<br />
Marcos Schaper dos Santos Junior<br />
Médico do Projeto Xingu da Unidade de Saúde e Meio Ambiente do Departamento<br />
de Medicina Preventiva da <strong>Unifesp</strong>.<br />
Maria Sylvia de Souza Vitalle (coordenação)<br />
Chefe do Setor de Medicina do Adolescente do Departamento de Pediatria<br />
da EPM-<strong>Unifesp</strong>. Professora Permanente do Programa de Pós-<br />
-graduação <strong>em</strong> Educação e Saúde na Infância e Adolescência da <strong>Unifesp</strong>.<br />
M<strong>em</strong>bro da International Association for Adolescent Health (IAAH).<br />
Vice-presidente do Departamento de Adolescência da SPSP.<br />
Martin Fabius Alcover de Barros<br />
Consultor e Pesquisador de Ética.<br />
Maysa Helena de Aguiar Toloni<br />
Nutricionista. Especialista <strong>em</strong> Saúde, Nutrição e Alimentação Infantil<br />
pela EPM-<strong>Unifesp</strong>. Mestre <strong>em</strong> Ciências pela <strong>Unifesp</strong>. Doutoranda do<br />
Programa de Pós-graduação <strong>em</strong> Pediatria e Ciências Aplicadas à Pediatria<br />
da EPM-<strong>Unifesp</strong>.<br />
Rita Maria Monteiro Goulart<br />
Nutricionista. Doutora <strong>em</strong> Saúde Pública pela FSP/USP. Docente do<br />
Curso de Graduação <strong>em</strong> Nutrição e do Mestrado <strong>em</strong> Ciências do Envelhecimento<br />
da Universidade São Judas Tadeu (USJT).
AUTORES<br />
XIII<br />
Sandra Maria Lima Ribeiro<br />
Nutricionista. Mestre <strong>em</strong> Ciências dos Alimentos pela FCF/USP. Doutora<br />
<strong>em</strong> Nutrição Humana Aplicada pela USP. Pós-doutora pelo Human<br />
Nutrition Research Center on Aging da Tufts University, Boston. Livre-<br />
-docente pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP.<br />
Professora-associada da Disciplina de Nutrição e Envelhecimento do<br />
Curso de Gerontologia da USP.<br />
Sarah Warkentin<br />
Nutricionista. Especialista <strong>em</strong> Saúde, Nutrição e Alimentação Infantil<br />
pela EPM-<strong>Unifesp</strong>. Mestranda <strong>em</strong> Pediatria e Ciências aplicadas à Pediatria<br />
da <strong>Unifesp</strong>. Professora Titular da Disciplina Educação Nutricional<br />
do Departamento de Nutrição da Universidade Paulista (Unip).<br />
Sonia Tucunduva Philippi<br />
Doutora <strong>em</strong> Nutrição <strong>em</strong> Saúde Pública pela FSP/USP. Professora-associada<br />
da Disciplina Dietética e Avaliação do Consumo Alimentar de Populações<br />
do Departamento de Nutrição da FSP/USP.<br />
Walter Belik<br />
Professor Titular do Instituto de Economia e Coordenador do Núcleo de<br />
Estudos e Pesquisas <strong>em</strong> Alimentação (Nepa) da Unicamp.
APRESENTAÇÃO<br />
Esta terceira coletânea apresenta quinze textos que compuseram quatro<br />
jornadas do Núcleo Interdepartamental de Segurança Alimentar e Nutricional<br />
(Nisan) nos anos de 2008 e 2009, seguindo a mesma proposta<br />
de promover a reflexão e a discussão de t<strong>em</strong>as relevantes <strong>para</strong> a Segurança<br />
Alimentar e Nutricional.<br />
Na primeira jornada, são abordados t<strong>em</strong>as relacionados à antropometria,<br />
principal instrumento <strong>para</strong> a vigilância nutricional de populações<br />
com maiores riscos de desvios nutricionais. Nos primeiros três<br />
capítulos, a antropometria é abordada <strong>em</strong> situações de risco biológico,<br />
como na infância, na gravidez e na velhice. Nos capítulos 4 e 5, discute-<br />
-se sobre a antropometria de populações indígenas e quilombolas, dois<br />
grupos que se caracterizam por apresentar maiores riscos socioeconômicos<br />
<strong>para</strong> a insegurança alimentar.<br />
A segunda jornada traz novas abordagens <strong>para</strong> os t<strong>em</strong>as “propaganda<br />
de alimentos e obesidade na infância e na adolescência”, questões<br />
já tratadas no primeiro fascículo dessa coletânea. Os primeiros dois capítulos<br />
descrev<strong>em</strong> ações que procuram educar formadores de opinião
XVI<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
e a população <strong>em</strong> geral <strong>para</strong> a escolha mais consciente de alimentos,<br />
apresentando o Portal Estilo de Vida Saudável e o S<strong>em</strong>áforo Nutricional,<br />
com suas vantagens e limitações. Nos dois capítulos seguintes, são apresentadas<br />
reflexões sobre os efeitos da propaganda de alimentos no consumo<br />
alimentar infantil e sobre regulamentação versus autorregulamentação<br />
da propaganda de alimentos dirigida a crianças e adolescentes.<br />
Na terceira jornada, discute-se a utilização da técnica da gota seca<br />
como avanço tecnológico que facilita o diagnóstico populacional de carências<br />
nutricionais específicas <strong>em</strong> inquéritos nacionais, informação relevante<br />
<strong>para</strong> a segurança alimentar e nutricional. Os outros dois capítulos<br />
que compõ<strong>em</strong> a terceira jornada tratam de t<strong>em</strong>as relacionados às<br />
tabelas de composição de alimentos e ao cálculo informatizado de dietas,<br />
instrumentos indispensáveis na construção de sist<strong>em</strong>as de vigilância<br />
nutricional <strong>para</strong> o país.<br />
Já a quarta jornada, composta pelos três capítulos finais desta coletânea,<br />
trata da alimentação na escola como instrumento de promoção<br />
de saúde e difusão de conhecimentos sobre dietas saudáveis, apresentando<br />
também, <strong>em</strong> uma abordag<strong>em</strong> macroeconômica, as dificuldades<br />
desses programas na América Latina ao longo das últimas décadas.<br />
Profª Drª Eleonora Menicucci de Oliveira<br />
Pró-reitora de Extensão (<strong>Unifesp</strong>)<br />
Profª Drª Conceição Vieira da Silva Ohara<br />
Pró-reitora de Extensão (<strong>Unifesp</strong>)
SUMÁRIO<br />
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS:<br />
APLICAÇÃO EM DIFERENTES GRUPOS ETÁRIOS/ETNIAS<br />
19 de outubro de 2007<br />
Anfiteatro L<strong>em</strong>os Torres – <strong>Unifesp</strong><br />
Curvas de crescimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3<br />
Claudio Leone<br />
Antropometria na gravidez . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37<br />
Luciana da Silva Sampaio Jorge<br />
Rita Maria Monteiro Goulart<br />
Avaliação do estado nutricional de idosos: antropometria . . . . . . . . . . . 59<br />
Sandra Maria Lima Ribeiro<br />
Camila Maria de Melo
XVIII<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Consequências de um encontro: a insegurança alimentar<br />
das populações indígenas brasileiras e a relação de contato com<br />
a sociedade nacional. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79<br />
Marcos Schaper dos Santos Junior<br />
Antropometria de crianças quilombolas de 0 a 5 anos de idade . . . . . . . .99<br />
José Augusto de A. C. Taddei<br />
Fernando A. B. Colugnati<br />
Fernanda Cobayashi<br />
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE NA<br />
INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA<br />
26 de março de 2008<br />
Teatro Marcos Lindenberg – <strong>Unifesp</strong><br />
A epid<strong>em</strong>ia da obesidade e a publicidade de alimentos . . . . . . . . . . . . 111<br />
José Augusto de A. C. Taddei<br />
Giovana Longo-Silva<br />
Maysa Helena de Aguiar Toloni<br />
Portal Estilo de Vida Saudável: uma ferramenta <strong>para</strong> o controle<br />
das doenças crônicas não transmissíveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129<br />
Kelly de Jesus Viana<br />
Sarah Warkentin<br />
Anna Helena Pedreira de Freitas<br />
José Augusto de A. C. Taddei<br />
A mídia e a alimentação infantil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 139<br />
Clóvis de Barros Filho<br />
Martin Fabius Alcover de Barros
SUMÁRIO<br />
XIX<br />
Regulamentação versus autorregulamentação . . . . . . . . . . . . . . . . . 155<br />
João Lopes Guimarães Júnior<br />
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO DE ALIMENTOS E<br />
CÁLCULO INFORMATIZADO DE DIETAS<br />
29 de outubro de 2008<br />
Teatro Marcos Lindenberg – <strong>Unifesp</strong><br />
Determinação do nível de h<strong>em</strong>oglobina utilizando a técnica da<br />
gota seca <strong>em</strong> papel de filtro – Pesquisa Nacional de D<strong>em</strong>ografia e Saúde<br />
(PNDS, 2006) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 163<br />
Helio Vannucchi<br />
Tabela Brasileira de Composição de Alimentos da Universidade de São Paulo<br />
(TBCA-USP) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 169<br />
Eliana Bistriche Giuntini<br />
Elizabete Wenzel de Menezes<br />
Franco Maria Lajolo<br />
Virtual Nutri Plus: programa <strong>para</strong> apoio às decisões nutricionais . . . . . . 197<br />
Sonia Tucunduva Philippi<br />
Greisse Viero da Silva Leal<br />
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA E SEGURANÇA<br />
ALIMENTAR E NUTRICIONAL<br />
27 de outubro de 2009<br />
Teatro Marcos Lindenberg – <strong>Unifesp</strong><br />
A alimentação escolar como oportunidade de promoção da saúde . . . . . 209<br />
Glaura César Pedroso
XX<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Educação alimentar e nutricional na escola . . . . . . . . . . . . . . . . . . 219<br />
Claudia Ridel Juzwiak<br />
Programas de alimentação escolar: instrumentos de promoção<br />
da segurança alimentar e nutricional na América Latina. . . . . . . . . . . 239<br />
Walter Belik<br />
Luciana Rosa de Souza<br />
Os <strong>PDF</strong>s dos volumes anteriores estão disponíveis no site do NISAN-<strong>Unifesp</strong>:<br />
http://www.unifesp.br/nucleos/nisan/index.php
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA<br />
E SUAS BASES CONCEITUAIS:<br />
APLICAÇÃO EM DIFERENTES<br />
GRUPOS ETÁRIOS/ETNIAS<br />
19 de outubro de 2007<br />
Anfiteatro L<strong>em</strong>os Torres – <strong>Unifesp</strong>
CURVAS DE CRESCIMENTO<br />
Claudio Leone<br />
INTRODUÇÃO<br />
Curvas de crescimento é a denominação habitualmente dada aos gráficos<br />
de crescimento físico de crianças e adolescentes que são utilizados<br />
na rotina assistencial dos serviços de saúde que normalmente atend<strong>em</strong><br />
a clientes dessas faixas etárias. As curvas nada mais são do que a representação<br />
gráfica das variações de medidas corporais (peso, estatura,<br />
circunferência craniana, índice de massa corporal [IMC], entre outras)<br />
tidas como normais e que são habitualmente observadas entre os indivíduos<br />
saudáveis de mesmo sexo e idade. Além disso, os gráficos descrev<strong>em</strong>,<br />
também especificamente <strong>para</strong> cada sexo, a tendência de evolução<br />
desses parâmetros antropométricos ao longo do t<strong>em</strong>po, isto é, <strong>em</strong> função<br />
da idade. 1<br />
FINALIDADE DAS CURVAS DE CRESCIMENTO<br />
Os gráficos de crescimento são utilizados no atendimento de crianças e<br />
adolescentes com algumas finalidades básicas:
4<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
• analisar a normalidade ou não de seu processo de crescimento;<br />
• contribuir <strong>para</strong> o diagnóstico de seu estado nutricional;<br />
• acompanhar sua evolução.<br />
Para tanto, as medidas de peso, estatura, etc. da criança ou do adolescente<br />
são com<strong>para</strong>das às de seus pares, <strong>para</strong> verificar <strong>em</strong> que posição<br />
suas medidas se situam <strong>em</strong> relação à faixa de variação de valores admitidos<br />
como normais <strong>para</strong> seu grupo de sexo e idade.<br />
Após inicialmente localizar sua posição no gráfico, passa-se a<br />
acompanhar sua evolução com a idade <strong>para</strong> verificar se segue a tendência<br />
de crescimento das crianças de porte físico s<strong>em</strong>elhante ou se dela se<br />
afasta, <strong>para</strong> mais ou <strong>para</strong> menos, indicando uma velocidade de crescimento<br />
superior ou inferior à do grupo. 1<br />
Sendo o crescimento um processo determinado por um amplo leque<br />
de fatores, entre os quais se destaca por sua importância a nutrição,<br />
eventuais alterações dos parâmetros antropométricos ou do processo de<br />
crescimento acabam sendo informações úteis <strong>para</strong> a elaboração de diagnósticos<br />
de desvios nutricionais que, eventualmente, pod<strong>em</strong> vir a ocorrer.<br />
ELABORAÇÃO DOS GRÁFICOS DE CRESCIMENTO<br />
O conhecimento prévio de como são (ou foram) elaboradas as curvas de<br />
crescimento é um ponto importante <strong>para</strong> que a interpretação dos resultados<br />
obtidos nas avaliações de parâmetros antropométricos possa ser<br />
feita de maneira adequada. 2<br />
Os gráficos de crescimento são (ou deveriam ser) elaborados a partir<br />
de estudos de levantamento de dados de amostras de grupos populacionais.<br />
Geralmente, as amostras utilizadas são representativas de populações<br />
específicas, como cidades, regiões e países, cujos resultados<br />
não pod<strong>em</strong> ser generalizados de maneira indiscriminada.<br />
Em algumas situações, não raras, por limitações de recursos ou por<br />
dificuldades operacionais intransponíveis, os pesquisadores acabam<br />
tendo de recorrer a uma amostra de conveniência. Esse tipo de amostra,
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
5<br />
possível de ser obtida naquelas circunstâncias, geralmente representa<br />
apenas e exclusivamente o próprio grupo de indivíduos avaliado, mas<br />
pode ser utilizado como referencial. Entretanto, deve-se ter <strong>em</strong> mente<br />
que sua utilização de maneira mais generalizada precisa ser feita com<br />
cuidado, pois pode produzir algumas distorções importantes no momento<br />
de avaliar uma criança ou um adolescente proveniente de outra<br />
população.<br />
Abstraindo da questão da amostra, as pesquisas de crescimento<br />
que se destinam à elaboração de curvas referenciais pod<strong>em</strong> ser realizadas<br />
na forma de estudos longitudinais ou transversais. Os estudos longitudinais<br />
acompanham o mesmo grupo de crianças (que se mantêm saudável)<br />
do nascimento até os 20 anos de idade, reavaliando suas medidas<br />
corporais após intervalos de t<strong>em</strong>po preestabelecidos.<br />
Por acompanhar s<strong>em</strong>pre a mesma amostra de indivíduos, os estudos<br />
resultam <strong>em</strong> curvas de crescimento bastante homogêneas, inclusive<br />
com uma dispersão menos ampla de valores ao redor das denominadas<br />
medidas de tendência central, como a média ou a mediana. Como consequência,<br />
os estudos longitudinais avaliam b<strong>em</strong> a velocidade de crescimento,<br />
mas reflet<strong>em</strong> menos a variabilidade populacional dos parâmetros<br />
antropométricos <strong>em</strong> cada idade, pois, durante o acompanhamento,<br />
as características de vida e de ambiente tend<strong>em</strong> a ser mais constantes<br />
ou a sofrer mudanças bastante s<strong>em</strong>elhantes entre os sujeitos que compõ<strong>em</strong><br />
a amostra.<br />
O maior inconveniente dos estudos longitudinais é o longo t<strong>em</strong>po<br />
de seguimento necessário <strong>para</strong> produzir a curva de crescimento completa.<br />
Além de gerar um custo muito elevado, esse tipo de estudo predispõe<br />
a um número relativamente elevado de perdas e abandonos do<br />
seguimento, com possíveis repercussões negativas sobre os resultados<br />
finais, cuja magnitude n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre pode ser avaliada.<br />
Por sua vez, os estudos transversais são realizados de maneira<br />
a medir <strong>em</strong> um sist<strong>em</strong>a do tipo mutirão, como se fosse tudo <strong>em</strong> um<br />
mesmo dia, um grande número de amostras de indivíduos saudáveis,
6<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
agrupados por sexo e idade. Assim, diferent<strong>em</strong>ente do longitudinal, o<br />
estudo transversal reúne um conjunto de sujeitos diferentes <strong>para</strong> cada<br />
grupo de sexo e idade avaliado. Exatamente por não ser<strong>em</strong> os mesmos<br />
indivíduos mensurados <strong>em</strong> cada amostra, os resultados mostram maior<br />
dispersão de valores ao redor da média, mais compatível com as variações<br />
das características ambientais normalmente existentes. Contudo,<br />
essa menor homogeneidade dos dados realmente observados produz<br />
curvas de tendência de crescimento diferentes das resultantes de estudos<br />
de acompanhamento longitudinal.<br />
Após a coleta, os dados são tratados de maneira s<strong>em</strong>elhante, inclusive<br />
os transversais (como se tivess<strong>em</strong> sido obtidos <strong>em</strong> um estudo longitudinal).<br />
Os valores são submetidos a uma interpolação mat<strong>em</strong>ática<br />
de maneira a desenvolver modelos e equações que permitam estimar os<br />
valores <strong>para</strong> as idades compreendidas no intervalo existente entre dois<br />
momentos (idades) <strong>em</strong> que as medidas foram realizadas.<br />
Finalmente, os gráficos com as curvas de crescimento são elaborados<br />
com os dados obtidos a partir das equações de interpolação. Todos<br />
os valores <strong>para</strong> todas as idades são recalculados de modo a estimar os<br />
valores que melhor se ajust<strong>em</strong> aos realmente observados nas idades <strong>em</strong><br />
que as medidas foram efetuadas.<br />
Esses procedimentos serv<strong>em</strong> também <strong>para</strong> suavizar as irregularidades<br />
produzidas pelas diferenças de variações existentes intra e entre<br />
as amostras de medidas, de modo a produzir curvas bastante regulares<br />
e estáveis, mesmo <strong>para</strong> os estudos transversais.<br />
O objetivo é que as curvas reproduzam com bastante aproximação<br />
a distribuição e a tendência de evolução dos valores das medidas corporais<br />
de indivíduos normais de diferentes portes físicos, desde os mais<br />
miúdos, quase microssômicos, até os maiores <strong>em</strong> cada idade.<br />
Para que os resultados sejam precisos, independent<strong>em</strong>ente de<br />
seu grau de representatividade universal, é preciso que os estudos tenham<br />
muito cuidado com os aspectos ligados à metodologia de mensuração<br />
utilizada. Além de um rigoroso treinamento das equipes de
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
7<br />
mensuradores responsáveis pela coleta de dados <strong>em</strong> campo, é necessário<br />
que os estudos mantenham também constante supervisão e aferições<br />
periódicas das equipes, b<strong>em</strong> como a verificação sist<strong>em</strong>ática da<br />
consistência dos dados coletados. Uma coleta de dados imprecisa, com<br />
medidas não confiáveis, invalida qualquer tentativa de elaborar curvas<br />
referenciais de crescimento.<br />
Cabe salientar, conforme o que já foi considerado nos aspectos relativos<br />
à amostra, que esses estudos resultam <strong>em</strong> um retrato momentâneo<br />
do padrão de crescimento dos indivíduos avaliados, que eventualmente<br />
poderá ser utilizado, não como padrão, mas como referencial de<br />
crescimento com o qual outros indivíduos ou populações poderão ser<br />
com<strong>para</strong>dos.<br />
Após o processamento, os resultados são disponibilizados sob a<br />
forma de gráficos (curvas) de crescimento, mais práticos <strong>para</strong> a utilização<br />
no dia a dia, principalmente na prática clínica, ou na forma de tabelas,<br />
<strong>em</strong> que os valores estimados são apresentados de maneira a permitir<strong>em</strong><br />
uma avaliação mais precisa do crescimento, sendo extr<strong>em</strong>amente<br />
úteis nos casos de avaliação e/ou acompanhamento do tratamento de<br />
doenças específicas do crescimento. 2<br />
PERCENTIS E ESCORES Z<br />
Nos gráficos ou tabelas, os valores pod<strong>em</strong> ser apresentados de duas maneiras<br />
diferentes: classificados <strong>em</strong> percentis ou <strong>em</strong> escores z.<br />
Percentis<br />
A classificação <strong>em</strong> percentis nada mais é do que a representação de maneira<br />
hierarquizada, crescente, inicialmente dos valores observados e,<br />
posteriormente, dos valores estimados mat<strong>em</strong>aticamente.<br />
A Figura 1 ilustra a distribuição do que seria uma amostra real de<br />
dados antropométricos. Se os indivíduos foss<strong>em</strong> alinhados horizontalmente<br />
do menor <strong>para</strong> o maior (peso, estatura, circunferência craniana,<br />
etc.) e os que apresentass<strong>em</strong> valores muito s<strong>em</strong>elhantes foss<strong>em</strong>
8<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
colocados verticalmente um atrás do outro, seria possível obter uma<br />
figura <strong>em</strong> forma de sino, simétrica quanto à distribuição dos valores.<br />
Esse formato da figura é denominado Curva de Gauss ou Curva Normal,<br />
modelo que permite definir os valores daquele parâmetro antropométrico<br />
que delimitam determinadas porcentagens (proporções)<br />
da amostra e que são denominados percentis. Essa distribuição<br />
também pode ser assumida quando se utilizam os valores estimados<br />
mat<strong>em</strong>aticamente.<br />
FIGURA 1 Distribuição de uma amostra de indivíduos saudáveis de mesmo sexo e<br />
idade, hierarquizada por um parâmetro antropométrico, <strong>para</strong> figurar uma possível<br />
distribuição <strong>em</strong> percentis.<br />
Percentis<br />
Tamanho da amostra (n) = 56
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
9<br />
Na Figura 2, observa-se que é possível calcular a média de qualquer<br />
medida corporal entre os dois indivíduos alinhados centralmente e assim<br />
determinar um valor (representado pela linha vertical pontilhada)<br />
que se<strong>para</strong> a amostra <strong>em</strong> dois grupos de igual tamanho, correspondentes<br />
a 50% da amostra cada. Esse valor recebe a denominação de mediana<br />
ou percentil 50 e pode ser calculado <strong>para</strong> qualquer amostra de indivíduos<br />
de mesmo sexo e idade.<br />
FIGURA 2 Distribuição de uma amostra de indivíduos saudáveis de mesmo sexo<br />
e idade, hierarquizada por um parâmetro antropométrico, <strong>para</strong> d<strong>em</strong>onstrar o<br />
posicionamento do percentil 50 do grupo.<br />
Percentis<br />
Percentil 50<br />
n = 56
10<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Assim, se uma criança, por ex<strong>em</strong>plo, tiver estatura igual a esse valor<br />
do percentil 50, significa que metade das crianças de mesmo sexo e idade<br />
é mais baixa do que ela e que a outra metade t<strong>em</strong> estatura maior.<br />
Na Figura 3, supondo que represente 60 indivíduos de uma amostra<br />
ordenada hierarquicamente pelo peso, observa-se que é possível<br />
determinar o valor que delimita os seis indivíduos mais pesados<br />
(10% da amostra), no extr<strong>em</strong>o direito da figura, ou os três mais magros<br />
(5% da amostra), no extr<strong>em</strong>o esquerdo da figura. Esses são os valores,<br />
calculados a partir da amostra, correspondentes aos percentis 90 e 5,<br />
respectivamente.<br />
FIGURA 3 Distribuição de uma amostra de indivíduos saudáveis de mesmo sexo<br />
e idade, hierarquizada por um parâmetro antropométrico, <strong>para</strong> d<strong>em</strong>onstrar o<br />
posicionamento dos percentis 5 e 90, além da mediana do grupo.<br />
Percentis<br />
Percentil 5 Percentil 50<br />
Percentil 90<br />
n = 56
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
11<br />
Deve-se salientar que, desse modo, é possível determinar quantos<br />
pontos de corte for<strong>em</strong> necessários, como o ponto que se<strong>para</strong> os 15%<br />
mais baixos (percentil 15), os 25% mais altos (percentil 75), os 5% mais<br />
gordos (percentil 95) ou, ainda, os 3% mais magros (percentil 3), e assim<br />
por diante. A classificação <strong>em</strong> percentis, intuitivamente, traz consigo a<br />
noção de risco, pois, como se observa pela Figura 3, quanto mais próximo<br />
dos extr<strong>em</strong>os da distribuição for o valor observado <strong>em</strong> uma criança<br />
ou adolescente, menos frequentes são os indivíduos normais portadores<br />
daquele valor. Está claro que isso não significa que o valor é obrigatoriamente<br />
anormal, mas indica que, apesar de a medida ter probabilidade<br />
de ser normal, esta é pequena.<br />
Escores z<br />
A classificação dos valores observados ou estimados <strong>em</strong> escores z é uma<br />
forma de localizar o quão distante da média (ou da mediana) de seu grupo<br />
de idade e sexo se situa a medida de uma criança. Obviamente, isso<br />
vale <strong>para</strong> qualquer parâmetro antropométrico, seja de peso, de estatura,<br />
de IMC, etc., e seu afastamento da média é medido <strong>em</strong> desvios padrão<br />
acima ou abaixo dela.<br />
Assim como a média ou a mediana representam o valor central de<br />
um conjunto de valores de qualquer ord<strong>em</strong>, antropométricos, inclusive,<br />
pode-se dizer que o desvio padrão representa, <strong>em</strong> termos, a dispersão<br />
desses valores ao redor da média (ou mediana) do grupo. Portanto,<br />
as amostras de dados de crescimento têm médias e medianas, b<strong>em</strong><br />
como desvios padrão distintos e específicos, de acordo com o grupo de<br />
idade e sexo.<br />
A partir da média ou mediana e do desvio padrão, é possível calcular<br />
o escore z de uma criança ou de um adolescente. Para tanto, qualquer<br />
que seja o parâmetro antropométrico considerado, basta subtrair o valor<br />
da média (ou mediana), correspondente a seu grupo de idade e sexo,<br />
do valor que a criança ou o adolescente apresenta. A seguir, divide-se a<br />
diferença (positiva, se a criança for maior do que a média, ou negativa,
12<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
se ela for menor) pelo valor do desvio padrão também específico do grupo.<br />
O Quadro 1 ex<strong>em</strong>plifica o cálculo de um escore z do peso de uma<br />
criança de 5 anos de idade.<br />
QUADRO 1<br />
Ex<strong>em</strong>plo de cálculo de escore z<br />
Sexo: masculino<br />
Idade: 5 anos<br />
Peso: 17 kg<br />
Média de peso deste grupo de idade do sexo masculino: 18,3 kg<br />
Desvio padrão deste grupo de idade do sexo masculino: 2,4 kg<br />
Portanto, o escore z = (17 – 18,3)/2,4 = –1,3/2,4 = 0,54<br />
Embora por analogia com a distribuição por percentis, é facilmente<br />
compreensível que quanto mais afastado da média, <strong>em</strong> escores z, for<br />
um valor antropométrico observado, menor será sua probabilidade de<br />
ser normal. Seu risco é mais difícil de ser intuitivamente percebido do<br />
que quando se utiliza a classificação <strong>em</strong> percentis.<br />
A percepção exata do risco pode d<strong>em</strong>andar cálculos adicionais ou a<br />
avaliação aproximada que se pode obter utilizando uma Curva de Gauss<br />
<strong>em</strong> que percentis e escores z estejam representados, como mostra a Figura<br />
4, na qual a Curva exibe a correspondência entre alguns valores de<br />
escore z e de percentis.<br />
Graficamente, a Curva de Gauss permite, ainda, mesmo que de<br />
maneira aproximada, avaliar a frequência com que determinado escore<br />
z é observado na população, como se pode ver na Figura 5, b<strong>em</strong> como<br />
a proporção da população que se situa acima ou abaixo de determinado<br />
escore z.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
13<br />
FIGURA 4 Representação gráfica da distribuição de uma amostra de indivíduos<br />
saudáveis de mesmo sexo e idade, hierarquizada por um parâmetro antropométrico,<br />
<strong>para</strong> d<strong>em</strong>onstrar o posicionamento de alguns valores de escore z <strong>em</strong> relação à<br />
média, b<strong>em</strong> como os percentis correspondentes.<br />
Frequência do valor<br />
na população normal<br />
20%<br />
18%<br />
16%<br />
14%<br />
12%<br />
10%<br />
8%<br />
6%<br />
4%<br />
2%<br />
0%<br />
Z: escore z (desvios padrão)<br />
p: percentil correspondente ao escore z<br />
Curva de Gauss<br />
-3 Z -2 Z -1 Z 0 +1 Z +2 Z +3 Z<br />
p0,13 p2,28 p15,8 p50 p84,2 p97,72 p99,87<br />
(mediana)<br />
Nas Figuras 6 e 7, verifica-se que enquanto o escore z de +1 (um desvio<br />
padrão acima da média) e o escore z de -1 (um desvio padrão abaixo<br />
da média) ocorr<strong>em</strong> na população normal com a mesma frequência, eles<br />
delimitam proporções completamente diferentes de indivíduos normais.<br />
Por se tratar de um modelo mat<strong>em</strong>ático, aritmeticamente tratável,<br />
o escore z é melhor do que as classificações <strong>em</strong> percentis <strong>para</strong> ser<br />
utilizado <strong>em</strong> pesquisas cujo objetivo é com<strong>para</strong>r, além de prevalências,
14<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
FIGURA 5 Distribuição de uma amostra de indivíduos saudáveis de mesmo sexo<br />
e idade, hierarquizada por um parâmetro antropométrico, <strong>para</strong> d<strong>em</strong>onstrar a<br />
frequência populacional com que os escores z +1 e - 1 são observados.<br />
Frequência do valor<br />
na população normal<br />
20%<br />
18%<br />
16%<br />
14%<br />
12%<br />
10%<br />
8%<br />
6%<br />
4%<br />
2%<br />
0%<br />
Z: escore z (desvios padrão)<br />
p: percentil correspondente ao escore z<br />
Curva de Gauss<br />
-3 Z -2 Z -1 Z 0 +1 Z +2 Z +3 Z<br />
p0,13 p2,28 p15,8 p50 p84,2 p97,72 p99,87<br />
(mediana)<br />
distribuições de parâmetros antropométricos entre diferentes populações<br />
ou comunidades ou sua evolução <strong>em</strong> uma mesma população ao<br />
longo do t<strong>em</strong>po.<br />
CURVAS DE CRESCIMENTO DA ORGANIZAÇÃO<br />
MUNDIAL DA SAÚDE<br />
Há mais de 50 anos, as curvas de crescimento têm sido utilizadas <strong>para</strong><br />
avaliar rotineiramente o crescimento e o estado nutricional de crianças<br />
e, anos depois, também de adolescentes. Embora algumas dessas curvas<br />
tenham sido criadas <strong>para</strong> avaliar populações de países ou de regiões
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
15<br />
FIGURA 6 Distribuição de uma amostra de indivíduos saudáveis de mesmo sexo<br />
e idade, hierarquizada por um parâmetro antropométrico, <strong>para</strong> d<strong>em</strong>onstrar a<br />
proporção da população que se situa abaixo de escore z +1.<br />
Frequência do valor<br />
na população normal<br />
20%<br />
18%<br />
16%<br />
14%<br />
12%<br />
10%<br />
8%<br />
6%<br />
4%<br />
2%<br />
0%<br />
Z: escore z (desvios padrão)<br />
p: percentil correspondente ao escore z<br />
Curva de Gauss<br />
-3 Z -2 Z -1 Z 0 +1 Z +2 Z +3 Z<br />
p0,13 p2,28 p15,8 p50 p84,2 p97,72 p99,87<br />
(mediana)<br />
específicas, profissionais de outros países também passaram a utilizá-<br />
-las, já que não contavam com dados de suas próprias populações.<br />
O referencial provavelmente mais famoso e internacionalmente<br />
muito utilizado é o das denominadas Curvas de Tanner, publicadas <strong>em</strong><br />
1966 3,4 , que tinham como base dados de crescimento de crianças e adolescentes<br />
ingleses. Posteriormente, surgiram outras curvas, como a do<br />
National Center for Health Statistics (NCHS), dos Estados Unidos, a<br />
qual, desde 1977 5 , quando foi criada, passou a ser muito utilizada internacionalmente,<br />
principalmente <strong>para</strong> crianças de até 5 anos de idade,<br />
até por recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS). Nessa<br />
ocasião, a OMS recomendava que países que não tivess<strong>em</strong> curvas de sua
16<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
FIGURA 7 Distribuição de uma amostra de indivíduos saudáveis de mesmo sexo<br />
e idade, hierarquizada por um parâmetro antropométrico, <strong>para</strong> d<strong>em</strong>onstrar a<br />
proporção da população que se situa abaixo de escore z -1.<br />
Frequência do valor<br />
na população normal<br />
20%<br />
18%<br />
16%<br />
14%<br />
12%<br />
10%<br />
8%<br />
6%<br />
4%<br />
Curva de Gauss<br />
2%<br />
0%<br />
-3 Z -2 Z -1 Z 0 +1 Z +2 Z +3 Z<br />
p0,13 p2,28 p15,8 p50 p84,2 p97,78 p99,87<br />
Z: escore z (desvios padrão)<br />
(mediana)<br />
p: percentil correspondente ao escore z<br />
própria população utilizass<strong>em</strong> as do NCHS, <strong>em</strong> função da grande carga<br />
de trabalho e dos altos custos que a realização de um referencial próprio<br />
d<strong>em</strong>andaria, particularmente aos países <strong>em</strong> desenvolvimento. Nessa<br />
época, a OMS começou a reunir Comitês de Peritos <strong>para</strong> que criass<strong>em</strong><br />
critérios que permitiriam a utilização das curvas <strong>em</strong> diferentes países.<br />
Mais ou menos na mesma época, no Brasil, foi realizado um estudo sobre<br />
o crescimento de crianças e adolescentes da cidade de Santo André/SP<br />
que, após alguns anos, foi apresentado sob a forma gráfica de curvas<br />
de crescimento. Essas curvas, denominadas Curvas de Crescimento de<br />
Santo André Classe IV, eram <strong>em</strong>basadas nos dados das crianças e dos
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
17<br />
adolescentes de maior nível socioeconômico daquela cidade e tiveram<br />
ampla utilização no meio médico, particularmente entre os pediatras.<br />
Também na década de 1970, surgiu a Curva Cubana de Crescimento,<br />
que foi realizada <strong>em</strong> uma amostra representativa de crianças e adolescentes<br />
cubanos, com os melhores cuidados metodológicos possíveis<br />
na época, sob a coordenação do professor Jordan, de Cuba, e com a assessoria<br />
do professor Tanner, de Londres. Entretanto, a curva cubana<br />
acabou não extravasando os limites de seu próprio país, apesar, inclusive,<br />
dos esforços do próprio Tanner, obviamente como decorrência dos<br />
probl<strong>em</strong>as políticos que Cuba enfrentou naqueles anos.<br />
Em 2000, <strong>em</strong> decorrência de probl<strong>em</strong>as que vinham sendo relatados<br />
com frequência quando da utilização da Curva do NCHS, o Center<br />
for Diseases Control (CDC) lançou um novo conjunto de tabelas e gráficos<br />
de crescimento. 6 Essas novas curvas, denominadas CDC 2000, na<br />
verdade correspond<strong>em</strong> ao aproveitamento de dados das curvas anteriores<br />
do NCHS (1977), mas substituindo os valores das crianças de menores<br />
idades pelos de uma nova amostra de crianças de baixa idade, mais recente<br />
e mais representativa da população do país como um todo. 7,8<br />
Como novidade, ao lado das curvas habituais de peso, comprimento<br />
ou estatura, circunferência craniana e do braço, o CDC acrescentou<br />
uma curva de IMC <strong>para</strong> indivíduos de 2 a 19 anos de idade. Além das tabelas<br />
e dos respectivos gráficos, o CDC também disponibilizou, <strong>para</strong> uso<br />
livre, um programa que permite realizar a classificação de parâmetros<br />
antropométricos, tanto individualmente quanto <strong>em</strong> grupos de crianças<br />
e/ou adolescentes. Esse programa está disponível como um dos módulos,<br />
denominado Nutrition, do programa Epi Info, versão 3.5.1, ainda<br />
distribuído gratuitamente pelo CDC (wwwn.cdc.gov/epiinfo/script/<br />
translations.aspx) <strong>em</strong> diversas línguas, inclusive português.<br />
A curva do CDC continua sendo utilizada até hoje por muitos profissionais,<br />
incluindo pesquisadores, principalmente nos Estados Unidos.
18<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
CURVAS DE CRESCIMENTO DA OMS: 2006 E 2007<br />
Um conjunto de peritos convocados pela própria OMS conseguiu d<strong>em</strong>onstrar<br />
<strong>para</strong> a Organização, no início da década de 1990, que um grupo<br />
significativo de crianças vinha apresentando, no primeiro ano de<br />
vida, uma tendência de crescimento muito diferente da representada<br />
nas curvas do NCHS, até então recomendadas pela própria OMS. Tratava-se<br />
de dados de grupos de crianças saudáveis recebendo aleitamento<br />
materno de maneira adequada, cujo crescimento vinha sendo acompanhado<br />
por pesquisadores de diversos centros de investigação, todos<br />
de reconhecida competência no campo do crescimento humano. 9<br />
Esses dados de crescimento convenceram a direção e os d<strong>em</strong>ais<br />
funcionários da OMS quanto à necessidade de se mobilizar<strong>em</strong> recursos<br />
próprios e também outras fontes que viabilizass<strong>em</strong> a realização de<br />
um novo estudo de crescimento. As pr<strong>em</strong>issas do estudo incluíam a obtenção<br />
de uma amostra multicêntrica internacional, a utilização de metodologias<br />
e instrumentos atualizados, a realização de um treinamento<br />
e uma supervisão muito cuidadosos do pessoal encarregado da coleta<br />
dos dados e a revisão do modelo utilizado no processamento e análise<br />
dos dados.<br />
As amostras dos diversos centros deveriam atender a um padrão<br />
adequado, de acordo com o preconizado pela OMS, de aleitamento materno,<br />
além de ser<strong>em</strong> compostas por crianças saudáveis de ambientes<br />
e estratos socioeconômicos suficientes <strong>para</strong> permitir que houvesse um<br />
padrão de crescimento otimizado.<br />
Metodologicamente, decidiu-se por um estudo misto: com uma primeira<br />
parte longitudinal que acompanhasse crianças de 0 a 24 meses de<br />
vida, realizando mensurações a intervalos próximos, adequados à grande<br />
intensidade e rapidez que a evolução do crescimento t<strong>em</strong> nessa idade,<br />
e uma segunda parte transversal, com grupos de idade distribuídos <strong>em</strong><br />
intervalos de 3 meses, entre 18 e 60 meses de idade, que foram avaliados.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
19<br />
Em relação ao aleitamento materno, a decisão foi de que todas as<br />
crianças do estudo longitudinal deveriam ter recebido aleitamento materno<br />
exclusivo ou preferencial até os 4 meses de idade. Após esse período,<br />
o aleitamento materno deveria ser mantido pelo menos até 1 ano de<br />
vida. Entretanto, <strong>para</strong> a parte transversal do estudo, exigiu-se apenas que<br />
todas as crianças incluídas nas amostras tivess<strong>em</strong> recebido no mínimo 3<br />
meses de aleitamento materno. Certamente, <strong>em</strong> ambas as partes do estudo,<br />
contou-se com uma dieta adequada compl<strong>em</strong>entando o aleitamento<br />
ou iniciada após o início do desmame.<br />
Como detalhe a mais, <strong>para</strong> ser<strong>em</strong> incluídas na amostra, as crianças<br />
deveriam ser filhas de mães não fumantes, <strong>em</strong> decorrência das conhecidas<br />
consequências que esse hábito materno t<strong>em</strong> sobre o crescimento<br />
da criança.<br />
O objetivo da OMS era produzir um referencial de crescimento<br />
adequado metodologicamente, que pudesse servir internacionalmente<br />
<strong>para</strong> avaliar e acompanhar o crescimento de crianças de 0 a 5 anos de<br />
idade, período da vida <strong>em</strong> que a criança apresenta sua maior vulnerabilidade<br />
diante de agravos de qualquer ord<strong>em</strong>. Simultaneamente, a OMS<br />
também decidiu realizar o estudo de marcos de desenvolvimento neuropsicomotor<br />
das crianças até 1 ano de idade, de maneira a confeccionar<br />
um referencial que permitisse o acompanhamento também de seu desenvolvimento<br />
na rotina de atendimento que essas crianças receb<strong>em</strong> na<br />
base do sist<strong>em</strong>a de saúde.<br />
Visando a uma racionalização dos elevados custos que um estudo<br />
desse porte d<strong>em</strong>andaria, a OMS selecionou <strong>para</strong> participar do estudo<br />
centros que, de acordo com seus critérios, já apresentavam experiência<br />
prévia na realização de pesquisas de campo, preferencialmente envolvendo<br />
o acompanhamento de crianças. Os grupos escolhidos <strong>para</strong> integrar<br />
a amostra foram os das seguintes cidades: Pelotas (RS, Brasil), Acra<br />
(Gana), Nova Déli (Índia), Davis (Califórnia, Estados Unidos), Mascate<br />
(Omã) e Oslo (Noruega).
20<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
No estudo longitudinal foram processados e analisados todos os<br />
dados, até os da idade de 24 meses, <strong>para</strong> realizar a estimativa de valores<br />
de crescimento apenas até os 18 meses, objetivando garantir melhor<br />
ajuste dos valores estimados com os valores reais e, ao mesmo t<strong>em</strong>po,<br />
obter maior suavização das curvas. Nesse processo, todas as crianças<br />
cujo peso <strong>para</strong> estatura estava acima de escores z +3 ou abaixo de -3 foram<br />
eliminadas da amostra.<br />
Após essa etapa, foi feita uma interpolação com os valores da parte<br />
transversal do estudo <strong>para</strong> gerar as tabelas e os gráficos finais do referencial.<br />
Na amostra da parte transversal do estudo, durante o processamento<br />
dos dados, foram eliminadas todas as crianças de 2 a 5 anos que<br />
se situavam acima de +2 desvios padrão, somente acima, o que significa<br />
provocar um <strong>em</strong>agrecimento das curvas de percentis ou de escore z da<br />
porção superior do gráfico de referência.<br />
A pesquisa <strong>em</strong> si, considerando as fases de campo e análise, durou<br />
6 anos. A OMS tornou públicos os resultados <strong>em</strong> 2006, liberando os direitos<br />
autorais <strong>para</strong> a livre utilização, enquanto a equipe que coordenou<br />
a realização do estudo concordou com a internacionalização de sua utilização<br />
como referencial de crescimento e desenvolvimento. 10,11<br />
Inicialmente, na ocasião do lançamento das curvas, denominadas<br />
Curvas de Crescimento OMS 2006, foram disponibilizadas as tabelas e<br />
os gráficos, por sexo, até a idade de 60 meses, de comprimento ou estatura,<br />
peso, IMC, circunferência br<strong>aqui</strong>al, circunferência craniana, dobra<br />
tricipital e dobra subescapular acompanhada dos gráficos de peso por<br />
comprimento ou por estatura, <strong>para</strong> ambos os sexos, e do referencial dos<br />
marcos de desenvolvimento.<br />
Pouco t<strong>em</strong>po depois, a OMS disponibilizou também o programa<br />
WHO Anthro <strong>para</strong> efetuar a transformação dos valores observados<br />
<strong>em</strong> percentil ou <strong>em</strong> escore z de crianças dessa faixa etária, individualmente<br />
ou, no caso de estudos populacionais, <strong>em</strong> grupos. Mais recent<strong>em</strong>ente,<br />
também foram divulgadas as tabelas de velocidade de ganho de
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
21<br />
comprimento e de peso por sexo. Todos esses referenciais e o programa<br />
pod<strong>em</strong> ser encontrados no site: http://www.who.int/childgrowth/en/,<br />
sendo sua utilização totalmente livre.<br />
CURVAS DE CRESCIMENTO (OMS, 2007)<br />
Em 2007, a OMS lançou um novo conjunto de tabelas e curvas <strong>para</strong> servir<br />
como referencial de crescimento, agora <strong>para</strong> crianças de 5 a 9 anos<br />
e adolescentes de 10 a 19 anos de idade, que pudesse compl<strong>em</strong>entar as<br />
curvas de 2006.<br />
Na verdade, as Curvas OMS 2007 são uma reconstrução das curvas<br />
de 1977 do NCHS, na época já recomendadas pela OMS. Nesse processo,<br />
os dados de 1977 foram fundidos com os dados das crianças de<br />
18 a 71 meses de idade da amostra utilizada na Curva OMS 2006. Depois<br />
disso, <strong>em</strong>pregando a mesma metodologia estatística de suavização<br />
adotada <strong>para</strong> a confecção das curvas do ano anterior (2006), novos dados<br />
foram estimados <strong>para</strong> as tabelas e os gráficos de referência de crescimento<br />
que foram criados <strong>para</strong> os escolares e os adolescentes.<br />
O objetivo desses procedimentos era obter, particularmente <strong>para</strong> o<br />
IMC, gráficos que, no extr<strong>em</strong>o inferior de idade, tivess<strong>em</strong> uma boa concordância<br />
com os valores das crianças de 59 meses de idade da curva<br />
de 2006, e que, no limite superior, nos adolescentes de 19 anos, os valores<br />
da curva foss<strong>em</strong> s<strong>em</strong>elhantes aos pontos de corte (cut off) propostos<br />
<strong>para</strong> adultos. Para isso, além do que já foi referido, também na confecção<br />
destas curvas foram excluídos os dados do NCHS de crianças e adolescentes<br />
muito pesados, que apresentavam valores extr<strong>em</strong>amente distanciados<br />
da mediana de seu grupo de sexo e idade.<br />
Como resultado, as diferenças de IMC <strong>para</strong> a idade entre as duas<br />
curvas, ao redor dos 5 anos, não ultrapassam 100 g/m 2 , enquanto, aos<br />
19 anos, os valores de escore z +1 de IMC são 0,4 kg/m 2 maiores <strong>para</strong><br />
o sexo masculino do que o ponto de corte de adultos – não há diferença<br />
no f<strong>em</strong>inino. Do mesmo modo, <strong>para</strong> o escore z +2, os valores <strong>para</strong>
22<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
ambos os sexos aos 19 anos foram de 29,7 kg/m 2 , muito próximos dos 30<br />
kg/m 2 definidos como ponto de corte <strong>para</strong> a obesidade <strong>em</strong> adultos. 12,13<br />
Assim, <strong>em</strong> 2007, a OMS lançou <strong>para</strong> livre utilização as tabelas e<br />
curvas de:<br />
• peso <strong>para</strong> idade e sexo, <strong>para</strong> crianças de 5 a 9 anos de idade;<br />
• estatura <strong>para</strong> idade e sexo, de 5 a 19 anos;<br />
• IMC <strong>para</strong> idade e sexo, de 5 a 19 anos.<br />
Não foram criados referenciais <strong>para</strong> outros parâmetros antropométricos.<br />
Especificamente <strong>para</strong> o peso, o referencial termina aos 10 anos de<br />
idade, pois a variabilidade da medida, <strong>em</strong> decorrência do estágio de desenvolvimento<br />
puberal <strong>em</strong> que o indivíduo se encontra, é muito grande,<br />
o que acarreta grande dificuldade <strong>em</strong> sua interpretação. No entender<br />
dos peritos da OMS, a avaliação da adequação do peso nos adolescentes<br />
é melhor se correlacionada à estatura, exatamente como é o caso do<br />
IMC.<br />
Junto dos gráficos, a OMS disponibilizou também <strong>para</strong> uso livre o<br />
programa WHO Anthro Plus, <strong>para</strong> cálculo de percentil ou escore z desses<br />
três parâmetros, utilizável tanto <strong>em</strong> indivíduos isoladamente quanto<br />
<strong>para</strong> grupos populacionais.<br />
Tabelas, gráficos e programas da OMS 2007 pod<strong>em</strong> ser livr<strong>em</strong>ente<br />
acessados no site: http://www.who.int/growthref/en/.<br />
ANÁLISE CRÍTICA DA UTILIZAÇÃO<br />
DAS CURVAS DA OMS DE 2006 E 2007<br />
Em consequência de todos esses fatos, particularmente no que tange ao<br />
aspecto multirracial da amostra estudada e aos cuidados metodológicos<br />
adotados, as curvas da OMS 2006 e 2007 pod<strong>em</strong> ser consideradas um<br />
bom referencial de crescimento <strong>para</strong> utilização nos países que não possu<strong>em</strong><br />
referenciais próprios.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
23<br />
As características das crianças e dos adolescentes avaliados permit<strong>em</strong><br />
supor que eles apresentam um bom padrão de crescimento que,<br />
portanto, pode servir como referencial (não como padrão) de crescimento<br />
<strong>para</strong> outras crianças e adolescentes.<br />
A troca de um referencial só pode ser consequência do fato de o<br />
novo descrever outros valores de crescimento, possivelmente considerados<br />
melhores. Entretanto, é preciso algum cuidado no momento <strong>em</strong><br />
que se implanta a utilização de novas curvas de referência, o que obrigatoriamente<br />
implica a reclassificação das crianças quanto a seu diagnóstico<br />
de crescimento e/ou de risco nutricional. Esse fato se reveste de<br />
particular relevância no caso das crianças que estão nos limites superiores<br />
ou inferiores da amplitude de variação aceitável <strong>para</strong> determinado<br />
parâmetro antropométrico, que quase certamente, com a utilização<br />
de novo referencial, poderão deixar de ser normais ou, ao contrário, tornar<strong>em</strong>-se<br />
normais. 14<br />
Para superar essa dificuldade, é necessário analisar criticamente os<br />
diferentes parâmetros antropométricos do novo referencial, particularmente<br />
na sua utilização prática frente a indivíduos que estão <strong>em</strong> diferentes<br />
momentos de crescimento. 8 Nesse sentido, vale a pena iniciar a<br />
análise pela Curva OMS 2006. O primeiro aspecto a se considerar são<br />
os valores de nascimento, que não se aplicam de maneira indiscriminada<br />
a todo e qualquer recém-nascido. Como mostra a Figura 8, mesmo<br />
se tratando de recém-nascidos considerados a termo, deve-se considerar<br />
a idade gestacional.<br />
No caso do IMC, que de certa forma espelha a evolução conjunta<br />
de peso e comprimento segundo a idade gestacional, verifica-se na mesma<br />
Figura 8 que os percentis 50, 3 e 97, estimados a partir de uma amostra<br />
de recém-nascido a termo, com idades gestacionais de 37 a 42 s<strong>em</strong>anas<br />
incompletas, não correspond<strong>em</strong> aos da OMS. Embora possa parecer<br />
óbvio, é preciso ter <strong>em</strong> mente que os valores da OMS não foram calculados<br />
<strong>para</strong> ser<strong>em</strong> avaliados pela idade gestacional. 15
24<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
FIGURA 8 Com<strong>para</strong>ção dos valores de IMC correspondentes aos percentis 3, 50<br />
e 97, estimados a partir de uma amostra de recém-nascidos do Berçário Anexo à<br />
Maternidade do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de<br />
São Paulo, todos a termo, porém com distintas idades gestacionais, com os valores de<br />
IMC dos mesmos percentis propostos pela OMS 2006 <strong>para</strong> recém-nascido.<br />
IMC<br />
17<br />
16<br />
15<br />
p97<br />
14<br />
13<br />
p50<br />
12<br />
11<br />
p3<br />
10<br />
37 38 39 40 41 42<br />
Idade gestacional (s<strong>em</strong>anas)<br />
Brock et al., 2008.<br />
OMS, 2006<br />
Como se observa pela Figura 8, as discrepâncias se modificam conforme<br />
o percentil e a idade gestacional considerada, sendo que os valores<br />
menos diferentes são os das 37 s<strong>em</strong>anas <strong>para</strong> os percentis 3 e 50, e os<br />
das 42 s<strong>em</strong>anas de idade gestacional no caso do percentil 97.<br />
Desse modo, como era de se esperar, entende-se que é impossível,<br />
na prática, com<strong>para</strong>r os parâmetros antropométricos no momento<br />
do nascimento com a curva OMS 2006, mesmo que se trate de um parto<br />
a termo.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
25<br />
A Figura 9 descreve a evolução dos valores de peso e de comprimento<br />
e estatura correspondentes aos percentis 3, 50 e 97 da Curva<br />
OMS 2006, agora transformados <strong>em</strong> percentis utilizando como referencial<br />
o CDC 2000.<br />
As maiores diferenças correspond<strong>em</strong> ao percentil 50 e são muito<br />
mais amplas <strong>para</strong> a curva do peso. Se ambos os referenciais d<strong>em</strong>onstrass<strong>em</strong><br />
um comportamento s<strong>em</strong>elhante de tendência de crescimento, poderiam<br />
ser observadas diferenças que, no entanto, tenderiam a ser mais<br />
constantes e não variariam tanto conforme a idade.<br />
FIGURA 9 Evolução dos percentis 3, 50 e 97 de peso e comprimento/estatura<br />
até os 5 anos de idade, <strong>em</strong> meninos, com<strong>para</strong>ndo os valores da OMS 2006 com o<br />
referencial do CDC 2000.<br />
Percentil<br />
97<br />
69<br />
50<br />
25<br />
OMS<br />
Peso<br />
Comprimento<br />
3<br />
0 6 12 18 24 30 36 42 48 54 60<br />
Idade (meses)<br />
CDC
26<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
No caso do peso, observa-se que o valor da OMS do percentil 50<br />
no nascimento é muito menor, correspondendo ao percentil 34 do CDC.<br />
A seguir, nos primeiros 3 a 4 meses, o peso (pela OMS) aumenta muito<br />
mais intensamente, com o percentil 50 chegando quase ao percentil 70<br />
do CDC. Daí <strong>em</strong> diante, há uma redução progressiva da velocidade de<br />
ganho de peso <strong>em</strong> relação à curva do CDC, que perdura até os 18 meses,<br />
fazendo que a mediana de peso da curva da OMS acabe correspondendo<br />
ao percentil 25 do CDC.<br />
A partir dos 18 meses, ocorre uma recuperação do ganho de peso<br />
que faz que aos 36 meses o valor do percentil 50 se torne praticamente<br />
idêntico nas duas curvas, o que persiste até os 5 anos.<br />
No caso do comprimento e da estatura, observa-se uma flutuação<br />
de valores de mesma tendência, <strong>em</strong>bora de muito menor amplitude. Especificamente,<br />
o percentil 50 de comprimento e estatura, como mostra<br />
a Figura 9, apesar das flutuações, permanece o t<strong>em</strong>po todo <strong>em</strong> valores<br />
superiores aos do CDC, parecendo indicar que não foi afetado pelas flutuações<br />
observadas no ganho de peso e que, portanto, esse poderia ser<br />
um padrão fisiológico de evolução ponderal. Nos percentis extr<strong>em</strong>os (3<br />
e 97), o comportamento é muito s<strong>em</strong>elhante, <strong>em</strong>bora com variações de<br />
valores de muito menor amplitude.<br />
O comportamento das meninas é praticamente idêntico ao dos<br />
meninos <strong>em</strong> todas as idades, respeitadas as diferenças de valores normalmente<br />
decorrentes do sexo. 16<br />
Quanto à circunferência craniana, o mesmo tipo de com<strong>para</strong>ção<br />
feita <strong>para</strong> peso e estatura mostra um comportamento completamente<br />
diferente entre as duas curvas, com os valores da mediana (escore z 0)<br />
da OMS 2006 s<strong>em</strong>pre bastante inferiores aos do escore z e da curva do<br />
CDC. A maior diferença (0,5 escore z) é a observada ao nascimento, e se<br />
reduz progressivamente até os 8 meses de vida, quando passa a flutuar<br />
<strong>em</strong> valores muito mais próximos do CDC, mas s<strong>em</strong>pre abaixo deste, até<br />
os 24 meses de vida (Figura 10). Além de eventuais aspectos metodológicos,<br />
como tipo de amostra, estudo longitudinal, técnicas de mensuração,<br />
entre outros, não parece haver outra explicação.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
27<br />
FIGURA 10 Evolução do percentil 50 da circunferência craniana <strong>em</strong> meninas,<br />
com<strong>para</strong>ndo os valores da OMS 2006 com o referencial do CDC 2000.<br />
z +0,5<br />
(p 69,1)<br />
z 0<br />
(p 50)<br />
z -0,5<br />
(p 30,9)<br />
z -1<br />
(p 15,8) 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24<br />
CDC<br />
OMS<br />
Idade (meses)<br />
Quanto à transição entre OMS 2006 e 2007, o que, como citado<br />
anteriormente, foi uma preocupação metodológica dos pesquisadores,<br />
as Figuras 11 e 12 mostram que, de fato, aos 60 meses, o ajuste foi bastante<br />
bom.<br />
Quando se com<strong>para</strong>m valores de crianças brasileiras de creches<br />
públicas e filantrópicas, com idades entre 3,5 e 7 anos in<strong>completo</strong>s,<br />
com essa parte dos dois referenciais, 2006 e 2007, o que se observa<br />
no caso do crescimento <strong>em</strong> estatura (Figura 11) é que muda a tendência<br />
de sua evolução. Inicialmente próxima, mas s<strong>em</strong>pre abaixo do referencial<br />
dos 38 aos 60 meses que, ainda que próxima, passa a ser acima<br />
da mediana entre 60 e 83 meses de idade. Nesse aspecto, o valor central<br />
(percentil 50) e os percentis 5 e 95 têm comportamentos praticamente<br />
idênticos. 17
Estatura (cm)<br />
28<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
FIGURA 11 Evolução da estatura de meninas de 38 a 84 meses de idade, de pré-<br />
-escolas filantrópicas e públicas, com<strong>para</strong>da aos valores das Curvas OMS 2006 e 2007.<br />
140<br />
135<br />
130<br />
125<br />
120<br />
p95<br />
p50<br />
115<br />
110<br />
p5<br />
105<br />
100<br />
95<br />
90<br />
OMS<br />
85<br />
80<br />
36<br />
42 48 54 60 66 72 78 84<br />
Idade (meses)<br />
Leone et al., 2009.<br />
A evolução do crescimento do peso não é igual à da estatura. Nos<br />
percentis 5, 50 e 95, a curva de tendência de ganho de peso dos pré-escolares<br />
está s<strong>em</strong>pre acima do referencial entre 38 e 84 meses de idade. O<br />
que se pode dizer, e que é s<strong>em</strong>elhante ao comportamento da estatura, é<br />
que a partir dos 60 meses a curva das crianças tende a se afastar da do<br />
referencial, <strong>em</strong> direção a valores de percentis mais elevados. No percentil<br />
5, essa tendência se inicia mais tardiamente, enquanto no percentil 95<br />
a diferença de peso se acentua progressivamente logo após os 60 meses,<br />
chegando a uma diferença de 5 kg a mais, entre 83 e 84 meses, <strong>em</strong> relação<br />
ao percentil 95 do referencial.<br />
Essa amostra de pré-escolares, com<strong>para</strong>da às Curvas da OMS, corresponde<br />
a dois estudos de desenho transversal, foi avaliada há mais
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
29<br />
de 5 anos e engloba mais de 2.800 crianças que na ocasião frequentavam<br />
pré-escolas públicas ou filantrópicas. Como consequência, é possível<br />
supor que a diferença de 5 kg observada no percentil 95 seja causada<br />
mais pelo <strong>em</strong>agrecimento realizado na amostra da OMS, decorrente da<br />
não inclusão dos outliers (crianças cujo peso estava muito acima da mediana),<br />
do que exclusivamente da transição nutricional que já se observava<br />
também no Brasil.<br />
O referencial da OMS 2007, <strong>para</strong> escolares e adolescentes, pela<br />
maneira como foi elaborado, praticamente não t<strong>em</strong> diferenças no que<br />
FIGURA 12 Evolução do peso de meninos de 38 a 84 meses de idade, de pré-<br />
-escolas filantrópicas e públicas, com<strong>para</strong>da aos valores das Curvas OMS 2006 e<br />
2007.<br />
35<br />
30<br />
M<br />
p 95<br />
Peso (kg)<br />
25<br />
20<br />
p 50<br />
p 5<br />
15<br />
OMS<br />
10<br />
36<br />
42 48 54 60 66 72 78 84<br />
Idade (meses)<br />
Leone et al., 2009.
30<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
tange à estatura, revelando uma tendência de crescimento quase idêntica<br />
à do CDC. Na Figura 13, observam-se algumas diferenças nos valores<br />
estimados <strong>em</strong> determinadas idades, que, no entanto, <strong>em</strong> valores absolutos<br />
são de pequena monta e não chegam a influenciar significativamente<br />
a utilização que pode ser feita das curvas <strong>para</strong> avaliar e acompanhar o<br />
crescimento de crianças escolares e de adolescentes.<br />
FIGURA 13 Com<strong>para</strong>ção dos valores de crescimento <strong>em</strong> estatura <strong>para</strong> o sexo<br />
f<strong>em</strong>inino, propostos pelas curvas OMS 2007 e CDC 2000 <strong>para</strong> escolares e<br />
adolescentes.<br />
190<br />
180<br />
p 97<br />
Estatura (cm)<br />
170<br />
160<br />
150<br />
140<br />
p 50<br />
p 3<br />
130<br />
120<br />
110<br />
105<br />
6<br />
7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19<br />
Idade (anos)<br />
OMS<br />
CDC/NCHS
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
31<br />
No entanto, quanto à variação do IMC e sua evolução até o início<br />
da idade adulta, as modificações feitas na amostra utilizada <strong>para</strong> os cálculos,<br />
excluindo os outliers mais obesos, resultaram <strong>em</strong> grandes diferenças<br />
nos valores de referência dos percentis mais elevados. A Figura<br />
14 mostra que, <strong>para</strong> o sexo f<strong>em</strong>inino, o valor de IMC do percentil 97 da<br />
curva OMS, <strong>para</strong> os 19 anos, é aproximadamente de 29 kg/m 2 – muito<br />
menor do que o proposto pelo referencial do CDC de 2000, que se<br />
situava praticamente <strong>em</strong> 34 kg/m 2 , uma diferença nada desprezível de<br />
quase 5 kg.<br />
FIGURA 14 Com<strong>para</strong>ção dos valores de crescimento do IMC <strong>para</strong> o sexo f<strong>em</strong>inino,<br />
propostos pelas curvas OMS 2007 e CDC 2000 <strong>para</strong> escolares e adolescentes.<br />
34<br />
32<br />
30<br />
Índice de massa corpórea<br />
28<br />
26<br />
24<br />
22<br />
20<br />
18<br />
p 97<br />
p 50<br />
16<br />
p 3<br />
14<br />
12<br />
6<br />
OMS<br />
CDC/NCHS<br />
7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19<br />
Idade (anos)
32<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Todas essas características dos referenciais propostos pela OMS <strong>em</strong><br />
2006 e 2007 redundarão <strong>em</strong> alterações nas avaliações, especialmente<br />
de estado nutricional, das crianças e principalmente dos adolescentes.<br />
As modificações ocorridas nos valores limítrofes da curva certamente<br />
resultarão <strong>em</strong> uma maior sensibilidade <strong>para</strong> a detecção de situações de<br />
excesso de peso e, principalmente, de obesidade e de magreza (desnutrição)<br />
ao lado de uma maior especificidade, no caso dos menores de 5 anos,<br />
<strong>para</strong> detecção de baixa estatura.<br />
Embora essas características sejam bastante coerentes com a epid<strong>em</strong>ia<br />
de obesidade 18 e a importante redução da desnutrição que se observa<br />
atualmente no Brasil, é importante ter <strong>em</strong> mente que a adoção<br />
das novas curvas, já preconizada pelo Ministério da Saúde, resultará<br />
<strong>em</strong> duas importantes modificações. A primeira, no plano coletivo, será<br />
uma redução da prevalência de baixa estatura associada a um grande<br />
aumento na prevalência de sobrepeso e, principalmente, de obesidade.<br />
Isso significa que mudanças não desprezíveis dev<strong>em</strong> ocorrer nas políticas<br />
de atenção às crianças e aos adolescentes, de modo a absorver o aumento<br />
de d<strong>em</strong>anda decorrente da maior prevalência de casos com peso<br />
excessivo.<br />
A segunda, no plano individual, será o aumento de casos falsos-positivos<br />
<strong>para</strong> peso excessivo, consequência do aumento da sensibilidade,<br />
o que significa que os profissionais de saúde dev<strong>em</strong> ter mais cuidado na<br />
elaboração do diagnóstico nutricional. Os dados antropométricos nunca<br />
dev<strong>em</strong> ser valorizados <strong>em</strong> d<strong>em</strong>asia de maneira isolada, evitando, assim,<br />
a aposição excessiva de rótulos de “gordo” <strong>em</strong> indivíduos que pod<strong>em</strong><br />
ser normais e, ao mesmo t<strong>em</strong>po, deixando de realizar intervenções<br />
desnecessárias que, além de seu custo, no mínimo, resultam s<strong>em</strong>pre <strong>em</strong><br />
algum desconforto <strong>para</strong> o indivíduo.<br />
Por causa da grande variedade de parâmetros antropométricos<br />
propostos pelas novas curvas da OMS, não é impossível imaginar que<br />
outras distorções e consequências possam vir a ser observadas, o que,<br />
no entanto, só poderá ser detectado a partir de estudos realizados quando<br />
de sua utilização na rotina.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
33<br />
Como conclusão, cabe salientar que, diante dos cuidados metodológicos<br />
que envolveram a realização da curva de 2006, não há como se<br />
posicionar de maneira absoluta contra sua utilização, particularmente<br />
nos países que não dispõ<strong>em</strong> de referenciais próprios. 19 No campo<br />
da pesquisa científica, também não há por que se opor à sua utilização.<br />
Aliás, a utilização de um mesmo referencial é condição sine qua non<br />
<strong>para</strong> que determinadas com<strong>para</strong>ções de crescimento e de prevalências<br />
possam ser realizadas entre diferentes grupos de indivíduos ou de populações.<br />
Assim, não há razões, no momento presente, <strong>para</strong> não se adotar<br />
um referencial metodologicamente b<strong>em</strong> elaborado e que disponibilize<br />
maior variedade de parâmetros antropométricos.<br />
Finalmente, é importante enfatizar que qualquer referencial pode<br />
ser útil, desde que tenha sido elaborado da maneira mais adequada possível,<br />
que seus defeitos e suas virtudes sejam conhecidos e, ao mesmo<br />
t<strong>em</strong>po, que os resultados sejam interpretados de maneira cuidadosa e<br />
crítica.<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
1. WHO Expert Committee. Physical status: the use and interpretation of anthropometry.<br />
WHO technical report series: 854. Geneve: World Health Organization,<br />
1995.<br />
2. Hauspie RC, Cameron N, Molinari L (eds.). Methods in Human Growth Research.<br />
Cambridge: Cambridge University Press, 2004.<br />
3. Tanner JM, Whitehouse RH, Takeishi M. Standards from birth to maturity for<br />
height, weight, height velocity and weight velocity: British children, 1965, part<br />
1. Arch Dis Child 1966; 41:454-71.<br />
4. Tanner JM, Whitehouse RH, Takeishi M. Standards from birth to maturity for<br />
height, weight, height velocity and weight velocity: British children, 1965, part<br />
2. Arch Dis Child 1966; 41:613-35.<br />
5. Hamill PV, Drizd TA, Johnson CL, Reed RB, Roche AF. National Center for<br />
Health Statistics – NCHS. Growth curves for children. Birth – 18 years. Vital<br />
Health Stat 1977; 11(165): i-iv, 1-74.
34<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
6. Ogden CL, Kuczmarski RJ, Flegal KM, Mei Z, Guo S, Wei R et al. Centers for<br />
Disease Control and Prevention 2000 Growth Charts for the United States: Improv<strong>em</strong>ents<br />
to the 1977 National Center for Health Statistics Version. Pediatrics<br />
2002; 109;45-60.<br />
7. Kuczmarski RJ, Ogden CL, Guo SS, Grummer-Strawn LM, FlegaL km, Mei Z,<br />
et al. 2000 CDC Growth Charts for the United States: Methods and Development.<br />
Vital and Health Satatistics 2002; 11(246): 3-203.<br />
8. Soares NT. Um novo referencial antropométrico de crescimento: significados e<br />
implicações. Rev Nutr 2003; 16(1):93-104.<br />
9. Garza C, de Onis M. Rationale for developing a new international growth reference.<br />
Food Nutr Bull 2004; 25(1):s5-s14.<br />
10. de Onis M, Garza C, Victora C G, Bhan MK, Norum K R, guest editors. The<br />
WHO Multicentre Growth Reference Study (MGRS): Rationale, planning, and<br />
impl<strong>em</strong>entation. Food Nutr Bull 2004; 25(Suppl. 1):S3-S84.<br />
11. Garza C. New growth standards for the 21st century: a prescriptive approach.<br />
Nutr Rev 2006; 64(5)s55-s59.<br />
12. Butte NP, Garza C, de Onis M. Evaluation of the feasibility of international growth<br />
standards for school-aged children and adolescents. J Nutr 2007; 137:153-7.<br />
13. de Onis M, Onyango AW, Borghi E, Siyam A, Nishida C, Siekmann J. Development<br />
of a World Health Organization growth reference for school-aged children<br />
and adolescent. Bull of WHO 2007; 85:660-7.<br />
14. de Onis, Onyango AW, Borghi E, Garza C, Yang H. Comparison of the World<br />
Health Organization child growth (WHO) standards and the National Center<br />
for Health statistics/WHO international growth reference implications for<br />
health programmes. Public Health Nutr 2006; 9(7):943-7.<br />
15. Brock RS, Falcão MC, Leone C. Body mass index values for newborns according<br />
to gestational age. Nutr Hosp 2008; 23(5):487-92.<br />
16. Leone C. Departamento Científico de Nutrologia da SBP. As novas curvas da<br />
Organização Mundial da Saúde propostas <strong>para</strong> crianças de 0 a 5 anos de idade.<br />
Documento Científico. Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Pediatria.<br />
17. Leone C, Bertoli CJ, Schoeps DO. Novas curvas de crescimento da Organização<br />
Mundial da Saúde: com<strong>para</strong>ção com valores de crescimento de crianças
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
35<br />
pré-escolares das cidades de Taubaté e Santo André, São Paulo. Rev Paul Pediatr<br />
2009; 27(1):40-7.<br />
18. Wang Y, Monteiro CA, Popkin BM. Trends of obesity and underweight in older<br />
children and adolescents in the United States, Brazil, China, and Russia. Am J<br />
Clin Nutr 2002; 75:971-7.<br />
19. World Health Organization. Child growth standards based on length/height,<br />
weight and age. Acta Paediatr 2006; (Suppl.)450:76-85.
ANTROPOMETRIA NA GRAVIDEZ<br />
Luciana da Silva Sampaio Jorge<br />
Rita Maria Monteiro Goulart<br />
INTRODUÇÃO<br />
O processo gravídico é reconhecido como o período de maior vulnerabilidade<br />
biológica do ciclo reprodutivo da mulher, <strong>em</strong> razão das alterações<br />
fisiológicas nele presentes. As mudanças são necessárias <strong>para</strong> regular o<br />
metabolismo materno, promover o crescimento fetal e pre<strong>para</strong>r a mulher<br />
<strong>para</strong> o trabalho de parto, o nascimento e a lactação. 1-3<br />
Para que a gravidez transcorra com segurança, preservando a saúde<br />
da mãe e de seu bebê, são necessários cuidados da própria gestante, do<br />
parceiro, da família e, especialmente, dos profissionais de saúde. 4 A assistência<br />
pré-natal é uma ação básica de saúde da mulher durante a gravidez,<br />
que t<strong>em</strong> como objetivos acolher a gestante desde o início – período<br />
de mudanças físicas e <strong>em</strong>ocionais – e prevenir, diagnosticar e tratar<br />
probl<strong>em</strong>as que possam ocorrer, visando a promover sua saúde e a da<br />
criança. Essa ação deve ser realizada <strong>em</strong> toda a rede pública de saúde do<br />
país. 4,5
38<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
O acompanhamento mensal é fundamental <strong>para</strong> a avaliação do<br />
crescimento fetal e de intercorrências clínicas, prevenindo e minimizando<br />
possíveis danos à saúde das mães e das crianças. Em geral, mulheres<br />
que receb<strong>em</strong> cuidados de pré-natal desde o primeiro trimestre têm<br />
melhores resultados gestacionais. 6<br />
Parte da vulnerabilidade biológica da mulher decorre do fato de<br />
a gestação ser um período anabólico que requer uma quantidade extra<br />
de energia e nutrientes <strong>para</strong> garantir o crescimento e a manutenção<br />
do feto e da placenta, a formação de novos tecidos maternos e a maior<br />
carga de trabalho metabólico e basal. 3 Com o aumento da d<strong>em</strong>anda fetal<br />
de nutrientes, além do aumento na ingestão calórica, os mecanismos<br />
que propiciam o alcance das necessidades nutricionais elevadas<br />
inclu<strong>em</strong> a redução do gasto energético na síntese de lipídios e proteínas<br />
e na estocag<strong>em</strong> de gordura materna, por meio de um aumento na<br />
eficiência metabólica da utilização de energia e/ou uma diminuição das<br />
atividades físicas. 7<br />
Vários fatores estão associados aos resultados obstétricos, como idade<br />
materna, intervalo interpartal, paridade, infecções, atividade física, patologias<br />
(hipertensão e diabetes), estado nutricional, tabagismo, uso excessivo<br />
de álcool, condições socioeconômicas, uso excessivo de cafeína, etc. 4<br />
Entre esses fatores, o estado nutricional materno nesse período t<strong>em</strong> dupla<br />
relevância, pois influi na saúde materna, podendo ser um dos atores<br />
causais de mortalidade materna, complicações na gravidez e no parto<br />
(necessidade de parto cirúrgico) e estado nutricional após o parto, como<br />
também na saúde do concepto, que, <strong>em</strong> razão da dependência da mãe<br />
<strong>para</strong> seu crescimento e desenvolvimento, sofre influência <strong>em</strong> seu peso<br />
ao nascer, pr<strong>em</strong>aturidade, mortalidade e morbidade neonatal. 3,8-11<br />
Engstrom 12 define estado nutricional<br />
[...] No plano individual ou biológico, como resultante do equilíbrio<br />
entre o suprimento de nutrientes (consumo/ingestão alimentar) e<br />
o gasto ou a necessidade energética do organismo. Este se refere à
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
39<br />
utilização dos alimentos pelo organismo <strong>para</strong> suprir suas necessidades<br />
nutricionais; portanto, relaciona-se com o estado de saúde do<br />
indivíduo e com a capacidade do organismo <strong>em</strong> utilizar (absorver,<br />
metabolizar) adequadamente os nutrientes da dieta.<br />
Apesar de existir consenso de que o estado nutricional da gestante é fundamental<br />
<strong>para</strong> sua saúde e do bebê e que, nos países não industrializados,<br />
essas mulheres representam um grupo vulnerável nutricionalmente,<br />
o Brasil está entre os países que não dispõ<strong>em</strong> de estudos nacionais<br />
que d<strong>em</strong>onstr<strong>em</strong> o perfil de estado nutricional de gestantes. 13<br />
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) realizou a<br />
Pesquisa de Orçamentos Familiares de 2002-2003, que avaliou o perfil<br />
nutricional da população brasileira e o padrão de consumo alimentar.<br />
Entre as mulheres adultas, encontrou-se cerca de 5% de desnutrição<br />
e 13% de obesidade. Na faixa de 20 a 24 anos de idade, a prevalência de<br />
desnutrição encontrada foi de 12,2%, e 18,4% de excesso de peso. Na faixa<br />
de 35 a 44 anos, o excesso de peso atingiu cerca de 41%.<br />
A com<strong>para</strong>ção entre os dados dessa pesquisa com as de anos anteriores<br />
encontrou uma tendência ao declínio da prevalência de desnutrição<br />
e aumento do excesso de peso entre as mulheres, com maior aumento<br />
entre mulheres de famílias com rendimento mensal de até meio<br />
salário mínimo per capita. 14 Assim, grande parcela das mulheres adultas<br />
<strong>em</strong> idade fértil de baixo nível socioeconômico está exposta a alterações<br />
nutricionais, principalmente ao excesso de peso, o que as coloca <strong>em</strong> situação<br />
de risco no caso de uma gestação.<br />
Nessa mesma publicação, foi realizada uma avaliação evolutiva do<br />
perfil antropométrico-nutricional entre os dados obtidos no Estudo Nacional<br />
de Despesa Familiar (ENDEF, 1974-1975) com os dados dessa pesquisa.<br />
Os resultados mostraram que ocorreu um declínio contínuo dos<br />
déficits ponderais <strong>em</strong> ambos os sexos: aumentaram contínua e intensamente<br />
as prevalências de excesso de peso e obesidade entre os homens<br />
e o excesso de peso entre as mulheres continuou aumentando apenas na
40<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
região Nordeste, entre famílias com renda mensal de até meio salário<br />
mínimo per capita – nas classes de maior renda, essa prevalência se estabilizou<br />
ou mesmo declinou. 14<br />
Os poucos resultados disponíveis sobre perfil nutricional de gestantes<br />
brasileiras foram produzidos por estudos <strong>em</strong> algumas regiões ou<br />
estados, como o estudo realizado por Pereira 15 , que, avaliando o estado<br />
nutricional de cerca de 20 mil gestantes, de vários municípios do estado<br />
de São Paulo, <strong>em</strong> dia de campanha de vacinação, encontrou 28% de baixo<br />
peso e 38% de sobrepeso/obesidade, com uso do critério de Rosso. 16<br />
Estudo de coorte realizado por Nucci et al. 17 , avaliando o estado nutricional<br />
de 5.564 gestantes usuárias de programa de pré-natal do Sist<strong>em</strong>a<br />
Único de Saúde (SUS), <strong>em</strong> seis capitais brasileiras, entre os anos de<br />
1991 e 1995, identificou 5,7% de baixo peso e 25% de sobrepeso/obesidade,<br />
com uso de índice de massa corporal (IMC) e critério da Organização<br />
Mundial da Saúde (OMS), com IMC menor que 18,5 kg/m 2 como<br />
ponto de corte <strong>para</strong> baixo.<br />
Historicamente, desde o início do século XX, o ganho ponderal foi<br />
relatado como indicador do estado nutricional materno e como possível<br />
preditor do crescimento fetal, <strong>em</strong> virtude de observações de que ganhos<br />
maiores de peso durante a gestação resultavam <strong>em</strong> aumentos na média<br />
de peso ao nascer. A partir desses achados, foram criadas recomendações<br />
acerca do ganho de peso gestacional ideal.<br />
Essas recomendações, ainda voltadas <strong>para</strong> o benefício sobre a saúde<br />
apenas do feto, geraram investigações que descreviam, além das variáveis<br />
fetais (crescimento fetal e peso ao nascer), as variáveis maternas<br />
(peso pré-gestacional, estatura). 2,18 A partir de então, o peso pré-gestacional<br />
foi destacado como um importante parâmetro, estimando-se que,<br />
<strong>para</strong> obter um ótimo crescimento fetal, as gestantes cuja relação do peso<br />
pré-gestacional <strong>para</strong> estatura fosse considerada inadequada necessitariam<br />
de um ganho de peso maior durante a gestação, sustentando a proposta<br />
de aumento de peso diferenciado segundo o estado nutricional<br />
pré-gestacional. 18
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
41<br />
No primeiro trimestre gestacional, o aumento de peso deve-se a alterações<br />
no corpo f<strong>em</strong>inino, que inclu<strong>em</strong> aumento do útero e das mamas,<br />
expansão do volume sanguíneo, líquido amniótico e desenvolvimento da<br />
placenta. No segundo e no terceiro trimestres, o aumento de peso deve-<br />
-se ao acúmulo de reservas nutricionais maternas <strong>para</strong> a lactação e o crescimento<br />
fetal. 18<br />
O baixo peso materno durante a gestação está associado à maior<br />
suscetibilidade a infecções, como as do trato respiratório e urinário,<br />
que pod<strong>em</strong> trazer repercussões desfavoráveis, como an<strong>em</strong>ia e perda de<br />
peso, contribuindo <strong>para</strong> o agravamento de seu estado nutricional. 12 Mulheres<br />
que iniciam a gravidez com baixo peso e/ou apresentam ganho<br />
de peso inadequado têm maior risco de o bebê apresentar retardo de<br />
crescimento intrauterino (RCIU), pr<strong>em</strong>aturidade e baixo peso ao nascer<br />
(BPN). 1<br />
Um dos fatores que têm mais impacto na determinação do peso ao<br />
nascer é o estado nutricional materno pré-gestacional, além do baixo<br />
ganho de peso durante a gravidez. 7,13 No Brasil, de acordo com a Pesquisa<br />
Nacional de D<strong>em</strong>ografia e Saúde de 1996 19 , o BPN ocorreu <strong>em</strong> 10,2%<br />
das crianças, valor s<strong>em</strong>elhante ao da década anterior. 10 O BPN está associado<br />
a diversas condições prejudiciais, e os riscos de mortalidade neonatal<br />
e infantil e de morbidade na infância aumentam à medida que diminui<br />
o peso de nascimento. 7,20<br />
A obesidade durante a gravidez está associada a diabete melito,<br />
pré-eclâmpsia, trabalho de parto pr<strong>em</strong>aturo, h<strong>em</strong>orragias pós-parto,<br />
partos por cesária, infecções, macrossomia fetal, baixos escores de Apgar<br />
e obesidade na infância, indicação de que as consequências são prejudiciais<br />
tanto <strong>para</strong> a mãe como <strong>para</strong> o filho. 1,17,21-24<br />
Allen et al. 25 , <strong>em</strong> estudo que investigou as relações entre a nutrição<br />
e os resultados da gravidez, com dados de gestantes do Egito, México e<br />
Quênia, verificaram que mulheres com IMC pré-gestacional baixo ganhavam<br />
mais peso durante a gestação e perdiam mais peso no período<br />
pós-parto e que o contrário ocorria com as mulheres que apresentavam
42<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
IMC pré-gestacional alto: ganho de peso menor na gestação e perda de<br />
peso menor no pós-parto.<br />
Estudo realizado por School 26 , com o objetivo de examinar a influência<br />
do ganho de peso gestacional na retenção de peso pós-parto e os resultados<br />
da gravidez, verificou que mulheres com ganho de peso excessivo<br />
entre a 20ª e a 30ª s<strong>em</strong>ana de gestação apresentavam maior retenção<br />
de peso pós-parto, que correspondia a cerca de 5 a 7% do peso pré-gestacional<br />
das mulheres.<br />
VIGILÂNCIA NUTRICIONAL DE GESTANTES<br />
A avaliação do estado nutricional e o monitoramento do peso na gestação<br />
são cuidados preconizados pelo Ministério da Saúde 4,27 , por meio<br />
da antropometria. Esse método é recomendado mundialmente, por<br />
ser não invasivo, de baixo custo, exigir pouca tecnologia e ser de fácil<br />
aplicação. 4,7<br />
A avaliação nutricional nesse período diferencia-se pelo fato de dever<br />
refletir não apenas um único indivíduo, mas sim a mulher e, indiretamente,<br />
o crescimento do feto. 7<br />
As medidas antropométricas realizadas no início da gravidez visam<br />
a avaliar o estado nutricional da mulher e predizer como deverá ser<br />
a evolução <strong>para</strong> atender às suas d<strong>em</strong>andas fisiológicas durante a gestação.<br />
As medidas realizadas durante a gestação têm como propósito avaliar<br />
a evolução do ganho de peso e identificar as mulheres que se beneficiariam<br />
com intervenções nutricionais. 7<br />
O Ministério da Saúde 4 preconiza que todas as gestantes dev<strong>em</strong><br />
ter seu estado nutricional avaliado durante a gestação, como parte integrante<br />
da rotina do pré-natal. Nas Unidades Básicas de Saúde e nas Unidades<br />
de Saúde da Família do SUS, a realização e a incorporação da avaliação<br />
nutricional e do monitoramento do ganho de peso das gestantes<br />
na rotina do serviço de atendimento de pré-natal indicam a valorização<br />
do seu estado nutricional como um importante fator que interfere na<br />
saúde da mãe e do bebê. 12,13
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
43<br />
Segundo Engstrom 12 , valorizar o estado nutricional das gestantes<br />
como um dos fatores determinantes de sua saúde e de seu bebê,<br />
b<strong>em</strong> como ter um olhar atento, diferenciado e cuidadoso <strong>para</strong> esses probl<strong>em</strong>as,<br />
observando seu estado nutricional e seu ganho de peso, é ter atitude<br />
de vigilância e promover a vigilância nutricional.<br />
De acordo com a OMS e a Organização Pan-americana de Saúde<br />
(Opas), o Sist<strong>em</strong>a de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan) pode<br />
ser definido como<br />
[...] sist<strong>em</strong>a de coleta, processamento e análise contínuos de dados<br />
de uma população, possibilitando um diagnóstico atualizado da situação<br />
nutricional, suas tendências t<strong>em</strong>porais e, também, dos fatores<br />
de sua determinação. Contribui <strong>para</strong> que se conheçam a natureza<br />
e a magnitude dos probl<strong>em</strong>as de nutrição, caracterizando grupos<br />
sociais de risco e dando subsídios <strong>para</strong> a formulação de políticas, estabelecimento<br />
de programas e intervenções. 28,29<br />
No Brasil, <strong>em</strong> 1990, a Vigilância Nutricional foi regulamentada como<br />
campo de atuação do SUS, por meio da Lei Orgânica n. 8080/90, e reconhecida<br />
como atribuição do sist<strong>em</strong>a de saúde. 30 Além disso, a publicação<br />
da Norma Operacional Básica (NOB/96) 31 e da Norma Operacional<br />
de Assistência à Saúde (Noas/01) 32 reforça a responsabilidade municipal<br />
na execução de um Sisvan.<br />
Em 1999, mais um avanço foi dado pelo Ministério da Saúde, ao<br />
instituir a Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN), com<br />
o propósito de estabelecer diretrizes e responsabilidades de diversos<br />
setores na garantia da segurança alimentar e nutricional. A PNAN<br />
preconiza que o Sisvan deve ser realizado prioritariamente com o<br />
grupo materno-infantil e realizar o mapeamento de end<strong>em</strong>ias carenciais,<br />
compreendendo uma descrição contínua e a predição de tendências,<br />
caracterizando áreas geográficas, segmentos sociais e biológicos<br />
de risco. 27
44<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Dentro do SUS, a Vigilância Nutricional como um sist<strong>em</strong>a contínuo<br />
de coleta, análise e processamento de dados pode colaborar <strong>para</strong><br />
apontar as diferenças do perfil nutricional de uma população de determinada<br />
localidade, a partir de informações obtidas na rotina de atendimento,<br />
com baixo custo e boas condições operacionais, sendo fonte potencial<br />
de informações <strong>para</strong> orientação de condutas individuais, triag<strong>em</strong><br />
<strong>para</strong> programas de intervenção e planejamento de ações coletivas. Pode,<br />
ainda, promover a intersetorialidade na resolução de probl<strong>em</strong>as, apontando<br />
e discutindo com outros setores. 33<br />
HISTÓRICO DOS MÉTODOS DE AVALIAÇÃO<br />
NUTRICIONAL DE GESTANTES<br />
É amplo o debate sobre a escolha de indicadores <strong>para</strong> avaliação nutricional<br />
da gestante. Um estudo multicêntrico realizado <strong>em</strong> 25 grupos de<br />
populações de todo o mundo, <strong>em</strong> colaboração com a OMS, analisou a<br />
antropometria materna e os resultados da gravidez, utilizando dados<br />
de 1959 a 1989, correspondentes a aproximadamente 110.000 mulheres,<br />
cujos dados antropométricos foram repetidos até o final da gravidez.<br />
A OMS 7 , com base nos resultados desse estudo multicêntrico e também<br />
<strong>em</strong> uma revisão de literatura realizada pelo Institute of Medicine<br />
(IOM) e uma publicação da Opas, elaborou recomendações internacionais<br />
sobre a escolha desses indicadores.<br />
O uso de uma combinação de indicadores, como altura materna<br />
e peso durante a gestação, ou IMC pré-gestacional e aumento de peso,<br />
provavelmente proporcionam a alternativa mais eficiente <strong>em</strong> determinadas<br />
situações, como melhor orientar os recursos financeiros, materiais<br />
e humanos. Para os propósitos de vigilância nutricional, um único<br />
indicador seria mais apropriado, <strong>para</strong> facilitar o processo. 7<br />
Atualmente, o IMC, <strong>em</strong>bora não avalie a composição corporal do indivíduo,<br />
t<strong>em</strong> tido sua aplicação fundamentada pela alta correlação que<br />
mantém com a gordura corporal, pelas dificuldades na obtenção de outras<br />
medidas do tecido adiposo, pela facilidade de cálculo, por não necessitar
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
45<br />
de um padrão de referência e por refletir uma estimativa das reservas maternas.<br />
20 Também t<strong>em</strong> tido forte associação com risco de doenças crônicas<br />
não transmissíveis e, por ser o mesmo indicador usado <strong>para</strong> adultos, reduz<br />
a necessidade de capacitação da equipe de saúde <strong>para</strong> uso do método. 34<br />
Várias tentativas têm sido realizadas <strong>para</strong> se encontrar uma solução<br />
científica e operacionalmente satisfatória <strong>para</strong> a avaliação do estado<br />
nutricional da gestante, sendo que nas últimas quatro décadas muitos<br />
esforços têm sido centralizados nos métodos antropométricos como<br />
instrumento de avaliação da condição nutricional da gestante.<br />
Na América Latina, um grupo de especialistas do Instituto de Nutrição<br />
do Centro-América e Panamá (Incap), <strong>em</strong> 1961, elaborou um<br />
modelo gráfico que considerava as diferenças de estatura materna e o<br />
aumento de peso segundo a idade gestacional, d<strong>em</strong>arcando limites inferiores<br />
e superiores de normalidade. Apesar de não considerar o estado<br />
nutricional pré-gestacional e as diferenças que deveriam ser observadas<br />
entre o ganho de peso de mulheres obesas e desnutridas, foi amplamente<br />
utilizado <strong>em</strong> países da América Central. 11<br />
Em 1977, um grupo de pesquisadores <strong>em</strong> São Paulo propôs e testou<br />
uma modificação no modelo gráfico do Incap, utilizando o peso pré-<br />
-gestacional, além do peso durante a gestação, e relacionando-o com o<br />
peso ao nascer do recém-nascido. Verificaram que o peso inicial da gestante<br />
t<strong>em</strong> relação direta com o peso do recém-nascido e que a mulher<br />
deve ser orientada <strong>para</strong> que tenha um ganho adequado de seu peso pré-<br />
-gestacional. 36 Tratava-se, no entanto, de um modelo conceitual definido<br />
por consenso e com pontos de corte estabelecidos por convenção,<br />
s<strong>em</strong> a necessária validação. 11<br />
Rosso 16 propôs uma curva de referência baseada <strong>em</strong> cálculos do<br />
aumento proporcional de peso, supondo que o aumento ponderal total<br />
deveria ser de 20% do peso ideal esperado <strong>para</strong> altura antes da gravidez,<br />
pois esse ganho asseguraria o máximo crescimento do feto. O instrumento<br />
gráfico proposto utilizava o percentual de adequação do peso<br />
esperado <strong>para</strong> altura, conforme a idade gestacional.
46<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Em 1986, Fescina realizou um estudo no Centro Latinoamericano<br />
de Perinatologia (Clap), no Uruguai, sobre aumento de peso durante a<br />
gravidez, com o objetivo de elaborar uma tabela <strong>para</strong> saber <strong>em</strong> qualquer<br />
momento se o peso está adequado <strong>para</strong> a idade gestacional nas mulheres<br />
que desconhec<strong>em</strong> seu peso pré-gestacional. Os resultados mostraram<br />
um aumento de peso linear da 13ª até a 36ª s<strong>em</strong>ana e um aumento<br />
maior no segundo trimestre. O autor concluiu que esse índice é sensível<br />
e adequado <strong>para</strong> todos os níveis de atenção que acompanh<strong>em</strong> populações<br />
de baixo nível cultural, <strong>em</strong> que o desconhecimento de peso pré-<br />
-gestacional é muito significativo.<br />
No Brasil, <strong>em</strong> 1987, o Ministério da Saúde adotou e recomendou a<br />
Curva de Rosso <strong>para</strong> avaliação e monitoramento do estado nutricional<br />
da gestante na rede pública de saúde, <strong>em</strong> caráter preliminar. 11<br />
O IOM, por intermédio da Acad<strong>em</strong>ia Americana de Ciências (AAC),<br />
elaborou um guia <strong>para</strong> impl<strong>em</strong>entação de um método de avaliação do estado<br />
nutricional materno na prática clínica, com instruções <strong>para</strong> situações<br />
nas quais o peso pré-gestacional é conhecido, propondo a classificação<br />
do estado nutricional pré-gestacional <strong>em</strong> categorias do IMC, definidas<br />
pelo grupo de especialistas por meio da conversão do índice de peso ideal<br />
<strong>para</strong> estatura, com base no padrão de referência do Metropolitan Life<br />
Insurance Company. Os pontos de corte <strong>para</strong> desnutrição e obesidade<br />
equival<strong>em</strong> a 90 e 120% da adequação, respectivamente. Também recomenda<br />
o acompanhamento do ganho ponderal materno, <strong>em</strong> função do<br />
estado nutricional prévio ou de ingresso no pré-natal. 1<br />
Atalah et al. 9 , baseando-se nos dados do Sist<strong>em</strong>a Nacional de Serviços<br />
de Salud (SNSS) do Chile, que d<strong>em</strong>onstram ter havido redução da prevalência<br />
de desnutrição <strong>em</strong> gestantes e aumento significativo de obesidade<br />
entre 1987 e 1993, constataram que a prevalência de gestantes desnutridas<br />
contrastava com a baixa proporção de mulheres desnutridas <strong>em</strong> idade fértil<br />
e que a proporção de baixo peso ao nascer, como indicativo indireto do<br />
estado nutricional materno, estava baixa, e sugeriram que o uso do método<br />
de Rosso <strong>para</strong> avaliação nutricional das gestantes no país poderia estar
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
47<br />
contribuindo <strong>para</strong> superestimar a desnutrição nas gestantes e estimular um<br />
aumento de peso maior que o necessário. Como consequência, isso determinaria<br />
maior gasto do setor de saúde com maior número de consultas e<br />
inscrições <strong>em</strong> programas de supl<strong>em</strong>entação alimentar.<br />
Esses mesmos autores, então, realizaram um estudo <strong>para</strong> avaliar a<br />
concordância de diagnóstico nutricional obtido entre a Curva de Rosso,<br />
a tabela do Departamento de Nutrição da Faculdade de Medicina do<br />
Chile e o IMC no início e no fim da gestação. Verificaram que menos<br />
da metade das gestantes consideradas desnutridas pela Curva de Rosso<br />
na primeira consulta do pré-natal era realmente desnutrida segundo o<br />
IMC, e essa discordância se acentuou ainda mais no final da gravidez. 9<br />
Segundo a OMS 7 , o instrumento proposto por Rosso 16 t<strong>em</strong> validade<br />
discutível, <strong>em</strong> razão do ponto de corte que superestima a desnutrição<br />
entre as gestantes e propõe expectativa não realista de ganho de peso<br />
<strong>para</strong> as gestantes desnutridas.<br />
De acordo com Coelho 11 , o uso extensivo da Curva de Rosso no<br />
Brasil mostrou uma discordância <strong>em</strong> termos epid<strong>em</strong>iológicos entre a situação<br />
nutricional de gestantes e o estado nutricional de mulheres <strong>em</strong><br />
idade reprodutiva, avaliadas por IMC, considerando desnutridas de 35 a<br />
45% das gestantes e 6% das mulheres <strong>em</strong> idade fértil.<br />
Atalah et al. 9 propuseram um novo gráfico de avaliação do estado nutricional<br />
da gestante baseando-se no IMC por idade gestacional, considerando<br />
que o ganho de peso deve ser diferenciado de acordo com o estado<br />
nutricional prévio. Estudo <strong>para</strong> validação do instrumento foi realizado <strong>em</strong><br />
uma coorte de gestantes chilenas, com<strong>para</strong>ndo resultados de IMC com medidas<br />
de composição corporal como pregas cutâneas e perímetro br<strong>aqui</strong>al.<br />
No Brasil, até 2000, o Ministério da Saúde preconizava a utilização da<br />
Curva de Rosso. Nesse mesmo ano, houve reformulação no Cartão da Gestante<br />
e incorporou-se ao Manual de Assistência Pré-natal o modelo da curva<br />
de Clap 35 , que avalia aumento de peso durante a gestação de acordo com<br />
a idade gestacional. 12 Isso resultou <strong>em</strong> controvérsias por parte dos estudiosos,<br />
<strong>em</strong> virtude da pequena casuística do método, de fundamentar-se <strong>em</strong>
48<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
relações corporais de mulheres não gestantes de tabelas de dados da década<br />
de 1950 e da necessidade de informação do peso pré-gestacional. 11<br />
Em 2002, o Ministério da Saúde propôs realizar a avaliação nutricional<br />
inicial, por meio de IMC pré-gestacional, utilizando a classificação<br />
e a recomendação do IOM e o gráfico recomendado pelo Clap, <strong>para</strong><br />
acompanhamento do ganho ponderal. Quando o peso pré-gestacional é<br />
desconhecido, deve-se avaliar e acompanhar o ganho de peso s<strong>em</strong>anal,<br />
utilizando de forma compl<strong>em</strong>entar a tabela de peso esperado <strong>para</strong> a altura<br />
segundo idade gestacional confeccionada pelo Ministério da Saúde,<br />
baseada no gráfico de Atalah. 34<br />
Estudo realizado por Cordelini 20 aplicou e avaliou os métodos<br />
propostos por Atalah et al. 34 e pelo IOM 1 , <strong>em</strong> um serviço público de<br />
pré-natal de baixo risco no município de São Paulo, no qual verificou<br />
que a proposta do IOM d<strong>em</strong>onstrou melhor aplicabilidade na prática<br />
clínica, porém na dependência da acurácia do peso pré-gestacional informado<br />
e com complexidade de preenchimento. O método de Atalah<br />
apresentou melhor aplicabilidade na avaliação do estado nutricional<br />
inicial e facilidade no preenchimento, mas pouca confiabilidade no<br />
acompanhamento individual, sendo mais indicado <strong>para</strong> avaliação de<br />
tendências populacionais.<br />
Abrams et al. 37 , <strong>em</strong> razão da frequente controvérsia no meio científico<br />
acerca de recomendações sobre ganho de peso gestacional e crítica<br />
ao critério recomendado pelo IOM, realizaram estudo de revisão sist<strong>em</strong>ática<br />
de literatura sobre resultados maternos e fetais que segue as<br />
recomendações do IOM de ganho de peso <strong>em</strong> mulheres com peso pré-<br />
-gestacional normal. Concluíram que essas recomendações de ganho de<br />
peso do IOM estão associadas aos melhores resultados <strong>para</strong> mãe e filho.<br />
Atualmente, a maioria dos órgãos científicos internacionais recomenda<br />
o uso do critério proposto pelo IOM 38 , utilizando IMC pré-gestacional e<br />
subsequente ganho de peso por categoria de estado nutricional pré-gestacional,<br />
por reconhecer que essas recomendações representam menor risco<br />
de baixo peso ao nascer e de retenção de peso materno pós-parto. 1,7,39,40
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
49<br />
A gerência de Programas de Saúde da Mulher 41 , da Prefeitura Municipal<br />
do Rio de Janeiro, <strong>em</strong> parceria com o Instituto de Nutrição Annes Dias,<br />
após estudo das alternativas de instrumentos <strong>para</strong> avaliação nutricional<br />
de gestantes e consulta a especialistas, optou por adotar o instrumento<br />
e os critérios desenvolvidos e recomendados pelo IOM 1 combinados aos<br />
instrumentos propostos por Atalah et al. 34 Isso traz como vantagens:<br />
• a utilização do mesmo índice antropométrico;<br />
• ambos utilizam IMC na classificação do estado nutricional prévio e/ou<br />
durante a gestação, independent<strong>em</strong>ente da idade gestacional de ingresso<br />
no pré-natal;<br />
• desnecessidade de conhecer o peso pré-gestacional <strong>para</strong> avaliar o estado<br />
nutricional e recomendar o ganho de peso adequado;<br />
• facilidade de uso e utilidade no acompanhamento clínico.<br />
Além disso, segue a recomendação do Ministério da Saúde de combinar<br />
IMC e aumento de peso durante a gestação e se mostra coerente com a<br />
realidade brasileira de ingresso no pré-natal a partir do segundo trimestre,<br />
na maioria das gestantes.<br />
Em junho de 2004, o Ministério da Saúde publicou um documento<br />
de orientações básicas <strong>para</strong> realização do sist<strong>em</strong>a de Vigilância Alimentar<br />
e Nutricional nos serviços de saúde, por meio do qual recomenda<br />
que as gestantes tenham seu estado nutricional inicial avaliado utilizando<br />
o IMC por idade gestacional na primeira consulta de pré-natal, seguindo<br />
o critério de Atalah et al. 34 Então, <strong>em</strong> função do estado nutricional<br />
avaliado, deve ser estimado seu ganho de peso trimestral e total<br />
esperado até o final da gestação, seguindo o critério do IOM. 42<br />
Em 2006, o Ministério da Saúde publicou um novo Manual Técnico<br />
de Pré-Natal e Puerpério 43 , no qual também recomenda a utilização<br />
desse método combinando o de Atalah e o do IOM <strong>para</strong> avaliação nutricional<br />
da gestante e acompanhamento de seu ganho de peso, o que confirma<br />
a coerência do uso dessa metodologia.
50<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
AVALIAÇÃO NUTRICIONAL DA GESTANTE<br />
E GANHO DE PESO GESTACIONAL<br />
A avaliação e o acompanhamento do estado nutricional da gestante e<br />
o ganho de peso durante a gestação têm como objetivos: identificar as<br />
gestantes <strong>em</strong> risco nutricional (baixo peso, sobrepeso ou obesidade) no<br />
início da gestação, detectar as gestantes com ganho de peso insuficiente<br />
ou excessivo <strong>para</strong> a idade gestacional e realizar orientação adequada<br />
<strong>para</strong> cada caso, com atenção <strong>para</strong> promoção do bom estado nutricional<br />
materno, condições <strong>para</strong> o parto e peso do recém-nascido.<br />
Técnica <strong>para</strong> a tomada de medidas de peso e estatura<br />
O peso deve ser aferido <strong>em</strong> todas as consultas de pré-natal. A estatura da gestante<br />
adulta (idade > 19 anos) deve ser aferida apenas na primeira consulta e<br />
a da gestante adolescente pelo menos trimestralmente. Recomenda-se a utilização<br />
da balança eletrônica ou mecânica, certificando-se se está <strong>em</strong> bom<br />
funcionamento e calibrada. O cuidado com as técnicas de medição e a aferição<br />
regular dos equipamentos garant<strong>em</strong> a qualidade das medidas coletadas.<br />
Os procedimentos <strong>para</strong> a tomada de peso e estatura estão descritos<br />
na publicação Vigilância Alimentar e Nutricional – Sisvan: orientações<br />
básicas <strong>para</strong> a coleta, processamento, análise de dados e informação <strong>em</strong><br />
serviços de saúde do Ministério da Saúde. 46<br />
Orientações <strong>para</strong> o diagnóstico e o acompanhamento<br />
do estado nutricional da gestante<br />
As orientações <strong>para</strong> o diagnóstico e o acompanhamento do estado nutricional<br />
da gestante estão descritas detalhadamente na publicação Vigilância<br />
Alimentar e Nutricional – Sisvan: orientações básicas <strong>para</strong> a coleta,<br />
processamento, análise de dados e informação <strong>em</strong> serviços de saúde,<br />
disponível no site: www.saude.gov.br.<br />
O Ministério da Saúde recomenda a utilização de dois instrumentos:<br />
o critério de classificação do estado nutricional inicial e ganho de<br />
peso conforme IOM e a Curva de Atalah, descritos a seguir.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
51<br />
Classificação do estado nutricional<br />
O IOM propôs uma avaliação do estado nutricional materno e uma recomendação<br />
de ganho de peso gestacional, na qual as faixas de ganho de peso<br />
indicadas são diferenciadas conforme o IMC pré-gestacional (Tabela 1).<br />
TABELA 1 Ganho de peso recomendado durante a gestação, segundo o estado<br />
nutricional inicial<br />
ESTADO<br />
GANHO DE PESO<br />
GANHO DE PESO (KG)<br />
GANHO DE PESO<br />
NUTRICIONAL<br />
(KG) TOTAL NO<br />
SEMANAL MÉDIO NO<br />
(KG) TOTAL NA<br />
INICIAL (IMC)<br />
1º TRIMESTRE<br />
2º E NO 3º TRIMESTRE<br />
GESTAÇÃO<br />
Baixo peso (BP) 2,3 0,5 12,5 a 18<br />
Adequado (A) 1,6 0,4 11,5 a 16<br />
Sobrepeso (S) 0,9 0,3 7 a 11,5<br />
Obesidade (O) – 0,3 7<br />
Fonte: IOM. 38<br />
Procedimentos <strong>para</strong> classificar o estado nutricional da gestante, segundo<br />
o IOM:<br />
• inicialmente, calcular e interpretar o IMC pré-gestacional;<br />
• calcular o ganho de peso gestacional até a data da consulta e avaliar a adequação,<br />
segundo a faixa de ganho de peso recomendada e a idade gestacional,<br />
<strong>para</strong> as categorias do IMC pré-gestacional;<br />
• estabelecer o ganho de peso s<strong>em</strong>anal e total recomendado até o final da<br />
gestação, segundo a idade gestacional.<br />
Curva de Atalah<br />
Segundo o Ministério da Saúde, a avaliação continuada permite com<strong>para</strong>r<br />
a evolução do ganho de peso durante a gestação de forma a verificar se
52<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
esse ganho está adequado <strong>em</strong> função do estado nutricional da gestante no<br />
início do pré-natal. Para tanto, recomenda-se o uso da Curva de Atalah et<br />
al. 34 , na qual se acompanha a curva de IMC, segundo a s<strong>em</strong>ana gestacional<br />
(ascendente, horizontal, descendente) (Figura 1).<br />
FIGURA 1 Gráfico de acompanhamento nutricional da gestante.<br />
IMC conforme a s<strong>em</strong>ana de gestação<br />
40<br />
40<br />
39,5<br />
39<br />
39,5<br />
39<br />
38,5<br />
38,5<br />
38<br />
38<br />
37,5<br />
37,5<br />
37<br />
37<br />
36,5<br />
O 36,5<br />
36<br />
35,5<br />
35<br />
34,5<br />
34<br />
33,5<br />
33<br />
32,5<br />
36<br />
35,5<br />
35<br />
34,5<br />
34<br />
33,5<br />
33<br />
32,5<br />
32<br />
32<br />
31,5<br />
31,5<br />
31<br />
31<br />
30,5<br />
S 30,5<br />
30<br />
29,5<br />
29<br />
30<br />
29,5<br />
29<br />
28,5<br />
28,5<br />
28<br />
28<br />
27,5<br />
27,5<br />
27<br />
27<br />
26,5<br />
A 26,5<br />
26<br />
25,5<br />
25<br />
24,5<br />
24<br />
23,5<br />
23<br />
26<br />
25,5<br />
25<br />
24,5<br />
24<br />
23,5<br />
23<br />
22,5<br />
22,5<br />
22<br />
22<br />
21,5<br />
21,5<br />
21<br />
21<br />
20,5<br />
BP 20,5<br />
20<br />
19,5<br />
19<br />
18,5<br />
18<br />
17,5<br />
20<br />
19,5<br />
19<br />
18,5<br />
18<br />
17,5<br />
17<br />
17<br />
6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 32 34 36 38 40<br />
S<strong>em</strong>ana de gestação<br />
BP Baixo peso<br />
A<br />
Adequado<br />
S<br />
Sobrepeso<br />
O<br />
Obesidade<br />
Fonte: Atalah et al. 34 e Ministério da Saúde. 42
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
53<br />
Deve-se realizar o acompanhamento do estado nutricional utilizando<br />
o gráfico da Figura 1 de IMC por s<strong>em</strong>ana gestacional, que é composto<br />
por um eixo horizontal com os valores de s<strong>em</strong>ana gestacional e<br />
um eixo vertical com os valores de IMC [peso(kg)/altura 2 (m)]. O gráfico<br />
apresenta o desenho de três curvas, que delimitam as quatro faixas <strong>para</strong><br />
classificação do estado nutricional: baixo peso (BP), adequado (A), sobrepeso<br />
(S) e obesidade (O).<br />
CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />
Neste capítulo, discutiu-se a importância do estado nutricional durante<br />
a gravidez considerando a saúde da gestante e da criança, a necessidade<br />
de realizar a vigilância do estado nutricional durante a gestação e a evolução<br />
dos critérios <strong>para</strong> o diagnóstico do estado nutricional da gestante.<br />
A avaliação do estado nutricional da gestante fornece informações<br />
importantes <strong>para</strong> a prevenção e o controle de agravos à saúde e à nutrição,<br />
sendo, portando, imprescindível na assistência pré-natal.<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
1. Suitor CW. Perspectives on Nutrition during Pregnancy. Part I – Weight Gain.<br />
Part II – Nutrient Suppl<strong>em</strong>ents. J Am Diet Assoc 1991; 91(1):96-8.<br />
2. Worthington-Roberts BS. Nutrição durante a gravidez e lactação. In: Mahan<br />
LK, Arlin MT. Alimentos, nutrição e dietoterapia. São Paulo: 1994.<br />
3. Ribeiro LC, Devincenzi MU, Garcia JN, Sigul<strong>em</strong> DM. Nutrição e alimentação<br />
na gestação. Rev Compacta Nutr 2002; 3(2):7-22.<br />
4. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Área Técnica de Saúde da<br />
Mulher. Atendimento Pré-Natal – Manual Técnico: Ministério da Saúde, Brasília<br />
2000a.<br />
5. Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia. Assistência<br />
Pré-Natal – Manual de Orientação. Rio de Janeiro, 2001a.<br />
6. Costa JSD, Victora CG, Barros FC, Halpern R, Horta BL, Manzolli P. Assistência<br />
médica materno-infantil <strong>em</strong> duas coortes de base populacional no Sul do<br />
Brasil: tendências e diferenciais. Cad Saude Publ 1996; 12(Suppl. 1):59-66.
54<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
7. Organización Mundial de la Salud. El estado físico: uso y interpretación de la<br />
anthropometría. Informe de Expertos de la OMS. Genebra: OMS, 1995.<br />
8. Siqueira AAF. Avaliação de um conjunto de curvas de ganho de peso de gestantes<br />
no diagnóstico da desnutrição materna e fetal. Rev Paul Pediatr 1983;<br />
1(4):13-20.<br />
9. Atalah ES, Castillo CL, Gomez CL, Mateluna AA, Urteaga CR, Castro RS et al.<br />
Malnutrición de la <strong>em</strong>barazada: um probl<strong>em</strong>a sobrestimado? Rev Med Chile<br />
1995; 123:1531-8.<br />
10. Sarni RS, Schoeps D, Kochi C, Mathias CV, Oliveira CRP, Vuono IM et al. Avaliação<br />
da condição nutricional das gestantes no município de Santo André, utilizando<br />
o gráfico de Rosso. Rev Bras Cresc Desenv Hum 1999; 9(1):1-8.<br />
11. Coelho KS, Souza AI, Batista Filho M. Avaliação antropométrica da gestante: visão<br />
retrospectiva e prospectiva. Rev Bras Saude Matern Infant 2002; 2(1):57-61.<br />
12. Engstrom EM (org.). SISVAN: instrumento <strong>para</strong> o combate aos distúrbios nutricionais<br />
<strong>em</strong> serviços de saúde: o diagnóstico nutricional. 2.ed. Rio de Janeiro:<br />
Fiocruz, 2002a.<br />
13. Castro IRR. Vigilância Alimentar e Nutricional: limitações e interfaces com a<br />
rede de saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1995.<br />
14. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de Orçamentos Familiares<br />
2002- 2003 – Análise da disponibilidade domiciliar de alimentos e do estado<br />
nutricional no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE, 2004.<br />
15. Pereira RT. Avaliação da condição nutricional das gestantes do Estado de São<br />
Paulo, por antropometria, utilizando o gráfico de Rosso. [Dissertação de Mestrado].<br />
São Paulo: EPM-<strong>Unifesp</strong>, 1993.<br />
16. Rosso P. A new chart to monitor weight gain during pregnancy. Am J Clin Nutr<br />
1985; 41:644-52.<br />
17. Nucci LB, Schmidt MI, Duncan BB, Fuchs SC, Fleck ET, Britto MMS. Nutritional<br />
status of pregnant women: prevalence and associated pregnancy outcomes.<br />
Rev Saude Publ 2001b; 35(6):502-7.<br />
18. Worthington-Roberts BS, Williams SR. Nutrição na gestação e lactação. Rio de<br />
Janeiro: Guanabara-Koogan, 1980.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
55<br />
19. Sociedade Civil B<strong>em</strong>-estar Familiar no Brasil. Pesquisa Nacional sobre D<strong>em</strong>ografia<br />
e Saúde. Rio de Janeiro: B<strong>em</strong>fam/Macro International, 1997.<br />
20. Cordelini S. Índices antropométricos durante a gestação: um estudo de aplicabilidade.<br />
[Dissertação de Mestrado]. São Paulo: Universidade de São Paulo,<br />
2002.<br />
21. Hodgson MI, Tilton Z, Donoso E, Arteaga A, Rosso P. Obesidad y riesgo obstetrico<br />
<strong>em</strong> uma población chilena. Rev Chil Nutr 1986; 14 (3):200-5.<br />
22. American College of Obstetricians and Gynecologists. Nutrition during pregnancy.<br />
Technical Bulletin Number 179. Int J Gynecol Obstet 1993; 43:67-74.<br />
23. Robinovich JT, Rubio EL, Sáez JC, Ramirez MI. Influencia del peso corporal <strong>em</strong><br />
el <strong>em</strong>barazo y resultado perinatal. Rev Chil Obstet Ginecol 1995; 60(3):151-67.<br />
24. American Dietetic Association. Position of the American Dietetic Association:<br />
nutrition and lifestyle for a healthy pregnancy outcome. J Am Diet Assoc 2002;<br />
102(10):1479-90.<br />
25. Allen LH, Lungaho MS, Shaheen M, Harrison GG, Neumann C, Kirksey A. Maternal<br />
body mass index and pregnancy outcome in the Nutrition Collaborative<br />
Research Support Program. Eur J Clin Nut 1994; 48(Suppl. 3):68-77.<br />
26. School TO, Hediger ML, Schall JI, Ances AG, Smith WK. Gestational weight<br />
gain, pregnancy outcome, and postpartum weight retention. Obst Gynecol<br />
1995; 86(3):423-7.<br />
27. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Política Nacional de Alimentação<br />
e Nutrição. Brasília: Departamento de Formulação de Políticas de<br />
Saúde, 2000b.<br />
28. Escola Nacional de Saúde Pública. Programa de Apoio à Reforma Sanitária. O<br />
sist<strong>em</strong>a de vigilância alimentar e nutricional na rede de saúde. Manual <strong>para</strong> implantação.<br />
Rio de Janeiro: ENSP, 1983.<br />
29. Silva VC. Vigilância nutricional de gestantes: análise de um modelo <strong>em</strong> serviço<br />
de atenção primária à saúde. [Dissertação de Mestrado]. Rio de Janeiro: ENSP/<br />
Fiocruz, 1994.<br />
30. Brasil. Lei Orgânica da Saúde n. 8080, de 19 de set<strong>em</strong>bro de 1990. Dispõe sobre<br />
as condições <strong>para</strong> promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e
56<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Brasília,<br />
19 de set<strong>em</strong>bro de 1990.<br />
31. Brasil. Norma Operacional Básica do Sist<strong>em</strong>a Único de Saúde (SUS), de 6 de<br />
nov<strong>em</strong>bro de 1996. Dispõe sobre a redefinição das responsabilidades dos Estados,<br />
do Distrito Federal e da União, e dos municípios. Diário Oficial. Brasília, 6<br />
de nov<strong>em</strong>bro de 1996.<br />
32. Brasil. Norma Operacional de Assistência à Saúde do Sist<strong>em</strong>a Único de Saúde<br />
(SUS), de 26 de janeiro de 2001. Dispõe sobre a ampliação das responsabilidades<br />
dos municípios na atenção Básica, definição do processo de regionalização,<br />
atualização dos critérios de habilitação de estados e municípios. Diário Oficial,<br />
Brasília, 26 de janeiro de 2001. n. 95.<br />
33. Engstrom EM (org.). SISVAN: instrumento <strong>para</strong> o combate aos distúrbios nutricionais<br />
<strong>em</strong> serviços de saúde: o diagnóstico coletivo. 2.ed. Rio de Janeiro:<br />
Fiocruz, 2002b.<br />
34. Atalah ES, Castillo CL, Castro RS, Aldea AP. Propuesta de un nuevo estándar<br />
de evaluación nutricional en <strong>em</strong>barazadas. Rev Med Chile 1997; 125:429-36.<br />
35. Fescina RH. Peso materno <strong>em</strong> la gestación: criterios <strong>para</strong> su evaluación cuando<br />
se desconece el peso habitual pregravidico. Rev Latin Perinat 1986; 6:64-70.<br />
36. Siqueira AAF, et al. Aplicação de uma curva de ganho de peso <strong>para</strong> gestantes.<br />
Rev Saude Publ 1977; 11:288-93.<br />
37. Abrams B, Altman SL, Pickett KE. Pregnancy weight gain: still controversial.<br />
Am J Clin Nutr 2000; 71(Suppl.):1233S-41S.<br />
38. National Acad<strong>em</strong>y of Sciences. Institute of Medicine. Committee on Nutritional<br />
Status During Pregnancy and Lactation Food and Nutrition Board. Subcommittee<br />
on Dietary Intake and Nutrient Suppl<strong>em</strong>ents during Pregnancy.<br />
Subcommittee on Nutritional Status and Weight Gain During Pregnancy. Nutrition<br />
during Pregnancy. Part I: Weight Gain. Part II: Nutrient Suppl<strong>em</strong>ents.<br />
National Acad<strong>em</strong>y Press: Washington DC, 1990.<br />
39. American College of Obstetricians and Gynecologists. Nutrition during pregnancy.<br />
Technical Bulletin Number 179. Int Gynecol Obstet 1993; 43:67-74.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
57<br />
40. American Dietetic Association. Position of the American Dietetic Association:<br />
nutrition and lifestyle for a healthy pregnancy outcome. J Am Diet Assoc 2002;<br />
102 (10): 1479 -90.<br />
41. Gerência de Programas de Saúde da Mulher. Diagnóstico e acompanhamento<br />
nutricional de gestantes: novos instrumentos <strong>para</strong> a rotina do pré-natal. Rio de<br />
Janeiro: Coordenação de Atendimento Integral à Saúde, 2002.<br />
42. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Coordenação Geral da Política<br />
Nacional de Alimentação e Nutrição. Orientações básicas <strong>para</strong> a coleta,<br />
processamento, análise de dados e informações <strong>em</strong> serviços de saúde <strong>para</strong> o Sist<strong>em</strong>a<br />
de Vigilância Alimentar e Nutricional. Brasília, Ministério da Saúde, 2004.<br />
43. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de<br />
Ações Programáticas Estratégicas. Área de Saúde da Mulher. Pré-natal e puerpério:<br />
atenção qualificada e humanizada. Manual Técnico. Brasília: Ministério<br />
da Saúde, 2005.<br />
44. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Pré-Natal e Puerpério:<br />
Atenção Qualificada e Humanizada – Manual Técnico. Brasília: Departamento<br />
de Ações Programáticas Estratégicas, 2005.<br />
45. Nucci LB, Duncan BB, Mengue SS, Branchtein L, Schmidt MI, Fleck ET. Assessment<br />
of weight gain during pregnancy in general prenatal care services in<br />
Brazil. Cad Saude Publ 2001a; 17(6):1367-74.<br />
46. Brasil. Ministério da Saúde. Vigilância alimentar e nutricional – Sisvan: orientações<br />
básicas <strong>para</strong> a coleta, processamento, análise de dados e informação <strong>em</strong><br />
serviços de saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2004.
AVALIAÇÃO DO ESTADO NUTRICIONAL<br />
DE IDOSOS: ANTROPOMETRIA<br />
Sandra Maria Lima Ribeiro<br />
Camila Maria de Melo<br />
INTRODUÇÃO<br />
Dados recentes do censo populacional brasileiro 1 apontam, no decorrer<br />
dos anos, um aumento da esperança de vida ao nascer, assim como<br />
do número de indivíduos idosos. Esses dados indicam claramente o envelhecimento<br />
da população, similar ao que t<strong>em</strong> ocorrido nas d<strong>em</strong>ais regiões<br />
do mundo, e despertam a necessidade de se compreender o envelhecimento<br />
sob suas diferentes dimensões. 2 O termo “envelhecimento”<br />
envolve modificações físicas, fisiológicas, metabólicas e psicológicas. É<br />
um processo que ocorre lenta e gradualmente e que varia muito de um<br />
indivíduo <strong>para</strong> outro. 3<br />
Com o envelhecimento, várias funções fisiológicas e metabólicas<br />
são alteradas e acabam por refletir no estado nutricional do indivíduo e,<br />
portanto, <strong>em</strong> sua saúde como um todo. De forma geral, pod<strong>em</strong> ocorrer<br />
alterações na composição corporal, no metabolismo ósseo, na fisiologia<br />
bucal, nos órgãos dos sentidos, nas concentrações de nutrientes no plasma<br />
e nos tecidos, na secreção de enzimas e hormônios, entre outros. 3-6
60<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Com o passar dos anos, ocorre, nas mucosas do tubo digestivo,<br />
uma diminuição dos movimentos de contração e motilidade, causando,<br />
consequent<strong>em</strong>ente, constipação e prejuízos à absorção intestinal. Ocorre,<br />
ainda, redução das secreções gástricas (hipocloridria), o que pode<br />
colaborar com infecções bacterianas da mucosa, comprometendo os<br />
processos digestivos, especialmente de vitamina B 12<br />
, tiamina e ferro. A<br />
perda dentária e as doenças da gengiva são também comuns, e as cáries<br />
não tratadas pod<strong>em</strong> resultar <strong>em</strong> periodontites. N<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre se consegue<br />
que a utilização de próteses dentárias seja um processo eficiente e,<br />
frequent<strong>em</strong>ente, o indivíduo passa a limitar o consumo de determinados<br />
alimentos. 7,8 Fatores psicológicos, como depressão por perda de entes<br />
queridos ou a institucionalização, pod<strong>em</strong> estar relacionados com a<br />
ingestão de alimentos e, consequent<strong>em</strong>ente, com o estado nutricional.<br />
Todos esses fatores relacionados apontam a necessidade de um<br />
constante monitoramento das condições de saúde do idoso. Para tanto,<br />
e pensando principalmente na prática clínica, a adoção de indicadores,<br />
métodos e técnicas apropriados é de fundamental importância.<br />
Como indicador do estado de saúde, pode-se citar a massa corporal.<br />
Além disso, a análise da composição da massa corporal reflete de forma<br />
importante a maior parte das alterações fisiológicas e metabólicas decorrentes<br />
do processo de envelhecimento. A medida das dimensões corporais,<br />
antropometria, permite o monitoramento do metabolismo de energia<br />
e macronutrientes, apontando, assim, estratégias de intervenção.<br />
Dessa forma, este capítulo pretende apontar as principais alterações<br />
na composição corporal, b<strong>em</strong> como as formas mais apropriadas<br />
<strong>para</strong> avaliação.<br />
MODIFICAÇÕES NA MASSA, NA ESTRUTURA E NA<br />
COMPOSIÇÃO CORPORAL<br />
Todas as modificações metabólicas do envelhecimento resultam, de forma<br />
geral, <strong>em</strong> alterações da massa corporal. Um estudo conduzido junto<br />
à população italiana, o Italian Longitudinal Study on Aging (ILSI),
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
61<br />
apontou que, por volta dos 60 anos de idade, se inicia um processo de<br />
ganho de massa corporal que se inverte com o passar do t<strong>em</strong>po, ou seja,<br />
há uma tendência à diminuição, especialmente a partir de 75 anos. 9 O<br />
Projeto Saúde e B<strong>em</strong>-estar do Idoso (Sabe), estudo multicêntrico realizado<br />
na América Latina, incluindo o Brasil, mostra dados similares ao<br />
estudo italiano, com diminuição <strong>em</strong> variáveis antropométricas nas idades<br />
avançadas. 10,11 São, portanto, dois momentos distintos e que dev<strong>em</strong><br />
ser monitorados. A medida da massa corporal, com a utilização de balanças,<br />
é simples e útil no monitoramento dessas mudanças. Além disso,<br />
no processo de investigação do estado nutricional, é importante questionar<br />
o histórico de peso <strong>para</strong> avaliar perda ou ganho significativo recente.<br />
Ao se avaliar a massa corporal do idoso, deve-se também levar <strong>em</strong><br />
consideração que ele, muitas vezes, se encontra impossibilitado de se<br />
locomover, como é o caso de idosos internados ou institucionalizados.<br />
Balanças adaptadas ao leito ou plataformas de balanças adaptadas à cadeira<br />
de rodas são boas opções, porém bastante caras. Por isso, foram<br />
desenvolvidas fórmulas preditivas <strong>para</strong> essas situações. As fórmulas<br />
propostas por Chumlea et al. 12 são citadas pela Organização Mundial da<br />
Saúde (OMS) 13 e apresentadas na Tabela 1.<br />
TABELA 1 Equações preditivas da estatura e do peso corporal de idosos ou<br />
indivíduos s<strong>em</strong> possibilidade de ser<strong>em</strong> medidos <strong>em</strong> pé<br />
FÓRMULAS PREDITIVAS DA ESTATURA<br />
Sexo Raça Equação (altura = ) R2 Erro-padrão<br />
HOMENS<br />
Não hispânicos<br />
78,31 + (1,94 × altura do joelho) –<br />
0,69 3,74<br />
brancos<br />
(0,14 × idade)<br />
Não hispânicos<br />
79,69 + (1,85 × altura do joelho) –<br />
0,7 3,81<br />
afrodescendentes<br />
(0,14 × idade)<br />
México-americanos 82,77 + (1,83 × altura do joelho) –<br />
0,66 3,69<br />
(0,16 × idade)<br />
(continua)
62<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
(continuação)<br />
MULHERES<br />
Não hispânicas<br />
82,21 + (1,85 × altura do joelho) –<br />
0,64 3,98<br />
brancas<br />
(0,21 × idade)<br />
Não hispânicas<br />
89,58 + (1,61 × altura do joelho) –<br />
0,63 3,83<br />
afrodescendentes<br />
(0,17 × idade)<br />
México-americanas 84,25 + (1,82 × altura do joelho) –<br />
0,65 3,78<br />
(0,26 × idade)<br />
FÓRMULAS PREDITIVAS DO PESO CORPORAL<br />
HOMENS (0,98 × CP) + (1,16 × altura do joelho) + (1,73 × CMB) + (0,37 × DCSE) – 81,69<br />
MULHERES (1,27 × CP) + (0,87 × altura do joelho) + (0,98 × CMB) + (0,4 × DCSE) – 62,35<br />
CP: circunferência da panturrilha; CMB: circunferência muscular do braço; DCSE: dobra cutânea subescapular.<br />
Fonte: Chumlea et al., 1998. 12<br />
Investigando especificamente quais componentes da massa corporal<br />
são alterados, é comum se observar uma redução da massa corporal<br />
magra, a qual é constituída pelas massas musculares esquelética e lisa,<br />
pela massa óssea e também pela água corporal. A perda acelerada de<br />
massa muscular pode, <strong>em</strong> alguns casos, resultar <strong>em</strong> alteração na estrutura<br />
e na composição do músculo esquelético, com infiltração de gordura<br />
e tecido conectivo na massa muscular, o que é denominado sarcopenia.<br />
Essa redução pode ser decorrente de fatores como sedentarismo,<br />
alteração na síntese e secreção de hormônios, má alimentação, estresse<br />
oxidativo, aumento da atividade de citocinas, entre outros. 14,15<br />
A sarcopenia pode resultar <strong>em</strong> diminuição da autonomia, maior risco<br />
de quedas com sequelas e, portanto, menor qualidade de vida. Cabe<br />
destacar que, <strong>em</strong>bora a perda de massa muscular seja um processo normal<br />
do envelhecimento, a sarcopenia deve ser evitada. 16,17 A sarcopenia<br />
consiste, de certa forma, na substituição de massa proteica por gordura
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
63<br />
no músculo; por isso, esse processo pode ser ocultado <strong>em</strong> medidas antropométricas<br />
simples. Apenas diagnósticos por imag<strong>em</strong>, como ressonância<br />
magnética (RM), tomografia computadorizada (TC) ou mesmo<br />
o Dexa (dual-energy X-ray absorptiometry) são capazes de detectar com<br />
precisão a perda e as alterações estruturais na massa magra.<br />
O estabelecimento de medidas antropométricas <strong>para</strong> avaliação do<br />
estado muscular <strong>em</strong> idosos t<strong>em</strong> sido objeto de diferentes estudos. Várias<br />
publicações buscaram estabelecer referências de medidas antropométricas<br />
<strong>para</strong> idosos. Burr e Phillips 18 avaliaram, <strong>em</strong> três áreas do País<br />
de Gales, indivíduos a partir de 75 até mais de 80 anos de idade, incluindo<br />
na amostra indivíduos hospitalizados. Para determinação do estado<br />
nutricional proteico por indicadores antropométricos, os autores optaram<br />
pelas medidas de circunferência muscular do braço e área muscular<br />
do braço. Embora bastante criticado tanto pelo tamanho total da amostra<br />
como pela inclusão de idosos não saudáveis, o estudo foi por muito<br />
t<strong>em</strong>po adotado como referência <strong>para</strong> avaliação de idosos. Outros estudos<br />
buscaram uma referência <strong>para</strong> idosos, principalmente nos Estados<br />
Unidos, mas nenhum era isento de limitações como tamanho da amostra,<br />
etnicidade, representatividade nacional, entre outros. 19-22<br />
Mais recent<strong>em</strong>ente, a partir de dados do National Health and Nutrition<br />
Examination Surveys III (NHANES III), foram avaliados 5.700<br />
indivíduos acima de 60 anos de idade. 23 As Tabelas 2 e 3 apresentam os<br />
dados de índice de massa corporal (IMC), circunferência do braço, dobra<br />
cutânea tricipital e circunferência muscular do braço a partir desse<br />
estudo. Cabe l<strong>em</strong>brar, ainda, que o comitê de especialistas da OMS recomenda<br />
que, <strong>em</strong> países onde não existam estudos locais, os dados do<br />
NHANES III sejam utilizados. 24
64<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
TABELA 2<br />
ou mais<br />
Avaliação da NHANES III (1988-1994) <strong>em</strong> homens de 60 anos de idade<br />
GRUPO<br />
ETÁRIO<br />
IMC<br />
N MÉDIA ±<br />
DP<br />
PERCENTIS SELECIONADOS<br />
P10 P15 P25 P50 P75 P85 P90<br />
60 a 69 1.175 27,3 ± 0,18 21,9 23,1 24,4 27,1 30,0 31,7 32,8<br />
70 a 79 875 26,7 ± 0,21 21,5 22,3 23,8 26,1 29,3 30,7 31,7<br />
> 80 699 25,0 ± 0,22 19,8 21,1 22,4 25,0 27,1 28,7 29,5<br />
CB<br />
60 a 69 1.126 32,8 ± 0,15 28,4 29,2 30,6 32,7 35,2 36,2 37,0<br />
70 a 79 832 31,5 ± 0,17 27,5 28,2 29,3 31,3 33,4 35,1 36,1<br />
> 80 642 29,05 ± 0,19 25,5 26,2 27,3 29,5 31,5 32,6 33,3<br />
DCT<br />
60 a 69 1.122 14,2 ± 0,25 7,7 8,5 10,1 12,7 17,1 20,2 23,1<br />
70 a 79 825 13,4 ± 0,28 7,3 7,9 9,0 12,4 16,0 18,8 20,6<br />
> 80 641 12,0 ± 0,28 6,6 7,6 8,7 11,2 13,8 16,2 18,0<br />
CMB<br />
60 a 69 1.119 28,3 ± 0,13 24,9 25,6 26,7 28,4 30,0 30,9 31,4<br />
70 a 79 824 27,3 ± 0,14 24,4 24,8 25,6 27,2 28,9 30 30,5<br />
> 80 639 25,7 ± 0,16 22,6 23,2 24,0 25,7 27,5 28,2 28,8<br />
IMC: índice de massa corporal; CB: circunferência do braço; DCT: dobra cutânea tricipital; CMB: circunferência<br />
muscular do braço; DP: desvio padrão.<br />
Fonte: adaptada de Kuczmarski et al., 2000. 23
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
65<br />
TABELA 3 Avaliação do NHANES III (1988-1994) <strong>em</strong> mulheres de 60 anos de<br />
idade ou mais<br />
GRUPO<br />
ETÁRIO<br />
N MÉDIA ± DP PERCENTIS SELECIONADOS<br />
P10 P15 P25 P50 P75 P85 P90<br />
IMC<br />
60 a 69 1.172 27,6 ± 0,27 20,9 21,8 23,5 26,6 30,8 33,6 35,7<br />
70 a 79 985 26,9 ± 0,28 20,7 21,4 22,6 25,9 29,9 32,1 34,5<br />
> 80 788 25,2 ± 0,26 19,3 20,3 21,7 25,0 28,4 30,0 31,4<br />
CB<br />
60 a 69 1.122 31,7 ± 0,21 26,2 26,9 28,3 31,2 34,3 36,5 38,3<br />
70 a 79 914 30,5 ± 0,23 25,4 26,1 27,4 30,1 33,1 35,1 36,7<br />
> 80 712 28,5 ± 0,25 23,0 23,8 25,5 28,4 31,5 33,2 34,0<br />
DCT<br />
60 a 69 1.090 24,2 ± 0,37 14,5 15,9 18,2 24,1 29,7 32,9 34,9<br />
70 a 79 902 22,3 ± 0,39 12,5 14 16,4 21,8 27,7 30,6 32,1<br />
> 80 705 18,6 ± 0,42 9,3 11,1 13,1 18,1 23,3 26,4 28,9<br />
CMB<br />
60 a 69 1.090 23,8 ± 0,12 20,6 21,1 21,9 23,5 25,4 26,6 27,4<br />
70 a 79 898 23,4 ± 0,14 20,3 20,8 21,6 23,0 24,8 26,3 27,0<br />
> 80 703 22,7 ± 0,16 19,3 20,0 20,9 22,6 24,5 25,4 26,0<br />
IMC: índice de massa corporal; CB: circunferência do braço; DCT: dobra cutânea tricipital; CMB: circunferência<br />
muscular do braço; DP: desvio padrão.<br />
Fonte: adaptada de Kuczmarski et al., 2000. 23<br />
Considerando-se que a perda de massa muscular se concentra principalmente<br />
<strong>em</strong> m<strong>em</strong>bros inferiores, t<strong>em</strong> havido uma tendência <strong>em</strong> apontar<br />
a circunferência da panturrilha como uma medida antropométrica<br />
sensível da massa muscular. 13 Nesse contexto, Rolland et al. 25 , <strong>em</strong> estudo<br />
realizado na França, com<strong>para</strong>ram as medidas da circunferência da panturrilha<br />
com um diagnóstico por imag<strong>em</strong> (Dexa) <strong>em</strong> 1.458 indivíduos saudáveis<br />
acima de 70 anos de idade, s<strong>em</strong> histórico de fraturas. Os autores
66<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
concluíram que a circunferência da panturrilha, <strong>em</strong>bora não possa ser<br />
usada como diagnóstico da sarcopenia, fornece informações importantes<br />
sobre incapacidades relativas à musculatura e à função física. Esses<br />
mesmos autores apontaram que uma medida de circunferência da panturrilha<br />
menor que 31 cm pode ser relacionada à perda de capacidades.<br />
Em relação à técnica <strong>para</strong> tomada dessa medida, os procedimentos<br />
descritos a seguir costumam ser adotados. Uma proposta é que o avaliado<br />
permaneça sentado <strong>em</strong> uma mesa ou cadeira ou <strong>em</strong> pé, com os pés<br />
se<strong>para</strong>dos cerca de 20 cm um do outro. Ao permanecer sentado <strong>em</strong> uma<br />
cadeira, sua perna direita deve permanecer fixa ao chão, com as pernas<br />
flexionadas <strong>em</strong> 90º. 24 Lohman 26 propõe que a medida seja feita com a<br />
perna solta, não apoiada no solo. Em idosos que não pod<strong>em</strong> se manter<br />
<strong>em</strong> pé ou sentados, a medida deve ser realizada levando-se a perna a uma<br />
flexão de 90º. 27 Em todos os diferentes procedimentos, a medida da circunferência<br />
deve ser tomada na região de maior diâmetro na panturrilha.<br />
Outros autores vêm propondo, como relação importante na análise<br />
da massa corporal magra <strong>em</strong> idosos, o índice de massa magra corporal<br />
(IMMC), que consiste na relação massa magra corporal/estatura. 2 Obisesan<br />
et al. 28 argumentam que, <strong>para</strong> definir sarcopenia, há necessidade de<br />
se discutir a massa magra relativa ao peso corporal, uma vez que a massa<br />
magra absoluta é relacionada à estatura do indivíduo. Uma questão prática<br />
relativa a esse índice é qual seria a melhor maneira de estimar ou medir<br />
a massa magra. Medidas antropométricas possu<strong>em</strong> limitações, porém<br />
métodos mais sofisticados tornam a determinação cara e, portanto, às vezes<br />
inviável.<br />
Da mesma forma que a massa magra, a gordura corporal também<br />
tende a sofrer modificações importantes com o envelhecimento. Além<br />
da possível substituição de massa proteica por massa adiposa, há uma<br />
tendência à diminuição na gordura subcutânea e a um acúmulo na região<br />
abdominal. Sabidamente, o aumento da gordura na região abdominal<br />
está relacionado a comprometimentos à saúde explicados, entre<br />
outros fatores, pelo quadro inflamatório sistêmico gerado. 28-30 Embora
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
67<br />
durante todo o ciclo da vida os homens tenham maior acúmulo de gordura<br />
visceral, com o envelhecimento, esse aspecto praticamente se iguala<br />
entre mulheres e homens, <strong>em</strong> virtude da diminuição dos estrogênios<br />
após a menopausa. 31<br />
Nicklas et al. 32 , a partir de amostra extraída do estudo denominado<br />
The Health, Aging and Body Composition Study, selecionaram 1.387 mulheres<br />
e 1.116 homens, entre 70 e 79 anos de idade, analisando a associação<br />
de infarto do miocárdio com adiposidade total (IMC) e distribuição da gordura<br />
corporal (circunferência da cintura, relação cintura-quadril – RCQ,<br />
tecido adiposo visceral e subcutâneo). Os autores observaram que a gordura<br />
visceral, mesmo <strong>em</strong> indivíduos com menor adiposidade subcutânea,<br />
mostrou maior associação com eventos de infarto do miocárdio e com<br />
mortalidade decorrente disso.<br />
Outro aspecto importante relacionado possivelmente à adiposidade<br />
visceral é a neurodegeneração. O envelhecimento <strong>em</strong> si é considerado<br />
um fator de comprometimento do funcionamento do cérebro por razões<br />
como a diminuição do fluxo sanguíneo e a perda natural de neurônios, o<br />
que pode levar à perda da m<strong>em</strong>ória, da função cognitiva, do equilíbrio,<br />
entre outras. Jagust et al. 29 investigaram se a elevação da gordura visceral<br />
seria associada a mudanças estruturais cerebrais, relacionadas a declínio<br />
cognitivo e d<strong>em</strong>ência.<br />
O estudo foi realizado a partir de uma amostra do Sacramento<br />
Area Latino Study on Aging. Os autores selecionaram 112 indivíduos<br />
de uma amostra de 1.789 idosos e avaliaram RCQ, glic<strong>em</strong>ia e insulina<br />
de jejum, colesterol e pressão arterial de repouso. O volume do<br />
hipocampo e dos h<strong>em</strong>isférios direito e esquerdo do cérebro foram avaliados<br />
por RM. Entre outros resultados, os autores encontraram uma<br />
correlação negativa e significativa entre volume do hipocampo e RCQ<br />
(r = -0,2; p = 0,02). Dessa forma, os autores concluíram que um alto<br />
valor de RCQ pode estar associado a processos neurodegenerativos,<br />
vasculares e metabólicos que afetam as estruturas cerebrais, levando a<br />
declínio cognitivo e d<strong>em</strong>ência.
68<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
É importante destacar que são hipotetizadas inúmeras causas <strong>para</strong><br />
declínio cognitivo e d<strong>em</strong>ência; portanto, a gordura visceral poderia ser<br />
um dos fatores, mas certamente não o único. No que diz respeito aos aspectos<br />
nutricionais, além da gordura corporal, vários estudos têm apontado<br />
que certas deficiências de nutrientes também pod<strong>em</strong> estar relacionadas<br />
com a função cerebral, como as vitaminas C, B 12<br />
, riboflavina,<br />
tiamina, folato, ferro e zinco. 3<br />
A gordura visceral ou central também t<strong>em</strong> sido relacionada com<br />
o grau de funcionalidade e com o nível de atividades físicas. Em uma<br />
amostra representativa na Espanha 33 , entre 2001 a 2003, foram estudados<br />
3.235 idosos não institucionalizados (1.411 homens e 1.824 mulheres).<br />
Avaliaram-se incapacidades por cinco indicadores: mobilidade, agilidade,<br />
restrição das atividades diárias, atividades instrumentais <strong>para</strong> a vida<br />
diária e atividades de autocuidado. As análises foram e repetidas após<br />
2 anos e observou-se que a circunferência do abdome foi preditora da<br />
incapacidade após esse período, levando à conclusão prévia de que evitar<br />
o aumento da gordura visceral é uma maneira de prevenir comprometimentos<br />
das capacidades físicas com a idade.<br />
Os mesmos autores 33 observaram que a associação entre gordura<br />
abdominal e incapacidades é independente do IMC. Esses resultados,<br />
juntamente a vários outros, levantam questões a respeito do IMC como<br />
indicador de risco de doenças crônicas <strong>em</strong> idosos. Os estudos, de forma<br />
geral, têm apontado resultados interessantes. Diferent<strong>em</strong>ente do que<br />
ocorre <strong>em</strong> adultos jovens, <strong>em</strong> idosos, o IMC parece ter menor importância<br />
<strong>em</strong> indicar adiposidade, apontando a maior possibilidade de ser<br />
um bom preditor de risco nutricional. Por sua vez, dados do NHANES<br />
I e II mostram que o IMC se correlaciona mais com a gordura subcutânea<br />
<strong>em</strong> jovens do que <strong>em</strong> idosos, nos quais o IMC parece se correlacionar<br />
melhor com a massa muscular.<br />
Cabrera et al. 34 , analisando pacientes por d<strong>em</strong>anda espontânea <strong>em</strong><br />
ambulatório de geriatria no Rio de Janeiro, realizaram um estudo de seguimento<br />
de 5 anos (575 mulheres com 60 a 94 anos de idade, sendo 109
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
69<br />
maiores que 80 anos). As curvas de sobrevida de Kaplan Méier apontaram<br />
maior t<strong>em</strong>po de vida <strong>para</strong> aqueles indivíduos com maiores valores<br />
de IMC. Resultados idênticos foram encontrados por Landi et al., 35 ao<br />
estudar<strong>em</strong>, <strong>em</strong> Rovereto, norte da Itália, idosos vivendo na comunidade.<br />
Por todas essas razões, a classificação dos valores do IMC não<br />
poderia ser utilizada da mesma forma <strong>para</strong> idosos e jovens. A partir<br />
dos dados coletados no Projeto Sabe 10 , a Organização Pan-americana<br />
de Saúde (Opas) indicou a seguinte classificação: < 23 kg/m 2 = baixo<br />
peso; 23 a 28 kg/m 2 = peso normal; 28 a 30 kg/m 2 = sobrepeso; > 30<br />
kg/m 2 = obesidade.<br />
Por sua vez, a classificação do IMC adotada pelo Sist<strong>em</strong>a de Vigilância<br />
Alimentar e Nutricional (Sisvan) do Ministério da Saúde 36 , classifica<br />
as informações recebidas das Unidades de Saúde a partir da proposta<br />
do Nutrition Screening Iniciative. 5 Os valores são: < 22 = baixo peso;<br />
22 a 27 = eutrofia; > 27 = sobrepeso.<br />
Considerando-se eventos importantes e diferentes que pod<strong>em</strong> ser<br />
analisados a partir das medidas do IMC, da circunferência do abdome<br />
e da circunferência da panturrilha, seria importante a realização dessas<br />
três medidas na prática clínica.<br />
Em relação às variáveis antropométricas, as Tabelas 4 e 5 apresentam<br />
alguns dados referentes ao projeto Sabe, 10 na avaliação do estado<br />
nutricional de idosos por indicadores antropométricos.<br />
TABELA 4<br />
Variáveis, média e percentis de mulheres avaliadas pelo Projeto Sabe<br />
VARIÁVEL N MÉDIA ± DP PERCENTIS<br />
25 50 75<br />
MC (KG) 1.071 62,49 ± 13 54 61 70<br />
ESTATURA<br />
1.066 151,22 ± 6,85 147 151 155<br />
(CM)<br />
IMC (KG/M 2 ) 1.064 27,26 ± 5,2 23,74 26,63 30,36<br />
(continua)
70<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
(continuação)<br />
CC (CM) 1.069 93,97 ± 13,65 85 94 103<br />
CQ (CM) 1.068 103,73 ± 11,26 96 102 111<br />
RCQ 1.068 0,91 0,85 0,9 0,97<br />
CP 1.114 35,36 ± 4,22 33 35 38<br />
DCT 1.101 25,22 ± 8,35 20 25 30,5<br />
CB 1.124 31,02 ± 6,01 28 31 34<br />
CMB 1.101 22,73 ± 2,62 20,92 22,64 24,42<br />
MC: massa corporal; IMC: índice de massa corporal; CC: circunferência da cintura; CQ: circunferência do<br />
quadril; RCQ: relação cintura-quadril; CP: circunferência da panturrilha; DCT: dobra cutânea tricipital; CB:<br />
circunferência do braço; CMB: circunferência muscular do braço; DP: desvio padrão.<br />
Fonte: adaptada de Lebrão e Duarte, 2003. 10<br />
TABELA 5<br />
Variáveis, média e percentis de homens avaliados pelo Projeto Sabe<br />
VARIÁVEL N MÉDIA ± DP PERCENTIS<br />
25 50 75<br />
MC (KG)* 734 67,74 ± 12,74 59 67 75<br />
ESTATURA (CM)* 733 164,40 ± 6,9 160 164 169<br />
IMC (KG/M 2 )* 732 25,00 ± 4,07 22,5 24,91 27,48<br />
CC (CM)* 732 95,20 ± 11,53 88 95,5 103<br />
CQ (CM)* 733 98,88 ± 8,38 94 99 103<br />
RCQ* 732 0,96 0,92 0,96 1,01<br />
CP 766 35,15 ± 3,84 33 35 38<br />
DCT* 726 13,71 ± 5,75 9 13 17<br />
CB* 770 29,16 ± 3,64 27 29 31<br />
CMB* 727 24,71 ± 2,66 22,98 24,86 26,49<br />
MC: massa corporal; IMC: índice de massa corporal; CC: circunferência da cintura; CQ: circunferência do<br />
quadril; RCQ: relação cintura-quadril; CP: circunferência da panturrilha; DCT: dobra cutânea tricipital; CB:<br />
circunferência do braço; CMB: circunferência muscular do braço.<br />
* Diferença significativa entre os sexos, de acordo com o teste t-student.<br />
Fonte: adaptada de Lebrão e Duarte, 2003. 10
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
71<br />
A massa corporal abrange também a massa óssea. É bastante estudada<br />
a perda mineral óssea com o envelhecimento, o que resulta <strong>em</strong><br />
menor densidade óssea. Esta é controlada, resumidamente, por células<br />
responsáveis pela incorporação de cálcio no osso (osteoblastos) e de<br />
células que se responsabilizam pela mobilização de cálcio do osso <strong>para</strong><br />
a circulação sanguínea (osteoclastos). Esses processos são controlados<br />
por uma série de fatores – hormonais, imunológicos, relativos ao estilo<br />
de vida, à idade avançada, à estrutura física pequena, à raça branca, entre<br />
outros. 37<br />
A diminuição da densidade mineral óssea, principalmente <strong>em</strong> mulheres,<br />
é um processo natural e decorre, <strong>em</strong> especial, da cessação da produção<br />
de hormônios esteroides com a menopausa. De forma geral, até<br />
a terceira década de vida, constitui-se o pico da massa óssea corporal e,<br />
a partir daí, t<strong>em</strong> início um lento declínio. De acordo com a OMS 38 osteoporose<br />
significa um valor de 2,5 desvios padrões abaixo da densidade<br />
mineral óssea correspondente ao valor mediano (P50) de uma população<br />
de referência. Valores entre 1 e 2,5 desvios-padrão abaixo da média<br />
são classificados como osteopenia.<br />
Paralelamente ao aparecimento de alterações na densidade mineral<br />
óssea, outro ponto discutido nos aspectos corporais de idosos é a estatura.<br />
Alterações na mineralização de ossos da coluna pod<strong>em</strong> fazê-la perder<br />
a capacidade de manter o corpo ereto, resultando <strong>em</strong> diminuição da<br />
estatura com a idade. Independent<strong>em</strong>ente das alterações na postura ereta,<br />
estudos populacionais relatam diminuição na estatura com a idade,<br />
mas há controvérsias nesse sentido. Perissinoto et al. 9 , na Itália, apontaram<br />
diminuição de 2 a 3 cm a cada década de vida. Já o Euronut Seneca<br />
Study 39 encontrou decréscimo de 1 a 2 cm <strong>em</strong> um estudo longitudinal de<br />
4 anos. Na América Latina, o Projeto Sabe 10 apontou perda de 0,5 a 2 cm<br />
por década. Por outro lado, considerando a tendência secular do crescimento,<br />
claramente descrita na literatura, a análise da estatura de indivíduos<br />
idosos com<strong>para</strong>tivamente a dos jovens dos dias atuais pode simplesmente<br />
estar relacionada a esse fenômeno. 40,41 Ad<strong>em</strong>ais, a tendência
72<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
secular do crescimento e o comprometimento da estatura com a idade<br />
pod<strong>em</strong> estar ocorrendo simultaneamente.<br />
Considerando alterações na postura, dev<strong>em</strong> ser buscadas alternativas<br />
<strong>para</strong> a tomada da estatura de idosos. Kwok e Whitelaw 42 propõ<strong>em</strong><br />
a medida da envergadura, ou seja, a medida dos braços abertos <strong>em</strong> cruz,<br />
de um dedo médio ao outro, como sendo proporcional à sua estatura.<br />
Entretanto, os idosos que eventualmente estejam fragilizados e comprometidos,<br />
não terão condições de permanecer com os braços abertos <strong>em</strong><br />
cruz por t<strong>em</strong>po suficiente <strong>para</strong> o procedimento de medida. Como alternativa,<br />
Mitchel e Lipchitz 43,44 propõ<strong>em</strong> a medida do comprimento do<br />
braço, a qual, de acordo com os autores, deve ser feita a partir do processo<br />
acromial da escápula até o final do processo estiloide da ulna.<br />
O método mais utilizado e mais citado na literatura é o comprimento<br />
ou a altura do joelho, por considerar que a medida <strong>em</strong> m<strong>em</strong>bros<br />
inferiores não é afetada pela diminuição das dimensões ósseas. A medida<br />
é feita com o indivíduo deitado e o joelho flexionado a 90°, a partir da<br />
sola do pé até a superfície superior do joelho.<br />
Para o estabelecimento da equação de regressão mais apropriada<br />
<strong>para</strong> estimativa da estatura a partir dessa medida, vários estudos são descritos<br />
na literatura. O primeiro foi realizado <strong>em</strong> uma amostra não representativa<br />
de Southest Ohio, apenas com indivíduos da raça branca. 45 Em<br />
outro 46 , foi avaliada uma amostra pequena e não representativa de indivíduos<br />
afrodescendentes não hispânicos. Finalmente, um estudo que utilizou<br />
uma amostra estratificada por gênero e raça a partir do NHANES<br />
III avaliou 4.750 indivíduos, sendo 1.369 homens não hispânicos brancos,<br />
1.472 mulheres não hispânicas brancas, 474 homens não hispânicos<br />
afrodescendentes e 481 mulheres não hispânicas afrodescendentes, além<br />
de 497 homens méxico-americanos e 457 mulheres méxico-americanas.<br />
Portanto, esse estudo procurou avaliar uma amostra bastante representativa<br />
de todas as diferenças raciais da população norte-americana. 12 Os<br />
resultados são traduzidos nas fórmulas descritas na Tabela 1, juntamente<br />
às estimativas de peso corporal citadas anteriormente.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
73<br />
Embora os estudos sobre estimativas de estatura tenham oferecido<br />
grande contribuição às técnicas antropométricas <strong>para</strong> avaliação do estado<br />
nutricional <strong>em</strong> idosos, o erro dessa análise ainda é bastante considerável<br />
e, portanto, sugere-se a adoção dessas medidas apenas quando<br />
outras alternativas não for<strong>em</strong> possíveis. Outro ponto que se deve levar<br />
<strong>em</strong> consideração é a relação entre essas medidas e a realidade dos idosos<br />
brasileiros, uma vez que não há a mesma tendência de relação proporcional<br />
entre todas as populações. 47<br />
IDOSOS E RISCO NUTRICIONAL<br />
Investigar as causas de desvios nutricionais que pod<strong>em</strong> resultar <strong>em</strong> peso<br />
excessivo ou deficiente é de extr<strong>em</strong>a importância. Como as internações<br />
hospitalares são mais frequentes nesse grupo populacional, deve-se<br />
l<strong>em</strong>brar de que um acompanhamento detalhado do estado nutricional<br />
colabora <strong>para</strong> um menor t<strong>em</strong>po de internação e, portanto, <strong>para</strong> uma recuperação<br />
mais rápida. Dessa forma, a adoção de técnicas de avaliação<br />
subjetiva ou relatos de questões importantes relacionadas costuma caracterizar<br />
um primeiro passo, ou uma triag<strong>em</strong>, <strong>para</strong> se avaliar o estado<br />
nutricional de idosos. Nessa triag<strong>em</strong>, o ponto importante a ser identificado<br />
é o grau de risco nutricional.<br />
Assim, é importante definir o termo “risco nutricional”. Não há<br />
muito consenso <strong>para</strong> essa definição e também não está claro se estar <strong>em</strong><br />
risco nutricional t<strong>em</strong> um sentido mais ameno do que estar desnutrido.<br />
Alguns autores propõ<strong>em</strong> que essa avaliação seja realizada de forma subjetiva,<br />
a partir da identificação de alguns sinais ou sintomas de depleção.<br />
Nesse contexto, foi proposta a avaliação subjetiva global, especialmente<br />
no caso de idosos hospitalizados ou fragilizados. Ao final dessa avaliação<br />
é estabelecido um escore que define o risco nutricional. 48<br />
A Miniavaliação Nutricional t<strong>em</strong> sido uma das mais utilizadas no<br />
Brasil, uma vez que foi traduzida <strong>para</strong> o idioma português e validada<br />
<strong>para</strong> a população brasileira. 49,50 Consiste <strong>em</strong> um questionário que deve<br />
ser aplicado pelo profissional de saúde, com perguntas sobre hábitos de
74<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
vida, uso de medicamentos, valores antropométricos e autoavaliação. A<br />
partir do preenchimento do questionário, atribui-se um escore que classifica<br />
o risco nutricional. Em Unidades Básicas de Saúde ou <strong>em</strong> Centros<br />
de Referência a Idosos, esse tipo de avaliação garante maior agilidade no<br />
atendimento aos idosos.<br />
CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />
O estabelecimento de técnicas apropriadas e de padrões de referência<br />
especificamente <strong>para</strong> indivíduos idosos são assuntos bastante complexos<br />
e controversos. Por isso, não existe ainda uma recomendação definitiva<br />
<strong>para</strong> a escolha e a adoção de métodos e técnicas. Dessa forma, é<br />
importante que a avaliação nesses casos seja feita da forma mais ampla<br />
possível, relacionando o maior número de variáveis possível. O contato<br />
pessoal, com o idoso e com os cuidadores permite uma importante troca<br />
de informações, que é fundamental na escolha de estratégias e condutas<br />
<strong>para</strong> a melhora do estado nutricional, da saúde e, portanto, da qualidade<br />
de vida do idoso.<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
1. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Dados coletados do censo realizado<br />
pelo IBGE. Disponível <strong>em</strong>: http://www.censo.ibge.gov.br. Acessado <strong>em</strong>:<br />
10/3/2008.<br />
2. Ladbrook K. International longevity centre global alliance conference “Human<br />
Rights in an ageing world”. Age and Aging 2008; 37(2):136-7.<br />
3. Ribeiro SML, Donato Jr. J, Tirapegui J. Nutrição e envelhecimento. In: Tirapegui<br />
J. Nutrição: fundamentos e aspectos atuais. Barueri: Manole, 2005. p.127-42.<br />
4. Jensen GJ, McGee M, Binkley J. Nutrition in the elderly. Gastroenterology Clinics<br />
of North America 2001; 30(2):313-34.<br />
5. Lipschitz DA. Screening for nutritional status in the elderly. Primary Care 1994;<br />
21(1):55-67.<br />
6. Wilson MM, Morley JE. Invited review: aging and energy balance. J Appl Physiol<br />
2003; 95(4):1728-36.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
75<br />
7. Marshall TA, Warren JJ, Hand JS, Xie, XJ, Stumbo, PJ. Oral health, nutrient intake<br />
and dietary quality in the very old. JADA 2002; 133:1369-79.<br />
8. Colussi CF, Freitas SFT. Aspectos epid<strong>em</strong>iológicos da saúde bucal do idoso no<br />
Brasil Cad Saúde Pública 2002; 18(5):1313-20.<br />
9. Perissinotto E, Pisent C, Sergi G, Grigoleto F, Enzi G. Anthropometric measur<strong>em</strong>ents<br />
in the elderly: age and gender differences. B J Nutr 2002; 87:177-86.<br />
10. Lebrão ML, Duarte YAO. Organização Pan-Americana de Saúde – OPAS/<br />
OMS, SABE – Saúde, B<strong>em</strong>-Estar e Envelhecimento – O Projeto Sabe no Município<br />
de São Paulo: uma abordag<strong>em</strong> inicial. São Paulo: Athalaia Bureau, 2003.<br />
11. Lebrão ML, Laurenti R. Saúde, b<strong>em</strong> estar e envelhecimento: o estudo SABE no<br />
Município de São Paulo. Rev Bras Epid<strong>em</strong>iol 2005; 8(2):127-41.<br />
12. Chumlea WC, Guo SS, Wholihan K, Cockram D, Kuczmarski RJ, Johnson CL.<br />
Stature prediction equations for elderly non-Hispanic white, non-Hispanic black,<br />
and Mexican-American persons developed from NHANES III data. J Am<br />
Diet Assoc 1998; 98(2):137-42.<br />
13. World Health Organization. Physical Status: the use and interpretation of anthropometry.<br />
Report of a WHO Expert Committee. WHO Technical Report<br />
Series 1995; 854:375-409.<br />
14. Doherty TJ. Aging and sarcopenia. J Appl Physiol 2003; 95:1717-27.<br />
15. Frontera WR, Hughes VA, Fielding RA, Fiaratone MA, Evans WJ, Roubenoff<br />
R. Aging of skeletal muscle: a 12-yr longitudinal study. J Appl Physiol 2000;<br />
88:1321-6.<br />
16. Kamel HK. Sacopenia and aging. Nutr Rev 2003; 61:157-67.<br />
17. Roubenoff R, Rall LC. Humoral mediation of changing body composition during<br />
aging and chronic inflmmation. Nutr Rev 1993; 51:1-11.<br />
18. Burr ML, Phillips KM. Anthropometric norms in the elderly. Br J Nutr 1984;<br />
51:165-9.<br />
19. Frisancho AR. New standars of weight and body composition by frame size and<br />
height for assessment of nutritional status of adults and the elderly. Am J Clin<br />
Nutr 1984; 40:808-19.<br />
20. Cornoni-Huntley JC, Harris TB, Everett DF, Albanes D, Micozzi MS, Miles TP<br />
et al. An overview of body weight of older persons,including the impact of mortality.<br />
J Clin Epid<strong>em</strong>iol 1991; 44:743-53.
76<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
21. Chumlea WC, Roche A, Mukherjee D. Nutritional assessment of the elderly<br />
through anthropometry. Ohio: Ross Laboratories, 1987.<br />
22. Falciglia G, O’Connor J, Gediing E. Upper Arm anthropometric norms in elderly<br />
white subjects. J Am Diet Assoc 1988; 88:569-74.<br />
23. Kuczmarski MF, Kuczmarski RJ, Najjar M. Descriptive anthropometric reference<br />
data for older Americans. J Am Diet Assoc 2000; 100:59-66.<br />
24. de Onis M, Habicht JP. Anthropometric reference data for international use.<br />
Recommendations from a World Health Organization Expert Committee. Am<br />
J Clin Nutr 1996; 64:650-8.<br />
25. Rolland Y, Lauwers-Cances V, Cournot M, Nourhashémi F, Reynish W, Rivière<br />
D et al. Sarcopenia, calf-circumference and physical function of elederly women:<br />
a cross sectional study. J Am Ger Soc 2003; 51:1120-4.<br />
26. Lohman TG. Anthropometric standardization reference manual. Champaign:<br />
Human Kinetics, 1988. p.28-80.<br />
27. Gibson R. Principles of nutritional assessment. Oxford: Oxford University<br />
Press, 1990. p.691.<br />
28. Obisesan TO, Aliyu MH, Bond V, Adams RG, Akomolafe A, Rotimi CN. Ethnic<br />
and age-related fat free mass loss in older Americans: the Third National<br />
Health and Nutrition Examination Survey (NHANES III). BMC Public Health<br />
abr 2005; 5(1):41.<br />
29. Jagust W, Harvey D, Mungas D, Haan M. Central obesity and the aging brain.<br />
Arch Neurol 2005; 62:1545-8.<br />
30. Menezes TN, Marucci MFN. Perfil dos indicadores de gordura e massa muscular<br />
corporal de idosos de Fortaleza, Ceará, Brasil. Cad Saúde Pública 2007;<br />
23(12):2887-95.<br />
31. Wajchenberg BE. Subcutaneous and visceral adipose tissue: their relation to the<br />
metabolic syndrome. Endocrine Reviews 2000; 21:697-738.<br />
32. Nicklas BJ, Penninx BWJH, Cesari M, Kritchevsky SB, Newman AB, Kanaya<br />
AM et al. Association of visceral adipose tissue with incidental myocardial infarction<br />
in older men and women. The health, aging and body composition.<br />
Am J Epid<strong>em</strong>iol 2004; 160(8):741-9.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
77<br />
33. Guallar-Castillon P, Sagardui-Villamor J, Banegas JR, Graciani A, Fornés NS,<br />
Garcia EL et al. Waist circumference as a precidctor of disability among older<br />
adults. Obesity 2007; 15(1):233-44.<br />
34. Cabrera MA, Wajngarten M, Gebara OC, Diament J. Relação do índice de massa<br />
corporal, da relação cintura quadril e da circunferência abdominal com a<br />
mortalidade <strong>em</strong> mulheres: seguimento de 5 anos. Cad Saúde Pública 2005;<br />
21(3):767-75.<br />
35. Landi F, Zuccalà G, Gambassi G, Incalzi RA, Manigrasso L, Pagano F et al. Body<br />
mass index and mortality among older people living in the community. J Am<br />
Geriatr Soc 1999; 47(9):1072-6.<br />
36. Ministério da Saúde. Sist<strong>em</strong>a de Vigilância alimentar e Nutricional. Orientações<br />
básicas <strong>para</strong> a coleta, o processamento, a análise de dados e a informação<br />
<strong>em</strong> serviços de saúde. Série A. Normas e Manuais Técnicos, Brasília 2004.<br />
37. Poole KES, Compston JE. Osteoporosis and its manag<strong>em</strong>ent. BMJ 2006;<br />
333:1251-6.<br />
38. World Health Organization. Assessment of frature risk and its application to<br />
screening for postmenopausal osteoporosis. Report of a WHO Study Group.<br />
World Healt Organ Tech Rep Ser 1994; 843:1-129.<br />
39. de Groot LC, Hautvast JG, van Staveren WA. Nutrition and health of elderly<br />
people in Europe: the EURONUT-SENECA Study. Nutr Rev 1992; 50:185-94.<br />
40. Chandler PJ, Bock RD. Age changes in adult stature: trend estimation from mixed<br />
longitudinal data. Ann Hum Biol 1991; 18(5):433-40.<br />
41. Eiben OG. Secular trend of physical development and its significance for pediatric<br />
practice. Arztl Jugendkd. 1990; 81(5):361-7.<br />
42. Kwok T, Whitelaw MN. The use of arm span in nutritional assessment of the elderly.<br />
J Am Ger Soc 1991; 39:342.<br />
43. Mitchel CO, Lipschitz DA. Arm lenght as na alternative to height in nutritional<br />
assessment of the elderly. J Parenteral and Enteral Nutr 1982; 6:226.<br />
44. Mitchel CO, Lipschitz DA. The effect of age and sex on the routinely used measur<strong>em</strong>ents<br />
to assess the nutritional status of hospitalized patients. Am J Clin<br />
Nutr 1982; 36:340.
78<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
45. Chumlea WC, Roche AF, Steinbaugh ML. Etimating stature from knee height<br />
for persons 60 to 90 years of age. J Am Geriat Soc 1985; 33:116.<br />
46. Chumlea WC, Guo S. Equations for predicting stature in white and black elederly<br />
individuas, J Gerontol 1992; 47:197.<br />
47. Mendoza-Núnez VM, Sánchez-Rodríguez MA, Cervantes-Sandoval A, Correa-<br />
-Muñoz E, Vargas-Guadarrama LA. Equations for predicting height for elderly<br />
mexican americans are not applicable for elderly mexicans. Am J Hum Biol<br />
2002; 14(3):351-5.<br />
48. Barbosa-Silva MCG, Barros AJD. Avaliação nutricional subjetiva. Parte 1.<br />
Revisão de sua validade após duas décadas de uso. Arq Gastroenterol 2002;<br />
39(3):181-7.<br />
49. Guizoz Y, Vellas B, Garry PJ. Mini Nutritional assessmet. A practical assessment<br />
tool for grading the nutritional the nutritional state of elderly patients.<br />
Facts Res Gerontol 1994; (Supp. 2):15-59.<br />
50. Guigoz Y, Vellas B. A mini avaliação nutricional (MAN) na classificação do estado<br />
nutricional do paciente idoso: apresentação, história e validação. Nestlé<br />
Nutrition Workshop series 1998; 1:1-2.
CONSEQUÊNCIAS DE UM ENCONTRO:<br />
A INSEGURANÇA ALIMENTAR DAS<br />
POPULAÇÕES INDÍGENAS<br />
BRASILEIRAS E A RELAÇÃO DE CONTATO<br />
COM A SOCIEDADE NACIONAL<br />
Marcos Schaper dos Santos Junior<br />
Conversando com um professor indígena do povo Ikpeng, que vive no Médio<br />
Xingu, perguntei qual era a pior doença que ele conhecia, ele me respondeu: A<br />
pior doença <strong>para</strong> o meu povo foi o contato com o seu.<br />
INTRODUÇÃO<br />
As fontes de dados sobre a população indígena no Brasil s<strong>em</strong>pre foram<br />
muito precárias. Os mais de 230 povos indígenas somam, segundo o Censo<br />
IBGE 2010, 896.917 pessoas, o que corresponde, aproximadamente, a<br />
0,47% da população total do país. A diversidade da população indígena<br />
brasileira é imensa e manifesta-se <strong>em</strong> vários aspectos, na forma de organização<br />
social e política, mitos, cosmologia, etc. Cada povo t<strong>em</strong> sua maneira<br />
de se relacionar com o mundo e sua própria visão sobre o processo<br />
de saúde, doença, alimentação e nutrição. São mais de 180 línguas faladas<br />
por 238 povos <strong>em</strong> diferentes estágios de relação de contato com outros<br />
segmentos da sociedade nacional, desde indígenas morando há décadas<br />
<strong>em</strong> cidades até relatos de mais de 50 evidências de grupos isolados. 1<br />
Os povos indígenas apresentam, <strong>em</strong> geral, precárias condições de<br />
vida e saúde, diretamente relacionadas aos processos históricos de mudanças<br />
sociais, culturais, econômicas e ambientais. Essa situação é decorrente,<br />
<strong>em</strong> especial, de suas desprotegidas interações com a sociedade<br />
não indígena. Essas mudanças repercut<strong>em</strong> diretamente nos determinantes<br />
das condições de saúde e nutrição e geram situações de insegurança<br />
alimentar e nutricional.
80<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
A INSEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL DA<br />
POPULAÇÃO INDÍGENA BRASILEIRA: A RELAÇÃO DE<br />
CONTATO COMO PANO DE FUNDO<br />
O Conselho Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea)<br />
define segurança alimentar e nutricional como o direito de todos ao<br />
acesso regular e contínuo aos alimentos, tanto <strong>em</strong> qualidade como <strong>em</strong><br />
quantidade suficiente, s<strong>em</strong> comprometer o acesso a outras necessidades<br />
essenciais. São princípios básicos as práticas alimentares promotoras de<br />
saúde que respeit<strong>em</strong> a diversidade cultural e sejam sustentáveis na perspectiva<br />
socioeconômica e ambiental. 2<br />
Negar esse direito às pessoas leva à insegurança alimentar, que<br />
pode se manifestar por fome, desnutrição e obesidade. Os indicadores<br />
antropométricos são tradicionalmente utilizados <strong>para</strong> mensurar<br />
sua magnitude, sobretudo entre as crianças. Pesquisadores da Unicamp<br />
coor denaram o projeto que validou um questionário de avaliação<br />
familiar de segurança alimentar (Escala Brasileira de Insegurança<br />
Alimentar – EBIA). 3 O instrumento é composto de 15 perguntas<br />
que permit<strong>em</strong> avaliar a segurança alimentar a partir da percepção da<br />
família.<br />
Estudos <strong>para</strong> determinar a insegurança alimentar entre os povos<br />
indígenas são pontuais. Levantamento conduzido por Verdum, <strong>em</strong><br />
meados da década de 1990, já apontava que, <strong>em</strong> 1/3 das terras indígenas<br />
(TI) do Brasil, os indígenas conviviam com probl<strong>em</strong>as de insegurança<br />
alimentar, a maioria localizada no Nordeste, Sul e Sudeste. 4-6 Em<br />
2004, foi realizada, utilizando a EBIA adaptada, uma pesquisa com famílias<br />
da etnia Terena, moradoras da TI Buriti, localizada no Mato<br />
Grosso do Sul. Esse estudo encontrou prevalência de insegurança alimentar<br />
leve <strong>em</strong> 22,4%, moderada <strong>em</strong> 32,7% e grave <strong>em</strong> 20,4% entre as<br />
famílias estudadas. 6<br />
No meio indígena, a insegurança alimentar é fruto de uma relação<br />
de contato com a sociedade não indígena que levou a drásticas alterações<br />
no modo de viver dessa população, ocasionada, entre outras razões,
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
81<br />
pelo processo contínuo de diminuição territorial, esgotamento de recursos<br />
naturais e degradação ambiental.<br />
A atividade de subsistência por meio da agricultura, coleta, pesca e<br />
caça v<strong>em</strong> se modificando ao longo do t<strong>em</strong>po. O confinamento de populações<br />
inteiras <strong>em</strong> pequenos territórios e a instalação de regimes econômicos,<br />
entre outros fatores, levaram muitos povos indígenas ao <strong>em</strong>pobrecimento<br />
e colocaram-n0s <strong>em</strong> situação de vulnerabilidade alimentar<br />
e nutricional. Atualmente, cerca de 40% desses povos viv<strong>em</strong> <strong>em</strong> menos<br />
de 2% das TI nas regiões Nordeste, Sudeste e Sul do país. 1 Segundo<br />
a Fundação Nacional do Índio (Funai), a população indígena está distribuída<br />
por 688 TI e algumas áreas urbanas, inclusive nas capitais e grandes<br />
cidades brasileiras. 7 Nas cidades, a grande maioria vive <strong>em</strong> favelas e<br />
bolsões de pobreza, trabalha <strong>em</strong> sub<strong>em</strong>pregos e recebe salários que não<br />
lhes permit<strong>em</strong> adquirir alimentos <strong>em</strong> quantidade e qualidade <strong>para</strong> garantir<br />
a segurança alimentar de suas famílias. 8,9<br />
Contudo, mesmo onde exist<strong>em</strong> grandes extensões de terra, as terras<br />
boas <strong>para</strong> cultivo, com abundância de animais, peixes e alimentos obtidos<br />
por meio da coleta (frutas, mel, castanhas, raízes) estão dispersos, sendo<br />
necessários grandes deslocamentos <strong>para</strong> encontrá-los. Com a exploração,<br />
ocorre um esgotamento dos recursos próximos às aldeias, sendo necessário<br />
ir cada vez mais longe <strong>para</strong> caçar, pescar, produzir ou coletar alimentos.<br />
Antigamente, isso era resolvido com a mudança das aldeias <strong>para</strong> uma<br />
região onde os alimentos eram abundantes e as terras eram férteis. Hoje<br />
<strong>em</strong> dia, com a redução dos territórios e a fixação da população nas aldeias,<br />
<strong>em</strong> decorrência da existência de escolas, poços artesianos, geradores,<br />
unidade de saúde e outros bens, isso não é mais possível. 10<br />
Outro aspecto que provoca variações na produção, na oferta e no<br />
consumo de alimentos é a sazonalidade. 5,11 Os períodos de seca e chuva,<br />
descida e subida dos níveis dos rios, levam à diminuição de peixes<br />
e pod<strong>em</strong> afetar negativamente a nutrição da população nos períodos<br />
de escassez, sobretudo daqueles que já apresentam comprometimento<br />
do estado nutricional. Além disso, é significativo o impacto ambiental
82<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
provocado pela ocupação do entorno das TI com fazendas <strong>para</strong> criação<br />
de gado e atividades extrativistas, como a exploração da madeira.<br />
O garimpo e as atividades agrícolas, como a monocultura da soja no<br />
Mato Grosso, provocam o assoreamento dos rios. 12 Tais fatores levam à<br />
diminuição de peixes e animais, que são as principais fontes de proteína<br />
de alto valor biológico <strong>para</strong> os povos indígenas, e à piora da qualidade da<br />
água usada <strong>para</strong> o consumo.<br />
Outrossim, as condições de saneamento das áreas indígenas são<br />
precárias. A falta de locais apropriados <strong>para</strong> destinos dos dejetos levam<br />
à alta infestação <strong>para</strong>sitária do meio ambiente, e a inexistência de água<br />
de boa qualidade <strong>para</strong> o consumo, na maioria das aldeias, favorece a<br />
transmissão de helmintos e protozoários, b<strong>em</strong> como a contaminação<br />
por enterobactérias. 8,13,14 Esse cenário explica a alta prevalência de <strong>para</strong>sitoses<br />
intestinais 15-22 e diarreias entre os indígenas. 8,13,23-25<br />
Outro aspecto relevante diz respeito à contaminação do solo e lençóis<br />
freáticos das TI por resíduos sólidos (p.ex., plásticos, latas, papelão),<br />
resíduos dos serviços de saúde, fertilizantes e defensivos agrícolas<br />
usados na agricultura do entorno, recipientes de combustíveis e óleos<br />
lubrificantes usados no transporte fluvial, contaminantes químicos das<br />
baterias e pilhas 13 , e mercúrio usado no garimpo. 26,27 A situação é preocupante<br />
pelos efeitos danosos que essas substâncias pod<strong>em</strong> causar <strong>para</strong><br />
a saúde humana, porém são poucos os estudos direcionados <strong>para</strong> dimensionar<br />
o probl<strong>em</strong>a entre os indígenas.<br />
Para vários povos indígenas, a construção do corpo é fruto de uma<br />
relação com seu ambiente material, social e cultural. O corpo é nutrido,<br />
modelado e cresce por várias intervenções dentro e fora dele, como pinturas,<br />
amarrações <strong>em</strong> partes do corpo, escarificações, perfuração das<br />
orelhas, tatuagens, uso de ervas, participação <strong>em</strong> rituais, etc. Portanto,<br />
<strong>para</strong> muitos povos, na gênese dos distúrbios nutricionais estão as mudanças<br />
de hábitos culturais, o abandono da alimentação tradicional e<br />
dos cuidados com as crianças e o rompimento de tabus relacionados a<br />
puberdade, gestação, parto e puerpério. 28,29
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
83<br />
Todos esses fatores decorrentes das mudanças que vêm ocorrendo<br />
com as populações indígenas geram situações de insegurança alimentar,<br />
b<strong>em</strong> como a peculiaridade do perfil nutricional e epid<strong>em</strong>iológico desses<br />
povos.<br />
TRANSIÇÃO EPIDEMIOLÓGICA E PERFIL NUTRICIONAL<br />
DA POPULAÇÃO INDÍGENA BRASILEIRA: REFLEXO DA<br />
EXCLUSÃO SOCIAL<br />
A mortalidade infantil é considerada um bom indicador das condições de<br />
vida de uma população, pois retrata a condição de saúde de sua parcela<br />
mais vulnerável – os menores de 1 ano. Em 2007, a mortalidade infantil no<br />
Brasil foi de 20 óbitos por 1.000 nascidos vivos 30 , enquanto na população<br />
indígena foi de 46,9 por 1.000. 31 Ao contrário das crianças de outras etnias,<br />
<strong>em</strong> que as causas neonatais predominam, os óbitos <strong>em</strong> menores de 1 ano<br />
entre as crianças indígenas ocorr<strong>em</strong> por causas pós-neonatais <strong>em</strong> mais da<br />
metade dos casos. 32 Infecções respiratórias agudas (IRA), diarreias e desnutrição<br />
estão entre as principais causas de óbitos dessas crianças. 33<br />
Cardoso 25 constatou que a taxa anual de hospitalização global dos<br />
Guarani, no Sul e Sudeste do Brasil, superou <strong>em</strong> 70% a taxa correspondente<br />
verificada no território nacional. O estudo revela que IRA e diarreias<br />
são as principais causam de internação entre as crianças. A an<strong>em</strong>ia<br />
<strong>em</strong> menores de 1 ano e a desnutrição chamam a atenção entre os diagnósticos<br />
secundários.<br />
Essa situação epid<strong>em</strong>iológica retrata a baixa qualidade da assistência<br />
à saúde, a falta de saneamento e a situação de insegurança alimentar<br />
e nutricional dos povos indígenas. Os indicadores d<strong>em</strong>onstram iniquidade<br />
e reflet<strong>em</strong> a exclusão social que marca historicamente a relação<br />
das sociedades indígenas com outros segmentos da sociedade nacional.<br />
Os povos indígenas apresentam uma transição epid<strong>em</strong>iológica caracterizada<br />
pela <strong>em</strong>ergência de doenças crônicas não transmissíveis<br />
(DCNT) coexistindo com altas prevalências de doenças infecciosas e<br />
<strong>para</strong>sitárias. 8,34-36
84<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
A população total v<strong>em</strong> crescendo <strong>em</strong> ritmo acelerado, acima da média<br />
nacional. Entre as causas <strong>para</strong> esse quadro, destaca-se o crescimento<br />
vegetativo decorrente das elevadas taxas de fecundidade e da queda<br />
da mortalidade. Tais características são consequência de vários fatores,<br />
como o abrandamento de conflitos com frentes expansionistas, diminuição<br />
das epid<strong>em</strong>ias, melhor acesso aos serviços de assistência à saúde, garantia<br />
de territórios, além do desejo e decisão de crescer. 37<br />
No contexto nutricional, observam-se prevalências b<strong>em</strong> acima da<br />
média nacional <strong>para</strong> baixa estatura entre as crianças e sobrepeso e obesidade<br />
crescentes a partir da infância.<br />
Ao longo das últimas décadas, houve aumento no número de pesquisas<br />
sobre as condições nutricionais dos povos indígenas. Entretanto,<br />
<strong>em</strong> sua maioria, são estudos transversais, abrang<strong>em</strong> um pequeno número<br />
de etnias e estão concentrados na Amazônia Legal. Como poucos<br />
estudos são longitudinais, não permit<strong>em</strong> com<strong>para</strong>ções com outros momentos<br />
da população estudada. 38<br />
Sabe-se que um imenso contingente dessa população vive nas cidades<br />
e capitais brasileiras e confinado <strong>em</strong> territórios exíguos, no Nordeste,<br />
Sudeste e Sul do Brasil. Contudo, apesar da situação de maior vulnerabilidade,<br />
esse grupo não é avaliado na maioria dos estudos.<br />
Além da sociodiversidade, o grande número de etnias não cont<strong>em</strong>pladas<br />
pelos estudos limita as possibilidades de generalizações e a elaboração<br />
de um quadro da situação nutricional do universo da população<br />
indígena brasileira.<br />
Os estudos sobre as condições nutricionais das crianças indígenas<br />
mostram prevalências moderadas ou elevadas de desnutrição 11,34,38-48 ,<br />
b<strong>em</strong> acima dos níveis nacionais 49 , chegando a 62,7 e 51,7%, de baixa estatura<br />
e de déficit de peso <strong>para</strong> idade, respectivamente, entre os Pakaanóva-Wari.<br />
11 Nos poucos estudos que avaliaram o peso de nascimento<br />
das crianças, encontram-se prevalências que chegam a 30,4% 38,43,47 , b<strong>em</strong><br />
acima da média nacional, que é de 8,2%. 32 A despeito disso, exist<strong>em</strong> estudos<br />
apontando sobrepeso infantil. 41,42,48 Os índices antropométricos
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
85<br />
encontrados nos estudos nutricionais das crianças reflet<strong>em</strong> as precárias<br />
condições de vida e saúde das comunidades indígenas.<br />
Estudos suger<strong>em</strong> que as alterações do estilo de vida dos indígenas,<br />
com a mudança da dieta tradicional, passando de carboidratos complexos<br />
<strong>para</strong> os de absorção rápida dos alimentos industrializados, e a diminuição<br />
da atividade física levaram ao surgimento de DCNT, como<br />
obesidade <strong>em</strong> adolescentes 34,48,50 e adultos 5,34-36,51-53 , diabetes tipo II 8,54-57 e<br />
hipertensão arterial. 35,36,52,58,59<br />
Concomitant<strong>em</strong>ente, pesquisas apontam fortes evidências de que<br />
a desnutrição na infância e o baixo peso ao nascer causam uma série de<br />
mudanças a longo prazo. O menor gasto energético e a maior suscetibilidade<br />
aos efeitos de dietas com alto teor de gordura ocasionam diabetes<br />
tipo II, obesidade e hipertensão arterial na vida adulta, evento conhecido<br />
como programação ou orig<strong>em</strong> fetal das doenças. 60,61 Assim, além das<br />
alterações da dieta e da atividade física, a desnutrição entre as crianças<br />
indígenas pode ser um agravante a médio e longo prazos. Por isso, ações<br />
voltadas <strong>para</strong> uma melhor qualidade do pré-natal, b<strong>em</strong> como da situação<br />
nutricional das crianças também são importantes na prevenção de<br />
DCNT na idade adulta.<br />
Segundo Vieira Filho, os indígenas brasileiros possu<strong>em</strong> o genótipo<br />
econômico ou thrifty genotype. 62 Os genes que atualmente predispõ<strong>em</strong><br />
os indígenas ao diabete tipo II foram vantajosos entre seus ancestrais<br />
que viviam <strong>em</strong> ambientes onde a disponibilidade alimentar era<br />
muito irregular. A rápida resposta insulínica ao estímulo da glicose favorecia<br />
a capacidade de converter a glicose <strong>em</strong> gordura de reserva, conferindo<br />
uma vantag<strong>em</strong> de sobrevivência durante períodos de escassez.<br />
Essa adaptação genética <strong>para</strong> garantir a sobrevivência <strong>em</strong> períodos de<br />
fome passou, diante de alterações ambientais, a ser a causa de ganho excessivo<br />
de peso e acúmulo de gordura. 63 Portanto, as políticas de saúde<br />
dev<strong>em</strong> evitar intervenções nutricionais que proporcion<strong>em</strong> maior ganho<br />
de peso corporal do que de estatura, como a distribuição de cesta de alimentos<br />
com alto valor calórico.
86<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Em relação à deficiência de micronutrientes, os estudos limitam-se<br />
à avaliação da an<strong>em</strong>ia, que afeta, <strong>em</strong> especial, mulheres <strong>em</strong> idade fértil e<br />
crianças menores de 2 anos, chegando à prevalência de 92%, como mostra<br />
estudo com a população infantil da etnia Suruí, de Rondônia. 40,42,45,46<br />
O principal determinante da an<strong>em</strong>ia entre as crianças é a deficiência de<br />
nutrientes na alimentação, <strong>em</strong> especial o ferro, associada a uma necessidade<br />
aumentada desse mineral, <strong>em</strong> função do crescimento. Merec<strong>em</strong><br />
destaque entre os indígenas as doenças infecto<strong>para</strong>sitárias, sobretudo<br />
as <strong>para</strong>sitoses, e, <strong>em</strong> algumas comunidades, a malária. Entre as mulheres,<br />
as condições inadequadas das gestações e partos são agravantes. Em<br />
muitos casos, elas iniciam suas gestações anêmicas ou com baixas reservas<br />
de ferro. 44<br />
Quanto às outras carências nutricionais, são poucos os estudos entre<br />
os povos indígenas brasileiros. 44 Vieira Filho et al. relataram a ocorrência<br />
de dois casos de polineuropatia carencial entre os Xavante, decorrentes<br />
da deficiência da tiamina (vitamina B 1<br />
). Os quadros foram<br />
associados a uma dieta baseada quase exclusivamente <strong>em</strong> arroz beneficiado,<br />
resultado de mudanças na dieta desse grupo indígena e da introdução<br />
de alimentos industrializados. 64<br />
Pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Pública coordenaram<br />
o primeiro Inquérito Nacional de Saúde Indígena, que avaliou 6.707<br />
mulheres na faixa etária de 14 a 49 anos e 6.285 crianças menores de 5<br />
anos. Os resultados, divulgados <strong>em</strong> maio de 2010, corroboram pesquisas<br />
anteriores com os povos indígenas e mostram que 30,2% das mulheres<br />
indígenas avaliadas estão com sobrepeso e 15,7% foram classificadas<br />
como obesas. A hipertensão arterial teve a maior prevalência, 12,1%,<br />
entre as mulheres das regiões Sul e Sudeste. As crianças menores de 5<br />
anos apresentaram a maior prevalência de baixa estatura, 41,1%, na região<br />
Norte. A an<strong>em</strong>ia está presente <strong>em</strong> todas as regiões. As maiores prevalências<br />
foram encontradas na região Norte: 66% entre as crianças de<br />
6 a 59 meses e 46,9 e 44,8% entre as mulheres não grávidas e gestantes,<br />
respectivamente. 65
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
87<br />
Pela iniciativa governamental e abrangência nacional, essa pesquisa<br />
representa um marco na luta de pesquisadores, indígenas e indigenistas<br />
<strong>para</strong> dar visibilidade aos probl<strong>em</strong>as de saúde desses povos, apesar de<br />
suas limitações <strong>para</strong> retratar a situação de uma população tão diversa<br />
como a população indígena brasileira.<br />
A diversidade sociocultural, b<strong>em</strong> como a heterogeneidade dos perfis<br />
epid<strong>em</strong>iológicos e das relações de contato com a sociedade não indígena,<br />
além de dificultar generalizações, exige políticas públicas e ações<br />
diferenciadas e sensíveis às profundas transformações ambientais, econômicas,<br />
sociais e culturais que os povos indígenas estão vivenciando.<br />
ATENÇÃO DIFERENCIADA À SAÚDE DA POPULAÇÃO<br />
INDÍGENA BRASILEIRA: UMA CONQUISTA AINDA A SER<br />
CONSOLIDADA<br />
A Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas, implantada<br />
a partir de 1999 pela Lei Arouca (Lei n. 9.836, de 23 de set<strong>em</strong>bro de<br />
1999), garante aos indígenas o direito a um modelo de atenção diferenciada<br />
à saúde, configurando um Subsist<strong>em</strong>a de Atenção à Saúde, parte<br />
do Sist<strong>em</strong>a Único de Saúde (SUS), que deve respeitar a especificidade e<br />
a diversidade sociocultural dessa população e se baseia na implantação<br />
dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI), identificados como<br />
um modelo de organização de serviço <strong>em</strong> bases territoriais definidas segundo<br />
critérios étnicos, culturais, geográficos, administrativo e de distribuição<br />
d<strong>em</strong>ográfica tradicional 66 , que não necessariamente coincide<br />
com os limites de estados e municípios onde estão localizadas as TI.<br />
Após 11 anos da implantação do subsist<strong>em</strong>a de saúde indígena, ainda<br />
se está longe de colocar <strong>em</strong> prática o modelo de atenção diferenciada.<br />
Existe uma distância enorme entre o discurso oficial e a prática nos<br />
DSEI. 67 A imensa complexidade do subsist<strong>em</strong>a e de sua operacionalização<br />
carece de uma reflexão profunda e de novas estratégias de intervenção.<br />
Essa situação levou a propostas de mudanças na gestão, que culminaram,<br />
<strong>em</strong> 2010, com a saída da responsabilidade da gestão da saúde
88<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
indígena da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e a criação da Secretaria<br />
Especial de Saúde Indígena (Sesai) no Ministério da Saúde, antiga<br />
reivindicação do movimento indígena e indigenista. 68<br />
Em 2006, foi instituído o Sist<strong>em</strong>a de Vigilância Alimentar e Nutricional<br />
<strong>para</strong> os DSEI – Sisvan Indígena, por meio da Portaria Funasa<br />
n. 984, de 6 de julho. 69 Segundo a Funasa:<br />
O Sisvan Indígena permite conhecer como se apresentam os agravos<br />
nutricionais nesta população propondo medidas imediatas ao<br />
diagnóstico e medidas articuladas intersetorialmente, incluindo<br />
políticas e ações eficazes <strong>para</strong> todos ou <strong>para</strong> os grupos de maior<br />
vulnerabilidade. 70<br />
Atualmente, o programa ainda está focado na implantação de rotinas de<br />
vigilância nutricional <strong>em</strong> áreas indígenas voltadas <strong>para</strong> o registro de dados<br />
nutricionais e retroalimentação do sist<strong>em</strong>a. De modo geral, as informações<br />
não são disponibilizadas <strong>para</strong> as Equipes Multidisciplinares de<br />
Saúde Indígena (EMSI), que atuam nos DSEI, <strong>para</strong> auxiliar a avaliação, o<br />
monitoramento e o planejamento das ações de enfrentamento dos probl<strong>em</strong>as<br />
<strong>em</strong> âmbito local.<br />
Algumas ações realizadas pela Funasa merec<strong>em</strong> destaque, como a<br />
implantação do Curso de Especialização <strong>em</strong> Vigilância Alimentar e Nutricional<br />
por meio da parceria com a Escola Nacional de Saúde e a realização<br />
do Inquérito Nacional de Saúde e Nutrição dos Povos Indígenas,<br />
<strong>em</strong> parceria com o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à<br />
Fome. Entretanto, o enfrentamento da insegurança alimentar e nutricional<br />
dos povos indígenas d<strong>em</strong>anda avanços além dos programas de<br />
supl<strong>em</strong>entação alimentar e transferência de renda. A magnitude do probl<strong>em</strong>a<br />
exige projetos de segurança alimentar permanentes com ações<br />
intersetoriais e sustentáveis.<br />
De modo geral, as políticas públicas e as iniciativas da sociedade<br />
civil <strong>para</strong> enfrentamento da insegurança alimentar dos povos indígenas
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
89<br />
têm encontrado dificuldades <strong>para</strong> atingir os resultados esperados. Várias<br />
razões são apontadas <strong>para</strong> o insucesso desses programas e projetos,<br />
como: desrespeito à organização social, ao conhecimento dos grupos indígenas<br />
e às suas relações com os territórios; implantação como núcleos<br />
isolados; dificuldades <strong>para</strong> articulação intersetorial; não participação das<br />
comunidades indígenas no planejamento dos projetos e elaboração sob<br />
a lógica do modelo de desenvolvimento ocidental. 71,72<br />
Embora existam indígenas <strong>em</strong> situação de extr<strong>em</strong>a pobreza, <strong>em</strong><br />
que o combate imediato à fome é necessário por meio do fornecimento<br />
de alimentos ou de dinheiro <strong>para</strong> adquiri-los, é preciso avançar <strong>para</strong><br />
propostas que caus<strong>em</strong> impacto sobre os determinantes das precárias<br />
condições de vida da imensa maioria dos povos indígenas, que geram<br />
insegurança alimentar e aumentam a vulnerabilidade desses povos aos<br />
distúrbios nutricionais.<br />
BUSCANDO UM NORTE E SONHANDO EM<br />
TRANSFORMAR REALIDADES<br />
Este capítulo visa a apontar caminhos, mas s<strong>em</strong> a pretensão de ensinar<br />
a traçá-los completamente. A diversidade dos povos é imensa; muitos e<br />
diferentes caminhos dev<strong>em</strong> ser pensados e trilhados. O desejo maior é<br />
despertar o querer mudar a realidade dos povos indígenas e estimular<br />
sonhos transformadores de práticas, realidades e pessoas.<br />
Os profissionais das EMSI dev<strong>em</strong> ser protagonistas na construção<br />
de propostas <strong>para</strong> o enfrentamento dos probl<strong>em</strong>as de saúde das pessoas<br />
que estão sob seus cuidados. 73 Para tanto, dev<strong>em</strong> conhecer os determinantes<br />
e condicionantes da situação de insegurança alimentar dos povos<br />
com os quais trabalham; <strong>em</strong>poderar as comunidades, professores, mulheres<br />
e lideranças por meio da divulgação das informações relacionadas à<br />
situação de saúde das comunidades e seus determinantes, relativizando<br />
seus conhecimentos e valorizando os conhecimentos e cuidados tradicionais;<br />
capacitar os profissionais indígenas de saúde <strong>para</strong> o desenvolvimento<br />
de ações de enfrentamento dos probl<strong>em</strong>as de saúde <strong>em</strong> suas aldeias;
90<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
incentivar a participação de lideranças e profissionais indígenas nos espaços<br />
de debate; desenvolver ações efetivas <strong>para</strong> a melhoria das condições<br />
do pré-natal, parto, puerpério, acompanhamento de crescimento e desenvolvimento<br />
das crianças e da saúde dos adultos e idosos, com ênfase na<br />
vigilância da saúde das mulheres <strong>em</strong> idade fértil e das crianças <strong>em</strong> maior<br />
risco nutricional, acompanhamento das doenças prevalentes na população<br />
infantil e das DCNT entre os adultos; e agregar outros segmentos sociais,<br />
como mulheres, lideranças e profissionais da medicina tradicional<br />
<strong>para</strong> valorizar e legitimar os cuidados, as orientações, as ações de educação<br />
<strong>em</strong> saúde e vigilância da saúde desenvolvidas nas aldeias.<br />
Entretanto, as ações setoriais de saúde, isoladas, não apresentam a<br />
eficácia necessária <strong>para</strong> se enfrentar o cenário epid<strong>em</strong>iológico, garantir<br />
segurança nutricional e causar impacto positivo na vida dos povos indígenas.<br />
Desse modo, além da sensibilidade antropológica necessária <strong>para</strong><br />
que as ações e orientações tenham chances maiores de surtir<strong>em</strong> efeito, é<br />
fundamental a articulação das equipes de saúde com os professores indígenas<br />
e profissionais que trabalh<strong>em</strong> nas TI com questões relacionadas<br />
ao meio ambiente e à produção de alimentos. A intersetorialidade deve<br />
ser uma diretriz básica <strong>para</strong> o enfrentamento das questões nutricionais<br />
e alimentares.<br />
Nesse contexto, é fundamental a busca por alternativas às cestas básicas<br />
com carboidratos de absorção rápida dos alimentos industrializados,<br />
com altos valores calóricos e ricos <strong>em</strong> sódio, como elaboração de cestas<br />
básicas e cardápio das merendas das escolas indígenas compostas com alimentos<br />
in natura, s<strong>em</strong>ielaborados e que respeit<strong>em</strong> os hábitos alimentares<br />
e a experiência produtiva de cada local; e incentivo à produção de alimentos<br />
tradicionais nas áreas indígenas e à busca de fontes alternativas de proteínas<br />
de alto valor biológico que sejam culturalmente sustentáveis. Essas<br />
iniciativas dev<strong>em</strong> ser colocadas na pauta de discussão de gestores, profissionais<br />
das diversas áreas, inclusive da saúde, e das comunidades indígenas.<br />
Aumentar o número de pesquisas sobre a população indígena, priorizando<br />
estudos longitudinais e que cont<strong>em</strong>pl<strong>em</strong> a diversidade dessa
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
91<br />
população, é medida fundamental <strong>para</strong> tirar os indígenas da situação de<br />
invisibilidade a que historicamente estão submetidos.<br />
Urge, <strong>para</strong> se avançar no enfrentamento da insegurança alimentar<br />
e nutricional dos povos indígenas, a implantação de políticas públicas e<br />
ações que respeit<strong>em</strong> a diversidade cultural e a relação de contato desses<br />
povos com a sociedade não indígena. É fundamental o protagonismo das<br />
comunidades e o envolvimento das associações indígenas, da sociedade<br />
civil e do governo com a participação de todas as instituições que desenvolv<strong>em</strong><br />
políticas públicas voltadas <strong>para</strong> os povos indígenas e relacionadas<br />
aos fatores causais que levam à insegurança alimentar e nutricional<br />
dessa população. É preciso ampliar a discussão e incluir na pauta as<br />
questões territoriais, o saneamento, a educação, as alternativas econômicas<br />
e o desenvolvimento sustentável <strong>para</strong> as comunidades indígenas<br />
do país, buscando transformar a realidade e as condições de saúde desses<br />
povos.<br />
Conclui-se com a transcrição do diálogo do personag<strong>em</strong> Kindzu<br />
com o fantasma de seu pai, do <strong>livro</strong> Terra sonâmbula, do moçambicano<br />
Mia Couto:<br />
– O que andas a fazer com um caderno, escreves o quê?<br />
– N<strong>em</strong> sei, pai. Escrevo conforme vou sonhando.<br />
– E alguém vai ler isto?<br />
– Talvez.<br />
– É bom assim, ensinar alguém a sonhar.<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
1. Instituto Socioambiental. Povos Indígenas no Brasil. Disponível: http://pib.socioambiental.org/pt.<br />
2. Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Princípios e diretrizes<br />
de uma política de segurança alimentar. Brasília: CONSEA, 2004.<br />
3. Corrêa AMS. Insegurança alimentar medida a partir da percepção das pessoas.<br />
Estud Av 2007; 21(60):143-54.
92<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
4. Verdum R. Mapa da fome entre os povos indígenas no Brasil (II). In: INESC,<br />
PETI/MN, ANAI/BA, Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida,<br />
orgs. Mapa da Fome entre os povos indígenas no Brasil (II): contribuição à formulação<br />
de políticas de segurança alimentar sustentáveis. Brasília: Instituto de<br />
Estudos Sócio-Econômicos, 1995. p.7-15.<br />
5. Corrêa MLM. Situação de alimentação e nutrição dos Bororo da Terra Indígena<br />
Perigara: perspectivas de segurança alimentar. [Tese de Mestrado] Cuiabá: Universidade<br />
Federal de Mato Grosso, 2005.<br />
6. Fávaro T, Ribas DLB, Zorzatto JR, Segall-Corrêa AM, Panigassi G. Segurança<br />
alimentar <strong>em</strong> famílias indígenas Teréna, Mato Grosso do Sul, Brasil. Cad Saúde<br />
Pública 2007; 23(4):785-93.<br />
7. Fundação Nacional do Índio. Disponível <strong>em</strong>: www.funai.gov.br/index.html.<br />
8. Santos RV, Coimbra Jr. CEA. Cenários e tendências da saúde e da epid<strong>em</strong>iologia<br />
dos povos indígenas no Brasil. In: Coimbra Jr. CEA, Santos RV, Escobar AL<br />
(orgs.). Epid<strong>em</strong>iologia e saúde dos povos indígenas no Brasil. Rio de Janeiro:<br />
Fiocruz/Abrasco, 2003. p.13-47.<br />
9. H<strong>aqui</strong>m VM. Nutrição e alimentação dos povos indígenas: um desafio intercultural.<br />
CRN-3 Notícias 2008; 91:20-1.<br />
10. Leite MS. Sociodiversidade, alimentação e nutrição indígena. In: Barros DC,<br />
Silva DO, Gugelmin SA (orgs.). Vigilância alimentar e nutricional <strong>para</strong> a saúde<br />
indígena 1. Fundação Oswaldo Cruz. Escola Nacional de Saúde Sergio Arouca.<br />
Educação a Distância. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2007. p.181-210.<br />
11. Leite MS, Santos R, Coimbra Jr. CEA. Sazonalidade e estado nutricional de populações<br />
indígenas: o caso Wari’, Rondônia, Brasil. Cad Saúde Pública 2007;<br />
23(11):2631-42.<br />
12. Instituto Observatório Social. Povos indígenas ameaçados. Disponível <strong>em</strong>:<br />
http://www.observatoriosocial.org.br/portal/images/stories/publicacoes/er15-<br />
-povosindigenas.pdf.<br />
13. Giatti LL, Rocha AA, Toledo RF, Barreira LP, Rios L, Pelicioni MCF et al. Condições<br />
sanitárias e socioambientais <strong>em</strong> Iauaretê, área indígena <strong>em</strong> São Gabriel<br />
da Cachoeira, AM. Ciênc Saúde Coletiva 2007; 12(6):1711-23.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
93<br />
14. Pena JL, Heller L. Saneamento e saúde indígena: uma avaliação na população<br />
Xakriabá, Minas Gerais. Eng Sanit Ambient 2008; 13(1):63-72.<br />
15. Bóia MN, Carvalho-Costa FA, Sodré FC, Eyer-Silva WA, Lamas CC, Lyra MR<br />
et al. Mass treatment for intestinal helminthisis control in an Amazonian end<strong>em</strong>ic<br />
area in Brazil. Rev Inst Med Trop S Paulo 2006; 48(4):189-95.<br />
16. Carvalho-Costa FA, Gonçalves AQ, Lassance SL, Silva Neto LM, Salmazo CAA,<br />
Bóia MN. Giardia lamblia and other intestinal <strong>para</strong>sitic infections and their relationships<br />
with nutritional status in children in Brazilian Amazon. Rev Inst<br />
Med Trop 2007; 49(3):147-53.<br />
17. Aguiar JIA, Gonçalves AQ, Sodré FC, Pereira SR, Bóia MN, L<strong>em</strong>os ERS et al.<br />
Intestinal protozoa and helminths among Terena Indians in the State of Mato<br />
Grosso do Sul: high prevalence of Blastocystis hominis. Rev Soc Bras Med<br />
Trop 2007; 40(6):631-4.<br />
18. Rios L, Cutolo AS, Giatti LL, Castro M, Rocha AA, Toledo RF et al. Prevalência<br />
de <strong>para</strong>sitos intestinais e aspectos socioambientais <strong>em</strong> comunidade indígena<br />
no Distrito de Iauaretê, Município de São Gabriel da Cachoeira (AM), Brasil.<br />
Saude Soc 2007; 16(2):76-86.<br />
19. Palhano-Silva CS, Araújo AAJ, Lourenço AEP, Bastos OMP, Santos RV, Coimbra<br />
Jr CEA. Intestinal Parasitic Infection in the Suruí Indians, Brazilian Amazon.<br />
Interciencia 2009; 34:259-64.<br />
20. Toledo MJO, Paludetto AW, Moura FT, Nascimento ES, Chaves M, Araújo SM<br />
et al. Avaliação de atividades de controle <strong>para</strong> entero<strong>para</strong>sitos <strong>em</strong> uma aldeia<br />
Kaingáng do Paraná. Rev Saúde Públ 2009; 43(6):981-90.<br />
21. Moura FT, Falavigna DLM, Mota LT, Toledo MJO. Entero<strong>para</strong>site contamination<br />
in peridomiciliar soils of two indigenous territories, State of Paraná, southern<br />
Brazil. Rev Panam Salud Publica 2010; 27(6):414-22.<br />
22. Escobar-Pardo ML, Godoy AO, Machado RS, Rodrigues D, Neto UF, Kawakami<br />
E. Prevalência de <strong>para</strong>sitoses intestinais <strong>em</strong> crianças do Parque Indígena do<br />
Xingu. J Pediatr 2010; 86(6):493-6.<br />
23. Haverroth M, Escobar AL, Coimbra Jr CEA. Infecções intestinais <strong>em</strong> populações<br />
indígenas de Rondônia (Distrito Sanitário Especial Indígena Porto Velho).<br />
Porto Velho: Centro de Estudos <strong>em</strong> Saúde do Índio de Rondônia, Universidade
94<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Federal de Rondônia/Rio de Janeiro: Escola Nacional de Saúde Pública Sergio<br />
Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, 2003. (Documento de Trabalho, 8).<br />
24. Orellana JDY, Basta PC, Santos RV, Coimbra Jr CEA. Morbidade hospitalar <strong>em</strong><br />
crianças indígenas Suruí menores de dez anos, Rondônia, Brasil: 2000 a 2004.<br />
Rev Bras Saude Mater Infant 2007; 7(3):281-7.<br />
25. Cardoso AM, Coimbra Jr. CEA, Tavares FG. Morbidade hospitalar indígena<br />
Guarani no Sul e Sudeste do Brasil. Rev Bras Epid<strong>em</strong>iol 2010; 13(1):21-34.<br />
26. Santos ECO, Câmara VM, Brabo ES, Loureiro ECB, Jesus IM, Fayal K et al. Avaliação<br />
dos níveis de exposição ao mercúrio entre índios Pakaanóva, Amazônia,<br />
Brasil. Cad Saúde Públ 2003; 19(1):199-206.<br />
27. Dórea JG, Barbosa AC, Ferrari I, Souza JR. Fish consumption (Hair Mercury)<br />
and nutritional status of Amazonian Amer-Indian Children. American Journal<br />
of Human Biology 2005; 17(4):507-14.<br />
28. McCallum C. O corpo que sabe: da epist<strong>em</strong>ologia Kaxinawá <strong>para</strong> uma antropologia<br />
médica das terras baixa sul americanas. In: Alves PC, Rabelo MC (orgs.).<br />
Antropologia da saúde: traçando identidade e explorando fronteiras. Rio de Janeiro:<br />
Fiocruz; Relume Dumará, 1998. p.215-45.<br />
29. Mendonça SB. Saúde indígena: distância que aproxima. In: Ministério da Saúde.<br />
Secretaria de Atenção à Saúde. Política Nacional de Humanização. Textos<br />
Básicos de Saúde. Cadernos HumanizaSUS (2). Brasília: Ministério da Saúde,<br />
2010. p.179-94.<br />
30. Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS – Indicadores e dados básicos – 2009.<br />
Disponível <strong>em</strong>: http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=0201.<br />
31. Brasil. Fundação Nacional da Saúde – Funasa. Vigilância <strong>em</strong> saúde indígena:<br />
síntese dos Indicadores 2010. Brasília: Funasa, 2010.<br />
32. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância <strong>em</strong> Saúde. Departamento<br />
de Análise de Situação <strong>em</strong> Saúde. Saúde Brasil 2006: uma análise da situação de<br />
saúde no Brasil/Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância <strong>em</strong> Saúde, Departamento<br />
de Análise de Situação <strong>em</strong> Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2006.<br />
33. Brasil. Fundação Nacional de Saúde – Funasa. Relatório Anual de Atividades de<br />
Atenção Integral à Saúde Indígena – 2007. Fundação Nacional de Saúde – Brasília:<br />
Funasa, 2008.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
95<br />
34. Leite MS, Santos RV, Gugelmin SA, Coimbra Jr CEA. Crescimento físico e perfil<br />
nutricional da população indígena Xavánte de Sangradouro-Volta Grande,<br />
Mato Grosso, Brasil. Cad Saúde Pública 2006; 22(2):265-76.<br />
35. Saad MNL. Saúde e nutrição Terena: sobrepeso e obesidade [Dissertação de<br />
Mestrado]. Campo Grande: Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, 2005.<br />
36. Tavares FG. Epid<strong>em</strong>iologia da hipertensão arterial e níveis tensionais <strong>em</strong> adultos<br />
indígenas Suruí, Rondônia, Brasil [Dissertação de Mestrado]. Rio de Janeiro:<br />
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, 2010.<br />
37. Pagliaro H, Azevedo MM, Santos RV. D<strong>em</strong>ografia dos povos indígenas no<br />
Brasil: um panorama crítico. In: Pagliaro H, Azevedo MM, Santos RV, orgs.<br />
D<strong>em</strong>ografia dos povos indígenas no Brasil. Rio de Janeiro: Fiocruz/ABEP,<br />
2005. p.11-32.<br />
38. Ribas DLB, Philippi ST. Aspectos alimentares e nutricionais de mães e crianças<br />
indígenas Teréna, Mato Grosso do Sul. In: Coimbra Jr CEA, Santos RV, Escobar<br />
AL (orgs.). Epid<strong>em</strong>iologia e saúde dos povos indígenas no Brasil. Rio de Janeiro:<br />
Fiocruz/Abrasco, 2003. p.73-88.<br />
39. Viana Lima RV. Avaliação do estado nutricional da população indígena da comunidade<br />
Terra Preta, Novo Airão, Amazonas [Dissertação de Mestrado]. Manaus:<br />
Universidade Federal do Amazonas, 2004.<br />
40. Morais MB, Alves GMS, Fagundes-Neto U. Estado nutricional de crianças índias<br />
terenas: evolução do peso e estatura e prevalência atual de an<strong>em</strong>ia. J Pediatr<br />
2005; 81(5):383-9.<br />
41. Menegolla IA, Drachler ML, Rodrigues IH, Schwingel LR, Scapinello E, Pedroso<br />
MB et al. Estado nutricional e fatores associados à estatura de crianças da Terra<br />
Indígena Guarita, Sul do Brasil. Cad Saúde Públ 2006; 22(2):395-406.<br />
42. Orellana JDY, Coimbra Jr CEA, Lourenço AElP, Santos RV. Estado nutricional e<br />
an<strong>em</strong>ia <strong>em</strong> crianças Suruí, Amazônia, Brasil. J Pediatr 2006; 82(5):383-8.<br />
43. Pícoli RP, Carandina L, Ribas DLB. Saúde materno-infantil e nutrição de crianças<br />
Kaiowá e Guaraní, Área Indígena de Caarapó, Mato Grosso do Sul, Brasil.<br />
Cad Saúde Públ 2006; 22(1):223-7.
96<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
44. Leite MS, Santos RV, Coimbra Jr CEA, Gugelmin SA. Alimentação e nutrição<br />
de povos indígenas no Brasil. In: Kac G, Sichieri R, Gigante DP (orgs.). Epid<strong>em</strong>iologia<br />
nutricional. Rio de Janeiro: Fiocruz; Atheneu, 2007. p.503-17.<br />
45. Mondini L, Canó EM, Fagundes U, Lima EES, Rodrigues D, Baruzzi RG. Condições<br />
de nutrição <strong>em</strong> crianças Kamaiurá: povo indígena do Alto Xingu, Brasil<br />
Central. Rev Bras Epid<strong>em</strong>iol 2007; 10(1):39-47.<br />
46. Mondini L, Rodrigues DA, Gimeno SGA, Baruzzi RG. Estado nutricional e níveis<br />
de h<strong>em</strong>oglobina <strong>em</strong> crianças Aruak e Karibe: povos indígenas do Alto Xingu,<br />
Brasil Central, 2001-2002. Rev Bras Epid<strong>em</strong>iol 2009; 12(3):469-77.<br />
47. Kühl A, Corso ACT, Leite MS, Bastos JL. Perfil nutricional e fatores associados<br />
à ocorrência de desnutrição entre crianças indígenas Kaingáng da Terra Indígena<br />
de Mangueirinha, Paraná, Brasil. Cad Saúde Públ 2009; 25(2):409-20.<br />
48. Castro TG, Schuch I, Conde WL, Veiga J, Leite MS, Dutra CLC et al. Estado nutricional<br />
dos indígenas Kaingáng matriculados <strong>em</strong> escolas indígenas do Estado<br />
do Rio Grande do Sul, Brasil. Cad Saúde Públ 2010; 26(9):1766-76.<br />
49. Brasil. Ministério da Saúde. Pesquisa Nacional de D<strong>em</strong>ografia e Saúde da Criança<br />
e da Mulher – PNDS 2006: dimensões do processo reprodutivo e da saúde da<br />
criança/ Ministério da Saúde, Centro Brasileiro de Análise e Planejamento. Brasília:<br />
Ministério da Saúde, 2009.<br />
50. Sampei MA, Canó EN, Fagundes U, Lima EES, Rodrigues D, Sigul<strong>em</strong> DM et al.<br />
Avaliação antropométrica de adolescentes Kamayurá, povo indígena do Alto<br />
Xingu, Brasil Central (2000-2001). Cad Saúde Públ 2007; 23(6):1443-53.<br />
51. Gugelmin AS, Santos RV. Uso do índice de massa corporal na avaliação do estado<br />
nutricional de adultos indígenas Xavánte, Terra Indígena Sangradouro-Volta<br />
Grande, Mato Grosso, Brasil. Cad Saúde Púb 2006; 22(9):1865-72.<br />
52. Gimeno SGA, Rodrigues D, Pagliaro H, Cano EN, Lima EES, Baruzzi RG. Perfil<br />
metabólico e antropométrico de índios Aruák: Mehináku, Waurá e Yawalapití,<br />
Alto Xingu, Brasil Central, 2000/2002. Cad Saúde Pública 2007; 23(8):1946-54.<br />
53. Salvo VLMA, Rodrigues D, Baruzzi RG, Pagliaro H, Gimeno SGA. Perfil metabólico<br />
e antropométrico dos Suyá: Parque Indígena do Xingu, Brasil Central.<br />
Rev Bras Epid<strong>em</strong>iol 2009; 12(3):458-68.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
97<br />
54. Vieira Filho JPB. O diabetes mellitus e as glic<strong>em</strong>ias de jejum dos índios Caripuna<br />
e Palikur. Rev Assoc Med Bras 1977; 23:175-8.<br />
55. Vieira Filho JPB. Emergência do diabetes melito tipo II entre os Xavante. Rev<br />
Assoc Med Bras 1996; 42:61.<br />
56. Tavares EF, Vieira Filho JPB, Andriolo A, Franco LJ. Anormalidades de tolerância<br />
à glicose e fatores de risco cardiovascular <strong>em</strong> uma tribo indígena aculturada<br />
da região brasileira. Arquivos Brasileiros de Endocrinologia e Metabologia 1999;<br />
43(Sup.1):S235.<br />
57. Cardoso AM, Mattos IE, Koifman RJ. Prevalência de Diabetes Mellitus e da Síndrome<br />
de Resistência Insulínica nos Índios Guarani do Estado do Rio de Janeiro.<br />
In: Coimbra Jr CEA, Santos RV, Escobar AL (orgs.). Epid<strong>em</strong>iologia e saúde<br />
dos povos indígenas no Brasil. Rio de Janeiro: Fiocruz; Abrasco, 2003. p.169-85<br />
58. Cardoso AM, Mattos IE, Koifman RJ. Prevalência de fatores de risco <strong>para</strong> doenças<br />
cardiovasculares na população Guaraní-Mbyá do Estado do Rio de Janeiro.<br />
Cad Saúde Públ 2001; 17(2):345-54.<br />
59. Meyerfreund D. Estudo da hipertensão arterial e de outros fatores de risco cardiovascular<br />
nas comunidades indígenas do Espírito Santo – BR [Tese de Doutorado].<br />
Vitória: Universidade Federal do Espírito Santo, 2006.<br />
60. Sawaya AL. Desnutrição: conseqüências <strong>em</strong> longo prazo e efeitos da recuperação<br />
nutricional. Estud Av 2006; 20(58):147-58.<br />
61. Bismarck-Nasr EM, Frutuoso MFP, Gamabardella AMD. Efeitos tardios do baixo<br />
peso ao nascer. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum 2008; 18(1):98-103.<br />
62. Neel JV. Diabetes Mellitus: a “thrifty” genotype rendered detrimental by “progress”?.<br />
Am J Hum Genet 1962; 14:353-62.<br />
63. Vieira Filho JPB. Contribuição à Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI)<br />
e à Eletronorte (Norte Energia) <strong>para</strong> um avanço na assistência à saúde dos índios<br />
Paracanã do Xingu, Araweté, Assurini e Xikrin do Bacajá. 2011 (mimeo).<br />
64. Vieira Filho JPB, Oliveira ASB, Silva MRD, Amaral AL, Schultz RR. Polineuropatia<br />
nutricional entre índios Xavantes. Rev Assoc Med Bras 1997; 43(1):82-8.<br />
65. Brasil. Fundação Nacional da Saúde. I Inquérito Nacional de Saúde e Nutrição<br />
dos Povos Indígenas. 2010. Disponível <strong>em</strong>: http://www.funasa.gov.br/internet/<br />
desai/arquivos/Apresentacao_Iquerito_Funasa_11_05_10.
98<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
66. Brasil. Fundação Nacional da Saúde. Política Nacional de Atenção à Saúde dos<br />
Povos Indígena. Brasília: Funasa/Ministério da Saúde, 2002.<br />
67. Abril Indígena. Documento Final do V Acampamento Terra Livre. 2008. Disponível<br />
<strong>em</strong>: http://www.coiab.com.br/coiab.php?dest=lista&tipo=N&pagina=37.<br />
68. Rodrigues D, Mendonça S. Política Indigenista de Saúde. Texto de Apoio, Disciplina<br />
de Política e Organização dos Serviços de Saúde destinados aos Povos<br />
Indígenas. II Curso de Especialização <strong>em</strong> saúde Indígena. UAB/<strong>Unifesp</strong>, 2010.<br />
69. Brasil. Fundação Nacional da Saúde. Portaria n. 984 de 6 de julho de 2006. Brasília:<br />
Funasa/Ministério da Saúde, 2006. Disponível <strong>em</strong>: http://www.funasa.gov.<br />
br/internet/arquivos/vigisus/07_.pdf.<br />
70. Brasil. Fundação Nacional da Saúde. Norma técnica: vigilância alimentar e nutricional<br />
<strong>para</strong> os distritos sanitários especiais indígenas. Brasília: Funasa/Ministério<br />
da Saúde, 2006.<br />
71. Gugelmin SA. Políticas Públicas e intervenções nutricionais. In: Barros DC, Silva<br />
DO, Gugelmin SA (orgs.). Vigilância alimentar e nutricional <strong>para</strong> a saúde indígena<br />
1. Fundação Oswaldo Cruz. Escola Nacional de Saúde Sergio Arouca.<br />
Educação a Distância. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2007. p.237-55.<br />
72. Brand AJ, Colman RS, Costa RB. Populações indígenas e lógicas tradicionais de<br />
Desenvolvimento Local. Interações 2008; 9(2):171-9.<br />
73. Schaper M, Rodrigues D, Fregonezi R, Santos L. Atenção primária à saúde: mudando<br />
<strong>para</strong> reconstruir. Texto de Apoio, Disciplina de Intervenções Clínicas<br />
Voltadas <strong>para</strong> as Populações Indígenas Brasileiras. I Curso de Especialização<br />
<strong>em</strong> saúde Indígena. UAB/<strong>Unifesp</strong>, 2009.
ANTROPOMETRIA DE<br />
CRIANÇAS QUILOMBOLAS DE<br />
0 A 5 ANOS DE IDADE<br />
José Augusto de A. C. Taddei<br />
Fernando A. B. Colugnati<br />
Fernanda Cobayashi<br />
INTRODUÇÃO<br />
Os inquéritos antropométricos de abrangência nacional realizados no<br />
Brasil e <strong>em</strong> outros países s<strong>em</strong>pre tiveram como limitação a não inclusão,<br />
<strong>em</strong> seus planos amostrais, dos subgrupos infantis com maiores riscos nutricionais.<br />
Pertenc<strong>em</strong> a esses subgrupos não considerados nas amostras<br />
nacionais as crianças que viv<strong>em</strong> nas ruas, <strong>em</strong> favelas e <strong>em</strong> cortiços, as de<br />
famílias s<strong>em</strong> terra e s<strong>em</strong> teto, as crianças abrigadas <strong>em</strong> orfanatos e as que<br />
viv<strong>em</strong> <strong>em</strong> locais de difícil acesso, como as da região Norte, além das r<strong>em</strong>anescentes<br />
de etnias específicas, como os quilombolas e os indígenas.<br />
A não inclusão desses contingentes de crianças nos inquéritos leva<br />
a estimativas de prevalências de desnutrição mais otimistas que as realmente<br />
existentes, motivando afirmativas imprecisas de que as prevalências<br />
dos desvios antropométricos estariam dentro dos níveis de normalidade<br />
no país. Mais importante, no entanto, do que o erro introduzido<br />
pelo viés de seleção nas estimativas nacionais ou regionais é a invisibilidade<br />
dessas populações. As populações quilombolas são <strong>em</strong>bl<strong>em</strong>áticas<br />
como representantes dos brasileiros invisíveis e, consequent<strong>em</strong>ente, excluídos.<br />
Muitos não sabiam, até b<strong>em</strong> pouco t<strong>em</strong>po, de sua existência e
100<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
acreditavam que só faziam parte da história do Brasil, tendo desaparecido<br />
com a abolição da escravatura.<br />
Os dados apresentados a seguir representam o primeiro perfil das<br />
condições de saúde e nutrição dos menores de 5 anos residentes <strong>em</strong> comunidades<br />
quilombolas. São informações que pod<strong>em</strong> ser úteis <strong>para</strong> políticos,<br />
líderes e gerentes envolvidos <strong>em</strong> programas de promoção das<br />
condições de vida, no sentido de melhorar a cobertura e adequar as<br />
ações de forma a minimizar o sofrimento e as privações por que passam<br />
as crianças quilombolas.<br />
SITUAÇÃO ANTROPOMÉTRICA E NUTRICIONAL<br />
A Tabela 1 apresenta as prevalências das condições nutricionais, utilizando-se<br />
os pontos de corte clássicos de -2 escores z <strong>para</strong> déficit e +2<br />
<strong>para</strong> excesso, segundo os padrões da Organização Mundial da Saúde<br />
(OMS) e do National Center for Health Statistics (NCHS). Observa-se<br />
que a maior prevalência é a do déficit altura/idade: 11,6% quando se utiliza<br />
o padrão NCHS e 15% com a população padrão da OMS. Em seguida,<br />
a relação peso/idade apresenta prevalências de 8,1 e 5,9%, considerando<br />
as populações de referência do NCHS e da OMS, respectivamente. No<br />
entanto, como esperado, <strong>para</strong> relação peso/altura, tais prevalências de<br />
déficit ca<strong>em</strong> bastante, sendo a estimativa de aproximadamente 2% <strong>para</strong><br />
ambas as populações de referência. 1-4<br />
TABELA 1<br />
Prevalências dos indicadores antropométricos de crianças quilombolas<br />
menores de 5 anos de idade considerando as populações de referência do NCHS 1 e<br />
da OMS 1977 e 2005 3,4<br />
ÍNDICES N DÉFICIT EUTROFIA EXCESSO<br />
NCHS/OMS 2.723<br />
Altura/idad e 11,6 87,6 0,8<br />
Peso/idade 8,1 89,5 2,4<br />
(continua)
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
101<br />
(continua)<br />
Peso/altura 2 94 3,9<br />
OMS<br />
2.725 a<br />
Altura/idade 15 84,2 0,8<br />
Peso/idade 5,9 92,1 2,1<br />
Peso/altura 1,9 92,7 5,4<br />
a Plausíveis <strong>para</strong> população de referência da WHO.<br />
4<br />
De acordo com a Tabela 1, pode-se dizer que a população estudada<br />
não apresenta situação preocupante do ponto de vista da desnutrição aguda.<br />
No entanto, deve-se atentar <strong>para</strong> o fato de que crianças com quadros<br />
agudos que se associam aos déficits de peso <strong>para</strong> estatura geralmente não<br />
participam dos inquéritos como o <strong>aqui</strong> realizado; permanec<strong>em</strong> <strong>em</strong> seus domicílios<br />
ou buscam assistência médica. É possível, portanto, que a desnutrição<br />
aguda esteja subestimada nesse estudo. Por sua vez, é evidente o quadro<br />
de retardo de desenvolvimento <strong>em</strong> razão da desnutrição crônica medida<br />
pelos déficits de altura/idade. Tal ocorrência torna-se ainda mais preocupante<br />
ao se atentar <strong>para</strong> o fato de que as crianças estudadas são as sobreviventes.<br />
Essas prevalências seriam ainda maiores se foss<strong>em</strong> considerados os<br />
vieses de sobrevivência a que estão sujeitos os estudos transversais. 5,6<br />
Com<strong>para</strong>ndo-se essa população à das crianças da amostra da Chamada<br />
Nutricional do S<strong>em</strong>iárido, nota-se que estão <strong>em</strong> situação um pouco<br />
mais desfavorável (Figura 1). Observa-se que as crianças quilombolas<br />
estão <strong>em</strong> situação s<strong>em</strong>elhante às do Nordeste urbano brasileiro de 1996,<br />
segundo dados da Pesquisa Nacional de D<strong>em</strong>ografia e Saúde (PNDS). 7<br />
Ainda na Tabela 1, que apresenta as prevalências de desvios nutricionais,<br />
vale ressaltar os excessos no índice peso/altura. Apesar de não<br />
ser o critério mais adequado <strong>para</strong> a classificação de obesidade da faixa<br />
etária estudada, as prevalências de aproximadamente 5% mostram quadro<br />
s<strong>em</strong>elhante aos encontrados <strong>em</strong> centros urbanos. Evidenciam que,<br />
também entre as crianças quilombolas, já coexist<strong>em</strong> o retardo de crescimento<br />
e os excessos de peso <strong>para</strong> a altura.
102<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
FIGURA 1 Prevalências estimadas dos déficits nutricionais entre populações<br />
quilombolas e outras populações infantis <strong>em</strong> situação de insegurança alimentar,<br />
segundo o padrão NCHS.<br />
30<br />
25<br />
25,2<br />
20<br />
%<br />
15<br />
10<br />
11,6<br />
8,2<br />
13<br />
7<br />
10,1<br />
6,6 5,6<br />
2,8<br />
5<br />
2<br />
3,2<br />
2,3<br />
0<br />
Quilombolas, 2006 S<strong>em</strong>iárido, 2005 NE urbano, 1996 NE rural, 1996<br />
Déficit A/I Déficit P/I Déficit P/A<br />
A/I: altura/idade; P/I: peso/idade; P/A: peso/altura; NE: Nordeste.<br />
Na Tabela 2, as prevalências de déficits são analisadas de acordo<br />
com variáveis biológicas e condições de nascimento e de cuidados básicos<br />
de saúde na infância. São marcantes as diferenças de prevalências<br />
entre crianças nascidas <strong>em</strong> condições adequadas quando com<strong>para</strong>das<br />
às menos favorecidas. Para crianças nascidas com peso menor de 3 kg,<br />
mediana estimada na amostra, nota-se 18,1% de déficit de altura/idade,<br />
com<strong>para</strong>do com 7,4% <strong>para</strong> crianças nascidas <strong>em</strong> melhores condições<br />
nutricionais. Situação similar se observa <strong>para</strong> o índice de peso/idade,<br />
<strong>em</strong> que as mesmas prevalências nos grupos contrastantes de peso<br />
ao nascer são 14,3 e 4,6%, respectivamente. Esse padrão de diferenças<br />
se repete quando se observam atendimento e frequência aos exames<br />
pré-natal.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
103<br />
TABELA 2 Prevalência de déficits antropométricos, segundo variáveis biológicas,<br />
de condições de nascimento e atenção básica à saúde<br />
VARIÁVEIS<br />
ALTURA/IDADE<br />
PESO/IDADE<br />
PESO/ALTURA<br />
(N = 316) 11,6%<br />
(N = 224) 8,1%<br />
(N = 55) 2%<br />
N % N % N %<br />
Sexo da criança 2.723<br />
Masculino 176 12,8 112 8,1 29 2,1<br />
F<strong>em</strong>inino 140 10,4 112 8,2 26 1,9<br />
Idade (anos) 2.723<br />
0 40 7,3 28 5 8 1,4<br />
1 84 14,6 60 10,4 22 3,8<br />
2 64 12 56 10,5 9 1,7<br />
3 65 12,7 40 7,8 6 1,2<br />
4 63 11,7 40 7,4 10 1,9<br />
Faixa etária 2.723<br />
0 a 5 meses 6 2,9 2 1 0 0<br />
6 a 11 meses 27 9,4 21 7,3 7 2,4<br />
12 a 35 meses 151 13,5 116 10,3 20 2,5<br />
Maiores de 36 meses 132 11,9 85 7,7 20 1,8<br />
Fez pré-natal 1.203<br />
Sim 116 10,4 81 7,2 28 2,5<br />
Não 13 17,3 10 13,3 1 1,3<br />
Consultas no pré-natal 955<br />
Até 4 consultas 29 12,3 27 11,2 7 2,9<br />
5 ou mais consultas 70 9,8 46 6,4 15 2,1<br />
Peso ao nascer 2.231<br />
Até 3 kg 136 18,1 108 14,3 23 3,1<br />
Acima de 3 kg 110 7,4 68 4,6 20 1,3<br />
T<strong>em</strong>po de aleitamento total 497<br />
Até 6 meses 33 13,3 20 8 4 1,6<br />
Acima de 6 meses 28 11,3 24 9,7 8 3,2<br />
(continua)
104<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
(continuação)<br />
T<strong>em</strong>po de aleitamento<br />
1.007<br />
exclusivo<br />
Até 3 meses 66 11,7 48 8,5 8 1,6<br />
Acima de 3 meses 43 9,7 33 7,4 12 2,7<br />
Número de refeições<br />
De 0 a 2 anos 1.824<br />
Até 3 refeições 65 17,8 54 14,8 17 4,7<br />
Mais de 3 refeições 164 11,2 105 7,2 25 1,7<br />
De 3 a 11 anos 2.312<br />
Até 3 refeições 129 15,6 100 12,1 23 2,8<br />
Mais de 3 154 10,4 99 6,7 21 1,4<br />
Acima de 11 anos 2.473<br />
Até 3 refeições 212 13,6 139 8,9 32 2,1<br />
Mais de 3 82 9 64 7 18 1,9<br />
Analisando-se a situação nutricional <strong>em</strong> vista de fatores socioeconômicos,<br />
constata-se, mais uma vez, que a população menos favorecida<br />
é a que apresenta as maiores prevalências de déficits (Tabela 3). Segundo<br />
classificação <strong>para</strong> nível socioeconômico pelo critério da Associação<br />
Brasileira dos Institutos de Pesquisa de Mercado (Abip<strong>em</strong>e) 8 , observa-<br />
-se que as prevalências são cerca de 3 vezes maiores no nível E, <strong>em</strong> com<strong>para</strong>ção<br />
com os d<strong>em</strong>ais níveis. Ex<strong>em</strong>plificando, a prevalência de retardo<br />
de crescimento na classe E é estimada <strong>em</strong> 15,6%, enquanto <strong>para</strong> a classe<br />
D é de 5,6%. A maior concentração da população no nível mais baixo<br />
poderia levar à estimativa das prevalências subestimadas <strong>para</strong> os níveis<br />
socioeconômicos mais altos. No entanto, quando se analisam as d<strong>em</strong>ais<br />
associações com variáveis de condições de moradia, saneamento e alimentação,<br />
essa relação se mantém. As prevalências dos déficits são s<strong>em</strong>pre<br />
maiores <strong>para</strong> a população residente <strong>em</strong> domicílios s<strong>em</strong> luz, com esgoto<br />
a céu aberto e s<strong>em</strong> rede pública de abastecimento de água.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
105<br />
TABELA 3 Prevalência de déficits antropométricos, segundo variáveis<br />
sociod<strong>em</strong>ográficas<br />
VARIÁVEIS N = 2.723 ALTURA/IDADE<br />
Sexo do chefe da família 2.715<br />
(N = 316) 11,6%<br />
PESO/IDADE<br />
(N = 224) 8,1%<br />
PESO/ALTURA<br />
(N = 55) 2%<br />
Masculino 90 12,5 161 8,5 11 1,5<br />
F<strong>em</strong>inino 226 11,3 161 8 44 2,2<br />
T<strong>em</strong>po de escolaridade<br />
do chefe da família<br />
Até 4 anos 220 13,1 160 9,6 40 2,4<br />
Mais de 4 anos 86 8,9 56 5,8 13 1,4<br />
T<strong>em</strong>po de escolaridade<br />
2.369<br />
2.289<br />
da mãe<br />
Até 4 anos 167 13,7 125 10,3 33 2,7<br />
Mais de 4 anos 101 8,8 67 5,8 16 1,4<br />
Classificação<br />
(Abip<strong>em</strong>e) 8<br />
socioeconômica<br />
B + C 14 7,2 9 4,6 3 1,6<br />
D 42 5,6 26 3,5 9 1,2<br />
E 242 14,9 178 10,9 39 2,4<br />
Luz no domicílio 2.698<br />
Sim 228 10,6 153 7 37 1,7<br />
Não 85 15,4 69 12,5 17 3,1<br />
Tipo de esgoto sanitário<br />
2.715<br />
da casa<br />
Rede pública 3 3,3 3 3,3 2 2,2<br />
Fossa séptica 55 7,4 39 5,1 11 1,6<br />
Fossa rudimentar 92 15,8 66 11,2 13 2,2<br />
Vala/céu aberto 162 12,7 116 9,1 29 2,3<br />
Não sabe 3 18,8 0 0 0 0<br />
(continua)
106<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
(continuação)<br />
Fonte de água que a<br />
2.714<br />
criança utiliza <strong>para</strong><br />
beber<br />
Rede pública 78 10,2 53 6,9 15 1,9<br />
Poço/cacimba/barreiro 143 13,7 100 9,6 18 1,7<br />
Cisterna/água da chuva 23 13,1 13 7,8 4 2,4<br />
Outros 71 9,7 58 7,9 18 2,5<br />
A água de beber da<br />
2.691<br />
criança é tratada no<br />
domicílio?<br />
Sim 183 10,6 134 7,7 44 2,5<br />
Não 130 13,6 88 9,1 12 1,2<br />
Não sabe 1 11,1 1 11,1 0 0<br />
Tratamento da água de<br />
2.697<br />
beber da criança<br />
Filtrada 72 9,2 64 8,1 25 3,2<br />
Clorada/hipoclorito 87 11,6 56 7,5 16 2,1<br />
Fervida 28 14,1 16 8,1 4 2<br />
Não se aplica 131 13,2 88 8,8 11 1,1<br />
DISCUSSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />
Embora limitado, como todo inquérito transversal, a Chamada Nutricional<br />
Quilombola é a linha de base a partir da qual deve ser construído<br />
o conhecimento sobre as condições de nutrição e saúde das crianças<br />
quilombolas. Com a repetição periódica desse estudo, pod<strong>em</strong> ser<br />
definidas tendências dos desvios nutricionais e estimadas efetividades<br />
de políticas e programas. Tais melhorias dev<strong>em</strong> ocorrer não só a partir<br />
de recursos externos às comunidades, mas também potencializando<br />
competências e recursos locais na construção de grupamentos sociais<br />
autossustentáveis.
I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />
107<br />
Os indicadores antropométricos não traduz<strong>em</strong> somente as condições<br />
de nutrição da população infantil, são também indicadores relevantes<br />
do desenvolvimento humano de um grupamento populacional.<br />
Em especial, o retardo no crescimento é bastante sensível a melhorias<br />
das condições de vida e pode ser um importante indicador das melhorias<br />
ocorridas entre essas populações nos próximos anos.<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
1. Hamill PV, Drizd TA, Johnson CL, Reed RB, Roche AF. NCHS growth curves<br />
for children birth-18 years. Vital Health Stat 11 1977; 165:i-iv,1-74.<br />
2. World Health Organization. Anthro 2005, Beta version Feb 17th, 2006: Software<br />
for assessing growth and development of the world’s children. Genebra:<br />
WHO, 2006a. Disponível <strong>em</strong>: http://www.who.int/childgrowth/software/en/.<br />
3. World Health Organization. Multicentre Growth Reference Study Group. Enrolment<br />
and baseline characteristics in the WHO Multicentre Growth Reference<br />
Study. Acta Paediatrica Suppl<strong>em</strong>entum 2006b; 450:7-15.<br />
4. WHO. Physical Status: The use and interpretation of anthropometry. Report<br />
of a WHO Expert Committee. (WHO technical report series, 854.) Genebra:<br />
WHO, 1995.<br />
5. Oliveira O, Taddei JAAC. Efeito dos vieses de sobrevivência nas prevalências da<br />
desnutrição <strong>em</strong> crianças no sexto ano de vida. Brasil PNSN, 1989. Cad Saúde<br />
Pública 1998; 14(3):493-9.<br />
6. Boerma JT, Sommerfeld AE, Bicego GT. Child anthropometry in cross-sectional<br />
surveys in developing countries: an assessment of the survivor bias. Amer J<br />
Epid<strong>em</strong>iol 1992; 135:438-49.<br />
7. B<strong>em</strong>fam – Sociedade Civil B<strong>em</strong>-Estar Familiar no Brasil. PNDS: Pesquisa Nacional<br />
sobre D<strong>em</strong>ografia e Saúde. Rio de Janeiro: B<strong>em</strong>fam, 1996.<br />
8. Associação Brasileira de Empresas de Pesquisas. Critério de Classificação Econômica<br />
Brasil. São Paulo, 2003. Disponível <strong>em</strong>: http://www.abep.org. Acessado<br />
<strong>em</strong>: 1/1/2007.
II JORNADA DE PROPAGANDA<br />
DE ALIMENTOS E OBESIDADE NA<br />
INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA<br />
26 de março de 2008<br />
Teatro Marcos Lindenberg – <strong>Unifesp</strong>
A EPIDEMIA DA OBESIDADE<br />
E A PUBLICIDADE DE ALIMENTOS<br />
José Augusto de A. C. Taddei<br />
Giovana Longo-Silva<br />
Maysa Helena de Aguiar Toloni<br />
PERFIL NUTRICIONAL BRASILEIRO<br />
Com o advento da industrialização, mudanças significativas ocorreram<br />
nos mais diversos segmentos da economia mundial, no estilo de vida e<br />
nos hábitos alimentares da população. 1<br />
A sociedade cont<strong>em</strong>porânea converge <strong>para</strong> um padrão dietético caracterizado<br />
por alimentos de alta densidade energética com altos teores<br />
de sal, gorduras totais, colesterol, carboidratos refinados e baixos teores<br />
de ácidos graxos insaturados e fibras. Tais mudanças alimentares, aliadas<br />
à rotina de vida sedentária e à falta de t<strong>em</strong>po <strong>para</strong> preparo e consumo<br />
de refeições, levando ao aumento do consumo de produtos industrializados,<br />
resultam no crescimento da obesidade e no aparecimento<br />
cada vez mais precoce de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT). 2<br />
Decorrente da falta de t<strong>em</strong>po e do aumento da participação f<strong>em</strong>inina<br />
no mercado de trabalho, a alimentação realizada fora de casa (bares, restaurantes,<br />
redes de fast-food e vendedores ambulantes) teve um importante<br />
crescimento, representando, atualmente, 25% dos gastos totais das<br />
famílias com alimentação. Como consequência, o número de restaurantes<br />
no Brasil saltou de 320 mil, <strong>em</strong> 1980, <strong>para</strong> 817 mil, <strong>em</strong> 2000. 1
112<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Concomitant<strong>em</strong>ente a essas mudanças, a sociedade cont<strong>em</strong>porânea<br />
caracteriza-se pela redução da prática de atividade física espontânea,<br />
denominada como toda e qualquer movimentação corporal que<br />
promova gasto energético, o que t<strong>em</strong> sido intensamente reduzido com<br />
o aumento das atividades de lazer passivas, caracterizadas pela substituição<br />
das brincadeiras ativas, como jogar bola, <strong>em</strong>pinar pipa e correr,<br />
por jogos eletrônicos. 3<br />
Esse contexto resulta na elevação das prevalências de sobrepeso<br />
e obesidade, fatores de risco importantes <strong>para</strong> a ocorrência de DCNT,<br />
como d<strong>em</strong>onstra a Figura 1, que reflete a tendência da prevalência de excesso<br />
de peso <strong>em</strong> crianças menores de 5 anos, adolescentes e adultos, e<br />
a estimativa de prevalência <strong>para</strong> o ano de 2016, caso a velocidade de aumento<br />
do excesso de peso permaneça constante. 4-7<br />
FIGURA 1 Tendência secular da prevalência (%) de excesso de peso <strong>em</strong> menores de<br />
5 anos de idade, adolescentes e adultos.<br />
16,6<br />
5,7<br />
4,4<br />
4,4<br />
9,6<br />
7,6<br />
5,3<br />
13,9<br />
10,7<br />
7,3<br />
15,2<br />
13<br />
7,8<br />
14,6<br />
8,3<br />
Menores de<br />
cinco anos<br />
Adolescentes<br />
Adultos<br />
1974 1989 1996 2006 2016<br />
Fonte: IBGE, 1978 4 ; IBGE, 1989 5 ; IBGE, 1999 6 ; PNDS, 2006. 7
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
113<br />
Portanto, entre as crianças menores de 5 anos, houve o aumento<br />
de 4,4%, <strong>em</strong> 1974, <strong>para</strong> 7,8%, <strong>em</strong> 2006 e, se a progressão permanecer incessante,<br />
<strong>em</strong> 10 anos, essa proporção terá aumentado <strong>para</strong> 8,3%. Já entre<br />
os adolescentes, ocorreu aumento de 4,1% <strong>para</strong> 15,2% entre 1974 e 2006,<br />
estimando-se que <strong>em</strong> 2016 serão obesos 16,6% dos adolescentes no país.<br />
Para os adultos, observa-se aumento de 5,7%, <strong>em</strong> 1974, <strong>para</strong> 14,6%, <strong>em</strong><br />
2006, podendo-se atingir, caso esse valor se mantenha constante, 14,6%<br />
<strong>em</strong> 2016. Resumindo, <strong>em</strong> 2016, <strong>em</strong> torno de 1 <strong>em</strong> cada 10 crianças e 1 <strong>em</strong><br />
cada 7 adolescentes e adultos brasileiros serão obesos.<br />
As estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam<br />
que 48% dos anos potenciais de vida saudável perdidos (APVSP)<br />
ocorr<strong>em</strong> <strong>em</strong> consequência de doenças crônicas, como cardiovasculares,<br />
câncer e diabetes, 39% <strong>em</strong> consequência de doenças transmissíveis,<br />
condições maternas perinatais e deficiências nutricionais e 13% decorrente<br />
de acidentes e violência. 8<br />
As DCNT possu<strong>em</strong> algumas características peculiares: levam décadas<br />
<strong>para</strong> se estabelecer, tendo sua orig<strong>em</strong> na infância e na juventude;<br />
<strong>em</strong> virtude de sua longa duração, exist<strong>em</strong> muitas possibilidades <strong>para</strong><br />
prevenção; e o tratamento <strong>em</strong> geral é de longa duração, complexo e caro.<br />
A determinação das causas dessas enfermidades engloba fatores<br />
socioeconômicos, culturais, políticos e ambientais, como a globalização,<br />
a urbanização e o envelhecimento populacional, compostos por<br />
fatores de risco modificáveis, como dietas geradoras de doenças, inatividade<br />
física e tabagismo. Consequent<strong>em</strong>ente, t<strong>em</strong>-se hipertensão arterial,<br />
hiperglic<strong>em</strong>ia, dislipid<strong>em</strong>ia, sobrepeso e obesidade. Isso, por sua<br />
vez, leva ao aparecimento das DCNT, como doenças cardiovasculares,<br />
acidente vascular encefálico, câncer, doenças respiratórias crônicas e<br />
diabetes. 8<br />
Anualmente, o Sist<strong>em</strong>a Único de Saúde (SUS) gasta cerca de 1,2 bilhão<br />
de reais com tratamento do sobrepeso, obesidade e suas consequências.<br />
Tais gastos são decorrentes do aumento do consumo de medicamentos,<br />
dos procedimentos diagnósticos e das internações por obesidade mórbida,
114<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
hipertensão, acidente vascular encefálico, infarto do miocárdio, diabetes,<br />
câncer de cólon e colelitíase. 9<br />
No mundo, 7,1 milhões de pessoas morr<strong>em</strong> a cada ano <strong>em</strong> decorrência<br />
da hipertensão arterial; 2,6 milhões como consequência do sobrepeso<br />
e obesidade e 4,4 milhões <strong>em</strong> decorrência de níveis totais de colesterol<br />
elevados. No Brasil, as DCNT são causas de 32,2% das mortes.<br />
Essa realidade poderia ser revertida e controlada por meio da adoção de<br />
práticas alimentares saudáveis e redução do sedentarismo. 8<br />
Esses dados são mais uma evidência de que a sociedade cont<strong>em</strong>porânea,<br />
<strong>em</strong> decorrência da falta de t<strong>em</strong>po <strong>para</strong> o preparo de suas refeições,<br />
é tentada a adquirir alimentos prontos <strong>para</strong> o consumo disponibilizados<br />
pela indústria. 2,10 O cerne da questão é que a população os<br />
adquire <strong>em</strong> um contexto mercadológico, otimizado por propaganda<br />
ostensiva, <strong>em</strong> detrimento da saúde e da nutrição, prejudicadas pelo consumo<br />
excessivo e rotineiro desses alimentos. 3<br />
PUBLICIDADE DE ALIMENTOS<br />
A indústria alimentícia investe fort<strong>em</strong>ente na divulgação de produtos<br />
de alta densidade energética <strong>para</strong> crianças e adolescentes, que os incorporam<br />
<strong>em</strong> suas dietas e tend<strong>em</strong> a se manter como consumidores<br />
fiéis a esses hábitos de consumo por longos períodos, transmitindo-<br />
-os a seus filhos. Embora sejam alimentos potencialmente causadores<br />
de obesidade, esses produtos geralmente aparec<strong>em</strong> nas propagandas<br />
associados a saúde, beleza, b<strong>em</strong>-estar, juventude, energia e prazer.<br />
As crianças nascidas após os anos 1980 estão sendo progressivamente<br />
mais expostas aos efeitos nocivos da propaganda enganosa de alimentos<br />
que promov<strong>em</strong> hábitos alimentares obesogênicos, aumentando os<br />
riscos de desenvolvimento precoce das DCNT associadas à obesidade<br />
e ao sedentarismo. 3,11,12<br />
A exposição frequente às propagandas veiculadas na televisão<br />
exerce grande influência sobre os hábitos alimentares, além de promover<br />
o sedentarismo. Assistindo à televisão, uma criança pode aprender
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
115<br />
concepções incorretas sobre o que é um alimento saudável. O próprio hábito<br />
de assistir à televisão está diretamente relacionado a pedidos, compras<br />
e consumo de alimentos anunciados. Uma vez que a maioria dos alimentos<br />
anunciados possui elevados teores de gorduras, óleos, açúcares e<br />
sal, contribui <strong>para</strong> mudança nos hábitos alimentares de crianças e agrava<br />
o probl<strong>em</strong>a da obesidade na população. 13-15<br />
Há grande influência da propaganda, veiculada principalmente<br />
pela televisão, visto que os produtos industrializados são alvos de intensas<br />
campanhas publicitárias, além do forte investimento promocional<br />
que receb<strong>em</strong> nos pontos de comercialização. 3 Alguns estudos citam<br />
a influência da publicidade sobre a confiança que as mães depositam nos<br />
produtos apresentados nos comerciais, principalmente <strong>em</strong> razão da falta<br />
de conhecimento. Nesse contexto, Almeida et al. 13 avaliaram 1.395 anúncios<br />
de produtos alimentícios veiculados na televisão e descobriram que<br />
cerca de 60% estão no grupo da pirâmide alimentar representado por gorduras,<br />
óleos, açúcares e doces, além da ausência de publicidade <strong>para</strong> frutas<br />
e hortaliças.<br />
Estudo de 2007 desenvolvido pela Universidade Federal de São<br />
Paulo (<strong>Unifesp</strong>) analisou os comerciais veiculados <strong>em</strong> programação infantil<br />
de canais abertos da TV brasileira. Surpreendent<strong>em</strong>ente, os alimentos<br />
constituíram 10% de todas as propagandas veiculadas. A pesquisa<br />
verificou que, entre as propagandas de alimentos, cerca de 45%<br />
correspondiam a guloseimas (chocolates, bolachas recheadas, balas, gomas<br />
de mascar, salgadinhos e sorvetes), 22,5%, a institucionais (lanches<br />
de redes de fast-food), 18%, a bebidas não lácteas (refrigerantes, sucos),<br />
9%, a cereais (cereais matinais e pães), 4%, a bebidas lácteas (iogurtes,<br />
bebidas achocolatadas), 0,5%, a alimentos pré-pre<strong>para</strong>dos (macarrão<br />
instantâneo, hambúrgueres) e 1%, a outros. 16<br />
O Brasil é o recordista mundial na quantidade de horas que as<br />
crianças assist<strong>em</strong> à televisão por dia: 4 horas e 51 minutos. Essa quantidade<br />
é maior que a média norte-americana, e é ainda mais assustadora<br />
se for observado que 80% da programação a que assist<strong>em</strong> é formatada
116<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
<strong>para</strong> o público adulto. 17 Nesse sentido, parece evidente que a presença<br />
da televisão no cotidiano das crianças brasileiras t<strong>em</strong> substituído experiências<br />
importantes <strong>para</strong> seu desenvolvimento, como o fortalecimento<br />
dos laços familiares e a criação de vínculos sociais. Portanto, visando à<br />
reversão de tal quadro, é imprescindível a criação de ações que estimul<strong>em</strong><br />
uma dieta equilibrada <strong>para</strong> toda a família, associada a brincadeiras<br />
e atividades físicas, com estratégias de lazer atraentes e prazerosas <strong>em</strong><br />
substituição à televisão, ao computador e ao consumo de dietas pouco<br />
saudáveis. 13,18,19<br />
As crianças brasileiras receb<strong>em</strong>, <strong>em</strong> média, R$ 28,60 de mesada, o<br />
que, no universo infantil brasileiro, significa R$ 69.237.069,00, a cada<br />
mês. O mercado infantil, no ano de 2004, movimentou 5 bilhões de reais<br />
com consumo de fast-food e, <strong>em</strong> 2006, o mercado publicitário infantil<br />
investiu, só <strong>em</strong> produtos infantis, 209,7 milhões de reais. Em recente<br />
pesquisa, ao ser<strong>em</strong> perguntadas <strong>em</strong> que mais gastam seu dinheiro, as<br />
guloseimas foram citadas por 73% das crianças entrevistadas, os salgadinhos<br />
por 47%, os sorvetes por 44% e as bebidas por 29%, ou seja, <strong>para</strong><br />
o público infantil, alimentos e bebidas têm maior apelo do que até mesmo<br />
os brinquedos. 20<br />
Para documentar a hipótese de que são prevalentes os erros alimentares<br />
desde a infância, realizou-se um estudo transversal com 270<br />
crianças que frequentavam berçários de creches públicas do município<br />
de São Paulo. Constatou-se que aproximadamente 67% dos pais ofereceram<br />
alimentos industrializados ainda no primeiro ano de vida, sendo<br />
que foram os filhos de mães com baixa escolaridade, mais jovens e<br />
com menor renda os mais suscetíveis aos erros alimentares. A Tabela 1<br />
apresenta o número e a frequência acumulada (%) das crianças estudadas,<br />
segundo faixa etária de introdução dos alimentos industrializados<br />
e de consumo tradicional. Fica evidente que cerca de 3 <strong>em</strong> cada 4 crianças,<br />
ao completar<strong>em</strong> 12 meses, já haviam consumido todos os tipos de<br />
alimentos considerados. 21 Contudo, o consumo precoce desses alimentos<br />
contraria as normas do Ministério da Saúde. 22
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
117<br />
TABELA 1 Distribuição de crianças, segundo a introdução de alimentos industrializados e de uso tradicional e faixa etária<br />
IDADE DE INTRODUÇÃO<br />
0 a 3M 4 a 6M 7 a 9M 10 a 12M > 12M<br />
NÃO IN-<br />
TRODUZIU<br />
NÃO IN-<br />
FORMADO TOTAL<br />
N % N %* N %* N %* N %* N % N % N<br />
Gelatina 14 5,2 100 42,2 53 61,8 71 88,1 06 90,3 26 9,7 0 0 270<br />
Bala/pirulito, chocolate 05 1,9 32 13,8 49 32 114 74,2 28 84,8 42 15,6 0 0 270<br />
Macarrão instantâneo 06 2,2 58 23,7 54 43,7 92 77,8 14 83 45 16,6 01 0,4 270<br />
Salgadinhos 04 1,5 32 13,4 40 28,2 123 73,7 19 80,7 52 19,3 0 0 270<br />
Bolacha recheada 03 1,1 41 16,3 51 35,2 97 71,1 22 79,2 56 20,8 0 0 270<br />
Suco artificial 06 2,2 43 18,1 39 32,5 84 63,6 22 71,7 75 27,9 01 0,4 270<br />
Embutidos 01 0,4 26 10,1 22 18,2 108 58,2 24 67,1 89 32,9 0 0 270<br />
Refrigerante 03 1,1 30 12,2 20 19,6 99 56,5 28 66,7 89 32,9 01 0,4 270<br />
ALIMENTOS DE<br />
USO TRADICIONAL<br />
ALIMENTOS<br />
INDUSTRIALIZADOS<br />
Açúcar 84 31,1 87 63,3 23 71,8 41 87 08 90 27 10 0 0 270<br />
Chá 133 49,3 87 81,5 12 85,9 06 88,1 0 88,1 29 10,8 03 1,1 270<br />
Mel 49 18,2 90 51,5 24 60,4 36 73,7 08 76,7 60 22,2 03 1,1 270<br />
Espessantes 34 12,6 95 47,8 41 63 18 69,6 03 70,7 78 28,9 01 0,4 270<br />
Fritura de imersão 0 0 15 5,6 20 13 106 52,3 25 61,6 103 38 01 0,4 270<br />
Café 01 0,4 17 6,7 15 12,3 50 30,8 27 40,8 159 58,8 01 0,4 270<br />
*Percentual acumulado.<br />
Fonte: Toloni et al., 2011. 21
118<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Hoje <strong>em</strong> dia, as crianças reconhec<strong>em</strong> melhor as marcas de salgadinhos<br />
do que os nomes das frutas. É o que mostra o documentário Criança,<br />
a alma do negócio, que propõe uma reflexão sobre como a sociedade<br />
de consumo e as mídias de massa influenciam na formação de crianças e<br />
adolescentes, além de mostrar a realidade atual, <strong>em</strong> que as crianças prefer<strong>em</strong><br />
ir ao shopping a brincar, conhec<strong>em</strong> marcas pelo logotipo e, apesar<br />
de ter<strong>em</strong> uma vasta coleção de brinquedos e jogos, encantam-se mais<br />
por um pequeno bonequinho de plástico que, na campanha promocional,<br />
é associado ao consumo de um alimento obesogênico. 23 Esse documentário<br />
reflete sobre essas questões e mostra como a criança se tornou<br />
a alma do negócio <strong>para</strong> a publicidade no Brasil. As crianças são bombardeadas<br />
por propagandas que estimulam o consumo e falam diretamente<br />
com elas dentro de suas próprias casas. O resultado é devastador e é<br />
cada vez mais comum ver crianças que, aos 5 anos, já vão à escola totalmente<br />
m<strong>aqui</strong>adas e que deixaram de brincar de correr por causa de seus<br />
saltos altos; que sab<strong>em</strong> as marcas de todos os celulares, mas não sab<strong>em</strong><br />
o que é uma minhoca; que reconhec<strong>em</strong> as marcas de todos os salgadinhos,<br />
mas não reconhec<strong>em</strong> frutas e hortaliças do cotidiano da alimentação<br />
do brasileiro, como mamão, cenoura e beterraba. 23<br />
O investimento do mercado publicitário de alimentos evidencia o<br />
poder desse setor. Em 2001, o orçamento publicitário das indústrias de<br />
alimentos mundial foi estimado <strong>em</strong> torno de 40 bilhões de dólares. No<br />
Brasil, <strong>em</strong> 2005, foram investidos cerca de 1 bilhão de reais. 24<br />
Os interesses mercantilistas saciam-se por meio de vultosos investimentos<br />
no marketing televisivo, um campo promissor e lucrativo, <strong>em</strong><br />
detrimento da saúde das crianças e dos adolescentes. Utilizando-se da<br />
mídia televisiva, o marketing alimentício t<strong>em</strong> como objetivo único ampliar<br />
suas vendas e garantir seu futuro mercado consumidor, introduzindo<br />
precoc<strong>em</strong>ente o <strong>para</strong>digma da sociedade de consumo de massa<br />
no público infantojuvenil. 25<br />
Diante das mudanças no perfil epid<strong>em</strong>iológico atual da população<br />
brasileira, b<strong>em</strong> como no padrão alimentar, com preocupantes reflexos
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
119<br />
na população infantil, sugere-se a criação de medidas factíveis de promoção<br />
da alimentação saudável no ambiente familiar e escolar, considerando<br />
os valores sociais, econômicos e culturais envolvidos nos diferentes<br />
contextos.<br />
Por meio da brincadeira, pod<strong>em</strong> ser incutidos no público infantil<br />
conhecimentos nutricionais e relacionados a uma dieta alimentar saudável.<br />
Ex<strong>em</strong>plo disso é o jogo Prato Feito, desenvolvido pela <strong>Unifesp</strong>,<br />
<strong>para</strong> ensinar crianças acima de 7 anos de idade a fazer<strong>em</strong> uma alimentação<br />
equilibrada e montar<strong>em</strong> refeições diversificadas e apetitosas. Brincando<br />
com os grupos alimentares (energéticos, reguladores e construtores),<br />
elas aprend<strong>em</strong> a identificar os nutrientes de cada alimento e a<br />
substituí-los por outros, que tenham a mesma propriedade nutricional.<br />
Vence o jogo o participante que montar primeiro o seu prato com itens<br />
de todos os grupos da pirâmide e completar o caminho do tabuleiro. 26<br />
O PAPEL DA ROTULAGEM NUTRICIONAL NA ADOÇÃO<br />
DE HÁBITOS ALIMENTARES SAUDÁVEIS<br />
Grande parte dos estudos e pesquisas que envolv<strong>em</strong> a área de nutrição<br />
e suas relações com estratégias <strong>para</strong> redução dos riscos de doenças destaca<br />
a importância do adequado conhecimento da rotulag<strong>em</strong> nutricional<br />
dos alimentos <strong>para</strong> a promoção da alimentação saudável. Considera-<br />
-se que o adequado conhecimento da rotulag<strong>em</strong> pode funcionar como<br />
um instrumento na educação do consumidor a respeito das relações entre<br />
nutrição e saúde, visando a capacitá-lo a fazer escolhas alimentares<br />
mais saudáveis. 27-29<br />
O uso da informação nutricional obrigatória nos rótulos de alimentos<br />
e bebidas produzidos, comercializados e <strong>em</strong>balados na ausência<br />
do cliente e prontos <strong>para</strong> ser<strong>em</strong> oferecidos ao consumidor está regulamentado<br />
no Brasil desde 2001. 30,31 Apesar do indiscutível benefício<br />
dessa normatização, estudos com o objetivo de verificar o grau de conhecimento<br />
da população sobre nutrição e comportamento do consumidor<br />
diante da utilização de rótulos de alimentos não são animadores.
120<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
De acordo com o Inquérito Domiciliar sobre Comportamentos de Risco<br />
e Morbidade Referida de Doenças e Agravos não Transmissíveis realizado<br />
<strong>em</strong> 14 capitais e no Distrito Federal, no Brasil, apenas 44% da população<br />
consulta o rótulo nutricional, sendo esse grupo predominant<strong>em</strong>ente<br />
constituído pelo sexo f<strong>em</strong>inino, com idades entre 15 e 24 anos e com<br />
grau de ensino fundamental <strong>completo</strong> ou superior. 32<br />
A não utilização da rotulag<strong>em</strong> nutricional e sua interpretação incorreta<br />
estão associadas a diversos fatores, destacando-se falta de t<strong>em</strong>po,<br />
insuficiência de conhecimentos sobre nutrição e falta de habilidades<br />
mat<strong>em</strong>áticas dos consumidores, que têm limitações <strong>para</strong> utilizar as informações<br />
expostas, constituindo, assim, uma barreira <strong>para</strong> melhores<br />
escolhas alimentares. 33<br />
Tendo <strong>em</strong> vista que <strong>para</strong> muitos compradores a informação contida<br />
nos rótulos é excessivamente técnica e pouco clara, foi criada no Reino<br />
Unido, pela Food Standards Agency (FSA), uma proposta simples e<br />
intuitiva <strong>para</strong> orientar o consumidor na escolha de produtos mais saudáveis.<br />
34 Essa ferramenta, que já se expandiu <strong>para</strong> outros países da Europa,<br />
é o Traffic Light Labelling, ou S<strong>em</strong>áforo Nutricional, que fornece<br />
subsídios <strong>para</strong> que se acrescent<strong>em</strong> nos rótulos informações diretas e<br />
práticas sobre a composição nutricional do alimento, tornando a compreensão<br />
mais acessível a leigos e crianças, direcionando-os <strong>para</strong> dietas<br />
mais equilibradas.<br />
O S<strong>em</strong>áforo Nutricional baseia-se nas cores do s<strong>em</strong>áforo, analisando<br />
se<strong>para</strong>damente a concentração de gorduras, gorduras saturadas, açúcares<br />
e sal correspondente a 100 g ou 100 mL de cada produto. Dessa<br />
forma, o sinal vermelho indica que o nutriente está presente <strong>em</strong> quantidade<br />
excessiva, o sinal amarelo indica média quantidade, e o verde, pouca<br />
quantidade. 34 O consumidor é orientado, caso consuma um alimento<br />
com sinal vermelho <strong>para</strong> um nutriente específico, a consumir outro com<br />
sinal verde <strong>para</strong> o mesmo nutriente.<br />
A FSA recomenda a utilização dessa metodologia <strong>em</strong> produtos processados<br />
de conveniência, como refeições prontas, pizzas, hambúrgueres,
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
121<br />
sanduíches, salsichas e cereais matinais, uma vez que seus conteúdos<br />
nutricionais são de difícil compreensão pelos consumidores. O s<strong>em</strong>áforo<br />
deve estar preferencialmente na parte frontal da <strong>em</strong>balag<strong>em</strong> do produto,<br />
de modo a facilitar a visualização pelo consumidor. 34<br />
Com o objetivo de identificar a compreensão da rotulag<strong>em</strong> nutricional<br />
pelos consumidores, foi conduzida uma pesquisa no Reino Unido com<br />
2.932 consumidores, na qual se constatou que a interpretação da rotulag<strong>em</strong><br />
nutricional foi favorecida pelo Traffic Light Labelling (71% de compreensão),<br />
quando com<strong>para</strong>da à rotulag<strong>em</strong> tradicional (58% de compreensão). Outra<br />
pesquisa, realizada na Austrália com 790 consumidores de todas as classes<br />
socioeconômicas, apontou que 81% dos entrevistados foram capazes de<br />
escolher corretamente os alimentos mais saudáveis e com<strong>para</strong>r, de forma<br />
rápida, dois produtos, utilizando o Traffic Light Labelling. Houve diferença<br />
estatisticamente significativa entre o des<strong>em</strong>penho observado no uso do<br />
S<strong>em</strong>áforo e da rotulag<strong>em</strong> nutricional tradicional. 35<br />
Diante do exposto e visando a difundir os benefícios do S<strong>em</strong>áforo<br />
Nutricional <strong>para</strong> a população brasileira, os autores deste capítulo adaptaram<br />
o Traffic Light Labelling às normas vigentes no Brasil e à classificação<br />
de produtos industrializados comercializados no país (Tabela 2). 27,28<br />
TABELA 2 Pontos de corte <strong>para</strong> a classificação de 100 g ou 100 mL dos alimentos,<br />
segundo a adaptação do S<strong>em</strong>áforo Nutricional às normas brasileiras<br />
NUTRIENTE VERDE AMARELO VERMELHO<br />
SÓLIDO LÍQUIDO SÓLIDO LÍQUIDO SÓLIDO LÍQUIDO<br />
Gordura ≤ 3 ≤ 1,5 > 3 e ≤ 20 > 1,5 e ≤ 10 > 20 > 10<br />
total (g) 31,34<br />
Gordura ≤ 1,5 ≤ 0,75 > 1,5 e ≤ 5 > 0,75 e<br />
saturada (g) 31,34 ≤ 2,5<br />
> 5 > 2,5<br />
Gordura<br />
0 0 > 0 e ≤ 1 > 0 e ≤ 1 > 1 > 1<br />
trans (g) 31<br />
(continua)
122<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
(continuação)<br />
Sódio (mg) 31 ≤ 40 ≤ 40 > 40 e ≤ 120 > 40 e ≤ 120 > 120 > 120<br />
Fibra (g) 31 ≥ 6 ≥ 3 ≥ 3 e < 6 ≥ 1,5 e < 3 < 3 < 1,5<br />
Açúcar (g) 31,34 ≤ 5 ≤ 2,5 > 5 e ≤ 12,5 > 2,5 e ≤ 6,3 > 12,5 > 6,3<br />
Fonte: ANVISA, 2003 31 ; FSA, 2007. 34<br />
Com base nos pontos de corte utilizados no país, foram classificados<br />
100 produtos industrializados, os quais foram selecionados da página<br />
eletrônica de um hipermercado brasileiro, optando-se, <strong>para</strong> cada categoria<br />
(salgadinhos de pacote, cereais matinais, <strong>em</strong>butidos, maionese,<br />
cereais <strong>em</strong> barra, bebidas artificiais, queijos, pizzas prontas congeladas,<br />
tortas salgadas prontas congeladas, hambúrgueres congelados, biscoitos<br />
doces, molhos de tomate, pó <strong>para</strong> misturar no leite, refeições prontas<br />
congeladas, tortas doces congeladas e produtos lácteos), pelos primeiros<br />
5 a 8 produtos listados na página. O resultado dessa classificação<br />
encontra-se na Figura 2 e reflete a situação de inadequação nutricional<br />
dos alimentos industrializados, quadro preocupante se considerado que<br />
os estudos têm d<strong>em</strong>onstrado aumento contínuo no consumo desses alimentos<br />
no país. 36<br />
Em relação aos resultados dessa classificação <strong>para</strong> gordura trans,<br />
vale salientar que, de acordo com o Regulamento Técnico sobre Rotulag<strong>em</strong><br />
Nutricional de Alimentos Embalados 37 , a informação de um nutriente<br />
pode ser expressa <strong>em</strong> “0” (zero) ou “não contém” quando o alimento<br />
contiver quantidades menores ou iguais às estabelecidas como<br />
não significativas. Assim, caso uma porção do alimento contenha quantidades<br />
iguais ou inferiores a 0,2 g de gordura trans, o fabricante pode<br />
omiti-la. Conclui-se, portanto, que os resultados da análise desse nutriente<br />
<strong>aqui</strong> apresentados pod<strong>em</strong> não retratar a realidade, de modo que,<br />
<strong>em</strong> 100 g do alimento pode haver quantidade superior à reconhecida<br />
pela rotulag<strong>em</strong> nutricional, que muitas vezes se refere a quantidades<br />
bastante inferiores a 100 g.
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
123<br />
FIGURA 2 Classificação dos 100 produtos industrializados disponíveis no mercado<br />
brasileiro, segundo a adaptação do S<strong>em</strong>áforo Nutricional às normas brasileiras.<br />
20<br />
28<br />
11<br />
13<br />
12<br />
11<br />
86<br />
57<br />
40<br />
76 77<br />
Verde<br />
Amarelo<br />
Vermelho<br />
23 32<br />
Gordura<br />
total<br />
Gordura<br />
saturada<br />
9<br />
5<br />
Gordura<br />
trans<br />
Fibra<br />
alimentar<br />
Sódio<br />
Obs.: As quantidades de açúcar não foram classificadas, pois, segundo norma da Anvisa, não são informadas<br />
no rótulo nutricional.<br />
As barras pod<strong>em</strong> ser lidas como percentuais, uma vez que se trata de 100 alimentos.<br />
Fonte: Ministério da Saúde, 2008. 7<br />
Fonte: Longo-Silva et al., 2010. 27<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
1. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de Orçamentos Familiares<br />
no Brasil (POF) 2002-2003: <strong>aqui</strong>sição alimentar domiciliar per capita. Rio<br />
de Janeiro: IBGE, 2004.<br />
2. Lands WE. Dietary fat and health: the evidence and the politics of prevention:<br />
careful use of dietary fats can improve life and prevent disease. Ann N Y Acad<br />
Sci 2005; 10(55):179-92.
124<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
3. Costa TF, Pontes TE, Brasil ALD, Ferreira ABR, Taddei JAAC. Transição nutricional<br />
e desenvolvimento de hábito de consumo alimentar na infância. In:<br />
Dutra-de-Oliveira JE, Marchini JS (orgs.). Ciências Nutricionais: aprendendo a<br />
aprender. São Paulo: Sarvier, 2008. p. 543-63.<br />
4. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Estudo Nacional de Despesam<br />
Familiar – ENDEF; Dados preliminares – Tabelas selecionadas: consumo alimentar<br />
– Despesas das famílias. Rio de Janeiro: IBGE, 1978.<br />
5. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional sobre Saúde e<br />
Nutrição, 1987-1989. Rio de Janeiro, 1989.<br />
6. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa sobre Padrões de Vida,<br />
1996-1997, 2. Rio de Janeiro: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão,<br />
1999.<br />
7. Brasil. Ministério da Saúde. Pesquisa Nacional de D<strong>em</strong>ografia e Saúde da Criança<br />
e da Mulher – PNDS 2006. Relatório. Brasília: Ministério da Saúde, 2008.<br />
8. World Health Organization. Preventing chronic diseases: a vital instrument.<br />
WHO Global Report. Genebra: WHO, 2005.<br />
9. Sichieri R, Castro JFG, Moura AS. Fatores associados ao padrão de consumo<br />
alimentar da população brasileira. Cad Saúde Públ 2003; 19(Suppl. 1):S47-S53.<br />
10. Abrams SE, Wells MR. Feeding better food habits in mid – 20 th – century<br />
America. Public Health Nurs 2005; 22(6):529-94.<br />
11. Tardido AP, Falcão MC. O impacto da modernização na transição nutricional.<br />
Rev Bras Nutr Clin 2006; 21:117-24.<br />
12. Pontes TE, Costa TF, Brasil ALD, Marum ABRF, Silva GL, Toloni MHA et al.<br />
Propagandas de alimentos, <strong>em</strong>balagens e rótulos. In: Palma D, Escrivão MAS,<br />
Oliveira FLC. Nutrição clínica na infância e na adolescência. Barueri: Manole,<br />
2009. p.629-56.<br />
13. Almeida SS, Nascimento PCBD, Quaioti TCB. Quantidade e qualidade de produtos<br />
alimentícios anunciados na televisão brasileira. Rev Saúde Públ 2002;<br />
36(3):353-5.<br />
14. T<strong>em</strong>ple JL, Giacomelli AM, Kent KM, Ro<strong>em</strong>mich JN, Epstein LH. Television<br />
watching increases motivated responding for food and energy intake in children.<br />
Am J Clin Nutr 2007; 85:355-61.
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
125<br />
15. Ansaloni JA. Propaganda, transição nutricional e segurança alimentar na Sociedade<br />
Brasileira. In: Taddei JAAC. Jornadas científicas do NISAN: Núcleo Interdepartamental<br />
de Segurança Alimentar Nutricional 2006/2007. Barueri: Manole,<br />
2008. p.19-32.<br />
16. Pontes TE. Análise da adequação nutricional e econômica de alimentos veiculados<br />
<strong>em</strong> propagandas durante o horário infantil nas duas <strong>em</strong>issoras de maior<br />
audiência da TV brasileira. São Paulo, 2007. Projeto de Iniciação Científica<br />
(CNPq/IC-PIBIC) apresentado à Universidade Federal de São Paulo.<br />
17. Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística. IBOPE. Painel Nacional<br />
de Televisão (PNT), 2005. Disponível <strong>em</strong>: http://www.ibope.com.br. Acessado<br />
<strong>em</strong>: 15/01/2012.<br />
18. Skinner JD, Ziegler P, Pac S, Devaney B. Meal and Snack Patterns of Infants and<br />
Toddlers. J Am Diet Assoc 2004; 104(Suppl. 1):65-70.<br />
19. Linn S. Crianças do consumo, a infância roubada. São Paulo: Instituto Alana, 2006.<br />
20. Nickelodeon Business Solution Research, 2007. Pesquisa intitulada “10 segredos<br />
<strong>para</strong> falar com as crianças (que você esqueceu porque cresceu)”. Disponível<br />
<strong>em</strong>: http://defesa.alana.org.br/biblioteca. Acessado <strong>em</strong>: 22/01/2012.<br />
21. Toloni MHA, Longo-Silva G, Goulart RMM, Taddei JAAC. Introdução de alimentos<br />
industrializados e de alimentos de uso tradicional na dieta de crianças<br />
de creches públicas e filantrópicas no município de São Paulo. Rev Nutr 2011a;<br />
24(1):61-70.<br />
22. Brasil. Ministério da Saúde. Guia alimentar <strong>para</strong> crianças menores de 2 anos.<br />
Ministério da Saúde, Organização Pan-Americana de Saúde. Brasília: Ministério<br />
da Saúde, 2006.<br />
23. Instituto Alana. Documentário Criança, a alma do negócio, 2008. Disponível<br />
<strong>em</strong>: http:// http://www.alana.org.br. Acessado <strong>em</strong>: 20/9/2012.<br />
24. Vasconcellos AB, Goulart D, Gentil PC, Oliveira TP. A saúde pública e a regulamentação<br />
da publicidade de alimentos. Brasília: Ministério da Saúde, 2007.<br />
25. Moreira AS. Cultura midiática e educação infantil. Educ Soc 2003; 24 (85):1203-35.<br />
26. Universidade Federal de São Paulo. Departamento de Pediatria, Disciplina de<br />
Nutrologia. Download jogo Prato Feito, 2005. Disponível <strong>em</strong>: http://www.unifesp.br/dped/disciplinas/nutricao/nutricao.html.<br />
Acessado <strong>em</strong>: 15/08/2012
126<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
27. Longo-Silva G, Toloni MHA, Taddei JAAC. Traffic Light Labelling: traduzindo<br />
a rotulag<strong>em</strong> de alimentos. Rev Nutr 2010; 23(6):1031-1040.<br />
28. Toloni MHA, Longo-Silva G, Pontes TE, Taddei JAAC. Rotulag<strong>em</strong> e publicidade<br />
de alimentos. In: Taddei JAAC, Lang RMF, Longo-Silva G, Toloni MHA. Nutrição<br />
<strong>em</strong> Saúde Publica. Rio de Janeiro: Rubi, 2011b. p.517-40.<br />
29. Feitosa TC, Pontes TE, Brasil AL, Marum ABRF, Taddei JAAC. Transição nutricional<br />
e desenvolvimento de hábito de consumo alimentar na infância. In:<br />
Dutra-de-Oliveira JE, Marchini S, (org.). Ciências nutricionais: aprendendo a<br />
aprender. 2.ed. São Paulo: Sarvier, 2008.<br />
30. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC n. 40, de 21 de março<br />
de 2001. Regulamento técnico <strong>para</strong> rotulag<strong>em</strong> nutricional obrigatória de alimentos<br />
e bebidas <strong>em</strong>balados. Diário Oficial da União. Brasília, março de 2001;<br />
(22-E):1; Seção 1.<br />
31. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC n. 359, de 23 de dez<strong>em</strong>bro<br />
de 2003. Brasília: Ministério da Saúde, 2003. Disponível <strong>em</strong>: http://e-legis.<br />
bvs.br/leisref/public/showAct.php?id=9058. Acessado <strong>em</strong>: 10/03/2012.<br />
32. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância <strong>em</strong> Saúde. Inquérito domiciliar<br />
sobre comportamentos de risco e morbidade referida de doenças e agravos<br />
não transmissíveis. Rio de Janeiro: Ministério da Saúde, 2003.<br />
33. Cass<strong>em</strong>iro JA, Colauto NB, Linde GA. Rotulag<strong>em</strong> nutricional: qu<strong>em</strong> lê e por<br />
quê? Arq Ciências Saúde Unipar 2006; 10(1):9-16.<br />
34. Food Standards Agency. Food labels: Traffic light Labelling. Reino Unido: Food<br />
Standards Agency, 2007. Disponível <strong>em</strong>: http://www.eatwell.gov.uk/. Acessado<br />
<strong>em</strong>: 10/01/2012.<br />
35. Kelly B, Hughes C, Chapman K, Louie J, Dixon H, King L, on behalf of a collaboration<br />
of Public Health and Consumer Research Groups. Front-of-pack food labelling:<br />
Traffic light labelling gets the green light. Sydney: Cancer Council, 2008.
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
127<br />
36. Portal Estilo de Vida Saudável. [página na Internet]. Disponível <strong>em</strong>: http://www.<br />
saude.br. Acessado <strong>em</strong>: 20/12/2011.<br />
37. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Portaria n. 27, de 13 de janeiro de<br />
1998. Brasília: Ministério da Saúde, 1998. Disponível <strong>em</strong>: http://e-legis.anvisa.<br />
gov.br/leisref/public/showAct.php?id=97&word. Acessado <strong>em</strong>: 22/01/2012.
PORTAL ESTILO DE VIDA<br />
SAUDÁVEL: UMA FERRAMENTA<br />
PARA O CONTROLE DAS DOENÇAS<br />
CRÔNICAS NÃO TRANSMISSÍVEIS<br />
Kelly de Jesus Viana<br />
Sarah Warkentin<br />
Anna Helena Pedreira de Freitas<br />
José Augusto de A. C. Taddei<br />
Desde a década de 1960, observam-se inúmeras mudanças no padrão de<br />
alimentação e atividade física da população, tendo ocorrido processos de<br />
transição epid<strong>em</strong>iológicos, d<strong>em</strong>ográficos e nutricionais. Houve queda da<br />
mortalidade, com aumento do número de idosos. De 1980 a 2000, a população<br />
de idosos aumentou <strong>em</strong> 107%, enquanto os menores de 14 anos<br />
aumentaram apenas 14%. Esse crescimento do número de idosos, por<br />
sua vez, está relacionado com o aumento da incidência e prevalência de<br />
doenças crônicas não transmissíveis (DCNT). 1<br />
As alterações no estilo de vida que ocorreram na população acarretaram<br />
aumento progressivo das taxas de sobrepeso e obesidade, com<br />
consequente crescimento das DCNT. Tais doenças são consideradas<br />
uma ameaça que aflige um número cada vez maior de pessoas, famílias<br />
e comunidades, sendo responsáveis por 60% das mortes que ocorr<strong>em</strong><br />
no mundo. As doenças crônicas inclu<strong>em</strong> doenças cardiovasculares,<br />
alguns tipos de câncer, doenças respiratórias crônicas e diabetes. 2,3<br />
Geralmente, essas doenças não têm cura, porque as lesões causadas são
130<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
irreversíveis, levando a complicações e morte. As principais complicações<br />
são as do aparelho circulatório (hipertensão, infarto do miocárdio,<br />
acidente vascular encefálico, etc.), os diversos tipos de câncer, diabetes,<br />
doenças pulmonares obstrutivas crônicas (enfis<strong>em</strong>a e bronquite crônica)<br />
e doenças osteoarticulares (osteoporose e artrose). Pequena parte<br />
dessas doenças (20%) está associada a predisposição genética ou alteração<br />
orgânica de nascimento. Na maioria das vezes, essas doenças são<br />
consequência do estilo de vida dos indivíduos. 4<br />
Dos 58 milhões de óbitos ocorridos mundialmente <strong>em</strong> 2005, aproximadamente<br />
35 milhões foram causados por DCNT. 2,3 Oitenta por cento<br />
das mortes por DCNT ocorr<strong>em</strong> nos países de baixa e média renda,<br />
onde vive a maioria da população do mundo, e apenas 20% das mortes<br />
por doenças crônicas acontec<strong>em</strong> <strong>em</strong> países de alta renda. A grande<br />
maioria dos óbitos causados por doenças crônicas <strong>em</strong> todas as idades,<br />
<strong>em</strong> homens e mulheres, e <strong>em</strong> todas as partes do mundo é <strong>em</strong> razão dos<br />
fatores de risco comuns e modificáveis, incluindo dietas não saudáveis,<br />
sedentarismo e tabagismo. 2,3<br />
Estilos de vida inadequados que expõ<strong>em</strong> crianças e adolescentes a<br />
riscos cumulativos desde o nascimento pod<strong>em</strong> conduzir a importantes<br />
condições clínicas, representadas pelas DCNT. Elas compõ<strong>em</strong> um conjunto<br />
de enfermidades que se caracterizam por apresentar longo período<br />
de latência, t<strong>em</strong>po de evolução prolongado, etiologia não totalmente elucidada,<br />
lesões irreversíveis e complicações que acarretam graus variáveis<br />
de incapacidade ou óbito precoces. As DCNT foram responsáveis, <strong>em</strong><br />
2003, por quase 50 óbitos/100.000 habitantes no Brasil, figurando como<br />
a principal causa de morte da população. 5<br />
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2008 (PNAD<br />
2008), realizada pelo Ministério da Saúde, mostrou que 31,3% dos indivíduos<br />
avaliados informaram apresentar pelo menos uma DCNT e 5,9%<br />
afirmaram ter três ou mais DCNT. O percentual de pessoas que sofr<strong>em</strong><br />
de DCNT foi maior entre as mulheres (35,2%) do que entre os homens<br />
(27,2%), ocorrendo aumento desses agravos com o avanço da idade. A
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
131<br />
pesquisa, que também abordou a prática de atividade física, destaca que<br />
20% da população maior de 14 anos de idade não realizava qualquer tipo<br />
de atividade física. O sedentarismo foi maior entre os homens (25%), enquanto<br />
14,9% das mulheres se declararam sedentárias. O maior percentual<br />
de inatividade física foi encontrado entre pessoas acima de 65 anos<br />
(38,1%). Somente 10,2% da população foi considerada ativa segundo a definição<br />
de fisicamente ativo da Organização Mundial da Saúde (OMS).<br />
Os fatores de risco <strong>para</strong> o aparecimento de DCNT são classificados<br />
como modificáveis e não modificáveis. Entre os modificáveis, estão<br />
a hipertensão arterial, a ingestão de álcool exagerada, a hiperglic<strong>em</strong>ia, o<br />
tabagismo, o sedentarismo, o estresse, a obesidade e o colesterol elevado.<br />
Entre os fatores não modificáveis, destacam-se idade, hereditariedade,<br />
raça e sexo. 6<br />
A prevenção e o retardo no aparecimento das enfermidades crônico-degenerativas<br />
pod<strong>em</strong> ocorrer precoc<strong>em</strong>ente, antes mesmo de se<br />
manifestar<strong>em</strong> clinicamente. Segundo o modelo explicativo do processo<br />
saúde-doença, descrito por Leavell e Clark 8 , ações intervencionistas<br />
direcionadas a tais enfermidades dev<strong>em</strong> ocorrer ainda no primeiro nível<br />
da fase de prevenção primária (período pré-patogênico). Esse nível<br />
de prevenção diz respeito à promoção de saúde, conceito que envolve a<br />
ideia de fortalecimento individual e coletivo <strong>para</strong> lidar com a multiplicidade<br />
dos condicionantes da saúde. 7<br />
A partir de meados de 1970, ocorreu a reconstrução do conceito<br />
de promoção da saúde, por meio de inúmeras conferências internacionais.<br />
Tal conceito representava uma reação à acentuada medicalização<br />
da vida social, que t<strong>em</strong> tido baixo impacto na melhoria das condições<br />
de vida. A promoção da saúde deixou de ser interpretada como simples<br />
caracterização de um nível de atenção da medicina preventiva, conforme<br />
o modelo proposto por Leavell e Clark. 8 Agora, é tratada a partir de<br />
enfoque político e técnico <strong>em</strong> torno do processo saúde-doença-cuidado.<br />
Não obstante, mudanças culturais pressupõ<strong>em</strong> processo de aprendizado<br />
contínuo, enfocando as diversas fases da vida. Nesse contexto,
132<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
sobrevém o papel dos diversos ambientes sociais, como escolas, domicílios,<br />
locais de trabalho e comunitários. Tais espaços dev<strong>em</strong> ser utilizados<br />
<strong>para</strong> a promoção de ações organizadas e conduzidas por organizações<br />
educacionais, profissionais, comerciais e voluntárias, b<strong>em</strong> como pelas<br />
instituições governamentais, conforme proposto na Carta de Ottawa. 9<br />
Assim, a promoção de estilos de vida saudáveis, incluindo hábitos<br />
alimentares e atividade física, pode e deve ter função pedagógica <strong>em</strong><br />
diferentes veículos de comunicação. Afinal, eles não se reduz<strong>em</strong> apenas<br />
às questões nutricionais e de fisiologia do exercício – as formações<br />
dos hábitos alimentares e das práticas de atividade física compreend<strong>em</strong><br />
processos graduais, nos quais estão envolvidos valores culturais,<br />
sociais, afetivo-<strong>em</strong>ocionais e comportamentais. 10,11 Práticas educativas<br />
impl<strong>em</strong>entadas por equipes multidisciplinares que conscientiz<strong>em</strong> a população<br />
da importância da alimentação saudável e da prática regular de<br />
atividade física também dev<strong>em</strong> continuar sendo um dos componentes<br />
prioritários nas estratégias de Saúde Pública, a fim de deter o avanço da<br />
obesidade e DCNT no país.<br />
Diante dessa realidade e no contexto da sociedade cont<strong>em</strong>porânea,<br />
sobretudo com a difusão maciça dos sist<strong>em</strong>as midiáticos de utilização<br />
mundial (televisão e internet), observa-se que, se por um lado aumentou<br />
o número de programas e sites informativos sobre nutrição e alimentação,<br />
por outro t<strong>em</strong>-se o marketing alimentício nos mesmos veículos promovendo<br />
aumento da baixa qualidade nutricional dos alimentos na quase<br />
totalidade das situações. 12,13 Um estudo realizado por Pontes et al. 14<br />
analisou a qualidade nutricional dos alimentos veiculados na TV brasileira<br />
e constatou que as guloseimas representavam cerca de 45% das<br />
propagandas alimentícias, seguidas das redes de fast-food, com 23%.<br />
Os esforços de promoção da saúde que são mediados por computadores<br />
e outras tecnologias digitais, conhecidas como cibersaúde,<br />
pod<strong>em</strong> ter grande potencial <strong>para</strong> promover mudanças no comportamento<br />
por meio de características únicas da população geral, possibilitando<br />
interatividade e conveniência. Evidências indicam que o uso da
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
133<br />
cibersaúde pode melhorar os resultados comportamentais. No entanto,<br />
é preciso compreender se a cibersaúde será eficaz dentro da realidade<br />
social. 15<br />
Os meios de comunicação pod<strong>em</strong> ajudar com estratégias de saúde<br />
pública, mas, na maioria das vezes, influenciam negativamente o consumo<br />
de alimentos, já que os comercias com finalidade preponderant<strong>em</strong>ente<br />
financeira exerc<strong>em</strong> grande influência no hábito de consumo,<br />
principalmente das crianças. Das cinco horas de televisão que a criança<br />
assiste, uma hora é ocupada por comerciais. 16<br />
Atualmente, a internet é um dos meios de comunicação mais utilizado<br />
no mundo. A internet teve orig<strong>em</strong> <strong>em</strong> 1969, com o projeto do<br />
governo norte-americano, que tinha como objetivo interligar universidades<br />
e instituições de pesquisa e militares. Na década de 1970, a rede tinha<br />
poucos centros, mas o Protocolo NCP (Network Control Protocol)<br />
foi visto como inadequado, sendo criado o TCP/IP, que continua como<br />
o protocolo-base da internet. 17<br />
No início, a internet possuía poucos serviços, sendo o e-mail o serviço<br />
mais utilizado. Ao longo da década de 1980, foi sendo criada a internet<br />
que se conhece atualmente, <strong>em</strong> que diversas instituições dos Estados<br />
Unidos e de outros países se interligaram, criando uma grande rede, mas<br />
s<strong>em</strong> fim comercial. No início dos anos 1990, com a pressão <strong>para</strong> que <strong>em</strong>presas<br />
pudess<strong>em</strong> também participar da rede mundial, a internet foi aberta<br />
<strong>para</strong> uso comercial. Em 1991, Tim Berners-Lee lançou o World Wide Web<br />
(www), que foi a base <strong>para</strong> que Marc Andreesen criasse o Mosaic, base do<br />
que se t<strong>em</strong> do conceito da internet, <strong>para</strong> a Unix, <strong>em</strong> fevereiro de 1993 e <strong>em</strong><br />
agosto do mesmo ano, lançar a versão <strong>para</strong> o Windows. 17<br />
A internet chegou ao Brasil <strong>em</strong> 1991, pela Rede Nacional de Pesquisas,<br />
com o objetivo de atender à conexão das redes de universidades<br />
e centros de pesquisas. Em 1995, os Ministérios de Comunicações e de<br />
Ciência e Tecnologia abriram a internet <strong>para</strong> sua operação comercial.<br />
Ela continua sendo o principal serviço de conectividade cada vez mais<br />
presente nos dias atuais. 17
134<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Dessa forma, o acesso à internet e seu aumento contínuo tornaram-se<br />
um modo viável <strong>para</strong> promover a saúde da população. Além de<br />
estar acessível 24 horas por dia, a internet oferece anonimato. 18<br />
Há evidência epid<strong>em</strong>iológica de que a adoção generalizada de mudanças<br />
específicas no comportamento pode melhorar significativamente<br />
a saúde da população. No entanto, os esforços da comunicação <strong>em</strong><br />
saúde, <strong>em</strong>bora b<strong>em</strong> intencionados, muitas vezes não envolv<strong>em</strong> as pessoas<br />
<strong>para</strong> mudar o comportamento dentro dos complexos contextos de<br />
suas vidas. 15<br />
O Portal Estilo de Vida Saudável, da Universidade Federal de São<br />
Paulo (<strong>Unifesp</strong>), cadastrado no endereço eletrônico www.saude.br, é de<br />
livre acesso a todos os usuários de internet e t<strong>em</strong> 11 parceiros institucionais;<br />
visa à construção e à diss<strong>em</strong>inação do conhecimento sobre estilo<br />
de vida saudável, sendo a primeira página eletrônica não comercial <strong>em</strong><br />
português que promove divulgação de informações, participação e interação<br />
dos usuários, sugestões de links, leitura de artigos científicos e<br />
divulgação de eventos relacionados com estilo de vida saudável. A proposta<br />
do Portal é ser uma fonte de construção de conhecimento, englobando<br />
as áreas de alimentação saudável e prática de atividade física,<br />
contribuindo <strong>para</strong> a prevenção de DCNT.<br />
O Portal Estilo de Vida Saudável foi disponibilizado <strong>para</strong> os usuários<br />
da internet <strong>em</strong> abril de 2008. Foi desenvolvido <strong>em</strong> linguag<strong>em</strong> HTML<br />
(http://www.w3c.org) e PHP (http://www.php.net/) e está hospedado <strong>em</strong><br />
um servidor Linux da rede <strong>Unifesp</strong>. Em 35 meses (até fevereiro de 2011),<br />
recebeu a média mensal de 142 acessos internos (rede <strong>Unifesp</strong>) e 1.817<br />
acessos externos.<br />
Cadastraram-se como m<strong>em</strong>bros da comunidade Estilo de Vida<br />
Saudável 810 usuários, com o seguinte perfil profissional: 34,8% são nutricionistas;<br />
13,7% profissionais da área da saúde; 16,4% profissionais que<br />
não são da área da saúde; 18,1% estudantes da área da saúde; 11,1%, estudantes<br />
de outras áreas; e 3,5% não informaram a profissão. São originários,<br />
<strong>em</strong> sua quase totalidade, da região Sudeste (75,1%) e 9 m<strong>em</strong>bros são
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
135<br />
do exterior (1,1%). De todos os m<strong>em</strong>bros cadastrados, 90,5% são do gênero<br />
f<strong>em</strong>inino e 61,7% têm idade inferior a 30 anos.<br />
Nesse período, foram publicados no site 107 matérias (atualidades<br />
e notícias) e 10 vídeos e também foram realizados diversos sorteios. A<br />
fim de incentivar o frequente acesso ao Portal Estilo de Vida Saudável,<br />
são enviados informativos mensais, com os principais t<strong>em</strong>as abordados<br />
no site no mês vigente. Todas essas estratégias foram adotadas visando<br />
a difundir conteúdos que estimul<strong>em</strong> o estilo de vida saudável e a promover<br />
a incorporação do maior número possível de participantes.<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
1. Brasil. Ministério da Saúde. Portal da Saúde. Disponível <strong>em</strong>: http://portal.saude.<br />
gov.br/portal/saude/profissional/visualizar_texto.cfm?idtxt=31877&janela=1>.<br />
Acessado <strong>em</strong>: 14/3/2011.<br />
2. World Health Organization. Nutrition in adolescence: issues and challenges<br />
for the health sector: issues in adolescent health and development. Genebra:<br />
WHO, 2005a. Disponível <strong>em</strong>: http://whqlibdoc.who.int/publications/2005/<br />
9241593660_eng.pdf>. Acessado <strong>em</strong>: 15/4/2009.<br />
3. World Health Organization. Preventing Chronic Diseases – a vital investment –<br />
WHO global report. Genebra: WHO, 2005b.<br />
4. Governo do Estado de São Paulo. Secretaria de Estado da Saúde. Coordenadoria<br />
de Controle de Doenças. Centro de Vigilância Epid<strong>em</strong>iológica. In: Rodrigues<br />
SSF (org.). Prevenção de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) e<br />
se seus fatores de risco: guia básico <strong>para</strong> agentes de saúde. 3.ed. São Paulo: CVE,<br />
2008.<br />
5. Brasil. Ministério da Saúde. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios<br />
2008. Disponível <strong>em</strong>: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/panorama_saude_brasil_2003_2008/PNAD_2008_saude.pdf.<br />
6. Brasil. Ministério da Saúde. Portal da Saúde. Informações de Saúde. [banco de<br />
dados na internet] IDB – Indicadores e Dados Básicos – Brasil 2003. Indicadores<br />
de mortalidade: taxa de mortalidade específica por doenças do aparelho cir-
136<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
culatório. Disponível <strong>em</strong>: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?idb2005/<br />
c08.def. Acessado <strong>em</strong>: 1/2/2009.<br />
7. Botrel TEA, Costa RD, Costa MD, Costa AMD. Doenças cardiovasculares:<br />
causas e prevenção. Cardiovascular diseases: etiology and prevention. Rev Bras<br />
Clín Ter 2000; 26(3):87-90.<br />
8. Leavell H, Clark EG. Preventive Medicine for the Doctor in his Community.<br />
Nova York: Mc Graw-Hill, 1965.<br />
9. Buss PM. Promoção e educação <strong>em</strong> saúde no âmbito da Escola de Governo <strong>em</strong><br />
Saúde da Escola Nacional de Saúde Pública. Cad Saúde Públ 1999; 15(2):177-85.<br />
10. Organização Pan-Americana de Saúde. Saúde Coletiva. Documentos Referenciais<br />
Básicos. Cartas. Carta de Ottawa. Primeira Conferência Internacional sobre<br />
Promoção da Saúde. Ottawa, 1986. Disponível <strong>em</strong>: http://www.opas.org.br/<br />
coletiva/uploadArq/Ottawa.pdf. Acessado <strong>em</strong>: 2/2/2009.<br />
11. Bleil SI. O Padrão Alimentar Ocidental: considerações sobre a mudança de hábitos<br />
no Brasil. Núcleo de Estudos e Pesquisas <strong>em</strong> Alimentação da Unicamp.<br />
Rev Cad de Debate Campinas 1998; 4:25.<br />
12. Brasil. Ministério da Saúde. Secretarias do Ministério. Secretaria de Atenção à<br />
Saúde. Atenção Básica. Legislação. Alimentação e Nutrição. Portaria n. 1.010,<br />
de 08 de maio de 2006. Disponível <strong>em</strong>: http://dtr2004.saude.gov.br/sas/legislacao/portaria1010_08_05_06.pdf.<br />
Acessado <strong>em</strong>: 12/2/2009.<br />
13. Almeida SS, Nascimento PCBD, Quaioti TCB. Quantidade e qualidade de produtos<br />
alimentícios anunciados na televisão brasileira. Rev Saúde Públ 2002;<br />
36(3):353-5.<br />
14. Nascimento PCBD. A influência da televisão nos hábitos alimentares de crianças<br />
e adolescentes. [Tese de Doutorado.]. Ribeirão Preto: Universidade de São<br />
Paulo, 2007.<br />
15. Pontes TE, Costa TF, Marum ABRF, Brasil ALD, Taddei JAAC. Orientação Nutricional<br />
de crianças e adolescentes e os novos padrões de consumo: propagandas,<br />
<strong>em</strong>balagens e rótulos. Rev Paul Pediatr 2009; 27(1):99-105.<br />
16. Neuhauser L, Kreps GL. Rethinking Communication in the E-health Era. J Health<br />
Psychol 2003; 8(1):7-23.
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
137<br />
17. Halpern G. Comerciais veiculados <strong>em</strong> programação infanto-juvenil de canais<br />
abertos de TV e sua relação com escolha de alimentos <strong>em</strong> amostra de escolares.<br />
[Tese de Doutorado]. São Paulo: <strong>Unifesp</strong>, 2003.<br />
18. Leiner B. A brief history of the Internet. version 3.314. Disponível <strong>em</strong>: http://<br />
www.isoc.org/internet-history/brief.html#Introduction.
A MÍDIA E A ALIMENTAÇÃO<br />
INFANTIL<br />
Clóvis de Barros Filho<br />
Martin Fabius Alcover de Barros<br />
INTRODUÇÃO<br />
A mídia é t<strong>em</strong>a da agenda pública e questão política candente. Regulamentar<br />
a atuação de seus profissionais implica conhecer com alguma<br />
precisão tudo de mal que se pretende evitar, discernir a extensão dos<br />
efeitos sociais da mídia supostamente indesejáveis. O discurso sobre a<br />
mídia oscila entre a apologia ingênua e o denuncismo ressentido. 1 O que<br />
mais chama a atenção é que n<strong>em</strong> uns n<strong>em</strong> outros d<strong>em</strong>onstram saber ao<br />
certo até onde a mídia impacta a sociedade com suas mensagens.<br />
Na discussão sobre a regulamentação da atividade jornalística, a<br />
impl<strong>em</strong>entação de uma comissão reguladora enfrenta os arautos da liberdade<br />
de imprensa. No caso da publicidade, o discurso do campo<br />
parece legitimar a atuação de um mecanismo autorregulatório de sua<br />
produção. O Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária<br />
(Conar) estaria autorizado pelos agentes do campo a dar uma solução<br />
aos probl<strong>em</strong>as éticos da produção publicitária. Controlado por publicitários,<br />
o Conar decidiria, caso a caso, sobre o certo e o errado, o aceitável<br />
e o inaceitável, o dizível e o indizível nas mensagens publicitárias.
140<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Cabe <strong>aqui</strong> uma advertência: a legitimidade de tal instituição junto<br />
aos agentes do campo pode autorizá-la a regulamentar relações e julgar<br />
conflitos entre esses agentes – questões internas, portanto. Todavia,<br />
as questões éticas mais graves envolvendo a prática publicitária não diz<strong>em</strong><br />
respeito a eventuais conflitos entre publicitários, porque a publicidade<br />
é a mensag<strong>em</strong> que atinge toda a sociedade. É com o corpo social<br />
global que o publicitário se relaciona prioritariamente; por isso, deixar<br />
aos publicitários a prerrogativa da decisão sobre os limites de sua própria<br />
atuação – na relação que mantêm com a sociedade como um todo –<br />
é desrespeitar o princípio da terceridade da justiça; é entregar as chaves<br />
do galinheiro à raposa; é presumir altruísmo e abnegação incompatíveis<br />
com o mundo da técnica, com a lógica do capital e com os rigores da<br />
competição no mercado <strong>para</strong> o qual trabalham. 2<br />
Este capítulo destaca alguns aportes científicos, apresentados no<br />
campo da comunicação, sobre os efeitos sociais da mídia – aportes que<br />
pretend<strong>em</strong> oferecer fundamento científico às reflexões sobre a eventual<br />
pertinência de um controle ou de regulamentação da atividade publicitária.<br />
RESPONSABILIDADE DA MÍDIA SOBRE O AGENDAMENTO<br />
Os meios de comunicação ag<strong>em</strong> sobre a sociedade, e o leitor sabe disso.<br />
O senso comum não se cansa de denunciar. As pessoas repet<strong>em</strong> expressões<br />
apreendidas da fala de alguma personag<strong>em</strong>, compram coisas sugeridas<br />
pela publicidade, discut<strong>em</strong> fatos noticiados pelo jornalismo, gastam<br />
t<strong>em</strong>po e energia <strong>para</strong> fundamentar suas opções de “paredão” <strong>em</strong><br />
reality shows e assim por diante.<br />
Ora, no momento de refletir sobre a mídia, nada mais normal que se parta<br />
do caso que se conhece melhor: o seu próprio. Seu apreço por Ana Maria<br />
Braga, Luciana Gimenez, Gugu, Chico Lang, Faustão, Galvão Bueno, Pedro Bial<br />
e outros ícones da telinha. Além da própria experiência, percebe-se que outras<br />
pessoas, com qu<strong>em</strong> se interage, fizeram o mesmo, acompanharam a mesma<br />
transmissão, os mesmos programas e as mesmas publicidades e, portanto,<br />
encontram-se aptas a conversar a respeito do mesmo cardápio t<strong>em</strong>ático.
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
141<br />
É possível constatar que essas conversas versam sobre notícias do<br />
Jornal Nacional, que o William Bonner abastece seus papos – esse é o<br />
seu caso particular. Outra coisa é aprender que, <strong>para</strong> além de tais conversas,<br />
na sociedade da qual se faz parte, os t<strong>em</strong>as mais tratados pelos<br />
meios de comunicação são, com recorrência, os mais discutidos pelas<br />
pessoas <strong>em</strong> geral: que os meios impactam a sociedade, que a maneira<br />
como isso acontece interessa aos cientistas, que muitas pesquisas pelo<br />
mundo procuram dar conta desses efeitos. 3<br />
Por ex<strong>em</strong>plo, pesquisas que relacionam o que é veiculado pelos<br />
meios e o que é discutido pela sociedade constataram que os assuntos<br />
mais presentes nos meios de comunicação também são os mais abordados<br />
nas conversas entre as pessoas. O professor Maxwell McCombs da<br />
Universidade do Texas nomeou essa relação de agenda setting. 4<br />
Essa denominação foi conservada <strong>em</strong> inglês <strong>em</strong> quase todos os países<br />
que estudam a mídia. Mas do que se trata exatamente? Afinal, que<br />
agenda é essa? O leitor, quando se fala <strong>em</strong> agenda, t<strong>em</strong> o direito de pensar<br />
<strong>em</strong> uma forma mais primitiva (<strong>em</strong> papel) ou mais atual (no computador)<br />
de registrar seus compromissos vindouros. Talvez também passe<br />
pela sua cabeça inscrever ordenadamente números de telefone, endereços<br />
e e-mails.<br />
Pois b<strong>em</strong>, a agenda de que se trata <strong>aqui</strong> é outra. Trata-se de um<br />
conjunto de t<strong>em</strong>as sobres os quais se conversa. Esses t<strong>em</strong>as, <strong>em</strong> inglês,<br />
são issues. Assim, a agenda da mídia é uma maneira pomposa de designar<br />
a reunião dos t<strong>em</strong>as abordados pelos meios de comunicação, e a<br />
agenda pública, por sua vez, refere-se aos t<strong>em</strong>as discutidos pelos agentes<br />
sociais fora dos meios de comunicação. 5<br />
Por ex<strong>em</strong>plo, não poderia haver estranheza se, na época da queda<br />
do avião da Air France – voo Rio-Paris –, um desconhecido propusesse<br />
um diálogo afirmando que não deve ser nada fácil passar 11 minutos <strong>em</strong><br />
queda livre dentro de um avião e, por fim, cair no oceano, de madrugada.<br />
E seria compreensível que alguém argumentasse, mesmo s<strong>em</strong> nunca<br />
ter visto aquele interlocutor, que muito provavelmente, no momento do
142<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
encontro com a água do oceano, todos já estivess<strong>em</strong> mortos ou inconscientes.<br />
Afinal, esse t<strong>em</strong>a, naquele momento, estava autorizado. Era conversável<br />
por qualquer um. Era, s<strong>em</strong> dúvida, um t<strong>em</strong>a da agenda pública.<br />
Os meios de comunicação facultam essa possibilidade. S<strong>em</strong> eles, de<br />
fato, não haveria como se falar de agenda pública. O espaço <strong>em</strong> que seus t<strong>em</strong>as<br />
pod<strong>em</strong> ser discutidos é, rigorosamente, qualquer lugar. Um espaço estilhaçado,<br />
onde a copresença não se faz mais necessária, <strong>em</strong> que a presunção<br />
de discutibilidade dos t<strong>em</strong>as públicos se deve não mais ao lugar <strong>em</strong> que<br />
são discutidos, mas ao pertencimento a uma zona de influência midiática<br />
que faculta e promove laços sociais a respeito das mensagens que enuncia.<br />
Por isso, diz-se que a agenda dos meios determina a agenda pública. 6<br />
No termo consagrado agenda setting, o verbo setting está no gerúndio<br />
to set. Significa fixar, estipular, determinar. Seria possível, assim, traduzir<br />
agenda setting por fixação, imposição ou determinação da agenda;<br />
ou, simplesmente, por agendamento. Desse modo, de acordo com a<br />
hipótese do agendamento, a agenda pública, discutida pelas pessoas <strong>em</strong><br />
sociedade, é determinada pelos meios de comunicação. A<br />
Por que esse assunto interessa a uma reflexão ética sobre a mídia?<br />
Ora, o leitor imagina que os profissionais que trabalham na produção<br />
das mensagens por ela veiculadas poderiam agir de maneira diferente<br />
do que faz<strong>em</strong>, propor outras mensagens, escolher outros t<strong>em</strong>as. No<br />
caso do jornalismo, a aplicação de critérios propriamente jornalísticos<br />
permite a conversão de alguns fatos <strong>em</strong> notícia; no caso da publicidade,<br />
a utilização de algumas técnicas criativas consagradas.<br />
Contudo, outros fatos ou técnicas poderiam merecer tal honra se<br />
novos critérios foss<strong>em</strong> adotados, de tal maneira que, se a sociedade conversa<br />
sobre os assuntos que conversa, discute sobre as questões que discute<br />
e, <strong>em</strong> última instância, interage <strong>em</strong> torno dos t<strong>em</strong>as que interage, é<br />
porque esses profissionais ag<strong>em</strong> de certa forma e não de modo diferente.<br />
Em outras palavras, as escolhas midiáticas produz<strong>em</strong> consequências<br />
importantes na constituição do tecido social, na organização dos espaços<br />
de socialização, e dev<strong>em</strong>, então, ser responsáveis por isso.
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
143<br />
A mídia é, portanto, responsável por determinar o agendamento da sociedade,<br />
o que inclui a publicidade. B O conteúdo da publicidade é veiculado<br />
lado a lado à programação. Às vezes, ela está até inserida na programação.<br />
É normal, então, que foliões discutam o comercial da cerveja na época do<br />
Carnaval, assim como é normal que crianças discutam sobre o lançamento<br />
de bolinho que traz consigo duas tatuagens do Hom<strong>em</strong> Aranha 3. C<br />
O agendamento não esgota a ação da mídia sobre a sociedade,<br />
é só o seu princípio mais rudimentar. Além de impor t<strong>em</strong>as de discussão,<br />
os meios tend<strong>em</strong> a agir sobre as opiniões que as pessoas têm sobre<br />
esses t<strong>em</strong>as, os valores que são atribuídos aos diferentes pontos de vista.<br />
Por isso, além de ensinar sobre o que falar, os meios também oferec<strong>em</strong><br />
opiniões legítimas a ser<strong>em</strong> adotadas, ou seja, ensinam às pessoas sobre<br />
o que falar.<br />
OPINIÃO PÚBLICA E A ESPIRAL DO SILÊNCIO<br />
A espiral do silêncio, assim como a agenda setting, é uma hipótese científica<br />
de sucesso, discutida <strong>em</strong> congressos, explicada <strong>em</strong> manuais e ensinada<br />
a todos que estudam opinião pública, incluindo os estudiosos da<br />
mídia, aos quais se juntam os interessados <strong>em</strong> psicologia social, investigadores<br />
da influência do coletivo sobre os comportamentos individuais.<br />
A espiral do silêncio, modelo proposto por Elisabeth Noelle-Neumann 8 ,<br />
resulta de exaustivas pesquisas sobre o comportamento eleitoral da sociedade<br />
al<strong>em</strong>ã. Para explicá-lo, responde-se a duas perguntas: por que<br />
“silêncio” e por que “espiral”?<br />
Começa-se pelo silêncio. Por que, então, essa espiral é do silêncio?<br />
Afinal, a que silêncio se está fazendo referência? Qu<strong>em</strong> se cala? E por<br />
quê? Segundo o modelo da espiral do silêncio, as pessoas não se manifestam<br />
sobre certos assuntos por medo. Mas medo de quê? De se sentir<strong>em</strong><br />
isoladas, de se dar<strong>em</strong> conta de que outros não pensam, não sent<strong>em</strong><br />
e não ag<strong>em</strong> como elas. Nos espaços de interação infantil e adolescente,<br />
esse medo é potencializado pela maior contundência das punições a<br />
eventuais desalinhamentos de comportamento. 9
144<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Para não sentir esse medo, procuram-se no outro coincidências<br />
com os próprios pontos de vista, opiniões, critérios éticos, etc. Adotam-<br />
-se estratégias de aproximação, de pertencimento; evita-se destacar as<br />
discrepâncias e evidenciar a discórdia. Evita-se, assim, expressar opiniões<br />
que, supõe-se, não coincidam com as opiniões dominantes.<br />
O modelo de Noelle-Neumann garante que esse acanhamento advém<br />
da busca de adequação que as pessoas s<strong>em</strong>pre <strong>em</strong>preend<strong>em</strong>, entre<br />
suas opiniões e as que julgam dominantes no universo <strong>em</strong> que estão circulando.<br />
Não cabe perguntar se, de fato, cada um pensa no que diz pensar.<br />
Jamais será possível saber ao certo. Assim, quando se vota <strong>em</strong> alguém<br />
execrado por corrupção, não v<strong>em</strong> ao caso nesse exame saber se<br />
deixou de gostar de fato do candidato; o que importa é que, na hora de<br />
tomar posição a respeito, cada um opera um cálculo de adequação complicado<br />
entre as próprias crenças e os discursos que observa <strong>em</strong> circulação<br />
por onde passa. Havendo incompatibilidade, o jeito é ficar calado.<br />
Mas o que permite a cada pessoa essa adequação entre suas manifestações<br />
e a tal opinião dominante? Essa adequação pressupõe que se conheça<br />
essa opinião dita dominante, ou melhor, que se acredite ter uma noção<br />
clara do que pensa a maioria sobre os t<strong>em</strong>as a respeito dos quais se vai fazer<br />
algum posicionamento. Se não houver essa noção, talvez se possa respeitar,<br />
com menos medo, a espontaneidade dos pontos de vista. Para que se tenha<br />
medo do isolamento, é preciso que a opinião dominante chegue até si. Essa<br />
impressão que se t<strong>em</strong> do que se pensam sobre os outros Noelle-Neumann<br />
chama de “clima de opinião”, a partir do qual as pessoas se ajustam.<br />
Ora, como saber o que pensa a maioria da sociedade – a tal opinião<br />
dominante – se não se conhece, muitas vezes, o que pensam as pessoas<br />
que moram dentro de casa? Fica evidente que não pode ser pelo contato<br />
direto, perguntando a cada um dos que circulam nesse universo. Sobretudo<br />
porque alguns dos t<strong>em</strong>as sobre os quais é preciso se manifestar<br />
transcend<strong>em</strong> a sociedade, são de âmbito internacional.<br />
A pergunta permanece: o que ajudaria a dispor de um clima de opinião<br />
sobre os t<strong>em</strong>as da agenda pública s<strong>em</strong> ter um instituto de pesquisa atrelado
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
145<br />
o t<strong>em</strong>po todo? A resposta não poderia ser outra. Os meios de comunicação<br />
fornec<strong>em</strong> muito do que se precisa <strong>para</strong> se viver <strong>em</strong> sociedade e ajustar os<br />
pontos de vista assumidos ao que supostamente pensa o coletivo.<br />
Sobre o silêncio já se falou bastante – talvez seja melhor mesmo<br />
calar –, mas ainda resta entender o que a autora quis dizer com espiral.<br />
O que justifica o recurso da alegoria geométrica? O leitor se l<strong>em</strong>brará<br />
das aulas do ensino médio e terá diante de si um caderno, possivelmente<br />
espiralado. A espiral da geometria caracteriza-se por não ter fim n<strong>em</strong><br />
começo, talvez como os processos sociais e discursivos de definição de<br />
uma s<strong>em</strong>pre mutante opinião pública.<br />
Imagina-se a seguinte situação: os meios de comunicação, diante de<br />
um escândalo político, constro<strong>em</strong> uma imag<strong>em</strong> desfavorável de seu protagonista.<br />
Essa imag<strong>em</strong> será dominante no universo social consumidor dos<br />
produtos desses meios, mas isso não impede que haja, nesse universo, vozes<br />
discordantes. Elas serão minoritárias. Haverá, no entanto, uma tendência<br />
ao silêncio entre os m<strong>em</strong>bros desse grupo minoritário. Quando parte<br />
desse grupo se cala, a opinião discordante, que já era minoritária, torna-se<br />
ainda mais minoritária. O número de silentes será, portanto, maior. Aqueles<br />
que ainda persistir<strong>em</strong>, exprimindo-se favoravelmente ao político, terão<br />
de suportar um ônus social crescente <strong>em</strong> suas tomadas de posição, estarão<br />
cada vez mais isolados e não encontrarão qu<strong>em</strong> lhes dê apoio.<br />
Muitos fatores incid<strong>em</strong> sobre as tomadas de posição pública e, consequent<strong>em</strong>ente,<br />
sobre o fenômeno da espiral do silêncio. A seguir, dois<br />
deles são destacados: o medo do isolamento e a competência específica<br />
do agente social <strong>para</strong> manifestar-se sobre este ou aquele t<strong>em</strong>a.<br />
O ser humano t<strong>em</strong> horror ao isolamento opinativo. Sustentar uma<br />
opinião contrária à da maioria traz desconforto. Esse medo é generalizado<br />
e comprovado por estatísticas. Para evitar tal isolamento, é preciso<br />
intuir qual é a opinião dominante. Só a percepção relativamente<br />
aguda do que pensam os d<strong>em</strong>ais e <strong>em</strong> qual sentido se deslocam essas<br />
opi niões permite ao ser humano manifestar-se <strong>em</strong> sociedade s<strong>em</strong> suportar<br />
o ônus da reprovação de seus pares. 7
146<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Esse medo do isolamento, segundo Noelle-Neumann, determina o<br />
minguamento progressivo das opiniões dominadas quando confrontadas<br />
com opiniões majoritárias. No entanto, deve-se observar que esse medo<br />
se manifesta nos atores sociais de maneiras distintas. N<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre o indivíduo<br />
que sustenta uma opinião minoritária se cala. Um dos fatores que<br />
condiciona essa tomada de posição pública é a competência específica<br />
<strong>para</strong> abordar os t<strong>em</strong>as <strong>em</strong> discussão, ou seja, os t<strong>em</strong>as de agenda pública.<br />
Sobre t<strong>em</strong>as da agenda privada todos falam. A forma das intervenções<br />
varia, mas os t<strong>em</strong>as que diz<strong>em</strong> respeito à vida privada de cada um<br />
são tratados <strong>em</strong> circuitos de relações mais ou menos abrangentes. Por<br />
isso, a questão a que se faz referência <strong>aqui</strong> diz respeito a t<strong>em</strong>as da agenda<br />
pública. Essa limitação t<strong>em</strong>ática torna os meios de comunicação um<br />
fator decisivo na construção e imposição da opinião dominante.<br />
Se, como se viu, são os meios que oferec<strong>em</strong> o menu t<strong>em</strong>ático comum,<br />
são também os que têm prerrogativa de indicar qual é o enfoque<br />
a ser dado a cada um desses t<strong>em</strong>as. No entanto, mesmo na discussão de<br />
assuntos políticos, por ex<strong>em</strong>plo, outros fatores, além da opinião da mídia,<br />
influenciam uma possível manifestação pública. A competência específica<br />
reconhecida <strong>para</strong> abordar o t<strong>em</strong>a é um deles. 10<br />
A maior disposição <strong>para</strong> que um indivíduo se manifeste e exiba<br />
sua opinião diante de outros sobre um t<strong>em</strong>a político dependerá de sua<br />
maior ou menor familiaridade no manejo desses t<strong>em</strong>as. Essa familiaridade,<br />
por sua vez, está vinculada ao grau de politização. Quanto maior<br />
o grau de politização, maior a tendência a uma manifestação política sobre<br />
um t<strong>em</strong>a político. Esse grau de politização envolve um conjunto de<br />
el<strong>em</strong>entos cognitivos, avaliativos e afetivos.<br />
Quando o t<strong>em</strong>a abordado é a opinião de crianças, pode-se dizer<br />
que poucas teriam a legitimidade <strong>para</strong> manifestar-se. Levando <strong>em</strong> consideração<br />
que a construção identitária de um indivíduo ocorre aos poucos,<br />
compreende-se que, nesse período da vida, o indivíduo possui a<br />
identidade pouco sólida. Isso faz com que a opinião da mídia seja determinante<br />
<strong>para</strong> a tomada de posição da criança. Em <strong>para</strong>lelo a isso, a
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
147<br />
criança está <strong>em</strong> plena construção de valores sobre o mundo, o que a torna<br />
mais influenciável e, portanto, a publicidade de produtos <strong>para</strong> crianças<br />
t<strong>em</strong> maior chance de ser uma opinião dominante.<br />
MÍDIA E IDEOLOGIA<br />
Até o desenvolvimento da mídia (impressa e eletrônica), a publicidade<br />
de um indivíduo ou de um t<strong>em</strong>a era ligada ao compartilhamento de um<br />
lugar comum; afinal, ela dependia da presença física do receptor, uma<br />
vez que era realizada essencialmente por meio da interação face a face.<br />
Para que se pudesse tornar pública uma ideia – algum tipo de ideal político,<br />
por ex<strong>em</strong>plo –, era preciso ter à volta pessoas capazes e dispostas<br />
a escutar o que se tinha a dizer. Diante disso, seu caráter era essencialmente<br />
dialógico, com os indivíduos falando ou representado uns diante<br />
dos outros, argumentando e participando ativamente do debate acerca<br />
do t<strong>em</strong>a discutido.<br />
Após o desenvolvimento dos meios de comunicação, novas formas<br />
de publicidade foram criadas além da copresencial. Ações e eventos passaram<br />
a se tornar públicos pela gravação e transmissão distantes do t<strong>em</strong>po e<br />
do espaço de suas ocorrências, o que se deu, sobretudo, com o surgimento<br />
das comunicações eletrônicas. Com o advento da televisão, por ex<strong>em</strong>plo,<br />
passou-se a ter acesso à imag<strong>em</strong> audiovisual daquele jogo de futebol<br />
que não se pode ver ao vivo. Essas novas formas de publicidade, evident<strong>em</strong>ente,<br />
não substituíram por <strong>completo</strong> a tradicional, já que ainda exist<strong>em</strong><br />
encontros públicos, d<strong>em</strong>onstrações de massa, etc. No entanto, de qualquer<br />
modo, ela passou a ser uma das mais importantes formas de publicidade<br />
atuais – publicidade que t<strong>em</strong> características um pouco distintas da<br />
tradicional. Em primeiro lugar, porque ela é menos dialógica. A possibilidade<br />
de o receptor intervir na programação televisiva, por ex<strong>em</strong>plo, é muito<br />
menor do que <strong>em</strong> um diálogo. Em segundo lugar, porque as ações e os<br />
eventos publicizados – sobretudo pela televisão – são visíveis <strong>para</strong> um número<br />
muito maior de pessoas. E, <strong>em</strong> terceiro lugar, porque fenômenos que<br />
ocorr<strong>em</strong> <strong>em</strong> contextos muito distantes passaram a também ser visíveis. Em
148<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
quarto e último lugar, porque a direção da visão é praticamente de sentido<br />
único. Quando se assiste ao Jornal Nacional, pode-se ver a Patrícia Poeta<br />
e o William Bonner, mas eles não pod<strong>em</strong> ver os espectadores.<br />
Assim, pode-se dizer que o desenvolvimento da mídia criou uma<br />
nova forma de publicidade, proporcionando, com isso, um tipo de visibilidade<br />
bastante diferente daquele tradicional de copresença. 11 Isso,<br />
s<strong>em</strong> dúvida, alterou significativamente as condições sob as quais o poder<br />
político é exercido. Foram diversos os desdobramentos dessa transformação,<br />
porém o foco principal deste capítulo não é esse, e, sim, como<br />
essa visibilidade é administrada pelos meios de comunicação e como<br />
essa administração pode entrecruzar-se com as relações de dominação<br />
existentes na sociedade atual.<br />
Os meios de comunicação pod<strong>em</strong> controlar a visibilidade de determinados<br />
assuntos de muitas formas. A principal delas é ocultando-os.<br />
Bourdieu, <strong>em</strong> seu clássico sobre a televisão, tece uma fina reflexão acerca<br />
de como esses meios ocultam muitos assuntos importantes, os quais,<br />
<strong>em</strong> suas palavras, seria preciso mostrar. Ocultam de maneira <strong>para</strong>doxal,<br />
mostrando. Mas como exatamente? Mostrando outra coisa <strong>em</strong> seu lugar<br />
ou, ainda, mostrando esses assuntos de modo que sejam vistos como<br />
algo insignificante ou como algo muito diferente da realidade.<br />
Se os meios de comunicação de massa pod<strong>em</strong> estabelecer e sustentar<br />
relações de dominação ao dar espaço <strong>para</strong> determinadas questões<br />
<strong>em</strong> detrimento de outras, como se viu, eles também pod<strong>em</strong> fazer o mesmo<br />
por meio do conteúdo veiculado por suas mensagens, isto é, configurando<br />
as mensagens de tal e tal forma, mobilizando este ou aquele<br />
sentido. Como se verá a seguir, <strong>para</strong> algumas teorias, o receptor é mero<br />
espectador passivo, que absorve indiscriminadamente o que se passa<br />
diante dele, uma espécie de receptáculo das mensagens midiáticas, esponja<br />
que tudo absorve. Muitas das primeiras teorias da comunicação<br />
segu<strong>em</strong> esse viés. Embora seu valor heurístico seja reconhecido, pode-<br />
-se crer que essas teorias são limitadas e ca<strong>em</strong> n<strong>aqui</strong>lo que Thompson 11<br />
chamou de “mito do receptor passivo”.
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
149<br />
Ao analisar o desenvolvimento dos meios de comunicação, Thompson<br />
observa que eles possibilitaram a produção, a reprodução e a circulação<br />
das formas simbólicas – expressões linguísticas, obras de artes, anúncios<br />
publicitários, gestos, ações, etc. – <strong>em</strong> uma escala antes inimaginável.<br />
Em suas palavras (p. 12), “viv<strong>em</strong>os, hoje, <strong>em</strong> sociedades onde a produção<br />
e recepção das formas simbólicas é s<strong>em</strong>pre mais mediada por uma rede<br />
complexa, transnacional, de interesses institucionais”. Nunca antes na história<br />
houve a possibilidade de acesso a tantas formas simbólicas. Compõe-<br />
-se hoje uma audiência extensa e potencialmente ampla, dispersa no t<strong>em</strong>po<br />
e no espaço e que, por conseguinte, amplia significativamente o raio de<br />
operação da ideologia, campo de análise que parece permanecer central<br />
<strong>para</strong> a compreensão de como, ainda que sejam ativas na recepção das mensagens<br />
midiáticas, as pessoas são, <strong>em</strong> algumas ocasiões, subjugadas por elas.<br />
Thompson 11 , ao analisar a história dessa disputa, distingue dois tipos<br />
gerais de concepção de ideologia: a neutra e a crítica. A primeira delas<br />
foi desenvolvida por autores como Destutt de Tracy, Lênin, Mannheim<br />
(<strong>em</strong> sua formulação geral da concepção total de ideologia) e Lukács, e<br />
compreende a ideologia como “um aspecto da vida social (ou uma forma<br />
de investigação social), entre outros, não [sendo] n<strong>em</strong> mais n<strong>em</strong><br />
menos atraente ou probl<strong>em</strong>ático do que qualquer outro” (p. 72). Assim,<br />
dessa perspectiva, um fenômeno considerado ideológico não é necessariamente<br />
enganador ou ilusório n<strong>em</strong> precisa estar ligado aos interesses<br />
de um grupo particular. Por ex<strong>em</strong>plo, quando se fala que a ideologia<br />
de um partido político é incompatível com a de outro, assume-se uma<br />
concepção neutra de ideologia. Afinal, nesse caso, o termo não denota<br />
necessariamente algo bom ou ruim, refere-se apenas à visão de mundo<br />
do partido <strong>em</strong> questão, ao seu ideário político.<br />
A concepção crítica de ideologia, por sua vez, foi desenvolvida, entre<br />
outros autores, por Napoleão, Marx e Mannheim (<strong>em</strong> sua concepção<br />
restrita de ideologia), e imputa aos fenômenos caracterizados como<br />
ideo lógicos um criticismo implícito ou sua própria condenação. Nas palavras<br />
de Thompson (2000, p. 73), “concepções críticas são aquelas que
150<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
possu<strong>em</strong> um sentido negativo, crítico ou pejorativo”. Assim, dessa perspectiva,<br />
todo fenômeno ideológico é enganador, ilusório e/ou parcial.<br />
Quando se fala que tal discurso não é científico, mas ideológico, assume-se<br />
uma concepção crítica de ideologia. Afinal, nesse caso, o termo<br />
está sendo <strong>em</strong>pregado pejorativamente.<br />
Ao considerar o papel do contexto de produção, circulação e recepção<br />
das formas simbólicas na análise da ideologia, Thompson enfoca,<br />
s<strong>em</strong> dúvida, a participação ativa do sentido na constituição da realidade<br />
social, além de também enfocar seu caráter indeterminado, o que<br />
quer dizer que o sentido não é alguma coisa acabada, previamente determinada<br />
pela mensag<strong>em</strong> que o mobiliza, mas alguma coisa viva, <strong>em</strong><br />
negociação, que depende também dos processos seletivos de recepção<br />
descritos no tópico anterior. Com isso, o autor abre a possibilidade de se<br />
pensar as mensagens mediáticas como potenciais estruturadores das relações<br />
de dominação, ainda que as pessoas sejam receptores ativos.<br />
Mas de quais relações de dominação se está falando propriamente?<br />
De qualquer uma. Seja de gênero, de idade, de raça, de classe, etc. Afinal,<br />
outra vantag<strong>em</strong> analítica da concepção de ideologia <strong>em</strong> questão é o fato<br />
de ela não colocar a ideologia como necessariamente dependente das relações<br />
de dominação de classe. Pelo contrário, ela se caracteriza justamente<br />
por uma abertura à análise da força simbólica de outras formas de<br />
dominação, derivadas ou não das relações de produção. Com isso, pode-<br />
-se discutir ideologia na produção midiática s<strong>em</strong>, no entanto, reduzi-la a<br />
mero reflexo das estruturas econômicas e sociais. Isso decorre do fato de<br />
Thompson partir de uma teoria social que, <strong>em</strong>bora confira importância à<br />
luta de classes na análise das sociedades cont<strong>em</strong>porâneas, considera centrais<br />
também outros conflitos estruturais, não os condicionando necessariamente<br />
às contradições entre o trabalho e o capital.<br />
Se no campo jornalístico o discurso da objetividade pode ser interpretado<br />
como uma ideologia, no campo publicitário, o mesmo ocorre<br />
com o discurso acerca da criatividade. Esta é habitualmente vista pelos<br />
publicitários como uma abertura <strong>para</strong> uma potencialidade esquecida
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
151<br />
ou reprimida. A ideia de que qualquer pessoa pode ser criativa, de que<br />
a criatividade está aberta a qualquer um, é quase uma unanimidade no<br />
discurso desses profissionais.<br />
Então, se todos pod<strong>em</strong> ser criativos, por que não são de fato? Trata-se<br />
de uma pergunta capciosa, mas prontamente respondida por José<br />
Predebon, publicitário e professor de criação: porque a criatividade possui<br />
inimigos. Entre os principais, estão a acomodação, a miopia estratégica,<br />
o imediatismo, a timidez, a insegurança, a prudência, o desânimo e<br />
a decepção. Assim, uma pessoa criativa seria aquela que consegue combater<br />
esses inimigos, dando vazão a suas pulsões criativas.<br />
S<strong>em</strong> dúvida, ao retratar a criatividade, o autor, assim como a maioria<br />
dos publicitários, assume uma perspectiva idealista. Não só porque a interpreta<br />
como uma potência universal, como uma entidade escondida ou<br />
recalcada nos porões da mente, mas também porque a interpreta como<br />
algo intrínseco às coisas do mundo, às suas produções. Afinal, imputa a<br />
elas um valor criativo interno, como se houvesse produções criativas de<br />
maneira intrínseca, independent<strong>em</strong>ente de um agente assim as classificar.<br />
Desse modo, o anúncio criativo conteria valores, os quais estariam<br />
nas próprias mensagens que veiculam, <strong>em</strong> suas imagens e textos, b<strong>em</strong><br />
como na relação entre ambos os valores passíveis de ser<strong>em</strong> reconhecidos.<br />
Equívoco idealista. Inversão de realidade, ao menos da perspectiva<br />
materialista. Afinal, sob essa última perspectiva, o valor não pode estar<br />
nas próprias coisas. O real não diz o que vale, diria Comte-Sponville.<br />
Um anúncio, então, não pode conter valores, ser intrinsecamente bom<br />
ou ruim. Em consequência, não se reconhec<strong>em</strong> valores <strong>em</strong> um anúncio,<br />
mas atribu<strong>em</strong>-se valores a ele. Um anúncio é inovador e estética e culturalmente<br />
relevante porque assim é classificado, e não o contrário: é inovador<br />
e estética e culturalmente relevante, portanto, é assim classificado.<br />
Assim, um mesmo anúncio pode provocar reações completamente<br />
distintas. Os anúncios de cerveja, por ex<strong>em</strong>plo, costumam agradar<br />
aos homens, aumentar sua potência de existir, elevar seu conatus. Afinal,<br />
apresentam mulheres bronzeadas, alegres e cheias de vida, trajadas
152<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
<strong>em</strong> minúsculos biquínis, exibindo a volúpia de seus corpos e uma deliciosa<br />
“gelada” <strong>em</strong> suas mãos. No entanto, os mesmos comerciais costumam<br />
provocar a ira das f<strong>em</strong>inistas, mulheres não tão bronzeadas assim,<br />
n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre tão alegres e cheias de vida. Afinal, na visão delas, tais comerciais<br />
reforçariam a concepção machista de mulher-objeto, a concepção<br />
de que a mulher não passa de um produto a ser consumido, um produto<br />
entre outros, um produto mercantilizado e banalizado.<br />
Não é necessário dizer que as palavras e a forma de se expressar<br />
carregam <strong>em</strong> si uma carga ideológica capaz de atingir mais um determinado<br />
público do que outros. A publicidade de biscoito que leva <strong>em</strong><br />
sua <strong>em</strong>balag<strong>em</strong> o personag<strong>em</strong> favorito de uma criança vai convencê-la<br />
muito mais do que a seus pais. A publicidade vai alavancar o conatus da<br />
criança, vai extasiá-la, fazendo com que sua felicidade dependa da obtenção<br />
ou não do objeto desejado.<br />
Parece ficar claro que o valor de qualquer anúncio é s<strong>em</strong>pre uma<br />
atribuição, que um comercial simplesmente é, não guardando nenhum<br />
valor (positivo ou negativo), intrínseco, e que, se possui valor criativo, é<br />
porque assim alguém os valorou. Mas se a perspectiva idealista da criatividade<br />
constitui evident<strong>em</strong>ente uma ilusão, por que ela constituiria<br />
uma ideologia? Porque no campo publicitário a criatividade é um b<strong>em</strong>,<br />
algo que possui utilidade, que pode ser acumulado e t<strong>em</strong> o poder de se<br />
reproduzir. Um capital, portanto, simbólico, de maneira mais específica,<br />
pois confere a seus detentores a autoridade profissional ao ser reconhecido<br />
como criativo e talentoso por seus colegas. Um profissional da publicidade<br />
adquire entre eles um prestígio que pode lhe trazer uma série<br />
de outros benefícios, inclusive financeiros.<br />
Quando o Festival Internacional de Publicidade de Cannes pr<strong>em</strong>ia determinados<br />
comerciais, estabelece, <strong>em</strong> certa medida, as diretrizes da boa<br />
publicidade. Diretrizes que, s<strong>em</strong> dúvida, possu<strong>em</strong> implicações políticas.<br />
Afinal, têm o poder de alçar comerciais pr<strong>em</strong>iados à condição de criativos<br />
eficientes, trazendo, <strong>em</strong> resultado, prestígio e reconhecimento <strong>para</strong> seus<br />
produtores – prestígio que pode, portanto, converter-se <strong>em</strong> lucro.
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
153<br />
Dessa forma, ao interpretar<strong>em</strong> a criatividade como uma potencialidade<br />
universal, como uma entidade pronta a ser acessada, os profissionais da<br />
publicidade acabam servindo aos interesses daqueles que possu<strong>em</strong> mais<br />
poder nesse espaço. Afinal, essa interpretação coloca a criatividade como<br />
determinação do agente – determinação de uma subjetividade discriminada<br />
capaz de atualizar tal potência – <strong>em</strong> vez de apreen dê-la como uma<br />
determinação de um espaço social estruturado de maneira objetiva. Com<br />
isso, o sucesso ou fracasso de um anúncio, sua consagração ou não, acabam<br />
sendo atribuídos ao próprio profissional que o produziu – sua competência<br />
e habilidade <strong>em</strong> saber trabalhar ou não com a potência criativa<br />
que supostamente possui –, e não aos interesses de qu<strong>em</strong> assim o classificou.<br />
Isto é, aos interesses daqueles que dominam seu espaço de produção.<br />
Isso faz com que a estratégia utilizada pelas agências <strong>para</strong> se comunicar<strong>em</strong><br />
com as crianças, fique de certa forma, consagrada. As <strong>em</strong>presas,<br />
portanto, reproduz<strong>em</strong> esse tipo de medida que permanece ao longo<br />
dos t<strong>em</strong>pos. Voltando à implicação ética da comunicação, poderia<br />
ser diferente.<br />
CONCLUSÕES<br />
Neste capítulo, foram apresentadas três formas imbricadas de interação<br />
da mídia com os agentes sociais: a agenda, a opinião e a ideologia. Denunciou-se<br />
a incipiência das pesquisas na área, <strong>em</strong> especial no que diz<br />
respeito ao público infantil. A sociedade lamenta.<br />
O trabalho universitário é essencial <strong>para</strong> que os <strong>em</strong>bates políticos<br />
sobre a normatização da atividade publicitária tenham fundamento<br />
científico e se afast<strong>em</strong> das especulações e achismos de aventureiros interessados.<br />
Afinal, no desequilíbrio entre o capital e qualquer outro ideal,<br />
só evidências científicas irrefutáveis no momento pod<strong>em</strong> converter-se<br />
<strong>em</strong> argumentos de proteção aos despossuídos.
154<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
1. Eco U. Apocalípticos e integrados. São Paulo: Perspectiva, 2006.<br />
2. Bourdieu P. Il n’y a pas d’actes désinteressé. In: Coisas ditas. São Paulo: Ática,<br />
2004.<br />
3. Wolf M. Teorias da comunição de massa. São Paulo: Martins Fontes, 2005.<br />
4. Mccombs M. Public opinion quarterly. An agenda setting function of the media,<br />
1971.<br />
5. Barros Filho C. Ética na comunicação. São Paulo: Summus, 2008.<br />
6. Barros Filho C. Agenda setting na educação. Rev Com Edu 1995; 5.<br />
7. Barros Filho C. A publicidade como suporte pedagógico: a questão da discriminação<br />
por idade na publicidade da Sukita. In Famecos. Revista do Curso de Pós-<br />
-graduação da PUCRS 2001; 16:122-35.<br />
8. Noelle Neumann E. The social skin. Chicago: University of Chicago Press, 1993.<br />
9. Piaget J. O juizo moral na criança. São Paulo: Summus, 1994.<br />
10. Bourrdieu P. Ce que parler veut dire. Paris: Fayard, 1982.<br />
11. Thompsom JB. Ideologia e cultura moderna. Petrópolis: Vozes, 1998.<br />
NOTAS<br />
A<br />
B<br />
C<br />
A perspectiva determinista da hipótese mereceu críticas. De um lado, por parte<br />
daqueles que ve<strong>em</strong> na relação entre t<strong>em</strong>as da mídia e t<strong>em</strong>as da agenda pública<br />
uma relação dialética. De outro, por parte daqueles que, reconhecendo a influência<br />
da mídia, não consideram a agenda pública um resultado mecânico das decisões<br />
editoriais.<br />
As pesquisas sobre o agendamento de t<strong>em</strong>as publicitários é menos frequente se<br />
com<strong>para</strong>da a outros produtos da mídia, como a notícia. Um ex<strong>em</strong>plo de investigação<br />
crítica da produção publicitária que investiga seu agendamento é proposto<br />
por Barros Filho. 7<br />
É de urgência e grande interesse social a investigação, ainda incipiente, sobre os<br />
efeitos do agendamento publicitário junto ao público infantil. Os programas de<br />
pós-graduação <strong>em</strong> comunicação poderiam consagrar <strong>em</strong> suas linhas de pesquisa<br />
um espaço <strong>para</strong> essa relevante produção.
REGULAMENTAÇÃO VERSUS<br />
AUTORREGULAMENTAÇÃO<br />
João Lopes Guimarães Júnior<br />
A necessidade de restringir a publicidade de alimentos dirigida às crianças<br />
v<strong>em</strong> sendo debatida <strong>em</strong> todo o mundo por especialistas <strong>em</strong> nutricionismo<br />
e saúde pública, preocupados <strong>em</strong> reverter o probl<strong>em</strong>a da obesidade<br />
infantil a partir da constatação de que uma política pública séria<br />
não pode ignorar o impacto de estratégias de marketing cada vez mais<br />
agressivas adotadas pelas <strong>em</strong>presas <strong>para</strong> seduzir esse público.<br />
As razões que mobilizam as iniciativas no sentido da regulamentação<br />
da publicidade de alimentos não saudáveis <strong>para</strong> crianças baseiam-se<br />
nas seguintes constatações:<br />
• a obesidade, nas décadas recentes, evoluiu e se tornou um dos mais<br />
graves probl<strong>em</strong>as mundiais de saúde pública, como resultado de profundas<br />
mudanças de hábitos alimentares e da adoção de estilos de vida<br />
sedentários;<br />
• as autoridades sanitárias dev<strong>em</strong> conceber e impl<strong>em</strong>entar uma política pública<br />
ampla e eficiente, que atinja não apenas os efeitos, mas também as<br />
causas da obesidade, uma vez que “a saúde é direito de todos e dever do
156<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Esta do, garantido mediante políticas sociais e econômicas que vis<strong>em</strong> à redução<br />
do risco de doença” (Constituição Federal, Art. 196);<br />
• é impossível combater a obesidade s<strong>em</strong> promover a reeducação alimentar;.<br />
• a preocupação com a adoção de uma dieta saudável, que impeça o consumo<br />
excessivo de alimentos ricos <strong>em</strong> açúcar, sódio e gordura, deve começar<br />
na infância, <strong>em</strong> um esforço <strong>para</strong> reverter o alarmante aumento da obesidade<br />
entre as crianças e evitar agravos sanitários precoces;<br />
• a publicidade de alimentos dirigida ao público infantil exerce influência<br />
significativa nos hábitos alimentares das crianças, constituindo, assim,<br />
um fator importante <strong>para</strong> o agravamento de um probl<strong>em</strong>a de saúde<br />
pública, uma vez que estimula o consumo de produtos de baixo valor<br />
nutricional.<br />
O enfoque na proteção da saúde das crianças precisa ser ressaltado diante<br />
da reação de setores cujos interesses econômicos pod<strong>em</strong> ser atingidos,<br />
os quais argumentam que restringir publicidade significaria violar<br />
os direitos à livre iniciativa e à liberdade de expressão. A estratégia dos<br />
lobbies que atuam contra a regulamentação consiste <strong>em</strong> desviar indevidamente<br />
o debate <strong>para</strong> um suposto conflito ideológico – liberalismo<br />
versus intervencionismo –, com espaço <strong>para</strong> argumentos ad terror<strong>em</strong><br />
sugerir<strong>em</strong> uma interferência paternalista, abusiva e arbitrária do Estado<br />
na vida dos cidadãos.<br />
A retórica diversionista de lobbies que colocam seus interesses corporativos<br />
acima de interesses sociais procura, estrategicamente, evitar a<br />
questão de fundo: como negar a legitimidade da intervenção estatal na<br />
economia quando se trata de proteger a saúde de crianças diante de um<br />
probl<strong>em</strong>a grave e concreto? Vale l<strong>em</strong>brar que o Brasil e diversos outros<br />
países de grande tradição d<strong>em</strong>ocrática possu<strong>em</strong>, há muito t<strong>em</strong>po, legislação<br />
que restringe intensamente atividades econômicas consideradas<br />
de algum modo lesivas à saúde pública. A criminalização do comércio<br />
de entorpecentes, a restrição à venda de psicotrópicos e a proibição da<br />
publicidade de cigarros são apenas alguns ex<strong>em</strong>plos b<strong>em</strong> conhecidos de
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
157<br />
estratégias de políticas públicas que autoridades sanitárias adotaram <strong>em</strong><br />
várias partes do mundo – não <strong>para</strong> eliminar o capitalismo ou as liberdades<br />
individuais, mas <strong>para</strong> proteger a saúde pública.<br />
Nesse contexto, a reação alarmista contra a regulamentação só se<br />
explica como desespero de qu<strong>em</strong> quer que interesses privados prevaleçam<br />
sobre interesses públicos. É l<strong>em</strong>brado <strong>aqui</strong> que muitas das maiores<br />
<strong>em</strong>presas alimentícias têm reconhecido a gravidade do probl<strong>em</strong>a e<br />
vêm assumindo, voluntariamente, o compromisso de não veicular publicidade<br />
de produtos não saudáveis <strong>para</strong> as crianças. Essa é a responsabilidade<br />
social esperada dos agentes econômicos, com a consciência de<br />
que a livre iniciativa deve assegurar a todos existência digna, observado<br />
o princípio da defesa do consumidor, como prevê o Art. 170 da Constituição<br />
Federal.<br />
O filósofo inglês John Stuart Mill (1806-1873) estabeleceu um dos<br />
princípios que fundamenta o liberalismo, inclusive a liberdade de expressão.<br />
O Princípio do Dano fixa condição <strong>para</strong> que a interferência estatal<br />
sobre a liberdade humana seja aceitável na conhecida fórmula: “o<br />
único propósito pelo qual pode ser exercido com pleno direito o poder<br />
sobre qualquer m<strong>em</strong>bro de uma comunidade civilizada, contra a vontade<br />
deste, é o de prevenir o dano a outros”. A imposição de restrições às<br />
<strong>em</strong>presas na veiculação de publicidade que pode estimular hábitos alimentares<br />
não saudáveis legitima-se, segundo essa lógica, na prevenção<br />
de danos às crianças. Além disso, se por lei as crianças “são absolutamente<br />
incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil”, não deveriam<br />
ser alvo de indução ao consumo por meio de estratégias que se<br />
aproveit<strong>em</strong> da sua deficiência de julgamento e experiência, proibidas<br />
pelo Center for Disease Control (CDC).<br />
Havendo, como efetivamente há, razões legítimas <strong>para</strong> a regulamentação<br />
da publicidade de alimentos pelo Estado, no contexto de política<br />
pública sanitária, a sociedade não deve se contentar com a autorregulamentação,<br />
isto é, a restrição interna corporis ditada pelo próprio<br />
mercado.
158<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
É certo que a publicidade comercial vai muito além da mera veiculação<br />
de informação. É inegável seu propósito imperativo: ela existe<br />
<strong>para</strong> persuadir o público, <strong>para</strong> instigar o consumo de determinados bens<br />
e serviços, <strong>para</strong> interferir na vontade dos destinatários de suas sofisticadas<br />
mensagens, <strong>para</strong> causar repercussão no comportamento das pessoas.<br />
É por isso que os próprios publicitários, por meio do Código Brasileiro<br />
de Autorregulamentação Publicitária, defin<strong>em</strong> publicidade como<br />
“toda atividade destinada a estimular o consumo de bens e serviços, b<strong>em</strong><br />
como promover instituições, conceitos ou ideias” (Art. 8º) e reconhec<strong>em</strong><br />
que “a publicidade exerce forte influência de ord<strong>em</strong> cultural sobre<br />
grandes massas da população” (Art. 7º).<br />
Mas qual é o limite ético e legal <strong>para</strong> as mensagens e estratégias publicitárias<br />
dirigidas ao público infantil? Até que ponto é lícito, <strong>para</strong> as<br />
<strong>em</strong>presas, “estimular o consumo de bens e serviços” e “exercer forte influência<br />
de ord<strong>em</strong> cultural” sobre massas de crianças por meio da publicidade?<br />
O que dizer quando essa influência é determinante na promoção<br />
de hábitos alimentares prejudiciais à saúde infantil?<br />
A ética publicitária é insuficiente <strong>para</strong> a proteção de todos os valores<br />
da sociedade brasileira. Embora o Conselho de Autorregulamentação<br />
Publicitária (Conar) mereça todo o respeito, deve ser visto pelo<br />
que é: uma entidade corporativa que jamais se colocará contra interesses<br />
econômicos do mercado publicitário. Em uma sociedade plural e d<strong>em</strong>ocrática,<br />
todos os setores dev<strong>em</strong> se submeter a controle externo, especialmente<br />
quando se trata de observar interesses e valores protegidos<br />
pela Constituição. Essa regra deve valer também <strong>para</strong> o mercado publicitário,<br />
cuja atividade influencia fort<strong>em</strong>ente o comportamento social.<br />
A importância da publicidade é inegável <strong>para</strong> a dinâmica de uma<br />
economia baseada na livre iniciativa, mas vale l<strong>em</strong>brar que a mensag<strong>em</strong><br />
s<strong>em</strong>pre será <strong>em</strong>itida com finalidade meramente venal – a intenção<br />
é vender. A preponderância de interesses mercantis não pode ser<br />
absoluta, especialmente <strong>em</strong> um país que t<strong>em</strong> como fundamentos a<br />
dignidade humano e os valores sociais da livre iniciativa, como quer a
II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />
159<br />
Constituição logo <strong>em</strong> seu primeiro artigo. Assim, conclui-se que a autorregulamentação,<br />
por si só, não basta <strong>para</strong> a garantia dos direitos<br />
constitucionais de proteção integral de crianças e adolescentes e de<br />
defesa dos consumidores diante da publicidade.
I JORNADA SOBRE TABELAS DE<br />
COMPOSIÇÃO DE ALIMENTOS<br />
E CÁLCULO INFORMATIZADO<br />
DE DIETAS<br />
29 de outubro de 2008<br />
Teatro Marcos Lindenberg – <strong>Unifesp</strong>
DETERMINAÇÃO DO NÍVEL DE<br />
HEMOGLOBINA UTILIZANDO<br />
A TÉCNICA DA GOTA SECA EM<br />
PAPEL DE FILTRO – PESQUISA<br />
NACIONAL DE DEMOGRAFIA E<br />
SAÚDE (PNDS, 2006)<br />
Helio Vannucchi<br />
A an<strong>em</strong>ia é a desord<strong>em</strong> nutricional mais generalizada no mundo, representando<br />
um grave probl<strong>em</strong>a de saúde pública. Na América Latina e no<br />
Caribe, aproximadamente 30% das mulheres e 25% das crianças abaixo<br />
de 5 anos de idade são anêmicas. No Brasil, a an<strong>em</strong>ia t<strong>em</strong> sido encontrada<br />
<strong>em</strong> várias regiões e diferencia-se de outras condições carenciais<br />
por não se limitar a acometer apenas as populações de mais baixa renda<br />
ou apenas os desnutridos. 1 Contudo, a an<strong>em</strong>ia ferropriva compromete<br />
principalmente alguns grupos mais sensíveis à escassez de ferro devido<br />
ao crescimento rápido ou ao aumento de d<strong>em</strong>anda: crianças entre 6<br />
meses e 5 anos de idade, adolescentes do sexo f<strong>em</strong>inino e mulheres <strong>em</strong><br />
idade fértil. 2-4<br />
No Brasil, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 30%<br />
das crianças abaixo de 5 anos têm an<strong>em</strong>ia, sendo a segunda maior prevalência<br />
na América Latina. 2 Em um enfoque nacional, alguns autores<br />
consideram que essas estimativas estão subestimadas e que a prevalência<br />
efetiva do probl<strong>em</strong>a <strong>em</strong> crianças pode ser 50% maior que os valores<br />
ditados pela OMS, alcançando 45%. 5
164<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
O diagnóstico clínico de an<strong>em</strong>ia de severidade moderada é complicado<br />
por causa da baixa percepção de palidez intermediária no exame<br />
físico. 6-8 No Brasil, a validade e a confiabilidade da presença de palidez<br />
palmar e conjuntival <strong>para</strong> a detecção de an<strong>em</strong>ia foi avaliada por Spinelli<br />
et al. 9 A com<strong>para</strong>ção entre os diagnósticos de an<strong>em</strong>ia obtidos pelo exame<br />
palmar e conjuntival contra os resultados obtidos pela determinação<br />
dos níveis de h<strong>em</strong>oglobina mostrou baixa concordância.<br />
Uma alternativa relativamente simples <strong>para</strong> a avaliação de an<strong>em</strong>ia<br />
pode ser observada pela utilização de um aparelho portátil com capacidade<br />
de medir a concentração de h<strong>em</strong>oglobina no sangue obtido por<br />
punção digital com resultado imediato. Entretanto, esse equipamento<br />
(h<strong>em</strong>oglobinômetro – H<strong>em</strong>ocue®) <strong>para</strong> pesquisas abrangendo distâncias<br />
e condições locais tão díspares, com grandes dificuldades <strong>em</strong> um<br />
país de dimensões continentais como o Brasil, não pode ser considerado<br />
viável. Isso exigiria a disponibilidade dos equipamentos <strong>em</strong> muitos municípios<br />
e os procedimentos dependeriam da habilidade de cada operador,<br />
cujo treinamento envolveria conhecimento de técnicas de laboratório,<br />
ainda que simples.<br />
Contudo, a gota seca pre<strong>para</strong>da com sangue periférico t<strong>em</strong> sido<br />
indicada <strong>para</strong> testes (screening) <strong>em</strong> vários estudos epid<strong>em</strong>iológicos. 10<br />
Essa técnica, na qual o sangue colhido por punção digital é depositado<br />
<strong>em</strong> papel de filtro especial, seco <strong>em</strong> t<strong>em</strong>peratura ambiente e depois<br />
eluído <strong>para</strong> dosag<strong>em</strong>, t<strong>em</strong> sido utilizada <strong>para</strong> análises s<strong>em</strong>iquantitativas<br />
de aminoácidos 11,12 , hormônios 13 , lipídios 14 e drogas terapêuticas 15 , assim<br />
como <strong>para</strong> testes genéticos. 16 O teste da gota seca t<strong>em</strong> sido muito utilizado<br />
com sucesso nos testes neonatais <strong>para</strong> defeitos congênitos, tais como<br />
a fenilcetonúria, oferecendo grande contribuição ao diagnóstico desse<br />
probl<strong>em</strong>a metabólico.<br />
Considerando as dificuldades técnicas <strong>para</strong> o diagnóstico clínico<br />
de an<strong>em</strong>ia, uma vez que o exame físico possui baixa sensibilidade, o exame<br />
de sangue é invasivo e a utilização de h<strong>em</strong>oglobinômetro foi considerada<br />
inviável por razões técnicas e econômicas, propõe-se estimar a
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
165<br />
prevalência de an<strong>em</strong>ia <strong>em</strong> mulheres e crianças menores de 5 anos pela<br />
técnica de gota seca.<br />
Esse método possui como vantagens:<br />
• a coleta das amostras é relativamente indolor, não invasiva e pode ser feita<br />
no domicílio, com menor necessidade de pessoal altamente qualificado;<br />
• as amostras dispensam centrifugação, se<strong>para</strong>ção ou congelamento imediato<br />
e proteção especial <strong>para</strong> transporte, como congelamento;<br />
• uma vez no laboratório, as amostras permanec<strong>em</strong> estáveis, congeladas<br />
por longos períodos. Uma gota típica contém 50 mcL de sangue total e<br />
t<strong>em</strong> aproximadamente 12 mm de diâmetro, permitindo a obtenção de até<br />
7 discos de 3,2 mm.<br />
A principal desvantag<strong>em</strong> desse método é que, no momento, poucos laboratórios<br />
comerciais ou acadêmicos têm experiência direta com ele.<br />
Utilizando essa técnica, foram analisadas 3.455 amostras de sangue<br />
de crianças de 6 a 59 meses e 5.669 amostras de sangue de mulheres<br />
não grávidas de 15 a 49 anos de idade <strong>para</strong> a determinação de h<strong>em</strong>oglobina.<br />
As amostras de sangue coletadas <strong>em</strong> papel de filtro foram secas<br />
ao ar ambiente <strong>para</strong> posterior quantificação por meio de kit laboratorial<br />
(Labtest®, Brasil).<br />
Em crianças, os critérios diagnósticos <strong>para</strong> an<strong>em</strong>ia, considerando-<br />
-se a faixa etária e as recomendações da OMS, são: an<strong>em</strong>ia leve (h<strong>em</strong>oglobina<br />
na faixa de > 9 a < 11 g/dL), an<strong>em</strong>ia moderada (h<strong>em</strong>oglobina entre<br />
7 e 9 g/dL) e an<strong>em</strong>ia grave (abaixo de 7 g/dL). 17<br />
Os principais resultados desse estudo mostram que a prevalência<br />
de an<strong>em</strong>ia <strong>em</strong> mulheres não grávidas é de 33% entre 15 e 19 anos, 29,2%<br />
entre 20 e 35 anos e 28,3% entre 36 e 49 anos. A região Nordeste apresentou<br />
a maior prevalência (39,1%), seguida das regiões Sudeste (28,5%),<br />
Sul (24,8%), Centro-oeste (20,1%) e Norte (19,3%).<br />
Em crianças de 6 a 59 meses de idade, a prevalência de an<strong>em</strong>ia seguiu<br />
a mesma tendência apresentada pelas mulheres, sendo a maior na
166<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
região Nordeste (25,5%), seguida das regiões Sudeste (22,6%), Sul (21,5%),<br />
Centro-oeste (11%) e Norte (10,4%). A prevalência foi maior na área urbana<br />
(23,1%) e não houve diferença entre as faixas etárias estudadas.<br />
No Brasil, os dados de prevalência de an<strong>em</strong>ia variam de 22,7 a 77%,<br />
e nas diferentes regiões essas discrepâncias estão relacionadas aos fatores<br />
socioeconômicos. 18<br />
Vale destacar que essa é a primeira pesquisa com gota seca realizada<br />
no Brasil e que o trabalho no laboratório ocorreu de modo seguro,<br />
sendo as amostras recebidas e identificadas conforme enviadas, ou seja,<br />
nenhum envelope foi violado ou rasurado, e o processamento das amostras<br />
seguiu o fluxo de chegada, s<strong>em</strong> acúmulo excessivo.<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
1. Bottoni A, Ciolette A, Schmitz BAS, Campanaro CM, Accioly E, Cuvello LCF.<br />
An<strong>em</strong>ia Ferropriva. Rev Paul Pediatr 1997; 15(3):127-34.<br />
2. World Health Organization. Iron deficiency ana<strong>em</strong>ia: assessment, prevention<br />
and control. A guide for programme managers. Genebra: WHO, 2001.<br />
3. World Health Organization. Vitamin and mineral requir<strong>em</strong>ents in human nutrition.<br />
2.ed. Bangkok: WHO, 1998.<br />
4. Centers for Diseases Control and Prevention. Recommendations to prevent<br />
and control iron deficiency in the United States. Morbidity and Mortality<br />
Weekly Report 2008; 47(3).<br />
5. Monteiro CA, Szarfarc SC, Mondini L. Tendência secular da an<strong>em</strong>ia na cidade<br />
de São Paulo (1984-1996). Rev Saúde Pública 2000; 34(Suppl. 6):62-72.<br />
6. Sheth TN, Choudhry NK, Bowes M, Detsky AS. The relation of conjunctival<br />
pallor to the presence of an<strong>em</strong>ia. J Gen Intern Med 1997; 12(2):102-6.<br />
7. Kalter HD, Burnham G, Kolstad PR, Hossain M, Schillinger JA, Khan NZ et<br />
al. Evaluation of clinical signs to diagnose ana<strong>em</strong>ia in Uganda and Bangladesh,<br />
in areas with and without malaria. Bull World Health Organ 1997; 75(Suppl.<br />
1):103-11.<br />
8. Sanchez-Carrillo CI. Bias due to conjunctiva hue and the clinical assessment of<br />
an<strong>em</strong>ia. J Clin Epid<strong>em</strong>iol 1989; 42(8):751-4.
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
167<br />
9. Spinelli MGN, Souza JMP, Souza SB, Sesoko EH. Confiabilidade e validade da<br />
palidez palmar e de conjuntivas como triag<strong>em</strong> de an<strong>em</strong>ia [Reliability and validity<br />
of palmar and conjunctival pallor for an<strong>em</strong>ia detection purposes]. Rev Saúde<br />
Públ 2003; 37(4):404-8.<br />
10. Sean D, O’Brien, Gunter EW. Screening of folate status with use of dried blood<br />
spots on filter paper. Am J Clin Nutr 1999; 70:359-67.<br />
11. Blau K. Determination of phenylalanine in filter paper blood spots by a simplified<br />
automated fluorometric method without dialysis. Ch<strong>em</strong> Chim Acta 1983;<br />
129:187-200.<br />
12. Becker K, Harenz J, Kalle N, Hommel G, Behlrhani AW. Com<strong>para</strong>tive column<br />
chromatographic estimations of phenylalanine in plasma, whole blood matrix<br />
and paper-dried capillary blood, of healthy children and adults, and patients<br />
with hyperphenylalanin<strong>em</strong>ia J Inherit Metab Dis 1985; 8:119-22.<br />
13. Basset F, Gross BA, Eastman CJ. Radioimmunoassay of prolactin in blood spotted<br />
on filter paper. Clin Ch<strong>em</strong> 1986; 32:854-6.<br />
14. Hirst AD, Beswick K. A blood spot assay for apo A1 and B lipoprotein and apo<br />
B A1 ratio, Ann Clin Bioch<strong>em</strong> 1993; 30:476-81.<br />
15. Lampe D, Scholz D, Prumke HJ, Blank W, Huller H. Capillaty blood, dried on<br />
filter paper, as a sample for monitoring cyclosporine A concentrations. Clin<br />
Ch<strong>em</strong> 1987; 33:1643-4.<br />
16. Loffredo CA, Ewing CK. Use of stored newborn blood spots in research on<br />
birth defects: variation in retrieval rates by type of defect and infant characteristics.<br />
Am J Med Genet 1997; 69:85-8.<br />
17. De Maeyer EM, Dallman P, Gurney JM, Hallberg L, Sood SK, Srikantia SG. Prévenir<br />
et combattre l’anémie ferriprive dans le cadre des soins de santé primaires.<br />
Genebra: OMS, 1991.<br />
18. Guerra CCC. Carência de ferro. Rev Soc Bras H<strong>em</strong>atol H<strong>em</strong>oter 1988;<br />
10(149):88-91.<br />
19. Batista Filho M. O controle das an<strong>em</strong>ias no Brasil. Rev Bras Saúde Matern Infant<br />
2004; 4(2):121-3.
TABELA BRASILEIRA DE<br />
COMPOSIÇÃO DE ALIMENTOS<br />
DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO<br />
(TBCA-USP)<br />
Eliana Bistriche Giuntini<br />
Elizabete Wenzel de Menezes<br />
Franco Maria Lajolo<br />
INTRODUÇÃO<br />
Informações <strong>em</strong> relação ao conteúdo de nutrientes e de outros componentes<br />
de alimentos, in natura e processados, são necessárias <strong>para</strong> a elaboração<br />
de programas nos campos da nutrição, saúde e educação, além<br />
de agricultura, indústria e marketing de alimentos. 1 De acordo com Sevenhuysen<br />
2 , “os benefícios econômicos de dados de composição de boa<br />
qualidade <strong>para</strong> a indústria e políticas governamentais são de fundamental<br />
importância”, tanto na padronização e na regulamentação de alimentos,<br />
como no favorecimento do comércio internacional, por meio da<br />
rotulag<strong>em</strong>.<br />
Segundo Southgate 3 , bancos de dados de alimentos são usados <strong>para</strong><br />
inúmeras atividades, porém todos os usuários têm algumas expectativas<br />
comuns. Eles esperam que os dados represent<strong>em</strong> os alimentos de sua região,<br />
que tenham sido obtidos por métodos de análise apropriados, de<br />
maneira criteriosa, e que reflitam a composição real do alimento.<br />
Dados de composição de alimentos, utilizados <strong>para</strong> determinar a<br />
ingestão de nutrientes, dev<strong>em</strong> representar alimentos consumidos na
170<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
atualidade, a fim de que seja possível relacionar a ingestão alimentar e a<br />
função metabólica. 4 Durante a década de 1990, inúmeros avanços baseados<br />
<strong>em</strong> dados epid<strong>em</strong>iológicos esclareceram o papel das dietas na redução de<br />
risco e no controle da morbidade e da mortalidade pr<strong>em</strong>atura resultante<br />
de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), como obesidade, diabetes,<br />
doenças cardiovasculares, hipertensão e alguns tipos de câncer. 5<br />
Esses avanços só foram possíveis graças à evolução dos métodos<br />
analíticos, que, cada vez mais, são capazes de fornecer informações fidedignas<br />
sobre a composição química dos alimentos.<br />
O INÍCIO DOS ESTUDOS DE COMPOSIÇÃO<br />
DOS ALIMENTOS<br />
Durante séculos, estudos químicos começaram a fundamentar o que seria<br />
o estudo sist<strong>em</strong>ático sobre composição de alimentos. Em 1665, Robert<br />
Hooke publicou uma teoria sobre combustão; Scheele, na Suécia,<br />
e Priestley, na Inglaterra, descobriram, independent<strong>em</strong>ente, o oxigênio;<br />
Cavendish identificou o hidrogênio <strong>em</strong> 1766; e Black, da University of<br />
Glasgow, descobriu a formação de gás carbônico na respiração, <strong>em</strong> 1757.<br />
Essas descobertas, não diretamente ligadas à nutrição, permitiram a Lavoisier,<br />
<strong>em</strong> 1780, d<strong>em</strong>onstrar a natureza da combustão e entender o processo<br />
de produção de energia <strong>em</strong> relação ao alimento. 6,7<br />
Mulder, <strong>em</strong> 1838, introduziu o termo proteína <strong>em</strong> estudos sobre albumina.<br />
Magendie mostrou que as proteínas pod<strong>em</strong> ter diferentes constituições<br />
e publicou, <strong>em</strong> 1841, um trabalho com<strong>para</strong>ndo a proteína da gelatina<br />
à da carne 6,7 , mas só <strong>em</strong> 1909 Thomas introduziu o conceito de qualidade<br />
proteica e o método <strong>para</strong> identificar o valor biológico das proteínas. 7<br />
O conhecimento sobre respiração e calorimetria permitiu o estudo<br />
sobre a necessidade energética do hom<strong>em</strong>. Von Voit, professor de fisiologia<br />
da University of Munich, foi o principal pesquisador dessa linha;<br />
junto a Pettenkofer, conduziu muitos estudos sobre metabolismo e influenciou<br />
Henneberger. Por toda sua contribuição, Lavoisier foi considerado<br />
o pai da composição química. 6
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
171<br />
Em 1850, um grupo de pesquisadores al<strong>em</strong>ães, comandado por<br />
Henneberger e Stohmann, iniciou a análise de composição centesimal<br />
de alimentos, <strong>em</strong> ração animal. Essa proposta foi chamada de método<br />
Weende e tornou-se um procedimento comum <strong>em</strong> alimentos: determinação<br />
da umidade por meio de secag<strong>em</strong> por aquecimento (heat-drying);<br />
determinação dos lipídios por meio de extração contínua com éter;<br />
teor de proteína obtido pela aplicação do fator 6,25 ao conteúdo de nitrogênio;<br />
fibra bruta determinada pela fração insolúvel após tratamento<br />
com ácido e álcali <strong>em</strong> resíduo s<strong>em</strong> minerais e gordura; e carboidratos<br />
calculados por diferença. A utilização do fator 6,25 <strong>para</strong> a conversão<br />
de nitrogênio <strong>em</strong> proteína baseou-se no conteúdo de 16% desse componente<br />
<strong>em</strong> proteína animal isolada, considerando que toda proteína<br />
contém a mesma quantidade de nitrogênio e que todo o nitrogênio é<br />
produto da proteína. No entanto, soube-se mais tarde que ambas as hipóteses<br />
não eram verdadeiras. 8,9<br />
A aplicação desses conceitos na ciência da nutrição foi feita por<br />
Max Rubner, médico e fisiologista al<strong>em</strong>ão, que, com sua equipe, <strong>em</strong> 1894,<br />
conseguiu d<strong>em</strong>onstrar com um cão o resultado da combustão de alimentos<br />
pela excreção da ureia e das trocas gasosas ao mesmo t<strong>em</strong>po. 10<br />
A investigação sist<strong>em</strong>ática do conteúdo de energia bruta dos alimentos<br />
pode ser atribuída a Rubner, na Al<strong>em</strong>anha, e a Atwater (que estudou<br />
com Rubner) nos Estados Unidos, usando bombas calorimétricas.<br />
Rubner, além de determinar a densidade energética de vários alimentos,<br />
d<strong>em</strong>onstrou que o corpo humano não consegue aproveitar toda a energia<br />
proveniente da combustão dos alimentos. Atwater e Bryant aprofundaram<br />
esses estudos e determinaram coeficientes de disponibilidade<br />
energética (Tabela 1) <strong>para</strong> os macronutrientes 11 , por meio da determinação<br />
do conteúdo de lipídios e nitrogênio de alimentos consumidos <strong>em</strong><br />
dietas mistas e da urina e fezes de indivíduos que consumiram essas dietas.<br />
Os carboidratos resultaram da diferença entre a quantidade total de<br />
material orgânico e a soma de proteína e gordura.
172<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
TABELA 1 Fatores de Atwater <strong>para</strong> combustão, coeficiente de disponibilidade e<br />
energia disponível <strong>para</strong> macronutrientes <strong>em</strong> uma dieta mista<br />
MACRONU-<br />
ENERGIA DE<br />
COEFICIENTE DE<br />
ENERGIA DISPONÍVEL<br />
TRIENTE<br />
COMBUSTÃO<br />
DISPONIBILIDADE<br />
POR TOTAL DE<br />
(KCAL/G)<br />
(%)<br />
NUTRIENTE (KCAL/G)<br />
Proteínas 5,65 92 4*<br />
Lipídios 9,4 95 8,9<br />
Carboidratos 4,1 97 4<br />
*Corrigido <strong>para</strong> material não oxidado na urina (5,65 kcal/g × 0,923 – 1,25 kcal/g).<br />
Fonte: Buchholz e Schoeller, 2004. 11<br />
Em 1941, Jones 12 sugeriu que o fator de conversão 6,25 <strong>para</strong> cálculo<br />
de proteína fosse substituído por fatores específicos, baseado no conhecimento<br />
de que o nitrogênio pode estar presente <strong>em</strong> outros compostos,<br />
como aminoácidos livres, nucleotídeos, creatina e colina, cujo nitrogênio<br />
não proteico (NPN) está disponível apenas <strong>em</strong> parte <strong>para</strong> a síntese<br />
de aminoácidos não essenciais, e que o conteúdo de nitrogênio varia de<br />
acordo com o peso molecular dos aminoácidos. Desse modo, o percentual<br />
de nitrogênio pode variar de 13 a 19%, dependendo da composição<br />
de aminoácidos. Esses fatores específicos, chamados fatores específicos<br />
de Jones, apresentam variação de 5,3 <strong>para</strong> algumas nozes ou s<strong>em</strong>entes a<br />
6,4 <strong>para</strong> o leite. 13<br />
Em 1955, Merrill e Watt refinaram os fatores do sist<strong>em</strong>a de Atwater,<br />
criando outros ainda mais específicos, baseados na variação do calor de<br />
combustão e no coeficiente de digestibilidade de diferentes proteínas, lipídios<br />
e carboidratos. 14 Esses fatores, com poucas modificações, foram<br />
republicados <strong>em</strong> 1973. 13,14 Paralelamente, Southgate e Durnin 15 testaram<br />
novamente os fatores gerais de Atwater <strong>em</strong> 1970 e concluíram por sua<br />
validade, exceto quando há grande consumo de carboidratos não disponíveis,<br />
pois há aumento de excreção de lipídios, nitrogênio fecal e, consequent<strong>em</strong>ente,<br />
da energia derivada desses nutrientes.
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
173<br />
De acordo com Dwyer 16 , os estudos sobre composição de alimentos<br />
passaram por quatro revoluções. A primeira, com Atwater, descreveu<br />
a energia advinda dos alimentos; a segunda trouxe a caracterização<br />
de vitaminas e minerais, que se mostraram importantes <strong>para</strong> evitar as<br />
doenças decorrentes de sua deficiência; na terceira, conhecendo-se melhor<br />
a composição dos alimentos, foram feitas associações entre dieta e<br />
doenças, incluindo as relacionadas à má nutrição e as DCNT; e a quarta<br />
relacionou-se com a descoberta de outras substâncias nos alimentos<br />
que também pod<strong>em</strong> afetar a saúde humana, como os compostos bioativos<br />
e fatores antinutricionais, que vêm sendo estudados e evidenciam<br />
que há um amplo campo de atuação a ser explorado.<br />
Possivelmente, a quinta revolução deverá estar relacionada com a<br />
biodiversidade. Segundo a Organização das Nações Unidas <strong>para</strong> Agricultura<br />
e Alimentação (FAO), o amplo conhecimento das informações<br />
de composição de alimentos de diferentes culturas das diversas regiões<br />
e países é importante <strong>para</strong> garantir a preservação e o uso sustentável da<br />
biodiversidade <strong>em</strong> programas de segurança alimentar e nutrição humana.<br />
AS PRIMEIRAS TABELAS DE<br />
COMPOSIÇÃO DE ALIMENTOS<br />
• 1844 – O francês Boussingault publicou uma tabela sobre o valor nutricional<br />
da ração animal. 6<br />
• 1851 – O al<strong>em</strong>ão Liebig publicou uma tabela com o valor nutritivo de alimentos<br />
baseado no conceito de alimentos plásticos ou nitrogenados e não<br />
nitrogenados. 6,9<br />
• 1878 – Konig publicou a primeira tabela europeia na Al<strong>em</strong>anha, Ch<strong>em</strong>ie<br />
der Menschlichen Nahrungs und Genussmittel. 17<br />
• 1891 – Jenkins e Winton publicaram a Compilation of Analyses of American<br />
Feeding Stuffs, com dados de análise de grãos e hortaliças. 6<br />
• 1894 – Atwater lançou uma primeira tabela oficial norte-americana de<br />
composição de alimentos – Foods: Nutritive Value and Cost. 18
174<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
• 1896 – Atwater e Wood 8 publicaram o Boletim 28 do United States Department<br />
of Agriculture (USDA) com The Ch<strong>em</strong>ical Composition of<br />
American Food Materials.<br />
• 1906 – Atwater et al. editaram uma revisão do Boletim 28. 6<br />
• 1916 – McKillop publicou, na Grã-Bretanha, uma tabela com muitos dados<br />
de alimentos norte-americanos. 6<br />
• 1921 – Plimmer publicou Analyses and Energy Valuers of Foods <strong>em</strong><br />
Londres. 17<br />
• 1925 – McKillop publicou a terceira edição da tabela, já com dados de alimentos<br />
britânicos, mas com influência de Atwater. 6<br />
• 1933 – McCance e Shipp publicaram, <strong>em</strong> Londres, The Ch<strong>em</strong>ie of Flesh<br />
Foods and their Losses on Cooking. 17<br />
• 1936 – Waller, do University of Michigan Hospital, publicou Nutritive Values<br />
of Foods, com dados sobre vitaminas. 6<br />
• 1937 – O USDA publicou Vitamin Content of Foods, com dados sobre vitaminas<br />
A, B, D, G e ácido ascórbico, compilados por Daniel e Munsell. Não<br />
havia dados sobre vitamina E, e os autores explicaram que se sabia que a<br />
riboflavina era essencial <strong>para</strong> algumas espécies, <strong>em</strong>bora fosse desconhecido<br />
seu papel <strong>para</strong> o hom<strong>em</strong>. 6<br />
• 1940 – Chatfield e Adams publicaram, pelo USDA, uma atualização da tabela<br />
de 1906, Proximate Composition of American Food Materials. O termo<br />
“proximal” foi utilizado <strong>em</strong> reconhecimento de que cada componente<br />
é composto por substâncias que têm propriedades <strong>em</strong> comum, mas<br />
que também pod<strong>em</strong> conter pequenas quantidades de outras substâncias<br />
ainda não conhecidas do ponto de vista químico. Não havia dados<br />
de vitaminas. 6<br />
• 1940 – McCance e Widdowson publicaram The Ch<strong>em</strong>ical Composition<br />
of Foods, na Inglaterra, já apresentando maior divergência com relação<br />
aos dados norte-americanos, principalmente <strong>em</strong> função dos métodos<br />
aplicados. 6,17<br />
• 1942 – Booher, Hartzler e Hewston publicaram Vitamin Values of Foods<br />
in Relation to Processing and Other Variants, <strong>em</strong> que são relacionados os
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
175<br />
fatores que afetam o teor de vitaminas, como variedade, método de cultivo,<br />
local de produção, processamento, estocag<strong>em</strong>, grau de maturação e<br />
métodos de análise. 6<br />
• 1942 – Vitamin Values of Foods in Terms of Common Measures foi publicado<br />
por Hewston e Marsh. Esses dados foram utilizados na publicação<br />
Table of Food Values Recommended for Use in Canada, no mesmo ano. 6<br />
• 1945 – Tables of Food Composition in Terms of Eleven Nutrients foi publicado<br />
pelo USDA, com dados de energia, proteína, lipídios, carboidratos,<br />
cálcio, fósforo, ferro, vitamina A, tiamina, riboflavina, niacina e ácido<br />
ascórbico. 6<br />
• 1944 a 1959 – Vários países lançaram suas primeiras tabelas: Vietnã, França,<br />
Al<strong>em</strong>anha, Noruega, Itália, Groelândia, Holanda, Grécia, África do<br />
Sul, Austrália, Japão, Filipinas, Índia, Coreia, Egito, Havaí. 6<br />
• 1949 – A FAO publicou pela primeira vez uma tabela de composição, Food<br />
Composition Tables for International Use, de Chatfield, na qual há uma referência<br />
datada de 1948 sobre dados de alimentos brasileiros. 18<br />
• 1954 – A FAO lançou, do mesmo autor, Food Composition Tables – Minerals<br />
and Vitamins – for International Use, a fim de compl<strong>em</strong>entar a tabela<br />
anterior. 6<br />
• 1961 – Foi lançada a primeira tabela <strong>para</strong> a América Latina – Food Composition<br />
Table for use in Latin America, de Leung e Flores –, cujos dados<br />
foram utilizados <strong>em</strong> programas de políticas governamentais <strong>em</strong> nutrição<br />
e saúde. Entretanto, muitos países na América Latina já tinham suas próprias<br />
tabelas (Tabela 2). 1<br />
Com o progresso da ciência da nutrição, referente às necessidades nutricionais<br />
e ao entendimento sobre a variabilidade do conteúdo dos nutrientes,<br />
tornou-se evidente a importância de aprimorar o conhecimento<br />
sobre os alimentos típicos de cada região. Assim, a partir de 1958, a<br />
FAO iniciou um programa de criação e publicação de tabelas de composição<br />
de alimentos regionais. 2
176<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
TABELA 2<br />
Publicações de tabelas de composição de alimentos na América Latina<br />
PAÍS/REGIÃO<br />
PRIMEIRAS PUBLICAÇÕES<br />
América Latina 1961<br />
Argentina 1935 a 1942<br />
Bolívia 1966<br />
Brasil 1948* a 1950<br />
Chile 1961<br />
Colômbia 1944<br />
Equador 1954<br />
México 1940<br />
Peru 1960<br />
República Dominicana 1964<br />
Uruguai 1949<br />
Venezuela 1950<br />
*1948 – citada pela FAO. 18<br />
Fonte: Bressani. 1<br />
ATUAÇÃO DA FAO E DA UNITED NATIONS UNIVERSITY<br />
APÓS A DÉCADA DE 1980<br />
Depois de colaborar na elaboração das tabelas regionais de composição<br />
de alimentos, a FAO reduziu suas atividades nessa área na década de<br />
1970, quando <strong>completo</strong>u sua série de tabelas. 19<br />
Anos mais tarde, baseada na recomendação de um grupo internacional<br />
coordenado pela United Nations University (UNU), <strong>em</strong> 1984, foi<br />
criada a International Network of Food Data Syst<strong>em</strong>s (Infoods), com o<br />
objetivo de estimular e coordenar esforços <strong>para</strong> melhorar a qualidade e<br />
a disponibilidade de dados analíticos de alimentos pelo mundo. 20<br />
Na América Latina, <strong>em</strong> 1986, ocorreu a primeira Conferência sobre<br />
Composição de Alimentos no Instituto de Nutrición de Centroamérica<br />
y Panamá (Incap), que visava a avaliar o grau de desenvolvimento
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
177<br />
das tabelas de composição dos países individualmente e por região, propor<br />
programas <strong>para</strong> atingir os objetivos propostos pelo Infoods e, ainda,<br />
desenvolver uma rede de trabalho de composição de alimentos na América<br />
Latina – o Latinfoods. 1<br />
Após a International Conference on Nutrition <strong>em</strong> 1992, a FAO, por<br />
meio do Infoods, v<strong>em</strong> propondo novas diretrizes e critérios <strong>para</strong> a área<br />
de composição de alimentos, publicando guias e manuais com protocolos<br />
a ser<strong>em</strong> usados na geração e compilação de dados e ampliando a comunicação<br />
e o intercâmbio de informações entre laboratórios. Outra<br />
proposta surgida nessa década foi a de incentivar a cooperação entre os<br />
governos e a indústria de alimentos, <strong>para</strong> o uso de dados de composição<br />
na informação pública e a promoção do comércio. 2 As instituições governamentais,<br />
por sua vez, dev<strong>em</strong> usar dados de composição de alimentos<br />
na formulação de políticas de saúde, alimentação e segurança alimentar,<br />
de acordo com a necessidade de grupos populacionais.<br />
A estratégia da FAO é a aplicação de um modelo regional de atuação,<br />
baseado na comunicação e no controle de qualidade, e t<strong>em</strong> como<br />
meta a geração, a diss<strong>em</strong>inação e a promoção do uso da informação de<br />
composição de alimentos de alta qualidade e <strong>em</strong> larga escala por profissionais,<br />
pesquisadores e instituições governamentais. O modelo fornece<br />
bases <strong>para</strong> a geração e a distribuição dos dados por meio de padrões e<br />
critérios continuamente revisados e dá suporte a comitês governamentais<br />
e instituições representativas <strong>para</strong> a supervisão de procedimentos e<br />
atividades relacionadas. 19<br />
Em âmbito internacional, a padronização é necessária <strong>para</strong> aumentar<br />
a difusão e o intercâmbio de dados. Os bancos de dados dev<strong>em</strong> ser<br />
compatíveis e padronizados, pois, dessa forma, o trabalho harmonizado<br />
promove a redução de gastos associados à geração e à manutenção<br />
de dados de composição <strong>em</strong> uma base global e, consequent<strong>em</strong>ente, diminui<br />
custos de produção de dados <strong>em</strong> países <strong>em</strong> desenvolvimento. 19<br />
Uma das propostas de padronização é a adoção de identificadores<br />
<strong>para</strong> os nutrientes. 20-23 Esses identificadores do Infoods (tagnames)<br />
representam o nutriente/componente de forma inequívoca, de acordo
178<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
com o método utilizado na análise, unidade e sua utilização <strong>em</strong> diferentes<br />
tabelas (Tabela 3).<br />
Uma das principais preocupações da FAO é referente à qualidade<br />
das informações. Os sist<strong>em</strong>as propostos <strong>para</strong> avaliação dos dados levam<br />
<strong>em</strong> conta o plano de amostrag<strong>em</strong>, o número de amostras e tratamento<br />
dado a elas, o método analítico e o controle de qualidade analítica (exatidão<br />
e precisão). Esses aspectos e números estão relacionados a conceitos<br />
de abrangência e representatividade que, aliados à documentação e à<br />
harmonização das informações, são a chave <strong>para</strong> a obtenção de um banco<br />
de dados de qualidade.<br />
TABELA 3 Ex<strong>em</strong>plos de identificadores (tagnames) do Infoods adotados <strong>para</strong> a<br />
descrição de cada componente<br />
NUTRIENTES UNIDADES IDENTIFICADORES/DESCRIÇÃO<br />
Umidade g Umidade <strong>em</strong> estufa a 105 o C<br />
Lipídios totais g Lipídios totais<br />
Lipídios totais obtidos por meio de extração<br />
contínua (método Soxhlet)<br />
Proteínas g Proteína total. Para cálculo das proteínas a partir<br />
do nitrogênio total, foram usados fatores de conversão da<br />
FAO/73*<br />
Produtos animais: carnes e peixes - 6,25; gelatina - 5,55; leite<br />
e derivados - 6,38; caseína - 6,40; leite humano - 6,37; ovo:<br />
inteiro - 6,25, albumina - 6,32, vitelina - 6,12<br />
Produtos vegetais: trigo: inteiro - 5,83, farelo - 6,31, <strong>em</strong>brião<br />
- 5,80, endosperma - 5,70; arroz e farinha de arroz - 5,95;<br />
centeio e farinha de centeio - 5,83; cevada e farinha de cevada<br />
- 5,83; aveia - 5,83; milho - 6,25; feijões - 6,25; soja - 5,71<br />
Oleaginosas: castanha-do-pará - 5,46; outras - 5,30<br />
Para os d<strong>em</strong>ais alimentos foi utilizado o fator 6,25<br />
(continua)
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
179<br />
(continuação)<br />
Fibra alimentar<br />
total<br />
Carboidratos<br />
disponíveis<br />
por diferença<br />
g<br />
g<br />
Fibra alimentar total determinada por método<br />
enzímico-gravimétrico ou não enzímico-gravimétrico (<strong>para</strong><br />
alimentos com baixo teor de amido) da AOAC** (24,25)<br />
Carboidratos metabolizáveis. Exclui a fração<br />
fibra alimentar (100 g – gramas totais de umidade, proteína,<br />
lipídios, cinzas e fibra alimentar)<br />
Energia kJ Energia total metabolizável expressa <strong>em</strong><br />
AOAC: Association of Official Agricultural Ch<strong>em</strong>ists.<br />
* Merril e Watt, 1973. 13<br />
** Cho et al., 1997; 24 Li e Cardozo, 1992. 25<br />
quilojoule (kJ), calculada a partir da energia dos nutrientes,<br />
considerando os fatores de conversão de Atwater: (17 × g<br />
proteína)+ (16 × g carboidratos (total de carboidratos - fibra<br />
alimentar) + (37 × g total de lipídios) + (29 × g de etanol)<br />
PERFIL DAS PRINCIPAIS TABELAS<br />
UTILIZADAS NO BRASIL<br />
• 1948 – Tabela de Alimentos Brasileiros, do Serviço de Alimentação da<br />
Previdência Social: 18 foi citada pela FAO <strong>em</strong> 1949, na publicação Food<br />
Composition Tables for International Use, mas não há informações sobre<br />
a orig<strong>em</strong> dos dados.<br />
• 1951 – Tabela de Composição Química de Alimentos, de Guilherme Franco,<br />
do Serviço de Alimentação da Previdência Social: 26 foi reeditada inúmeras<br />
vezes, <strong>em</strong>bora não apresente informações sobre a forma de obtenção<br />
dos dados e nunca tenha sido atualizada.<br />
• 1977 – Tabelas de Composição de Alimentos – Estudo Nacional de Despesas<br />
Familiares do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): 27<br />
adaptada aos objetivos do Endef, essa tabela é uma compilação de dados<br />
nacionais e internacionais, quando foram escolhidos os dados mais representativos,<br />
considerando-se números de amostras e métodos analíticos<br />
utilizados na época. Essas informações são mencionadas na parte introdutória<br />
da publicação, onde também é identificada sua orig<strong>em</strong>. As publicações<br />
e metodologias utilizadas são das décadas de 1960 e 1970; <strong>em</strong>
180<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
função disso, os dados sobre fibra apresentados refer<strong>em</strong>-se à fibra bruta e,<br />
no caso de vitaminas e minerais, são pouco precisos. Apresentam o nome<br />
científico dos alimentos e informações de alimentos crus e pre<strong>para</strong>dos.<br />
• 1995 – Tabela de Composição de Alimentos, de Mendez et al.: editada pela<br />
Universidade Federal Fluminense 28 , apresenta informações sobre preparo<br />
das amostras, nome científico, nome <strong>em</strong> espanhol e <strong>em</strong> inglês dos alimentos<br />
e metodologia utilizada na análise. Contudo, a fibra insolúvel foi obtida<br />
com solução detergente (ácido e neutro) e, a solúvel, por método que<br />
determina parte da pectina, de modo que os dados pod<strong>em</strong> estar subestimados,<br />
assim como os dados sobre energia.<br />
• 1998 – Tabela Brasileira de Composição de Alimentos – Universidade de<br />
São Paulo (TBCA-USP), Brasilfoods, Faculdade de Ciências Farmacêuticas<br />
da Universidade de São Paulo 29 : trata-se da primeira tabela da América<br />
Latina a ser disponibilizada na internet e v<strong>em</strong> sendo constant<strong>em</strong>ente atualizada.<br />
Adota padrões internacionais (Infoods/Latinfoods) no que se refere<br />
aos métodos analíticos e à identificação de alimentos e nutrientes; apresenta<br />
os alimentos de maneira detalhada (nome científico, parte do alimento,<br />
processamento, grau de maturação, etc.) e os dados por 100 g, b<strong>em</strong> como<br />
por medidas caseiras mais utilizadas ao respectivo alimento. É a primeira<br />
tabela que conta com informações sobre as diferentes frações de carboidratos<br />
e resposta glicêmica. As informações são encontradas pelo sist<strong>em</strong>a<br />
de busca por alimento, que contém dados de 2.089 alimentos entre composição<br />
centesimal, fibra alimentar, amido resistente, vitamina A e carotenoides,<br />
ácidos graxos e colesterol. É também a primeira tabela que conta<br />
com informações sobre diferentes frações de carboidratos e resposta glicêmica.<br />
Os dados sobre fibra alimentar foram obtidos por método enzímico-gravimétrico,<br />
há informações sobre carboidratos totais e disponíveis e<br />
os dados sobre energia são apresentados <strong>em</strong> quilocaloria (kcal) e quilojoule<br />
(kJ), calculados sobre o teor de carboidratos disponíveis, ou seja, não inclu<strong>em</strong><br />
a fibra alimentar. 30 Oferece, ainda, informações sobre porções recomendadas<br />
pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e sobre<br />
a orig<strong>em</strong> dos dados. 31
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
181<br />
• 2001 – Tabela de Composição de Alimentos – Suporte <strong>para</strong> Decisão Nutricional<br />
de Philippi 32 : t<strong>em</strong> como base o banco de dados utilizado no Virtual<br />
Nutri, um programa de nutrição e cálculo de dietas da Faculdade<br />
de Saúde Pública da Universidade de São Paulo 33 , que traz dados de várias<br />
tabelas, nacionais e internacionais, e dados de rótulos de produtos<br />
industrializados.<br />
• 2004 – Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (Taco), do Núcleo<br />
de Estudos e Pesquisa <strong>em</strong> Alimentação da Universidade Estadual de<br />
Campinas (Nepa/Unicamp): é uma tabela com dados de energia, macronutrientes,<br />
fibra alimentar, vitaminas, minerais de dados de frações de<br />
ácidos graxos de 495 alimentos, considerados representativos do hábito<br />
alimentar brasileiro. O teor energético foi obtido utilizando-se dados de<br />
carboidratos totais, o que inclui a fração de fibra alimentar.<br />
É importante destacar a elaboração de manuscritos internos (compilados<br />
e traduzidos de dados internacionais) <strong>para</strong> seu <strong>em</strong>prego <strong>em</strong> unidades<br />
e instituições, como os utilizados na Faculdade de Saúde Pública,<br />
no Curso de Graduação de Nutricionistas, durante as décadas de 1970<br />
e 1980.<br />
TBCA-USP<br />
A TBCA-USP 29 , criada <strong>em</strong> 1998, v<strong>em</strong> sendo elaborada mediante a adoção<br />
de uma série de critérios que inclu<strong>em</strong> informações referentes a<br />
amostrag<strong>em</strong>, procedimento analítico e identificação detalhada do alimento,<br />
conferindo confiabilidade aos dados analisados diretamente ou<br />
compilados a ser<strong>em</strong> incluídos. 34-36<br />
A Rede Brasileira de Dados de Composição de Alimentos (Brasilfoods)<br />
A iniciou suas atividades na década de 1980 e, ao longo dos anos,<br />
v<strong>em</strong> discutindo aspectos relacionados à importância da obtenção de<br />
dados de qualidade. Entre esses aspectos, estão os estudos colaborativos<br />
<strong>para</strong> aferição de técnicas analíticas <strong>para</strong> nutrientes críticos, com a<br />
realização de estudos <strong>para</strong> composição centesimal, aminoácidos, fibra
182<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
alimentar, vitamina A e carotenoides; compilação de dados com avaliação<br />
e documentação de metodologia utilizada; e integração com<br />
organismos internacionais, como Infoods, que define normas e padrões,<br />
com base científica, na área de composição de alimentos. 37,38<br />
Uma primeira iniciativa de compilação de dados nacionais no início<br />
da década de 1990 detectou a reduzida qualidade dos dados de composição<br />
de alimentos. 39 Muitos alimentos, basicamente de orig<strong>em</strong> vegetal,<br />
não apresentavam a descrição dos métodos analíticos utilizados<br />
ou haviam sido analisados por métodos inadequados, principalmente<br />
<strong>em</strong> relação à fibra alimentar (FA). Inúmeros dados foram descartados,<br />
outros foram utilizados após a compl<strong>em</strong>entação de informação com<br />
a realização de análise da FA por métodos validados pela Faculdade<br />
de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF/USP). 35<br />
Dessa forma, reiterou-se a necessidade de uniformizar procedimentos<br />
analíticos.<br />
O Projeto Integrado de Composição de Alimentos, criado pelo<br />
Brasilfoods, t<strong>em</strong> como objetivo principal a elaboração e a manutenção<br />
de uma tabela nacional de composição de alimentos, mediante a análise<br />
de novos alimentos, da compilação e avaliação da qualidade de dados<br />
de composição. Para tanto, foi criado um banco de dados de alimentos<br />
brasileiros, baseado nas diretrizes preconizadas pelo Infoods e adotadas<br />
pelo Latinfoods, relativas à identificação de nutrientes e alimentos, que<br />
visam a facilitar a troca de informações entre pesquisadores da área e<br />
bancos de dados de diferentes regiões do mundo. 34,30<br />
A TBCA-USP, que se tornou realidade <strong>em</strong> 1998, é o resultado da<br />
soma de esforços de mais de 27 laboratórios participantes do Projeto Integrado<br />
de Composição de Alimentos. É coordenada pela Rede Brasileira<br />
de Dados de Composição de Alimentos (Brasilfoods)/Departamento<br />
de Alimentos e Nutrição Experimental da FCF/USP e visa a disponibilizar<br />
informações de qualidade sobre composição de alimentos. 30<br />
Esses esforços foram reconhecidos pelo Ministério da Saúde,<br />
que indicou a TBCA-USP como referência <strong>para</strong> o estabelecimento da
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
183<br />
Resolução RDC 40, da Anvisa, sobre a rotulag<strong>em</strong> nutricional obrigatória<br />
<strong>em</strong> alimentos e bebidas <strong>em</strong>baladas 40 , e da RDC 360 de dez<strong>em</strong>bro de<br />
2003 31 , que substituiu a RDC 40 <strong>para</strong> se tornar compatível com o Mercado<br />
Comum do Sul (Mercosul).<br />
O Brasilfoods, além de centralizar as informações nacionais de<br />
composição de alimentos, colabora com a Tabla de Composición de Alimentos<br />
de América Latina, disponibilizando suas informações atualizadas<br />
<strong>para</strong> essa base de dados e participando de atividades que têm como<br />
meta gerar, compilar e difundir informações adequadas e confiáveis sobre<br />
composição de alimentos na região, além de promover a melhoria<br />
da qualidade desses dados. 41<br />
De acordo com Greenfield e Southgate 36 , <strong>para</strong> a elaboração de tabelas<br />
de alimentos os dados de composição pod<strong>em</strong> ser obtidos de três formas:<br />
análise direta, compilação e análise/compilação. A análise direta é<br />
a forma ideal, mas envolve custo elevado, infraestrutura (equipamentos<br />
e pessoal treinado), padronização e validação de metodologias, entre<br />
outras variáveis. A compilação envolve uma base teórica complexa,<br />
com critérios preestabelecidos <strong>para</strong> avaliação cuidadosa da qualidade<br />
dos dados. Nessa avaliação, dev<strong>em</strong> ser considerados diversos fatores,<br />
como plano de amostrag<strong>em</strong>, descrição do tratamento dado à amostra,<br />
identificação e procedimento do método analítico adotado, fatores de<br />
conversão, controle de qualidade analítica, identificação detalhada dos<br />
nutrientes e alimentos. 34-36<br />
O banco de dados da TBCA-USP baseia-se <strong>em</strong> análises químicas<br />
efetuadas na FCF/USP e compilação de dados de alimentos nacionais, levantados<br />
<strong>em</strong> publicações, dissertações, teses, informações internas de laboratórios<br />
públicos e privados, b<strong>em</strong> como de indústrias de alimentos. Os<br />
dados levantados são avaliados criteriosamente <strong>para</strong> a verificação das informações<br />
disponíveis sobre a metodologia analítica utilizada, o plano de<br />
amostrag<strong>em</strong>, o número de amostras, o controle de qualidade analítica, o<br />
tratamento dado à amostra, a descrição detalhada do alimento, entre outros.<br />
Análises de certos componentes são, às vezes, efetuadas na FCF/USP
184<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
a fim de compl<strong>em</strong>entar a informação, como é o caso da FA ou, ainda, umidade<br />
e cinzas. A FA deve ser analisada por metodologia específica – enzímico-gravimétrico<br />
–, a fim de que o teor de carboidratos e o valor energético<br />
possam ser calculados de maneira adequada. 42<br />
Informações disponíveis na TBCA-USP<br />
Desde seu lançamento, a TBCA-USP passou por inúmeras modificações<br />
<strong>em</strong> termos de formato e introdução de dados de novos alimentos e componentes.<br />
Na Tabela 4, encontram-se as principais alterações e a evolução<br />
<strong>em</strong> número de dados de composição centesimal. O banco de dados<br />
da TBCA-USP é composto, atualmente, por várias planilhas: de dados<br />
de nutrientes por 100 g de alimento, de identificação geral do alimento<br />
e uma de medidas caseiras/unidade e porção recomendada. No website,<br />
é feita a interface entre essas planilhas utilizando o código alfanumérico<br />
de identificação do alimento. O nome do alimento é composto pela sequência<br />
de colunas preenchidas na planilha de identificação, que segue<br />
a mesma ord<strong>em</strong> do formulário de compilação, e o programa executa cálculos<br />
cruzando as informações do banco de dados por 100 g com os gramas<br />
correspondentes à(s) determinada(s) medida(s) caseira(s), que aparecerão<br />
no resultado da busca (Figuras 1 e 2), ao lado das informações<br />
por 100 g (Figura 3). 42<br />
Um resumo das informações disponíveis na TBCA-USP pode ser<br />
visto na Tabela 5. Como os carboidratos e a resposta glicêmica dos alimentos<br />
estão relacionados à redução de risco de desenvolvimento de<br />
DCNT, dados dessa natureza vêm sendo analisados na FCF/USP <strong>para</strong><br />
ser<strong>em</strong> incorporados à TBCA-USP. O mesmo acontece com as vitaminas,<br />
ácidos graxos, compostos bioativos (flavonoides, carotenoides, organossulfurados<br />
e fitosteróis).
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
185<br />
FIGURA 1 Página inicial da TBCA-USP 5.0.<br />
FIGURA 2 Ex<strong>em</strong>plo da página de resultados da busca na TBCA-USP 5.0.
186<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
FIGURA 3 Ex<strong>em</strong>plo de apresentação dos dados na TBCA-USP 5.0.
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
187<br />
TABELA 4 Versões, data de lançamento e número de alimentos com dados de<br />
composição centesimal da TBCA-USP<br />
VERSÃO<br />
DATA DE<br />
NÚMERO DE<br />
PRINCIPAIS ALTERAÇÕES<br />
LANÇAMENTO<br />
DADOS CC<br />
TBCA-USP 1.0 Julho/1998 300 Formato de tabela tradicional<br />
TBCA-USP 1.1 Março/1999 390 Número de dados<br />
TBCA-USP 2.0 Junho/2000 390 Apresentação gráfica<br />
TBCA-USP 3.0 Março/2001 696 Tabela blocada, divisão por grupos<br />
de alimentos, número de dados<br />
TBCA-USP 4.0 Julho/2004 1.205 Sist<strong>em</strong>a de busca por alimento,<br />
medidas caseiras, energia <strong>em</strong> kj,<br />
número de dados<br />
TBCA-USP 4.1 Nov<strong>em</strong>bro/2004 1.205 Sist<strong>em</strong>a de busca alimento/nutriente<br />
Conferência eletrônica<br />
TBCA-USP 5.0 Agosto/2008 1.205 Informações sobre frações de<br />
carboidratos e resposta glicêmica<br />
CC: composição centesimal.<br />
TABELA 5<br />
Resumo das informações disponíveis na TBCA-USP sobre número de<br />
alimentos e componentes<br />
COMPONENTE<br />
NÚMERO DE ALIMENTOS<br />
Composição centesimal* 1.205<br />
FA total** 194<br />
Amido resistente 128<br />
Vitamina A/carotenoides # 290<br />
Ácidos graxos/colesterol 119<br />
Fenilalanina ## 251<br />
Frações de carboidratos 112<br />
Resposta glicêmica 41<br />
FA: fibra alimentar.<br />
* Inclui dados de FA por métodos enzímico-gravimétrico.<br />
** FA por métodos enzímico-gravimétrico, s<strong>em</strong> composição centesimal.<br />
#<br />
Parte das amostras foram analisadas com se<strong>para</strong>ção de isômeros.<br />
##<br />
Link disponibilizado.
188<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
No it<strong>em</strong> “Como enviar dados”, o formulário <strong>para</strong> compilação de dados,<br />
acompanhado de manual de preenchimento, está disponível <strong>para</strong><br />
download, tanto <strong>para</strong> estimular a r<strong>em</strong>essa de dados como <strong>para</strong> incentivar<br />
os pesquisadores a divulgar<strong>em</strong> seus dados de maneira mais completa,<br />
a fim de que possam ser devidamente avaliados <strong>em</strong> termos de qualidade<br />
da informação. 30 Para facilitar o trabalho de compilação de dados<br />
e promover a uniformização das informações enviadas, o formulário é<br />
composto de planilhas de compilação independentes <strong>para</strong> os grupos de<br />
nutrientes: carboidratos, aminoácidos, ácidos graxos, minerais, vitaminas<br />
lipossolúveis, vitaminas hidrossolúveis, composição centesimal,<br />
além de incluir as planilhas <strong>para</strong> a identificação dos alimentos e <strong>para</strong><br />
avaliação da qualidade analítica dos dados. 43 Esse formulário e o manual<br />
de preenchimento foram traduzidos <strong>para</strong> o espanhol e vêm sendo utilizados<br />
por diversos países participantes do Latinfoods. 44<br />
Com a finalidade de facilitar a busca por informações de alimentos/produtos<br />
não cont<strong>em</strong>plados pela TBCA-USP, estão disponíveis aos<br />
usuá rios links com websites relacionados, assim como referências bibliográficas<br />
publicadas pela Rede Brasilfoods e outros órgãos internacionais<br />
relevantes na área de composição de alimentos e bancos de dados.<br />
Várias dessas publicações estão <strong>em</strong> formato portable document<br />
format (<strong>PDF</strong>), possibilitando arquivamento ou impressão. 30<br />
Com<strong>para</strong>ções e utilização de dados de alimentos de diferentes tabelas<br />
pod<strong>em</strong> ocorrer, porém algumas informações são imprescindíveis<br />
<strong>para</strong> tal. Entre as tabelas disponíveis na internet, a tabela dinamarquesa<br />
Danish Food Composition Databank 45 , a Souci-Fachmann-Kraut 46 ,<br />
a do U.S. Department of Agriculture 47 , a da rede Latinfoods 41 , a da<br />
Argentina 48 , a Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (Taco) 49<br />
e a TBCA-USP apresentam dados de umidade e cinzas, o que possibilita<br />
a completa avaliação da composição centesimal, a conversão de<br />
dados <strong>para</strong> a base seca durante com<strong>para</strong>ções e a importação/exportação<br />
de dados.
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
189<br />
PROGRAMAS COMPUTADORIZADOS<br />
E VARIABILIDADE DE DADOS<br />
Ao se utilizar um programa computadorizado <strong>para</strong> cálculo de dietas ou<br />
consultar uma tabela de composição química de alimentos, deve-se ter<br />
<strong>em</strong> mente que os dados são valores médios, referentes a um determinado<br />
número de amostras analisadas. Portanto, variações entre tabelas são<br />
absolutamente normais, mesmo utilizando-se métodos analíticos oficiais,<br />
reconhecidos internacionalmente e validados. Segundo Klensin 20 ,<br />
“dados de composição de alimentos, assim como a maioria de outros dados<br />
científicos, raramente são verdadeiros ou falsos de forma absoluta”.<br />
Os alimentos, por seu caráter biológico, pod<strong>em</strong> conter diferentes<br />
teores de nutrientes, <strong>em</strong> função de variedade, safra, solo, clima, produção,<br />
formulação, entre outros; dessa forma, variações encontradas não<br />
pod<strong>em</strong> ser consideradas erros. No entanto, é de primordial importância<br />
a adoção de cuidados que envolvam desde a identificação detalhada do<br />
alimento até o controle da qualidade analítica, <strong>para</strong> garantir a qualidade<br />
das informações, mesmo que os dados provenientes de diferentes laboratórios<br />
não sejam exatamente iguais.<br />
Quando são avaliados e com<strong>para</strong>dos valores oriundos de diferentes<br />
tabelas, usadas <strong>em</strong> diferentes programas, dev<strong>em</strong>-se observar quais<br />
critérios foram adotados <strong>para</strong> esse fim. A omissão de detalhes analíticos<br />
ou a adoção de procedimento analítico inadequado, por ex<strong>em</strong>plo,<br />
pode afetar o julgamento das informações. Minimizando essas interferências,<br />
pod<strong>em</strong>-se, então, identificar fontes de variações, que não configuram<br />
erros.<br />
Alguns critérios básicos dev<strong>em</strong> ser observados <strong>para</strong> que haja maior<br />
confiabilidade das informações, como referência sobre procedimentos<br />
analíticos adotados e sua adequação <strong>para</strong> o nutriente, forma de seleção<br />
dos dados de alimentos a ser<strong>em</strong> compilados, número de amostra que<br />
originou os dados e identificação detalhada do alimento.<br />
Uma observação importante refere-se aos dados de FA, que dev<strong>em</strong><br />
ser obtidos por método enzímico-gravimétrico. Muitas tabelas <strong>em</strong> uso
190<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
ainda apresentam dados de fibra bruta (basicamente, celulose e parte de<br />
h<strong>em</strong>icelulose e lignina), que é apenas uma parte da FA. Além da importância<br />
de ser identificado o real teor de FA, responsável por inúmeros<br />
efeitos fisiológicos e associada à redução de risco de desenvolvimento<br />
de certas doenças, o valor obtido deve ser descontado da quantidade de<br />
carboidratos totais da dieta, <strong>para</strong> fins de cálculo de energia.<br />
A estimativa de carboidratos totais por diferença é um ex<strong>em</strong>plo<br />
clássico de prática adotada que interfere nos resultados. Embora bastante<br />
utilizada, essa estimativa permite que esse dado seja uma fonte de<br />
erro recorrente, pois se trata de cálculo dependente de análise de outros<br />
nutrientes e pode acumular variações referentes a elas, b<strong>em</strong> como<br />
incluir outros componentes. 9 Ainda hoje, algumas tabelas de composição<br />
de alimentos adotam essa estimativa, ou seja, descontam-se de 100<br />
os valores de umidade, cinzas, lipídios e proteínas. Esse valor obtido refere-se<br />
ao total de carboidratos, no qual a FA está incluída. Para o cálculo<br />
do valor energético do alimento, é necessário descontar o teor de<br />
FA da quantidade de carboidratos totais do alimento (carboidratos totais<br />
por diferença – FA = carboidratos disponíveis por diferença). Portanto,<br />
quando se utiliza uma tabela com dados de fibra analisada pelo<br />
método de fibra bruta, ou no caso de a FA não ter sido analisada, deve-<br />
-se saber que esses alimentos pod<strong>em</strong> estar com teor de energia superestimado.<br />
O ideal é que os diferentes carboidratos sejam analisados por<br />
métodos específicos <strong>para</strong> cada tipo. 50 Países como Austrália, Nova Zelândia<br />
e Reino Unido apresentam <strong>em</strong> suas tabelas os carboidratos analisados<br />
se<strong>para</strong>damente.<br />
É importante ressaltar que a TBCA-USP, desde sua criação, v<strong>em</strong><br />
apresentando dados de alimentos de forma individualizada, fornecendo<br />
informações detalhadas sobre variedade, espécie, grau de maturação,<br />
sazonalidade, entre outras. Essas informações são extr<strong>em</strong>amente importantes<br />
do ponto de vista nutricional, porque pod<strong>em</strong> implicar variações<br />
na quantidade de nutrientes dos alimentos. Tal detalhamento v<strong>em</strong> também<br />
ao encontro da preocupação que muitos órgãos internacionais têm
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
191<br />
d<strong>em</strong>onstrado <strong>em</strong> relação à biodiversidade de alimentos, pois os bancos<br />
de dados e tabelas de composição de alimentos, <strong>em</strong> sua maioria, apresentam<br />
valores médios de amostras compostas ou provenientes de cálculos<br />
sobre dados de amostras individuais.<br />
Vale l<strong>em</strong>brar que Atwater enfatizou que bancos de dados de composição<br />
de alimentos são ferramentas científicas que dev<strong>em</strong> ser usadas<br />
corretamente e que seu uso adequado depende do treinamento e da perícia<br />
do usuário. 16<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
1. Bressani R. Report on Latinfoods. The United Nations University Press. Food<br />
and Nutrition Bulletin 1990; 12(2). Tóquio. Disponível <strong>em</strong>: http://www.unu.<br />
edu/unupress/food/8F122e/8F122E0a.htm.<br />
2. Sevenhuysen GP. FAO’s food composition activities. In: FAO celebrates 50 years.<br />
1995. Disponível <strong>em</strong>: http://www.fao.org/docrep/V7700T/v7700t07.htm.<br />
3. Southgate DAT. Data quality in sampling, analysis and compilation. J Food<br />
Compos Anal 2002; 15(4):507-13.<br />
4. Holden JM. Expert syst<strong>em</strong>s for the evaluation of data quality for establishing<br />
the recommended dietary allowances. J Nutr 1996; 126(Suppl):2329-36.<br />
5. World Health Organization/Food and Agricultural Organization. Diet, nutrition<br />
and prevention of chronic diseases. WHO technical report series; 916. Genebra:<br />
WHO/FAO, 2003. Disponível <strong>em</strong>: http://www.who.int/hpr/NPH/ docs/<br />
who_fao_expert_ report.pdf>.<br />
6. McMasters V. History of food composition tables of the word. J Am Diet Assoc<br />
1963; 43:442-50.<br />
7. Savage G. Experimental ch<strong>em</strong>ists: the founders of nutrition. Nutr Today<br />
1992:24-9.<br />
8. Atwater WO, Woods CD. The ch<strong>em</strong>ical composition of american food materials.<br />
U.S. Department of Agriculture. Farmer’s Bulletin, Washington 1896; 28.<br />
9. Koivistoinen PE. Introduction: the early history of food composition analysis –<br />
source of artifacts until now. Food Ch<strong>em</strong> 1996; 57(1):5-6.
192<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
10. Carpenter KJ. A short history of nutritional science: Part 1 (1785–1885). J Nutr<br />
2003; 133:638-45.<br />
11. Buchholz AC, Schoeller DA. Is a calorie a calorie? Am J Clin Nut 2004;<br />
79(Suppl):899-906.<br />
12. Jones DB. Factors for converting percentages of nitrogen in foods and feeds<br />
into percentages of protein. U.S. Department of Agriculture, Circular 1941; 183.<br />
22p. Disponível <strong>em</strong>: http://www.nal.usda.gov/fnic/foodcomp/Data/Classics/<br />
cir183.pdf>.<br />
13. Merril AL, Watt BK. Energy value of foods, basis and derivation (revision). Agric.<br />
Handbook 94, US Department of Agriculture, Washington. 1973. 105p. Disponível<br />
<strong>em</strong>: http://www.nal.usda.gov/fnic/foodcomp/Data/Classics/ah74.pdf.<br />
14. Food and Agriculture Organization. Food energy: methods of analysis and conversion<br />
factors. Report of a technical worshop. FAO, Food and Nutrition Paper,<br />
77, Rome, 2003. Disponível <strong>em</strong>: ftp://ftp.fao.org/docrep/fao/006/y5022e/<br />
y5022e00.pdf.<br />
15. Southgate DAT, Durnin JV. Calorie conversion factors. An experimental reassessment<br />
of the factors used in the calculation of the energy value of human<br />
diets. Br J Nutr 1970; 24(2):517-35.<br />
16. Dwyer JT. Future directions in food composition studies. J Nutr 1994;<br />
124(Suppl.):1783-88S.<br />
17. Church SM. The history of food composition databases. Nutr Bull 2006; 31:15-20.<br />
18. FAO. Food and Agriculture Organization. Food composition tables for international<br />
use. Roma, 1949. Disponível <strong>em</strong>: http://www.fao.org/ docrep/x5557E/<br />
X5557E00.htm.<br />
19. Lupien JR. The FAO/UNU food composition initiative. Food Ch<strong>em</strong> 1996;<br />
57(1):171-3.<br />
20. Klensin JC. INFOODS Food composition data interchange handbook. Tóquio:<br />
United Nations University Press, 1992.<br />
21. Burlingame B. Proximate methods and modes of expression: variability as a<br />
harmonization issue. In: National Nutrient 21st Databank Conference, June<br />
20-22, 1996, Baton Rouge, Louisiana. Disponível <strong>em</strong>: http://www.nal.usda.gov.<br />
fnic/ foodcomp/conf/NDBC21/p6-1.pdf.
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
193<br />
22. Infoods. The International Network of Food Data Syst<strong>em</strong>s. Disponível <strong>em</strong>:<br />
http://www.fao.org/Infoods/tagnames_en.stm.<br />
23. Klensin JC, Feskanich D, Lin V, Truswell AS, Southgate DAT. Identification of<br />
food components for INFOODS data interchange. United Nations: University<br />
Press, 1989.<br />
24. Cho S, Devries JW, Prosky L. Dietary fiber analysis and applications. Maryland:<br />
AOAC International, 1997.<br />
25. Li BW, Cardozo MS. Nonenzymaticgravimetric determination of total fiber in<br />
fruits and vegetables. J AOAC Int 1992; 75(2):372-4.<br />
26. Franco G. Tabela de composição química de alimentos. Rio de Janeiro: Serviço<br />
de Alimentação da Previdência Social, 1951. 130p.<br />
27. Estudo Nacional de Despesas Familiares. Instituto Brasileiro de Geografia e<br />
Estatística (Endef – IBGE). Tabela de composição de alimentos. Endef-IBGE,<br />
1977.<br />
28. Mendez MHM, Derivi SCN, Rodriguez MCR, Fernandes ML. Tabela de composição<br />
de alimentos. Rio de Janeiro: EDUFF, 1995.<br />
29. Universidade de São Paulo. Faculdade de Ciências Farmacêuticas. Departamento<br />
de Alimentos e Nutrição Experimental. Tabela Brasileira de Composição<br />
de Alimentos-USP. Versão 4.1. Disponível <strong>em</strong>: http://www.fcf.usp.br/tabela.<br />
30. Giuntini EB. Tabela Brasileira de Composição de Alimentos TBCA-USP: 2001-<br />
2004. [Tese de Doutorado]. Programa Interunidades de Nutrição Humana Aplicada<br />
– Pronut FCF/FEA/FSP – São Paulo: USP, 2005.<br />
31. Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Regulamento técnico <strong>para</strong> Rotulag<strong>em</strong><br />
nutricional obrigatória de alimentos e bebidas <strong>em</strong>baladas. RDC 360, 23<br />
de dez<strong>em</strong>bro de 2003. Disponível <strong>em</strong>: http://www.anvisa.gov.br/legis/.<br />
32. Philippi ST. Tabela de Composição Centesimal: suporte <strong>para</strong> decisão nutricional.<br />
Brasília: Anvisa, Finatec/Nut-Unb, 2001.<br />
33. Philippi ST, Szarfarc SC, Latterza AR. Virtual Nutri: sist<strong>em</strong>a de análise nutricional<br />
– versão 1.0. São Paulo: FSP/USP, 1996.<br />
34. Menezes EW, Caruso L, Lajolo, FM. Uniformização internacional de dados brasileiros<br />
de composição de alimentos. Bol SBCTA 1997; 31(2):93-104.
194<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
35. Menezes EW, Gonçalves FAR, Giuntini EB, Lajolo FM. Brazilian food composition<br />
database: Internet diss<strong>em</strong>ination and others recent developments. J Food<br />
Compos Anal 2002; 15(4):453-64.<br />
36. Greenfield H, Southgate DAT. Food composition data: production, manag<strong>em</strong>ent<br />
and use. 2.ed. Londres: Food and Agriculture Organization of United Nations<br />
(FAO), 2003.<br />
37. Lajolo FM. Grupo de trabalho: composição de alimentos. Bol SBCTA 1995;<br />
29:57-69.<br />
38. Lajolo FM, Menezes EW. Atividades nacionais sobre composicão de alimentos<br />
no Brasil,1995-1997, Simposio FAO/SLAN/LATINFOODS sobre Composición<br />
de Alimentos. XI Congresso da Sociedad Latinoamericana de Nutrición.<br />
SLAN 97, Guat<strong>em</strong>ala 1997a.<br />
39. Lajolo FM, Menezes EW. Uma análise retrospectiva e contextualização da<br />
questão. Grupo de trabalho de composição de alimentos. Bol SBCTA 1997b;<br />
31(2):90-2.<br />
40. Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Regulamento técnico <strong>para</strong> Rotulag<strong>em</strong><br />
nutricional obrigatória de alimentos e bebidas <strong>em</strong>baladas RDC 40, 21<br />
de março de 2001 Disponível <strong>em</strong>: http://www.anvisa.gov.br/legis/.<br />
41. Food and Agriculture Organization/Rede Latino Americana de Composição de<br />
Alimentos. Tabla de composición de alimentos de América Latina. No ar desde<br />
2000. Disponível <strong>em</strong>: http://www.rlc.fao.org/ bases/alimento.<br />
42. Giuntini EB, Lajolo FM, Menezes EW. Tabela Brasileira de Composição de Alimentos<br />
TBCA-USP (Versões 3 e 4) no contexto internacional. Arch Latinoamer<br />
Nutr 2006; 56(4):366-74.<br />
43. Menezes EW, Ratto AT, Giuntini EB, Lajolo FM. Composição de alimentos:<br />
compilação e informização de estruturas <strong>para</strong> intercâmbio de dados. Braz J<br />
Food Tecnol 2005; 8(1):25-33.<br />
44. Menezes EW, Giuntini EB, Dan MCT, Santos NC, Melo AT, Lajolo FM. Brazilian<br />
Network of Food Data Syst<strong>em</strong>s and LATINFOODS Regional Technical<br />
Compilation Committee: Food composition activities (2006-2009). J Food<br />
Compos Anal 2011; 24:678-81.
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
195<br />
45. Danish Food Composition Databank. Danish Institute for Food and Veterinary<br />
Research. Disponível <strong>em</strong>: http://www.foodcomp.dk/fcdb_default. htm.<br />
46. Souci-Fachmann-Kraut Online-Database. Food Composition and Nutrition<br />
Tables, based on the 6th ed. 2000. Disponível <strong>em</strong>: http://www.sfk-online.net.<br />
47. U.S. Department of Agriculture. Agricultural Research Service (USDA-ARS).<br />
Nutrient Data Laboratory. Disponível <strong>em</strong>: http://www.nal.usda.gov/fnic/<br />
foodcomp.<br />
48. Closa SJ, Landeta MC. Tabla de Composición de Alimentos. Disponível <strong>em</strong>:<br />
http://www.unlu.edu.ar/~argenfoods/Tablas/Tabla.htm.<br />
49. Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (Taco)/Nepa – Unicamp. Campinas:<br />
Nepa-Unicamp, 2006. Disponível <strong>em</strong>: http://www.unicamp.br/nepa/taco.<br />
50. Monro J, Burlingame B. Carbohidratos y componentes alimentarios relacionados:<br />
identificadores de INFOODS, significados y usos. In: Morón<br />
C, Zacarías I, Pablo S (eds.). Produccíon y Manejo de datos de composición<br />
química de alimentos en nutrición. Santiago: FAO/INTA, 1997, p.327-56.<br />
NOTA<br />
A<br />
O Brasilfoods está ligado ao Latinfoods (Red Latinoamericana de Dados<br />
de Composición de Alimentos)/Infoods (International Network Food Data<br />
Syst<strong>em</strong>s).
VIRTUAL NUTRI PLUS:<br />
PROGRAMA PARA APOIO<br />
ÀS DECISÕES NUTRICIONAIS<br />
Sonia Tucunduva Philippi<br />
Greisse Viero da Silva Leal<br />
É importante o conhecimento dos dados sobre a composição de alimentos<br />
produzidos e consumidos nas diferentes regiões do Brasil, pois eles<br />
fornec<strong>em</strong> el<strong>em</strong>entos básicos <strong>para</strong> ações de promoção da saúde, como<br />
orientação nutricional baseada <strong>em</strong> princípios de desenvolvimento local<br />
e diversificação da alimentação, <strong>em</strong> contraposição à massificação de<br />
dietas monótonas e inadequadas. Esses dados precisam ser confiáveis e<br />
apresentar informações sobre a composição do alimento in natura, processado<br />
ou como pre<strong>para</strong>ção culinária, <strong>para</strong> possibilitar a tomada de<br />
decisão sobre os tipos de alimentos que dev<strong>em</strong> compor a dieta, observadas<br />
as recomendações nutricionais. O conhecimento da energia, dos<br />
macro e micronutrientes dos diferentes alimentos possibilita, <strong>em</strong> conjunto<br />
com outras informações, um adequado planejamento da dieta não<br />
só <strong>para</strong> coletividades sadias como <strong>para</strong> indivíduos com dietas específicas<br />
que necessitam de controle de nutrientes especiais. 1<br />
Os profissionais da área de alimentação e nutrição (nutricionista,<br />
gastrônomo, engenheiro de alimento, médico) buscam programas e tabelas<br />
de composição <strong>para</strong> consultas sobre a composição centesimal de
198<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
alimentos ou a utilização dos dados <strong>em</strong> trabalhos clínicos, ambulatoriais,<br />
laboratoriais, de desenvolvimento de novas tecnologias e melhoramento<br />
da qualidade do valor nutritivo dos alimentos. As indústrias de<br />
alimentos e pequenas <strong>em</strong>presas também pod<strong>em</strong> utilizar a composição<br />
centesimal de alimentos e ingredientes <strong>para</strong> planejamento da informação<br />
nutricional nos rótulos. As Unidades Produtoras de Refeições públicas<br />
ou privadas buscam informações <strong>em</strong> programas e <strong>em</strong> tabelas <strong>para</strong><br />
planejamento e cálculo de seus cardápios, que estão cada vez mais disponíveis<br />
<strong>para</strong> conhecimento do consumidor exigente e comprometido<br />
com uma qualidade de vida saudável. 1<br />
O programa Virtual Nutri Plus (VNPlus) é um sist<strong>em</strong>a computadorizado<br />
<strong>para</strong> avaliação da composição nutricional de indivíduos e grupos<br />
populacionais <strong>em</strong> versão nova 2 e norteada pelo primeiro programa<br />
nutricional do Brasil desenvolvido por nutricionista, o Virtual Nutri. 2<br />
O VNPlus foi desenvolvido 3 a partir de 2001 utilizando a linguag<strong>em</strong><br />
Delphi 5.0 da Borland como linguag<strong>em</strong> de programação e banco de<br />
dados Paradox, seguindo o modelo incr<strong>em</strong>ental segundo os <strong>para</strong>digmas<br />
de engenharia de software. Esse software t<strong>em</strong> como objetivo auxiliar no<br />
planejamento e na avaliação de dietas e no acompanhamento e na evolução<br />
de pacientes e grupos populacionais, além de possibilitar funcionalidades<br />
como o cadastramento e a inclusão de alimentos e pre<strong>para</strong>ções<br />
culinárias, a criação de banco de dados (pacientes, dietas, protocolos de<br />
pre<strong>para</strong>ções culinárias/receitas), a avaliação de dietas de grandes grupos<br />
populacionais (pesquisa), b<strong>em</strong> como a utilização <strong>em</strong> acad<strong>em</strong>ias, consultórios,<br />
trabalhos acadêmicos de graduação, especialização e de pós-graduação,<br />
universidades, unidades produtoras de alimentação e nutrição,<br />
hospitais, escolas e creches.<br />
É possível exportar dados de um determinado grupo de pacientes<br />
<strong>para</strong>, por ex<strong>em</strong>plo, uma planilha de Excel (.xls), possibilitando que o<br />
usuário proceda as análises estatísticas necessárias. Permite também o<br />
acesso ao manual de utilização com explicações detalhadas de todas as<br />
funcionalidades. 3
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
199<br />
Destaca-se que a funcionalidade “Cadastro de alimentos” permite<br />
ao usuário incluir seus próprios alimentos no banco de dados, alterar<br />
alimentos já existentes e imprimir relatórios da composição nutricional<br />
de determinados alimentos ou dietas. Possibilita a análise de dados coletados<br />
<strong>em</strong> pesquisas de consumo alimentar por meio de inquéritos alimentares,<br />
como o recordatório de 24 horas, o diário alimentar e o questionário<br />
de frequência alimentar. 3<br />
Além do VNPlus, outro material de consulta que se mostra rápido<br />
e prático no planejamento e cálculo do valor nutritivo de dietas, principalmente<br />
<strong>em</strong> locais e situações nas quais não há possibilidade de utilização<br />
de um programa destinado a este fim, é a Tabela de composição de<br />
alimentos: suporte <strong>para</strong> decisão nutricional. 4 A elaboração dessa tabela<br />
partiu da necessidade da existência de um banco de dados, com composição<br />
de alimentos atualizada, com os alimentos consumidos <strong>em</strong> sua<br />
forma usual, e não apenas uma lista de alimentos crus, com informações<br />
sobre alguns principais nutrientes. O trabalho com pesquisas sobre o<br />
consumo de alimentos <strong>em</strong> indivíduos e populações d<strong>em</strong>anda necessidade<br />
de informações sobre os alimentos industrializados, com as respectivas<br />
marcas comerciais e as pre<strong>para</strong>ções culinárias mais habitualmente<br />
consumidas. As informações sobre o valor nutritivo dos alimentos,<br />
reunidas <strong>em</strong> uma tabela, possibilitam a tomada de decisão sobre os alimentos<br />
e as pre<strong>para</strong>ções culinárias que dev<strong>em</strong> integrar o planejamento<br />
dietético de acordo com as recomendações nutricionais. O conhecimento<br />
sobre os valores de energia (kcal), umidade, proteína, lipídios,<br />
carboidratos, vitaminas, minerais, fibras, ácidos graxos, aminoácidos e<br />
outros micronutrientes dos alimentos é imprescindível <strong>para</strong> um diagnóstico<br />
eficiente do consumo alimentar e planejamento de políticas públicas<br />
de intervenção nutricional, principalmente <strong>em</strong> grupos com maior<br />
vulnerabilidade. 4<br />
Inicialmente, <strong>para</strong> a composição dessa tabela, foi utilizado como<br />
base o banco de dados do programa Virtual Nutri versão 1.0, <strong>para</strong><br />
Windows. 3 Para os alimentos in natura, as informações foram retiradas
200<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
de várias tabelas de composição de alimentos nacionais e internacionais.<br />
5-10 Para conhecer o conteúdo nutricional dos alimentos industrializados,<br />
foi realizado um trabalho de leitura e interpretação das informações<br />
contidas <strong>em</strong> rótulos/<strong>em</strong>balagens, fichas técnicas, consultas a<br />
serviços de orientação ao consumidor e sites das indústrias alimentícias<br />
(período de 1995 a 2000). A tabela é também composta por alimentos<br />
consumidos pela população <strong>em</strong> forma de pre<strong>para</strong>ções, possibilitando a<br />
consulta imediata daqueles mais consumidos, como arroz, feijão, pizza,<br />
pastel de feira e fast-food, e traz informações sobre o valor nutritivo por<br />
100 g do alimento pronto <strong>para</strong> consumo. Nas receitas das pre<strong>para</strong>ções<br />
culinárias, foram considerados o rendimento, a forma de preparo e o indicador<br />
de conversão (IC) do estado do alimento.<br />
Posteriormente, o banco de dados da tabela foi atualizado <strong>para</strong> o<br />
desenvolvimento e aprimoramento do VNPlus, com a inclusão de dados<br />
da Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (Taco) 11 , coordenada<br />
pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas <strong>em</strong> Alimentação (Nepa) da Universidade<br />
Estadual de Campinas (Unicamp), além de novas inclusões<br />
de alimentos, fórmulas e supl<strong>em</strong>entos por meio da interpretação das<br />
informações contidas <strong>em</strong> rótulos/<strong>em</strong>balagens, fichas técnicas e novas<br />
consultas a Serviços ao Consumidor (período de 2000 a 2010). Mais recent<strong>em</strong>ente,<br />
as partes não convencionais dos alimentos também foram<br />
incluídas, com base no material técnico publicado pelo Sesi. 12<br />
O banco de dados atual do VNPlus possui mais de 2.900 alimentos<br />
entre naturais (270), pre<strong>para</strong>ções (490) e industrializados (2150); apresenta<br />
mais de 3.200 variações de alimentos de acordo com forma de preparo<br />
(cru, assado, grelhado, etc.) e com suas medidas usuais; entre elas,<br />
unidade, copo, fatia, folha, ramo, gomo, bago, colher de servir, colher de<br />
sopa, colher de sobr<strong>em</strong>esa, colher de chá, colher de café, xícara de chá,<br />
escumadeira e concha. 2<br />
As pre<strong>para</strong>ções culinárias do hábito alimentar brasileiro presentes<br />
no programa, <strong>em</strong> sua maioria, foram elaboradas no laboratório de Técnica<br />
Dietética da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
201<br />
(FSP-USP), com variações culinárias de diversas regiões do Brasil, como<br />
abobrinha frita, arroz com lentilha, bife à milanesa, acarajé, feijoada,<br />
entre outras. 3<br />
O programa avalia energia (kcal), unidade (g), proteína (g), carboidrato<br />
(g), fibra total (g), fibra insolúvel (g), fibra solúvel (g), gordura total (g),<br />
gordura saturada (g), gordura monoinsaturada (g), gordura poli-insaturada<br />
(g), colesterol (mg), vitamina A (RE), vitamina B1 (mg), vitamina B2 (mg),<br />
vitamina B6 (mg), vitamina B12 (mcg), vitamina C (mg), vitamina D (mcg),<br />
vitamina E (mg), niacina (mg), cálcio (mg), cobre (mg), ácido pantotênico<br />
(mg), folato (mcg), ferro (mg), fósforo (mg), iodo (mcg), magnésio (mg),<br />
manganês (mg), potássio (mg), selênio (mcg), sódio (mg) e zinco (mg). 2<br />
O VNPlus possui diversas funções, como avaliação do estado nutricional<br />
segundo as recomendações das DRI; recomendação diária de ingestão<br />
de energia e nutrientes de acordo com peso, altura, idade, sexo e atividade<br />
física; relatórios que descrev<strong>em</strong> o valor nutritivo dos alimentos por gramas;<br />
visualização da distribuição de nutrientes por refeição; e descrição<br />
da dieta <strong>em</strong> medidas usuais e <strong>em</strong> gramas. 2<br />
É importante ressaltar a necessidade de se conhecer as tabelas de<br />
composição de alimentos que compõ<strong>em</strong> o banco de dados de um programa<br />
a ser utilizado <strong>para</strong> planejamento e avaliação dietética. Dev<strong>em</strong>-<br />
-se utilizar tabelas que apresent<strong>em</strong> dados de alimentos locais com análises<br />
padronizadas realizadas por laboratórios certificados, como é o<br />
caso das tabelas Taco 11 e Tabela Brasileira de Composição de Alimentos<br />
(TBCA-USP). 13<br />
Em 1984, foi criada a rede Infoods (International Network of Food<br />
Data Syst<strong>em</strong>s), ligada à Universidade das Nações Unidas (UNU) e à Food<br />
and Agriculture Administration (FAO), que propôs diretrizes e criou ferramentas<br />
que implicaram grande avanço nas tabelas de composição. Atualmente,<br />
a consciência relativa à biodiversidade de alimentos existentes v<strong>em</strong><br />
ampliando o enfoque das tabelas e dos bancos de dados de composição<br />
química de alimentos. No Brasil, a TBCA-USP, da Rede Brasileira de Dados<br />
de Composição de Alimentos (Brasilfoods), desde sua criação <strong>em</strong>
202<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
1998, v<strong>em</strong> adotando esses padrões internacionais e encontra-se disponível<br />
na internet (http://www.fcf.usp.br/tabela). 13 Os dados de porções<br />
e medidas usuais de consumo dos alimentos utilizados na TBCA foram<br />
compilados do VNPlus.<br />
A Taco foi coordenada pelo Nepa da Unicamp e teve a participação<br />
de diferentes instituições brasileiras e de pesquisadores renomados.<br />
Teve financiamento dos Ministérios da Saúde e do Desenvolvimento Social<br />
e Combate à Fome. O objetivo era proporcionar informações sobre<br />
um grande número de nutrientes <strong>em</strong> alimentos nacionais e regionais<br />
obtidos por meio de amostrag<strong>em</strong> representativa e análises realizadas<br />
por laboratórios com competência analítica comprovada por estudos<br />
interlaboratoriais, segundo critérios internacionais. Teve início <strong>em</strong> 1997<br />
e foi desenvolvida <strong>em</strong> cinco fases, sendo que a quinta fase teve início<br />
<strong>em</strong> 2005. Foi lançada <strong>em</strong> 2004 e atualmente totaliza 495 alimentos. Essa<br />
tabela inovou ao apresentar 90 protocolos padronizados por Philippi 11<br />
<strong>para</strong> alimentos pre<strong>para</strong>dos, do hábito alimentar e de caráter regional,<br />
desenvolvidos e inseridos na Tabela após análise <strong>em</strong> 100 g de alimento<br />
pronto. Ex<strong>em</strong>plos: pintado assado/grelhado, mandioca cozida, feijão-<br />
-roxo cozido, coxinha frita, bolinho de arroz, entre outros.<br />
O projeto Taco foi desenvolvido <strong>em</strong> fases com a preocupação de<br />
inserir na Tabela um número expressivo de informações sobre nutrientes<br />
<strong>em</strong> alimentos nacionais, regionais e alguns industrializados, obtidos<br />
por amostrag<strong>em</strong> representativa e com análises realizadas apenas por 20<br />
laboratórios com competência comprovada por estudos interlaboratoriais<br />
e internacionais, sendo sete de São Paulo, dois do Paraná, dois do<br />
Rio de Janeiro e nove de outros estados brasileiros. No caso, por ex<strong>em</strong>plo,<br />
de frutas, verduras e legumes, as coletas foram realizadas no Ceasa<br />
<strong>em</strong> Campinas, no Ceagesp <strong>em</strong> São Paulo, no Mercado Municipal <strong>em</strong><br />
São Paulo ou <strong>em</strong> supermercados, s<strong>em</strong>pre de fornecedores com maior<br />
volume de vendas, com coleta aleatória <strong>para</strong> cada alimento. No Instituto<br />
Tecnológico de Alimentos (ITAL Campinas), todos os alimentos foram<br />
homogeneizados, com protocolos específicos e três amostras compostas
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
203<br />
(100 a 200 g) encaminhadas <strong>para</strong> análises laboratoriais. Como ex<strong>em</strong>plo<br />
de metodologia analítica, todas de alta complexidade, foram avaliados<br />
teores de minerais e vitaminas.<br />
Os minerais (Ca, Fe, MG, Mn, P, Na, K, Cu e Zn) foram determinados<br />
por espectrometria de <strong>em</strong>issão atômica com fonte de plasma indutivamente<br />
acoplado ICP-OES, segundo a Association of Official Analytical<br />
Ch<strong>em</strong>ists (AOAC, 2000). As vitaminas, como o retinol, foram<br />
determinadas por cromatografia líquida de alta eficiência (Clae) com<br />
detecção por fluorescência, segundo Mans e Philippi e Zahar e Smith<br />
(referências completas no site da Taco). 1 Após todo o procedimento<br />
analítico, os valores definidos foram incluídos na Tabela por 100 g do<br />
alimento. 1<br />
As tabelas de composição de alimentos nacionais e internacionais<br />
dev<strong>em</strong> ser s<strong>em</strong>pre consultadas, <strong>para</strong> avaliar as informações disponíveis<br />
e compl<strong>em</strong>entar as lacunas existentes quando da busca dos dados. Os<br />
bancos de dados dos alimentos dos programas nutricionais nacionais ou<br />
internacionais dev<strong>em</strong> também trazer suas referências <strong>para</strong> identificar a<br />
fonte dos dados e sua confiabilidade.<br />
De acordo com Johana Dwyer 14 , nutricionista e pesquisadora norte-americana,<br />
os estudos sobre composição de alimentos passaram por<br />
quatro revoluções. A primeira, com Atwater 15 , descreveu a energia advinda<br />
dos alimentos; a segunda apresentou a caracterização de vitaminas<br />
e minerais que se mostraram importantes <strong>para</strong> evitar as doenças<br />
decorrentes de sua deficiência; na terceira, conhecendo-se melhor a<br />
composição dos alimentos, foram feitas associações entre dieta e doença,<br />
incluindo as relacionadas a má nutrição e doenças crônicas não transmissíveis;<br />
e a quarta revolução relaciona-se com a descoberta de outras<br />
substâncias nos alimentos que também pod<strong>em</strong> afetar a saúde humana,<br />
como os compostos bioativos e fatores antinutricionais. A quinta revolução<br />
deverá estar relacionada com a biodiversidade.<br />
Segundo a FAO, o amplo conhecimento das informações de composição<br />
de alimentos de diferentes culturas das diversas regiões e países é
204<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
importante <strong>para</strong> garantir a preservação e o uso sustentável da biodiversidade<br />
<strong>em</strong> programas de segurança alimentar e nutrição humana. Portanto,<br />
um banco de dados de um programa ou de uma tabela deve estar s<strong>em</strong>pre<br />
<strong>em</strong> construção, atualização e aperfeiçoamento. 1<br />
A partir de 2011, uma equipe de programadores deu início à construção<br />
do Virtual Nutri Plus Web, a partir do VNPlus. O trabalho foi<br />
apresentado no Congresso Latinoamericano de Nutrição (SLAN), <strong>em</strong><br />
2012, <strong>em</strong> Havana, Cuba. 16<br />
O Virtual Nutri Plus Web 2 foi desenvolvido na plataforma ASP.<br />
NET da Microsoft, sendo, portanto, um software 100% Web. Sua concepção<br />
e seu desenvolvimento foram idealizados pela Dra. Sonia Tucunduva<br />
Philippi e realizados pela <strong>em</strong>presa Keeple. A equipe contou<br />
com dois nutricionistas, um gerente de projeto, um designer e três desenvolvedores.<br />
Por se tratar de um sist<strong>em</strong>a totalmente Web, não requer<br />
instalação e funciona com dispositivo conectado à internet com<br />
um browser (Internet Explorer, Mozilla, Safari, Chrome, etc.) e é compatível<br />
com qualquer sist<strong>em</strong>a operacional (Windows, Mac OS, Linux,<br />
etc.). O aplicativo é executado nas “nuvens” e, por consequência, seu<br />
des<strong>em</strong>penho é garantido pela <strong>em</strong>presa desenvolvedora. O novo Virtual<br />
Nutri Plus está hospedado <strong>em</strong> um dos maiores Data Centers do Brasil,<br />
o que garante alto des<strong>em</strong>penho e manutenção adequada <strong>para</strong> seu<br />
perfeito e constante funcionamento, além de total segurança no armazenamento<br />
das informações.<br />
Em relação ao modelo de cobrança, o VNPlus foi desenvolvido no<br />
modelo SaaS (software as a service), que permite ao nutricionista obter<br />
uma assinatura somente pelo t<strong>em</strong>po que desejar utilizar o sist<strong>em</strong>a.<br />
As principais vantagens de utilização do VNPlus são a automatização,<br />
a garantia de que a informação sobre a composição nutricional dos alimentos<br />
está atualizada, a otimização de alguns passos no processo de<br />
atendimento nutricional (p.ex., avaliações) e o acompanhamento das<br />
ações pelo usuário, facilitando as atividades de planejamento e avaliação<br />
pelo nutricionista. 2
I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />
205<br />
O desenvolvimento de pesquisas sobre valor nutritivo e composição<br />
dos alimentos deveria ser uma atribuição governamental, com<br />
recursos financeiros, materiais e humanos alocados <strong>em</strong> alguma esfera<br />
governamental, <strong>para</strong> permitir plenas condições operacionais, com<br />
continuidade, atualização permanente e divulgação imediata dos dados<br />
obtidos. Contudo, essa tarefa t<strong>em</strong> ficado na iniciativa dos pesquisadores<br />
que buscam recursos financeiros junto aos órgãos governamentais,<br />
mas s<strong>em</strong>pre insuficientes e descontínuos. Existe morosidade<br />
<strong>em</strong> razão da complexidade e é necessário rigor nas análises laboratoriais,<br />
permitindo a existência de lacunas entre as necessidades e as<br />
reais possibilidades.<br />
Como reflexão sobre o t<strong>em</strong>a de programas de nutrição informatizados,<br />
deveria haver uma tabela oficial brasileira, com alimentos naturais,<br />
processados e pre<strong>para</strong>ções tipicamente de nosso país, coordenada por um<br />
órgão governamental como Ministérios da Saúde, Agricultura, Ciência e<br />
Tecnologia, com parcerias técnicas com universidades, órgãos de pesquisa,<br />
instituições privadas e <strong>em</strong>presas alimentícias, <strong>em</strong> um esforço único<br />
de desenvolver programas específicos <strong>para</strong> a área de alimentação e nutrição,<br />
possibilitando conhecer a composição dos alimentos nacionais e<br />
todo o potencial de seus macro e micronutrientes, além de outros compostos<br />
ainda não conhecidos.<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
1. Virtual Nutri Plus (Software online). Disponível <strong>em</strong>: http://www.virtualnutriplus.com.br.<br />
2. Philippi ST. Tabela de composição de alimentos: a palavra da Profa. Dra. Sonia<br />
Tucunduva Philippi. Nestlé Bio-Nutrição e Saúde São Paulo 2011; 4:4-9.<br />
3. Philippi ST. Virtual Nutri Plus (Software) versão 1.0. São Paulo, 2008.<br />
4. Bowes AP, Church CF. Food values of portions commonly used. Rev By JAT<br />
Pennington. 17.ed. Nova York: Lippincott – Raven Publishers, 1998.<br />
5. Geltz R, Geltz B. The food processor for Windows. Versão 6.0: nutrition analysis<br />
software. Sal<strong>em</strong>: Esha research, 1995.
206<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
6. Holland B, Welch AA, et al. Mc Cance and Winddwson’s. The composition of<br />
foods. 5.ed. Cambridge: TheRoyal Society of Ch<strong>em</strong>istry/ Ministry of Agriculture,<br />
Fisheries and Food, 1991.<br />
7. Instituto de Geografia e Estatística. Estudo Nacional de Despesa Familiar – EN-<br />
DEF: Tabela de Composição de Alimentos. Publicações especiais. Rio de Janeiro<br />
1997; 3.<br />
8. Souci SW, Farchman W, Kraut K. Food composition and nutrition tables. 5.ed.<br />
Stutgard: Medpharm Scientific Publishers, 1994.<br />
9. Watt B, Merrill AL. Composition of foods: raw, processed, prepared. Agriculture<br />
Handbook, 8. Washington DC: Consumer and Food Economics Research<br />
Division/Agricultural Research Service, 1963.<br />
10. Núcleo de Estudos e Pesquisas <strong>em</strong> Alimentação. Universidade Estadual de<br />
Campinas. Tabela Brasileira de Composição de alimentos (TACO): versão1.<br />
São Paulo: NEPA/Unicamp, 2004. Disponível <strong>em</strong>: www.unicamp.br/nepa/taco.<br />
11. Programa Alimente-se B<strong>em</strong>. Tabela de composição química das partes não<br />
convencionais dos alimentos. São Paulo: Sesi-SP, 2008.<br />
12. Universidade de São Paulo. Faculdade de Ciências Farmacêuticas. Departamento<br />
de Alimentos e Nutrição Experimental. Tabela Brasileira de Composição<br />
de Alimentos-USP. Versão 4.1. Disponível <strong>em</strong>: http://www.fcf.usp.br/tabela.<br />
13. Dwyer JT. Future directions in food composition studies. J Nutr 1994; 124<br />
(Suppl.):1783-88S.<br />
14. Atwater WO, Woods CD. The Ch<strong>em</strong>ical composition of American food materials.<br />
Farmers Bulletin n.28. U.S. Department of Agriculture. Washington, 1896.<br />
15. Philippi ST, Guerreiro RER, Cechin J, Sossai J, Filho AGF, Leal GVS. Assessment<br />
on diet, nutritional status and health conditions: Web-Virtual Nutri<br />
Plus, Brazilian software for clinical and epid<strong>em</strong>iological use. XVI Congresso<br />
Latinoamericano de Nutrición – SLAN, 2012.
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA<br />
ESCOLA E SEGURANÇA<br />
ALIMENTAR E NUTRICIONAL<br />
27 de outubro de 2009<br />
Teatro Marcos Lindenberg – <strong>Unifesp</strong>
A ALIMENTAÇÃO ESCOLAR COMO<br />
OPORTUNIDADE DE PROMOÇÃO DA<br />
SAÚDE<br />
Glaura César Pedroso<br />
INTRODUÇÃO<br />
A Carta de Ottawa 1 define Promoção da Saúde como “processo de capacitação<br />
da comunidade <strong>para</strong> atuar na melhoria da sua qualidade de vida<br />
e saúde, incluindo maior participação no controle deste processo”. Esse<br />
documento também define os seguintes campos de ação <strong>para</strong> promoção<br />
da saúde: elaboração e impl<strong>em</strong>entação de políticas públicas saudáveis,<br />
criação de ambientes favoráveis à saúde, fortalecimento da participação<br />
comunitária, desenvolvimento de habilidades pessoais e reorientação<br />
dos serviços de saúde. Assim, chama-se a atenção <strong>para</strong> os determinantes<br />
múltiplos da saúde e <strong>para</strong> a necessidade de um trabalho intersetorial<br />
e interinstitucional na mediação entre os diferentes interesses existentes<br />
<strong>em</strong> relação à saúde.<br />
Os conceitos ligados à promoção da saúde, assim como suas práticas,<br />
vêm sendo elaborados mundialmente <strong>em</strong> diferentes contextos<br />
sociais, levando à produção de vários documentos voltados <strong>para</strong> os<br />
diferentes campos de promoção da saúde. 2 No caso brasileiro, o desenvolvimento<br />
da promoção da saúde ocorre no contexto da red<strong>em</strong>ocratização<br />
do país e da reforma sanitária, cujos princípios e diretrizes estão<br />
incorporados no texto constitucional. Os conceitos trazidos do contexto
210<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
internacional encontraram, no Brasil, um debate com forte participação<br />
popular que resgata a noção de saúde como produção social e direito de<br />
cidadania. 3 Entende-se promoção da saúde como mais do que a adoção<br />
de estilos de vida saudáveis, sendo fundamentais a discussão das condições<br />
objetivas de existência dos indivíduos e grupos sociais e a luta pela<br />
garantia de seus direitos.<br />
Em 2006, por meio da Portaria n. 687 do Ministério da Saúde, oficializou-se<br />
a Política Nacional de Promoção da Saúde, articulando e reforçando<br />
programas e iniciativas anteriores, visando a consolidar uma<br />
agenda nacional, coerente com os princípios e diretrizes do Sist<strong>em</strong>a<br />
Único de Saúde (SUS). 4-6 Além das ações desenvolvidas nos serviços de<br />
saúde, numerosas iniciativas de promoção da saúde vêm se articulando<br />
no espaço das políticas públicas de desenvolvimento, da intersetorialidade<br />
e da ação comunitária. Entre essas iniciativas, destacam-se as<br />
experiências de Escolas Promotoras de Saúde, que envolv<strong>em</strong> parcerias<br />
entre os Ministérios da Saúde e da Educação, as universidades, os estados<br />
e os municípios, com o apoio da Sociedade Brasileira de Pediatria. 5-8<br />
A Escola Promotora da Saúde considera as pessoas, <strong>em</strong> especial as<br />
crianças e os adolescentes, inseridas <strong>em</strong> seu ambiente familiar, comunitário<br />
e social, e t<strong>em</strong> três princípios básicos, relacionados entre si 9 :<br />
• educação <strong>para</strong> saúde com enfoque integral, incluindo o desenvolvimento<br />
de habilidades <strong>para</strong> a vida: discute a saúde como construção social, abordando<br />
a relação entre a saúde e seus determinantes, e usa todas as oportunidades<br />
educativas <strong>para</strong> promover a saúde;<br />
• criação e manutenção de ambientes físicos e psicossociais saudáveis: destaca<br />
o desenvolvimento humano saudável e as relações construtivas e harmônicas,<br />
promove aptidões e atitudes <strong>para</strong> a saúde, busca oferecer um<br />
espaço físico seguro e confortável, com água potável e instalações sanitárias<br />
adequadas e uma atmosfera psicológica positiva <strong>para</strong> a aprendizag<strong>em</strong>.<br />
Promove a autonomia, a criatividade e a participação dos alunos, b<strong>em</strong><br />
como de toda a comunidade escolar; 10
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
211<br />
• oferta de serviços de saúde: visa ao fortalecimento da articulação entre os<br />
setores da educação e da saúde; no caso brasileiro, estimula-se o acesso a<br />
serviços de saúde, com definição conjunta e participativa das prioridades<br />
e estratégias, contribuindo <strong>para</strong> a consolidação do SUS. 11<br />
Como l<strong>em</strong>brou Cerqueira 12 , essa visão se contrapõe ao que ocorre<br />
na maioria dos casos, <strong>em</strong> que a escola é vista pelo setor da saúde como<br />
“lugar de aplicação de medidas de controle e prevenção de doenças”, <strong>em</strong><br />
que os alunos seriam um grupo passivo, alvo de ações isoladas e assistencialistas,<br />
<strong>em</strong> que se usa a escola, mas não se oferece uma atenção integral<br />
n<strong>em</strong> se aproveitam as oportunidades pedagógicas <strong>para</strong> promover<br />
o desenvolvimento e o protagonismo da criança e do adolescente <strong>em</strong> relação<br />
à sua saúde e à de sua comunidade.<br />
Essa visão também é coerente com o texto dos Parâmetros Curriculares<br />
Nacionais 13 , que elege como t<strong>em</strong>as transversais: saúde, meio ambiente,<br />
trabalho e consumo, pluralidade cultural, orientação sexual e ética.<br />
As questões sociais cont<strong>em</strong>porâneas passam a ser abordadas não<br />
apenas como conteúdo de disciplinas específicas, mas por todas as disciplinas<br />
e também <strong>em</strong> projetos interdisciplinares. Nesse contexto, a segurança<br />
alimentar e nutricional torna-se um componente fundamental e<br />
indissociável das estratégias de promoção da saúde no contexto escolar. 14<br />
A articulação das ações de promoção da saúde com o Programa Nacional<br />
de Alimentação Escolar pode ocorrer <strong>em</strong> vários momentos, trazendo<br />
valiosas oportunidades de aprendizag<strong>em</strong>, de discussão sobre as<br />
condições de vida e de construção de estilos de vida saudáveis, por meio<br />
de conteúdos de várias disciplinas e também nos t<strong>em</strong>as transversais,<br />
como a orig<strong>em</strong> dos alimentos, o alimento nas diferentes culturas, os processos<br />
de trabalho e produção de alimentos, a escolha de alimentos saudáveis<br />
e a pressão pelo consumo de alimentos industrializados, a questão<br />
do desperdício e da sustentabilidade, entre outras. O momento da merenda<br />
não deve ficar dissociado dos outros momentos da vida escolar. 15,16<br />
Nesse contexto, merec<strong>em</strong> destaque os aspectos descritos a seguir.
212<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
CONDIÇÕES SANITÁRIAS<br />
Garantia das condições de higiene e de qualidade na <strong>aqui</strong>sição, na conservação<br />
e no preparo dos alimentos. Esses aspectos também pod<strong>em</strong> ser<br />
objeto de discussão com os alunos e pais, possibilitando sua participação<br />
no processo. 17,18<br />
ALIMENTAÇÃO COMO DIREITO FUNDAMENTAL<br />
Toda criança t<strong>em</strong> o direito de se manter alimentada durante o período<br />
escolar, com alimentos <strong>em</strong> quantidade e qualidade adequadas às suas<br />
necessidades e respeitando seus hábitos culturais. A alimentação escolar<br />
é parte do dia alimentar da criança e não deve ser tratada como política<br />
meramente assistencial n<strong>em</strong> como solução <strong>para</strong> a desnutrição ou<br />
o fracasso escolar, como se observou <strong>em</strong> vários momentos de sua história.<br />
A alimentação escolar precisa ser entendida como a garantia de um<br />
direito de cidadania. 17<br />
TREINAMENTO E SUPERVISÃO DE RECURSOS HUMANOS<br />
Todos os profissionais que participam da elaboração e distribuição<br />
da merenda escolar dev<strong>em</strong> ser vistos como m<strong>em</strong>bros da equipe escolar,<br />
tendo, portanto, seu papel como educadores. Tudo o que acontece<br />
na escola pode e deve ser aproveitado como oportunidade pedagógica.<br />
Para isso, deve-se proporcionar formação profissional compatível com<br />
esse papel, além de condições adequadas de trabalho e acesso à educação<br />
continuada/permanente a todos os envolvidos.<br />
INTEGRAÇÃO DA EQUIPE<br />
O planejamento conjunto das atividades pode promover a ligação entre<br />
os conteúdos da sala de aula e a alimentação. Uma possibilidade de<br />
trabalho educativo é envolver o professor no trabalho junto aos alunos,<br />
no momento da merenda, buscando valorizar, assim, os aspectos simbólicos<br />
e vivenciais relacionados à alimentação e proporcionando novas<br />
relações entre educadores e educandos, pelo compartilhamento das
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
213<br />
refeições. Esse trabalho pode e deve ser compartilhado com merendeiras<br />
e nutricionistas. 19-21<br />
CANTINAS<br />
Para as escolas que têm cantinas, além da regulamentação da venda de<br />
alimentos, é importante realizar um trabalho educativo com os profissionais<br />
e proprietários desses estabelecimentos, com a finalidade de oferecer<br />
e estimular a escolha de alimentos saudáveis. Um ex<strong>em</strong>plo é o trabalho<br />
de Schmitz et al. 22<br />
ATENÇÃO<br />
Não se pode deixar de lado a discussão sobre as condições de vida, saúde<br />
e trabalho da equipe da escola, incluindo-se também as merendeiras.<br />
O trabalho digno e a atenção à saúde desses profissionais são componentes<br />
indissociáveis da meta de se construir uma escola promotora de saúde.<br />
ORIGEM E PREPARO DOS ALIMENTOS<br />
A abordag<strong>em</strong> dos conteúdos relativos à orig<strong>em</strong> dos alimentos e seu preparo<br />
pode também motivar a escolha de alimentos saudáveis e propor novas<br />
relações entre produção e consumo. Projetos interdisciplinares, como a<br />
instalação de hortas escolares e a participação do escolar na seleção e pre<strong>para</strong>ção<br />
das refeições, pod<strong>em</strong> ser de grande valia <strong>para</strong> discutir a orig<strong>em</strong> do<br />
alimento; os processos de produção, transporte, armazenamento e consumo;<br />
a importância dos produtos locais e dos alimentos próprios de cada<br />
estação do ano; a relação entre o clima, a água e a produção de alimentos,<br />
entre outros. Esses projetos pod<strong>em</strong> também constituir um valioso incentivo<br />
à escolha de alimentos saudáveis provenientes da produção local. 23,24<br />
A ORIGEM DO ALIMENTO – FRUTO DA NATUREZA E DO<br />
TRABALHO COLETIVO<br />
Seus significados nas diferentes culturas e <strong>em</strong> diferentes momentos da vida,<br />
a culinária regional, as relações sociais e afetivas envolvidas no servir e no
214<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
comer são aspectos importantes que pod<strong>em</strong> dar orig<strong>em</strong> a vários projetos e<br />
atividades transversais e interdisciplinares, que respeitam e valorizam a criança<br />
como sujeito, e não como consumidor. Alimentação não é prescrição ou<br />
treinamento, mas envolve dimensões simbólicas e vivenciais e traz possibilidades<br />
de compartilhamento de experiências e maior proximidade entre os<br />
alunos e a equipe da escola. 17 Nas palavras de Domene 16 : “O comportamento<br />
alimentar reflete o resultado de experiências vividas <strong>em</strong> diferentes níveis de<br />
relação, desde interpessoais, ambientais, comunitários e até políticos”.<br />
CONCLUSÕES<br />
Objetiva-se, com isso, satisfazer as necessidades biológicas, mas também<br />
de afeto e cidadania, recuperando-se a alimentação escolar como<br />
espaço pedagógico repleto de significados. 16,17 O aproveitamento da alimentação<br />
escolar como oportunidade de promoção da saúde requer<br />
planejamento interdisciplinar e intersetorial, respeito à cultura e conhecimento<br />
das necessidades locais, além da elaboração de materiais didáticos<br />
e de apoio apropriados <strong>para</strong> esse fim.<br />
Para projetos locais, é necessário o envolvimento de toda a equipe, merecendo<br />
destaque também o papel dos gestores, articulando e facilitando os<br />
projetos e iniciativas dos educadores e d<strong>em</strong>ais m<strong>em</strong>bros da comunidade<br />
escolar. Em âmbito regional, é importante o compromisso dos gestores da<br />
educação e do Programa de Alimentação Escolar, <strong>para</strong> impl<strong>em</strong>entação das<br />
políticas de promoção da saúde, preferencialmente definidas <strong>em</strong> conjunto<br />
com os Conselhos de Escola e outras instâncias de participação popular. Esses<br />
conselhos surgiram no processo de red<strong>em</strong>ocratização da sociedade brasileira<br />
e são compostos por representantes de todos os atores participantes<br />
dos processos educativos – pais, professores, diretores, funcionários e alunos.<br />
Segundo Silva 25 , constitu<strong>em</strong> espaços de educação <strong>para</strong> a d<strong>em</strong>ocracia e<br />
sua implantação d<strong>em</strong>andou esforços dos setores progressistas da sociedade.<br />
Valorizar os Conselhos de Escola como instâncias de planejamento<br />
local requer uma concepção de educação como “processo coletivo, partilhado<br />
entre a escola e a sociedade” e, consequent<strong>em</strong>ente, promover a
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
215<br />
d<strong>em</strong>ocratização do planejamento e da gestão, incluindo os “leigos” historicamente<br />
excluídos desses processos. Como locais de construção coletiva<br />
e de poder partilhado, os conselhos de escola dev<strong>em</strong> ser fortalecidos,<br />
valorizando-se a cidadania ativa <strong>em</strong> oposição às relações de consumo. A<br />
participação é entendida, assim, como forma de conquista de poder e,<br />
por meio dele, de direitos. 26 Essa participação possibilita a consolidação<br />
do trabalho voltado <strong>para</strong> a promoção da saúde, pela apropriação do processo<br />
pelos conselhos e por cada um dos segmentos envolvidos.<br />
A implantação de políticas intersetoriais e participativas requer decisões<br />
políticas e envolve mudanças nas estruturas de poder, assim como<br />
o enfrentamento de contradições e restrições de vários tipos. No caso da<br />
saúde escolar, observa-se a convivência do modelo antigo – higienista e assistencialista<br />
– com novas propostas, mais próximas dos princípios da promoção<br />
da saúde <strong>em</strong> seus aspectos transformadores. Assim, a ex<strong>em</strong>plo de<br />
Valadão 27 , observa-se que a saúde escolar, ao mesmo t<strong>em</strong>po que serve <strong>para</strong><br />
estabelecimento de “práticas compensatórias da inexistência de serviços<br />
de saúde, da iniquidade e da falta de acesso à cidadania”, permite vislumbrar<br />
oportunidades <strong>para</strong> o fortalecimento de políticas públicas e da construção<br />
de projetos com real impacto na qualidade de vida. Como l<strong>em</strong>bra a<br />
mesma autora, “é precisamente a valorização de suas especificidades que<br />
faz das instituições de educação e de saúde parceiras privilegiadas.” Por<br />
isso, afirma que a política <strong>para</strong> promoção da saúde na escola deve sustentar-se<br />
menos na inflexibilidade das normas e mais na exigência de conexão<br />
entre as normas e o compromisso de transformação social; apresentar-se<br />
como uma estratégia, entre outras, <strong>para</strong> qualificar a escola na recomposição<br />
de sua identidade política e pedagógica, visando a tornar mais saudáveis<br />
e solidárias as experiências de conviver e aprender cidadania.<br />
Faz-se necessário, portanto, superar a visão da escola e da comunidade<br />
escolar como objetos, combatendo a transformação da escola <strong>em</strong><br />
mero local de assistência social. A participação da escola na rede de proteção<br />
social só pode se efetivar por meio do respeito à especificidade da<br />
educação e às tarefas primordiais da escola. No dizer de Silva 28 :
216<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
O bom trabalho pedagógico é aquela atividade intencional que acontece<br />
na escola, que possibilita as relações de aprendizagens entre sujeitos,<br />
orientadas pela ética profissional; é aquele que se alcança por<br />
meio de atividades voltadas <strong>para</strong> produção de ideias, de concepções,<br />
conceitos, valores, símbolos, hábitos, atitudes e habilidades. A educação<br />
de qualidade social implica, pois, assegurar a redistribuição<br />
da riqueza produzida e que os bens culturais sejam socialmente distribuídos<br />
entre todos.<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
1. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Projeto promoção<br />
da saúde. As cartas da promoção da saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2002.<br />
2. Buss PM. Uma introdução ao conceito de promoção da saúde. In: Czeresnia D,<br />
Freitas CM (org.). Promoção da Saúde: conceitos, reflexões, tendências. Rio de<br />
Janeiro: Fiocruz, 2003. p.15-38.<br />
3. Ferreira Neto JL, Kind L, Barros JS, Azevedo NS, Abrantes TM. Apontamentos<br />
sobre promoção da Saúde e biopoder. Saúde Soc 2009; 18(3):456-66.<br />
4. Teixeira CF. Formulação e impl<strong>em</strong>entação de políticas públicas saudáveis: desafios<br />
<strong>para</strong> o planejamento e gestão das ações de promoção da saúde na cidades.<br />
Saúde Soc 2004; 13(1):37-46.<br />
5. Buss PM, Carvalho AI. Desenvolvimento da promoção da saúde no Brasil nos<br />
últimos vinte anos (1988-2008). Ciênc Saúde Coletiva 2009; 14(6):2305-16.<br />
6. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância <strong>em</strong> Saúde. Secretaria de<br />
Atenção à Saúde. Política nacional de promoção da saúde. 3.ed. Brasília: Ministério<br />
da Saúde, 2010.<br />
7. Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento Científico de Saúde Escolar.<br />
Escolas promotoras de saúde. Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Pediatria,<br />
2004.<br />
8. Silva CS, Ramos BEO, Kobel JL, Neves MBP, Guerra AB, Santos MLM et al. Escola<br />
Promotora de Saúde: Uma Nova Forma de Fazer Saúde Escolar. In: Lopez<br />
FA, Campos Junior D (orgs.). Tratado de Pediatria: Sociedade Brasileira de Pediatria.<br />
2.ed. Barueri: Manole, 2010. p.203-31.
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
217<br />
9. Ippolito-Shepherd J. A promoção da saúde no âmbito escolar: a iniciativa regional<br />
escolas promotoras de saúde. In: Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento<br />
Científico de Saúde Escolar. Escolas promotoras de saúde. Rio de Janeiro:<br />
Sociedade Brasileira de Pediatria, 2004. p.6-11.<br />
10. Pelicioni MCF, Torres AL. Escola Promotora de Saúde. Série Monográfica n.<br />
12. São Paulo: Universidade de São Paulo – Faculdade de Saúde Pública, 1999.<br />
11. Silva CS, Delorme MIC. Apresentação das Experiências. In: Brasil. Ministério da<br />
Saúde. Escolas Promotoras de Saúde: Experiências do Brasil. Ministério da Saúde,<br />
Organização Panamericana de Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2006. p.21-30.<br />
12. Cerqueira MT. A construção da Rede Latino-Americana de Escolas Promotoras<br />
de Saúde. In: Brasil. Ministério da Saúde. Escolas promotoras de saúde: experiências<br />
do Brasil. Ministério da Saúde, Organização Panamericana de Saúde.<br />
Brasília: Ministério da Saúde, 2006. p.33-9.<br />
13. Brasil. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais:<br />
introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais/Secretaria de Educação<br />
Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1997. 126p.<br />
14. Bizzo MLG, Leder L. Educação nutricional nos parâmetros curriculares nacionais<br />
<strong>para</strong> o ensino fundamental. Rev Nutr 2005; 18(5):661-7.<br />
15. Costa EQ, Ribeiro VMB, Ribeiro ECO. Programa de Alimentação Escolar: espaço<br />
de aprendizag<strong>em</strong> e produção de conhecimento. Rev Nutr 2001; 14(3):225-9.<br />
16. Domene SMA. A escola como ambiente de promoção da saúde e educação nutricional.<br />
Psicologia USP 2008; 19(4):505-17.<br />
17. Ceccim RB. A merenda escolar na virada do século – agenciamento pedagógico<br />
da cidadania. Em aberto 1995; 15(67):63-72.<br />
18. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de<br />
Atenção Básica. Manual operacional <strong>para</strong> profissionais de saúde e educação:<br />
Promoção da alimentação saudável nas escolas. Ministério da Saúde. Secretaria<br />
de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. (Série A. Normas e manuais<br />
técnicos). Brasília: Ministério da Saúde, 2008. p.11-2.<br />
19. Costa EQ, Lima ES, Ribeiro VMB. O treinamento de merendeiras: análise do<br />
material instrucional do Instituto de Nutrição Annes Dias – Rio de Janeiro<br />
(1956-94). História, Ciências, Saúde, Manguinhos 2002; 9(3):535-60.
218<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
20. Carvalho AT, Muniz VM, Gomes JF, Samico I. Programa de alimentação escolar<br />
no município de João Pessoa – PB, Brasil: as merendeiras <strong>em</strong> foco. Interface<br />
Comunic Saúde Educ 2008; 12(27):823-34.<br />
21. Teo CRPA, Sabedot FRB, Schafer E. Merendeiras como agentes de educação<br />
<strong>em</strong> saúde da comunidade escolar: potencialidades e limites. Rev Espaço Saúde<br />
2010; 11(2):11-20. Disponível <strong>em</strong>: http://www.ccs.uel.br/espaco<strong>para</strong>saude.<br />
22. Schmitz BAS, Recine E, Cardoso GT, Silva JRM, Amorim NFA, Bernardon R et<br />
al. A escola promovendo hábitos alimentares saudáveis: uma proposta metodológica<br />
de capacitação <strong>para</strong> educadores e donos de cantina escolar. Cad Saúde<br />
Pública 2008; 24(Suppl. 2):S312-22.<br />
23. Maldonado LA, Azevedo AMF, Castro IRR. O Programa de Alimentação Escolar<br />
como estratégia de promoção da saúde na cidade do Rio de Janeiro. In: Brasil.<br />
Ministério da Saúde. Escolas promotoras de saúde: experiências do Brasil.<br />
Ministério da Saúde, Organização Panamericana de Saúde. Brasília: Ministério<br />
da Saúde, 2006. p.105-12.<br />
24. Triches RM, Schneider S. Alimentação escolar e agricultura familiar: reconectando<br />
o consumo à produção. Saúde Soc 2010; 19(4):933-45.<br />
25. Silva IM. Conselhos de Escola na Cidade de São Paulo. São Paulo: Instituto Pólis/PUC-SP,<br />
2002.<br />
26. Bógus CM, Westphal MF. Participação social e cidadania <strong>em</strong> movimentos por<br />
cidades saudáveis. In: Fernandez JCA, Mendes R (orgs.). Promoção da saúde e<br />
gestão local. São Paulo: Aderaldo & Rothschild/Cepedoc, 2007.<br />
27. Valadão MM. Saúde na Escola: um campo <strong>em</strong> busca de espaço na agenda intersetorial.<br />
[Tese de Mestrado.]. São Paulo: Universidade de São Paulo – Faculdade<br />
de Saúde Pública, 2004.<br />
28. Silva MA. Qualidade social da educação pública: algumas aproximações. Cad<br />
Cedes 2009; 29(78):216-26.
EDUCAÇÃO ALIMENTAR<br />
E NUTRICIONAL NA ESCOLA<br />
Claudia Ridel Juzwiak<br />
INTRODUÇÃO<br />
A promoção de um estilo de vida saudável desde a infância t<strong>em</strong> o potencial<br />
de afetar positivamente a saúde atual e futura, ao garantir o crescimento<br />
e o desenvolvimento físico e mental esperados e reduzir o risco<br />
de doenças e agravos não transmissíveis na idade adulta.<br />
A escola representa um dos locais mais interessantes <strong>para</strong> ações de<br />
promoção de educação <strong>em</strong> saúde, pois propicia inúmeras situações de<br />
aprendizag<strong>em</strong> direcionadas a um extenso setor da população, com ampla<br />
faixa etária que frequenta da creche à Educação de Jovens e Adultos<br />
(EJA), permitindo, ainda, a articulação com a família e a comunidade. 1<br />
Os Parâmetros Curriculares Nacionais reforçam esse papel ao incluír<strong>em</strong><br />
a saúde como um dos t<strong>em</strong>as a ser<strong>em</strong> trabalhados transversalmente<br />
e ao colocar<strong>em</strong> como um de seus objetivos que os alunos sejam<br />
capazes de “conhecer e cuidar do próprio corpo, valorizando e adotando<br />
hábitos saudáveis como um dos aspectos básicos da qualidade de<br />
vida e agindo com responsabilidade <strong>em</strong> relação à sua saúde e à saúde<br />
coletiva”. 2
220<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Dentro da perspectiva da adoção de hábitos saudáveis, a nutrição<br />
merece destaque, ressaltando-se a necessidade de impl<strong>em</strong>entação de<br />
ações de Educação Alimentar e Nutricional no ambiente escolar. Boog 3<br />
descreve que “a educação alimentar e nutricional não t<strong>em</strong> por finalidade<br />
prescrever formas adequadas de se alimentar, mas, sim, ensinar a pensar<br />
certo a respeito da alimentação” e que, “pensar certo não é transferir<br />
um conhecimento pronto e inerte sobre o que ‘deve’ ser consumido,<br />
às vezes desconexo com o cotidiano alimentar da casa e da escola”. Assim,<br />
fica claro que esse processo na escola deve levar ao desenvolvimento<br />
da capacidade crítica e de habilidades que se traduzam <strong>em</strong> mudança<br />
no comportamento, ou seja, autonomia <strong>para</strong> a tomada de decisões relacionadas<br />
a <strong>aqui</strong>sição, pre<strong>para</strong>ção, preservação e consumo de alimentos,<br />
principalmente diante das consequências da transição nutricional, que<br />
inclu<strong>em</strong> a grande diversidade e a constante ampliação de opções de alimentos<br />
processados, b<strong>em</strong> como a perda de aspectos culturais e sociais<br />
da alimentação. 4<br />
Neste texto, pretende-se ressaltar alguns aspectos envolvidos no<br />
complexo processo da educação alimentar e nutricional no ambiente<br />
escolar.<br />
EDUCAÇÃO ALIMENTAR E NUTRICIONAL NA ESCOLA<br />
A importância de ações intersetoriais<br />
A publicação da Portaria Interministerial n. 1.010, <strong>em</strong> maio de 2006, representou<br />
um marco no processo de fortalecimento das ações de Educação<br />
Alimentar e Nutricional ao instituir as diretrizes <strong>para</strong> a promoção<br />
da alimentação saudável nas escolas de educação infantil, fundamental e<br />
de nível médio, públicas e privadas, <strong>em</strong> âmbito nacional, <strong>em</strong> consonância<br />
com a Política de Alimentação e Nutrição, que prevê a “incorporação<br />
do t<strong>em</strong>a alimentação saudável no projeto político pedagógico da escola,<br />
perpassando todas as áreas de estudo e propiciando experiências no cotidiano<br />
das atividades escolares”. 5
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
221<br />
Em 2009, essa portaria foi reforçada com a sanção da Lei n. 11.947,<br />
de junho de 2009, e a publicação da Resolução do Fundo Nacional de<br />
Desenvolvimento da Educação (FNDE) n. 38, de julho de 2009, ambas<br />
enfatizando a importância da Educação Alimentar e Nutricional como<br />
parte do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). 6,7 Nesses<br />
documentos são sugeridas estratégias <strong>para</strong> a impl<strong>em</strong>entação da Educação<br />
Alimentar e Nutricional visando à oferta de alimentação saudável na<br />
escola, sendo elas a implantação e manutenção de hortas escolares pedagógicas,<br />
a inserção do t<strong>em</strong>a alimentação saudável no currículo escolar,<br />
a realização de oficinas culinárias experimentais com os alunos, a formação<br />
da comunidade escolar, b<strong>em</strong> como o desenvolvimento de tecnologias<br />
sociais que a benefici<strong>em</strong>. Esses documentos ressaltam que não só<br />
o responsável técnico (nutricionista) deve estar envolvido, mas todos os<br />
profissionais da educação relacionados a esse processo. 5-7<br />
A ênfase dada à educação alimentar e nutricional no PNAE a partir<br />
da publicação dessas regulamentações é fundamental <strong>para</strong> que a alimentação<br />
escolar tenha sua dimensão ampliada, desviando-se do objetivo<br />
puramente biológico de fornecer energia e nutrientes, e passando a<br />
ter um papel pedagógico, ainda mais quando se avalia o alcance do Programa,<br />
cuja expectativa foi atender a 47 milhões de alunos, da educação<br />
básica à educação de jovens adultos <strong>em</strong> 2010. 8<br />
Quanto à sociedade, vale ressaltar sua participação <strong>em</strong> um importante<br />
instrumento de controle social – o Conselho de Alimentação Escolar<br />
(CAE). Esse órgão colegiado deliberativo, criado com a missão de<br />
acompanhar e assessorar as Entidades Executoras do PNAE <strong>em</strong> cada<br />
um dos municípios, é formado por representantes do poder executivo,<br />
entidade civil local, representantes das entidades de trabalhadores<br />
da educação e representantes dos pais e alunos. 6,7 Atua verificando se a<br />
distribuição da alimentação escolar está sendo regular, se há falta de alimentos,<br />
se os alunos estão satisfeitos com a qualidade da alimentação<br />
e se exist<strong>em</strong> falhas que prejudicam a qualidade do PNAE. Dessa forma,<br />
contribui <strong>para</strong> a constante melhora do Programa. 9
222<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Segundo a Lei n. 11.947, os CAE pod<strong>em</strong> desenvolver suas atribuições<br />
<strong>em</strong> regime de cooperação com os Conselhos de Segurança Alimentar<br />
e Nutricional estaduais, municipais e d<strong>em</strong>ais conselhos afins e<br />
dev<strong>em</strong> observar as diretrizes estabelecidas pelo Conselho Nacional de<br />
Segurança Alimentar e Nutricional (Consea). 6<br />
Outra questão que mostra a importância da consolidação de ações<br />
intersetoriais diz respeito ao previsto, desde a publicação da Portaria<br />
n. 1.010, sobre a orientação de “restrição ao comércio e à promoção comercial<br />
no ambiente escolar de alimentos e pre<strong>para</strong>ções com altos teores<br />
de gordura saturada, gordura trans, açúcar livre e sal e incentivo ao<br />
consumo de frutas, legumes e verduras” 6 , a qual estimulou a publicação<br />
de regulamentações <strong>em</strong> diversos municípios e estados e que, <strong>em</strong>bora<br />
com abordagens distintas, visavam a contribuir com a promoção da<br />
alimentação saudável na escola. 10 Esses dispositivos legais defin<strong>em</strong> os<br />
alimentos cuja comercialização deve ser proibida, permitida ou obrigatória,<br />
ações educativas, capacitação de cantineiros, alvará sanitário, assessoria<br />
técnica, venda nas cercanias, propaganda de alimentos e fiscalização<br />
e sanções. O fato de essas regulamentações existir<strong>em</strong> <strong>em</strong> apenas<br />
algumas localidades e de n<strong>em</strong> todas estar<strong>em</strong> <strong>em</strong> vigor sugere a necessidade<br />
de uma regulamentação nacional. 10<br />
Quanto a publicidade e marketing de alimentos, a World Health<br />
Organization 11 identificou que as principais formas de incentivar a<br />
venda de alimentos <strong>para</strong> crianças são a televisão e o marketing na escola.<br />
Princípios internacionais foram estabelecidos <strong>para</strong> que as crianças<br />
não sejam prejudicadas pela propaganda e por outras estratégias de<br />
marketing de alimentos (p.ex., associação do alimento a personagens<br />
famosos, brindes na <strong>em</strong>balag<strong>em</strong>), uma vez que estudos já mostraram<br />
que esses jovens consumidores são influenciados pelos comerciais e<br />
incentivos agregados e solicitam que os pais compr<strong>em</strong> os alimentos<br />
anunciados. 11,12<br />
No Brasil, recent<strong>em</strong>ente, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária<br />
(Anvisa) publicou a RDC n. 24/2010, que estabelece:
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
223<br />
[...] assegurar informações indisponíveis à preservação da saúde de<br />
todos aqueles expostos à oferta, propaganda, publicidade, informação<br />
e outras práticas correlatas cujo objetivo seja a divulgação e a<br />
promoção comercial dos alimentos. 13<br />
Nessa estratégia, são apresentadas as definições de alimento com quantidade<br />
elevada de açúcar, gordura saturada, gordura trans e sódio. Isso<br />
contribui <strong>para</strong> que os consumidores tenham maior possibilidade de tomada<br />
de decisão diante da ampla oferta de alimentos, porém outras medidas<br />
de regulamentação ainda são aguardadas. Monteiro e Castro 14 reforçam<br />
que as ações públicas não dev<strong>em</strong> limitar-se apenas à restrição da<br />
publicidade desses alimentos, mas garantir campanhas que incentiv<strong>em</strong><br />
o consumo de alimentos saudáveis.<br />
Importância da atuação interdisciplinar<br />
dos diversos atores da escola<br />
Segundo o Conselho Federal de Nutricionistas (CFN), as atribuições<br />
do nutricionista na escola inclu<strong>em</strong><br />
[...] planejar, organizar, dirigir, supervisionar e avaliar os serviços de<br />
alimentação e nutrição, além de realizar assistência e educação nutricional<br />
a coletividade ou indivíduos sadios ou enfermos <strong>em</strong> instituições<br />
públicas e privadas. 15<br />
A gestão do PNAE t<strong>em</strong> sido indicada como a atribuição que ocupa o<br />
maior t<strong>em</strong>po dos nutricionistas. 16 Esse fator, muitas vezes associado a um<br />
número reduzido de nutricionistas nas equipes, dificulta que estes estejam<br />
à frente do desenvolvimento e da implantação de ações permanentes<br />
de educação alimentar e nutricional na escola. Para viabilizar essas<br />
ações, é fundamental que o nutricionista conte com a parceria da comunidade<br />
escolar. Todos os atores que estão envolvidos no processo educativo<br />
dev<strong>em</strong> participar, mesmo tendo diferentes graus de influência –
224<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
o esforço conjunto de diretores, coordenadores pedagógicos, assistentes<br />
de direção, professores, agentes escolares e outros funcionários garante<br />
que o processo educativo ocorra, sendo essencial que esses profissionais<br />
desenvolvam trabalho interdisciplinar. 3<br />
Para o pleno envolvimento, esses atores também dev<strong>em</strong> passar<br />
pelo processo de educação alimentar e nutricional, a fim de que se apoder<strong>em</strong><br />
desses conceitos <strong>para</strong> suas próprias vidas – dessa maneira, espera-se<br />
que todos sejam sensibilizados e capacitados <strong>para</strong> produzir e desenvolver<br />
estratégias de formação do aluno. 17 Ao nutricionista, citando<br />
Costa et al. 18 , cabe “estabelecer relação de diálogo entre o saber popular<br />
e o saber técnico, rompendo com o tradicional modelo tecnicista”. Nesse<br />
contexto, a relação do nutricionista com as cozinheiras e os professores<br />
deve ser evidenciada.<br />
Considerando o ambiente escolar, vale enfatizar o papel das cozinheiras<br />
(também denominadas merendeiras). Carvalho et al. 19 , <strong>em</strong> estudo<br />
sobre o seu papel na produção e distribuição da alimentação escolar,<br />
identificaram uma série de fatores que apontam <strong>para</strong> a importância da<br />
inclusão dessas profissionais no processo educativo.<br />
Além de suas atribuições na produção das refeições, que garant<strong>em</strong><br />
que o alimento oferecido seja adequado higienicamente, nutricionalmente<br />
e <strong>em</strong> termos de características sensoriais, as cozinheiras<br />
desenvolv<strong>em</strong> uma relação de afeto com os escolares ao acompanhá-<br />
-los no dia a dia, podendo, dessa maneira, envolver-se no processo<br />
de formação de seus hábitos alimentares e, por essa razão, dev<strong>em</strong> ser<br />
valorizadas. 3,18-20<br />
No processo de formação/capacitação das cozinheiras, é fundamental<br />
que, assim como t<strong>em</strong>as voltados à higiene dos alimentos, sejam<br />
abordadas questões relativas à alimentação saudável dos escolares, pois<br />
além de ser<strong>em</strong> agentes multiplicadores desses conhecimentos durante<br />
o contato com os alunos, muitas vezes pod<strong>em</strong>, por desconhecimento,<br />
tomar atitudes baseadas <strong>em</strong> percepções que afetam negativamente<br />
o processo educativo. Por ex<strong>em</strong>plo, ao servir pratos com quantidade de
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
225<br />
acordo com sua percepção do que acham que determinada criança precisa<br />
consumir, e não com base no per capita previsto, ou ao atribuir valor<br />
aos alimentos com base <strong>em</strong> sua capacidade de provocar saciedade<br />
(alimentos fortes versus fracos) ou, ainda, decidir por formas de preparo<br />
que pod<strong>em</strong> levar à monotonia alimentar ou estar <strong>em</strong> desacordo com<br />
as recomendações nutricionais. 19-21<br />
Os professores têm enorme importância no processo, pois conviv<strong>em</strong><br />
por muitas horas diárias com os escolares, desenvolvendo forte vínculo,<br />
tendo a oportunidade de atuar como modelo e vivenciando inúmeras<br />
situações que permit<strong>em</strong> que trabalh<strong>em</strong> t<strong>em</strong>as sobre alimentação<br />
e nutrição. 3<br />
Doyle e Feldman 22 , <strong>em</strong> estudo realizado com estudantes do Ensino<br />
Médio de Manaus, apontaram a importância da identificação dos<br />
educandos com os comunicadores. Nesse estudo, houve uma resposta<br />
positiva às mensagens sobre nutrição quando os comunicadores foram<br />
percebidos pelos estudantes como mais s<strong>em</strong>elhantes a eles, independent<strong>em</strong>ente<br />
do nível de especialização, característica que beneficia<br />
os professores nessa missão.<br />
No entanto, além da identificação com o grupo, também é necessário<br />
que professores tenham formação técnica adequada <strong>em</strong> nutrição<br />
e acesso a materiais que os auxili<strong>em</strong> nessa tarefa. A detecção dessas necessidades<br />
aponta <strong>para</strong> alguns benefícios que a parceria professor-nutricionista<br />
pode gerar. Ressalta-se que <strong>para</strong> essa parceria se efetivar é<br />
fundamental que a direção da escola esteja sensibilizada <strong>para</strong> o desenvolvimento<br />
das ações propostas, além de ter pleno conhecimento da legislação<br />
e atuar como facilitadora do processo.<br />
Em relação às barreiras que os professores pod<strong>em</strong> encontrar, Olivares<br />
et al. 23 , <strong>em</strong> levantamento realizado com 80 instituições de ensino<br />
primário de 50 países da Ásia, África, América Latina, Caribe e Oriente<br />
Médio, por meio de questionário, identificaram carências que limitam o<br />
desenvolvimento da educação alimentar e nutricional; entre elas, as relacionadas<br />
a formação <strong>em</strong> nutrição dos professores, com programas de
226<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
capacitação e atualização suficientes, frequentes e com ampla cobertura,<br />
materiais educativos apropriados <strong>para</strong> educadores e educandos, apoio<br />
político, financiamento e pessoal especializado.<br />
Quanto à formação, segundo Contento et al. 24 , a partir de análises<br />
de programas de educação alimentar e nutricional impl<strong>em</strong>entados<br />
<strong>em</strong> escolas nos Estados Unidos durante a década de 1980, professores<br />
pre<strong>para</strong>dos apresentaram maior interesse por nutrição, melhora na atitude<br />
<strong>em</strong> relação à seleção alimentar e maior t<strong>em</strong>po de aula dedicado a<br />
esse t<strong>em</strong>a. Estudo de Gaglianone et al. 25 mostrou aumento significativo<br />
no conhecimento sobre nutrição e nas atitudes positivas <strong>em</strong> relação<br />
à impl<strong>em</strong>entação de ações educativas sobre esse t<strong>em</strong>a, após capacitação.<br />
Contudo, Boog 3 enfatiza que mais do que o conhecimento técnico,<br />
o professor deve “estar comprometido com a busca ativa: do direito ao<br />
acesso a uma alimentação saudável <strong>para</strong> si e <strong>para</strong> a coletividade, da valorização<br />
da alimentação de boa qualidade”.<br />
Entre os materiais utilizados pelos professores <strong>para</strong> a discussão<br />
sobre alimentação e nutrição, destaca-se o <strong>livro</strong> didático. Vários estudos<br />
têm identificado limitações nesse material, que apresenta muitos<br />
dos conteúdos desatualizados e até mesmo informações incorretas. 26,27<br />
Como ex<strong>em</strong>plo, Gaglianone 26 , <strong>em</strong> seu estudo sobre os conteúdos de 23<br />
<strong>livro</strong>s didáticos de Ciências, encontrou ausência de informações que relacionass<strong>em</strong><br />
maus hábitos alimentares e o surgimento de doenças, estímulo<br />
ao consumo de alimentos de orig<strong>em</strong> animal (supervalorização das<br />
proteínas), tratamento preconceituoso da obesidade e falta de incentivo<br />
ao aleitamento materno.<br />
Em estudo realizado <strong>em</strong> Piracicaba/SP, também foi observado que,<br />
<strong>em</strong> sua maioria, os professores avaliados planejavam seu ensino com<br />
base <strong>em</strong> currículos previamente construídos, s<strong>em</strong> realizar diagnóstico<br />
do interesse dos alunos e s<strong>em</strong> evolução dos conteúdos, que foram ministrados<br />
de forma s<strong>em</strong>elhante <strong>para</strong> as 4 a , 5 a e 7 a séries, ignorando-se<br />
o processo cognitivo dos escolares. Além disso, há uma tendência <strong>em</strong><br />
concentrar essa t<strong>em</strong>ática nas aulas de ciências, privilegiando o enfoque
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
227<br />
biológico 28 e distanciando-se do papel social e cultural do alimento, assim<br />
como das situações de vivência. Para que o ensino sobre a alimentação<br />
e a nutrição possa atender ao proposto nas diretrizes <strong>para</strong> a promoção<br />
da alimentação saudável nas escolas 5-7 , é importante que o t<strong>em</strong>a<br />
não fique restrito às aulas de ciências, a um determinado período do<br />
ano, ou que seja trabalhado <strong>em</strong> projetos específicos e desconectados do<br />
comer cotidiano. 3 Deve-se, ainda, valorizar o conhecimento prévio dos<br />
alunos 28 e identificar os interesses e as motivações sobre o t<strong>em</strong>a, tanto<br />
de alunos como de professores, s<strong>em</strong>pre respeitado o contexto cultural<br />
da comunidade. 1<br />
Mesmo com essas limitações, estudos têm mostrado que professores<br />
perceb<strong>em</strong> a importância de desenvolver t<strong>em</strong>as de alimentação e nutrição<br />
e vêm realizando esse trabalho. 25,27,29 Contudo, é importante salientar<br />
que os próprios professores indicam outras dificuldades, além<br />
das que já foram mencionadas, <strong>para</strong> a impl<strong>em</strong>entação de programas de<br />
educação alimentar e nutricional, como o calendário escolar e a necessidade<br />
de dedicar maior t<strong>em</strong>po aos conteúdos tradicionais. 25 Ad<strong>em</strong>ais, ao<br />
mesmo t<strong>em</strong>po que reforçam a necessidade de mais conhecimento/formação<br />
sobre o t<strong>em</strong>a, apontam outros fatores relevantes como barreiras<br />
<strong>para</strong> seu trabalho: a integração entre o que é desenvolvido na escola e na<br />
família e a inclusão do t<strong>em</strong>a no projeto pedagógico. 21,25,30<br />
A efetivação dessas parcerias não é um processo simples, pois exige<br />
grande colaboração entre as partes <strong>para</strong> que a interdisciplinaridade possa<br />
realmente ser praticada.<br />
Ações na escola<br />
Ao se planejar<strong>em</strong> programas de educação alimentar e nutricional no<br />
ambiente escolar, as necessidades e os fatores motivacionais da população-alvo<br />
(incluindo estudantes, professores e comunidade escolar),<br />
assim como o conhecimento prévio, dev<strong>em</strong> ser avaliados cuidadosamente<br />
<strong>para</strong> que sejam adotadas estratégias adequadas, respeitando-se<br />
as questões culturais que envolvam modificações dos conhecimentos
228<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
e das atitudes e que result<strong>em</strong> <strong>em</strong> transformação e mudança no<br />
comportamento. 4<br />
Contento 31 propõe um modelo <strong>para</strong> o desenvolvimento de projetos<br />
que se baseia <strong>em</strong> três eixos:<br />
• fase diagnóstica, na qual ocorre a identificação de recursos e pessoal disponível<br />
<strong>para</strong> o desenvolvimento do programa, assim como os processos<br />
que identificam as necessidades de saúde do grupo, os comportamentos<br />
individuais e as práticas da comunidade que possam melhorar a saúde;<br />
• fase de desenvolvimento definido por meio de uma série de passos, a partir<br />
dos quais são identificados os mediadores potenciais da mudança de<br />
comportamento desejada, a determinação da teoria ou modelo <strong>para</strong> mediar<br />
essas mudanças, o estabelecimento dos objetivos educacionais e o<br />
planejamento de estratégias e atividades baseadas <strong>em</strong> teorias. A forma de<br />
avaliação dos resultados também deve ser planejada nessa fase;<br />
• fase de análise dos resultados que reflet<strong>em</strong> o impacto do programa sobre<br />
o comportamento e as práticas, cujas mudanças foram inicialmente<br />
objetivadas.<br />
Dentro dessa perspectiva, dois aspectos do desenvolvimento de programas<br />
serão discutidos: a seleção de algumas estratégias de trabalho e o<br />
processo de avaliação.<br />
Aprender fazendo<br />
Além da importância de os t<strong>em</strong>as ser<strong>em</strong> tratados de forma transversal 5-7 ,<br />
a metodologia pedagógica adotada <strong>para</strong> o desenvolvimento dos programas<br />
e projetos de Educação Alimentar e Nutricional deve privilegiar o<br />
diálogo horizontal. 32 As atividades propostas dev<strong>em</strong> ser probl<strong>em</strong>atizadoras,<br />
respeitar o conhecimento e a cultura e, o mais importante, ter significado<br />
<strong>para</strong> o educando. 3,32 Isso faz com que os educandos sejam capazes<br />
de ir além da simples <strong>aqui</strong>sição de conhecimento, passando a refletir sobre<br />
suas escolhas alimentares e cultivando a construção da cidadania. 3,32
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
229<br />
Dois aspectos pod<strong>em</strong> ser destacados quanto à seleção de estratégias<br />
a ser<strong>em</strong> adotadas: é importante selecionar atividades que estimul<strong>em</strong><br />
a participação dos educandos, enfatizando o aprender fazendo, um dos<br />
quatro pilares da educação propostos pela United Nations Educational,<br />
Scientific and Cultural Organization (Unesco), e, no caso de crianças,<br />
o lúdico t<strong>em</strong> um papel fundamental, pois permite explorar o aprender<br />
brincando. Entre as ferramentas que pod<strong>em</strong> ser usadas, a alimentação<br />
escolar passa a ter papel pedagógico quando inserida no currículo, pois<br />
o momento da alimentação, consumida no ambiente escolar, fornece<br />
inúmeras oportunidades <strong>para</strong> que escolares coloqu<strong>em</strong> <strong>em</strong> prática o que<br />
v<strong>em</strong> sendo desenvolvido nas diferentes áreas de conhecimento. 4<br />
Ao mesmo t<strong>em</strong>po, os alimentos servidos na própria escola dev<strong>em</strong><br />
estar no centro das atividades pedagógicas, sendo explorados a partir<br />
do conhecimento dos escolares sobre o planejamento e preparo das refeições,<br />
além do que v<strong>em</strong> sendo discutido sobre seus diversos aspectos<br />
<strong>em</strong> diferentes áreas. 33,34 É importante olhar o alimento além de suas características<br />
nutricionais, explorando, por ex<strong>em</strong>plo, sua orig<strong>em</strong>, sua importância<br />
<strong>para</strong> o desenvolvimento do ser humano e seu significado social<br />
e econômico. Várias são as oportunidades de aprendizag<strong>em</strong> a partir<br />
da alimentação escolar: higiene pessoal e dos alimentos, relacionamento<br />
e interação, comportamento, autonomia, uso adequado de utensílios,<br />
desenvolvimento do paladar, controle do desperdício, autoestima e imag<strong>em</strong><br />
corporal positiva. 1,3<br />
Horta escolar e oficinas culinárias<br />
A utilização de hortas escolares t<strong>em</strong> sido incentivada pelas regulamentações<br />
publicadas. 5-7 Fruto de uma proposta conjunta da FAO, do FNDE<br />
e do MEC, o projeto (TCP/BRA/2003) “Horta escolar como eixo gerador<br />
de dinâmicas comunitárias, educação ambiental, alimentação saudável<br />
e sustentável” traz inúmeras oportunidades de aprendizag<strong>em</strong>, pois<br />
representa um ecossist<strong>em</strong>a que permite a inclusão dos educandos, dos<br />
professores, da comunidade escolar e, ainda, a articulação com a família,
230<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
pois essas experiências práticas pod<strong>em</strong> ser transmitidas. Prevê-se também<br />
o envolvimento de agricultores familiares e gestores de políticas<br />
públicas. 35<br />
Tal estratégia proporciona oportunidade <strong>para</strong> a prática educativa<br />
integrada, contínua e permanente, não só <strong>para</strong> as questões do alimento<br />
e da nutrição, mas também <strong>para</strong> o ambiente e a cidadania. 35 No estudo<br />
de Moreira 21 , os professores relataram ter desenvolvido as seguintes<br />
atividades a partir da horta: plantio, observação do canteiro, colheita,<br />
contato com a terra, experimentação, atividades <strong>em</strong> sala de aula com<br />
músicas, pesquisa, desenhos, manuais, histórias e caça-palavra. A horta<br />
permite ainda mais: a valorização de produtos regionais e orgânicos,<br />
a redução do desperdício e a produção de hortaliças frescas, s<strong>em</strong> utilização<br />
de agrotóxicos, que pod<strong>em</strong> ser incorporadas ao cardápio da escola,<br />
enriquecendo a qualidade da alimentação.<br />
A experiência da horta pode ser compl<strong>em</strong>entada com oficinas de<br />
culinária, que valorizam a cultura da comunidade e permit<strong>em</strong> a participação<br />
ativa no processo de aprendizag<strong>em</strong>. 36 Além de aprender fazendo, a<br />
criança é exposta a novos alimentos, novas formas de preparo e sabores,<br />
b<strong>em</strong> como à experimentação – aprender a conhecer – junto ao grupo<br />
social, o que pode influenciar positivamente a ingestão dos alimentos. 33<br />
Aprender brincando<br />
No caso de crianças, a opção por atividades lúdicas, que inclu<strong>em</strong> o brincar<br />
e o jogar, parece lógica, uma vez que a brincadeira é um ato natural<br />
desse período da vida. A brincadeira estimula o desenvolvimento infantil<br />
e facilita a aprendizag<strong>em</strong>, pois a própria motivação da criança é aproveitada,<br />
tornando a tarefa mais atrativa, enquanto o conhecimento vai sendo<br />
construído a partir do estímulo aos sentidos, da valorização de sua cultura,<br />
do desenvolvimento motor, da socialização e interação, do exercício da<br />
imaginação e criatividade e da sist<strong>em</strong>atização das experiências. 37,38<br />
Como qualquer material didático de apoio, o jogo deve ter coerência<br />
com as pr<strong>em</strong>issas pedagógicas propostas. 32 Pode ser considerado
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
231<br />
como uma brincadeira que envolve regras. A partir das habilidades que<br />
permite desenvolver, é possível <strong>em</strong>pregá-lo <strong>para</strong> uma variedade de propósitos<br />
– no contexto da educação alimentar e nutricional, pode ser<br />
usado <strong>para</strong> transmitir informações, ajudar a construir a autoconfiança,<br />
incr<strong>em</strong>entar a motivação, fomentar a reflexão, possibilitar a prática significativa<br />
d<strong>aqui</strong>lo que está sendo aprendido, contribuir <strong>para</strong> o aprendizado<br />
de regras sociais e também como instrumento de avaliação da ação<br />
educativa.<br />
O uso de histórias também é um recurso interessante, pois pod<strong>em</strong><br />
ser trabalhadas de diversas formas – leitura, dramatização, contador de<br />
histórias, pre<strong>para</strong>ção de alimentos, músicas, fantoches – ou ser o ponto<br />
de partida <strong>para</strong> o desenvolvimento de outros conteúdos e atividades.<br />
Estudos suger<strong>em</strong> que crianças pod<strong>em</strong> ser influenciadas pelas situações<br />
mostradas nas histórias infantis e descobrir mecanismos de tomada de<br />
decisão e solução de probl<strong>em</strong>as, e que pode haver melhora <strong>em</strong> sua autoestima.<br />
39 No acervo de histórias infantis tradicionais, pod<strong>em</strong> ser encontradas<br />
várias situações relacionadas à alimentação possíveis de ser<strong>em</strong><br />
exploradas no ambiente escolar. Estudo norte-americano 40 avaliou<br />
<strong>livro</strong>s infantis pr<strong>em</strong>iados, voltados <strong>para</strong> o público pré-escolar, e identificou<br />
que 45% apresentavam pelo menos uma menção a alimentos. O<br />
grupo mais mencionado foi o de alimentos fonte de carboidratos complexos,<br />
seguido das frutas e açúcares simples/gorduras, <strong>em</strong> sua maioria<br />
(77%) relacionada a mensagens positivas. Hortaliças foram significativamente<br />
menos mencionadas. Embora não esteja claro qual o impacto das<br />
mensagens sobre mudanças nos hábitos alimentares 39 , histórias infantis<br />
permit<strong>em</strong> o desenvolvimento de inúmeros conceitos sobre alimentos<br />
e nutrição. 33<br />
Para o sucesso da utilização/criação de jogos e histórias, é importante<br />
estabelecer objetivos claros do que se pretende alcançar e adequá-los<br />
às habilidades da criança, respeitando-se sua idade e seu desenvolvimento.<br />
O conhecimento dessas características é importante <strong>para</strong> a criação<br />
ou escolha de materiais adequados. Entre os diversos educadores que
232<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
trataram do brincar e da aprendizag<strong>em</strong>, destacam-se as teorias de Piaget<br />
e Vygotsky. Segundo a teoria construtivista proposta por Piaget, as crianças<br />
passam por quatro estágios associados às idades (mas não de forma<br />
rígida), nos quais interag<strong>em</strong> com a realidade de maneira diferente, construindo<br />
seu entendimento de mundo. Tais estágios representam uma sequência<br />
constante e evolu<strong>em</strong> de maneira que <strong>em</strong> cada um o esqu<strong>em</strong>a de<br />
assimilação anterior é englobado e ampliado, devendo ser conhecidos<br />
<strong>para</strong> que a escolha do material didático seja a mais adequada. Vygotsky,<br />
por sua vez, reforçou a importância da atuação dos outros m<strong>em</strong>bros do<br />
grupo social como essencial <strong>para</strong> o desenvolvimento da criança. 17<br />
Respeitando-se esses conceitos, todos os jogos pod<strong>em</strong> ser <strong>em</strong>pregados,<br />
seja o mais simples ou aquele desenvolvido especificamente <strong>para</strong><br />
esse fim ou adaptado (m<strong>em</strong>ória, tabuleiro, lenço-atrás, etc.), desde o<br />
mais tradicional até os modernos games <strong>para</strong> computadores.<br />
Avaliação<br />
Embora todas as etapas de elaboração de programas de Educação Alimentar<br />
e Nutricional sejam essenciais <strong>para</strong> seu sucesso, n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre sua<br />
avaliação está prevista no planejamento, sendo este um aspecto fundamental<br />
e que deve s<strong>em</strong>pre ser realizado <strong>para</strong> que seja possível julgar a<br />
efetividade e a eficácia do programa e nortear novos caminhos a ser<strong>em</strong><br />
seguidos.<br />
Pérez-Rodrigo e Aranceta 1 reforçam que não só a avaliação final é<br />
importante, mas também a avaliação do processo (avaliação formativa),<br />
que resulta na identificação de fatores que pod<strong>em</strong> gerar maior eficácia<br />
das ações. A avaliação do processo foca <strong>em</strong> impl<strong>em</strong>entação do programa,<br />
controle de qualidade e monitoramento, que explicam seu resultado.<br />
Essa avaliação permite investigar qual é a extensão do programa, o<br />
grau de adesão, o alcance das ações, o uso de materiais, os mediadores<br />
ambientais (p.ex., formação de professores), o conteúdo trabalhado, o<br />
envolvimento da família, a disponibilidade de alimentos saudáveis <strong>em</strong>
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
233<br />
casa, as modificações nas refeições oferecidas na escola, a presença de<br />
subgrupos com necessidades especiais, as dificuldades <strong>para</strong> sensibilização,<br />
o apoio externo, entre outros fatores importantes.<br />
Para cada intervenção, é necessário que indicadores de avaliação<br />
sejam determinados. Alguns dos instrumentos que pod<strong>em</strong> ser adotados<br />
<strong>para</strong> essa avaliação inclu<strong>em</strong> a observação das classes, o acompanhamento<br />
da alimentação escolar, os grupos focais e a análise de fatores que<br />
afetam a adesão. 1<br />
A avaliação final, que avalia o impacto do programa, é importante<br />
<strong>para</strong> identificar sua eficácia e deve incluir medidas qualitativas e<br />
quantitativas. 1,29<br />
A adoção de um processo de avaliação pleno e envolvendo toda a<br />
equipe norteia as decisões <strong>para</strong> novas intervenções; portanto, deve ser<br />
s<strong>em</strong>pre considerado cuidadosamente no planejamento.<br />
CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />
Este texto teve como objetivo pontuar fatores implicados no desenvolvimento<br />
da educação alimentar e nutricional na escola. Fica claro, mesmo<br />
com base <strong>em</strong> apenas alguns aspectos <strong>aqui</strong> tratados, que não são poucos<br />
os desafios envolvidos nesse amplo processo, que engloba uma gama<br />
tão variada de questões, que vão desde intersetorialidade até o desenvolvimento<br />
de materiais didáticos. Espera-se que a percepção da magnitude<br />
dessa complexidade provoque a reflexão sobre o papel que cada um<br />
pode exercer.<br />
O sucesso das ações depende de quanto o processo está integrado<br />
à realidade dos alunos – a alimentação servida, o currículo, as questões<br />
culturais – e dos esforços, os quais dev<strong>em</strong> ser permanentes e envolver<br />
todos os setores e atores.<br />
Apenas o trabalho <strong>em</strong> conjunto com a finalidade de que os escolares<br />
alcanc<strong>em</strong> muito além da <strong>aqui</strong>sição de conhecimentos, atingindo<br />
competências que os permitam utilizar as informações e recursos
234<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
disponíveis de forma a adotar hábitos alimentares saudáveis, garantirá o<br />
êxito das ações de educação alimentar e nutricional na escola.<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
1. Pérez-Rodrigo C, Aranceta J. School based education: lessons learned and new<br />
perspectives. Publ Health Nutr 2001; 4(1A):131-9.<br />
2. Brasil. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais:<br />
apresentação dos t<strong>em</strong>as transversais, ética/Secretaria de Educação Fundamental.<br />
Brasília: MEC/SEF, 1997.<br />
3. Boog MCF. O professor e a alimentação escolar. Campinas: Komedi, 2008.<br />
4. Pérez-Rodrigo C, Klepp K-I, Yngve A, Sjörström M, Stockley L, Aranceta J. The<br />
school setting: an opportunity for the impl<strong>em</strong>entation of dietary guidelines.<br />
Publ Health Nutr 2001; 4(2B):717-24.<br />
5. Brasil. Ministério da Saúde. Ministério da Educação. Portaria Interministerial<br />
MS/MEC n. 1.010, de 8 de maio de 2006.<br />
6. Brasil. Lei n. 11.947, de 16 de junho de 2009.<br />
7. Brasil. Ministério da Educação. Fundo Nnacional de Desenvolvimento da Educação.<br />
Resolução/CD/FNDE n. 38, de 16 de julho de 2009.<br />
8. Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Alimentação escolar. Disponível<br />
<strong>em</strong>: htpp://http://www.fnde.gov.br/index.php/programas-alimentacao-escolar.<br />
Acessado <strong>em</strong>: 29/9/2010.<br />
9. Brasil. Ministério da Educação. Fundo Nnacional de Desenvolvimento da Educação.<br />
Programa Nacional de Alimentação Escolar. Coordenação Geral do Programa<br />
Nacional de Alimentação Escolar. Manual de orientação <strong>para</strong> os conselheiros<br />
e agentes envolvidos na execução do programa nacional de alimentação<br />
escolar. Ministério da Educação. Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação.<br />
Brasília, 2006.<br />
10. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de atenção à saúde. Departamento de<br />
Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica Coordenação Geral da Política<br />
de Alimentação. Regulamento da comercialização de alimentos <strong>em</strong> escolas<br />
no Brasil: experiências estaduais e municipais. Brasília, 2007.
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
235<br />
11. Hawkes C. Marketing global food to children: the regulatoy environment. Geneve:<br />
World Health Organization, 2007.<br />
12. Halpern G. Comerciais veiculados <strong>em</strong> programação infanto-juvenil de canais<br />
abertos de TV e sua relação com a escolha de alimentos <strong>em</strong> amostra de escolares.<br />
[Dissertação de Mestrado]. São Paulo: <strong>Unifesp</strong> 2003.<br />
13. Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução n. 24 de 15 de junho<br />
de 2010. Diário Oficial da União. Seção 1, n. 122, de 29 de junho de 2010.<br />
14. Monteiro CA, Castro IRR. Por que é necessário regulamentar a publicidade de<br />
alimentos. Rev Ciênc Cult 2009; 61(4). Disponível <strong>em</strong>: http://cienciaecultura.<br />
bvs.br/pdf/cic/v61n4/20.pdf. Acessado <strong>em</strong>: 19/9/2010.<br />
15. Conselho Federal de Nutricionistas. Resolução n. 380, de 28 de dez<strong>em</strong>bro de 2005.<br />
16. Honório ARF. Percepções e d<strong>em</strong>andas dos nutricionistas atuantes na alimentação<br />
escolar no estado de São Paulo sobre a formação necessária <strong>para</strong> atuar nessa<br />
área. [Dissertação de Mestrado]. São Paulo: <strong>Unifesp</strong> 2009.<br />
17. Woehlert AP, Bernucii CB, Dornelles IRC, Reis NB, Linden S. Nutrição & pedagogia.<br />
O caminho do sucesso à educação alimentar e nutricional <strong>em</strong> escolas de<br />
educação infantil. Porto Alegre: Nova Prova, 2007.<br />
18. Costa EQ, Ribeiro VMB, Ribeiro ECO. Programa de alimentação escolar: espaço<br />
de aprendizag<strong>em</strong> e produção de conhecimento. Rev Nutr Campinas 2001;<br />
14(3):225-9.<br />
19. Carvalho AT, Muniz VM, Gomes JF, Samico I . Programa de alimentação escolar<br />
<strong>em</strong> João Pessoa- PB, Brasil: as merendeiras <strong>em</strong> foco. Interface Comunic Saúde<br />
Educ 2008; 12(27):823-34.<br />
20. Voorpostel CR. Percepções de professores e funcionários de escola rural sobre a<br />
alimentação. [Dissertação de Mestrado]. Campinas: Unicamp, 2007.<br />
21. Moreira ACM. Educação nutricional na Educação infantil: o papel da escola<br />
na formação de hábitos alimentares das crianças, considerando a probl<strong>em</strong>ática<br />
da obesidade. [Dissertação de Mestrado]. São Paulo: Universidade Presbiteriana<br />
Mackenzie, 2006.<br />
22. Doyle EL, Feldman RHL. Are local teachers or nutrition experts perceived<br />
as more effective among Brazilian high school students? J Sch Health. 1994;<br />
64(3):115-8.
236<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
23. Olivares S, Snel J, McGrann M, Glasauer P. J Food Nutr Agric 1998; 22:57-62.<br />
24. Contento IR, Manning AD, Shannon B. Research Perspective on School-based<br />
Nutrition Education. JNE 1992; 24:247-60.<br />
25. Gaglione CP, Taddei JAAC, Colugnati FAB, Magalhães CG, Davanço GM, Macedo<br />
L et al. Nutrition education in public el<strong>em</strong>entary schools of São Paulo,<br />
Brazil: the Reducing Risks of Illness and Death in Adulthood project. Rev Nutr<br />
Campinas 2006; 19(3):309-20.<br />
26. Gaglianone CP. Estudo do conteúdo relacionado à nutrição <strong>em</strong> <strong>livro</strong>s didáticos<br />
de ciências utilizados no ensino fundamental brasileiro. [Dissertação de Mestrado].<br />
São Paulo: <strong>Unifesp</strong>, 1999.<br />
27. Soares JR, Fernandez MRS, Ferreira MKM. A educação nutricional no contexto<br />
dos materiais didáticos utilizados na rede municipal de ensino de Governador<br />
Valadares – MG, nos anos iniciais. [Monografia]. Governador Valadares: Faculdade<br />
de Ciências da Saúde da Universidade Vale do Rio Doce, 2009.<br />
28. Pipitone MAP, Silva MV, Sturion GL, Caroba DCR. A educação nutricional no<br />
programa de ciências <strong>para</strong> o ensino fundamental. Saúde Rev Piracicaba 2003;<br />
5(9):29-37.<br />
29. Fernandez PM, Silva DO. Descrição das noções conceituais sobre os grupos alimentares<br />
por professores De 1ª a 4ª série: a necessidade de atualização dos conceitos.<br />
Rev Ciênc Educ 2008; 14(3):451-66.<br />
30. Soares ACF, Lazzari ACM, Ferdinandi MN. Análise da importância dos conteúdos<br />
da disciplina de educação nutricional no ensino fundamental segundo<br />
professores de escolas públicas e privadas da cidade de Maringá – Paraná. Rev<br />
Saúde Pesq 2009; 2(2):179-84.<br />
31. Contento IR. Nutrition education: linking research, theory, and practice. Asia<br />
Pac J Clin Nutr 2008; 17(1):176-9.<br />
32. Bizzo MLG, Leder L. Educação nutricional nos parâmetros curriculares nacionais<br />
e <strong>para</strong> o ensino fundamental. Rev Nutr Campinas 2005; 18(5):661-7.<br />
33. Evers CL. How to teach nutrition to kids. Portland: Carrot Press, 2003.<br />
34. Pedrazza DF, Andrade SLLS. Alimentação Escolar analisada no contexto de um<br />
programa de alimentação e nutrição. RBPS 2006; 19(3):164-74.
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
237<br />
35. Costa ES, Alexandre JC, Fernandes MCA, Oliveira MS. Mapeamento do processo:<br />
implantação e impl<strong>em</strong>entação do projeto Educando com a Horta Escolar.<br />
Brasília, 2007. Disponível <strong>em</strong>: htpp://www.educandocomahorta.org.br. Acessado<br />
<strong>em</strong>: 17/10/2010.<br />
36. Rodrigues LPF, Roncada MJ. Educação nutricional no Brasil: evolução de proposta<br />
metodológica <strong>para</strong> escolas. Com Ciências Saúde 2008; 19(4):315-22.<br />
37. Dallabona SR, Mendes SMS. O lúdico na educação infantil: jogar, brincar uma<br />
forma de educar. Rev Divulgação Técnico-Científica do ICPG 2004; 1(4):107-12.<br />
38. Cordazzo STD, Vieira ML. A brincadeira e suas implicações no processo de<br />
aprendizag<strong>em</strong> e de desenvolvimento. Estudo e Pesquisas <strong>em</strong> Psicologia UERJ<br />
2007; 7(1):89-101.<br />
39. Byrne M, Nitzke A. Preeschool children’s acceptance of a novel vegetable following<br />
exposure to messages in story books. J Nutr Educ Behav 2002; 34:211-4.<br />
40. Byrne EM, Nitzke AS. Nutrition messages in a sample of children’s picture<br />
books. J Am Diet Assoc 2000; 31:359-62.
PROGRAMAS DE ALIMENTAÇÃO<br />
ESCOLAR: INSTRUMENTOS DE<br />
PROMOÇÃO DA SEGURANÇA<br />
ALIMENTAR E NUTRICIONAL NA<br />
AMÉRICA LATINA<br />
Walter Belik<br />
Luciana Rosa de Souza<br />
INTRODUÇÃO<br />
Este capítulo visa a discutir a importância dos Programas de Alimentação<br />
Escolar enquanto ações de política social no campo da segurança alimentar<br />
e nutricional, considerando seus transbordamentos <strong>para</strong> a área educacional<br />
e no desenvolvimento local. A principal motivação desse estudo<br />
vincula-se às observações que indicam que os programas de alimentação<br />
escolar têm sido tímidos e não têm chegado à população que mais necessita.<br />
Na América Latina, <strong>em</strong> geral, apenas 1,1% do gasto social associado<br />
ao Produto Interno Bruto (PIB) t<strong>em</strong> sido direcionado aos programas de<br />
alimentação, dentro dos quais se insere a alimentação escolar. 1 Na realidade,<br />
pode-se inferir que caso esses programas foss<strong>em</strong> estendidos e aplicados<br />
de forma universal, de modo a atender toda a população-alvo s<strong>em</strong><br />
discriminação de renda, seus efeitos poderiam ir além do simples aporte<br />
alimentar, além de gerar efeitos no desenvolvimento das regiões.<br />
De fato, quando as políticas sociais são dirigidas de forma intensiva<br />
<strong>para</strong> o apoio a programas de alimentação escolar, pod<strong>em</strong> provocar<br />
enormes ganhos vinculados a educação, saúde e desenvolvimento local,
240<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
além de ter impactos diretos sobre a segurança alimentar. Define-se a<br />
segurança alimentar a partir do acesso aos alimentos de qualidade <strong>em</strong><br />
quantidade adequada e com regularidade. É importante destacar que os<br />
Programas de Alimentação Escolar (PAE), ao reforçar<strong>em</strong> os aspectos da<br />
produção e do consumo local, preservando hábitos alimentares, têm capacidade<br />
de ir além e promover o que se costuma denominar soberania<br />
alimentar das comunidades. 2<br />
Os programas de alimentação escolar são capazes de gerar meios<br />
<strong>para</strong> desenvolver a produção local, desvinculando-a de crises setoriais<br />
e mantendo regularidade nas rendas da comunidade, ao mesmo t<strong>em</strong>po<br />
<strong>em</strong> que se garante o abastecimento alimentar. No momento atual, considerando<br />
o cenário de irregularidade nos preço dos alimentos, a dinamização<br />
local criada a partir da agricultura familiar pode ser um caminho<br />
<strong>para</strong> evitar crises de abastecimento e falta de produtos essenciais à<br />
alimentação. Ad<strong>em</strong>ais, “(esses programas) pod<strong>em</strong> cumprir um papel relevante<br />
na rede de proteção social devido à sua alta capacidade de responder<br />
<strong>em</strong> momentos de crise”. 3<br />
Este capítulo usa o caso do Brasil como ex<strong>em</strong>plo b<strong>em</strong>-sucedido –<br />
mas não acabado – de um PAE que serve como referência <strong>para</strong> toda a<br />
região, já que possui um desenho mais avançado 4,A , além de ter cobertura<br />
universal. Um total de quase 20 países da América Latina e do Caribe<br />
desenvolve programas de alimentação escolar, porém muitos programas<br />
não passam de pequenas ajudas que são transferidas a certas<br />
escolas de regiões carentes <strong>em</strong> algumas épocas do ano. Em outros casos,<br />
a quantidade de alimentos utilizada nas merendas é tão pequena que<br />
proporciona baixos resultados <strong>em</strong> termos nutricionais.<br />
O objetivo mais direto desse trabalho é indicar que os PAE pod<strong>em</strong><br />
ser mais b<strong>em</strong> utilizados como instrumento de promoção da segurança<br />
alimentar e nutricional. Argumenta-se que tal instrumento não t<strong>em</strong><br />
sido b<strong>em</strong> aproveitado, <strong>em</strong> função de seu baixo alcance sobre a população<br />
mais necessitada e do valor relativamente reduzido de suas transferências<br />
aos municípios. Mesmo no Brasil, considerado um ex<strong>em</strong>plo na
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
241<br />
impl<strong>em</strong>entação de seu PAE, os resultados medidos <strong>em</strong> termos de impacto<br />
direto ou na percepção da segurança alimentar são reduzidos ou<br />
não foram avaliados. 5 As constatações a respeito do impacto do PAE no<br />
Brasil são provenientes de levantamentos realizados com base na aplicação<br />
de questionários e segundo a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar<br />
(Ebia), <strong>em</strong> pesquisa com amostras de domicílios <strong>em</strong> 2006. B De<br />
toda forma, o poder que esses programas pod<strong>em</strong> ter caso sejam desenhados<br />
<strong>para</strong> dinamizar a renda dos produtores locais e outros el<strong>em</strong>entos<br />
ligados à educação e à saúde nas comunidades enseja sua grande capacidade<br />
de atuar como política social.<br />
Este capítulo foi dividido <strong>em</strong> três seções: a primeira analisa a literatura<br />
acerca dos impactos locais dos PAE sobre a dinamização local;<br />
a segunda discute as correlações que pod<strong>em</strong> ser estabelecidas entre<br />
educação e alimentação escolar; e a terceira traça um panorama geral<br />
dos programas de transferência de renda na América Latina, ressaltando<br />
que o ex<strong>em</strong>plo do PAE brasileiro perpassará todo o texto, <strong>em</strong> razão<br />
de seus aspectos de universalidade na oferta do serviço e seu desenho<br />
orientado <strong>para</strong> a dinamização local, facultado por meio do Programa de<br />
Aquisição de Alimentos (PAA), do Governo Federal, que facilita a compra<br />
de produtos da agricultura familiar por parte das prefeituras.<br />
ALIMENTAÇÃO ESCOLAR E DESENVOLVIMENTO LOCAL<br />
O fornecimento de alimentação nas escolas tende a ser um processo<br />
descentralizado por definição, pois a matéria-prima ou mesmo as refeições<br />
prontas precisam chegar até as escolas, sendo distribuídas <strong>em</strong><br />
um amplo espaço geográfico. A alimentação acontece <strong>em</strong> um espaço de<br />
grande dispersão, procurando atender a seu público beneficiário e ao<br />
mesmo t<strong>em</strong>po resguardar aspectos ligados aos hábitos alimentares de<br />
cada grupo envolvido. São muitas as dificuldades presentes no processo<br />
de obtenção dos alimentos e sua posterior distribuição.<br />
Fica evidente que <strong>para</strong> países que depend<strong>em</strong> de doações da cooperação<br />
internacional <strong>para</strong> atender às necessidades diárias de alimentação
242<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
dos estudantes é difícil mencionar a importância de preservação de hábitos<br />
locais. O mesmo ocorre com as estruturas centralizadas de compra<br />
e gestão dos recursos públicos. Nos países mais burocratizados e<br />
com controles mais rígidos quanto aos poderes provinciais ou municipais,<br />
torna-se difícil promover a descentralização dessas compras.<br />
Como resultado, nesses casos, compras centralizadas costumam ocorrer,<br />
muitas vezes, concentradas <strong>em</strong> algumas poucas <strong>em</strong>presas fornecedoras<br />
s<strong>em</strong> promover qualquer geração de renda nas economias locais.<br />
Analisar o caso do Brasil permite entender como o sist<strong>em</strong>a de alimentação<br />
escolar transitou de um formato focalizado <strong>em</strong> termos sociais<br />
e geográfico via compra centralizada <strong>para</strong> um formato universal, com a<br />
<strong>aqui</strong>sição de alimentos por meio da compra descentralizada baseada <strong>em</strong><br />
sist<strong>em</strong>as locais de fornecimento.<br />
No Brasil, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)<br />
sofreu grande evolução <strong>em</strong> seus mais de 50 anos de vida. Em seu início,<br />
era uma simples campanha voltada <strong>para</strong> algumas escolas durante<br />
alguns dias da s<strong>em</strong>ana. Seus suprimentos tinham relação direta<br />
com a disponibilidade proporcionada pelas doações de gêneros proveniente<br />
da ajuda alimentar internacional ou programas como o PL 480<br />
norte-americano. C<br />
Em 1979, o programa assumiu caráter nacional e universal. Na década<br />
de 1990, o PNAE começou a se estruturar, estabelecendo algumas<br />
regras referentes às quantidades a ser<strong>em</strong> fornecidas, aos valores nutricionais<br />
e ao sist<strong>em</strong>a de compras envolvido no fornecimento. Finalmente,<br />
<strong>em</strong> 1994, adotou-se a descentralização na gestão do programa, promovendo<br />
seu controle por parte da sociedade civil e facilitando-se as compras<br />
por meio de sist<strong>em</strong>as locais de abastecimento.<br />
Em 1994, o mesmo Projeto de Lei que descentralizou e municipalizou<br />
D a merenda escolar recomendava a preferência por produtos in natura<br />
na compra e a priorização da produção local <strong>para</strong> reduzir custos.<br />
Em 1996, uma nova portaria passou a definir critérios <strong>para</strong> a <strong>aqui</strong>sição
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
243<br />
de alimentos <strong>para</strong> a merenda escolar. Essa portaria acentuou a importância<br />
da comercialização de alimentos produzidos na região <strong>para</strong> incentivar<br />
a produção local, além de recomendar a <strong>aqui</strong>sição de produtos<br />
que estivess<strong>em</strong> <strong>em</strong> período de safra na região. Também se indicava a necessidade<br />
de evitar a compra de alimentos de <strong>em</strong>presas monopolísticas,<br />
ou seja, dos grandes atacadistas do setor de alimentação.<br />
As ações vinculadas ao PNAE no modelo descentralizado (ou seja,<br />
após a municipalização da merenda escolar) centravam-se no estímulo<br />
ao associativismo e à profissionalização dos produtores agrícolas familiares.<br />
Nesse modelo de administração do PNAE, a prefeitura seria o<br />
agente promotor da associação entre alimentação escolar e desenvolvimento<br />
local. Entende-se que esse desenho descentralizado apresentado<br />
pelo PNAE é mais apropriado <strong>para</strong> promover o desenvolvimento<br />
local, especialmente <strong>para</strong> municípios pequenos. Parte-se do suposto<br />
que esse desenho de PAE tende a gerar maiores reflexos sobre os produtores<br />
de produtos hortifrutigranjeiros e carnes, situações nas quais<br />
os benefícios derivados da logística, do preço/qualidade e do fortalecimento<br />
da economia local são evidentes. Nesse tipo de PAE, a exceção<br />
deve ser feita <strong>para</strong> a gestão da alimentação escolar nos grandes municípios<br />
e também <strong>para</strong> a compra de gêneros não perecíveis, <strong>para</strong> os quais<br />
as compras <strong>em</strong> grandes quantidades pod<strong>em</strong> representar uma grande<br />
economia.<br />
Informações recolhidas nas quatro edições do Prêmio Gestor Eficiente<br />
da Merenda Escolar organizado pela ONG Ação Fome Zero E<br />
mostram que os municípios que promoveram a compra de alimentos<br />
junto à agricultura e à agroindústria familiar ou ao pequeno comércio<br />
tiveram vantagens <strong>em</strong> termos de renda e <strong>em</strong>prego <strong>para</strong> seu município,<br />
além de garantir<strong>em</strong> uma alimentação saudável e respeitar os hábitos alimentares<br />
regionais. Entretanto, essa opção, por privilegiar os fornecedores<br />
locais, implicou grande esforço, seja no campo administrativo ou<br />
de reorientação de prioridades nas decisões políticas municipais.
244<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Em alguns casos de municípios b<strong>em</strong>-sucedidos que foram avaliados<br />
pelo prêmio, já se contava com uma estrutura produtiva estabelecida<br />
e um sist<strong>em</strong>a de distribuição constituído. Nesses casos, a gestão da<br />
merenda escolar era feita de forma rotineira e burocrática até que, por<br />
algum motivo de crise – por ex<strong>em</strong>plo, uma baixa nos preços de mercado<br />
pagos aos produtores locais ou uma mudança nos fluxos dos mercados,<br />
ou mesmo por pressão exercida pelos produtores locais –, a opção pela<br />
utilização das compras locais passou a ser adotada. Esses foram os casos<br />
da adoção do suco de laranja na merenda escolar na região de Bebedouro<br />
(SP), do leite no oeste de Santa Catarina, do leite de cabra <strong>em</strong> Sergipe,<br />
da castanha-do-pará <strong>em</strong> alguns municípios da Amazônia, do doce<br />
de coco <strong>em</strong> Quissamã (RJ) e dos alimentos orgânicos <strong>em</strong> vários municípios<br />
analisados.<br />
Em outros casos, o avanço de programas de compra da agricultura<br />
familiar pode ser visto como mais difícil de ser impl<strong>em</strong>entado, pois<br />
envolve o que se chama de desenvolvimento de fornecedores. Nessa<br />
circunstância, torna-se necessário identificar produtores, capacitá-<br />
-los <strong>para</strong> o atendimento aos requisitos de qualidade exigida, auxiliá-los<br />
na pre<strong>para</strong>ção de documentação e estabelecer rotinas de atendimento<br />
e entrega. Geralmente, esse trabalho t<strong>em</strong> início dentro da escola, com<br />
programas de educação alimentar e recuperação de tradições e hábitos<br />
locais apoiados ou incentivados pelo Conselho Municipal de Alimentação<br />
Escolar (CAE). Em momento posterior, há o envolvimento de agrônomos,<br />
assistentes sociais e o pessoal administrativo da prefeitura nas<br />
compras escolares.<br />
Pelo fato de a legislação brasileira <strong>para</strong> compras públicas ser muito<br />
rígida, criou-se uma dificuldade <strong>para</strong> que os pequenos produtores agropecuários<br />
ou pequenos processadores pudess<strong>em</strong> participar dos processos<br />
licitatórios. Em resposta a essas dificuldades, no ano de 2003, o governo<br />
brasileiro lançou o PAA, com uma modalidade <strong>para</strong> a compra da<br />
agricultura familiar (s<strong>em</strong> licitação <strong>em</strong> montante de até R$ 5.000,00/ano)<br />
e posterior doação desse alimento <strong>para</strong> a merenda escolar. Mais tarde,
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
245<br />
essa modalidade foi subdividida <strong>em</strong> outras. Entretanto, pode-se resumir<br />
a atuação do governo nesse particular <strong>em</strong> dois tipos: a compra com<br />
doação simultânea e o programa de compra do leite. Em ambos os casos,<br />
as estatísticas não faz<strong>em</strong> diferenciação sobre o destino das compras, de<br />
modo que elas pod<strong>em</strong> ser utilizadas <strong>para</strong> a merenda escolar, como também<br />
<strong>para</strong> a doação a instituições de assistência social.<br />
Levantamentos realizados por Turpin 6 d<strong>em</strong>onstram que foram<br />
gastos R$ 619 milhões nos estados e municípios, entre 2003 e 2008, com<br />
esses dois programas F , porém não se sabe ao certo quanto foi destinado<br />
à alimentação escolar, que deve ser predominante <strong>em</strong> com<strong>para</strong>ção com<br />
outros itens cobertos pelas compras governamentais transferidos a instituições<br />
de caridade municipais. Contudo, há ainda outra modalidade<br />
de PAA que é operado diretamente pela Companhia Nacional de Abastecimento<br />
(Conab), que realiza as compras e que pode ter contribuído<br />
com um pequeno montante adicional <strong>para</strong> o abastecimento da merenda<br />
escolar.<br />
Em sua concepção original, ao consolidar a relação entre o consumo<br />
de alimentos <strong>para</strong> a merenda escolar e sua produção local, buscava-<br />
-se manter as compras da merenda escolar sob o controle do município,<br />
ou da escola, e permitir o acesso de pequenos produtores cadastrados<br />
<strong>para</strong> o circuito de compras dos municípios. Com isso, era possível preservar<br />
os hábitos de consumo locais nas escolas e, ao mesmo t<strong>em</strong>po, gerar<br />
uma escala econômica de produção capaz de viabilizar esses pequenos<br />
agricultores. A conjugação do PNAE com o PAA é um ex<strong>em</strong>plo do<br />
esforço nessa direção que acontece no Brasil.<br />
No entanto, <strong>para</strong> que essas propostas possam ser ampliadas, seria<br />
necessário também melhorar o aporte de alimentos destinados à<br />
merenda escolar. Atualmente, a legislação brasileira prevê que a merenda<br />
deve atender a 15% das necessidades calóricas diárias e prover<br />
9 g de proteína <strong>para</strong> os alunos durante os 200 dias letivos do calendário<br />
escolar. Esses valores são muito reduzidos e não pod<strong>em</strong><br />
alterar significativamente o quadro nutricional grave de famílias <strong>em</strong>
246<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
extr<strong>em</strong>a pobreza. Entretanto, com mais refeições e alimentação de<br />
melhor qualidade, as municipalidades poderiam mudar esse quadro.<br />
Poderiam, por ex<strong>em</strong>plo, comprar mais dos produtores locais, gerando,<br />
dessa maneira, um fluxo significativo de alimentos adquiridos da<br />
agricultura familiar.<br />
Outra providência importante é o incentivo à criação de hortas escolares<br />
(administradas por famílias ou cooperativas de produtores) <strong>para</strong><br />
oferta local. Para tanto, é fundamental que o Poder Público disponibilize<br />
áreas ociosas <strong>em</strong> terrenos municipais e áreas contíguas às escolas.<br />
Este é um el<strong>em</strong>ento importante <strong>para</strong> o funcionamento de uma relação<br />
direta entre fornecedores e compradores, no que se refere à qualidade<br />
dos alimentos fornecidos. Ao mesmo t<strong>em</strong>po, a proximidade das áreas<br />
de produção permite o desenvolvimento de atividades escolares, tendo<br />
a merenda (produção, relações de trabalho, conteúdo nutricional e outros<br />
el<strong>em</strong>entos) como ponto de destaque.<br />
Atualmente, o programa brasileiro atende a um total de 37 milhões<br />
de crianças (pré-escola, ensino infantil e fundamental) com gastos da<br />
União superiores a R$ 1,5 bilhão. Estima-se que, com a incorporação dos<br />
estudantes do Ensino Médio ao PNAE, o gasto do Governo Federal supere<br />
os R$ 2 bilhões, atendendo a cerca de 45 milhões de alunos. Essa<br />
foi outra inovação importante que foi introduzida <strong>em</strong> 2009 – uma diretriz<br />
estabelecendo percentuais <strong>para</strong> a compra local. A legislação atual<br />
prevê que 70% do valor repassado deve ser utilizado <strong>para</strong> a compra de<br />
produtos básicos, o que, por si só, não é uma garantia de compras junto<br />
aos agricultores locais, pois n<strong>em</strong> todos os municípios produz<strong>em</strong> todos<br />
os produtos necessários à merenda escolar, mesmo porque exist<strong>em</strong><br />
vários municípios urbanos, além do fato de muitos produtos básicos ser<strong>em</strong><br />
industrializados, como queijos, carnes, farinhas, óleo de soja, etc., e<br />
os produtores locais não ser<strong>em</strong> capazes de fornecer esses bens <strong>em</strong> condições<br />
(qualidade e quantidade) adequadas.<br />
Finalmente, há um probl<strong>em</strong>a de preços praticados: muitas vezes, a<br />
compra de produtos (mesmo aqueles da produção local) é mais barata
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
247<br />
quando feita por <strong>em</strong>presas fornecedoras. Isso s<strong>em</strong> contar custos de<br />
transação envolvidos na operação com pequenos produtores.<br />
Nesta sessão, procurou-se indicar os possíveis impactos da alimentação<br />
escolar sobre a dinamização local, com base no ex<strong>em</strong>plo brasileiro,<br />
cuja importância <strong>em</strong> termos de PAE na América Latina ainda será explorada<br />
na sequência deste estudo. A próxima seção busca apreender as<br />
relações entre os programas de alimentação escolar e o aproveitamento<br />
educacional dos escolares beneficiados, entre outras informações que<br />
vinculam educação das crianças <strong>em</strong> situação de desvantag<strong>em</strong> com relação<br />
à alimentação escolar.<br />
PAE E EDUCAÇÃO<br />
A valorização do espaço escolar como el<strong>em</strong>ento <strong>para</strong> a atração das comunidades<br />
e a participação d<strong>em</strong>ocrática tende a provocar efeitos que<br />
extrapolam a simples necessidade de gestão e o acompanhamento das<br />
políticas públicas. Nas comunidades, a escola funciona como ponto de<br />
encontro, promovendo a educação, a boa nutrição e a integração dos<br />
grupos mais vulneráveis. Assim, vislumbrar a escola como um centro<br />
de referência <strong>em</strong> segurança alimentar e os PAE como seus condutores<br />
pode abrir um novo horizonte <strong>para</strong> as comunidades participar<strong>em</strong><br />
<strong>em</strong> um novo desenho das políticas de alimentação escolar. A participação<br />
popular faculta o <strong>em</strong>poderamento dos atores e t<strong>em</strong> se tornado<br />
a nova política pública que, <strong>em</strong>bora tenha raízes na preocupação neoliberal<br />
de reduzir a tutela do Estado, pode promover a cidadania e<br />
conter grande potencial <strong>para</strong> revitalizar a d<strong>em</strong>ocracia. 7 Portanto, não<br />
se pode identificar os PAE como estando unicamente voltados <strong>para</strong> a<br />
alimentação.<br />
Muitas pesquisas foram realizadas sobre a efetividade dos programas<br />
de alimentação escolar <strong>em</strong> termos nutricionais, e a pergunta que<br />
t<strong>em</strong> balizado tais pesquisas é: qual seria o impacto da alimentação escolar<br />
<strong>em</strong> termos nutricionais? Entretanto, segundo estudo de Kristjansson<br />
et al. 8 , não seria possível apontar dados conclusivos a respeito do
248<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
impacto da merenda escolar sobre a nutrição das crianças. Um mapeamento<br />
de 18 estudos realizados desde a década de 1920, <strong>em</strong> países industrializados<br />
e <strong>em</strong> desenvolvimento, mostra que os resultados variam<br />
dependendo do grupo que está sendo analisado, desde a qualidade e a<br />
frequência dos alimentos fornecidos até outras variáveis da conjuntura<br />
econômica envolvidas no processo. Pode-se concluir, entretanto, que,<br />
do ponto de vista da frequência escolar e da redução da repetência e do<br />
abandono escolar, os PAE representam um grande avanço.<br />
Conforme estudo de Kristjansson et al. 8 , no qual foram analisados<br />
os impactos da alimentação escolar tanto <strong>em</strong> países de baixa renda<br />
como <strong>em</strong> países de alta renda:<br />
Results for height from High Income countries were mixed, but generally<br />
positive. In low income countries, children who were fed at<br />
school attended school more frequently than those in control groups;<br />
this finding translated to an average increase of 4 to 6 days a year per<br />
child. For educational and cognitive outcomes, children who were<br />
fed at school gained more than controls on math achiev<strong>em</strong>ent, and<br />
on some short-term cognitive tasks. School meals may have small<br />
physical and psychosocial benefits for disadvantaged children. (p.8)<br />
É comum a associação das dificuldades de aprendizag<strong>em</strong> com insuficiência<br />
de micronutrientes. No trabalho de Kristjansson et al. 8 , ficou<br />
clara a possibilidade de os programas de alimentação escolar ajudar<strong>em</strong><br />
a minorar os impactos negativos da desnutrição sobre o processo<br />
de aprendizag<strong>em</strong>. Os autores consideram que os PAE pod<strong>em</strong> ter como<br />
objetivos:<br />
• alívio da fome no curto prazo; 9<br />
• oferta de micronutrientes essenciais ao desenvolvimento saudável da<br />
criança;<br />
• facultar o crescimento das crianças; 10
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
249<br />
• promover o desenvolvimento cognitivo das crianças e melhorar seu des<strong>em</strong>penho<br />
acadêmico. 10<br />
O estudo de Kristjansson et al. 8 também afirma que “nos países <strong>em</strong> desenvolvimento<br />
a alimentação escolar visa a melhorar a frequência escolar,<br />
a participação e encorajar os estudantes”.<br />
Essa conclusão pode ser corroborada nos estudos do programa norte-americano<br />
segundo evidências a partir do NSLP (National School Luch<br />
Program), <strong>em</strong> atividade desde 1946, quando foi transformado <strong>em</strong> um programa<br />
de alcance nacional. Atualmente, o NSLP atende crianças e jovens<br />
do ensino el<strong>em</strong>entar e secundário cujas famílias possuam renda máxima<br />
entre 131 e 185% da linha da pobreza. As refeições <strong>para</strong> os alunos são subsidiadas<br />
de modo que o Estado cobre até US$ 1,14 do valor da refeição, dependendo<br />
do tipo de refeição e da família beneficiária. G,11 Segundo estudos<br />
realizados <strong>em</strong> diversas escolas norte-americanas nos anos 1980, há um<br />
claro aumento de frequência e pontualidade entre os alunos participantes<br />
do NSLP, porém esses estudos não foram conclusivos sobre a melhoria no<br />
rendimento desses estudantes <strong>em</strong> disciplinas como linguag<strong>em</strong>, mat<strong>em</strong>ática<br />
e leitura. Contudo, exist<strong>em</strong> evidências de que os almoços dos estudantes<br />
beneficiários continham calorias e nutrientes <strong>em</strong> excesso, com evidentes<br />
implicações sobre a situação de obesidade dessas crianças e jovens. 11<br />
Um estudo mais abrangente foi realizado pelo Programa Mundial<br />
de Alimentos (PMA). Segundo esse organismo das Nações Unidas,<br />
quando a alimentação foi oferecida nas escolas, além de a fome ter sido<br />
aliviada imediatamente, a frequência escolar praticamente dobrou durante<br />
um ano. 12 Assim, no que se refere à frequência escolar, há indícios<br />
claros de sua correlação positiva com o programa de alimentação, <strong>em</strong>bora<br />
seus efeitos objetivos na nutrição não tenham sido constatados.<br />
De acordo com os mesmos autores, pesquisas a respeito do impacto<br />
da alimentação escolar, apresentadas <strong>em</strong> encontro realizado no ano<br />
2000, indicaram que existe baixa evidência dos benefícios nutricionais<br />
da alimentação escolar, ainda que se possa apresentar fortes indícios de
250<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
melhorias no processo de aprendizag<strong>em</strong>. Ao mesmo t<strong>em</strong>po, é preciso<br />
ressaltar, tal como afirma Macintyre 13 , que a alimentação escolar se direciona<br />
muito mais aos sintomas da fome que às suas causas subjacentes;<br />
ou seja, <strong>em</strong>bora o alimento possa dar uma satisfação imediata ao estudante,<br />
as raízes da desnutrição pod<strong>em</strong> persistir.<br />
O mesmo estudo encontrou efeitos positivos da alimentação escolar<br />
sobre o crescimento da massa muscular da criança <strong>em</strong> algumas<br />
situa ções especiais. Em relação à capacidade cognitiva das crianças, por<br />
sua vez, os testes mostraram que exist<strong>em</strong> efeitos de longo prazo, além<br />
de outros impactos de curto prazo, como mudanças metabólicas, que<br />
aumentam a oferta de energia <strong>para</strong> as crianças. 8 Em termos de comportamento,<br />
a pesquisa dos autores referidos indica que houve melhoria na<br />
interação das crianças nas atividades da escola após a oferta da alimentação<br />
escolar.<br />
Para resumir, o estudo dos autores acima referidos indica que os<br />
impactos são pequenos nos quesitos antropométricos. Contudo, pode-se<br />
ressaltar, com base nas evidências apontadas, que a alimentação<br />
escolar trouxe melhoria nos indicadores relativos a inteligência, capacidade<br />
de compreensão e comportamento. Além disso, o estudo reforça<br />
que a potencialização dos benefícios depende do desenho do programa<br />
e conclui que afirmar que a alimentação escolar isoladamente é<br />
capaz de resolver todas as dificuldades inerentes à pobreza é uma falha<br />
grave, pois a pobreza d<strong>em</strong>anda ações <strong>em</strong> diferentes frentes <strong>para</strong> ser<br />
erradicada.<br />
Greenhalgh, Kristjansson e Robinson 14 , <strong>em</strong> artigo publicado no<br />
British Medical Journal, corroboram essas afirmações e reforçam o fato<br />
de que<br />
[...] apesar de se verificar que os programas têm um efeito significativo<br />
no crescimento e no des<strong>em</strong>penho cognitivo, as pesquisas realizadas<br />
tiveram muitos desenhos diferentes e foram impl<strong>em</strong>entadas <strong>em</strong><br />
contextos sociais e sist<strong>em</strong>as educacionais variados, por pessoas das
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
251<br />
mais diferentes formações, culturas e crenças; e com uma ampla variação<br />
no ambiente econômico e contexto político.<br />
As autoras mostram que uma pesquisa realizada com o fornecimento de<br />
supl<strong>em</strong>entos à base de leite <strong>para</strong> estudantes na Grã-Bretanha <strong>em</strong> 1920,<br />
período de recessão, mostrou um efeito evidente sobre o crescimento<br />
das crianças. A mesma pesquisa, com o mesmo supl<strong>em</strong>ento a base de<br />
leite foi aplicada <strong>em</strong> crianças britânicas <strong>em</strong> 1970, quando não apresentou<br />
benefício significativo. 14<br />
Ainda que se reconheça a necessidade de avaliação mais detalhada<br />
a respeito dos impactos dos PAE sobre quesitos como peso, altura,<br />
desenvolvimento cognitivo e melhorias nutricionais <strong>em</strong> geral, é importante<br />
reconhecer que os impactos exist<strong>em</strong> e que os desenhos das políticas<br />
dev<strong>em</strong> ser suficientes <strong>para</strong> maximizar os efeitos positivos almejados<br />
pela alimentação escolar. Embora, existam evidências importantes de<br />
que a alimentação escolar promove impactos <strong>em</strong> termos de frequência<br />
e avanços nutricionais sobre o beneficiário, vale l<strong>em</strong>brar que, <strong>em</strong> muitos<br />
casos, uma boa alimentação escolar pode influenciar a mudança de hábitos<br />
alimentares da família, mas também pode acontecer de a alimentação<br />
na escola induzir uma redução das quantidades de alimentos servidos<br />
a essa criança <strong>em</strong> seu lar. 14<br />
O ESTADO DA ARTE DOS PAE NA AMÉRICA LATINA<br />
Na América Latina, os PAE já exist<strong>em</strong> há algumas décadas. O Uruguai<br />
possui o mais antigo, com o surgimento datado do começo do século<br />
XX, sendo que os d<strong>em</strong>ais pertenc<strong>em</strong> aos anos de 1950 e 1960. 15 Apesar<br />
do caráter pioneiro desses programas, a desnutrição ainda se apresenta<br />
com alta incidência na região, como um verdadeiro probl<strong>em</strong>a de saúde<br />
pública ainda não solucionado.<br />
Os eixos gerais perseguidos pelos PAE são o alívio da pobreza no<br />
curto prazo associado à melhoria nos níveis nutricionais e à manutenção<br />
das crianças na escola. Ao mesmo t<strong>em</strong>po, esses programas, <strong>para</strong>
252<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
ter<strong>em</strong> efetividade, d<strong>em</strong>andam fort<strong>em</strong>ente investimentos <strong>em</strong> infraestrutura<br />
(saneamento básico, energia elétrica, meios de transporte, etc.),<br />
além de ser<strong>em</strong> dependentes de uma coordenação institucional que pode<br />
estar nos âmbitos da sociedade civil, governo ou mesmo de organismos<br />
internacionais.<br />
Segundo a FAO 16 , os PAE são fundamentais <strong>para</strong> reduzir a pobreza,<br />
a desigualdade econômica e social, tendo <strong>em</strong> vista que:<br />
1. Provêm alimento seguro e sustentável aos menores <strong>em</strong> idade escolar. Incentivam<br />
maior participação das crianças na escola e auxiliam na redução<br />
do abandono escolar e das dificuldades de aprendizag<strong>em</strong>.<br />
2. Oferec<strong>em</strong> um percentual importante de calorias, proteínas e vitaminas<br />
que as crianças necessitam <strong>para</strong> obter melhor nutrição.<br />
3. Auxiliam a integração social e comunitária, contribuindo com a formação<br />
de capital social via participação de pais, professores e autoridades locais<br />
no processo de distribuição, armazenamento, preparo e entrega de<br />
alimentos.<br />
4. Oferec<strong>em</strong> oportunidade de aprendizag<strong>em</strong> e inovação pedagógica ao envolver<br />
diferentes atores no processo.<br />
5. Contribu<strong>em</strong> <strong>para</strong> mobilização de recursos locais por meio da compra de<br />
alimentos de pequenos produtores e utilização de recursos originários da<br />
comunidade.<br />
6. Promov<strong>em</strong> a inserção de crianças e indígenas na escola e na comunidade,<br />
integrando enfoques de gênero s<strong>em</strong> discriminação por raça.<br />
7. Nos casos <strong>em</strong> que estão associados aos programas de saúde, contribu<strong>em</strong><br />
<strong>para</strong> maior participação da comunidade <strong>em</strong> programas de saúde e<br />
nutrição.<br />
A respeito dessa lista, pod<strong>em</strong> ser acrescentados mais dois aspectos de<br />
grande importância <strong>para</strong> o desenvolvimento regional. Do ponto de vista<br />
econômico, os programas de alimentação escolar, quando desenhados<br />
<strong>para</strong> dinamizar a agricultura local, pod<strong>em</strong> permitir o fechamento do
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
253<br />
circuito de geração de renda e distribuição dos benefícios, promovendo<br />
o desenvolvimento local e evitando transbordamentos dessa renda <strong>para</strong><br />
outras localidades. Além disso, do ponto de vista do <strong>em</strong>poderamento,<br />
esses programas promov<strong>em</strong> a transparência nas relações de cidadania,<br />
aproximando o Poder Público dos pais de alunos e da sociedade civil organizada.<br />
Em resumo, a gestão local dos recursos da alimentação escolar<br />
reforça o sentimento de pertencimento comunitário.<br />
Na América Latina, os programas de alimentação escolar se generalizaram<br />
nos anos 1950, a partir de repasses de recursos e alimentos<br />
provenientes de programas da ajuda humanitária internacionais, como<br />
o programa PL 480 dos Estados Unidos. Segundo Levine 17 , a doação<br />
de alimentos tinha como objetivo reduzir o superávit de produção dos<br />
agricultores norte-americanos e já havia sido aplicada durante os anos<br />
1930 naquele país <strong>para</strong> garantir a alimentação escolar. Nos anos 1950, no<br />
contexto da Guerra Fria, visando a alimentar o Terceiro Mundo, o Congresso<br />
norte-americano aprovou a doação de alimentos como forma de<br />
conter os movimentos revolucionários que começavam a <strong>em</strong>ergir <strong>em</strong><br />
vários países da região. Milhares de toneladas de trigo, milho e leite <strong>em</strong><br />
pó foram enviadas aos países <strong>em</strong> desenvolvimento com nomes de sugestivos<br />
programas como Aliança <strong>para</strong> o Progresso e Alimentos <strong>para</strong> a Paz.<br />
Relatórios do governo Johnson, nos anos 1960, mencionados por Levine<br />
17 , indicam que os doadores praticamente nada sabiam acerca dos hábitos<br />
alimentares das populações que receberiam os alimentos doados.<br />
Em 1962, as Nações Unidas criaram o PMA, organismo voltado<br />
<strong>para</strong> o desenvolvimento de programas <strong>em</strong>ergenciais de doação. Em<br />
pouco t<strong>em</strong>po, o PMA passou a administrar uma parte importante dos<br />
excedentes norte-americanos, sendo que os Estados Unidos se transformaram<br />
no principal doador <strong>para</strong> a organização. Segundo Marchione<br />
18 , aproximadamente metade do que o PMA faz como doação atualmente<br />
v<strong>em</strong> dos Estados Unidos. Embora o PL 480 tenha um orçamento<br />
anual aprovado pelo Congresso, a ajuda alimentar norte-americana<br />
pode extrapolar esse total s<strong>em</strong>pre que houver excedentes agrícolas s<strong>em</strong>
254<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
colocação no mercado. 18 Os programas de alimentação escolar <strong>em</strong> boa<br />
parte da América Central foram estruturados com base nos excedentes<br />
norte-americanos, à s<strong>em</strong>elhança dos programas dos anos 1930 <strong>em</strong><br />
território norte-americano. Mais tarde, <strong>em</strong> 1946, os países da América<br />
Central passaram a se orientar no programa nacional norte-americano,<br />
após a institucionalização do National School Lunch Program nos Estados<br />
Unidos. 19 Posteriormente, esses programas foram transferidos <strong>para</strong><br />
a administração do PMA. Atualmente, o PMA sustenta programas de<br />
alimentação escolar <strong>em</strong> 74 países, atendendo 21,7 milhões de estudantes<br />
<strong>em</strong> 2005. H<br />
Conforme o documento “Programas de Alimentación Escolar en<br />
América Latina y el Caribe”, I pôde-se apreender que, dentre os países<br />
analisados, J o Brasil é o único que apresenta um desenho de PAE de caráter<br />
puramente universal, <strong>em</strong> que todas as crianças que frequentam escolas<br />
da rede pública nos níveis da pré-escola e educação primária receb<strong>em</strong><br />
refeições, cujo fornecimento t<strong>em</strong> frequência anual, <strong>em</strong>bora a lei<br />
garanta a alimentação <strong>para</strong> apenas os 200 dias letivos.<br />
Os d<strong>em</strong>ais países apresentam programas focalizados, seja no quesito<br />
renda ou <strong>em</strong> termos geográficos. Dessa maneira, apenas os grupos<br />
mais pobres ou de regiões escolhidas receb<strong>em</strong> a merenda escolar. Por<br />
ex<strong>em</strong>plo, a Bolívia focaliza seus programas <strong>em</strong> duas províncias, ao passo<br />
que a Colômbia focaliza o programa <strong>em</strong> áreas rurais e <strong>em</strong> localidades<br />
onde existe maior diversidade étnica. Outros países oferec<strong>em</strong> a merenda<br />
escolar por poucos dias durante um ano e, ao mesmo t<strong>em</strong>po, oferec<strong>em</strong><br />
exclusivamente o café da manhã ou almoço (quase não oferecendo<br />
ambos ao mesmo t<strong>em</strong>po), como é possível verificar no caso do Equador.<br />
O Chile, por sua vez, apresenta um programa de caráter universal<br />
<strong>em</strong> termos espaciais, mas restrito a partir da renda das famílias dos estudantes.<br />
Esse país parte de um programa de alimentação escolar com<br />
uma proposta universal, porém focado <strong>para</strong> que os estudantes de renda<br />
mais baixa obtenham acesso à alimentação. Esse programa é administrado<br />
de forma centralizada pela Junta Nacional de Auxílio Escolar e
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
255<br />
Becas (Junaeb), encarregada de fazer as compras da merenda e definir<br />
os beneficiários do programa.<br />
Conforme dados do inventário realizado pela rede de pesquisadores,<br />
<strong>em</strong>presas e gestores envolvidos na alimentação escolar com a<br />
América Latina, <strong>em</strong> dez<strong>em</strong>bro de 2005, entre os países latino-americanos,<br />
somente o Peru (além do Brasil) deixou de ter ajuda internacional<br />
<strong>para</strong> seus programas de alimentação escolar. Ao mesmo t<strong>em</strong>po,<br />
esse levantamento aponta que apenas o Brasil possui um programa<br />
de atendimento universal que funciona com recursos integrais originários<br />
de orçamentos públicos. Os d<strong>em</strong>ais países têm estratégias diferenciadas<br />
de focalização, as quais priorizam um ou mais critérios,<br />
como municípios com alto índice de pobreza, presença de escolas, locais<br />
onde os níveis de frequência escolar são baixos, áreas rurais e regiões<br />
com populações indígenas. Nos países que optaram pela focalização,<br />
a seleção dos beneficiários é feita por indicadores de pobreza<br />
e carências materiais. De modo geral, com<strong>para</strong>ndo-se a situação dos<br />
países na América Latina, os PAE alcançam uma cobertura <strong>em</strong> torno<br />
de 40% <strong>para</strong> alunos da pré-escola e ensino básico 6 , o que pode ser considerado<br />
muito baixo.<br />
A respeito dos programas internos de cada país, Abreu 20 apresentou<br />
uma classificação <strong>em</strong> três grupos de países da América Latina:<br />
aqueles com economias menos complexas, de baixa industrialização,<br />
onde não há tradição de intervenção do Estado na área social e a<br />
execução do programa de merenda escolar é focalizada e centralizada,<br />
existindo grande dependência externa, <strong>em</strong> que se enquadravam Bolívia,<br />
Equador, Peru, Nicarágua e Guat<strong>em</strong>ala; os países com economia<br />
mais desenvolvida, cujos ex<strong>em</strong>plos são a Colômbia e a Venezuela, além<br />
do Chile, onde a merenda ainda é administrada de forma altamente focalizada<br />
e centralizada, <strong>em</strong>bora com maior flexibilidade de gestão que<br />
os primeiros; e os países que, assim como o Brasil, possuíam já no momento<br />
do estudo economias mais diversificadas, com significativa industrialização,<br />
<strong>em</strong> que as políticas de alimentação escolar decorriam
256<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
de uma longa história de atuação do Estado na área social, caracterizando-se<br />
por baixo financiamento externo.<br />
Na América Latina, tornou-se praticamente unânime o estabelecimento<br />
do objetivo principal dos programas como sendo a equidade no<br />
sist<strong>em</strong>a educacional. O objetivo de equidade poderia ser alcançado a<br />
partir dos PAE, uma vez que estes contribu<strong>em</strong> <strong>para</strong> a melhoria no acesso,<br />
permanência e habilidades de aprendizag<strong>em</strong> dos escolares mais vulneráveis,<br />
b<strong>em</strong> como a garantia de suas necessidades nutricionais, particularmente<br />
de carências específicas (ferro, vitamina A, iodo e cálcio).<br />
Assim, esses alunos estariam <strong>em</strong> igualdade de condições com os outros<br />
escolares que se alimentam regularmente, desde que os programas se<br />
estabelecess<strong>em</strong> de forma regular e com um aporte alimentar significativo.<br />
Alguns países ainda dão ênfase à equidade de gênero; outros, como<br />
Bolívia e Colômbia, almejam o fortalecimento da pequena produção<br />
agrícola com a compra local; e outros, ainda, visam ao desenvolvimento<br />
de hortas escolares, como é o caso da Argentina.<br />
Em resumo, são poucos os países do mundo que possu<strong>em</strong> programas<br />
de merenda escolar de alcance verdadeiramente universal. Na América<br />
Latina, apenas três possu<strong>em</strong> programas de merenda escolar com<br />
expressão nacional e de grande cobertura: Brasil, Chile e Panamá. No<br />
Chile, entretanto, assim como nos Estados Unidos, a alimentação escolar<br />
não possui características universais, pois só está disponível <strong>para</strong> os<br />
alunos declarados ou considerados pobres. Nos d<strong>em</strong>ais países da América<br />
Latina, a merenda escolar não t<strong>em</strong> cobertura nacional – são programas<br />
localizados, não atend<strong>em</strong> todos os dias do ano letivo n<strong>em</strong> dispõ<strong>em</strong><br />
de fontes de financiamento fixas e constantes ao longo do t<strong>em</strong>po, baseadas<br />
<strong>em</strong> legislação.<br />
A seguir, encontra-se um quadro resumindo as características principais<br />
dos PAE <strong>em</strong> países da América Latina (Tabela 1).
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
257<br />
TABELA 1 Caracterização dos Programas de Alimentação Escolar na América Latina K,21<br />
PAÍS ANO DE<br />
INÍCIO<br />
FOCALI-<br />
ZADO/UNI-<br />
VERSAL<br />
ALUNOS<br />
BENEFICIA-<br />
DOS (10 3 )<br />
COBERTURA GASTO GASTO/DIA<br />
(US$ 10 6 ) 1L NO (US$)<br />
ANUAL POR ALU-<br />
TIPO DE<br />
ALIMENTOS<br />
DIAS/ANO<br />
Argentina 1964 F 1.978 Básica 75 0,15 Desjejum e<br />
almoço<br />
Bolívia 1996 F M 1.274 Básica 20,2 0,08 Desjejum S.I.<br />
Brasil<br />
1954 U 36.300 Pré-escolar e<br />
(2007) N básica<br />
Colômbia 1941 F 2.612 Pré-escolar e<br />
básica<br />
Costa Rica S.I. F 666 Pré-escolar e<br />
básica<br />
Chile 1964 U Q 2.835 Pré-escolar e<br />
básica<br />
1.232,2 O 0,17 Lanche ou<br />
almoço<br />
39,2 0,08 Desjejum, lanche<br />
e almoço<br />
20,9 0,3 Desjejum e<br />
almoço<br />
165,7 0,5 Desjejum e<br />
almoço<br />
Equador 1987 F 2.189 Básica 30,1 0,12 Desjejum e<br />
almoço<br />
Guat<strong>em</strong>ala 1956 F 2.706 Pré-escolar e<br />
básica<br />
200 dias<br />
200 dias<br />
142 P<br />
S.I.<br />
27,2 0,09 Lanche S.I.<br />
180 dias<br />
Parte do ano<br />
escolar R<br />
Honduras 1970 F 1.826 Básica 9,9 0,57 Desjejum 200 dias<br />
México 1960 F 18.351 Básica 286,4 0,26 Desjejum S.I.<br />
Nicarágua 1994 S F 938 Pré-escolar e<br />
básica<br />
4,9 0,06 Lanche S.I.<br />
(continua)
258<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
(continuação)<br />
Panamá T<br />
(2007)<br />
S.I. U 473 Básica 18,7 U 0,26 Leite,<br />
bolachas e<br />
almoço<br />
Paraguai S.I. F 1.384 Básica 5 0,05 Desjejum e<br />
almoço<br />
Peru 1950 V,22 F 4.508 Pré-escolar e<br />
básica<br />
75,4 0,13 Desjejum e<br />
almoço<br />
Uruguai 1910 F 405 Básica 16,6 0,39 Desjejum, lanche<br />
e almoço<br />
Venezuela S.I. F 5.427 Básica 55,8 0,38 Desjejum, lanche<br />
e almoço<br />
S.I.: s<strong>em</strong> informação.<br />
Fonte: Infante 23 e FAO. 24<br />
150 dias<br />
S.I.<br />
S.I.<br />
S.I.<br />
S.I.
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
259<br />
Acompanhando a situação dos PAE na América Latina, observam-<br />
-se alguns movimentos recentes que pod<strong>em</strong> alterar o quadro apresentado<br />
na tabela anterior. Há informações de que, no caso da Bolívia W , o governo<br />
haveria encaminhado uma lei que garantiria a universalização do<br />
PAE, a partir de 2007. Os recursos <strong>para</strong> o financiamento dessa expansão<br />
viriam das rendas decorrentes do aumento dos preços do gás natural extraído<br />
do solo boliviano. Entretanto, não há informação sobre os desdobramentos<br />
dessa lei e sobre seus impactos no período recente.<br />
No caso da Nicarágua, no ano de 1994, foi iniciado o Programa Integral<br />
de Nutrición Escolar X , o qual deu um caráter permanente com<br />
t<strong>em</strong>poralidade indefinida ao programa de alimentação escolar na Nicarágua.<br />
Este programa procura reunir os vários programas pulverizados<br />
existentes na Nicarágua, com objetivos que se ass<strong>em</strong>elhavam a este, os<br />
quais tiveram seu surgimento datado de 25 a 30 anos atrás.<br />
Recent<strong>em</strong>ente, no Uruguai, o governo anunciou uma diferenciação<br />
no tipo de alimentação servida por tipo de escola e região. A alimentação<br />
escolar teria oferta universal, mas, existiriam distinções. Y Em escolas<br />
rurais, todas as crianças receberiam almoço diário; nas escolas especiais,<br />
por sua vez, com jornada de oito horas diárias, todos os alunos<br />
receberiam desjejum, almoço e merenda; e nas escolas urbanas, o almoço<br />
seria servido de acordo com a d<strong>em</strong>anda.<br />
No Chile, entende-se que o PAE possui características de universalidade,<br />
pois seu acesso pode ser estendido a todas as crianças; porém<br />
existe um critério de seletividade apenas <strong>para</strong> aquelas carentes, identificadas<br />
por levantamentos do governo, as quais poderiam <strong>acessar</strong> a alimentação<br />
escolar, algo que não apareceu nas experiências do Panamá e<br />
do Brasil.<br />
O objetivo da Tabela 1 foi criar um breve panorama das ações <strong>para</strong><br />
alimentação escolar na América Latina, cujo objetivo maior foi descrever<br />
a situação de tais intervenções e corroborar com o objetivo deste capítulo,<br />
que foi apontar como as políticas de alimentação escolar exist<strong>em</strong>
260<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
<strong>em</strong> praticamente todos os países da região, mas têm sido pouco utilizadas<br />
como ferramenta <strong>para</strong> promover tanto melhorias nutricionais<br />
às crianças latino-americanas como <strong>para</strong> dinamização das economias<br />
locais.<br />
CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />
Este capítulo revisitou a literatura e as experiências latino-americanas<br />
sobre alimentação escolar, indicou que estas mostraram relações positivas<br />
entre os desenhos dos programas de alimentação escolar e seus possíveis<br />
resultados <strong>em</strong> termos de desenvolvimento cognitivo e fre quência<br />
escolar dos beneficiários e apresentou resultados sobre dinamização<br />
das economias locais. Considera-se que, a depender dos desenhos adotados<br />
pelos PAE, pode-se promover o dinamismo local e a estabilidade<br />
na renda dos pequenos agricultores, uma vez vinculados com a compra<br />
de alimentos da agricultura familiar <strong>para</strong> a merenda escolar.<br />
O artigo mostrou que a alimentação escolar é parte integrante dos<br />
programas de segurança alimentar desenvolvidos pelos países na América<br />
Latina, <strong>em</strong>bora n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre as refeições sejam <strong>em</strong> número e quantidade<br />
suficientes.<br />
Exist<strong>em</strong> muitos modelos de programas adaptados às realidades locais<br />
e restritos à capacidade financeira dos governos. Entretanto, <strong>para</strong><br />
enfrentamento da questão da pobreza e da fome na América Latina, é<br />
essencial que haja uma compl<strong>em</strong>entação de esforços entre as comunidades,<br />
entidades governamentais e agências multilaterais, de modo a avançar<br />
no sentido de melhorar os sist<strong>em</strong>as de educação, incluindo o apoio<br />
à saúde e à infraestrutura. Esse tipo de programa não pode depender de<br />
ajudas humanitárias ou doações de excedentes agrícolas de países desenvolvidos,<br />
como t<strong>em</strong> sido a prática nos últimos anos.<br />
Outro aspecto essencial dos PAE refere-se à sua gestão. A observação<br />
dos casos latino-americanos – que são majoritariamente focalizados<br />
– indicou que, nas situações nas quais esses programas foram<br />
implantados, de forma descentralizada no âmbito da região e geridos
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
261<br />
d<strong>em</strong>ocraticamente, foi possível atender de forma diferenciada aos diversos<br />
grupos sociais. Essas ações conseguiram promover a capacitação<br />
e a educação nutricional incorporando programas de saúde e nutrição e<br />
mantendo o respeito às tradições locais.<br />
O caso do PAE brasileiro t<strong>em</strong> sido usado como referência, especialmente<br />
na América Latina e Caribe, graças a seu desenho universal<br />
e descentralizado no âmbito do município, com aportes de recursos totalmente<br />
definidos por orçamento do Governo Federal, com perenidade<br />
garantida por lei. Outros países, como Panamá e Chile, também possu<strong>em</strong><br />
programas de abrangência nacional, <strong>em</strong>bora no caso do Chile sua<br />
ação seja direcionada <strong>para</strong> públicos específicos, ou seja, há um processo<br />
de seletividade na oferta do PAE.<br />
Neste momento, <strong>em</strong> que a alta dos preços dos alimentos se coloca<br />
como uma preocupação de todos os países, a alimentação escolar como<br />
uma política de atenção à alimentação aparece <strong>para</strong> a América Latina<br />
como crucial <strong>em</strong> diversos sentidos, seja <strong>para</strong> garantir um acesso mínimo<br />
das crianças à alimentação, melhorando sua nutrição, seja <strong>para</strong> dinamizar<br />
localmente os pequenos produtores. Ainda que não existam<br />
dados consolidados – apenas indicações – dos impactos da alimentação<br />
escolar sobre nutrição e rendimento escolar das crianças, é indicada a<br />
importância de se utilizar a alimentação escolar <strong>para</strong> aumentar os efeitos<br />
positivos sobre os três eixos que a política pode afetar: desenvolvimento<br />
local, frequência escolar e ampliação da segurança alimentar da<br />
população.<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
1. Comissão Econômica <strong>para</strong> a América Latina. Social panorama of Latin America,<br />
2007. Disponível: http://www.cepal.org/cgi-bin/getProd.asp?xml=/publicaciones<br />
/xml/9/30309/P30309.xml&xsl=/dds/tpl-i/p9f.xsl&base=/tpl-i/top-bottom.xsl.<br />
2. Chonchol J. Soberania Alimentar. Rev Estudos Avançados 2005; 19(55):33-48.<br />
3. Duke Center for International Development Sanford Institute of Public Policy<br />
Duke University. Review of WFP School Feeding Programs. School Feedings
262<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
Programs Ams in Latin America: a review of World Food Programme Interventions<br />
in Ecuador, Honduras and Bolivia. Final Report, 2005.<br />
4. Melgar-Quinomez HR, Nord M, Perez-Escamilla R, Segall-Correa AM. Psychometric<br />
properties of a modified US Household Food Security Survey Module.<br />
Brazil European Journal of Clinical Nutrition Campinas 2007:1-9.<br />
5. Food and Agriculture Organization. The state of Food Insecurity in the World,<br />
2006. Disponível: http://www.fao.org/docrep/009/a0750e/a0750e00.htm.<br />
6. Turpin ME. a alimentação escolar como vetor de desenvolvimento local e garantia<br />
da segurança alimentar. [Dissertação de Mestrado]. Campinas: Instituto<br />
de Economia, 2008.<br />
7. Gaventa J. Foreword. In: Cornwall A, Coelho VSP. Spaces for change? The politics<br />
of citizen participation in new d<strong>em</strong>ocratic arenas. Londres: Zed Books,<br />
2007.<br />
8. Kristjansson E, Petticrew M, MacDonald B, Krasevec J, Janzen L, Wells GA et<br />
al. School feeding for improving the physical and physichosocial health of disadvantaged<br />
el<strong>em</strong>entary school children. In: Cochrane Database Syst Rev, 2007.<br />
Disponível <strong>em</strong>: site: http://lib.bioinfo.pl/pmid:17253518.<br />
9. Allen LH, Gillespie SR. What works? A Review of the Efficacy and Effectiveness<br />
of Nutrition Interventions. Manila, Philippines: Asian Development Bank with<br />
UN ACC/ACN, 2001.<br />
10. Evinger M. Bias in meta-analysis detected by a simple graphical test. British<br />
Medical Journal 1997; 315:629-34.<br />
11. Rossi PH. Feeding the Poor – Assessing Federal Food Aid. Washignton: The<br />
AEI Press, 1998.<br />
12. World Food Programme. WFO head calls on leaders to support universal school<br />
feeding for world’s poor children. 2005. Disponível <strong>em</strong>: http://www.wfp.org/<br />
english/?ModuleID=137&Key=464 2005. Acesso <strong>em</strong>: 18/8/2008.<br />
13. Macintyre 1992 apud Greenlalgh, Kristjansson e Robinson 2007.<br />
14. Greenhalgh T, Kristjansson E, Robinson V. Realist review to understand the<br />
efficacy of school feeding programmes. 2007. Disponível <strong>em</strong>: http://resources.<br />
bmj.com/bmj/subscribers.
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
263<br />
15. Cohen E, Franco R. Evaluación de proyectos sociales. México: Siglo Veintiuno<br />
Editores, 2006.<br />
16. Food and Agriculture Organization. Programas de Alimentación Escolar en<br />
América Latina y el Caribe. 2007. mimeo.<br />
17. Levine S. School lunch politics: the surprising history of americas favorite welfare<br />
programe. New Jersey: Princeton University Press, 2008.<br />
18. Marchione TJ. Food Provide Througth US Government Emergency Food Aid<br />
Programs: Policies and Customs Governing their Formulation, Selection and<br />
Distribution. J Nutr 2002; 132:2104-11.<br />
19. Bickel GW, Andrews MS. A Evolução do Programa de Cupom Alimentação<br />
e a Mensuração da Fome dos Estados Unidos. In: Takagi M, Graziano da Silva<br />
J, Belik W. Combate à fome e à pobreza rural. São Paulo: Instituto Cidadania,<br />
2002. p.33-74.<br />
20. Abreu M. Alimentação escolar na América Latina: programas universais ou focalizados/políticas<br />
de descentralização. Disponível <strong>em</strong>: http://<strong>em</strong>aberto.inep.<br />
gov.br/index.php/<strong>em</strong>aberto/article/viewFile/1003/906. Acesso <strong>em</strong>: 25 ago 2008.<br />
21. Zepeda AON. Alimentación en las escuelas de América Latina. Recomendaciones<br />
<strong>para</strong> mejorar su efectividad. In: iniciativa alcsh – Working Paper N. 2008.<br />
Disponível <strong>em</strong>: www.rlc.fao.org/iniciativa/wps.htm.<br />
22. Martinez R. Hambre y desigualdad en los países andinos: la desnutrición y<br />
la vulnerabilidad alimentaria en Bolivia, Colombia, Ecuador y Perú. In: Série<br />
Políticas sociais 2005; 112.<br />
23. Infante R. Inventario de los Programas de Alimentación Escolar. Programa<br />
Mundial de Alimentos, 2005.<br />
24. FAO/RLC. Programas de Alimentación Escolar en América Latina y el Caribe<br />
Análisis y Recomendaciones <strong>para</strong> su Efectividad. 2007. (mimeo).
264<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
NOTAS<br />
A<br />
B<br />
C<br />
D<br />
E<br />
F<br />
Entende-se como um desenho mais avançado como PAE aquele que cont<strong>em</strong>pla a<br />
participação da comunidade nas decisões sobre a compra dos alimentos e sobre<br />
os cardápios definidos nas escolas. Em algumas localidades, esses programas de<br />
merenda inclu<strong>em</strong> as hortas escolares, o consumo de produtos orgânicos, os programas<br />
de educação alimentar nas escolas, etc.<br />
A Ebia foi adotada na Pesquisa sobre Amostra de Domicílios (PNAD) aplicada<br />
pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) <strong>em</strong> 2006. Essa escala<br />
está baseada nos estudos de K. Radimer da Universidade de Cornell nos Estados<br />
Unidos dos anos 1990. A escala de Radimer foi utilizada <strong>em</strong> diversos estudos<br />
patrocinados pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (conhecida<br />
como Household Food Security Survey Module – HFSSM), tendo sido aplicada,<br />
com adaptações e após validação, <strong>em</strong> várias comunidades na Venezuela, Colômbia,<br />
República Dominicana, México, Bolívia, Guat<strong>em</strong>ala, Brasil, Burkina Fasso,<br />
Gana, Malásia e Filipinas. 5<br />
A Public Law 480 foi aprovada <strong>em</strong> 1954 nos Estados Unidos e visava à compra de<br />
excedentes alimentares dos produtores <strong>para</strong> doação a países pobres. Internamente,<br />
a PL 480 representava um subsídio ao agricultor e uma forma de estabilizar os<br />
preços de mercado.<br />
Essa lei tornou os municípios unidades responsáveis pela oferta da alimentação<br />
escolar. Esse fato foi um divisor de águas, pois foi por meio dessa medida que se<br />
descentralizou a gestão da alimentação escolar no Brasil, colocando seus mais de<br />
5.000 municípios como responsáveis pela gestão e oferta da alimentação escolar.<br />
As informações sobre o Prêmio pod<strong>em</strong> ser verificadas no site: www.pr<strong>em</strong>iomerenda.org.br.<br />
Compra com doação simultânea e programa de compra do leite, ambos participam<br />
do PAA.<br />
G<br />
Dados de 1997-1998.<br />
H<br />
I<br />
Disponível <strong>em</strong>: http://www.wfp.org/food_aid/school_feeding/Docs/WFP%20<br />
SFfactsheet%20SP06.pdf.<br />
Pre<strong>para</strong>do <strong>para</strong> a o Escritório Regional da FAO <strong>para</strong> a América Latina e o Caribe,<br />
com participação dos autores durante o ano de 2007.
I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />
265<br />
J<br />
K<br />
L<br />
M<br />
N<br />
O<br />
P<br />
Q<br />
R<br />
S<br />
T<br />
Os países analisados pelo documento foram: Argentina, Bolívia, Brasil, Colômbia,<br />
Chile, Equador, Guat<strong>em</strong>ala, Honduras e México.<br />
Essa tabela baseou-se <strong>em</strong> estudo desenvolvido por Zepeda 21 e no material fornecido<br />
pela FAO: Programas de Alimentación Escolar en América Latina y el Caribe,<br />
documento da FAO. 16<br />
Do Governo Central, exceto Brasil, com estimativa de contribuição dos estados e<br />
municípios.<br />
Em artigo retirado do site http://www.oei.es/noticias/spip.php?article1303, t<strong>em</strong>-<br />
-se que a Bolívia promoverá a universalização do PAE. O artigo é datado de 5 de<br />
nov<strong>em</strong>bro 2007.<br />
Fonte PNAE – FNDE/MEC.<br />
Considerando-se o gasto de R$ 1,6 bilhão do Governo Federal com uma compl<strong>em</strong>entação<br />
integral desse valor, segundo a Lei, cumprida por apenas 50% dos municípios.<br />
Transformado <strong>em</strong> dólares ao câmbio médio de 2007 de R$ 1,9475/US$.<br />
Dados <strong>para</strong> 2006, informação retirada do documento: Programas de Alimentación<br />
Escolar en América Latina y el Caribe, documento da FAO. 16<br />
O programa é considerado universal porque qualquer aluno da rede de ensino do<br />
Chile t<strong>em</strong> direito de pedir a alimentação escolar. Entretanto, existe um critério<br />
de seletividade segundo o qual apenas os alunos carentes, com renda abaixo de<br />
determinado patamar, terão acesso à alimentação escolar. Portanto, o programa<br />
pode ser classificado como universal com critério de seletividade.<br />
O dado mais recente coloca a oferta de 88 dias de desjejum e 54 dias de almoço.<br />
Esse dado foi coletado <strong>para</strong> o ano de 2004, conforme documento da FAO: Programas<br />
de Alimentación Escolar en América Latina y el Caribe, documento da<br />
FAO. 16<br />
De acordo com o documento disponível <strong>em</strong>: http://<strong>em</strong>aberto.inep.gov.br/index.<br />
php/<strong>em</strong>aberto/article/viewFile/1010/912.<br />
Fonte: Meduca – Ministério de Educação do Panamá.<br />
U<br />
Média dos anos 2005 a 2007.<br />
V<br />
W<br />
Nasceu com ajuda da Usaid, via programa Alimentos <strong>para</strong> o Desenvolvimento,<br />
conforme documento de Martinez. 22<br />
Disponível <strong>em</strong>: http://www.oei.es/noticias/spip.php?article1303.
266<br />
JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />
X<br />
Y<br />
Disponível <strong>em</strong>: http://<strong>em</strong>aberto.inep.gov.br/index.php/<strong>em</strong>aberto/article/view<br />
File/1010/912.<br />
Disponível <strong>em</strong>: http://<strong>em</strong>aberto.inep.gov.br/index.php/<strong>em</strong>aberto/article/viewFile<br />
/1003/906.