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Sexualidade, Fecundidade e Programas de Saúde entre os Pankararu

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<strong>Sexualida<strong>de</strong></strong>, <strong>Fecundida<strong>de</strong></strong> e <strong>Programas</strong> <strong>de</strong><br />

Saú<strong>de</strong> <strong>entre</strong> <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> 1<br />

Renato Athias<br />

Núcleo <strong>de</strong> Pesquisas e Estud<strong>os</strong> sobre Etnicida<strong>de</strong><br />

Programa <strong>de</strong> Pós-Graduação em Antropologia<br />

Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Pernambuco<br />

A reprodução humana, as doenças associadas à reprodução biológica e suas<br />

repercussões sobre a saú<strong>de</strong> <strong>de</strong> homens e mulheres tem sido objeto <strong>de</strong> estud<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

diversas áreas do conhecimento. Mesmo assim, estud<strong>os</strong> relacionad<strong>os</strong> a esta temática,<br />

com um recorte nas questões étnicas, estão ainda iniciando, principalmente <strong>entre</strong> <strong>os</strong><br />

pov<strong>os</strong> indígenas <strong>de</strong> Pernambuco. Este trabalho 2 situa-se no campo da saú<strong>de</strong> indígena,<br />

que recentemente vem se formando como um campo disciplinar seja no âmbito da<br />

antropologia da saú<strong>de</strong>, seja n<strong>os</strong> espaç<strong>os</strong> da saú<strong>de</strong> pública ou coletiva. (Coimbra &<br />

Sant<strong>os</strong> 2000). Os aportes da epi<strong>de</strong>miologia, por exemplo, para a área da saú<strong>de</strong><br />

reprodutiva, datam <strong>de</strong> um período recente. Neste sentido, este texto procura construir<br />

um argumento sobre essa questão, em base a<strong>os</strong> dad<strong>os</strong> coletad<strong>os</strong> na área indígena<br />

<strong>Pankararu</strong>. Constitui-se, sobretudo <strong>de</strong> uma abordagem preliminar, longe, portanto <strong>de</strong><br />

propor um marco n<strong>os</strong> estud<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> reprodutiva <strong>entre</strong> as populações indígenas <strong>de</strong><br />

Pernambuco. Este trabalho po<strong>de</strong> ser visto como um texto exploratório visando ampliar<br />

<strong>os</strong> conheciment<strong>os</strong> nesta área, dando pistas para futur<strong>os</strong> estud<strong>os</strong>.<br />

Como <strong>os</strong> <strong>de</strong>mais nessa coletânea, este capítulo parte da premissa que existem<br />

estratégias <strong>de</strong> reprodução distintas em grup<strong>os</strong> sociais diferentes, e que estas estão<br />

baseadas na realida<strong>de</strong> social e ambientais on<strong>de</strong> esses grup<strong>os</strong> habitam. No caso d<strong>os</strong><br />

<strong>Pankararu</strong>, é um povo indígena do sertão pernambucano em contato com a socieda<strong>de</strong><br />

nacional há mais <strong>de</strong> e 500 an<strong>os</strong>. Os <strong>Pankararu</strong> estão estimad<strong>os</strong> em mais <strong>de</strong> 5.000<br />

indivídu<strong>os</strong> e vive numa área <strong>de</strong> terra <strong>de</strong> 14.290 hectares, próxima à margem esquerda<br />

do Rio São Francisco. Eles são confundid<strong>os</strong> com o restante da população do sertão,<br />

pois não falam mais sua língua, sendo o português a única língua <strong>de</strong> comunicação na<br />

área. Amb<strong>os</strong>, sertanej<strong>os</strong> e índi<strong>os</strong>, são <strong>de</strong>p<strong>os</strong>itári<strong>os</strong> <strong>de</strong> uma cultura, outrora<br />

completamente indígena, pois foram eles <strong>os</strong> primeir<strong>os</strong> a povoar esta região do semiárido.<br />

Com isso, a n<strong>os</strong>sa pesquisa m<strong>os</strong>tra que as estratégias <strong>de</strong> reprodução social<br />

estão relacionad<strong>os</strong> a dois element<strong>os</strong> significativ<strong>os</strong> presentes <strong>entre</strong> populações<br />

indígenas, habitantes do semi-árido pernambucano: a) a relação estrita com a<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> étnica e <strong>os</strong> process<strong>os</strong> <strong>de</strong> territorialização, e b) as questões da adaptabilida<strong>de</strong><br />

a um ec<strong>os</strong>sistema específico, neste caso à zona <strong>de</strong> caatinga do sertão pernambucano.<br />

Até que ponto estes element<strong>os</strong> <strong>de</strong>senvolvem um impacto na reprodução biológica e<br />

1<br />

Capítulo 4 do livro intitulado: Saú<strong>de</strong>, Sexo e Famílias Urbanas, Rurais e Indígenas em Pernambuco, organizado<br />

por Russell Parry Scott, Renato Athias e Marion Quadr<strong>os</strong>, Editora da UFPE, 2006.<br />

2 G<strong>os</strong>taria <strong>de</strong> agra<strong>de</strong>cer a leitura previa e <strong>os</strong> comentári<strong>os</strong> d<strong>os</strong> colegas Russell Parry Scott, Jean Langdon, Marion<br />

Quadr<strong>os</strong>, Márcia Longhi, Marina Machado e César Guimarães.


2<br />

social, bem como, no <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> uma sexualida<strong>de</strong>? Este trabalho preten<strong>de</strong><br />

oferecer element<strong>os</strong> sobre essas questões e articular resp<strong>os</strong>tas às questões sobre a saú<strong>de</strong><br />

reprodutiva <strong>entre</strong> <strong>os</strong> índi<strong>os</strong> habitantes do semi-árido pernambucano.<br />

Até recentemente <strong>os</strong> estud<strong>os</strong> sobre a reprodução e as estratégias <strong>de</strong> reprodução<br />

social, no âmbito da antropologia, eram vist<strong>os</strong> através <strong>de</strong> dois mo<strong>de</strong>l<strong>os</strong> analític<strong>os</strong>.<br />

Estas duas abordagens não conseguem articular o conjunto <strong>de</strong> relações socioculturais<br />

que proporciona a amplitu<strong>de</strong> e a complexida<strong>de</strong> das condições <strong>de</strong> reprodução e a<br />

manutenção <strong>de</strong> um grupo social. Essas abordagens, apesar <strong>de</strong> referirem, como<br />

element<strong>os</strong> importantes, <strong>os</strong> context<strong>os</strong> cultural e ecológico <strong>de</strong> inserção do grupo social,<br />

<strong>de</strong>ixam lacunas na análise, interpretação e representação das doenças do ciclo<br />

reprodutivo que estão relacionadas ao espaço on<strong>de</strong> as relações sociais reproduzem-se.<br />

Também não apontam efeit<strong>os</strong> e impact<strong>os</strong> do ec<strong>os</strong>sistema no ciclo natural da<br />

reprodução 3 . Durham (1982) critica o reducionismo contido neste tipo <strong>de</strong> análise. Ela<br />

diz: que falar da reprodução das condições <strong>de</strong> reprodução <strong>de</strong>ve ser muito mais amplo<br />

e complexo do que apontar a função familiar <strong>de</strong> reprodução da força <strong>de</strong> trabalho.<br />

Klaas Woortmann (1984) em seu trabalho, diz não mais consi<strong>de</strong>rar, o papel da família<br />

para a reprodução do capital, e sim perceber o significado da articulação <strong>entre</strong> <strong>os</strong><br />

chamad<strong>os</strong> setores informal e formal, pelo grupo doméstico, para a reprodução da<br />

família. Aqueles estud<strong>os</strong> apoiad<strong>os</strong> na tradição marxista enfatizando a reprodução das<br />

condições <strong>de</strong> produção e aqueles com base em mo<strong>de</strong>l<strong>os</strong> puramente <strong>de</strong>mográficobiológic<strong>os</strong>,<br />

<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um enfoque cultural.<br />

As pesquisas sobre a reprodução geralmente dão pouca ênfase a questões<br />

relacionadas ao meio ambiente e adaptação do grupo social a<strong>os</strong> aspect<strong>os</strong> ambientais e<br />

ecológic<strong>os</strong>, on<strong>de</strong> se po<strong>de</strong> perceber a interação <strong>entre</strong> populações e seus respectiv<strong>os</strong><br />

3 Outras abordagens sobre essa questão po<strong>de</strong>m ser encontradas no livro organizado por Simone Monteiro e Livio<br />

Sansone. (Org.). Etnicida<strong>de</strong> na América Latina: Um <strong>de</strong>bate sobre Raça, Saú<strong>de</strong> e Direit<strong>os</strong> Reprodutiv<strong>os</strong>. Rio<br />

<strong>de</strong> Janeiro: Editora Fiocruz, 2004.


3<br />

ec<strong>os</strong>sistemas. A interação <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada população a um ambiente específico<br />

agrega um número significativo <strong>de</strong> variáveis comportamentais que darão sustentação<br />

a presença e a manutenção <strong>de</strong>ste grupo social em um <strong>de</strong>terminado território. As<br />

interações <strong>entre</strong> população e <strong>os</strong> ec<strong>os</strong>sistemas são, portanto, as fontes primeiras que<br />

levam a uma construção <strong>de</strong> saberes específic<strong>os</strong>, a representação <strong>de</strong> valores, a<br />

<strong>de</strong>terminadas práticas culturais, a específicas categorias lingüísticas, a mo<strong>de</strong>l<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

adaptabilida<strong>de</strong> e as formas <strong>de</strong> organização social nas quais antropólog<strong>os</strong> e outr<strong>os</strong><br />

cientistas sociais procuram traduzir e interpretar <strong>os</strong> aspect<strong>os</strong> culturais advind<strong>os</strong> <strong>de</strong>ssas<br />

interações.<br />

Os trabalh<strong>os</strong> antropológic<strong>os</strong> que vão nessa direção apresentam duas maneiras<br />

<strong>de</strong> explicitar essa questão: uma a) apresentando <strong>os</strong> comportament<strong>os</strong> culturais como<br />

parte <strong>de</strong> um sistema que inclua <strong>os</strong> fenômen<strong>os</strong> ambientais, a outra b) m<strong>os</strong>trando que <strong>os</strong><br />

fenômen<strong>os</strong> ambientais são responsáveis e <strong>de</strong>terminam <strong>os</strong> comportament<strong>os</strong> culturais.<br />

Na realida<strong>de</strong>, essas duas abordagens não são contraditórias, ao contrário, estão interrelacionadas<br />

e são complementares. Nesse sentido, esse trabalho procura <strong>de</strong>monstrar<br />

como as formas <strong>de</strong> ‘adaptabilida<strong>de</strong>’ d<strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> no semi-árido estão inseridas em<br />

sistema mais amplo que regula as estratégias <strong>de</strong> manutenção e reprodução social.<br />

A pesquisa <strong>entre</strong> <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> procurou especificamente levantar a questão da<br />

representação das doenças e enten<strong>de</strong>r o itinerário terapêutico que <strong>os</strong> índi<strong>os</strong> utilizam na<br />

busca do próprio bem-estar e no auto cuidado. Tratou-se <strong>de</strong> um estudo 4 antropológico,<br />

no qual <strong>os</strong> pesquisadores visitaram as al<strong>de</strong>ias Brejo d<strong>os</strong> Padres, Saco d<strong>os</strong> Barr<strong>os</strong>,<br />

Espinheiro, Serrinha, Carrapateira e Tapera, por períod<strong>os</strong> <strong>de</strong> 3 a 7 dias em cada visita.<br />

Estes procuraram conviver com a população buscando uma interação em vistas a uma<br />

4 Esta pesquisa inicialmente recebeu apoio CNPq e FACEPE, fez interface com o NUSP/UFPE, e a equipe foi<br />

comp<strong>os</strong>ta por Renato Athias (Coor<strong>de</strong>nador), Marion Quadr<strong>os</strong>, Celane Camarão, Marcela Zamboni e Luzia<br />

Albuquerque, Polyana Benigno, Tainã El-Bacha, Juliana Lobo, Veridiana Camp<strong>os</strong>, Fernando Barb<strong>os</strong>a e Karina<br />

Leão Rodrigues do Departamento <strong>de</strong> Ciências Sociais da UFPE, em seguida a equipe incorporou ao projeto <strong>de</strong><br />

Pesquisa: Estil<strong>os</strong> Reprodutiv<strong>os</strong> e Organizações Representativas, financiado pelo CNPq e Fundação Ford, sob a<br />

coor<strong>de</strong>nação do Prof. Parry Scott


4<br />

melhor compreensão da representação das doenças do ciclo reprodutivo. Nesse<br />

sentido, foram realizadas 41 <strong>entre</strong>vistas com mulheres e homens através <strong>de</strong> um roteiro<br />

previamente elaborado e aplicado em pequen<strong>os</strong> grup<strong>os</strong> <strong>de</strong> discussão com mulheres. A<br />

realização duma oficina sobre saú<strong>de</strong> reprodutiva com <strong>os</strong> 21 agentes indígenas <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> e auxiliares <strong>de</strong> enfermagem <strong>Pankararu</strong>, no inicio da pesquisa, foi importante<br />

para enten<strong>de</strong>r como <strong>os</strong> programas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> são implantad<strong>os</strong> e <strong>de</strong>senvolvid<strong>os</strong> na área<br />

indígena. Durante esse período realizou-se um seminário <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Indígena<br />

<strong>Pankararu</strong> que contou com a participação <strong>de</strong> 61 pessoas, <strong>entre</strong> agentes <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>,<br />

li<strong>de</strong>ranças indígenas e profissionais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> que trabalham na área indígena, na<br />

Al<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Serrinha, em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1999 para fortalecer a participação comunitária<br />

na organização d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. A seleção das al<strong>de</strong>ias pankararu para realizar<br />

esta pesquisa <strong>de</strong> campo levou-n<strong>os</strong> a procurar informações e dad<strong>os</strong> sobre a organização<br />

social d<strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> na literatura existente e a investigar como está se dando na<br />

atualida<strong>de</strong>.<br />

Os <strong>Pankararu</strong><br />

A base da economia <strong>Pankararu</strong> é a agricultura <strong>de</strong>stacando-se como principais<br />

cultiv<strong>os</strong> o feijão, o milho e a mandioca, cujas sementes vem há an<strong>os</strong> processada e<br />

adaptadas às características do semi-árido. Existe também uma varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> frutas<br />

como a pinha, a banana, a goiaba, <strong>entre</strong> outras, que faz parte da organização da<br />

produção <strong>Pankararu</strong>. Esses produt<strong>os</strong> <strong>de</strong>stinam-se principalmente para o consumo<br />

interno e parte é comercializada nas feiras das cida<strong>de</strong>s vizinhas, tais como, Tacaratu,<br />

Petrolândia, Jatobá e Paulo Afonso. A partir <strong>de</strong> 2006 <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> criaram uma feira<br />

<strong>de</strong>ntro da área indígena (Brejo d<strong>os</strong> Padres) on<strong>de</strong> são comercializad<strong>os</strong> <strong>os</strong> principais<br />

produt<strong>os</strong> <strong>de</strong> consumo.<br />

O trabalho na agricultura é <strong>de</strong>senvolvido especificamente pelo núcleo familiar,<br />

não obstante existem outras formas da organização do trabalho, como por exemplo, o<br />

remunerado (assalariado) e o <strong>de</strong> “meia”, modalida<strong>de</strong> utilizada tanto para o plantio <strong>de</strong><br />

feijão como na fabricação da farinha <strong>de</strong> mandioca. Apesar <strong>de</strong> a Terra Indígena<br />

encontrar-se atualmente regularizada (isto é, com uma portaria do Ministério da<br />

Justiça para a <strong>de</strong>marcação) existe um grupo significativo <strong>de</strong> índi<strong>os</strong> que não p<strong>os</strong>suem<br />

terras, outr<strong>os</strong> têm apenas “roçad<strong>os</strong>” muito distantes do local <strong>de</strong> moradia, tendo que<br />

caminhar, muitas vezes, mais <strong>de</strong> duas horas para chegar ao local <strong>de</strong> trabalho, pois<br />

parte da área indígena ainda está sob o domínio <strong>de</strong> p<strong>os</strong>seir<strong>os</strong> não indígenas.<br />

Além <strong>de</strong>ssas ativida<strong>de</strong>s econômicas referidas acima, <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> p<strong>os</strong>suem<br />

animais doméstic<strong>os</strong> que se constituem <strong>de</strong> pequen<strong>os</strong> criatóri<strong>os</strong>. E por causa das<br />

inúmeras secas, que ocorrem <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1983, essa ativida<strong>de</strong> produtiva está processo <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>saparecimento, uma vez que esses animais adaptad<strong>os</strong> a região <strong>de</strong> serras e ao semiárido<br />

são difícil <strong>de</strong> serem encontrad<strong>os</strong>. Entre estas, se <strong>de</strong>staca a criação <strong>de</strong> galinhas,<br />

porc<strong>os</strong>, bo<strong>de</strong>s, cabras, carneir<strong>os</strong> e ovelhas, adaptad<strong>os</strong> as áreas <strong>de</strong> serras e contra-serras<br />

da área <strong>Pankararu</strong>. Para realizar o trabalho e o transporte <strong>de</strong> bens, as famílias p<strong>os</strong>suem<br />

burr<strong>os</strong>, jegues, jument<strong>os</strong>, caval<strong>os</strong>, ou éguas. Os animais doméstic<strong>os</strong> mais p<strong>os</strong>suíd<strong>os</strong><br />

pelas famílias são <strong>os</strong> cachorr<strong>os</strong>, gat<strong>os</strong> e pássar<strong>os</strong> em gaiolas.<br />

A produção artesanal não assume gran<strong>de</strong>s proporções na economia <strong>Pankararu</strong>.<br />

Essas ativida<strong>de</strong>s empregam mão-<strong>de</strong>-obra predominantemente feminina. A<br />

indumentária d<strong>os</strong> “Praiá” (saias chapéus, máscaras, usad<strong>os</strong> em cerimoniais),<br />

vassouras, sacolas, aban<strong>os</strong> e cestas são confeccionad<strong>os</strong> em palha <strong>de</strong> ouricuri e a fibra<br />

<strong>de</strong> caroá. Com a argila e barro confeccionam panelas, fogareir<strong>os</strong>, geralmente objet<strong>os</strong><br />

utilitári<strong>os</strong> para uso próprio ou comercializado pel<strong>os</strong> índi<strong>os</strong> nas diversas feiras. Uma<br />

pequena parcela d<strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> realiza um tipo <strong>de</strong> trabalho assalariado fora da al<strong>de</strong>ia.


Estes quase sempre são trabalh<strong>os</strong> que não requerem especialização. Atualmente com a<br />

implantação do Distrito Sanitário Especial Indígena <strong>os</strong> profissionais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong><br />

indígenas estão trabalhando com salário proveniente d<strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> da FUNASA, que<br />

juntamente com <strong>os</strong> professores indígenas formam o grupo <strong>de</strong> assalariad<strong>os</strong> que vivem e<br />

trabalham na área indígena, pois <strong>os</strong> outr<strong>os</strong> assalariad<strong>os</strong> trabalham fora da área<br />

indígena.<br />

A terra d<strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> situa-se <strong>entre</strong> as Serra Gran<strong>de</strong> e Serra da Borborema<br />

próxima às margens do rio São Francisco, <strong>entre</strong> <strong>os</strong> municípi<strong>os</strong> <strong>de</strong> Petrolândia,<br />

Tacaratu e Jatobá. Segundo perspectiva tradicional e corrente, o <strong>de</strong>senho da área seria<br />

um gran<strong>de</strong> circulo que tem por centro o cemitério do Brejo d<strong>os</strong> Padres, <strong>de</strong> on<strong>de</strong> parte<br />

uma linha <strong>de</strong> uma légua <strong>de</strong> raio. Esta área indígena encontra-se encravada n<strong>os</strong> três<br />

municípi<strong>os</strong> citad<strong>os</strong>. Ainda, em outra perspectiva, também segundo tradição oral,<br />

quatro léguas em quadro <strong>de</strong> terras foram concedidas, pelo imperador Pedro II, a<strong>os</strong><br />

<strong>Pankararu</strong>. Existem inúmer<strong>os</strong> registr<strong>os</strong> e citações em document<strong>os</strong> oficiais que<br />

confirmam a doação. Essa concessão <strong>de</strong> terras toma a igreja do al<strong>de</strong>amento como<br />

ponto central e projeta quatro linhas em cruz, para cada direção, <strong>de</strong> uma “légua <strong>de</strong><br />

sesmaria”, ou seja, 6.600m, totalizando dimensão <strong>de</strong> um quadrado <strong>de</strong><br />

aproximadamente 19.424ha. (ATLAS, 1993:38).<br />

Registr<strong>os</strong> sobre as terras d<strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> indicavam dois marc<strong>os</strong> geográfic<strong>os</strong>,<br />

consi<strong>de</strong>rad<strong>os</strong> sagrad<strong>os</strong> pel<strong>os</strong> índi<strong>os</strong>: as cachoeiras <strong>de</strong> Paulo Afonso e as <strong>de</strong> Itaparica.<br />

Além <strong>de</strong>sses, a Serra <strong>de</strong> Borborema é extremamente importante para orientação e<br />

histórias <strong>Pankararu</strong>, pois existem grutas e cavernas que se relacionam com <strong>os</strong><br />

Encantad<strong>os</strong>. Relat<strong>os</strong> <strong>de</strong> índi<strong>os</strong> mais velh<strong>os</strong> revelam um mito <strong>de</strong> que nas cachoeiras <strong>de</strong><br />

Itaparica, <strong>os</strong> ancestrais d<strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong>, teriam sucumbido a um dilúvio e as cachoeiras<br />

<strong>de</strong> Itaparica teriam aparecido no local exato do sepultamento <strong>de</strong> índi<strong>os</strong>, e<br />

p<strong>os</strong>teriormente transformado em cemitério cristão pel<strong>os</strong> missionári<strong>os</strong>. Atualmente<br />

esses locais encontram-se submers<strong>os</strong> pelo lago da barragem <strong>de</strong> Itaparica.<br />

É relevante a discussão acerca da territorialização, especificamente <strong>entre</strong> <strong>os</strong><br />

<strong>Pankararu</strong>, porque esta reflete, no sentido real, a capacida<strong>de</strong> que esse processo p<strong>os</strong>sui<br />

para assegurar a sobrevivência física e a continuida<strong>de</strong> étnica d<strong>os</strong> índi<strong>os</strong>.<br />

5


6<br />

Analisando a situação <strong>de</strong> intrusamento e d<strong>os</strong> conflit<strong>os</strong> das terras não será<br />

difícil compreen<strong>de</strong>r as razões das precárias condições <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, da carência alimentar,<br />

enfim, d<strong>os</strong> inúmer<strong>os</strong> problemas que atingem as populações indígenas na região. Além<br />

da insuficiência da terra <strong>de</strong>terminada pela ocupação e presença <strong>de</strong> p<strong>os</strong>seir<strong>os</strong> e projet<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong>senvolvimentistas, mesmo naquelas já regularizadas. Esse quadro é agravado pel<strong>os</strong><br />

períod<strong>os</strong> prolongad<strong>os</strong> <strong>de</strong> secas e estiagem que atingem a maioria das áreas,<br />

principalmente aquelas localizadas no sertão pernambucano. Por tod<strong>os</strong> estes<br />

problemas, <strong>os</strong> índi<strong>os</strong> ocupam as faixas <strong>de</strong> terras que restam e que é, geralmente, a<br />

mais difícil para uma agricultura.<br />

A insuficiência <strong>de</strong> terra tem estimulado ainda a migração <strong>de</strong> índi<strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong><br />

para cida<strong>de</strong>s como São Paulo. Na favela Real Parque 5 . Relatório da Secretaria do<br />

Menor do Estado <strong>de</strong> São Paulo (outubro <strong>de</strong> 1990) informava a existência, já naquela<br />

época, <strong>de</strong> 40 famílias e 80 crianças <strong>Pankararu</strong> morando na favela Real Parque,<br />

Morumbi on<strong>de</strong> vivem em precárias condições. Recentemente outro relatório da<br />

FUNAI apresentava o número <strong>de</strong>1000 pessoas.<br />

Os <strong>Pankararu</strong> se organizam basicamente <strong>de</strong> acordo a duas classificações: <strong>os</strong><br />

tronc<strong>os</strong> e as al<strong>de</strong>ias, ambas estão relacionad<strong>os</strong> com a organização das famílias<br />

<strong>Pankararu</strong>. Nesse sentido, a árvore está sendo vista como analogia. Eles se referem<br />

também a “raiz”, <strong>os</strong> “tronc<strong>os</strong>” ou “ramas”. Assim eles estão indicando uma<br />

classificação histórica do aparecimento e do pertencimento das famílias. Porém,<br />

quando se referem à “al<strong>de</strong>ia” estão utilizando o discurso e uma classificação espacial<br />

das famílias. Outra maneira <strong>de</strong> explicar essa espacialização, <strong>de</strong> acordo com o Seu João<br />

Páscoa, da Serrinha, seria verificar a linha. Pois, <strong>os</strong> “don<strong>os</strong> <strong>de</strong> barranco” <strong>entre</strong>gam<br />

uma linha <strong>de</strong> terra para o parceleiro. Esses segundo o Seu João <strong>de</strong> Páscoa, eram <strong>os</strong><br />

“linheir<strong>os</strong>” que vieram <strong>de</strong> fora e estavam associad<strong>os</strong> a<strong>os</strong> don<strong>os</strong> <strong>de</strong> barranc<strong>os</strong> e,<br />

portanto são estes que se misturam a<strong>os</strong> índi<strong>os</strong>. A classificação d<strong>os</strong> grup<strong>os</strong> <strong>de</strong> famílias<br />

5 O êxodo <strong>Pankararu</strong> começou no final d<strong>os</strong> an<strong>os</strong> cinqüenta, após a construção das barragens <strong>de</strong> Paulo Afonso e<br />

Itaparica. Apesar <strong>de</strong> suas terras terem sido <strong>de</strong>marcad<strong>os</strong> em 1939 (e já homologadas), divers<strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> se<br />

juntaram à orla <strong>de</strong> migrantes nor<strong>de</strong>stin<strong>os</strong> e vieram a São Paulo para trabalhar na construção civil. Juracilda Veiga e<br />

Moacir Sant<strong>os</strong> - Relatório sobre <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> <strong>de</strong> São Paulo, FUNAI, 2001


em diferentes status, através da sua ligação a “tronc<strong>os</strong>” familiares que se divi<strong>de</strong> <strong>entre</strong><br />

<strong>os</strong> antig<strong>os</strong> e <strong>os</strong> nov<strong>os</strong> apresentam a dinâmica <strong>de</strong> pertencimento ao grupo. Desta forma<br />

estão operando uma dicotomia básica <strong>entre</strong> aqueles <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> índi<strong>os</strong> “pur<strong>os</strong>” e<br />

<strong>os</strong> que <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>m <strong>de</strong> índi<strong>os</strong> “misturad<strong>os</strong>” ou “braiad<strong>os</strong>” (ou <strong>de</strong> linheir<strong>os</strong>), em<br />

referência a uma forma <strong>de</strong> organização que é mais histórica que estrutural, e que não<br />

correspon<strong>de</strong> a nenhuma segmentação, classes ou linhagens (Arruti 1997). Abaixo do<br />

tronco <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> localizam a família, que está diretamente vinculada ao convívio<br />

social cotidiano, relacionado a um praiá ou a um grupo <strong>de</strong> praiás. Praia é o nome<br />

genérico dado a<strong>os</strong> Encantad<strong>os</strong>, na realida<strong>de</strong>, é a representação física do Encantado<br />

nessa terra. Reconhece-se a vestimenta e <strong>os</strong> sinais das roupas <strong>de</strong> caroá. Cada um<br />

p<strong>os</strong>sui um nome, uma história, uma família que zela pela perpetuação e das relações<br />

com <strong>os</strong> outr<strong>os</strong> praiás e um terreiro. É este convívio que dá suporte para a <strong>de</strong>finição das<br />

opções políticas das famílias. Agrupam aquelas com as quais compartilham terras<br />

para plantar e a quem se pe<strong>de</strong> ajuda com quem se compartilha a comida e o trabalho<br />

da “farinhada”. A organização das famílias está diretamente ligada as relações com <strong>os</strong><br />

praiás e à disp<strong>os</strong>ição espacial das casas, que estão disp<strong>os</strong>tas segundo duas maneiras:<br />

agrupadas lado a lado ou em grup<strong>os</strong> <strong>de</strong> casas <strong>de</strong> uma mesma família, cuja disp<strong>os</strong>ição<br />

ten<strong>de</strong> à forma circular.<br />

Essa classificação não chega a pôr em risco a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> pankararu <strong>de</strong>ssas<br />

famílias <strong>de</strong> tronc<strong>os</strong> mais nov<strong>os</strong>, já que participam plenamente da divisão da terra, d<strong>os</strong><br />

rituais e da organização política. Também não chega a criar uma forma <strong>de</strong> organização<br />

da socieda<strong>de</strong>, que tenha repercussão sobre as relações cotidianas ou <strong>de</strong> parentesco, a<br />

não ser em ocasiões <strong>de</strong> disputas internas, quando po<strong>de</strong> ser usada para a faccionar e reclassificar<br />

alguém ou uma família. A distinção <strong>de</strong> famílias por tronco não é muito<br />

claro e surge como mais um objeto <strong>de</strong> op<strong>os</strong>ições internas. Portanto, uma família está<br />

diretamente vinculada ao convívio social diário <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> seu espaço na área indígena<br />

reconhecido por tod<strong>os</strong>. Quando agrupadas lado-a-lado, as famílias ten<strong>de</strong>m a dispor<br />

suas casas em linha reta ao longo das principais vias <strong>de</strong> acesso internas a área.<br />

Quando constroem em forma circular, o foco gravitacional é a casa do patriarca que,<br />

em geral, é “pai <strong>de</strong> Praiá” ou zeladores <strong>de</strong> Praiá, como também são chamad<strong>os</strong>,<br />

realizando em seu terreiro <strong>os</strong> Torés e “obrigações” e tornando-se assim referência<br />

religi<strong>os</strong>a para um círculo <strong>de</strong> vizinh<strong>os</strong> <strong>de</strong> extensão variável.<br />

As famílias mais extensas mantêm uma interação cotidiana mais intensa, com<br />

a p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> compartilhar da distribuição recurs<strong>os</strong> e prestígio. Estas também são<br />

referências para a administração do p<strong>os</strong>to indígena on<strong>de</strong> o “pai” ou patriarca da casa<br />

principal serve <strong>de</strong> interlocutor privilegiado, e muitas das vezes situam-se assume o<br />

papel <strong>de</strong> representar o interesse <strong>de</strong> tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong>. Esta interlocução lhe dá o<br />

status <strong>de</strong> li<strong>de</strong>rança.<br />

7


8<br />

<strong>Fecundida<strong>de</strong></strong> e <strong>Sexualida<strong>de</strong></strong><br />

De acordo com as informações censitárias existentes (Wong 1994) para a<br />

segunda meta<strong>de</strong> do século XX, o nor<strong>de</strong>ste foi a região que experimentou a maior<br />

queda da fecundida<strong>de</strong> em term<strong>os</strong> <strong>de</strong> númer<strong>os</strong> <strong>de</strong> filh<strong>os</strong>. Não existe uma pesquisa<br />

setorial sobre a fecundida<strong>de</strong> <strong>entre</strong> <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong>, porém nessas duas tabelas, exp<strong>os</strong>tas<br />

aqui, po<strong>de</strong>m<strong>os</strong> inferir alguns element<strong>os</strong> para esse <strong>de</strong>bate sobre a queda da fecundida<strong>de</strong><br />

no nor<strong>de</strong>ste e relacionar com as questões que envolvem a saú<strong>de</strong> reprodutiva <strong>entre</strong> <strong>os</strong><br />

<strong>Pankararu</strong>.<br />

Ao comparar essas duas tabelas (2000 e 2005) po<strong>de</strong>m<strong>os</strong> confirmar <strong>os</strong> dad<strong>os</strong><br />

sobre a redução d<strong>os</strong> índices <strong>de</strong> fecundida<strong>de</strong>. Na tabela II, po<strong>de</strong>-se ser perceber essa<br />

redução na faixa etária <strong>de</strong> 0-4 an<strong>os</strong>. Esse dado é importante para analisar o<br />

comportamento <strong>Pankararu</strong> com relação a fecundida<strong>de</strong> e parturição. A queda da<br />

fecundida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser vista principalmente através <strong>de</strong> mudanças comportamentais, no<br />

que diz respeito ao número <strong>de</strong> filh<strong>os</strong>.<br />

Tabela I - Dad<strong>os</strong> Censitári<strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong>, 2000. Fonte: SIASI/FUNASA


9<br />

An<strong>os</strong> 75=<<br />

Entre 70 e 74 an<strong>os</strong><br />

Entre 65 e 69 an<strong>os</strong><br />

Entre 60 e 64 an<strong>os</strong><br />

Entre 55 e 59 an<strong>os</strong><br />

Pop. Masculina<br />

Pop. Feminina<br />

Entre 50 e 54 an<strong>os</strong><br />

Entre 45 e 49 an<strong>os</strong><br />

Entre 40 e 44 an<strong>os</strong><br />

Entre 35 e 39 an<strong>os</strong><br />

Entre 30 e 34 an<strong>os</strong><br />

Entre 25 e 29 an<strong>os</strong><br />

Entre 20 e 24 an<strong>os</strong><br />

Entre 15 e 19 an<strong>os</strong><br />

Entre 10 e 14 an<strong>os</strong><br />

Entre 5 e 9 an<strong>os</strong><br />

Entre 0 e 4 an<strong>os</strong><br />

400 300 200 100 0 100 200 300 400<br />

Entre <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> não é mais o mesmo que n<strong>os</strong> an<strong>os</strong> anteriores. Isso foi<br />

também notado através da <strong>entre</strong>vistas realizadas na área. No entanto, como se trata <strong>de</strong><br />

informações censitárias <strong>de</strong> uma comunida<strong>de</strong> indígena, nas condições em que se<br />

encontram a situação, não se <strong>de</strong>scarta as dificulda<strong>de</strong>s na coleta.<br />

Percebe-se que houve uma significativa redução no número <strong>de</strong> nasciment<strong>os</strong><br />

nesses últim<strong>os</strong> 5 an<strong>os</strong>. Essa observação, <strong>de</strong> certa forma, po<strong>de</strong> estar associada a queda<br />

da fecundida<strong>de</strong> que Wong (1994) se refere em term<strong>os</strong> <strong>de</strong> Brasil, ou seja, essa redução<br />

se <strong>de</strong>u basicamente n<strong>os</strong> an<strong>os</strong> 80 para toda a região nor<strong>de</strong>ste, e que agora estaria tendo<br />

um impacto nas áreas indígenas do sertão <strong>de</strong> Pernambuco, <strong>de</strong> acordo com n<strong>os</strong>sas<br />

observações. Demograficamente essa mudança é significativa, pois significa que o<br />

padrão do número <strong>de</strong> filh<strong>os</strong> está tendo uma intervenção por parte <strong>de</strong> uma população<br />

sexualmente ativa. E aca<strong>de</strong>micamente esse <strong>de</strong>bate interessa antropologia.<br />

Outra questão que chama à atenção na tabela I (2000) é que as mulheres na<br />

faixa etária <strong>de</strong> 25 a 29 an<strong>os</strong>, que estão no mesmo número que <strong>os</strong> homens, continuam<br />

na mesma proporção até a faixa etária <strong>de</strong> 35 a 39, quando <strong>os</strong> homens são<br />

ultrapassad<strong>os</strong> pelas mulheres. Em outras palavras, esses dad<strong>os</strong> revelam que existem<br />

mais mulheres na área indígena, <strong>de</strong>ssa geração. Será que <strong>os</strong> homens <strong>de</strong>ssa faixa etária<br />

migraram para outras regiões para morar fora? Isto confirma o que as mulheres falam<br />

nas <strong>entre</strong>vistas - que <strong>os</strong> homens fazem parte essencialmente da população <strong>Pankararu</strong><br />

que migrou. Na tabela II (2005), cinco an<strong>os</strong> após, percebe-se que a saída <strong>de</strong> homens<br />

da al<strong>de</strong>ia não é mais significativa, como foi no passado, dando a enten<strong>de</strong>r que a<br />

migração para <strong>os</strong> outr<strong>os</strong> centr<strong>os</strong> não faz parte <strong>de</strong> uma prática atual.


10<br />

Esses dad<strong>os</strong> populacionais colocam em evidência, e isso já fez parte <strong>de</strong> vári<strong>os</strong><br />

estud<strong>os</strong> sobre a fecundida<strong>de</strong> <strong>entre</strong> as populações do nor<strong>de</strong>ste, a transição da<br />

fecundida<strong>de</strong> 6 . Os referid<strong>os</strong> estud<strong>os</strong> revelam que é muito provável que esse processo<br />

tenha sido iniciado pelas elites nor<strong>de</strong>stinas, há alguns <strong>de</strong>cêni<strong>os</strong> antes, e que agora<br />

po<strong>de</strong> ser observado <strong>entre</strong> a população indígena do sertão. Em trabalh<strong>os</strong> anteriores<br />

(Athias 2004) tem<strong>os</strong> caracterizado as famílias <strong>Pankararu</strong> tradicionalmente, com uma<br />

prole numer<strong>os</strong>a, pois c<strong>os</strong>tumam ter em média 4 a 5 filh<strong>os</strong>, dad<strong>os</strong> que po<strong>de</strong>m ser<br />

evi<strong>de</strong>nciad<strong>os</strong> através da pesquisa qualitativa. As mulheres na faixa etária d<strong>os</strong> 20 a 24<br />

an<strong>os</strong>, não querem ter o mesmo número <strong>de</strong> filh<strong>os</strong> que suas mães. Essa informação é<br />

recorrente nas <strong>entre</strong>vistas realizadas. E nessas duas tabelas parecem n<strong>os</strong> confirmar<br />

essa realida<strong>de</strong>. Ou então po<strong>de</strong>m<strong>os</strong> também <strong>de</strong>duzir que o índice <strong>de</strong> mortalida<strong>de</strong><br />

infantil continua ainda muito alto. E esse dado tem uma importância fundamental<br />

para a construção da sexualida<strong>de</strong> <strong>Pankararu</strong>.<br />

Um outro elemento a ser consi<strong>de</strong>rado está vinculado a mudança<br />

comportamental, que <strong>os</strong> pesquisadores citad<strong>os</strong> dizem existir no nor<strong>de</strong>ste como um<br />

todo, associando, sobretudo, ao nível <strong>de</strong> escolarização das mulheres das gerações<br />

recentes. Ou seja, quanto maior for a escolarida<strong>de</strong> menor é o numero <strong>de</strong> filh<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong>sejado. Aliás, essa questão já fez parte também <strong>de</strong> estud<strong>os</strong> populacionais no<br />

nor<strong>de</strong>ste 7 . O que se coaduna com a realida<strong>de</strong> <strong>Pankararu</strong>, uma vez que o as mulheres<br />

<strong>de</strong>ssas faixas etárias, passaram por escolas municipais, o que não ocorreu com a<br />

geração <strong>de</strong> suas mães. No entanto, percebeu-se na pesquisa qualitativa, que ainda está<br />

presente um forte direcionamento, por parte d<strong>os</strong> pais com relação ao número i<strong>de</strong>al <strong>de</strong><br />

filh<strong>os</strong> para o casal. Pois, ainda se percebe, <strong>entre</strong> <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong>, a imagem <strong>de</strong> que uma<br />

família com um número gran<strong>de</strong> <strong>de</strong> filh<strong>os</strong> é bem vinda e, sobretudo, por que não só<br />

6 Conferir, por exemplo, <strong>os</strong> trabalh<strong>os</strong> <strong>de</strong> Carvalho (1990)<br />

7 Veja por exemplo a argumentação apresentada no trabalho <strong>de</strong> J<strong>os</strong>é Eustáquio Alves (1994).


consolida o casamento, mas também as alianças <strong>entre</strong> as famílias, tendo em vista a<br />

realida<strong>de</strong> da distribuição espacial e a territorialida<strong>de</strong>. Uma <strong>de</strong> n<strong>os</strong>sas conclusões nessa<br />

pesquisa é <strong>de</strong> que o número <strong>de</strong> filh<strong>os</strong> também está fortemente associado ao controle<br />

d<strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> ambientais da Terra Indígena <strong>Pankararu</strong> e que existe uma mudança<br />

significativa no número i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> filh<strong>os</strong> com um impacto na sexualida<strong>de</strong> vivenciada<br />

pel<strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong>.<br />

Esses dad<strong>os</strong> apresentad<strong>os</strong> nessas duas tabelas apresentam uma <strong>de</strong>sproporção<br />

na base da pirâmi<strong>de</strong>, e isso n<strong>os</strong> leva a refletir também sobre uma outra questão<br />

também importante para enten<strong>de</strong>r o <strong>de</strong>senvolvimento da sexualida<strong>de</strong> <strong>entre</strong> <strong>os</strong><br />

<strong>Pankararu</strong>: as mulheres estão utilizando muito mais as práticas anticoncepcionais para<br />

gerenciar <strong>os</strong> nasciment<strong>os</strong> que as gerações <strong>de</strong> suas mães. Esse é um forte indício que<br />

vem a partir da pesquisa que <strong>de</strong>senvolvem<strong>os</strong> na área em 2001. Mesmo que também se<br />

p<strong>os</strong>sa associar a escolarização é importante na negociação <strong>entre</strong> <strong>os</strong> casais para o<br />

<strong>de</strong>bate do número <strong>de</strong> filh<strong>os</strong> i<strong>de</strong>al.<br />

Essa também é outra questão <strong>de</strong> um <strong>de</strong>bate extremamente atual na área<br />

indígena. O numero i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> filh<strong>os</strong>? Que tem a ver com à negociação do casal em<br />

relação a sua prole. Essa discussão está associada o que <strong>os</strong> estudi<strong>os</strong><strong>os</strong> da questão<br />

chamam <strong>de</strong> preferências reprodutivas concluindo sobre o impacto da fecundida<strong>de</strong> em<br />

grup<strong>os</strong> sociais. E nesse sentido o processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão sobre a fecundida<strong>de</strong> interfere<br />

nas preferências reprodutivas e n<strong>os</strong> fornecem element<strong>os</strong> para discutir as relações <strong>de</strong><br />

gêner<strong>os</strong> <strong>entre</strong> <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong>. N<strong>os</strong>so trabalho a também aponta para a situação d<strong>os</strong><br />

recurs<strong>os</strong> ambientais como um d<strong>os</strong> fatores que influenciam nesse <strong>de</strong>bate. Durante as<br />

oficinas <strong>entre</strong> <strong>os</strong> homens e mulheres realizad<strong>os</strong> <strong>entre</strong> <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> po<strong>de</strong>-se perceber<br />

através d<strong>os</strong> <strong>de</strong>poiment<strong>os</strong> que as mulheres e homens recém casad<strong>os</strong> p<strong>os</strong>suem uma<br />

outra forma <strong>de</strong> comunicar-se diferentemente daquelas <strong>de</strong> seus pais. Nesse sentido, a<br />

comunicação <strong>entre</strong> o casal po<strong>de</strong> ser um d<strong>os</strong> mecanism<strong>os</strong> mais eficazes <strong>de</strong> conciliação<br />

das diferenças <strong>entre</strong> o numero <strong>de</strong> filh<strong>os</strong> consi<strong>de</strong>rado i<strong>de</strong>al.<br />

11


12<br />

Por outro lado tivem<strong>os</strong> noticias que as maternida<strong>de</strong>s (n<strong>os</strong> finais d<strong>os</strong> an<strong>os</strong> 80)<br />

no sertão estavam promovendo ligaduras <strong>de</strong> trompa, sem muitas vezes a <strong>de</strong>vida<br />

autorização da parturiente. Que impacto esta estratégia <strong>de</strong> planejamento familiar<br />

inci<strong>de</strong> sobre a sexualida<strong>de</strong> <strong>entre</strong> <strong>Pankararu</strong>. Escutam<strong>os</strong> <strong>de</strong> mulheres <strong>Pankararu</strong> que<br />

foram incentivadas a realizarem a ligadura, uma vez que elas já tinham número <strong>de</strong><br />

filh<strong>os</strong> consi<strong>de</strong>rad<strong>os</strong> i<strong>de</strong>al pel<strong>os</strong> profissionais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, nesse caso <strong>os</strong> médic<strong>os</strong>. Não n<strong>os</strong><br />

interessa entrar nessa questão específica, <strong>de</strong> esterilização, mas simplesmente colocá-la<br />

como uma das p<strong>os</strong>síveis explicações para sobre o número <strong>de</strong> nasciment<strong>os</strong> express<strong>os</strong><br />

na base da pirâmi<strong>de</strong> <strong>de</strong> 2005. Elisabeth Meloni Vieira (1994) diz que <strong>os</strong> médic<strong>os</strong>, nas<br />

maternida<strong>de</strong>s, ocuparam um papel importante nessa estratégia, e que o aumento da<br />

esterilização no Brasil segue o exemplo <strong>de</strong> vári<strong>os</strong> países on<strong>de</strong> ela se tornou mais<br />

prevalente a partir da década <strong>de</strong> 80, como n<strong>os</strong> EUA e ainda em alguns Estad<strong>os</strong> do<br />

nor<strong>de</strong>ste on<strong>de</strong> a esterilização grátis atinge índices maiores que 50% baseando-se n<strong>os</strong><br />

dad<strong>os</strong> <strong>de</strong> Oliveira & Simões (1988).<br />

Uma outra hipótese, que não se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser colocada, é que esteja<br />

ocorrendo sub-notificação <strong>de</strong> nasciment<strong>os</strong> na área indígena <strong>Pankararu</strong>. Porém tendo<br />

em vistas <strong>os</strong> dad<strong>os</strong> qualitativ<strong>os</strong> da pesquisa acredita-se que o comportamento d<strong>os</strong><br />

<strong>Pankararu</strong> com relação ao número i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> filh<strong>os</strong> esteja realmente em processo <strong>de</strong><br />

mudar. Por outro lado, esses dad<strong>os</strong> reforçam a tese <strong>de</strong> Wong que no nor<strong>de</strong>ste do Brasil<br />

a queda da fecundida<strong>de</strong> é um fato e que já se po<strong>de</strong> pensar em transição da fecundida<strong>de</strong><br />

para o Brasil.<br />

Tabela II – Dad<strong>os</strong> Censitári<strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> – 2005 – Fonte: SIASI/FUNASA<br />

An<strong>os</strong> 75=<<br />

Entre 70 e 74 an<strong>os</strong><br />

Entre 65 e 69 an<strong>os</strong><br />

Entre 60 e 64 an<strong>os</strong><br />

Entre 55 e 59 an<strong>os</strong><br />

Pop. Masculina<br />

Pop. Feminina<br />

Entre 50 e 54 an<strong>os</strong><br />

Entre 45 e 49 an<strong>os</strong><br />

Entre 40 e 44 an<strong>os</strong><br />

Entre 35 e 39 an<strong>os</strong><br />

Entre 30 e 34 an<strong>os</strong><br />

Entre 25 e 29 an<strong>os</strong><br />

Entre 20 e 24 an<strong>os</strong><br />

Entre 15 e 19 an<strong>os</strong><br />

Entre 10 e 14 an<strong>os</strong><br />

Entre 5 e 9 an<strong>os</strong><br />

Entre 0 e 4 an<strong>os</strong><br />

500 400 300 200 100 0 100 200 300 400 500


13<br />

Tradição e Cura<br />

Os dad<strong>os</strong> sobre fecundida<strong>de</strong> precisam ser complementad<strong>os</strong> por uma<br />

compreensão mais completa da cultura na qual se estabelecem as relações <strong>de</strong><br />

parentesco <strong>entre</strong> <strong>os</strong> membr<strong>os</strong> da etnia. De acordo com as informações, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1930 até<br />

a presente data, ocorreram mudanças significativas na área <strong>Pankararu</strong> que provocaram<br />

um profundo impacto na organização social, no sistema <strong>de</strong> parentesco e na construção<br />

<strong>de</strong> sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> étnica. Essas mudanças têm a ver com reorganização espacial e a<br />

criação do lago <strong>de</strong> Itaparica, provocando a submersão das cachoeiras, lugar mítico d<strong>os</strong><br />

<strong>Pankararu</strong>. Também estão relacionadas à luta pela <strong>de</strong>marcação das terras indígenas,<br />

ainda em andamento.<br />

As manifestações culturais e religi<strong>os</strong>as d<strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> apresentam uma relação<br />

com a saú<strong>de</strong> e as práticas tradicionais <strong>de</strong> cura. Principalmente àquelas relacionadas à<br />

cura pela medicina indígena que estão completamente envolvidas com o que eles<br />

<strong>de</strong>nominam <strong>de</strong> encantad<strong>os</strong>. Estes são entida<strong>de</strong>s que se manifestam nas práticas <strong>de</strong><br />

cura e são reverenciad<strong>os</strong> em festas tradicionais, juntamente com a dança do Toré e a<br />

bebida feita da jurema. Os encantad<strong>os</strong>, na realida<strong>de</strong>, são <strong>os</strong> espírit<strong>os</strong> protetores <strong>de</strong>ssa<br />

terra, pertencentes ao mundo d<strong>os</strong> heróis mític<strong>os</strong>. Os <strong>Pankararu</strong> po<strong>de</strong>m localizá-l<strong>os</strong><br />

como moradores das serras (estão nas cavernas alguns dizem), no rio e nas cachoeiras.<br />

Eles comunicam com este mundo através das manifestações d<strong>os</strong> praiás e homens<br />

iniciad<strong>os</strong> que po<strong>de</strong>m servir <strong>de</strong> intermediári<strong>os</strong> <strong>entre</strong> o mundo d<strong>os</strong> encantad<strong>os</strong> e o<br />

mundo real. Os praiás se apresentam com uma vestimenta que <strong>os</strong> cobrem da cabeça<br />

a<strong>os</strong> pés (a única parte visível do corpo) confeccionada com a fibra do caroá da família<br />

das bromeliáceas (Neoglaziovia variegata) uma palmeira existente no sertão, muito<br />

utilizada no artesanato.<br />

Na celebração do Menino-no-Rancho, uma das principais festas d<strong>os</strong><br />

<strong>Pankararu</strong>, há uma intensa interação <strong>entre</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, ec<strong>os</strong>sistema, saú<strong>de</strong> e doenças do<br />

ciclo reprodutivo. Essa celebração não tem uma data fixa para sua realização,<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo exclusivamente do pai <strong>de</strong> um menino. Está associada a uma cura<br />

específica, po<strong>de</strong>ndo ainda ser vista como um ato <strong>de</strong> iniciação para <strong>os</strong> menin<strong>os</strong>. Há<br />

muito orgulho <strong>de</strong> um <strong>Pankararu</strong> ao se referir que ele foi "colocado" no rancho. Esta<br />

festa também está associada a procura da noiva, pois, durante a celebração, o menino<br />

é apresentado a uma menina que participa da festa. E esta menina é chamada <strong>de</strong><br />

noiva do menino do rancho. Nesta celebração, <strong>os</strong> praiás dançando no terreiro<br />

procuram pegar o menino e este é <strong>de</strong>fendido pel<strong>os</strong> seus padrinh<strong>os</strong>, gerando, uma luta<br />

física <strong>entre</strong> praiás e padrinh<strong>os</strong>. Quanto maior for o número <strong>de</strong> padrinh<strong>os</strong>, menor será a<br />

p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> d<strong>os</strong> praiás reterem o menino. Essa festa também po<strong>de</strong> estar relacionada<br />

ao pagamento <strong>de</strong> uma “promessa” associada à cura <strong>de</strong> doenças da infância: diarréia,<br />

sarampo, caxumba, catapora, pneumonia, verme e dor <strong>de</strong> cabeça, todas i<strong>de</strong>ntificadas<br />

como doenças do ciclo reprodutivo. Nesse sentido, o <strong>de</strong>smatamento aparece como um<br />

fato ameaçador para a saú<strong>de</strong> reprodutiva, pois <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> acreditam que o<br />

<strong>de</strong>smatamento tem afastado o encanto e <strong>os</strong> encantad<strong>os</strong>.


Estão fortemente presentes na cultura <strong>Pankararu</strong> <strong>os</strong> curadores e benze<strong>de</strong>iras,<br />

que são <strong>os</strong> primeir<strong>os</strong> a serem procurad<strong>os</strong> para tratar as doenças e mal-estar. Estes<br />

dominam o conhecimento específico das ervas que curam e alguns representando <strong>os</strong><br />

“encantad<strong>os</strong>”, para realizar a cura. Por uma mesa <strong>de</strong> cura e um trabalho <strong>de</strong> cura<br />

realizado por especialistas que tem po<strong>de</strong>res <strong>de</strong> se comunicar com a ‘força encantada’.<br />

A noção <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>entre</strong> <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> está <strong>de</strong>finida como sendo principalmente<br />

a “falta <strong>de</strong> doenças” e a relação que estes mantém com <strong>os</strong> “encantad<strong>os</strong>” <strong>de</strong>termina o<br />

equilíbrio do próprio corpo e consequentemente do bem estar. A maioria d<strong>os</strong><br />

<strong>Pankararu</strong> procura <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> da biomedicina, tal como estão implantad<strong>os</strong><br />

na área indígenas bem como buscam soluções no sistema médico tradicional através<br />

<strong>de</strong> pessoas que são referidas como tal. Pô<strong>de</strong>-se verificar esse itinerário em todas as<br />

al<strong>de</strong>ias em que a pesquisa foi realizada, que <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> além <strong>de</strong> procurar <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong><br />

médic<strong>os</strong> existentes, utilizam <strong>os</strong> remédi<strong>os</strong> prescrit<strong>os</strong> por benze<strong>de</strong>iras e curadores. Em<br />

muit<strong>os</strong> cas<strong>os</strong> o uso da medicina tradicional se apresentou como complementar à<br />

biomedicina. A pesquisa não tem dad<strong>os</strong> suficientes para i<strong>de</strong>ntificar quais são as<br />

doenças em que <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> apenas procuram <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> do sistema tradicional e<br />

quais as doenças que apenas <strong>os</strong> curadores e benze<strong>de</strong>iras tratam. No entanto, po<strong>de</strong>-se<br />

perceber que há uma distinção do tipo <strong>de</strong> ajuda e a ênfase em que se dá a busca <strong>de</strong><br />

remédi<strong>os</strong> com <strong>os</strong> curadores. No que se refere às doenças do ciclo reprodutivo,<br />

rotulada <strong>entre</strong> <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> como sendo “doenças <strong>de</strong> mulher” as palavras do curador e<br />

benze<strong>de</strong>ira são muito mais aceitas do que <strong>os</strong> remédi<strong>os</strong> oferecid<strong>os</strong> pela biomedicina.<br />

Parece existir uma crença maior na medicina indígena, n<strong>os</strong> remédi<strong>os</strong> para cura<br />

das doenças sexualmente transmitidas, oferecid<strong>os</strong> pel<strong>os</strong> curadores que n<strong>os</strong> remédi<strong>os</strong><br />

da farmácia. Há uma enorme lista <strong>de</strong> chás e garrafadas <strong>de</strong> domínio comum <strong>entre</strong> <strong>os</strong><br />

<strong>Pankararu</strong>. Isso po<strong>de</strong> também ser explicado que essas doenças são men<strong>os</strong> divulgadas e<br />

o paciente no caso, procura escon<strong>de</strong>r, pois dificilmente eles ou elas relatam em suas<br />

histórias clínicas para o médico ou outr<strong>os</strong> agentes.<br />

14


Quando comparam<strong>os</strong> as práticas da medicina indígena e da biomedicina,<br />

percebem<strong>os</strong> que <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> p<strong>os</strong>suem conheciment<strong>os</strong> aprimorad<strong>os</strong>: sobre o parto<br />

(dietas, parto <strong>de</strong> cócoras, acompanhamento <strong>de</strong> parteiras, contato intenso com <strong>os</strong><br />

familiares na casa, rezas, encantament<strong>os</strong>), contracepção (chás, banh<strong>os</strong> e assei<strong>os</strong> com<br />

raízes e ervas locais), prevenção e pré-natal (banh<strong>os</strong> e assei<strong>os</strong> com raízes e ervas<br />

locais, rezas e encantament<strong>os</strong>), que são praticadas no dia-a-dia nas al<strong>de</strong>ias. A procura<br />

pelo acompanhamento biomédico também é valorizada, mas há dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

atendimento <strong>de</strong>vido à inexistência <strong>de</strong> rotina no atendimento <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> nas al<strong>de</strong>ias e a<br />

escassez <strong>de</strong> transporte para <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> das cida<strong>de</strong>s próximas. O que<br />

diminuiu consi<strong>de</strong>ravelmente, pois o atendimento básico é realizado pela equipe<br />

médica do DSEI.<br />

Tanto no itinerário terapêutico quanto nas formas <strong>de</strong> lidar com doenças <strong>de</strong><br />

infância, parto, pré-natal e contracepção, <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> p<strong>os</strong>suem uma forma particular<br />

<strong>de</strong> se relacionar. Convivem bem com a biomedicina e, também, valorizam <strong>os</strong><br />

conheciment<strong>os</strong> da medicina tradicional e das curas através d<strong>os</strong> encantad<strong>os</strong>. A boa<br />

aceitação do sistema biomédico inclui a valorização do parto em h<strong>os</strong>pital pelas índias<br />

mais novas, como maneira <strong>de</strong> evitar risc<strong>os</strong> ou ter como socorrê-l<strong>os</strong> a tempo. A<br />

assistência h<strong>os</strong>pitalar e o médico são valorizad<strong>os</strong> para a cura <strong>de</strong> enfermida<strong>de</strong>s e para a<br />

prevenção <strong>de</strong> doenças, <strong>de</strong> maneira extensiva.<br />

As índias <strong>entre</strong>vistadas, durante a pesquisa, realçaram que as reza<strong>de</strong>iras e<br />

curadores têm um papel importante no âmbito da saú<strong>de</strong>, reconhecidas por tod<strong>os</strong> e que<br />

existe um interesse muito gran<strong>de</strong> em po<strong>de</strong>r ampliar <strong>os</strong> conheciment<strong>os</strong> em saú<strong>de</strong><br />

reprodutiva e do próprio corpo. Os agentes <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> p<strong>os</strong>suem opiniões que se<br />

coadunam às das mulheres: existe uma gran<strong>de</strong> conscientização a respeito d<strong>os</strong><br />

serviç<strong>os</strong> que po<strong>de</strong>m atuar na área indígena, um gran<strong>de</strong> interesse na própria<br />

capacitação e na melhoria das suas atuações. Além disso, são reconhecid<strong>os</strong> pela<br />

população como pessoas que po<strong>de</strong>m ajudar a melhorar a situação da saú<strong>de</strong> na área.<br />

15


16<br />

As índias <strong>entre</strong>vistadas e <strong>os</strong> agentes indígenas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> enfatizaram que <strong>os</strong><br />

programas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> existentes não levam em conta a especificida<strong>de</strong> étnica d<strong>os</strong><br />

<strong>Pankararu</strong>, inclusive no que diz respeito a<strong>os</strong> conheciment<strong>os</strong> locais sobre saú<strong>de</strong><br />

reprodutiva. O atendimento realizado pela equipe do DSEI ainda está ambulatorial e<br />

<strong>os</strong> centr<strong>os</strong> <strong>de</strong> referência carecem <strong>de</strong> uma melhor atenção no <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> um<br />

atendimento especifico e diferenciado. Não existe um sistema <strong>de</strong> informação que<br />

favoreça a vigilância sanitária para a área indígena e a não coor<strong>de</strong>nação d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong> saú<strong>de</strong> está muito mais no âmbito administrativo que uma preocupação com<br />

articular a medicina indígena com <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>.<br />

A saú<strong>de</strong> indígena, até o presente, não tem uma avaliação mais global sobre as<br />

práticas médicas em andamento nas áreas indígenas em Pernambuco. Os divers<strong>os</strong><br />

projet<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> implantad<strong>os</strong> nas áreas indígenas não chegaram a formular um<br />

consenso mínimo sobre como <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>veriam ser mais bem<br />

organizad<strong>os</strong> tendo em vista sua relação ou não com um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> atenção nacional<br />

que também optou por favorecer <strong>os</strong> sistemas locais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Em outras palavras,<br />

ainda não existe uma reflexão mais ampla sobre como organizar um subsistema <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> indígena, com toda a sua especificida<strong>de</strong> relacionada ao SUS.<br />

Em uma concepção geral, o SUS oferece a p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> criação <strong>de</strong><br />

sistemas locais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> basead<strong>os</strong> nas diferentes realida<strong>de</strong>s e a diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

mo<strong>de</strong>l<strong>os</strong> operacionais. Em se tratando da atenção da saú<strong>de</strong> e sob a perspectiva <strong>de</strong><br />

comando único <strong>de</strong> ações, essa dicotomia se m<strong>os</strong>trou extremamente inviável e<br />

incoerente, criando relações paternalistas para <strong>de</strong>terminadas populações indígenas e<br />

gerando a imp<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> execução <strong>de</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>de</strong> maneira integral.<br />

Ações <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> e <strong>Programas</strong><br />

A discussão que segue está baseada nas informações provenientes <strong>de</strong> um<br />

trabalho educativo <strong>de</strong> intervenção 8 realizado na área <strong>Pankararu</strong> em 2001 e 2002<br />

<strong>de</strong>senvolvido pela SSL e pela FUNASA. Essa ação consistiu na realização <strong>de</strong><br />

aplicação <strong>de</strong> um questionário, oficinas, grup<strong>os</strong> <strong>de</strong> discussões e reuniões sobre a<br />

temática do corpo, saú<strong>de</strong> reprodutiva e sobre as doenças sexualmente transmissíveis e<br />

Aids. Essas reuniões contaram com a participação d<strong>os</strong> agentes indígenas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>,<br />

auxiliares indígenas <strong>de</strong> enfermagem (vinculad<strong>os</strong> ao DSEI-PE e que atuam na área<br />

<strong>Pankararu</strong>), li<strong>de</strong>ranças, mulheres e homens, além da orientação especifica para<br />

mulheres e homens. Cabe salientar que, a equipe SSL, que conduziu essas ativida<strong>de</strong>s<br />

em campo, procurou envolver <strong>os</strong> profissionais <strong>de</strong> nível superior que atuam nas<br />

equipes <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, com vistas a promover a necessária articulação institucional.<br />

As mulheres atendidas realizaram a prevenção para o câncer <strong>de</strong> mama e foram<br />

orientadas e estimuladas a realizarem o auto exame <strong>de</strong> mamas mensal (10 dias após a<br />

menstruação). Segundo as consultoras das ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> educação e intervenção, a<br />

maioria das mulheres que receberam esse atendimento, <strong>de</strong>sconhecia o exame <strong>de</strong><br />

8 Intitulada: Reprodução, <strong>Sexualida<strong>de</strong></strong> e <strong>Programas</strong> <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvida pela Associação Saú<strong>de</strong> Sem Limites<br />

(SSL) em parceria com a Associação d<strong>os</strong> Profissionais Indígenas <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> <strong>Pankararu</strong> (APROISP), Universida<strong>de</strong><br />

Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Pernambuco (NUSP, NEPE e FAGES) com apoio da Fundação Nacional <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>/DSEI-PE e do<br />

Programa Estadual <strong>de</strong> DSTs e Aids/CN DST e AIDS


17<br />

prevenção das mamas e as poucas que já haviam realizado o exame o fizeram fora da<br />

área <strong>Pankararu</strong>. Algumas mulheres já palpam o peito por causa da TV e da campanha<br />

<strong>de</strong> marketing realizada pelo Ministério da Saú<strong>de</strong>, que divulga o auto-exame. As<br />

mulheres se m<strong>os</strong>traram envolvidas no aprendizado do auto-exame tendo plenas<br />

condições para assumir este auto-cuidado. Após essas orientações iniciais foi<br />

realizado uma anamnese dirigida a abordagem das DSTs sendo que esse registro era<br />

feito em uma ficha clínica elaborada <strong>de</strong> acordo com o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> “Inquérito <strong>de</strong> Acesso<br />

Rápido” à situação das DSTs e Aids na Al<strong>de</strong>ia. Em seguida era realizado o exame da<br />

genitália externa para a pesquisa <strong>de</strong> lesões e a coleta <strong>de</strong> material para o exame<br />

“papanicolau”. As mulheres cujo diagnóstico <strong>de</strong> DST era evi<strong>de</strong>nciado pela clínica<br />

eram orientadas e tratadas, bem como o seu parceiro.<br />

Para a realização <strong>de</strong>ssas ativida<strong>de</strong>s 9 foram visitadas 12 al<strong>de</strong>ias, realizadas 14<br />

palestras com participação <strong>de</strong> homens e mulheres atingindo um total <strong>de</strong> 257 pessoas<br />

sendo que 191 mulheres e 66 homens. Na ocasião <strong>de</strong>sse processo <strong>de</strong> intervenção<br />

foram realizad<strong>os</strong> 176 exames papanicolau. De acordo com <strong>os</strong> dad<strong>os</strong> <strong>de</strong>mográfic<strong>os</strong><br />

existentes na ocasião (1.953 mulheres) <strong>de</strong>sse processo, esses exames representaram<br />

cerca <strong>de</strong> 10% população <strong>Pankararu</strong>. Desse total <strong>de</strong> exames realizad<strong>os</strong> apenas 6<br />

mulheres tiveram resultado normal. Portanto 96% das mulheres examinadas<br />

apresentaram algum tipo <strong>de</strong> alteração no colo do útero.<br />

Esses dad<strong>os</strong> sobre essa ativida<strong>de</strong> realizada na área indígena confirmam que o<br />

acesso a um exame preventivo ainda se concentra em poucas mulheres. A gran<strong>de</strong><br />

maioria ainda não participa <strong>de</strong>ssas ativida<strong>de</strong>s ou as equipes <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> sentem<br />

dificulda<strong>de</strong>s em procurar interiorizar ainda mais as ações nessa direção na área<br />

indígena.<br />

Políticas <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong><br />

O mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> atenção a saú<strong>de</strong> indígena na forma <strong>de</strong> Distrit<strong>os</strong> Sanitári<strong>os</strong><br />

Especiais Indígenas com um território <strong>de</strong>finido e um subsistema estabelecido <strong>de</strong><br />

acordo com a Lei 8.080, implantad<strong>os</strong> em Pernambuco <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1999, p<strong>os</strong>sibilitou a<br />

sistematização <strong>de</strong> dad<strong>os</strong> e informações em saú<strong>de</strong> indígena para a elaboração <strong>de</strong> perfis<br />

epi<strong>de</strong>miológic<strong>os</strong> que retratam a situação <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> das áreas indígenas. No entanto,<br />

dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> manutenção d<strong>os</strong> programas <strong>de</strong>vido a alta rotativida<strong>de</strong> d<strong>os</strong><br />

profissionais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> nas áreas indígenas não permitem se ter um quadro geral.<br />

l.<br />

9<br />

Informações retiradas do Relatório <strong>de</strong> Intervenção Educativa da Associação Saú<strong>de</strong> Sem Limites,<br />

elaborado por Marina Machado e Juliana Lobo.


18<br />

Neste sentido, observa-se que o primeiro tipo <strong>de</strong> enfoque (nas doenças) que<br />

equipe <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> do distrito tem se associa nitidamente a um estilo <strong>de</strong> administração <strong>de</strong><br />

programas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> que favorece conheciment<strong>os</strong> biomédic<strong>os</strong> especializadas. As<br />

suas medidas <strong>de</strong> eficácia são na redução <strong>de</strong> índices <strong>de</strong> morbida<strong>de</strong> e mortalida<strong>de</strong> cuja<br />

causalida<strong>de</strong> se restringe à doença, alvo <strong>de</strong> um <strong>de</strong>terminado programa. Em outras<br />

palavras, não existe por parte da equipe <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> que atua na área indígena, um<br />

entendimento maior das p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s existentes com relação ao auto-cuidado e as<br />

tradições culturais <strong>Pankararu</strong>. As persistências <strong>de</strong> indicadores negativ<strong>os</strong> m<strong>os</strong>tram <strong>os</strong><br />

velh<strong>os</strong> problemas on<strong>de</strong> a ação biomédica ainda é privilegiada na área indígena. Essas<br />

estratégias ampliam a “consciência”, que atacar a doença muitas vezes é uma<br />

estratégia que, apesar <strong>de</strong> ren<strong>de</strong>r alguns resultad<strong>os</strong>, que não po<strong>de</strong>riam ser obtid<strong>os</strong> por<br />

outro caminho, porém, às vezes, torna-se uma estratégia cara cuj<strong>os</strong> resultad<strong>os</strong> são<br />

precarizad<strong>os</strong> por fatores fora do controle d<strong>os</strong> profissionais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Evi<strong>de</strong>ntemente,<br />

que essas ações sensibilizam principalmente aqueles administradores <strong>de</strong> programas <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> mais preocupad<strong>os</strong> com <strong>os</strong> índices contábeis <strong>de</strong> custo-benefício <strong>de</strong> que com a<br />

i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong> grup<strong>os</strong> sociais específic<strong>os</strong> cujas <strong>de</strong>mandas precisam ser atendidas.<br />

Ganham-se alguns a<strong>de</strong>pt<strong>os</strong> disp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> a juntar forças com outr<strong>os</strong> profissionais<br />

afinad<strong>os</strong> com <strong>os</strong> interesses <strong>de</strong> segment<strong>os</strong> e grup<strong>os</strong> específic<strong>os</strong> necessitad<strong>os</strong> da<br />

população. O apelo à "integralida<strong>de</strong>" foi a maneira encontrada <strong>de</strong>, simultaneamente,<br />

criticar a fragmentação c<strong>os</strong>tumeira d<strong>os</strong> portadores do conhecimento médico <strong>de</strong><br />

tratamento por órgã<strong>os</strong> e doenças específicas, e aproveitar d<strong>os</strong> seus serviç<strong>os</strong><br />

direcionad<strong>os</strong> ao que interessava à mulher e ao adolescente no estabelecimento <strong>de</strong><br />

centr<strong>os</strong> <strong>de</strong> referência. A idéia <strong>de</strong> integrar também serviu para chamar atenção à<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> realizar outras formas e intensificar o diálogo <strong>entre</strong> <strong>os</strong> curadores e<br />

agentes tradicionais <strong>de</strong> curas com <strong>os</strong> atores do ambiente ambulatorial da equipe<br />

médica.


19<br />

Os grup<strong>os</strong> indígenas que visualizam<strong>os</strong> aqui têm referências diferentes ao<br />

mesmo mais concreto e mais complexo. Um entendimento mais amplo <strong>de</strong> sua<br />

inserção na realida<strong>de</strong> local. São grup<strong>os</strong> <strong>de</strong> famílias e <strong>de</strong> pessoas, freqüentemente <strong>de</strong><br />

características diversas, que interagem com regularida<strong>de</strong> na vida cotidiana. Grup<strong>os</strong><br />

familiares, <strong>de</strong> parentesco, <strong>de</strong> vizinhança são exempl<strong>os</strong> com uma dinâmica relacional<br />

específica. Estes mantêm uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> étnica relacionada com o seu território,<br />

portanto uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acordo com a sua inserção numa localização geográfica<br />

específica que recebe diversas <strong>de</strong>nominações, mas que, <strong>de</strong> c<strong>os</strong>tume, po<strong>de</strong> ser chamada<br />

<strong>de</strong> "comunida<strong>de</strong>". As manifestações culturais e principalmente religi<strong>os</strong>as d<strong>os</strong><br />

<strong>Pankararu</strong> estão completamente envolvidas com o que eles <strong>de</strong>nominam <strong>de</strong> encantad<strong>os</strong>.<br />

As forças encantadas são entida<strong>de</strong>s que se manifestam na organização política e nas<br />

práticas <strong>de</strong> cura, e são reverenciad<strong>os</strong> em festas tradicionais <strong>Pankararu</strong>. Segundo <strong>os</strong><br />

<strong>Pankararu</strong>, <strong>os</strong> encantad<strong>os</strong> são colocad<strong>os</strong> em uma forma hierárquica na qual o “Mestre-<br />

Guia” é o “comandante”. O processo doença-cura <strong>entre</strong> <strong>os</strong> indígenas está relacionado<br />

a uma concepção própria, às práticas terapêuticas que passam por um entendimento da<br />

c<strong>os</strong>mologia própria <strong>de</strong> cada grupo indígena. Os curadores e benze<strong>de</strong>iras <strong>Pankararu</strong>,<br />

não po<strong>de</strong>m <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> participar da Festa Anual do Mestre Guia, no último dia das<br />

Corridas do Umbu. A morte é vista como um renascimento para o mundo d<strong>os</strong><br />

encantad<strong>os</strong>. As pessoas que morrem vão procurar moradia n<strong>os</strong> lugares d<strong>os</strong><br />

encantad<strong>os</strong>, nas serras e nas cachoeiras do rio. As doenças po<strong>de</strong>m ser tratadas na<br />

medida em que <strong>os</strong> encantad<strong>os</strong> são chamad<strong>os</strong>.<br />

Para finalizar acredita-se importante relatar que <strong>os</strong> resultad<strong>os</strong> prátic<strong>os</strong> das<br />

ações <strong>de</strong> pesquisa e <strong>os</strong> própri<strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> insistem que se <strong>de</strong>veria prioritariamente: a)<br />

ampliar o <strong>de</strong>bate das questões <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> reprodutiva <strong>entre</strong> <strong>os</strong> jovens e promovendo a<br />

participação d<strong>os</strong> mesm<strong>os</strong> nas diversas ativida<strong>de</strong>s na área indígena; b) atuar em<br />

conjunto com <strong>os</strong> profissionais indígenas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e <strong>os</strong> profissionais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> que<br />

atuam na área indígena, através <strong>de</strong> reuniões específicas discutindo as especificida<strong>de</strong>s<br />

d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> da área <strong>Pankararu</strong> e por último através <strong>de</strong> um série <strong>de</strong><br />

treinamento e capacitações para homens e mulheres que estão participando nas<br />

diversas instâncias <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, e, sobretudo c) p<strong>os</strong>sibilitar o inter-relação com outras<br />

áreas indígenas do Estado <strong>de</strong> Pernambuco visando <strong>os</strong> gestores e profissionais que<br />

atuam no âmbito do Distrito Especial Indígena <strong>de</strong> Pernambuco para que a política<br />

nacional <strong>de</strong> atenção a saú<strong>de</strong> d<strong>os</strong> pov<strong>os</strong> indígenas seja realmente efetivada.<br />

* * *<br />

A intensificação <strong>de</strong> trabalh<strong>os</strong> relacionad<strong>os</strong> com a etnicida<strong>de</strong> em Pernambuco é<br />

proveniente <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>cisão explicita <strong>de</strong> realçar a condição das populações indígenas<br />

do Nor<strong>de</strong>ste, feito a partir da UFPE por integrantes do Núcleo <strong>de</strong> Estud<strong>os</strong> e Pesquisas<br />

sobre Etnicida<strong>de</strong> (NEPE) em mead<strong>os</strong> da década <strong>de</strong> noventa. Como conhecedores das<br />

condições do sertão do Sub-M;edio São Francisco, e com experiências com outras<br />

etnias, tanto do próprio estado <strong>de</strong> Pernambuco quanto da Amazônia, a inclusão na<br />

pesquisa sobre Reprodução, <strong>Sexualida<strong>de</strong></strong> e Grup<strong>os</strong> Sociais Diferente, apoiada pelo<br />

CNPQ ajudou a dar um direcionamento para a colaboração com FAGES e a inclusão<br />

<strong>de</strong> gênero, geração e parentesco num esforço <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificar a especificida<strong>de</strong> cultural<br />

d<strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong>. Este trabalho ocorre num período <strong>de</strong> efervescência nacional do<br />

estabelecimento d<strong>os</strong> Distrit<strong>os</strong> Sanitári<strong>os</strong> Especiais Indígenas. É neste contexto que se<br />

estabelece um <strong>de</strong>safio excepcional <strong>de</strong> compor estruturas que p<strong>os</strong>sam representar e


<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r <strong>os</strong> direit<strong>os</strong> indígenas nesta esfera. Rapidamente se percebe uma necessida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> estimular que este grupo or<strong>de</strong>nasse a sua <strong>de</strong>manda para tratamento a<strong>de</strong>quado <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong>, encontrando e aproveitando <strong>de</strong> aberturas permitidas pelo movimento indígena,<br />

pel<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> governamentais e pelas organizações não governamentais.<br />

As ações da pesquisa e intervenção executadas na área indígena <strong>Pankararu</strong><br />

estavam direcionadas para dois eix<strong>os</strong> centrais: 1) enten<strong>de</strong>r o processo saú<strong>de</strong>-doença e<br />

especificamente as questões que envolvem a saú<strong>de</strong> reprodutiva. Aí está o lado da<br />

pesquisa e o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>l<strong>os</strong> explicativ<strong>os</strong> para o caso indígena,<br />

populações tradicionais, grup<strong>os</strong> sociais distint<strong>os</strong>, buscando relacionar <strong>os</strong> aspect<strong>os</strong> da<br />

representação das doenças e as questões que se situam no âmbito da sexualida<strong>de</strong>, e 2)<br />

intervir através <strong>de</strong> ações <strong>de</strong>stinadas, sobretudo a fornecer informações sobre <strong>os</strong><br />

direit<strong>os</strong> indígenas visando o empo<strong>de</strong>ramento d<strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> no âmbito da saú<strong>de</strong><br />

reprodutiva, tendo em vista que <strong>os</strong> mesm<strong>os</strong> tenham ferramentas para serem atores e<br />

sujeit<strong>os</strong> nas <strong>de</strong>cisões sobre a organização d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> no âmbito do distrito<br />

sanitário indígena.<br />

Essa pesquisa buscou interagir com as questões relacionadas da saú<strong>de</strong><br />

reprodutiva em grup<strong>os</strong> etnicamente diferenciad<strong>os</strong>. E percebeu-se da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

produzir conheciment<strong>os</strong> para compreen<strong>de</strong>r essa realida<strong>de</strong>. Os resultad<strong>os</strong> parciais da<br />

pesquisa apontam para uma maior compreensão d<strong>os</strong> aspect<strong>os</strong> reprodutiv<strong>os</strong> da área<br />

<strong>Pankararu</strong>, e a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> <strong>de</strong>mandas específicas. As mulheres indígenas <strong>de</strong>mandam<br />

uma maior atenção d<strong>os</strong> programas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> para as questões especificamente d<strong>os</strong><br />

aspect<strong>os</strong> reprodutiv<strong>os</strong> e solicitam um maior cuidado no encaminhamento <strong>de</strong> exames<br />

laboratoriais com relação ao programa <strong>de</strong> prevenção <strong>de</strong> câncer colo-uterino (PCCU).<br />

E enfatizam que esses exames sejam realizad<strong>os</strong> na área indígena, com um maior<br />

envolvimento das parteiras e agentes <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> no processo <strong>de</strong> educação e saú<strong>de</strong>; <strong>os</strong><br />

jovens com maior interesse em questões das DSTs e AIDS superou a expectativa<br />

inicial d<strong>os</strong> integrantes do projeto. Atualmente, um número significativo <strong>de</strong> jovens faz<br />

parte <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong> multiplicadores na área indígena.<br />

A parceria com a Associação d<strong>os</strong> Profissionais Indígenas <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> <strong>Pankararu</strong><br />

(APROISP), organizada por trabalhadores <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> em torno do fato que <strong>os</strong> agentes<br />

<strong>de</strong> saú<strong>de</strong> precisam ser indígenas, p<strong>os</strong>sibilitou uma maior interface com <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong> na área indígena e, sobretudo um trabalho em conjunto na produção <strong>de</strong> material<br />

<strong>de</strong> divulgação e pedagógico para ser usado nas áreas indígenas. Durante esse período<br />

foram <strong>de</strong>senvolvid<strong>os</strong> materiais educativ<strong>os</strong> na área indígena para ações educativas na<br />

sensibilização das DSTs e Aids.<br />

Os homens que participaram das oficinas e grup<strong>os</strong> <strong>de</strong> discussão sobre DSTs e<br />

AIDS tiveram uma oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> falar abertamente e solicitar material específic<strong>os</strong><br />

para eles. Verificou-se que as al<strong>de</strong>ias indígenas na área <strong>Pankararu</strong> gozam <strong>de</strong> uma<br />

gran<strong>de</strong> in<strong>de</strong>pendência <strong>entre</strong> si o que p<strong>os</strong>sibilita uma maior interação das pessoas n<strong>os</strong><br />

process<strong>os</strong> <strong>de</strong> discussão e <strong>de</strong>bate sobre a questão. E que as questões que envolvem<br />

<strong>de</strong>cisão da coletivida<strong>de</strong> precisam ser altamente negociadas n<strong>os</strong> divers<strong>os</strong> setores da<br />

organização social <strong>Pankararu</strong>.<br />

20


Em term<strong>os</strong> <strong>de</strong> organizações representativas, as ações e intervenções durante a<br />

pesquisa procuraram-se dar priorida<strong>de</strong> na participação do Conselho Indígena <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong><br />

<strong>Pankararu</strong>, que agrupa representante (um titular e um suplente) das al<strong>de</strong>ias situadas na<br />

área indígena. A atuação e participação nas reuniões do conselho local <strong>de</strong> saú<strong>de</strong><br />

visaram um assessoramento às questões <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e nas p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

planejamento d<strong>os</strong> programas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>.<br />

Em consonância com <strong>os</strong> outr<strong>os</strong> dois grup<strong>os</strong> (rurais e urban<strong>os</strong>), as ações <strong>de</strong><br />

pesquisa e intervenção <strong>entre</strong> <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong> estão diretamente relacionadas com <strong>os</strong><br />

objetiv<strong>os</strong> do projeto sobre Estil<strong>os</strong> reprodutiv<strong>os</strong>: “Estimular a elaboração, pelas<br />

organizações representativas, <strong>de</strong> estratégias reivindicatórias concretas que reforcem e/<br />

ou estabeleçam setores que <strong>de</strong>monstram sensibilida<strong>de</strong> à questão <strong>de</strong> gênero <strong>entre</strong> as<br />

organizações representativas [e] Promover o contato <strong>de</strong>stas organizações com<br />

executores, administradores, e planejadores <strong>de</strong> ações governamentais e nãogovernamentais<br />

na área <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> (e especialmente saú<strong>de</strong> reprodutiva) na expectativa<br />

<strong>de</strong> aumentar o acesso e a sensibilida<strong>de</strong> a questões <strong>de</strong> gênero nestes serviç<strong>os</strong>.”<br />

Para realização <strong>de</strong>sse projeto, na área indígena, procurou-se agregar <strong>os</strong> dad<strong>os</strong><br />

da pesquisa anterior apoiada pelo CNPQ (intitulada: Sangue Bom, Sangue Mau<br />

análise das representações sociais da doença <strong>entre</strong> <strong>os</strong> <strong>Pankararu</strong>), e juntamente com<br />

essas informações, buscou-se completar com a pesquisa quantitativa realizada na área<br />

indígena, on<strong>de</strong> se <strong>entre</strong>vistou: 324 mulheres e 315 homens. Esses dad<strong>os</strong>, já totalmente<br />

tabulad<strong>os</strong>, têm p<strong>os</strong>sibilitado material <strong>de</strong> análise para <strong>os</strong> divers<strong>os</strong> estud<strong>os</strong>, alguns já<br />

publicad<strong>os</strong>. Foram realizad<strong>os</strong> oito grup<strong>os</strong> <strong>de</strong> discussão, envolvendo, mulheres,<br />

homens e jovens. Oficinas e capacitações sobre as questões <strong>de</strong> DST e AIDS com<br />

homens (jovens e adult<strong>os</strong>) e mulheres (jovens e adult<strong>os</strong>). Os participantes <strong>de</strong>ssas<br />

oficinas tornaram-se multiplicadores em suas al<strong>de</strong>ias. Juntamente com a APROISP<br />

foram realizadas várias oficinas <strong>de</strong> treinamento para <strong>os</strong> Conselheir<strong>os</strong> <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> e em<br />

conjunto uma oficina <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> material didático para uso na área indígena on<strong>de</strong><br />

21


22<br />

se publicou (com o apoio da SSL e FUNASA) uma cartilha e um cartaz, resultad<strong>os</strong><br />

<strong>de</strong>ssas oficinas. A equipe do projeto também participou <strong>de</strong> uma intervenção direta na<br />

área indígena, em conjunto com a Associação Saú<strong>de</strong> Sem Limites (SSL) e APROISP,<br />

com mulheres e homens p<strong>os</strong>sibilitando que as ações <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e controle <strong>de</strong> DSTs<br />

f<strong>os</strong>sem realizadas na área indígena em toda sua extensão. As mulheres indígenas<br />

solicitaram uma ação mais concreta com relação utilização do álcool na área indígena<br />

e equipe do projeto juntamente com membr<strong>os</strong> da Associação Saú<strong>de</strong> Sem Limites<br />

elaborou um projeto <strong>de</strong> pesquisa sobre a representação social do alcoolismo na área<br />

indígena, concluído em 2004. O material da pesquisa p<strong>os</strong>sibilitou ainda a<br />

implementação do projeto Saú<strong>de</strong> e Cultura <strong>Pankararu</strong>, <strong>de</strong> intervenção em saú<strong>de</strong>, da<br />

SSL em parceira com APROISP.<br />

As reuniões conjuntas do projeto têm p<strong>os</strong>sibilitado um maior intercambio <strong>entre</strong><br />

representantes indígenas e <strong>os</strong> trabalhadores rurais e moradores do Ibura, on<strong>de</strong> as<br />

questões sobre saú<strong>de</strong> reprodutiva tem sido um tema <strong>de</strong> empo<strong>de</strong>ramento <strong>de</strong>ssas<br />

organizações. As ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> divulgação d<strong>os</strong> resultad<strong>os</strong> do projeto: publicações (3<br />

capítul<strong>os</strong> <strong>de</strong> livro), apresentações em congress<strong>os</strong> (ANPOCS, ABA, ABRASCO,<br />

Epi<strong>de</strong>miologia, Seminári<strong>os</strong> regionais e nacionais, oficinas realizadas pela FUNASA).<br />

Discussão no âmbito das reuniões do Distrito Sanitário Especial Indígena, e as<br />

interfaces com Núcleo <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Pública (NUSP), Núcleo <strong>de</strong> Estud<strong>os</strong> e Pesquisas<br />

sobre Etnicida<strong>de</strong> (NEPE), amb<strong>os</strong> da UFPE, p<strong>os</strong>sibilitando assim a realização, nesses<br />

últim<strong>os</strong> an<strong>os</strong>, <strong>de</strong> três Fóruns <strong>de</strong> Debates sobre a Saú<strong>de</strong> Indígena no Estado <strong>de</strong><br />

Pernambuco com a participação do Conselho Distrital <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Indígena <strong>de</strong><br />

Pernambuco, FUNASA, e outras instituições que atuam nas áreas indígenas <strong>de</strong><br />

Pernambuco.<br />

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Fotografias: Renato Athias

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