relações entre valores individuais, valores organizacionais e ... - Ucg
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JOSÉ CALIXTO DE SOUZA PIRES<br />
RELAÇÕES ENTRE VALORES INDIVIDUAIS, VALORES<br />
ORGANIZACIONAIS E PROGRAMA DE QUALIDADE DE<br />
VIDA NO TRABALHO<br />
GOIÂNIA<br />
2004
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS<br />
MESTRADO EM PSICOLOGIA<br />
RELAÇÕES ENTRE VALORES INDIVIDUAIS, VALORES<br />
ORGANIZACIONAIS E PROGRAMA DE QUALIDADE DE<br />
VIDA NO TRABALHO<br />
José Calixto de Souza Pires<br />
Orientadora: Profa. Dra. Kátia Barbosa Macêdo<br />
Dissertação apresentada ao Mestrado em<br />
Psicologia da Universidade Católica de<br />
Goiás, como requisito parcial à obtenção do<br />
título de Mestre em Psicologia Social.<br />
Goiânia<br />
2004
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS<br />
Folha de Avaliação<br />
Autor: José Calixto de Souza Pires<br />
Título: RELAÇÕES ENTRE VALORES INDIVIDUAIS, VALORES<br />
ORGANIZACIONAIS E PROGRAMA DE QUALIDADE DE VIDA NO<br />
TRABALHO<br />
Data da avaliação: _____/_____/_____<br />
BANCA EXAMINADORA<br />
_______________________________<br />
Profa. Dra. Kátia Barbosa Macêdo<br />
Universidade Católica de Goiás<br />
____________<br />
Nota ou grau<br />
_________________________________<br />
Profa. Dra. Ana Raquel Rosas Torres<br />
Universidade Católica de Goiás<br />
____________<br />
Nota ou grau<br />
_________________________________<br />
Profa. Dra. Maria do Carmo Martins<br />
Universidade Federal de Uberlândia<br />
____________<br />
Nota ou Grau<br />
GOIÂNIA<br />
2004
Dedico este trabalho, em especial, à minha esposa,<br />
Maria Auxiliadora, que esteve sempre ao meu lado e<br />
me ajudou nos momentos de alegria e de frustrações,<br />
bem como aos meus pais Valdeci e Divina pela<br />
dedicação e cuidado e que forneceram incentivo ao meu<br />
crescimento pessoal e profissional, além dos <strong>valores</strong><br />
básicos norteadores de minha conduta.
AGRADECIMENTOS<br />
A Deus por avalizar a contemplação de meu sonho, ter iluminado meu<br />
caminho, ter me dado forças para seguí-lo e por ser o único que verdadeiramente tudo<br />
conhece, tudo pode, em todas as coisas está presente e pela providência da satisfação de<br />
todas as minhas necessidades no tempo e no momento certo.<br />
À Profa. Dra. Kátia Barbosa Macêdo, orientadora deste trabalho, pela<br />
credibilidade e confiança dispensadas à minha pessoa e por ter me mostrado novos<br />
horizontes, dividindo comigo parte de seus conhecimentos e de sua experiência.<br />
A minha querida esposa, Maria Auxiliadora, companheira inseparável, pela<br />
força, compreensão, apoio e carinho que me transmitiu nessa jornada e cujo encanto<br />
enriqueceu esta minha conquista.<br />
Aos meus pais, Valdeci e Divina, por terem me apoiado em mais esta conquista<br />
e nos momentos mais difíceis, e mesmo distantes de minha rotina, estiveram presentes na<br />
minha história.<br />
Aos meus sogros, Geracino e Nelcy, pelo carinho, amizade, consideração,<br />
força, incentivo e, sobretudo, por me terem como filho e pela filha maravilhosa que me<br />
deram como esposa.<br />
A Profa. Dra. Ana Raquel Rosas Torres, pelo carinho, apoio e envolvimento<br />
apresentados nas sugestões colocadas por ocasião do exame de qualificação.<br />
A Profa. Dra. Helenides Mendonça pela sua disponibilidade e presteza com<br />
que apresentou suas sugestões.<br />
A Profa. Ms. Sueli Vieira pela presteza, orientações e sugestões valiosas em<br />
relação às análises estatísticas.<br />
A minha querida colega Evanúzia, companheira de jornada, queixas e<br />
lamentações, pelo apoio nos momentos mais difíceis e de incertezas, mas muito presente<br />
também nos momentos de alegria.<br />
A minha querida Colega Karen Michel Esber pela sua contribuição valiosa,<br />
pela compreensão, pela amizade, pelos momentos de troca, pela empatia, pelos sorrisos...
6<br />
Ao CNPq e ao comitê responsável pelo processo de seleção de bolsista pela<br />
concessão da bolsa de estudos.<br />
A organização e aos trabalhadores pela disposição e confiança em contribuir na<br />
realização desta pesquisa.<br />
E a todos aqueles que de uma forma ou de outra, tornaram possível que o<br />
sonho se tornasse realidade.
Ainda que eu falasse a língua dos homens e<br />
dos anjos, se não tiver amor sou como o<br />
bronze que soa, ou como o címbalo que<br />
retina.<br />
I Coríntios 13: 1
SUMÁRIO<br />
LISTA DE FIGURAS................................................................................................... 11<br />
LISTA DE QUADROS................................................................................................. 11<br />
LISTA DE TABELAS.................................................................................................. 11<br />
LISTA DE GRÁFICOS ............................................................................................... 12<br />
RESUMO....................................................................................................................... 14<br />
ABSTRACT .................................................................................................................. 15<br />
APRESENTAÇÃO ....................................................................................................... 16<br />
CAPÍTULO 1 - CULTURA ORGANIZACIONAL E ORGANIZAÇÕES<br />
PÚBLICAS.................................................................................................................... 22<br />
1. Conceitos de Cultura................................................................................................ 22<br />
2. Cultura Brasileira..................................................................................................... 27<br />
3. As Organizações e a Cultura Organizacional ........................................................ 28<br />
3.1. Diferentes Abordagens em Cultura Organizacional .......................................... 32<br />
3.1.1. Abordagem de Smircich..................................................................................... 32<br />
3.1.2. Abordagem de Schein......................................................................................... 33<br />
3.1.3. Abordagem de Hofstede..................................................................................... 34<br />
3.1.4. Abordagem de Frost........................................................................................... 37<br />
4. Cultura de Organizações Públicas .......................................................................... 38<br />
4.1. Histórico das Organizações Públicas ................................................................... 38<br />
4.2. Organizações Públicas no Brasil .......................................................................... 40<br />
4.3. Conceituando e Caracterizando as Organizações Públicas............................... 42<br />
CAPÍTULO 2 – VALORES HUMANOS................................................................... 48<br />
1. Conceito de Valores.................................................................................................. 48<br />
2. Abordagens sobre Valores ....................................................................................... 49<br />
3. Valores Organizacionais .......................................................................................... 59
9<br />
CAPÍTULO 3 – QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO................................... 69<br />
1. Evolução da Qualidade de Vida no Trabalho........................................................ 70<br />
2. Definições de Qualidade de Vida no Trabalho ...................................................... 72<br />
3. Algumas Abordagens sobre Qualidade de Vida no Trabalho.............................. 76<br />
3.1. Abordagem de Hackman e Oldhan...................................................................... 77<br />
3.2. Abordagem de Westley ......................................................................................... 78<br />
3.3. Abordagem de Werther e Davis........................................................................... 80<br />
3.4. Abordagem de Nadler e Lawler ........................................................................... 82<br />
3.5. Abordagem de Huse e Cummings........................................................................ 82<br />
3.6. Abordagem de Walton .......................................................................................... 83<br />
4. Algumas Pesquisas sobre QVT Desenvolvidas no Brasil...................................... 89<br />
CAPÍTULO 4 – ESTUDO 1......................................................................................... 94<br />
1. Campo de Estudo...................................................................................................... 95<br />
1.1. População ............................................................................................................... 96<br />
1.2. Amostra .................................................................................................................. 96<br />
1.3. Dados Sócio-Demográficos dos Participantes ..................................................... 97<br />
1.4. Instrumentos ..........................................................................................................100<br />
1.5. Procedimentos........................................................................................................102<br />
1.6. Técnica de Análise de Dados ................................................................................102<br />
1.7. Resultados ..............................................................................................................104<br />
1.7.1. Apresentação dos Resultados Referentes à Escala de Valores Individuais<br />
e o Inventário de Valores Organizacionais...................................................104<br />
1.7.2. Relação <strong>entre</strong> os Valores Individuais e Organizacionais ................................110<br />
CAPÍTULO 5 – ESTUDO 2.........................................................................................113<br />
1. População ..................................................................................................................113<br />
2. Amostra .....................................................................................................................113<br />
3. Caracterização da Amostra .....................................................................................113<br />
4. Instrumentos .............................................................................................................114<br />
5. Procedimentos...........................................................................................................116<br />
6. Técnica de Análise de Dados ...................................................................................117<br />
7. Resultados .................................................................................................................119
10<br />
7.1. Apresentação da análise gráfica do discurso das <strong>entre</strong>vistas ............................119<br />
CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................209<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................226<br />
ANEXOS .......................................................................................................................235
LISTA DE FIGURAS<br />
Figura 1 – Diagrama das Diferentes Manifestações de Cultura.................................... 26<br />
Figura 2 – Estrutura Bidimensional dos Tipos Motivacionais ...................................... 57<br />
Figura 3 – Estrutura dos Valores Organizacionais........................................................ 66<br />
LISTA DE QUADROS<br />
Quadro 1 – Escala de Valores de Rokeach .................................................................. 51<br />
Quadro 2 – Agrupamento dos Valores Organizacionais por Pólos Axiológicos .......... 64<br />
Quadro 3 – O Processo Evolutivo do Pensamento de QVT.......................................... 75<br />
Quadro 4 – Indicadores de QVT Segundo Modelo de Westley.................................... 79<br />
Quadro 5 – Modelo de QVT Segundo Werther e Davis ............................................... 80<br />
Quadro 6 – Modelo Conceitual de QVT Proposto por Walton..................................... 88<br />
LISTA DE TABELAS<br />
Tabela 1 – Distribuição dos Trabalhadores da Interprise por Gênero........................... 97<br />
Tabela 2 - Distribuição dos Trabalhadores da Interprise por Idade .............................. 97<br />
Tabela 3 - Distribuição dos Trabalhadores da Interprise por Estado Civil ................... 98<br />
Tabela 4 - Distribuição dos Trabalhadores da Interprise por Escolaridade .................. 98<br />
Tabela 5 - Distribuição dos Trabalhadores da Interprise por Cargo ............................. 99<br />
Tabela 6 - Distribuição dos Trabalhadores da Interprise por Nível Hierárquico.......... 99<br />
Tabela 7 - Distribuição dos Trabalhadores da Interprise por Tempo de Serviço..........100<br />
Tabela 8 – Escores Médios e Desvio Padrão (DP) dos 10 Tipos Motivacionais de<br />
Valores Individuais dos Trabalhadores .......................................................105<br />
Tabela 9 – Média e Desvio Padrão (DP) das Três Dimensões Bipolares dos Valores<br />
Organizacionais na Percepção dos Trabalhadores.......................................108<br />
Tabela 10 – Coeficiente de Correlação (“r” Pearson) <strong>entre</strong> os dez Tipos Motivacionais<br />
e as Três Dimensões Bipolares dos Valores Organizacionais ...........110
LISTA DE GRÁFICOS<br />
Gráfico 1 – Quando você pensa nos seus <strong>valores</strong>, quais são as primeiras cinco palavras<br />
que te ocorrem? .......................................................................................... 120<br />
Gráfico 2 – Quando você pensa nos seus <strong>valores</strong>, quais são as primeiras cinco palavras<br />
que te ocorrem? .......................................................................................... 120<br />
Gráfico 3 – O que o(a) levou a escolher esta organização como campo de trabalho?<br />
Como imaginava que seria?........................................................................ 124<br />
Gráfico 4 – O que o(a) levou a escolher esta organização como campo de trabalho?<br />
Como imaginava que seria?........................................................................ 124<br />
Gráfico 5 – O que você imaginava sobre a organização confirmou-se ou não?............ 128<br />
Gráfico 6 – O que você imaginava sobre a organização confirmou-se ou não?............ 128<br />
Gráfico 7 – Como você aprendeu sobre os <strong>valores</strong> da organização? ............................ 132<br />
Gráfico 8 – Como você aprendeu sobre os <strong>valores</strong> da organização? ............................ 132<br />
Gráfico 9 – Ao se deparar com os <strong>valores</strong> da organização, o que você sentiu? Como<br />
está hoje? .................................................................................................... 135<br />
Gráfico 10 – Ao se deparar com os <strong>valores</strong> da organização, o que você sentiu?<br />
Como está hoje? ....................................................................................... 136<br />
Gráfico 11 – Quais os <strong>valores</strong> que considera primordiais para sua vida? ..................... 140<br />
Gráfico 12 – Quais são as primeiras cinco palavras que lhe ocorrem quando você<br />
pensa nos <strong>valores</strong> da organização? .......................................................... 142<br />
Gráfico 13 – Quais são as primeiras cinco palavras que lhe ocorrem quando você<br />
pensa nos <strong>valores</strong> da organização? .......................................................... 143<br />
Gráfico 14 – Você considera que os seus <strong>valores</strong> e os <strong>valores</strong> da organização<br />
combinam? Por quê? ............................................................................... 147<br />
Gráfico 15 – Você considera que os seus <strong>valores</strong> e os <strong>valores</strong> da organização<br />
combinam? Por quê? ............................................................................... 148<br />
Gráfico 16 – Quando, no desempenho de suas funções, você precisa fazer algo que<br />
coincide com os seus <strong>valores</strong>, o que acontece com você?........................ 152<br />
Gráfico 17 – Quando, no desempenho de suas funções, você precisa fazer algo que<br />
coincide com os seus <strong>valores</strong>, o que acontece com você?........................ 152<br />
Gráfico 18 – Quando, no desempenho de suas funções, você precisa fazer algo que<br />
não coincide com os seus <strong>valores</strong>, o que acontece com você?................. 155
13<br />
Gráfico 19 – Quando, no desempenho de suas funções, você precisa fazer algo que<br />
não coincide com os seus <strong>valores</strong>, o que acontece com você?................. 155<br />
Gráfico 20 – Quais são os <strong>valores</strong> que você acha que norteiam a organização?........... 158<br />
Gráfico 21 – Quais são os <strong>valores</strong> que você acha que norteiam a organização?........... 159<br />
Gráfico 22 – Você conhece o PQVT da Interprise? Como ficou sabendo dele? .......... 162<br />
Gráfico 23 – Trabalhar em uma empresa que tenha PQVT faz alguma diferença? ...... 164<br />
Gráfico 24 – Após a implantação do PQVT, o que mudou no seu trabalho?................ 166<br />
Gráfico 25 – O PQVT desenvolvido pela Interprise é compatível com os seus<br />
<strong>valores</strong> ou entra em conflito com eles? Como Avalia o Programa?...... 168<br />
Gráfico 26 – Você acha que há vantagens e/ou desvantagens em estar nesta<br />
Organização? Quais? ................................................................................ 170<br />
Gráfico 27 – Quais são os motivos que levaram a empresa a implantar o PQVT? ...... 172<br />
Gráfico 28 – Quais departamentos apoiaram o Programa e quais não apoiaram? ........ 174<br />
Gráfico 29 – Após a idéia de implantação do Programa, qual foi o primeiro passo? .. 175<br />
Gráfico 30 – A empresa possui uma política de pessoal, ou seja, de RH? Qual? Quando<br />
foi instituída? Por quem? Como foi e como é divulgada atualmente? ..177<br />
Gráfico 31 – Como e quando surgiu o setor que gerencia o PQVT da empresa? Qual o seu<br />
nível hierárquico? Quantas pessoas atuam nele? Qual o seu histórico?... 179<br />
Gráfico 32 – Escolha dos responsáveis pelo PQVT ...................................................... 181<br />
Gráfico 33 – Quais foram os objetivos e metas estipulados? ........................................ 183<br />
Gráfico 34 – Foi realizada uma previsão de recursos: humanos, financeiros e materiais? ... 185<br />
Gráfico 35 – Qual foi o período de implantação? Como os trabalhadores receberam a<br />
idéia inicialmente?.................................................................................... 187<br />
Gráfico 36 – Definição de responsabilidades e necessidade de ajustes......................... 189<br />
Gráfico 37 – Dificuldades encontradas durante a implantação do PQVT..................... 191<br />
Gráfico 38 – Expectativas da organização sobre o PQVT ............................................ 194<br />
Gráfico 39 – Das metas e objetivos quais foram alcançados? Quais ainda estão sendo<br />
buscados?................................................................................................... 196<br />
Gráfico 40 – Departamento que sofreu o maior impacto com o PQVT ........................ 198<br />
Gráfico 41 – Avaliação do Processo de Implantação do PQVT.................................... 201<br />
Gráfico 42 – Mudanças na imagem da organização após a implantação do PQVT...... 203<br />
Gráfico 43 – Após a implantação do PQVT, o que foi implementado?........................ 205<br />
Gráfico 44 – Existência de um controle sobre o PQVT ................................................ 207
RESUMO<br />
Os <strong>valores</strong> são princípios norteadores das aspirações, ações e avaliações, instituindo<br />
normas, sejam individualmente ou socialmente, para obtenção do que se necessita ou se<br />
deseja. As organizações também possuem seus <strong>valores</strong>, direcionando ações para o<br />
atingimento de metas. Eles constituem o núcleo da cultura organizacional e definem o<br />
sucesso da organização. Esta pesquisa teve como objetivo geral verificar a relação <strong>entre</strong><br />
Valores Individuais, Valores Organizacionais e Programa de Qualidade de Vida no<br />
Trabalho (PQVT). Como objetivos específicos, levantar as prioridades axiológicas dos<br />
trabalhadores, os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> segundo a sua percepção e a razão da criação do<br />
PQVT desenvolvido pela organização pesquisada. A pesquisa teve caráter descritivo e<br />
exploratório e foi realizada em uma organização pública no Município de Goiânia que<br />
presta serviço nas áreas da saúde e meio ambiente. Trata-se de um estudo de caso,<br />
composto por dois estudos empíricos. Primeiramente foi realizado o Estudo 1,<br />
fundamentado na Tipologia de Domínios Motivacionais de Valores, desenvolvidas por<br />
Schwartz e Bilsky (1987) e Schwartz (1992, 1994), que utilizaram como instrumento para<br />
coleta de dados a Escala de Valores Individuais (SCHWARTZ, 1993). Com base no<br />
Inventário de Valores Organizacionais de Tamayo e Mendes (1999), os <strong>valores</strong><br />
<strong>organizacionais</strong> foram levantados e analisados, de acordo com a percepção dos<br />
trabalhadores. A técnica utilizada para análise dos dados foi o cálculo da média e desvio<br />
padrão dos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e <strong>organizacionais</strong> e o Coeficiente de Correlação (r de<br />
Pearson) <strong>entre</strong> esses mesmos <strong>valores</strong>. Os resultados do Estudo 1 indicaram Benevolência,<br />
Conformidade, Universalismo e Segurança como as prioridades axiológicas dos<br />
trabalhadores, e Conservação, Hierarquia e Domínio <strong>valores</strong> orientadores da organização.<br />
A correlação <strong>entre</strong> os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e os <strong>organizacionais</strong>, indicou que os <strong>valores</strong><br />
<strong>organizacionais</strong> Conservação, Hierarquia e Domínio apresentaram correlação significativa<br />
apenas com o tipo motivacional Conformidade. No Estudo 2, o instrumento de coleta de<br />
dados foi uma <strong>entre</strong>vista semi-estruturada. As <strong>entre</strong>vistas foram analisadas por meio da<br />
técnica gráfica do discurso de Lane (1985). O Estudo 2 foi dividido em dois grupos: o<br />
grupo G1, formado pelos trabalhadores, e o grupo G2, pelos gestores do PQVT. Os<br />
resultados do Estudo 2 demonstraram a presença do valor individual de Conformidade e<br />
dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> de Conservação e Hierarquia. Mostrou ainda uma contradição<br />
nos discursos dos gestores e que o PQVT trata-se de um programa criado dentro da<br />
informalidade. Quanto aos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>, o PQVT revelou ser positivo. Em<br />
contrapartida, com os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, revelou ser negativo em virtude da cultura<br />
que rege essa organização pública.<br />
Palavras-Chaves: 1) Valores <strong>individuais</strong>; 2) Valores <strong>organizacionais</strong>; 3) Qualidade de vida<br />
no trabalho.
ABSTRACT<br />
Values are principles that lead the aspirations, actions and valuations, establishing rules,<br />
individually or socially, in order to get what is needed or wished. Organizations also have<br />
their values, directing actions to reach the goals. They constitute the nucleons of the<br />
organizational culture and define the organization’s success. This research had as general<br />
goal the checking of individual values; organizational values and the Program of Life<br />
Quality at Work. As its specific goals raising the axiological priorities of the workers, the<br />
organizational values, according to their perception and the reason for the creation of the<br />
Program of life Quality at Work, developed by the organization that was studied. The<br />
research had a descriptive and exploitative characteristic and took place in a public<br />
organization in Goiania, which provides services in the health and environment areas. It’s<br />
about a case study, compound by two empirical studies. First, Study 1 was made, based on<br />
the Typology of Motivational Domination Of Values, developed by Schwartz and Bilsky<br />
(1987) and Schwartz (1992, 1994), who used the “Scale of Individual Values”<br />
(SCHWARTZ, 1993) as an instrument data gathering. Basing on the Inventory of<br />
Organizational Values, from Tamayo and Mendes (1999), organizational values were<br />
raised and analyzed according to the workers perception. The technique that was used for<br />
data analysis was setting of the mean and standard deviation of the individual and<br />
organizational values and the Coefficient of Relationship (r from Pearson) among these<br />
some values. The results from Study 1 indicated Benevolence, Conformity, Universalism<br />
and Safety as the workers axiological priorities, and Conservation, Hierarchy and<br />
Dominion, values that direct the organization. The relation among the individual and the<br />
organizational values indicated that the organizational values Conservation, Hierarchy and<br />
Dominion presented significant relation only to the motivational kind Conformity. In Study<br />
2 the instrument for data gathering was a “a semi-structuralized” interview. The interviews<br />
were analyzed through a graphic technique of Lane’s (1985) speech. Study 2 was divided<br />
into 2 groups: the group G1, composed by the workers and the group G2, by the directors<br />
of the Program of Life Quality at Work. The results of Study 2 also demonstrated the<br />
presence of the Conformity individual value and of the Conservation and Hierarchy<br />
organizational values. It still showed a contradiction in the director’s speeches and that the<br />
Program of Life Quality at Work is about a program, which was created in the informality.<br />
As for the individual values, the Program of Life Quality at Work revealed itself as<br />
positive. On the other hand, as for the organizational values, the program revealed itself as<br />
negative due to the culture that rules this public organization.<br />
Key-words: 1) Individual Values 2) Organizational Values 3) Quality of life at work.
APRESENTAÇÃO<br />
O mundo do trabalho vem passando por profundas transformações. Temáticas<br />
como a globalização, flexibilização, competitividade, novas formas de organização do<br />
trabalho, têm lugar garantido nas análises daqueles que atuam ou estudam as organizações.<br />
Na fase denominada terceira Revolução Industrial, as pessoas que atuam nas organizações<br />
passam a ser fonte de maior interesse, pois, conforme assinalam alguns autores, são os<br />
colaboradores que possibilitam a vantagem competitiva nas organizações.<br />
Essas transformações geram um ambiente complexo, marcado pelos avanços<br />
tecnológicos e científicos, mudanças de conceito, de <strong>valores</strong> e quebra de paradigmas que<br />
norteiam todos os segmentos da sociedade.<br />
Tal complexidade pode ser demonstrada pelos seguintes fatos: o aumento do<br />
volume de dados e informações, cada vez mais acessíveis, face às novas tecnologias de<br />
informação e de comunicação, e o fator tempo, que se torna cada vez mais essencial e<br />
decisivo, exigindo a rápida tomada de decisões; a globalização dos mercados: a troca não<br />
apenas de produtos, mas de tecnologia, conhecimento e informação <strong>entre</strong> os países. Nas<br />
organizações, essa troca representa ao mesmo tempo uma grande oportunidade e um<br />
grande desafio, elevando os níveis de competitividade e exigindo vigília constante do<br />
ambiente.<br />
No ambiente globalizado, turbulento, onde as interações sociais ocorrem <strong>entre</strong><br />
pessoas de diferentes regiões e países, a palavra cultura surge quase automaticamente, em<br />
qualquer interação estão os <strong>valores</strong>, hábitos, crenças, ideologias, atitudes. Junto a tudo isso<br />
está a maneira própria de agir, de optar, em resumo, de decidir.<br />
Para a psicologia social, o mundo do trabalho proporciona um amplo espectro<br />
para o desenvolvimento de inúmeros estudos, pois permite a análise das relações <strong>entre</strong> os<br />
indivíduos e seu trabalho e de questões como cultura organizacional, <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>,<br />
<strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> e qualidade de vida no trabalho.<br />
Para Hofstede (1980, p. 21), a cultura é “a programação coletiva mental que<br />
distingue os membros de grupos diferentes.”
17<br />
Ao conceituar cultura como o estabelecimento de um programa coletivo da<br />
mente que diferencia os membros de um grupo humano do outro, Hofstede mostra com<br />
clareza a previsibilidade do comportamento dos indivíduos de modo geral, principalmente<br />
daqueles mais conhecidos, pertencentes ao mesmo grupo, pois para ele cada indivíduo<br />
recebe programa mental estável ao longo do tempo, direcionando-o para se comportar em<br />
determinadas situações.<br />
A cultura é um dos pontos-chave na compreensão das ações humanas,<br />
funcionando como um padrão coletivo que identifica os grupos, suas maneiras de perceber,<br />
pensar, sentir e agir. Assim, mais do que um conjunto de regras, de hábitos e de artefatos,<br />
cultura significa construção de significados partilhados pelo conjunto de pessoas<br />
pertencentes a um mesmo grupo social.<br />
Além disso, o autor considera os <strong>valores</strong> o centro da cultura, revelando<br />
tendências para preferir certos estados em detrimento de outros.<br />
Para Rokeach (1973), os <strong>valores</strong> significam uma crença duradoura, um modo<br />
específico de conduta ou um estado-fim de existência e têm a função de orientar e<br />
direcionar essa conduta em diferentes situações na vida do indivíduo.<br />
Schwartz e Bilsky (1994) salientam que os <strong>valores</strong> são expressos por meio de<br />
domínios motivacionais e estão fundamentados em um conjunto de motivações universais,<br />
que originam e organizam os <strong>valores</strong> nas diferentes culturas. Funcionam como padrões<br />
para julgar e justificar as ações e são adquiridos tanto por meio da socialização de <strong>valores</strong><br />
de grupos dominantes quanto por meio de experiências de aprendizado único do indivíduo.<br />
Assim, denota-se que os <strong>valores</strong> são inicialmente apreendidos na socialização<br />
primária, por isso constituem a identidade do indivíduo, e ainda têm o importante papel de<br />
atribuir um sentido à ação dos mesmos, ajudar a fazer escolhas, resolver conflitos e tomar<br />
decisões.<br />
Os <strong>valores</strong> no contexto organizacional têm sido estudados tanto nas suas<br />
relações com o trabalho propriamente dito quanto com a cultura organizacional. Tamayo<br />
(1996) afirma que os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> são crenças e princípios que ensinam o que é<br />
bom e desejável para a organização, com relação às metas <strong>organizacionais</strong>, orientando a<br />
sua vida. Eles também constituem o núcleo da cultura organizacional quando se referem às<br />
organizações.<br />
Os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> servem à própria sobrevivência da organização e,<br />
por essa razão, são usados para mediar conflitos na solução de problemas. São um dos
18<br />
elementos responsáveis pela socialização das normas e regras que definem formas<br />
específicas de o trabalhador vivenciar sua tarefa e compartilhar suas relações sociais,<br />
afetivas e profissionais no contexto organizacional.<br />
Búrigo (1997) afirma que a Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) busca<br />
humanizar as relações laborais na organização, mantendo um vínculo estreito com a<br />
produtividade e, principalmente, a satisfação do trabalhador no seu ambiente de trabalho.<br />
Constitui-se ainda em condição de trabalho, associada ao bem-estar, à saúde e à segurança<br />
do trabalhador.<br />
Entre tantos fatores que determinam a qualidade de vida de um indivíduo, o<br />
trabalho, talvez seja um dos mais marcantes, por dois motivos, primeiro, é por meio dele<br />
que os indivíduos conseguem impulsionar outros fatores como a educação, a cultura, o<br />
lazer, etc.; e segundo, de um modo geral, o indivíduo passa a maior parte de seu tempo<br />
trabalhando. Nesse sentido, o ambiente organizacional é um grande influenciador na<br />
qualidade de vida dos trabalhadores, o que justifica a grande preocupação atual das<br />
organizações em avaliá-la. Fazer investimentos necessários à valorização do potencial<br />
humano e à sua capacitação para enfrentar os desafios que ora se apresentam ao mundo do<br />
trabalho tornaram-se interesses fundamentais para o crescimento e competitividade<br />
organizacional.<br />
A presente pesquisa é de caráter descritivo e exploratório e se divide em duas<br />
partes, sendo a primeira relativa aos capítulos teóricos e a segunda aos estudos empíricos.<br />
Trata-se de um estudo de caso que buscou a integração das abordagens<br />
quantitativa e qualitativa em pesquisa, para, com essa modalidade retratar uma unidade ou<br />
uma situação particular, analisando-a profundamente, reunindo informações e detalhes, a<br />
fim de permitir a compreensão da totalidade da referida situação (BRUYNE, HERMAN e<br />
SCHOUTHEETE, 1997; CHIZOTTI, 1995; GODOY, 1995; RICHARDSON, 1985).<br />
A organização onde se desenvolveu a pesquisa é uma organização pública que<br />
há alguns anos convive com a expectativa de um processo de privatização a cada nova<br />
gestão governamental, dependendo somente da regulamentação de normas para que seja<br />
efetivada.<br />
A pesquisa teve como objetivo analisar a relação <strong>entre</strong> <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>,<br />
<strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> e Programa de Qualidade de Vida no Trabalho, tomando como<br />
base empírica uma organização estatal com sede em Goiânia - GO.
19<br />
Seus objetivos específicos foram levantar dados acerca dos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong><br />
dos trabalhadores e <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, segundo a percepção dos mesmos, além de<br />
conhecer o motivo da criação e como se apresentava nesse contexto o Programa de<br />
Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT), e a relação, na prática, <strong>entre</strong> <strong>valores</strong> mencionados<br />
e o PQVT.<br />
Os objetivos específicos foram fundamentais no sentido de nortear o processo<br />
de conhecimento do objeto da pesquisa e de buscar a compreensão e o sentido da análise<br />
dos resultados dos dois estudos.<br />
Tamayo e Gondim (1996) afirmam que o levantamento dos <strong>valores</strong><br />
<strong>organizacionais</strong> está intimamente ligado à capacidade da organização para atuar em sua<br />
área. Eles estão além das próprias normas definidas pela organização e constituem uma<br />
espécie de ideologia – as normas da organização estão enraizadas nos <strong>valores</strong> e podem ser<br />
consideradas até mesmo operacionalização deles.<br />
Uma outra abordagem para se levantarem os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> consiste,<br />
segundo Tamayo (1996), em estudar a percepção que os trabalhadores têm dos <strong>valores</strong> que<br />
orientam a vida da organização, percepção que é resultante do discurso dos diretores,<br />
gerentes e colegas, como também dos documentos oficiais da mesma.<br />
Na segunda abordagem, os <strong>valores</strong> são analisados em sua hierarquia, de acordo<br />
com a percepção que os trabalhadores têm do sistema de <strong>valores</strong> da organização. Segundo<br />
o mesmo autor, o estudo dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> a partir dessa percepção favorece a<br />
sua compreensão mais do que apenas a descrição objetiva de conteúdo de documentos<br />
oficiais.<br />
Em vista do que foi proposto, escolheu-se trabalhar os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong><br />
a partir da percepção dos trabalhadores de uma organização pública que, por questões de<br />
ética e sigilo, foi denominada Interprise.<br />
Entende-se que este estudo, em sua análise e na discussão referente à<br />
compreensão do fenômeno estudado, tendo como centralidade os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>,<br />
<strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> e a Qualidade de Vida no Trabalho, parecem pertinentes, haja vista<br />
que poderá contribuir para novas pesquisas sobre o tema.<br />
Em um mundo onde o trabalho depende do conhecimento e da qualidade de<br />
vida no trabalho, e ambos são indispensáveis para o sucesso da organização, deve-se<br />
buscar a valorização da relação <strong>entre</strong> o homem e o trabalho, pois é por meio dela que o<br />
homem cria sua história e a si mesmo.
PARTE I<br />
Esta parte da dissertação é composta por três capítulos teóricos.<br />
O primeiro capítulo apresenta os conceitos e abordagens de cultura de uma<br />
forma geral e o conceito e as principais perspectivas e abordagens no estudo da cultura<br />
organizacional, considerando-a como contexto maior para o estudo dos <strong>valores</strong>. Ainda<br />
discorre a contextualização histórica da organização pública, bem como suas<br />
características e o tipo de cultura predominante nesse tipo de organização.<br />
O segundo capítulo discute as teorias sobre <strong>valores</strong> humanos de modo que<br />
explicam a sua estrutura e formação. Estas teorias são propostas por Rokeach (1968, 1973),<br />
Schwartz (1992, 1994) e Tamayo (1993), no que tange aos seus conceitos, tipos, estruturas,<br />
contribuições e críticas. Ainda aborda os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> enfatizando as<br />
prioridades axiológicas da organização na concepção de Tamayo (1996).<br />
O terceiro capítulo apresenta o processo evolutivo dos modelos de Qualidade<br />
de Vida no Trabalho - QVT, as definições de Qualidade de Vida no Trabalho,<br />
considerando que não existe um consenso acerca da conceituação do termo QVT e,<br />
apresenta, também, algumas abordagens sobre Qualidade de Vida no Trabalho de<br />
pesquisadores que, de acordo com as suas particularidades, auxiliam na compreensão deste<br />
tema. Por fim, apresenta algumas pesquisas sobre Qualidade de Vida no Trabalho<br />
desenvolvidas no Brasil.
PARTE II<br />
Esta parte da dissertação é composta por dois estudos empíricos denominados<br />
estudo 1 e estudo 2.<br />
O estudo 1 identifica e descreve o método utilizado na primeira fase da<br />
presente pesquisa. Descreve, também, os critérios utilizados para a escolha da população,<br />
bem como os instrumentos utilizados na coleta de dados, no que se refere aos <strong>valores</strong><br />
<strong>individuais</strong> e os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> e quais foram os procedimentos adotados para a<br />
realização da pesquisa. Por fim, descreve a forma do tratamento estatístico aplicado aos<br />
dados obtidos por meio dos inventários de <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>.<br />
O estudo 2 visou conhecer e avaliar a percepção dos trabalhadores sobre o<br />
PQVT desenvolvido pela organização Interprise, como foi criado e como ele se apresenta<br />
no contexto da organização e verificar se há relação na prática <strong>entre</strong> QVT e os Valores<br />
Individuais e Organizacionais, além de conhecer, também, as prioridades axiológicas dos<br />
gestores do PQVT no que tange os Valores Individuais e Organizacionais. E ainda<br />
caracteriza a amostra, a forma como o roteiro da <strong>entre</strong>vista foi construído, os<br />
procedimentos de aplicação, a técnica de tratamento dos dados e a análise dos resultados.
CAPÍTULO 1<br />
CULTURA ORGANIZACIONAL E ORGANIZAÇÕES PÚBLICAS<br />
1. Conceitos de Cultura<br />
A cultura é um dos pontos-chave na compreensão das ações humanas,<br />
funcionando como um padrão coletivo que identifica os grupos, suas maneiras de perceber,<br />
pensar, sentir e agir.<br />
Segundo Motta e Caldas (1997, p. 16), a<br />
cultura é um conceito antropológico e sociológico que comporta<br />
múltiplas definições. Para alguns, a cultura é a forma pela qual uma<br />
comunidade satisfaz as suas necessidades materiais e psicossociais. Para<br />
outros, a cultura é a adaptação em si, é a forma pela qual uma<br />
comunidade define seu perfil em função da necessidade de adaptação ao<br />
meio ambiente.<br />
Percebe-se, na definição de cultura apresentada pelos autores, que está presente<br />
a idéia de sobrevivência, estando implícita a noção de ambiente como contexto para a<br />
busca de sobrevivência e crescimento.<br />
Jermier (1991) e Rodrigues (1991) postulam que a cultura é o produto<br />
objetivado do trabalho subjetivo dos indivíduos, ou seja, é um produto social reificado nos<br />
símbolos, rituais, relacionamentos, hábitos, <strong>valores</strong>, discursos, idéias, conhecimentos do<br />
ser humano. Todavia, as manifestações culturais somente serão compreendidas quando<br />
contextualizadas, considerando a história, a percepção e a interpretação desses indivíduos.<br />
É pela cultura que os indivíduos percebem a realidade social e é por ela também que<br />
constroem o significado para as suas vidas.<br />
Segundo Motta (2000, p.188-189) “a cultura designa, classifica, corrige, liga e<br />
coloca em ordem. Assim, a cultura desenvolve princípios de classificação que permitem<br />
ordenar a sociedade em grupos distintos, grupos totêmicos e até categorias profissionais.”<br />
Isso quer dizer que a cultura, com as suas peculiaridades, integra os indivíduos de
23<br />
determinado contexto por meio dos significados construídos, compartilhados socialmente e<br />
aprendidos ao longo do processo histórico, dando um sentido às ações e orientação no<br />
tempo e espaço. A cultura fornece um referencial que permite aos indivíduos dar um<br />
sentido ao mundo em que vivem e às suas próprias ações.<br />
Aktouf (1994, p. 47) considera a cultura “algo muito vasto, muito importante,<br />
inscrita profundamente nas estruturas sociais, na história, no inconsciente, na experiência<br />
vivida e no vir a ser coletivo humano.”<br />
Percebe-se, nesse conceito, que o autor considera que há uma interdependência<br />
<strong>entre</strong> os fatores: história, estrutura social, condições de vida e experiências subjetivas dos<br />
indivíduos. Ou seja, pode-se perceber um comportamento convencional e esperado.<br />
Cultura dá identidade a um grupo social, que, por sua vez, cria e recria sua realidade,<br />
modificando e transformando sua cultura. Assim mesmo, no decorrer do tempo, elementos<br />
básicos da cultura desse grupo permanecem em sua estrutura social, possibilitando sua<br />
continuidade.<br />
A cultura se torna evidenciada na história e na linguagem de um grupo e é<br />
comunicada por meio de várias manifestações como: os ritos de passagem, usados quando<br />
um indivíduo entra ou sai de um grupo; ritos de integração, usados para construir vínculos<br />
<strong>entre</strong> os membros de um grupo; ritos de intensificação, usados para motivar a adesão do<br />
indivíduo às normas e <strong>valores</strong>.<br />
A linguagem e a história são meios para a transmissão da cultura, fornecendo<br />
pistas sobre <strong>valores</strong> e normas a serem seguidos. O estudo da história e da linguagem pode<br />
revelar os <strong>valores</strong> que orientam o comportamento de um determinado grupo em relação às<br />
metas a serem alcançadas.<br />
Hall (apud MACÊDO, 1999, p.41) considera que a cultura possui três<br />
características: “ela não é inata, e sim aprendida; suas distintas facetas estão interrelacionadas;<br />
ela é compartilhada e de fato determina os limites dos distintos grupos. A<br />
cultura é o meio de comunicação do homem”.<br />
Entre as principais inquietações do indivíduo, está a busca de uma explicação<br />
para a diversidade <strong>entre</strong> os hábitos dos diferentes povos, apesar da unidade biológica da<br />
espécie (LARAIA, 1993). Ainda hoje a antropologia cultural, um dos campos da<br />
antropologia geral, desenvolve vários estudos relacionados a essa inquietação, levantando,<br />
discutindo e interpretando diferenças, traços comuns e transformações culturais de países,<br />
etnias e organizações.
24<br />
Os objetos de estudo da antropologia cultural são os mais diversos, podendo<br />
partir de um enfoque sobre determinado rito de uma comunidade (GEERTZ, 1989), até<br />
estudos que discutem a emergência de uma cultura mundial (ORTIZ, 1994).<br />
Para DaMatta (1985) “a cultura é um mapa, um receituário, um código através<br />
do qual as pessoas de um dado grupo, pensam, classificam, estudam e modificam o mundo<br />
e si mesmos.”<br />
Para esse autor, a cultura é uma coleção de crenças, expectativas, <strong>valores</strong><br />
partilhados pelos membros de um grupo por meio de códigos e transmitidos de geração em<br />
geração. Os indivíduos criam normas, ou seja, regras de conduta, que definem os<br />
comportamentos aceitáveis. Mitos e rituais, muitas vezes implícitos, que emergem ao<br />
longo do tempo, reforçam certas normas ou <strong>valores</strong> e explicam porque razão um dado<br />
aspecto da cultura é tão importante.<br />
Analisadas essas definições, nota-se que elas possuem raízes comuns no modo<br />
de compreender a cultura de um grupo no que diz respeito aos seus hábitos, rituais e<br />
significados, variando de um grupo para outro. Cada cultura, para os autores citados,<br />
contém hábitos, ritos mais ou menos desenvolvidos, posturas e significados próprios para<br />
lidar com questões universais.<br />
Por outro lado, nota-se também que enquanto para alguns autores a cultura traz<br />
a idéia de sobrevivência, para outros a ela desenvolve princípios de classificação. Ou seja,<br />
para uns, está implícita a noção de ambiente como contexto para a busca de sobrevivência<br />
e crescimento; para outros, os indivíduos criam normas, regras de conduta que definem os<br />
comportamentos esperados.<br />
Segundo Hofstede (1980, p.21) a cultura é “a programação coletiva mental<br />
que distingue os membros de grupos diferentes”. Em outras palavras, como a cultura foi<br />
definida com um significado singular, particular, é oportuno que se estude a cultura pelos<br />
<strong>valores</strong> dos indivíduos inseridos nas culturas.<br />
Para Hofstede, a cultura compreende sistema de <strong>valores</strong> como blocos<br />
constituintes que vão “apresentar uma ampla tendência a preferir certas situações<br />
específicas a outras” (HOFSTEDE, 1980, p.19).<br />
Ao conceituar cultura como o estabelecimento de um programa coletivo da<br />
mente que diferencia os membros de um grupo humano de outro, Hofstede quer mostrar<br />
com clareza a previsibilidade do comportamento dos indivíduos de modo geral,<br />
principalmente daqueles mais conhecidos, pertencentes ao mesmo grupo, pois para ele
25<br />
cada indivíduo recebe um programa mental que é estável ao longo do tempo e direciona o<br />
indivíduo para comportar-se nas situações.<br />
Assim, programação mental é a denominação do autor para cultura, querendo<br />
com isso explicar a abrangência e profundidade que a cultura exerce na vida dos indivíduos.<br />
De acordo com Hofstede (1980, p.15-16), a programação mental dos<br />
indivíduos é particularmente única e parcialmente compartilhada com outros, sendo<br />
possível distinguir três níveis de programas mentais:<br />
a) Universal: o mais básico, este é o nível de programação mental,<br />
compartilhado por todos, ou quase todos do gênero humano. Este é o<br />
sistema de operação biológico do corpo humano, mas inclui uma grande<br />
extensão de comportamentos expressivos tais como rir, chorar e<br />
comportamentos associativos e agressivos os quais são também<br />
encontrados nos animais; b) Coletivo: este nível de programação mental<br />
é compartilhado com algumas, mas não com todas as pessoas; ele é<br />
comum para pessoas que pertencem a um certo grupo ou categoria, mas<br />
diferente <strong>entre</strong> pessoas pertencentes a outros grupos ou categorias. Toda<br />
área da cultura humana subjetiva (chamada “subjetiva” para distinguila<br />
da dos artefatos humanos “objetivos”) pertence a este nível. Nele<br />
inclui a linguagem na qual nos expressamos, a deferência mostrada pelos<br />
mais velhos, a distância física mantida de outras pessoas, para manter-se<br />
confortável, o modo que percebemos as atividades humanas em geral<br />
como: comer, fazer amor e o cerimonial que os envolve; c) Individual:<br />
nível de programação humana que é verdadeiramente único. Duas<br />
pessoas não são programadas exatamente iguais; até mesmo se elas são<br />
gêmeas criadas juntas. Este é o nível de individualização da<br />
personalidade e ele fornece uma larga variedade de comportamentos<br />
alternativos dentro da mesma cultura.<br />
Segundo Hofstede (1980), os programas mentais podem ser herdados ou<br />
aprendidos após o nascimento. D<strong>entre</strong> os três níveis de programas mentais apresentados, o<br />
nível universal é totalmente herdado. Ele faz parte do código genético comum a todo<br />
indivíduo. No nível individual, uma parte da programação é herdada. Torna-se, por<br />
exemplo, difícil explicar as diferenças quanto a compatibilidades e temperamentos <strong>entre</strong><br />
crianças dos mesmos pais, criadas em ambientes iguais. No nível coletivo, grande parte do<br />
programa mental, ou o programa completo, chega ao indivíduo por meio da aprendizagem<br />
compartilhada com pessoas que passaram pelo mesmo processo de aprendizagem, sendo,<br />
portanto, uma programação mental. A cultura é, nessa visão, aprendida no ambiente social.<br />
É importante ressaltar que Hofstede faz uma observação quanto ao conceito de<br />
cultura comparado a uma “programação mental”, podendo ser acusado de uma visão<br />
determinista, fechada, subtraindo do indivíduo sua capacidade de intervenção para
26<br />
mudanças criativas e possíveis transformações da cultura. Hofstede (1994, p. 4) esclarece<br />
que “o comportamento dos indivíduos é apenas parcialmente pré-determinado pelo<br />
programa mental, pois têm habilidade básica para se desviarem dele, e reagir de modo<br />
criativo, novo, destrutivo ou inesperado.”<br />
Para Hofstede, a palavra cultura é utilizada para descrever sociedades inteiras,<br />
ao passo que, para grupos dentro delas, é usado o termo subcultura. Cultura, nesse sentido,<br />
inclui sistemas de <strong>valores</strong> e <strong>valores</strong> compõem o núcleo da cultura, como já mencionado<br />
anteriormente. “Ao estudar ‘<strong>valores</strong>’ nós comparamos indivíduos; ao estudar ‘cultura’ nós<br />
comparamos sociedades” (HOFSTEDE, 1980, p.28).<br />
Percebe-se, então, no conceito de Hofstede, um dos significados dados por<br />
muitas línguas ocidentais para cultura: civilização ou refinamento da mente.<br />
De acordo com Hofstede (1994), as diferentes manifestações culturais podem<br />
ser vistas por meio de quatro fatores: símbolos, heróis, rituais e <strong>valores</strong>. Os símbolos<br />
representam a parte mais visível, e os <strong>valores</strong>, a mais profunda manifestação da cultura.<br />
Os símbolos são palavras, gestos, figuras ou objetos que carregam um<br />
significado particular, sendo reconhecidos apenas por aquelas pessoas que compartilham a<br />
cultura. Os heróis são pessoas vivas ou mortas, reais ou imaginárias, que possuem<br />
características que são altamente valorizadas na cultura e servem como modelos para<br />
comportamento. Os rituais são atividades coletivas, tecnicamente supérfluas no<br />
atingimento de um objetivo, mas dentro da cultura são considerados socialmente<br />
essenciais. Eles são cumpridos, portanto, para perpetuação da cultura. Os <strong>valores</strong><br />
significam largas tendências de preferências a certos estados de coisas sobre outros<br />
(HOFSTEDE, 1994).<br />
Figura 1 – Diagrama das diferentes manifestações de cultura (HOFSTEDE, 1994)
27<br />
Como já foi dito, os <strong>valores</strong> como blocos constituintes da cultura vão<br />
“apresentar uma ampla tendência a preferir certas situações específicas a outras.”<br />
(HOFSTEDE, 1980, p.19), sendo ela construída nas interações sociais, compartilhada<br />
pelos membros das sociedades e transmitida no tempo pelas gerações (TRIANDIS, 1994).<br />
Assim, a cultura e os <strong>valores</strong> estão presentes em toda interação social e<br />
influenciam o modo como as pessoas selecionam, interpretam, processam e usam a<br />
informação.<br />
Falar em cultura implica falar sobre a capacidade de adaptação do indivíduo à<br />
realidade do grupo no qual está inserido. A cultura, com a construção do significado social<br />
e normativo, possibilita que um grupo se fortaleça ou se desintegre. A cultura vem<br />
expressar os <strong>valores</strong> e as crenças que os membros desse grupo partilham. Tais <strong>valores</strong><br />
manifestam-se por meio de símbolos, como mitos, rituais, histórias, lendas e uma<br />
linguagem especializada, orientando os indivíduos de uma referida cultura na forma de<br />
pensar, agir e tomar decisões.<br />
O indivíduo é essencialmente um ser de cultura. Nesse sentido, a cultura torna<br />
possível a transformação da natureza e faz com que os povos se diferenciem pelas suas<br />
elaborações culturais, invenções e diferentes resoluções e encaminhamentos dos<br />
problemas.<br />
2. Cultura Brasileira<br />
Freitas (1997) procurou levantar os traços da cultura brasileira que mais<br />
influenciam o espaço organizacional. Ao ressaltar que a cultura brasileira apresenta<br />
diversidades sem ser desordenada, o autor propõe cinco traços.<br />
O primeiro deles refere-se à Hierarquia, que denota tendência à centralização<br />
do poder dentro dos grupos sociais, distanciamento nas relações <strong>entre</strong> diferentes grupos<br />
sociais e passividade e aceitação dos grupos inferiores.<br />
O segundo trata do Personalismo, que mostra uma sociedade baseada em<br />
relações pessoais, a busca de proximidade e afeto nas relações e paternalismo no sentido de<br />
domínio moral e econômico.<br />
O terceiro é a Malandragem, que revela a flexibilidade e adaptabilidade como<br />
meio de navegação social e o “jeitinho”.
28<br />
O quarto traço característico da cultura brasileira é o Sensualismo, que mostra<br />
o gosto pelo sensual e pelo exótico nas relações sociais.<br />
Por fim, o quinto aspecto trata-se do Aventureiro, revelando que o brasileiro é<br />
mais sonhador do que disciplinado e tem uma aversão ao trabalho manual ou metódico.<br />
Barros e Prates (1996) procuram fazer uma integração dos traços culturais<br />
brasileiros, montando o que eles chamam de modelo de ação cultural brasileiro. Tal<br />
modelo prevê um sistema composto de quatro subsistemas: o institucional ou formal, o<br />
pessoal informal, o dos líderes e a dos liderados.<br />
No subsistema líderes, aparecem os traços de concentração de poder e<br />
personalismo, que resultariam no traço de paternalismo. Este traço aponta para relações<br />
líder-liderados que envolvem trocas tanto por um trabalho com remuneração quanto por<br />
dedicação e colaboração no sentido de favorecimento.<br />
No subsistema liderados, o indivíduo tem uma postura de espectador e de<br />
evitar conflitos, que resultaria num traço de flexibilidade, que expressa tanto um lado<br />
criativo como um lado de adaptação a imposições e desigualdades.<br />
No subsistema formal, tem-se a postura de espectador e a concentração de<br />
poder, resultando no formalismo, ou seja, na discrepância <strong>entre</strong> o direito e o fato. Da<br />
combinação dos traços anteriores, tem-se ainda a impunidade.<br />
No subsistema informal, encontra-se personalismo e evitar conflito,<br />
redundando numa característica de lealdade pessoal.<br />
Os autores argumentam que, no Brasil, o membro do grupo valoriza mais as<br />
necessidades do líder e dos outros membros do grupo do que as necessidades de um<br />
sistema maior no qual está inserido.<br />
Nota-se a coerência e a complementaridade <strong>entre</strong> os dois trabalhos citados. Um<br />
ou outro ponto é mais destacado em cada um deles, mas, contemplando-os como um todo,<br />
pode-se ter uma visão abrangente da cultura nacional e de suas possíveis implicações no<br />
que se refere à sua influência sobre a cultura das organizações brasileiras.<br />
3. As Organizações e a Cultura Organizacional<br />
As organizações estão inseridas dentro de um ambiente e interagem com ele,<br />
recebendo dele influências e influenciando-o. Os indivíduos que atuam nas organizações<br />
são agentes que contribuem para esse intercâmbio constante. Os <strong>valores</strong> dos indivíduos,
29<br />
por sua vez, conduzem à formação da cultura da organização. Essa é a raiz das decisões<br />
estratégicas de uma organização. Hall (1982) afirma que a cultura é uma das condições do<br />
ambiente externo de vital importância e de difícil mensuração.<br />
Smircich (1983) compreende a organização como um organismo adaptativo<br />
que existe por meio de processos de trocas com o ambiente. Na visão da autora, a<br />
organização é também um sistema de conhecimento. A noção de organização repousa<br />
sobre a rede de significados subjetivos que os membros partilham e que parecem funcionar<br />
de uma maneira regular.<br />
As organizações são realidades sociais construídas de forma compartilhada.<br />
Morgan (1996, p.36) salienta que<br />
a estrutura organizacional, regras, políticas, objetivos, missões,<br />
descrições de cargos e procedimentos operacionais padronizados<br />
desempenham uma função interpretativa... atuam como pontos primários<br />
de referência para o modo pelo qual as pessoas pensam e dão sentido<br />
aos contextos nos quais trabalham.<br />
Para Morgan, toda organização está inserida em um espaço cultural e social e é<br />
este espaço que determina como a organização será administrada. Toda organização recebe<br />
influência do contexto cultural onde se insere.<br />
Segundo Dias (1998), a organização é um conjunto de relações <strong>entre</strong> pessoas<br />
que lhe permitem operar de forma coesa. Relações são os resultados das comunicações<br />
diretas e indiretas que ocorrem <strong>entre</strong> as pessoas no decorrer do tempo. As relações<br />
fundamentais da organização devem permanecer inalteradas, mesmo que se alterem as<br />
pessoas.<br />
Diante do que foi defendido pelos autores sobre organizações, percebe-se que<br />
raramente elas são propostas como um fim em si mesmas. São instrumentos criados para se<br />
atingirem outros fins. A organização depende das pessoas para atingir seus objetivos. É<br />
por meio da interação <strong>entre</strong> as pessoas que se definem os propósitos das organizações. É<br />
por isso que as idéias sobre tarefas, metas, propósitos e objetivos se tornaram conceitos<br />
<strong>organizacionais</strong> tão fundamentais.<br />
Fleury (1995, p. 27) define que<br />
cultura organizacional é um conjunto de <strong>valores</strong>, expressos em elementos<br />
simbólicos e em práticas <strong>organizacionais</strong>, que em sua capacidade de<br />
ordenar, atribuir significações, construir a identidade organizacional,
30<br />
tanto agem como elementos de comunicação e consenso, como<br />
expressam e instrumentalizam relações de dominação.<br />
Nesse contexto de cultura organizacional, a autora afirma que os <strong>valores</strong> são<br />
uma das expressões da cultura representada nos símbolos e nas práticas diárias da<br />
organização. Diante de todas as práticas que a cultura produz, ela evidencia as relações de<br />
poder vivenciadas dentro da organização. A noção de poder e os aspectos correlatos,<br />
principalmente os interesses, estão vinculados essencialmente à noção de cultura<br />
organizacional.<br />
Na década de 1950 já havia trabalhos que enfatizavam a cultura como<br />
fenômeno organizacional. Na década de 1980, porém, desenvolveu-se um interesse notório<br />
pelo estudo da cultura organizacional, cujo fator predominante, assinalado por Freitas<br />
(1991), foi o crescente desempenho tecnológico e econômico do Japão, atribuído<br />
principalmente à sua formação cultural.<br />
Segundo Mintzberg et al. (2000), a cultura organizacional é a base da<br />
organização. São as crenças comuns que se refletem nas tradições e nos hábitos, bem como<br />
em manifestações mais tangíveis – histórias, símbolos, ou mesmo edifícios e produtos.<br />
Para o autor, a força de uma cultura está em legitimar as crenças e os <strong>valores</strong><br />
compartilhados <strong>entre</strong> os membros de uma organização. A cultura organizacional não<br />
existiria sem os indivíduos.<br />
Ao abordar sobre cultura é válido mencionar como os indivíduos estão<br />
estruturados nas organizações. De acordo com Mintzberg (1995), as cinco estruturas que<br />
compõem as organizações seriam: núcleo operacional, cúpula estratégica, linha<br />
intermediária, tecnoestrutura e assessoria de apoio.<br />
O núcleo operacional da organização engloba aqueles participantes que<br />
perfazem o trabalho básico relacionado diretamente com a produção de bens ou prestação<br />
de serviços. A cúpula estratégica é encarregada de assegurar que a organização cumpra a<br />
sua missão de maneira eficaz e também de satisfazer as exigências daqueles que controlam<br />
ou exercem poder sobre a organização. A linha intermediária é a que faz a ligação <strong>entre</strong> a<br />
cúpula estratégica e o núcleo operacional, formando uma cadeia que vai desde os gerentes<br />
de mais alto nível até os supervisores de primeira linha. Na tecnoestrutura encontram-se os<br />
analistas que prestam serviços à organização atuando sobre as tarefas dos outros. A<br />
assessoria de apoio são numerosas unidades especializadas, com o fim de dar apoio para a<br />
organização fora de seu fluxo de trabalho operacional.
31<br />
Segundo Mintzberg (1995), as cinco estruturas são destinadas a ser tratadas<br />
como um só sistema, como um quadro de referência ou teoria integrado para guiar na<br />
tentativa de compreender e delinear organizações do mundo real.<br />
Segundo o mesmo autor, toda organização está inserida dentro de um contexto<br />
social, político, econômico e cultural, que a leva a fazer modificações nas estruturas<br />
visando tanto interferir nesses contextos como adaptar-se a eles. Para tal, interpretam os<br />
contextos internos e externos de modo a assegurar sua competitividade e sobrevivência.<br />
Deve-se, portanto, considerar a realidade como socialmente construída e, nesse sentido, a<br />
estrutura passa a ser concebida não somente em função de seus atributos estruturais<br />
prescritos, mas também em função dos padrões emergentes de interação, que se originam<br />
da interpretação das normas e ações, abarcando também a realidade subjetiva que é<br />
inerente às organizações.<br />
A cultura organizacional é um conceito essencial à construção das estruturas<br />
<strong>organizacionais</strong>. Percebe-se, então, que a cultura de uma organização será um conjunto de<br />
características que a torna única perante qualquer outra. A cultura assume o papel de<br />
legitimadora do sistema de <strong>valores</strong>, expressos através de rituais, mitos, hábitos e crenças<br />
comuns aos membros de uma organização, que assim produzem normas de comportamento<br />
genericamente aceitas por todos.<br />
Segundo Smircich (1985, p. 58)<br />
cultura descreve um atributo ou qualidade interna de um grupo... Cultura<br />
é um conjunto bastante estável de suposições implícitas, de crenças<br />
compartilhadas, significados e <strong>valores</strong> que formam um tipo de pano de<br />
fundo para ação.<br />
Em outras palavras, a autora afirma que a cultura é um conjunto de<br />
pressupostos que legitima a ação; que a cultura tem em seu núcleo um conjunto estável de<br />
<strong>valores</strong> que define as normas, regras, procedimentos e objetivos de um grupo que orienta<br />
os indivíduos em suas ações, decisões e comportamentos; ou seja, a cultura funciona como<br />
um mecanismo regulatório-adaptativo, pois permite a articulação dos indivíduos em suas<br />
ações dentro do grupo.
32<br />
3.1 Diferentes Abordagens em Cultura Organizacional<br />
3.1.1 Abordagem de Smircich<br />
Smircich (1983) sistematizou o significado do conceito de cultura na análise<br />
organizacional e afirmou que este se baseia em diferentes pressupostos, os quais acarretam<br />
divergências nas abordagens da relação organização-cultura. A autora subdividiu os grupos<br />
que estudam a cultura organizacional: os que a estudam como uma variável crítica e os que<br />
a estudam como uma metáfora básica. Em outras palavras, Smircich (1983) afirma que<br />
diferentes análises da cultura organizacional podem ser atribuídas aos pressupostos<br />
adotados pelos pesquisadores em relação à concepção da cultura, organização e natureza<br />
humana. Esses pressupostos conduzem a dois modos distintos de pesquisar a cultura<br />
organizacional: primeiro, como variável, considerando a cultura como algo que a<br />
organização possui; e segundo, como um modo de funcionar, algo que a organização é.<br />
A cultura vista como algo que a organização “possui” busca, nesse sentido, as<br />
práticas; isso devido ao importante papel das práticas na cultura organizacional e pelo fato<br />
de elas serem consideradas manipuláveis. A cultura vista como algo que a organização “é”<br />
busca um todo integrado, ou seja, práticas e <strong>valores</strong>, que podem ser considerados como a<br />
organização “é”. E é pela observação das práticas que se terá conhecimento dos <strong>valores</strong>.<br />
Segundo Aktouf (1994), o estudo da cultura como variável denota a<br />
pressuposição de união <strong>entre</strong> todos os integrantes da organização, visando à sustentação e<br />
ao alcance dos objetivos <strong>organizacionais</strong>.<br />
Para Smircich (1983), os autores que concebem a cultura como uma metáfora<br />
advogam que ela é algo que a organização é, analisando-a em seus aspectos simbólicos,<br />
ideais e expressivos.<br />
Percebe-se, portanto, que frente a essas duas abordagens, aqueles autores que<br />
defendem a cultura como uma variável, ou seja, a cultura como algo que a organização<br />
“possui”, consideram que ela interfere no desempenho organizacional; e aqueles que<br />
sustentam a cultura como algo que a organização “é” possuem o entendimento de que os<br />
estudos sobre cultura propiciariam maior clareza a respeito da vida organizacional,<br />
promovendo uma reflexão mais crítica sobre as idéias, normas, <strong>valores</strong>, enfim, sobre a<br />
realidade social.
33<br />
3.1.2 Abordagem de Schein<br />
Schein (1991, p. 247) define cultura como sendo<br />
o conjunto de pressupostos básicos que um grupo inventou, descobriu ou<br />
desenvolveu ao aprender como lidar com os problemas de adaptação<br />
externa e integração interna e que funcionaram bem o suficiente para<br />
serem considerados válidos e ensinados a novos membros com a forma<br />
correta de perceber, pensar e sentir em relação a esses problemas.<br />
Para Schein (1991), são os pressupostos básicos que permitem a compreensão<br />
dos <strong>valores</strong> e do comportamento aberto do grupo. São eles que determinam, em última<br />
instância, como os membros do grupo percebem, pensam e sentem.<br />
Schein (1991) desenvolveu um modelo de análise e intervenção, no qual<br />
distingue três níveis de apreensão da cultura em uma organização, que são:<br />
• Nível dos artefatos visíveis: Segundo Schein (1991, p. 252), esse nível é composto<br />
pelas “estruturas <strong>organizacionais</strong> e processos visíveis (difíceis de decifrar)”, ou seja,<br />
ele é constituído pelo ambiente da organização, arquitetura, layout, a maneira dos<br />
indivíduos se vestirem, padrões de comportamento visíveis, documentos públicos:<br />
cartas, mapas.<br />
• Valores compartilhados: De acordo com Schein (1991, p.252), esse nível compreende<br />
as “estratégias, objetivos e filosofias (justificativas fundamentadas).” Nele os <strong>valores</strong><br />
são difíceis de se observar diretamente para identificar. É recomendável que se<br />
<strong>entre</strong>viste os membros-chave de uma organização. Os <strong>valores</strong> expressam o que as<br />
pessoas reportam ser a razão de seu comportamento, o que, na maioria das vezes, são<br />
idealizações ou racionalizações.<br />
• Pressupostos básicos: Para Schein (1991, p. 252), esse nível é constituído pelas<br />
“crenças inconscientes e assumidas, hábitos de percepção, pensamento e sentimento<br />
(última fonte de <strong>valores</strong> e ação)”, ou seja, constitui-se nos pressupostos que<br />
determinam como os membros de um grupo percebem, pensam e sentem.<br />
Schein (1991) afirma que os três níveis da cultura interagem <strong>entre</strong> si e que os<br />
pressupostos básicos constituem a essência da cultura, formando em seu conjunto a cultura,<br />
enquanto os <strong>valores</strong> e artefatos seriam manifestações dessa essência. Para ele, portanto, a<br />
essência da cultura organizacional reside nas premissas subjacentes onde se originam tanto<br />
os <strong>valores</strong> quanto o comportamento dos membros do grupo, as quais referendam as
34<br />
autoridades consideradas legítimas, mantêm os mitos e símbolos que fortalecem a coesão e<br />
definem os sistemas de poder e de comunicação vigentes.<br />
Schein (1991), em seus estudos, vai além das análises estruturais das<br />
organizações, que se atêm aos organogramas, manuais, relações hierárquicas e prescrições<br />
de trabalho. Por essa razão, os estudos de cultura organizacional não podem restringir-se à<br />
observação dos artefatos visíveis, mas devem dialogar com os membros de uma<br />
organização para o entendimento do significado desses mesmos artefatos visíveis. Mesmo<br />
as explicações sobre os artefatos visíveis dadas pelos membros da organização ainda não<br />
são suficientes, porque existem pressupostos sobre tais explicações que eles consideram<br />
tão óbvios que sequer conseguiram apropriar deles. Referidos pressupostos tendem a<br />
influenciar todo o processo de interação dos membros da organização.<br />
O mesmo autor atribui importância e propõe que se estude o papel dos<br />
fundadores na constituição dos <strong>valores</strong> da organização. Ele entende que os fundadores<br />
imprimem a sua visão de mundo aos demais trabalhadores, além do papel a ser<br />
desempenhado pela organização. Se preservados, esses pressupostos servem de<br />
orientadores para os trabalhadores <strong>organizacionais</strong>.<br />
No início de uma organização, as crenças e os <strong>valores</strong> do fundador são<br />
incorporados às políticas <strong>organizacionais</strong> e, informalmente, são considerados válidos e<br />
ensinados aos novos membros da organização. O fundador desempenha um papel decisivo<br />
como detentor da concepção global sobre o projeto da organização. Segundo Fleury (1996,<br />
p.21), cabe a ele, como possuidor dessa faculdade, “estruturá-la, desenvolvê-la e tecer<br />
elementos simbólicos consistentes com esta visão.”<br />
3.1.3 Abordagem de Hofstede<br />
Para Hofstede (1994, p.179-180), a<br />
cultura é mais do que a soma das partes; é um todo. É historicamente<br />
determinada, refletindo a história da organização. Relaciona-se com as<br />
questões de estudo dos antropólogos. É construída socialmente, uma vez<br />
que é criada e preservada pelo grupo de pessoas que formam a<br />
organização. É suave, embora outros autores assegurem que ela é, além<br />
de suave, pesada. E cultura é difícil de mudar.
35<br />
Em outras palavras, Hofstede afirma que a cultura abrange todo um conjunto<br />
de elementos interativos fundamentais, ou seja, mitos, histórias, <strong>valores</strong>, ritos, linguagem,<br />
símbolos, etc. Ela é parte de um processo histórico ao longo da existência da organização.<br />
Sua construção social e sedimentação realizam-se com sua transmissão aos membros da<br />
organização e também aos novos membros que chegam. A cultura se torna cristalizada<br />
quando a organização demonstra que ela é eficaz na resolução de seus problemas, isto é, a<br />
organização consolida uma forma de ser e uma forma de atuar própria e diferenciada das<br />
outras organizações.<br />
Hofstede desenvolveu um estudo que reuniu amostras de trabalhadores de uma<br />
multinacional americana com filiais em vários países. Quarenta países constituíram objeto<br />
de estudo de Hofstede. Posteriormente esse número foi ampliado para sessenta. O<br />
pesquisador buscou, com esse estudo transcultural, identificar <strong>valores</strong> subjacentes à cultura<br />
dos trabalhadores daquela organização nos diversos países estudados.<br />
Hofstede (1994) produziu resultados de pesquisa que corroboraram e<br />
integraram outros obtidos por diversos pesquisadores.<br />
Utilizando análise fatorial, Hofstede identificou quatro fatores ou dimensões<br />
que diferenciam grupos nacionais culturais, pressupondo relações de conflito e<br />
compatibilidade <strong>entre</strong> essas dimensões. É fundamental notar que Hofstede pôde descobrir<br />
que tanto administradores quanto trabalhadores podem ser situados ao longo dessas quatro<br />
dimensões básicas:<br />
a) Distância de Poder: a primeira dimensão é definida como “até que ponto os<br />
membros menos poderosos das instituições e organizações dentro de um país esperam e<br />
aceitam que o poder é distribuído desigualmente” (HOFSTEDE, 1994, p.28). Significa o<br />
grau de aceitação por uma sociedade na distribuição de poder;<br />
b) Evitação de Incertezas: a segunda dimensão é definida como “até que<br />
ponto os membros de uma cultura se sentem ameaçados pela incerteza ou por uma<br />
situação desconhecida” (HOFSTEDE, 1994, p.113). A evitação de incertezas mede o<br />
incômodo diante de situações ambíguas, bem como a forma pela qual essas situações são<br />
evitadas, criando maior estabilidade de carreira, pondo em prática regras mais<br />
formalizadas, deixando de lado idéias e comportamentos alternativos ou desviantes e<br />
tomando como viáveis as verdades absolutas;<br />
c) Individualismo/Coletivismo: na terceira dimensão, o individualismo é<br />
definido como
36<br />
pertencente a sociedades na qual os vínculos são fracos: é esperado que<br />
cada um cuide de si mesmo e de sua família nuclear. Coletivismo, ao<br />
contrário, pertence a sociedades na qual as pessoas do nascimento em<br />
diante são integradas dentro de um forte e coeso grupo de pertença, que<br />
por toda vida das pessoas continua a protegê-los em troca de lealdade<br />
inquestionável. (HOFSTEDE, 1994, p.51)<br />
A relação individualismo versus coletivismo significa que quando se fala em<br />
individualismo fala-se nas situações em que as pessoas se definem como indivíduo, o que<br />
implica redes sociais que se interligam difusamente, redes essas nas quais as pessoas<br />
tomam conta apenas de si próprias e daqueles que lhes estão mais próximo. A situação<br />
inversa, o coletivismo, é caracterizada por redes sociais profundas, nas quais as pessoas<br />
fazem distinção <strong>entre</strong> seus próprios grupos, que incluem parentes, clãs e organizações,<br />
além de outros grupos;<br />
d) Masculinidade/Feminilidade: a última dimensão é definida como a<br />
masculinidade pertencente à sociedade na qual os papéis sociais de<br />
gênero são claramente distintos (homens são supostamente assertivos,<br />
fortes e focados no sucesso material. Ao passo que as mulheres são<br />
supostamente mais modestas, sensíveis e preocupadas com a qualidade<br />
de vida); a feminilidade pertence à sociedade na qual os papéis sociais<br />
de gênero coincidem (ambos, homens e mulheres, são supostamente<br />
modestos, sensíveis e preocupados com a qualidade de vida).<br />
(HOFSTEDE, 1994, p.82-83)<br />
Nessa dimensão os comportamentos são orientados pelos <strong>valores</strong> da cultura, ou<br />
seja, a masculinidade refere-se à medida segundo a qual <strong>valores</strong> dominantes na sociedade<br />
enfatizam tanto a assertividade quanto a aquisição de dinheiro e de coisas, não enfatizando<br />
particularmente as pessoas. E a feminilidade, por sua vez, é definida como a medida como<br />
os <strong>valores</strong> dominantes na sociedade salientam os relacionamentos <strong>entre</strong> pessoas, a<br />
preocupação com o próximo e a qualidade de vida global.<br />
Em outras palavras, Hofstede (1980) demonstrou com essas quatro dimensões<br />
as diferenças culturais nas formas de pensar e de agir em sociedade. Na dimensão distância<br />
de poder ele se refere à percepção do grau de desigualdade de poder <strong>entre</strong> a pessoa menos<br />
poderosa e a mais poderosa, ambas pertencentes ao mesmo sistema social. Isto é, a<br />
distância de poder se refere ao modo como o chefe e o subordinado percebem quem<br />
determina mais o comportamento do outro, num sistema hierárquico específico.
37<br />
A dimensão evitação de incerteza mostra o grau de ameaça sentido pelos<br />
membros de uma cultura em situações desconhecidas, incertas, que podem gerar stress<br />
devido ao estado de incerteza que provocam.<br />
Já na dimensão individualismo/coletivismo as sociedades individualistas são<br />
aquelas em que os interesses dos indivíduos prevalecem aos interesses do grupo. Baixa<br />
coesão grupal, assim como um forte foco na identidade pessoal caracterizam sociedades<br />
com alto grau de individualismo. Em contraste, sociedades coletivistas enfatizam os<br />
interesses do grupo acima dos interesses da pessoa. Coesão grupal e forte lealdade à<br />
família, à organização e aos parentes caracterizam essas sociedades.<br />
Na dimensão masculinidade/feminilidade, a masculinidade pertence às<br />
sociedades nas quais os papéis sociais de gênero são claramente distintos, isto é, dos<br />
homens se espera assertividade, força e foco no sucesso material, enquanto que das<br />
mulheres se espera mais modéstia, delicadeza e preocupação com a qualidade de vida. Por<br />
outro lado, a feminilidade pertence às sociedades nas quais os papéis de gênero coincidem,<br />
ou seja, espera-se que tanto os homens quanto as mulheres sejam modestos, dedicados e<br />
preocupados com a qualidade de vida.<br />
De acordo com Torres et al (2001), esse estudo de Hofstede contribuiu para as<br />
teorias sobre <strong>valores</strong> em psicologia social ao identificar a dimensão cultural que envolve as<br />
relações <strong>entre</strong> as pessoas e seus grupos – individualismo/coletivismo.<br />
3.1.4 Abordagem de Frost<br />
A abordagem de Frost (1991) busca mostrar as diferentes possibilidades de<br />
compreensão da cultura organizacional estabelecida por diversos pesquisadores,<br />
evidenciando que a mesma aparece ora como integrada, ora como diferenciada, ou ainda<br />
como fragmentada.<br />
A integração pressupõe que a organização possua a mesma cultura. Parte-se da<br />
idéia de que ela pode ser criada, mantida e perpetuada pelos gerentes, líderes e fundadores.<br />
Nesse sentido, a cultura é vista como uma variável que pode ser manipulada para promover<br />
um consenso, dar clareza e, principalmente, manter as pessoas da organização unidas e até<br />
conformadas.<br />
A diferenciação enfoca as diferenças existentes <strong>entre</strong> os diversos grupos que<br />
compõem a organização. Nessa perspectiva, o consenso ainda existe, só que apenas dentro
38<br />
do grupo. A organização é vista e constituída por um conjunto de grupos e subgrupos, cada<br />
um deles com a sua própria cultura. Assim, a visão única se dissipa, aparecendo uma visão<br />
mais heterogênea.<br />
A fragmentação consiste na visão de que o que há são <strong>valores</strong> partilhados<br />
temporariamente pelos vários indivíduos que atuam na organização. Essa perspectiva<br />
possibilita evidenciar mais facilmente as culturas como um processo real concebido, cujo<br />
principal aspecto é centrar-se na interação das pessoas que compõem a organização.<br />
Estudos recentes, como o de Cavedon e Fachin (2000), mostram que é<br />
perfeitamente possível a abordagem conjunta dessas três perspectivas apontadas por Frost<br />
(1991), pois promovem uma integração das diferentes significações culturais que existem<br />
nas organizações.<br />
A cultura organizacional não é algo pronto e acabado, mas está em constante<br />
transformação de acordo com a sua história, os seus trabalhadores, a sua adaptação às<br />
alterações do meio ambiente e aos distintos problemas internos.<br />
Pode-se resumir, portanto, que as conseqüências imediatas da existência da<br />
cultura organizacional em uma organização são: 1) um conjunto de características que<br />
diferem de uma organização para outra e que condicionam comportamentos típicos para<br />
ação e reação; 2) uma tendência a defender e a preservar hábitos que caracterizam a<br />
singularidade da organização; e 3) a possibilidade de mudanças e inovação essencialmente<br />
por forças externas ou produção interna de idéias novas.<br />
A seguir, será apresentada a contextualização histórica das organizações<br />
públicas, bem como suas características e a cultura predominante nesse tipo de<br />
organização.<br />
4. Cultura de Organizações Públicas<br />
4.1 Histórico das Organizações Públicas<br />
Pimenta (1998) afirma que até o século XIX o Estado brasileiro pode ser<br />
caracterizado como um Estado Patrimonialista 1 , devido à sua pequena participação na<br />
1 Martins (1997) diz que Estado Patrimonialista é a cultura de apropriação daquilo que é público pelo privado<br />
(JAGUARIBE, 1958; WAHRLICH, 1983; GUERREIRO-RAMOS, 1983), a despeito de comportar variações<br />
de amplitude conceitual, conquanto esteja referido mais especificamente a apropriação de recursos, poder ou<br />
benefícios públicos.
39<br />
economia e na ordem social do país. Mesmo com o início da República em 1889, quando<br />
ocorreram alterações significativas no processo político de detenção do poder, que deixou<br />
de ser centralizado por um imperador e passou a ser disputado pelas oligarquias locais, o<br />
perfil das ações do Estado não mudou significativamente.<br />
Segundo o mesmo autor, estas condições se estenderam até a década de 1930,<br />
com o início da aceleração do processo de industrialização brasileiro, quando o Estado<br />
passou por uma transformação profunda, surgindo como um Estado Intervencionista 2 , que<br />
passou a induzir o crescimento econômico, ao mesmo tempo em que apoiou a<br />
profissionalização do funcionamento e a expansão das organizações burocráticas públicas.<br />
Foi nesse período que surgiram as primeiras características do Estado brasileiro como<br />
Estado do bem-estar, com a criação de novas áreas de atuação, novas políticas e novos<br />
órgãos, tais como o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e o Ministério da<br />
Educação e Saúde Pública.<br />
Martins (1997, p.174-175) afirma que<br />
do ponto de vista das organizações públicas, essa fase (década de 1930)<br />
não implicou uma maior demanda sobre a administração pública, nem<br />
registrou esforços sistemáticos de reforma administrativa, senão<br />
reestruturações ministeriais próprias da atividade governamental do<br />
Império e da implantação do federalismo desconcentrado da República<br />
Velha.<br />
Segundo Marcelino (2003), foi no período <strong>entre</strong> 1930 a 1945 que se<br />
desenvolveu um esforço de renovação e inovação do poder governamental. As premissas<br />
fundamentais eram a reforma do sistema de pessoal, a implantação e simplificação de<br />
sistemas administrativos e das atividades de orçamento, para promover eficiência à<br />
administração pública.<br />
Denota-se que a característica mais marcante desse período foi a reforma dos<br />
meios, ou seja, das atividades de administração geral, em detrimento da reforma dos fins,<br />
isto é, das atividades substantivas.<br />
Conforme afirma Marcelino (2003), porém, o impulso reformista entrou em<br />
colapso após 1945, com a queda do Estado Novo, regime autoritário implantado por<br />
Getúlio Vargas em 1937. A falência ocorreu devido à reforma ter obedecido a uma<br />
orientação autocrática e impositiva por ocorrer num período ditatorial (1937-1945), como<br />
2 Segundo Ferreira (1999), nos regimes federativos, ato do poder central destinado a impor medidas necessárias a<br />
manter a integridade da União, quando algum dos seus membros está submetido à anormalidade grave e que<br />
prejudique o funcionamento da Federação.
40<br />
já foi citado anteriormente, o que contribuiu para que a administração assumisse<br />
características de um sistema fechado. Somente em 1952 esboçou-se um novo ciclo, que se<br />
estendeu por dez anos, durante os quais se realizaram estudos e se elaboraram projetos que<br />
não chegaram, <strong>entre</strong>tanto, a se concretizar.<br />
Para Marcelino (2003), na década de 1960 consolidava-se o modelo chamado<br />
“administração para o desenvolvimento”, voltado fundamentalmente para a expansão da<br />
intervenção do Estado na vida econômica e social, para a substituição das atividades de<br />
trabalhadores estatutários por celetistas e para a criação de entidades da administração<br />
descentralizada para realização da intervenção econômica do Estado. O clima políticoinstitucional<br />
dos governos autoritários gerou um modelo organizacional no País que se<br />
caracterizou pela centralização de um complexo aparelho burocrático.<br />
Ainda, segundo o mesmo autor, o desafio dos anos 1980 era instalar sistemas<br />
administrativos que pudessem acelerar o desenvolvimento e possibilitar ao País o uso<br />
efetivo de seus recursos. No entanto, o complexo processo de reforma administrativa<br />
vincula-se ao contexto econômico, social, político e cultural do País, não podendo, dessa<br />
forma, ser enfatizado somente sob os aspectos legal e técnico.<br />
Nota-se que diante dos desafios dos anos de 1980, enfrentados pelo Estado, a<br />
Constituição promulgada em 1988, segundo Pimenta (1998), paradoxalmente criou uma<br />
série de direitos e garantias aos trabalhadores de organizações públicas, direitos esses que<br />
vieram sobrecarregar as despesas do Estado; é o caso da estabilidade dos trabalhadores, da<br />
obrigatoriedade de implantação do regime jurídico na área de pessoal, que aumentou os<br />
seus direitos e garantias em organizações públicas, e da igualdade de vencimentos para<br />
cargos assemelhados, <strong>entre</strong> outros.<br />
4.2 Organizações Públicas no Brasil<br />
De acordo com Carbone (2000), a história da administração pública no Brasil<br />
ainda é muito recente. Se não é muito comparada a outras culturas, é suficiente para gerar<br />
um modus operandi próprio. No Brasil, os trabalhadores de organizações públicas sempre<br />
necessitaram possuir habilidades diplomáticas nas suas relações de trabalho, para não<br />
provocarem divergências com a administração pouco competente dos gestores. Nas<br />
organizações públicas, são as relações de estima e os jogos de influência os verdadeiros<br />
indicadores de poder no Brasil.
41<br />
Segundo Castor e José (1998), a história da administração brasileira é uma<br />
repetição monótona da luta <strong>entre</strong> duas forças: de um lado, uma burocracia formalista,<br />
ritualista, centralizadora, ineficaz e adversa às tentativas periódicas de modernização do<br />
aparelho do Estado, aliada aos interesses econômicos retrógrados e conservadores, embora<br />
politicamente influentes; de outro, as correntes modernizantes da burocracia e seus<br />
próprios aliados políticos e empresariais. A primeira quer perpetuar seu controle social e<br />
seus privilégios por meio da centralização burocrática, de natureza conservadora e<br />
imobilista. As forças modernizantes, por seu turno, industrializadas e abertas ao exterior, a<br />
exigir novas missões para o Estado, principalmente na área de ampliação da infra-estrutura<br />
econômica e social, hoje apontam para a globalização e o liberalismo.<br />
De um lado tem-se a burocracia em seu sentido corporativo, centralizadora e,<br />
portanto, contrária às mudanças na organização e nas formas de operar do aparelho do<br />
Estado; e de outro, as forças inovadoras, que, não raramente, encontram muita dificuldade<br />
para implementar de maneira efetiva projetos de reforma. Essas forças inovadoras<br />
procuram introduzir, nas organizações públicas, uma cultura de flexibilidade e de gestão<br />
empreendedora que permita às organizações públicas atuarem de forma eficiente, num<br />
mundo de rápidas transformações.<br />
No contexto das organizações públicas, a luta de forças se manifesta <strong>entre</strong> o<br />
“novo e o velho”, isto é, as transformações e inovações das organizações no mundo<br />
contemporâneo frente a uma dinâmica e a uma burocracia arraigadas. As organizações<br />
públicas se deparam com a necessidade do novo tanto em aspectos administrativos como<br />
políticos. Mais que isso, necessitam criativamente integrar aspectos políticos e técnicos,<br />
sendo essa junção inerente e fundamental para as ações nesse campo. Entretanto, essa<br />
busca de forças torna-se necessária para se conduzir a uma reflexão, onde se possa obter as<br />
melhores estratégias para descrever organizações públicas capazes de atingir seus<br />
objetivos, que consistem em serviços eficientes à sociedade.<br />
De acordo com Castor e José (1998), a elevada autonomia operacional<br />
concedida às organizações públicas logo incorre em privilégios corporativistas, práticas de<br />
favorecimento e de clientelismo, quando não de exercício duvidoso do cargo.<br />
Posto isso, d<strong>entre</strong> as demandas das organizações públicas, a principal que todos<br />
devem considerar é a tentativa de transformação da cultura imposta a elas desde o princípio<br />
da criação do serviço público.<br />
Isso fica evidente quando Guimarães (2000, p.127) afirma que
42<br />
no setor público, o desafio que se coloca para a nova administração<br />
pública é como transformar estruturas burocráticas, hierarquizadas e<br />
que tendem a um processo de insulamento em organizações flexíveis e<br />
empreendedoras.<br />
O mesmo autor afirma que essa transformação só é possível quando ocorrer<br />
uma ruptura com os modelos tradicionais de administração dos recursos públicos e<br />
introduzir uma nova cultura de gestão.<br />
4.3 Conceituando e Caracterizando as Organizações Públicas<br />
Dias (1998) afirma que as organizações públicas têm como objetivo prestar<br />
serviços para a sociedade. Elas podem ser consideradas como sistemas dinâmicos,<br />
extremamente complexos, interdependentes e interrelacionados coerentemente, envolvendo<br />
informações e seus fluxos, estruturas <strong>organizacionais</strong>, pessoas e tecnologias. Elas cumprem<br />
suas funções, buscando uma maior eficiência da máquina pública e um melhor<br />
atendimento para a sociedade.<br />
Segundo Dussault (1992, p.13),<br />
as organizações de serviços públicos dependem em maior grau do que as<br />
demais do ambiente sóciopolítico: seu quadro de funcionamento é<br />
regulado externamente à organização. As organizações públicas podem<br />
ter autonomia na direção dos seus negócios, mas, inicialmente, seu<br />
mandato vem do Governo, seus objetivos são fixados por uma autoridade<br />
externa.<br />
Percebe-se que as organizações públicas são mais vulneráveis a interferência<br />
do poder político 3 , pois são geridas pelo poder público. Elas, também, têm a missão de<br />
prestar serviços à sociedade. Evidentemente, esta prestação de serviços, está,<br />
habitualmente, em contradição com a limitação dos recursos recebidos por elas. E, quando<br />
há recursos disponíveis, eles tendem a depender da decisão política e das flutuações da<br />
capacidade econômica do Estado.<br />
3 De acordo com Bobbio, Matteucci e Pasquino (1999), o que caracteriza o poder político é a exclusividade do uso<br />
da força em relação à totalidade dos grupos que atuam num determinado contexto social, exclusividade que é<br />
resultado de um processo que se desenvolve em toda a sociedade organizada, no sentido da monopolização da<br />
posse e uso dos meios. Ou seja, é a intervenção de modo imperativo, em todas as esferas possíveis da atividade dos<br />
membros de um grupo para encaminhar tal atividade ao fim desejado ou para a desviá-la de um fim não desejado.
43<br />
Para Gaster (1999), a baixa qualidade dos serviços públicos gera e perpetua<br />
uma baixa expectativa em relação ao que pode ser oferecido, tanto por usuários quanto por<br />
prestadores de serviços, contribuindo, assim, para gerar um ciclo vicioso de insatisfação e<br />
frustração de gerentes e usuários.<br />
Nota-se que as organizações públicas são sistemas complexos devido ao alto<br />
índice de burocracia existente no seu funcionamento, isto é, o tipo de regulamento<br />
desenvolvido na burocracia estatal tende a ser aplicado a qualquer organização pública.<br />
Dessa maneira, as condições e a organização do trabalho tendem a uniformizar-se no setor<br />
público, ou seja, os trabalhadores das organizações públicas tendem a encontrar-se em<br />
idênticas situações laborais e de organização do trabalho, proporcionadas pela burocracia<br />
estatal, uma vez que os seus dirigentes são responsáveis perante uma autoridade externa à<br />
organização pública, gerando, assim, uma tendência à centralização das decisões.<br />
As organizações públicas mantêm as mesmas características básicas das<br />
demais organizações, acrescidas, <strong>entre</strong>tanto, de algumas especificidades, tais como: apego<br />
às regras e rotinas, supervalorização da hierarquia, paternalismo nas relações, apego ao<br />
poder, d<strong>entre</strong> outras. Tais diferenças são importantes na definição dos processos internos,<br />
na relação com inovações e mudança, na formação dos <strong>valores</strong> e crenças <strong>organizacionais</strong> e<br />
políticas de recursos humanos.<br />
De acordo com Carbone (2000), as características da organização pública que<br />
dificultam a sua mudança são as seguintes:<br />
• Burocratismo: excessivo controle de procedimentos, gerando uma administração<br />
engessada, complicada e desfocada das necessidades do País e do contribuinte;<br />
• Autoritarismo/Centralização: excessiva verticalização da estrutura hierárquica e<br />
centralização do processo decisório;<br />
• Aversão aos Empreendedores: ausência de comportamento empreendedor para<br />
modificar e se opor ao modelo de produção vigente;<br />
• Paternalismo: alto controle da movimentação de pessoal e da distribuição de<br />
empregos, cargos e comissões, dentro da lógica dos interesses políticos dominantes;<br />
• Levar Vantagem: constante promoção da punição àqueles indivíduos injustos,<br />
obtendo vantagens dos negócios do Estado;<br />
• Reformismo: desconsideração dos avanços conquistados, descontinuidade<br />
administrativa, perda de tecnologia e desconfiança generalizada. Corporativismo como<br />
obstáculo à mudança e mecanismo de proteção à tecnocracia.
44<br />
Um ponto fundamental ao planejamento e à gestão pública, levantado por<br />
Martelane (1991), é a presença de dois corpos funcionais com características nitidamente<br />
distintas: um permanente e outro não permanente. O corpo permanente é formado pelos<br />
trabalhadores de carreira, cujos objetivos e cultura foram formados no seio da organização,<br />
e o não permanente é composto por administradores políticos que seguem objetivos<br />
externos e mais amplos aos da organização.<br />
O conflito <strong>entre</strong> eles é acentuado pela substituição dos trabalhadores não<br />
permanentes, que mudam a cada novo mandato. Schall (1997) afirma que essa<br />
descontinuidade administrativa é um dos pontos que mais diferenciam a organização<br />
pública da privada, conferindo às organizações públicas características específicas, que<br />
também podem ser aplicadas a realidade brasileira, como:<br />
• Projetos de Curto Prazo: cada governo só privilegia projetos que possa concluir em<br />
seu mandato, para ter retorno político;<br />
• Duplicação de Projetos: cada novo governo inicia novos projetos, muitas vezes quase<br />
idênticos, reivindicando a autoria para si;<br />
• Conflitos de Objetivos: conflito <strong>entre</strong> os objetivos do corpo permanente e do não<br />
permanente, o que pode gerar pouco empenho em relação aos procedimentos que vão<br />
contra interesses corporativos – ciência de que a chefia logo será substituída;<br />
• Administração Amadora: administração feita por indivíduos com pouco<br />
conhecimento da história e da cultura da organização e, muitas vezes, sem o preparo<br />
técnico necessário – predomínio de critérios políticos em detrimento da capacidade<br />
técnica ou administrativa dos nomeados.<br />
Alguns problemas de ajustes em relação ao trabalhador permanente são<br />
atribuídos por Pereira (1996, p. 20), quando afirma que<br />
no Brasil a extensão da estabilidade a todos os servidores públicos, ao<br />
invés de limitá-la a apenas às carreiras onde se exerce o poder de<br />
Estado, e o entendimento dessa estabilidade de uma forma tal que a<br />
ineficiência, a desmotivação, a falta de disposição para o trabalho não<br />
pudessem ser punidas com a demissão, implicaram em um forte aumento<br />
da ineficiência do servidor público.<br />
Ainda, segundo o mesmo autor, outro ponto fundamental gerado pela<br />
estabilidade é o aumento dos custos públicos, que impede a adequação dos quadros de<br />
trabalhadores às reais necessidades do serviço, tanto em termos de quantidade quanto de
45<br />
especialização técnica, inviabilizando, ao mesmo tempo, a implantação de um sistema de<br />
administração eficiente, baseado em incentivos e punições.<br />
Johnson et al. (1996) afirmam que o fato de a propriedade ser pública torna<br />
frágeis, complexos e lentos vários processos que se podem apresentar muito simples e<br />
dinâmicos na organização privada, cujos objetivos são mais claros e o foco do controle<br />
externo é uma pequena fração daquele exercitado sobre uma organização financiada pela<br />
sociedade.<br />
Os autores acrescentam ainda que o controle público tem influência no<br />
planejamento e na gestão. Esse controle, de forte conotação política, é o único caminho<br />
para o equilíbrio das forças sociais. Nas organizações controladas pelo Governo há a<br />
predominância dos processos políticos, que muitas vezes oneram de várias formas os<br />
processos operacionais e administrativos ou, mesmo, se opõem a eles.<br />
Shepherd e Valencia (1996) afirmam que as situações que dificultam a<br />
administração de organizações públicas são:<br />
• A administração pública oferece, principalmente, serviços dos quais ela detém o<br />
monopólio, o que propicia que sejam produzidos de maneira ineficiente;<br />
• O controle dos eleitores sobre os políticos é normalmente imperfeito, sendo que<br />
organizações políticas destinadas a representar os eleitores dificilmente trabalham sem<br />
atrito;<br />
• A dificuldade dos políticos em controlar os funcionários, e definir e medir com<br />
exatidão os resultados da administração pública.<br />
Essas características, peculiares às organizações públicas, tornam-se um grande<br />
empecilho para a implantação de inovações tecnológicas, pois elas, via de regra, são<br />
processos longos e que requerem um tempo de desenvolvimento e aperfeiçoamento,<br />
dificilmente restringindo-se a um único mandato governamental.<br />
Pesquisa realizada por Vaitsman (2001) <strong>entre</strong> os anos de 1997 e 1998, com<br />
trabalhadores de um hospital público do Rio de Janeiro, teve como objetivo investigar o<br />
gerencialismo, a cultura, as representações, os <strong>valores</strong> e as expectativas <strong>entre</strong> os<br />
trabalhadores públicos da saúde.<br />
Pretendia verificar se existia algum tipo de defesa corporativa sobre a<br />
estabilidade dos trabalhadores públicos. A estabilidade pode adquirir vários significados,<br />
dependendo da situação ou do contexto ao qual se refere. A leitura dos dados demonstrou<br />
que, para a maioria dos <strong>entre</strong>vistados, a estabilidade consistiu na principal razão para a
46<br />
entrada no serviço público. Como representação social, porém, a estabilidade já não tem<br />
significado positivo <strong>entre</strong> os trabalhadores. Pode-se dizer mesmo que inexiste uma defesa<br />
da estabilidade como um princípio ideativo, pelo contrário, nas várias categorias<br />
profissionais dos participantes da pesquisa há uma noção associada a descompromisso,<br />
desmotivação e mau desempenho.<br />
Ainda que grande parte dos <strong>entre</strong>vistados tenha avaliado negativamente a<br />
estabilidade do ponto de vista de suas conseqüências para o desempenho no trabalho, a<br />
pesquisa revela que ninguém quer abdicar dessa condição. Isto se explica não apenas pelo<br />
próprio fato de consistir em direito adquirido, mas também pela desconfiança que<br />
predomina <strong>entre</strong> os trabalhadores em relação à manutenção e/ou cumprimento das regras<br />
do jogo e ao efetivo exercício da meritocracia no setor público, o que costuma ser atribuído<br />
de forma generalizada à “política”.<br />
Ainda em relação à pesquisa, quando perguntados sobre as mudanças no setor<br />
público, 41% consideraram que as mudanças “não dão certo por causa dos interesses<br />
políticos” e 40% que “podem melhorar o setor”. Se, por um lado, as respostas<br />
confirmaram a representação negativa em relação a tudo aquilo que é associado à<br />
“política”, por outro, elas mostram que uma parte dos servidores crê em mudanças.<br />
De acordo com a pesquisa, ao serem perguntados sobre “Quem costuma `se dar<br />
bem` no serviço público?”, a maioria dos trabalhadores públicos apontou “quem tem<br />
padrinho político”, ou seja, ainda que o mérito – “desempenho profissional” – e a<br />
qualificação técnica – “capacitação profissional” – sejam <strong>valores</strong> incorporados e<br />
aspirados, predomina a opinião de que, na prática, os que têm padrinho político acabam<br />
sendo mais bem-sucedidos. Ainda que exista, <strong>entre</strong> os trabalhadores, aspirações e atitudes<br />
universalistas, a isso não corresponde a crença de que as regras do jogo sejam as mesmas<br />
para todos, o que provavelmente tem implicações negativas do ponto de vista da formação<br />
de um ethos de envolvimento e comprometimento com a coisa pública.<br />
A autora da pesquisa concluiu que as aspirações de meritocracia e competência<br />
técnica, amplamente difundidas <strong>entre</strong> os servidores, são parte da gramática universalista<br />
que certamente está presente e rege as relações de trabalho em uma área envolvendo<br />
atividades de alta complexidade e especialização. O setor público é percebido como um<br />
terreno onde predominam o apadrinhamento político, as relações de favorecimento pessoal<br />
e os privilégios que contornam as normas formalmente instituídas. O sentimento de<br />
iniqüidade e injustiça, bem como a incongruência <strong>entre</strong> o discurso e as práticas oficiais,
47<br />
produz frustração em relação aos projetos pessoais e profissionais, levando à desmotivação<br />
e dificultando a formação de expectativas positivas quanto às possibilidades de mudança.<br />
A seguir será abordado o tema Valores, por tê-lo como elemento central na<br />
compreensão da cultura e pelo fato de que o presente estudo visa conhecer a relação <strong>entre</strong><br />
os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>, <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> e Programa de Qualidade de Vida no<br />
Trabalho.
CAPÍTULO 2<br />
VALORES HUMANOS<br />
1. Conceito de Valores<br />
Segundo Gondim (1996), o interesse pelo estudo dos <strong>valores</strong> remonta à antiguidade, na<br />
filosofia, e ressurgiu com vigor, na atualidade, em diferentes áreas do conhecimento, tais como Psicologia<br />
Social, Antropologia e Administração. Schwartz (1992), quando discute a importância dos <strong>valores</strong> em<br />
diferentes contextos, confirma a centralidade no estudo deste conceito para unificar interesses de diversas<br />
ciências preocupadas com o comportamento humano.<br />
Segundo Torres et al (2001), na década de 1950, Gordon Allport declarou que<br />
a importância que as pessoas dão a certos <strong>valores</strong>, em detrimento de outros, influencia a<br />
maneira pela qual elas percebem a realidade social. Algum tempo depois (ALLPORT,<br />
1961, p.543), esse mesmo autor afirmou que “os <strong>valores</strong> são a força que dominam a vida<br />
humana”, pois influenciam na percepção da realidade e nas atitudes. No entanto, pode-se<br />
dizer que Rokeach (1968, 1973) e seus estudos sobre a natureza dos <strong>valores</strong> humanos<br />
exerceram influência sobre as investigações posteriores.<br />
O conceito de <strong>valores</strong> para teóricos como Rokeach (1973), Schwartz (1987,<br />
1992, 1994) e Tamayo (1993, 1997), expressa interesses e desejos do tipo individual,<br />
coletivo ou misto, dentro de áreas motivacionais bem definidas.<br />
Schwartz & Ros (1995, p.93) concebem os <strong>valores</strong> culturais como “idéias<br />
abstratas compartilhadas sobre o que é bom, desejável e correto em uma sociedade ou em<br />
um grupo cultural determinado.”<br />
Para autores como Tamayo e Schwartz (1993, p.330), na psicologia o conceito<br />
de <strong>valores</strong> possui uma dimensão motivacional como definidores de “princípios
49<br />
transituacionais organizados hierarquicamente, relativos a estados de existência ou<br />
modelos de comportamento desejáveis, que orientam a vida do indivíduo e expressam<br />
interesses <strong>individuais</strong>, coletivos ou mistos.”<br />
Esse conceito coloca a origem dos <strong>valores</strong> como sendo de ordem motivacional,<br />
já que expressam interesses e desejos, próprios de áreas motivacionais, bem definidos. Os<br />
<strong>valores</strong>, vistos sob essa dimensão, exercem uma função mobilizadora e orientadora do<br />
comportamento humano.<br />
Schwartz e Bilsky (1987) e Schwartz (1994) afirmam haver um consenso em<br />
relação às cinco características de definições de <strong>valores</strong>: (1) um valor é uma crença; (2)<br />
relativo a um estado fim ou modo de conduta desejável; (3) transcende situações<br />
específicas; (4) guia a seleção ou avaliação de comportamento, pessoas e eventos; e (5) é<br />
ordenado pela importância relativa a outros <strong>valores</strong>, para formar um sistema de <strong>valores</strong><br />
prioritários.<br />
Segundo Mendes (1999), <strong>valores</strong> significam também uma ruptura com a<br />
indiferença. O indivíduo não é passivo em suas interações. Vale ressaltar, nesse processo,<br />
as influências dos aspectos emocionais e cognitivos, ambos constituintes da socialização,<br />
que têm início na família e continuam no mundo do trabalho, onde ocorre reforço e<br />
ressocializações constantes, colocando os <strong>valores</strong> como reflexo das interações <strong>entre</strong> o<br />
contexto social e a história de vida do sujeito.<br />
2. Abordagens sobre Valores<br />
No âmbito da psicologia, o tema <strong>valores</strong> passou a ter importância com o estudo e<br />
as pesquisas feitas por Rokeach. Rokeach foi um grande estudioso e pesquisador dessa área.<br />
Suas contribuições se tornaram um referencial para muitos pesquisadores.<br />
Rokeach (1973, p.5) definiu o conceito de valor como sendo:<br />
uma crença duradoura, um modo específico de conduta ou estado-fim de<br />
existência que é pessoalmente ou socialmente preferível por um modo<br />
oposto ou contrário de conduta ou estado-fim de existência. Um sistema de<br />
<strong>valores</strong> é uma organização duradoura de crenças em relação a modos de<br />
conduta preferíveis ou estados finais de existência ao longo de um contínuo<br />
de importância relativa.<br />
Em outras palavras, Rokeach afirma que valor é a crença duradoura de um modo
50<br />
de conduta ou estado fim de existência, sendo pessoalmente ou socialmente preferível a uma<br />
conduta ou estado final de existência oposto.<br />
A formulação do conceito de <strong>valores</strong> humanos, de acordo com Rokeach (1973), é<br />
guiada por cinco suposições sobre a natureza desses <strong>valores</strong>: (1) o número total de <strong>valores</strong><br />
que uma pessoa possui é relativamente pequeno; (2) todas as pessoas, em diferentes lugares,<br />
possuem os mesmos <strong>valores</strong>, em diferentes graus; (3) os <strong>valores</strong> são organizados dentro de<br />
um sistema de <strong>valores</strong>; (4) os antecedentes dos <strong>valores</strong> humanos podem ser encontrados nas<br />
culturas, nas sociedades, nas instituições e na personalidade das pessoas; (5) as<br />
conseqüências dos <strong>valores</strong> humanos podem ser manifestadas em todos os fenômenos<br />
considerados merecedores de investigação e estudo para as ciências sociais.<br />
Rokeach afirma que os <strong>valores</strong> são poucos e gerais (o mesmo valor pode ativar<br />
comportamentos e julgamentos em várias situações) e transcendem situações específicas,<br />
gerando condutas para atingir determinados objetivos almejados. Pode-se verificar, pelas<br />
idéias de Rokeach, que os <strong>valores</strong> embasam a conduta em diferentes situações na vida da<br />
pessoa.<br />
Rokeach considera que “a atitude refere-se a um determinado objeto, mas a<br />
crença estende-se à informação de que uma pessoa dispõe acerca do objeto, ou seja,<br />
enquanto as atitudes se direcionam a um objeto específico, os <strong>valores</strong> são mais gerais e<br />
abstratos” (TORRES et al., 2001, p.541).<br />
Rokeach (1973) dividiu os <strong>valores</strong> em dois grupos: <strong>valores</strong> terminais e <strong>valores</strong><br />
instrumentais. Os <strong>valores</strong> terminais são definidos como um valor que assume um caráter<br />
absoluto, sendo pessoal e socialmente preferível d<strong>entre</strong> várias situações referentes a vários<br />
objetos. Os <strong>valores</strong> instrumentais são definidos como um valor que é utilizado como meio de<br />
alcançar um estado de existência que seja um fim em si mesmo.<br />
Em outras palavras, os <strong>valores</strong> se desenvolvem ao longo de duas dimensões: (1)<br />
os tipos de metas pessoais que alguém deve possuir (<strong>valores</strong> terminais) e (2) o tipo de<br />
comportamento que alguém deve assumir como forma de alcançar essas metas (<strong>valores</strong><br />
instrumentais). Assim, por exemplo, pode-se desenvolver um valor terminal (meta ou<br />
objetivo) de que se deve ser próspero na vida e um valor instrumental (meio) de que se deve<br />
ser ambicioso e trabalhador para atingir esse objetivo. Esses <strong>valores</strong> se complementam,<br />
especificando um objetivo geral na vida e identificando comportamentos aceitáveis que
51<br />
podem ser usados para alcançar esse objetivo.<br />
Rokeach (1973) considerou de dois tipos os <strong>valores</strong> terminais – os <strong>valores</strong><br />
pessoais, com foco no próprio indivíduo, e os <strong>valores</strong> sociais, com foco externo, nas outras<br />
pessoas. Os <strong>valores</strong> instrumentais também são de dois tipos – aqueles que, uma vez violados,<br />
originam crises de consciência ou sentimentos de culpa no indivíduo, por esse ter cometido<br />
um erro (<strong>valores</strong> morais), e aqueles <strong>valores</strong> que, uma vez violados, conduzem a sentimentos<br />
de vergonha, ligados à inadequação pessoal (<strong>valores</strong> de competência).<br />
Para o autor, os <strong>valores</strong> terminais se subdividem em <strong>valores</strong> pessoais, que são<br />
aqueles <strong>valores</strong> centrados no próprio indivíduo, e em <strong>valores</strong> sociais, que são os <strong>valores</strong><br />
centrados nas relações sociais. Os <strong>valores</strong> instrumentais também se subdividem em <strong>valores</strong><br />
morais, que têm o foco no relacionamento interpessoal e referem-se ao modo de<br />
comportamento, e em <strong>valores</strong> de competência, que têm o foco no intrapessoal e referem-se<br />
ao comportamento lógico, inteligente e imaginativo.<br />
Tal classificação de Rokeach determinou a detecção de dezoito <strong>valores</strong> terminais<br />
e dezoito <strong>valores</strong> instrumentais, listados no quadro a seguir. Sua proposta de medida avalia<br />
os <strong>valores</strong> em importância, como princípios guias das vidas dos sujeitos estudados.<br />
QUADRO 1: Valores terminais e <strong>valores</strong> instrumentais<br />
VALORES TERMINAIS<br />
Amizade Verdadeira<br />
Amor Maduro<br />
Auto-Respeito<br />
Felicidade<br />
Harmonia Interior<br />
Igualdade<br />
Liberdade<br />
Prazer<br />
Reconhecimento Social<br />
Sabedoria<br />
Salvação<br />
Segurança Familiar<br />
Segurança Nacional<br />
Um mundo de Beleza<br />
Um Mundo de Paz<br />
Um Sentimento de Realização<br />
Uma Vida Confortável<br />
Uma Vida Excitante<br />
Fonte: Rokeach (1973)<br />
VALORES INSTRUMENTAIS<br />
Ser Alegre<br />
Ser Ambicioso<br />
Ser Amoroso<br />
Ser Auto-Controlado<br />
Ser Capaz<br />
Ser Corajoso<br />
Ser Educado<br />
Ser Honesto<br />
Ser Imaginativo<br />
Ser Independente<br />
Ser Intelectual<br />
Ser Limpo<br />
Ser Lógico<br />
Ser Magnânimo<br />
Ter Mente Aberta<br />
Ser Obediente<br />
Ser Prestativo<br />
Ser Responsável
52<br />
Segundo Rokeach (1973), a escala de dezoito <strong>valores</strong> terminais e dezoito <strong>valores</strong><br />
instrumentais foi derivada de uma outra composta por doze <strong>valores</strong> terminais e doze <strong>valores</strong> instrumentais.<br />
Os <strong>valores</strong> terminais foram formulados sob a forma de substantivos e os <strong>valores</strong> instrumentais sob a forma<br />
de adjetivos. Os 24 <strong>valores</strong> foram organizados em ordem alfabética em dois blocos (<strong>valores</strong> instrumentais e<br />
<strong>valores</strong> terminais); foi solicitado então aos sujeitos que colocassem em ordem de importância os <strong>valores</strong><br />
como princípios organizadores das suas vidas. Com esse procedimento, Rokeach construiu a forma “A” da<br />
sua escala de <strong>valores</strong>. Mais tarde, Rokeach (1973) ampliou a lista de 24 <strong>valores</strong> para 36, acrescentando, para<br />
tanto, seis <strong>valores</strong> instrumentais e seis <strong>valores</strong> terminais. Esse aumento na escala de <strong>valores</strong> se deveu ao fato<br />
de ter omitido muitos <strong>valores</strong> importantes na versão anterior.<br />
Um dos primeiros fatores importantes nas pesquisas de Rokeach (1968, 1973) sobre os<br />
<strong>valores</strong> humanos foi a condição de os <strong>valores</strong> se referirem como “desejáveis”, ou seja, a idéia do que é certo<br />
ou errado, bom ou ruim, aceitável ou não, dentro dos padrões culturais e sociais. Essa concepção teve<br />
suporte na definição antropológica de valor proposta por Kluckhohn (1951) como uma concepção do<br />
desejável, explícita ou implícita, de indivíduos ou grupos, que orienta na seleção de condutas e metas. Desse<br />
modo, para Rokeach (1972, p. 159-160, citado por HOFSTEDE, 1980, p. 19):<br />
Dizer que uma pessoa “tem um valor” é dizer que ela tem uma crença de<br />
que um modo específico de conduta ou finalidade de existência é<br />
pessoalmente e socialmente preferível a outros modos alternativos de<br />
conduta ou finalidades de existência.<br />
De acordo com Rokeach (1973), os <strong>valores</strong> são <strong>individuais</strong>, ou seja, singulares e organizados<br />
dentro de um sistema hierárquico em função de sua prioridade. Assim, um sistema de <strong>valores</strong> é a<br />
organização hierárquica dos <strong>valores</strong> de um indivíduo em forma de estrutura, que define os <strong>valores</strong> mais<br />
importantes e os menos importantes em determinadas situações em que ele se encontra. Isso mostra que<br />
indivíduos que convivem em um mesmo grupo ou sociedade compartilham de um mesmo sistema de<br />
<strong>valores</strong>, porém o grau de prioridade que cada um deles atribui para cada valor é diferente.<br />
As prioridades de valor individual são produto tanto de uma cultura compartilhada como de<br />
uma experiência pessoal única. No entanto, dentro de grupos culturais há uma variação individual nas<br />
prioridades de <strong>valores</strong>, devido às experiências únicas e às personalidades dos diferentes indivíduos.<br />
Rokeach (1973) afirma que o comportamento do indivíduo depende de seus <strong>valores</strong> em<br />
determinadas situações. Isso vem mostrar que quando o indivíduo dá ênfase aos <strong>valores</strong> sociais, todos os<br />
outros <strong>valores</strong> sociais serão priorizados e os <strong>valores</strong> pessoais sofrerão uma baixa em sua importância.<br />
Porém, quando é um valor pessoal que tem uma preferência maior, todos os outros <strong>valores</strong> pessoais serão<br />
mais importantes que os <strong>valores</strong> sociais.<br />
Entretanto, a divisão dos <strong>valores</strong> de Rokeach em instrumentais e terminais foi questionada por
53<br />
Schwartz e Bilsky (1990). Para eles a diferença <strong>entre</strong> meio e fim não é clara, pois o meio pode-se tornar fim<br />
e vice-versa. Demonstraram essa crítica por meio do exemplo em que prazer, sendo um valor terminal, pode<br />
se tornar, em algumas situações, um valor instrumental no sentido de estar promovendo outros <strong>valores</strong><br />
terminais como a felicidade. Em outro exemplo, auto-suficiente, como valor instrumental, pode tornar-se<br />
fim por ser promovido por outros <strong>valores</strong> instrumentais como competente. Além disso, teoricamente, isso<br />
não possibilitava identificar com clareza empírica os tipos de <strong>valores</strong>, como os instrumentais e os terminais,<br />
previstos na teoria.<br />
Segundo Rokeach (1973), os <strong>valores</strong> também podem ser divididos em: cognitivos, afetivos e<br />
comportamentais. No plano cognitivo encontra-se a percepção, as informações e o conhecimento que o<br />
indivíduo tem dos modos de conduta e estados fins de existência desejáveis. Em relação ao plano afetivo,<br />
compreende-se as emoções e os sentimentos que estão vinculados com o sistema de crenças do indivíduo,<br />
provocando reações que sejam a favor ou contra comportamentos coerentes ou incoerentes ao sistema de<br />
crenças. Quanto ao plano comportamental, esse mostra a disposição de escolher quais as melhores maneiras<br />
de agir em detrimento de outras.<br />
Com base nas escalas de Rokeach (1973), Schwartz e Bilsky (1987, 1990) formularam sua<br />
teoria dos <strong>valores</strong>. Os autores partiram do pressuposto de que a existência do homem se baseia em três<br />
necessidades universais: necessidade dos indivíduos como organismo biológico; necessidade de<br />
coordenação nas interações sociais e necessidade de sobrevivência e bem-estar do grupo. Para eles, dessas<br />
necessidades universais derivam as definições para os domínios motivacionais de <strong>valores</strong>. Vale ressaltar que<br />
Maslow (1954), ao apresentar sua hierarquia das necessidades, não distinguiu valor de necessidade, porém<br />
deixou claro que as necessidades influenciam o comportamento humano. Maslow ressaltou ainda que, à<br />
proporção que o ser humano satisfaz uma necessidade básica, surgem outras mais elevadas no<br />
comportamento do indivíduo. Dessa forma, pode-se perceber a semelhança <strong>entre</strong> o modelo de Maslow e<br />
Schwartz e Bilsky ao construir seus domínios motivacionais de <strong>valores</strong> com base nas necessidades<br />
universais.<br />
Com o pressuposto de que a estrutura dos <strong>valores</strong> humanos se refere à organização conceitual<br />
de <strong>valores</strong> sobre a base das suas similaridades e diferenças e, ainda, das críticas à escala de Rokeach (1973),<br />
Schwartz (1992) construiu sua escala de <strong>valores</strong> composta por 56 itens, dos quais 36 são oriundos da escala<br />
de Rokeach (1973). Na escala de Schwartz (1992), os respondentes devem avaliar quanto cada um dos 56<br />
<strong>valores</strong> é importante como princípio organizador da sua vida pessoal, por meio de uma escala tipo Likert<br />
que varia de -1 (oposto aos <strong>valores</strong> do indivíduo) a +7 (suprema importância), passando pelo zero (nenhuma<br />
importância). Mediante 36 amostras provenientes de 20 países, Schwartz (1992) utilizou uma escala de 56<br />
<strong>valores</strong>, tendo como base instrumentos desenvolvidos em outras culturas, levantamentos específicos e<br />
<strong>entre</strong>vistas com sujeitos muçulmanos e drusos. Desses <strong>valores</strong>, 30 eram <strong>valores</strong> terminais e 26 <strong>valores</strong><br />
instrumentais.<br />
Schwartz tem o grande mérito de conseguir reunir em torno de sua teoria, dos <strong>valores</strong><br />
humanos, pesquisadores dos cinco continentes, em mais de 50 países. Desde o começo do seu modelo<br />
(SCHWARTZ & BILSKY, 1987, 1990), esse autor manteve-se fiel à idéia de que existe um conjunto de
54<br />
motivações universais que originam e organizam os <strong>valores</strong> nas diferentes culturas.<br />
Schwartz (1994, p.21) define <strong>valores</strong> como: “metas transituacionais desejáveis, variando em<br />
importância, que serve como princípios guias na vida de uma pessoa ou outra entidade social.”<br />
Implícito nessa definição de <strong>valores</strong> como metas, ressalta-se: (1) servem os interesses de<br />
algumas entidades sociais; (2) podem motivar a ação – dar direção e intensidade emocional; (3) funcionam<br />
como padrões para julgar e justificar a ação; e (4) são adquiridos tanto por meio da socialização de <strong>valores</strong><br />
de grupos dominantes quanto por meio de experiências de aprendizado único de indivíduos. Outros<br />
construtos relacionados a meta, tais como “projetos sociais” e “tarefas de vida”, podem ser vistos como<br />
expressões de <strong>valores</strong> nos domínios de vida específicos.<br />
A constituição dos <strong>valores</strong>, de Schwartz e Bilsky (1987), baseou-se no raciocínio de que:<br />
frente à realidade do contexto social, indivíduos e grupos convertem, cognitivamente, as necessidades<br />
inerentes à existência humana e as expressam em uma linguagem de <strong>valores</strong><br />
específicos e definidos pela cultura. Esse é um processo no qual o indivíduo simboliza as necessidades e as<br />
coloca no mundo da cultura.<br />
Segundo Tamayo e Schwartz (1993), Schwartz e Bilsky (1987, 1990) consideraram que as<br />
exigências universais do ser humano que constituem a fonte dos <strong>valores</strong>, expressam-se por meio de tipos<br />
motivacionais.<br />
Os dez tipos de <strong>valores</strong> motivacionais, segundo Tamayo e Schwartz (1993, p.331-332) e<br />
Schwartz (1994, p.22) são:<br />
1. Hedonismo: a gratificação de necessidades físicas é transformada em<br />
<strong>valores</strong> socialmente reconhecidos. A meta motivacional deste grupo de<br />
<strong>valores</strong> é o prazer e a gratificação sensual. Exemplo: prazer e vida<br />
divertida.<br />
2. Auto-Realização: a sua meta é o sucesso pessoal obtido através de<br />
uma demonstração de competência que, leva reconhecimento social.<br />
Exemplo: sucesso, capacidade e ambição.<br />
3. Poder Social: o funcionamento da sociedade parece exigir algum<br />
sistema de estratificação de função e de responsabilidade. Desta forma,<br />
surgem no grupo as relações de dominação e submissão. Para justificar<br />
este fato da vida social, o poder é transformado em valor. Necessidades<br />
<strong>individuais</strong> de dominação e de controle podem também ser<br />
transformadas em <strong>valores</strong> relativos ao poder. Segundo Schwartz, a<br />
meta deste tipo de <strong>valores</strong> é a procura de status social, prestígio e<br />
controle sobre pessoas e recursos. Exemplo: poder social, autoridade e<br />
riqueza.<br />
4. Auto-Determinação: os <strong>valores</strong> de auto-determinação procuram a<br />
independência de pensamento, ação, opção. Exemplo: criatividade,<br />
curiosidade e liberdade.<br />
5. Conformidade: a sua meta motivacional é o controle de impulsos e do<br />
próprio comportamento em conformidade com as expectativas sociais.<br />
Exemplo: polidez, obediência e honrar os pais e os mais velhos.
55<br />
6. Benevolência: a meta motivacional é o interesse e a preocupação com<br />
o bem-estar das pessoas íntimas. Exemplo: útil, honesto e perdão.<br />
7. Segurança: a meta dos <strong>valores</strong> deste tipo é a integridade pessoal e de<br />
pessoas e grupos de identificação, assim como a estabilidade da<br />
sociedade e de si mesmo. Exemplo: segurança nacional, ordem social e<br />
limpo.<br />
8. Tradição: etimologicamente significa a transmissão, a transferência de<br />
princípios, ideais e costumes. Todas as sociedades desenvolvem usos,<br />
costumes, práticas e símbolos que representam o seu destino e a sua<br />
experiência comum. A tradição é algo que brota da comunidade e que<br />
se transforma em símbolo da sua própria sobrevivência (DURKHEIM,<br />
1954). A meta motivacional dos <strong>valores</strong> relativos à tradição é o<br />
respeito e a aceitação dos ideais e costumes da sua sociedade.<br />
Exemplo: Humildade, devoto e aceitação da minha parte na vida.<br />
9. Estimulação: os <strong>valores</strong> deste grupo têm como meta a procura de<br />
excitação, novidade e mudança, que parecem ser necessárias para<br />
poder manter um nível satisfatório de funcionamento. Exemplo: vida<br />
excitante e variada.<br />
10. Filantropia 4 : compreensão e aceitação dos outros e preocupação com<br />
o bem-estar de todos. Schwartz denomina este tipo motivacional<br />
“universalismo”.<br />
Os tipos de <strong>valores</strong> relacionados são derivados de três necessidades humanas<br />
universais (SCHWARTZ & BILSKY, 1987, 1990): as necessidades biológicas (organismo),<br />
as necessidades sociais (interação) e as necessidades de sobrevivência e bem-estar do grupo.<br />
Em função de quem se beneficia quando o indivíduo adota ou se comporta de acordo com<br />
cada tipo de valor, Schwartz & Bilsky definem os diferentes interesses que podem cumprir:<br />
individualista (poder, auto-realização, hedonismo e auto-direção), coletivista (tradição,<br />
conformidade e benevolência) ou misto (segurança e filantropia). Uma outra forma de<br />
considerar os tipos de <strong>valores</strong> é em razão das suas dimensões de ordem superior, a saber<br />
(SCHWARTZ, 1994): auto-promoção versus auto-transcendência e abertura à mudança<br />
versus conservação.<br />
Os tipos motivacionais da dimensão auto-promoção têm como <strong>valores</strong> poder e<br />
auto-realização, sendo que poder é busca de status social e prestígio, controle ou domínio<br />
sobre pessoas e recursos materiais; e a auto-realização é a busca de sucesso pessoal.<br />
Os tipos motivacionais da dimensão auto-transcendência têm como base os<br />
<strong>valores</strong> de filantropia e benevolência, sendo que a filantropia é a busca da compreensão, da<br />
tolerância, busca do bem-estar de todas as pessoas e da preservação da natureza; e a<br />
4 Em português a palavra filantropia expressa diretamente o interesse teórico e prático pela felicidade dos<br />
homens.
56<br />
benevolência é a busca do bem-estar das pessoas afetivamente mais próximas.<br />
Os tipos motivacionais da dimensão abertura à mudança são formados pelos<br />
<strong>valores</strong> de auto-direção, estimulação e hedonismo. A auto-direção é a busca da<br />
independência de pensamento, ações, escolhas; a estimulação é a busca de excitação,<br />
novidade e mudança, e o hedonismo é a busca do sentimento de prazer e gratificação com o<br />
próprio eu.<br />
Os tipos motivacionais da dimensão conservação trazem como <strong>valores</strong><br />
segurança, tradição e conformidade. A segurança é a busca da harmonia e estabilidade da<br />
sociedade, das relações interpessoais e do ego; a tradição é a busca dos sentimentos de<br />
respeito e a aceitação dos costumes e idéias da cultura e da religião, e a conformidade é a<br />
busca do controle dos impulsos e das ações que sugerem transgressão das normas sociais.<br />
Figura 2 – Estrutura Bidimensional dos Tipos Motivacionais<br />
Percebe-se que na estrutura motivacional, representada pela figura 2, os <strong>valores</strong><br />
que servem aos interesses <strong>individuais</strong> (poder, auto-realização, hedonismo, estimulação e<br />
auto-direção) formam uma região oposta aos tipos de <strong>valores</strong> que servem a interesses<br />
coletivos (benevolência, tradição e conformidade). Os tipos motivacionais, universalismo e
57<br />
segurança, servem a interesses mistos e estão localizados <strong>entre</strong> as regiões referentes aos<br />
interesses <strong>individuais</strong> e coletivos.<br />
Segundo Tamayo e Schwartz (1993), a teoria dos <strong>valores</strong> humanos proposta<br />
por Schwartz e Bilsky postulam dois tipos básicos de relacionamento: de compatibilidade e<br />
de conflito. Em outras palavras, como os <strong>valores</strong> estão a serviço de interesses <strong>individuais</strong>,<br />
coletivos ou mistos, a relação estabelecida <strong>entre</strong> eles é basicamente de dois tipos: de<br />
compatibilidade e de conflito.<br />
Schwartz e Bilsky (1987; 1990) consideram a compatibilidade <strong>entre</strong> tipos de<br />
<strong>valores</strong> que estão contíguos, ou seja, que estão próximos, que são vizinhos, como, por<br />
exemplo, estimulação e hedonismo, tradição e conformidade. O conflito <strong>entre</strong> os tipos de<br />
<strong>valores</strong> está <strong>entre</strong> aqueles que se situam em direções contrárias, ou seja, que se situam em<br />
lados opostos, como, por exemplo, estimulação e conformidade, hedonismo e tradição.<br />
De acordo com Tamayo e Schwartz (1993), a procura concomitante por tipos<br />
de <strong>valores</strong> motivacionais que pertencem a uma mesma área contígua é possível, porque<br />
esses <strong>valores</strong> estão a serviço de um mesmo interesse e possuem objetivos harmoniosos.<br />
Assim, por exemplo, tanto tradição quanto conformidade buscam a submissão a normas e<br />
o autocontrole. Por outro lado, a procura concomitante de tipos de <strong>valores</strong> situados em<br />
áreas opostas é conflitiva, porque estão a serviço de interesses contrários. Assim, por<br />
exemplo, a preservação da estabilidade e das práticas tradicionais, presente nos <strong>valores</strong> do<br />
tipo tradição, é conflitiva com a procura de mudança e de novidade, que é o núcleo dos<br />
<strong>valores</strong> do tipo estimulação.<br />
Vários estudos têm se fundamentado nessa estrutura empírica (SCHWARTZ &<br />
SAGIV, 1995; SCHWARTZ & ROS, 1995), d<strong>entre</strong> eles destacando-se o trabalho de<br />
Schwartz e Tamayo (1993), realizado no Brasil, que teve como objetivo verificar a<br />
estrutura motivacional dos <strong>valores</strong> com amostras brasileiras. O estudo foi composto por<br />
duas amostras: a primeira formada por 154 professores, sendo 70 do sexo masculino e 84<br />
do sexo feminino, com idade variando <strong>entre</strong> 30 e 31 anos; a segunda, formada por 244<br />
estudantes universitários de ambos os sexos, com idade variando <strong>entre</strong> 21 e 25 anos,<br />
oriundos de cinco regiões geopolíticas do País. Utilizou-se a escala elaborada por<br />
Schwartz, composta por 56 <strong>valores</strong>, sendo 30 <strong>valores</strong> terminais e 26 <strong>valores</strong> instrumentais.<br />
Segundo os autores da pesquisa, foram acrescentados quatro <strong>valores</strong> à cultura<br />
brasileira, devido às suas peculiaridades. Esses <strong>valores</strong>, conforme Tamayo (1997, p.121-<br />
122), foram definidos operacionalmente pelos sujeitos <strong>entre</strong>vistados como:
58<br />
1. Esperto: driblar obstáculos para conseguir o que quero;<br />
2. Sonhador: ter sempre uma visão otimista do futuro;<br />
3. Vaidade: preocupação e cuidado com minha aparência; e<br />
4. Trabalho: modo digno de ganhar a vida.<br />
Percebe-se que os resultados encontrados por Schwartz e Tamayo (1993) num certo sentido<br />
corroboram com as pesquisas de Barros e Prates (1996) e Freitas (1997) quando procuram levantar os traços<br />
da cultura brasileira, enfocando hierarquia, personalismo, malandragem, sensualismo, paternalismo,<br />
flexibilidade, formalismo e lealdade pessoal.<br />
Os resultados do estudo, especificamente os <strong>valores</strong> referentes à cultura<br />
brasileira, apresentaram a seguinte configuração: para o valor sonhador, sua localização<br />
em cada amostra foi diferente. Na amostra relativa aos professores, o valor sonhador se<br />
estabeleceu no domínio de filantropia. Já na amostra dos estudantes, o valor sonhador se<br />
estabeleceu no domínio de benevolência. A meta motivacional desse valor está orientada<br />
para o evitamento ou redução do impacto de frustrações, mediante uma visão otimista do<br />
mundo. O valor esperto, nas duas amostras, professores e estudantes, localizou-se em um<br />
único domínio, o da auto-realização. Sua meta motivacional continua sendo o sucesso<br />
pessoal pela demonstração de competência. O valor vaidade, da mesma forma que o valor<br />
sonhador, localizou-se em domínios diferentes nas duas amostras: na amostra dos<br />
professores, o valor vaidade se estabeleceu numa mistura de regiões adjacentes constituída<br />
por tradição + conformidade + segurança; em relação à amostra dos estudantes, o valor<br />
vaidade foi estabelecido no domínio de poder. Isso significa que o cuidado com a<br />
aparência pessoal produz efeito positivo sobre os outros e atrai sobre si atenção e<br />
admiração. A vaidade é um meio para atingir status social, prestígio, controle e domínio<br />
sobre pessoas e recursos. Por último, o valor trabalho, da mesma forma que o valor<br />
esperto, nas duas amostras, professores e estudantes, localizou-se em um único domínio, o<br />
da benevolência. A sua meta motivacional determina a procura pelo bem-estar das pessoas<br />
íntimas e da família (TAMAYO e SCHWARTZ, 1993).<br />
Com esse estudo, os autores puderam concluir, em relação aos quatro <strong>valores</strong><br />
referentes à cultura brasileira, em primeiro lugar, que a sua localização nas diversas regiões<br />
do espaço multidimensional é mais uma evidência quanto à estrutura motivacional dos<br />
<strong>valores</strong>. Em segundo lugar, que os quatro <strong>valores</strong> estudados nas amostras brasileiras<br />
possuem status de <strong>valores</strong> (TAMAYO e SCHWARTZ, 1993). É importante ressaltar que<br />
esses quatro <strong>valores</strong>, ou seja, Sonhador, Esperto, Vaidade e Trabalho, são próprios da
59<br />
cultura brasileira, constituindo um diferencial em relação às outras culturas. Isso, porém,<br />
não exclui o fato de que os outros <strong>valores</strong> aqui postulados pela tipologia de <strong>valores</strong> de<br />
Schwartz também façam parte da hierarquia de <strong>valores</strong> dos brasileiros.<br />
3. Valores Organizacionais<br />
Os estudos iniciais sobre <strong>valores</strong> enfocaram o indivíduo. Os resultados que foram obtidos<br />
em diversas pesquisas, porém, trouxeram contribuições valiosas para a compreensão do tema, gerando,<br />
com isso, a possibilidade de se estender o conhecimento para outras áreas, como a das organizações.<br />
Entretanto, para se compreender as organizações e o comportamento dos<br />
indivíduos nas mesmas, pressupõe-se o estudo da cultura organizacional e dos <strong>valores</strong> que<br />
constituem o seu núcleo.<br />
Na área organizacional são necessários ainda muitos estudos, pois não há tantas<br />
pesquisas como existem em relação aos <strong>valores</strong> humanos. A pesquisa dos <strong>valores</strong><br />
<strong>organizacionais</strong> é análoga à pesquisa dos <strong>valores</strong> humanos e uma ampliação desta.<br />
Toda organização conta com um conjunto claro e expresso de <strong>valores</strong><br />
compartilhados sobre os quais se erguem as práticas de gerenciamento. Esse conjunto de<br />
<strong>valores</strong> que cada uma das organizações possui compõe uma cultura que as diferenciam<br />
umas das outras.<br />
Para Tamayo (1996, p.182), os “<strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> podem ser definidos<br />
como princípios ou crenças organizadas hierarquicamente, relativos a metas<br />
<strong>organizacionais</strong> desejáveis que orientam a vida da empresa e estão a serviço de interesses<br />
<strong>individuais</strong>, coletivos e mistos.”<br />
Mendes (1999) afirma que os <strong>valores</strong> são importantes para compreensão da<br />
cultura organizacional. Os <strong>valores</strong>, como experiência subjetiva compartilhada, criam nas<br />
organizações a possibilidade de simbolização e mediação das necessidades <strong>individuais</strong> e<br />
<strong>organizacionais</strong>. O sistema de <strong>valores</strong>, assim como a cultura, faz parte de um universo<br />
simbólico que pode permitir a comunicação <strong>entre</strong> os membros de uma determinada<br />
organização, favorecendo a expressão do modo de ser particular do indivíduo e os<br />
processos de crescimento da organização.<br />
Segundo Rokeach (1979), as organizações deixam registros de seus padrões de<br />
<strong>valores</strong> distintivos em seus documentos, registros esses que podem ser observados e<br />
mensurados.
60<br />
Tanto Rokeach (1979) quanto Schwartz (1992) observaram que as diferenças<br />
de <strong>valores</strong> <strong>entre</strong> indivíduos, organizações e nações não provêm do fato de que um grupo ou<br />
pessoa tem um valor específico, uma vez que o mesmo número relativamente pequeno de<br />
<strong>valores</strong> é encontrado na maioria dos ambientes. Ao invés disso, as pessoas e os grupos<br />
diferem em termos da importância que é atribuída aos diferentes <strong>valores</strong>, sendo que essas<br />
diferenças podem, assim, ser descritas em termos de hierarquia de <strong>valores</strong> ou estrutura de<br />
<strong>valores</strong>. Uma estrutura de valor é mais do que uma hierarquia de valor, uma vez que ela é<br />
um padrão de relações <strong>entre</strong> um grupo de <strong>valores</strong>, e os padrões podem diferir tanto em<br />
termos de compatibilidade quanto em termos de conflito <strong>entre</strong> os <strong>valores</strong>.<br />
As organizações adotam os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> como uma crença naquilo<br />
que é valioso e relevante para elas. Nesse sentido, todas as organizações definem aquilo<br />
que merece atenção. Todas, de certa forma, possuem <strong>valores</strong>, sejam eles expressos de<br />
modo formal ou não.<br />
Tamayo & Gondim (1996) enfatizam, no contexto dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>,<br />
as dimensões cognitiva, motivacional, funcional e hierárquica.<br />
No aspecto cognitivo, os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> constituem elementos básicos,<br />
já que eles são crenças sobre o que é e o que não é desejável na organização, sobre o que<br />
promove resultado positivo ou não. Dessa maneira, expressam formas de conhecer a<br />
realidade organizacional, respostas a problemas <strong>organizacionais</strong>. Essas crenças vinculamse<br />
a diversas dimensões da vida organizacional, tais como a produção, a qualidade, as<br />
relações interpessoais, o respeito à autoridade gerencial, a obediência às normas, etc. Nessa<br />
dimensão, os <strong>valores</strong> funcionam como padrões cognitivos para o julgamento e a<br />
justificação do comportamento de si e dos outros.<br />
Na dimensão motivacional, os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> funcionam como<br />
necessidades que determinam o comportamento orientado a um fim (FEATHER, 1995). A<br />
prioridade que uma organização atribui a alguns <strong>valores</strong> determina a quantidade de esforço<br />
que seus membros despendem em certos comportamentos e na vivência dos mesmos.<br />
Nessa dimensão, os <strong>valores</strong> expressam interesses e desejos de alguém, sendo que esses<br />
interesses e desejos podem ser <strong>individuais</strong> ou coletivos.<br />
Quanto à dimensão funcional, os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> têm a função de<br />
orientar a vida da organização, guiar o comportamento dos seus membros e o julgamento<br />
que eles fazem do comportamento dos outros. Esses <strong>valores</strong> são determinantes da rotina<br />
diária da organização. Os <strong>valores</strong> possuem ainda a função “de vincular as pessoas de modo
61<br />
que elas permaneçam dentro do sistema e executem as funções que lhes foram atribuídas”<br />
(KATZ & KAHN, 1978, p.70 apud TAMAYO, 1996).<br />
Em relação à dimensão hierarquia, os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> buscam<br />
preferências, distinção <strong>entre</strong> o importante e o secundário, <strong>entre</strong> o que tem valor e o que não<br />
tem. Nessa dimensão, a essência dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> é permitir uma hierarquização<br />
ao longo de um continuum de importância, tendo como base a relação dos <strong>valores</strong> com a<br />
missão e os objetivos da organização, e também de acordo com as pressões externas<br />
provenientes de mudanças da sociedade, e com o esforço realizado pela organização e<br />
pelos membros para a obtenção das metas propostas.<br />
Segundo Tamayo & Gondim (1996), uma referência a essa hierarquização dos<br />
<strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> que orientam seu funcionamento e sua vida para os membros da<br />
organização é demonstrado pelo seguinte exemplo: uma organização pode ser descrita<br />
como norteada por <strong>valores</strong> referentes aos aspectos técnicos e tecnológicos, ao passo que<br />
outra é percebida como enfatizando o extremo oposto, ou seja, centrando suas<br />
preocupações, principalmente, no bem-estar dos indivíduos que a compõem.<br />
O levantamento dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> está intimamente ligado à<br />
capacidade da organização em atuar na sua área. Eles estão além das próprias normas<br />
definidas pela organização, e constituem uma espécie de ideologia – as normas da<br />
organização estão enraizadas nos <strong>valores</strong>, e podem ser consideradas até mesmo<br />
operacionalização destes (TAMAYO & GONDIM, 1996). As normas definem<br />
explicitamente as formas de comportamento esperadas dos membros de uma organização e<br />
os <strong>valores</strong> proporcionam uma justificação mais elaborada e generalizada, tanto para o<br />
comportamento apropriado, como para as atividades e funções do sistema.<br />
Katz & Kahn (1975) postulam que os componentes principais das organizações<br />
são os <strong>valores</strong>, os papéis e as normas. O essencial são os sistemas de crenças e <strong>valores</strong>, as<br />
interações <strong>entre</strong> os seus membros, as atividades por eles executadas e o próprio<br />
funcionamento da organização. Os papéis, as normas e os <strong>valores</strong> definem e norteiam o<br />
funcionamento da organização. Os papéis definem e ditam formas de comportamento para<br />
as tarefas a executar; as normas são expectativas transformadas em exigências; e os <strong>valores</strong><br />
justificam as aspirações ideológicas mais gerais (KATZ & KAHN, 1978, apud TAMAYO,<br />
1996).
62<br />
Tanto Schein (1991) quanto Hofstede (1994), ao proporem o modelo de<br />
desenvolvimento da cultura organizacional, também atribuem aos <strong>valores</strong> uma posição de<br />
destaque.<br />
De forma geral, pode-se dizer que a cultura consiste em elementos<br />
compartilhados que constituem os padrões para perceber, pensar, agir e comunicar. A<br />
sociedade e as organizações transmitem aos seus membros, por meio de diversos<br />
mecanismos, esses elementos compartilhados. As prioridades axiológicas de uma<br />
sociedade ou de uma organização expressam a estrutura básica da sua cultura<br />
(SCHWARTZ, 1995, 1996).<br />
Percebe-se, pelas idéias dos autores citados, que os <strong>valores</strong> constituem o núcleo<br />
da cultura, também quando se referem às organizações. Os <strong>valores</strong> orientam as práticas<br />
gerenciais, as políticas <strong>organizacionais</strong> e o comportamento dos trabalhadores. Eles são<br />
divulgados na missão e nas políticas da organização, nos documentos oficiais e nos ritos<br />
<strong>organizacionais</strong>.<br />
Tamayo afirma que “os <strong>valores</strong>, com as normas, as crenças compartilhadas, os<br />
símbolos e os rituais constituem os elementos da cultura de uma sociedade ou de uma<br />
empresa” (TAMAYO, 1996, p.175). Basicamente, os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> são crenças<br />
sobre o que é bom e desejável para a organização.<br />
Da mesma forma que os <strong>valores</strong> humanos, onde os indivíduos têm exigências<br />
universais, as organizações também necessitam de exigências universais que têm de ser<br />
satisfeitas para garantir a sua sobrevivência.<br />
Segundo Tamayo (1996), toda organização enfrenta três problemas<br />
fundamentais:<br />
1. a relação <strong>entre</strong> o indivíduo e o grupo, por ser sempre conflituosa no<br />
sentido de estar conciliando as metas e os interesses do indivíduo e<br />
da organização;<br />
2. a necessidade de elaborar uma estrutura para que a organização<br />
possa sobreviver, tais como: a definição de papéis, normas,<br />
subsistemas <strong>organizacionais</strong>, etc.;<br />
3. a relação da organização com o meio ambiente natural e social, pois<br />
toda organização, de uma forma ou de outra, está estabelecida em<br />
algum lugar e inserida em alguma sociedade. Ou seja, a<br />
organização, para sobreviver, precisa manter relação com o meio,<br />
com a sociedade e com as outras organizações. (TAMAYO, 1996,<br />
p.184-185)
63<br />
A partir dessas necessidades e com base na abordagem cultural dos <strong>valores</strong><br />
(SCHWARTZ & ROS, 1995), postulam-se três dimensões bipolares para representar as<br />
alternativas de respostas das organizações: autonomia versus conservação, hierarquia<br />
versus estrutura igualitária e harmonia versus domínio. A escolha que a organização faz<br />
implica valorização de determinadas formas de pensar, de agir e de sentir, que constituem<br />
os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>. Cada um desses pólos consiste no agrupamento empírico de<br />
diversos <strong>valores</strong>, como estão esquematizados na quadro 2:<br />
QUADRO 2: Agrupamento dos Valores Organizacionais por pólos axiológicos<br />
PÓLO AXIOLÓGICO<br />
Autonomia<br />
VALORES<br />
Criatividade, Curiosidade, Eficiência,<br />
Eficácia, Modernização, Qualidade,<br />
Reconhecimento, Competência, Prazer,<br />
Inovação, Realização, Estimulação e<br />
Liberdade.<br />
Conservação<br />
Estrutura Igualitária<br />
Hierarquia<br />
Harmonia<br />
Domínio<br />
Disciplina, Honestidade, Lealdade, Limpeza,<br />
Ordem, Polidez, Prestígio, Segurança,<br />
Sensatez e Sigilo.<br />
Democracia, Descentralização, Justiça,<br />
Qualificação dos Recursos Humanos,<br />
Sociabilidade, Co-gestão, Coleguismo,<br />
Igualdade, Cooperação, Dinamismo,<br />
Independência, Autonomia, Comunicação,<br />
Respeito e Equidade.<br />
Fiscalização, Hierarquia, Obediência, Poder,<br />
Pontualidade, Rigidez, Supervisão e<br />
Tradição.<br />
Integração<br />
Interorganizacional,<br />
Interdependência, Ética, Parceria,<br />
Tolerância, Intercâmbio, Preservação,<br />
Equilíbrio, Preservação da Natureza,<br />
Respeito à Natureza, Espontaneidade e<br />
Iniciativa.<br />
Audácia, Competitividade, Domínio,<br />
Previsibilidade, Produtividade, Satisfação<br />
dos Clientes e Sucesso.
64<br />
Fonte: Mendes (1999, p.127-128).<br />
A primeira dimensão bipolar é constituída por autonomia versus conservação.<br />
Nela encontra-se o primeiro problema que as organizações têm de solucionar, que é o da<br />
relação <strong>entre</strong> o indivíduo e o grupo formado pela própria organização. Procura-se, nessa<br />
dimensão, solucionar os conflitos gerados por essa relação, ou seja, indivíduo e grupo. As<br />
organizações que buscam os <strong>valores</strong> de conservação enfatizam a manutenção do status<br />
quo e a interdição de comportamentos que possam perturbar as normas e as tradições da<br />
organização. Os <strong>valores</strong> desse pólo da dimensão são <strong>valores</strong> sóciocêntricos. No lado oposto<br />
dessa dimensão, há as organizações que buscam os <strong>valores</strong> de autonomia enfatizando<br />
importantes <strong>valores</strong> como a percepção do trabalhador como uma entidade autônoma<br />
habilitada para perseguir os seus próprios interesses e fixar as suas metas em harmonia<br />
com as metas e normas da organização. Essas organizações priorizam <strong>valores</strong> como a<br />
criatividade individual e absoluta confiança na responsabilidade individual.<br />
Neste pólo da dimensão existem duas formas de autonomia: individualismo ou<br />
autonomia intelectual, com o foco voltado para os <strong>valores</strong> de autodeterminação<br />
(criatividade, curiosidade), que dá o direito ao indivíduo de buscar na vida organizacional<br />
as suas próprias diretrizes intelectuais. A outra forma é o individualismo afetivo, que centra<br />
nos <strong>valores</strong> de estimulação e hedonismo (prazer e vida excitante) e dá o direito ao<br />
indivíduo de um espaço para expressar a sua experiência afetiva. As soluções para os<br />
problemas surgidos nessa dimensão deverão ser buscados no contínuo definido pelo<br />
individualismo e o coletivismo.<br />
A segunda dimensão bipolar é hierarquia versus estrutura igualitária. Nessa<br />
segunda dimensão encontra-se o segundo problema que toda organização deve resolver,<br />
que é o da estrutura. A solução desse problema é fundamental, pois sem a sua solução a<br />
organização não pode funcionar e nem sequer existir. Isso porque é a estrutura que define o<br />
sistema social da organização, as funções que devem ser executadas e as relações <strong>entre</strong> as<br />
diversas unidades e <strong>entre</strong> os membros que compõem a organização.<br />
O primeiro pólo da dimensão, o da hierarquia, enfatiza que a forma de<br />
garantir o comprometimento dos trabalhadores da organização com sua missão é por meio<br />
da hierarquia. Os <strong>valores</strong> culturais presentes nesse pólo, e que expressam uma nítida<br />
preferência pela hierarquia, são a autoridade, o poder social, a influência, a fiscalização e a<br />
supervisão. Esses <strong>valores</strong> dão uma maior legitimidade na definição e distribuição
65<br />
hierárquica de recursos e de papéis sociais na organização. No lado oposto dessa dimensão<br />
encontra-se a opção pela estrutura igualitária, que expressa a preocupação com o bemestar<br />
dos outros e da organização em geral. A estrutura igualitária caracteriza-se por<br />
possuir poucos níveis de autoridade e ter um gerenciamento por consenso. Os<br />
trabalhadores da organização são tratados como seres humanos, ou seja, como pessoas e<br />
não como recursos humanos. Os <strong>valores</strong> culturais presentes nesse pólo que expressam<br />
nitidamente a estrutura igualitária, são a justiça social, a igualdade, a responsabilidade e a<br />
eqüidade. As soluções para os problemas surgidos nessa dimensão deverão ser buscadas<br />
num contínuo que vai da hierarquia ao igualitarismo.<br />
A terceira dimensão bipolar é caracterizada pela harmonia versus domínio.<br />
Nessa dimensão bipolar encontra-se o terceiro problema que toda organização precisa<br />
resolver, que é o seu relacionamento físico e social, ou seja, o contexto no qual a<br />
organização está inserida.<br />
O pólo da harmonia representa a busca por um relacionamento harmonioso<br />
com a natureza e com as outras organizações. Os <strong>valores</strong> presentes nesse pólo são a<br />
proteção da natureza, a cooperação e a integração interorganizacional, que expressam a<br />
tentativa de um acomodamento harmonioso no seu meio ambiente. No lado oposto dessa<br />
dimensão encontra-se o domínio que representa a tentativa de assertividade da organização<br />
pela dominação dos recursos materiais, do mercado, da tecnologia e do conhecimento na<br />
área específica de atuação. Os <strong>valores</strong> presentes nesse pólo referem-se ao domínio,<br />
controle e à exploração do ambiente físico e social para obtenção da auto-afirmação da<br />
organização.<br />
Segundo Tamayo (1996), as organizações onde predominam os <strong>valores</strong> de<br />
domínio tendem a ter sucesso mesmo à custa do comprometimento do meio ambiente. Em<br />
relação às organizações onde predominam os <strong>valores</strong> de harmonia, elas tendem a<br />
desenvolver e ter sucesso por meio de uma interação harmoniosa com a natureza e com as<br />
outras organizações.<br />
Com base na fonte dos <strong>valores</strong>, Tamayo postula que os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong><br />
se organizam e se estruturam em torno das três dimensões bipolares já citadas. Assim, os<br />
<strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> poderiam ser classificados em sete tipos motivacionais definidos<br />
pelos pólos opostos dessas três dimensões, como mostra o gráfico:<br />
Harmonia<br />
Estrutura
66<br />
Autonomia Intelectual<br />
Igualitária<br />
Autonomia<br />
Conservador<br />
Autonomia Afetiva<br />
Hierarquia<br />
Domínio<br />
Figura 3 - Estrutura dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> (TAMAYO, 1996, p. 188)<br />
Tamayo (1996) afirma que, ao sobrepor o eixo da estrutura bidimensional dos<br />
<strong>valores</strong> sociais com o eixo da estrutura bidimensional dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, é<br />
possível fazer uma correlação das áreas de conflito e de convergência <strong>entre</strong> as prioridades<br />
axiológicas da organização e do trabalhador.<br />
Os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> não devem ser confundidos com os <strong>valores</strong><br />
<strong>individuais</strong> dos membros da organização, nem com os que eles gostariam que existissem<br />
na organização (TAMAYO, 1996). Os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> se diferenciam dos <strong>valores</strong><br />
<strong>organizacionais</strong>, na medida em que aqueles são crenças de cada um dos indivíduos e estes<br />
são <strong>valores</strong> que, embora um indivíduo possa não concordar, pessoalmente, verifica como<br />
sendo um valor da organização em que trabalha. Quase todo trabalhador é capaz de<br />
detectar diferenças nos <strong>valores</strong> predominantes de determinadas organizações e que<br />
determinam seu clima e sua cultura organizacional. Tamayo (1996) afirma que seria falácia<br />
equacionar os <strong>valores</strong> da organização com as finalidades e metas dos seus membros. A<br />
organização possui uma estrutura de <strong>valores</strong> que não combina necessariamente com os<br />
<strong>valores</strong> de seus trabalhadores e que, inclusive, pode ser conflitivo, no todo ou em parte,<br />
com os deles.<br />
Para Lupi (1995), o sistema de <strong>valores</strong> de um indivíduo vai se construindo com<br />
o tempo e também se transformando. No entanto, ele considera que existe um núcleo de<br />
<strong>valores</strong> subjetivos adquiridos nos primeiros anos de vida, por meio das relações parentais,<br />
que são muito consistentes e duradouros. Judge & Bretz (1992) realizaram uma pesquisa<br />
sobre <strong>valores</strong> no trabalho e concluíram que as pessoas tendem a escolher o trabalho cujo o<br />
conteúdo de <strong>valores</strong> é similar à sua própria orientação de valor, e Ravlim & Meglino<br />
(1989) consideram pouco provável que a socialização no ambiente de trabalho altere a<br />
estrutura básica de <strong>valores</strong> que o indivíduo traz para a organização. Por outro lado, Freitas
67<br />
(1991) cita uma pesquisa com 305 Chief Executive Officers (CEOs), cujas percepções<br />
refletem que os <strong>valores</strong> têm sido dirigidos pelas organizações, que os <strong>valores</strong> são moldados<br />
pela cúpula administrativa; e que os CEOs podem mudar os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>. A<br />
autora salienta também que a cúpula e a administração média se identificam em alguma<br />
extensão com os <strong>valores</strong> básicos e que a identificação existe nos níveis inferiores, ainda<br />
que em menor proporção. Se isso é verdade, ou seja, se os <strong>valores</strong> são tão consistentes,<br />
tem-se de admitir que a dinâmica das organizações, a definição de papéis, a elaboração dos<br />
sistemas de normas e todos os demais procedimentos <strong>organizacionais</strong> têm certa aprovação<br />
da maioria dos seus membros.<br />
Ao pesquisar <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> e suas formas de transmissão,<br />
manutenção e mudanças, busca-se não apenas o entendimento das organizações, como<br />
também a criação de práticas de prevenção e aperfeiçoamento dos trabalhadores nas<br />
mesmas, <strong>entre</strong> si e com o mercado, promovendo condições de sobrevivência e<br />
competitividade no mercado globalizado e cada vez mais exigente.<br />
As organizações, para se manterem competitivas, devem estar atentas aos<br />
<strong>valores</strong> que norteiam suas metas e ações, assim como as de seus trabalhadores e dirigentes,<br />
para compreenderem melhor a dinâmica de seu funcionamento, bem como para propor<br />
ações preventivas, corretivas e prescritivas.<br />
Os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, enfim, constituem um referencial importante, uma<br />
vez que as prioridades axiológicas da organização determinam e sustentam a cultura<br />
organizacional, possivelmente influenciando a formação de vínculos do indivíduo com ela.<br />
O próximo capítulo tem o objetivo de apresentar a Qualidade de Vida no<br />
Trabalho, termo usado de forma mais abrangente em função da preocupação com a saúde<br />
do trabalhador. Far-se-á um levantamento dos principais conceitos, o itinerário histórico,<br />
suas principais abordagens e a aplicação das mesmas em alguns estudos desenvolvidos no<br />
Brasil.
CAPÍTULO 3<br />
QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO<br />
Atualmente tem sido intenso o esforço empreendido pelas organizações para<br />
sobreviverem, como também tem sido enorme o desgaste impingido ao trabalhador. A<br />
atenção dada à satisfação não é um tema recente. A conscientização dos trabalhadores fez<br />
com que cientistas e dirigentes de organizações começassem a investigar que fatores do<br />
trabalho estariam afetando a satisfação do trabalhador. Por isso, o conceito de Qualidade<br />
de Vida no Trabalho (QVT) vem evoluindo, ampliando e orientando-se cada vez mais para<br />
a democracia industrial, a humanização do trabalho e a responsabilidade social das<br />
organizações.<br />
Inseridas num cenário cada vez mais competitivo, as organizações, principalmente as organizações públicas, têm<br />
cada vez mais a função de suprir as expectativas da sociedade e, para isso, devem estar voltadas para a valorização e o respeito ao<br />
ser humano.<br />
Nesse sentido, as organizações, diante dos processos de mudança e dos constantes avanços tecnológicos, têm<br />
buscado a qualidade e a competitividade para fazer frente à globalização da economia, o que exige maior participação dos<br />
trabalhadores nos processos <strong>organizacionais</strong>. Para tanto, defende-se que, se uma organização deseja um desenvolvimento sólido,<br />
deve preocupar-se com a qualidade de vida dos seus trabalhadores.<br />
A abordagem da Qualidade de Vida no Trabalho tem recebido distintas nomenclaturas, conforme a evolução do<br />
pensamento administrativo e das conseqüentes relações de trabalho vivenciadas pelo trabalhador, sendo que, em sua essência,<br />
refere-se à facilitação ou satisfação das necessidades do trabalhador no desenvolvimento de suas atividades (RODRIGUES, 1994).<br />
O tema Qualidade de Vida no Trabalho é uma abordagem de humanização do trabalhador, que visa proporcionarlhe<br />
satisfação e envolvimento psicológico saudável com o trabalho que realizam. Nesse sentido, buscou-se realizar uma pesquisa<br />
para o estudo da relação de um Programa de Qualidade de Vida no Trabalho com os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e <strong>organizacionais</strong> de uma<br />
organização.<br />
1. Evolução da Qualidade de Vida no Trabalho<br />
Os estudos de Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) não tiveram um início<br />
vinculado com a melhoria das condições de trabalho, pelo contrário, estiveram mais<br />
voltados à busca de produtividade e lucratividade. Atualmente, a QVT é vista de uma<br />
maneira mais abrangente, envolvendo vários tipos de programas e perspectivas que visam
210<br />
não só a humanização do trabalho, na ótica do trabalhador, bem como a competitividade<br />
das organizações, na ótica dos empresários.<br />
Segundo Moraes (1990), a origem do movimento de Qualidade de Vida no Trabalho surgiu na década de 1930,<br />
com a Escola das Relações Humanas, contrariando os pressupostos de Tylor e concedendo lugar às pessoas que trabalham e<br />
contribuem no contexto organizacional – em contrapartida ao enfoque anterior, prioritário não somente à sistematização das tarefas,<br />
mas também ao trabalhador e ao ambiente de trabalho. Já naquela época, acreditava-se que tal referencial era o que mais se<br />
identificava com o que se convencionou denominar posteriormente como Qualidade de Vida no Trabalho.<br />
A base desse movimento foi propiciada pelos clássicos estudos de Elton Mayo<br />
e seus colaboradores, que verificaram pela primeira vez, de forma sistemática, a<br />
importância dos fatores psicossociais 5 na vida da organização. Em Hawthorne, Mayo e<br />
seus colaboradores pesquisaram a relação <strong>entre</strong> a iluminação do ambiente e a<br />
produtividade dos trabalhadores, constatando que os fatores psicossociais poderiam<br />
aumentar ou diminuir o nível de produção, ao influenciar o grau de satisfação do<br />
trabalhador.<br />
Entretanto, foi na década de 1950, na Inglaterra, que Eric Trist e colaboradores desenvolveram um modelo que<br />
agrupava o trinômio: indivíduo – trabalho – organização, iniciando assim os primeiros estudos sobre QVT. Utilizando uma<br />
abordagem sócio-técnica em relação à organização do trabalho, demonstraram as ligações <strong>entre</strong> a introdução de novas tecnologias e<br />
os graus de conflitos interpessoais e intergrupais em uma mina de carvão, tendo como finalidade principal a organização do<br />
trabalho, a partir da análise e da reestruturação da tarefa (VIEIRA, 1996).<br />
Segundo o modelo dos sistemas sócio-técnicos, todo processo produtivo requer tanto a organização técnica quanto<br />
a organização social inter-relacionadas para concretizar os objetivos do empreendimento. Não é a tecnologia que determina a forma<br />
de trabalho e o relacionamento dos grupos de trabalho, como foi tão popularizado na administração científica. As variáveis<br />
psicossociais dos Recursos Humanos são fatores que afetam, porque influenciam a adoção de tecnologias (ORTSMAN, 1984;<br />
BERGERÓN, PETIT e BÉLANGER, 1984).<br />
No entanto, somente na década de 1960 é que o movimento sobre QVT tomou impulso, a partir da conscientização<br />
da importância de se buscarem melhores formas de organizar o trabalho, com a finalidade de minimizar os seus efeitos negativos<br />
sobre o trabalhador e alcançar o seu bem-estar geral.<br />
Alia-se a esse movimento sobre QVT o surgimento da Escola Comportamental, a partir da metade da década de<br />
1950 e no decorrer da década de 1960. Como desmembramento da Escola de Relações Humanas, através de Abraham H. Maslow e<br />
Frederick Herzberg, a Escola Comportamental enfocou a teoria das necessidades humanas, propôs uma teoria baseada em fatores<br />
higiênicos e motivacionais e no enriquecimento da tarefa (CHIAVENATO, 2000).<br />
Huse e Cummings (1985) acreditam que a conscientização dos trabalhadores e o aumento das responsabilidades<br />
sociais das organizações contribuíram de forma decisiva para a ampliação das discussões sobre o tema QVT, junto aos<br />
pesquisadores e dirigentes <strong>organizacionais</strong>.<br />
Segundo Vieira (1996), a primeira fase do movimento sobre QVT estendeu-se até 1974, quando houve uma queda<br />
no interesse pela QVT, em função da preocupação com questões econômicas, como a energia e a crescente inflação. A necessidade<br />
de sobrevivência das organizações fez com que os interesses dos trabalhadores passassem a ter uma importância secundária.<br />
A partir de 1979 ressurgiu a preocupação com a QVT devido, principalmente, à<br />
perda de competitividade das organizações norte-americanas frente às suas concorrentes<br />
japonesas. Essa perda de competitividade levou à investigação dos estilos gerenciais<br />
praticados em outros países e a relacionar os programas de produtividade aos esforços com<br />
a melhoria da QVT (BOWDITCH & BUONO, 1992; BURREL & MORGAN, 1979).<br />
Segundo Moraes (1992), a partir de 1979 a preocupação com a Qualidade de<br />
Vida no Trabalho toma um novo rumo, passando a ser vista como um conceito global,<br />
como uma forma de enfrentar os problemas de qualidade e produtividade.<br />
5 Tais fatores referem-se às concepções psicológicas e sociológicas bem como suas inter-relações, que<br />
influenciam significativamente o comportamento do ser humano em seu local de trabalho.
211<br />
É a partir da década de 1980 que se firma a tendência pela maior participação<br />
do trabalhador nos processos decisórios da organização.<br />
Já na década de 1990, a Qualidade de Vida no Trabalho torna-se foco de<br />
programas que relatam <strong>valores</strong> ambientais e humanísticos, negligenciados pelo avanço<br />
tecnológico.<br />
De acordo com Fernandes (1996), no Brasil a preocupação com a QVT surge também em função da preocupação<br />
com a competitividade das organizações, num contexto de maior abertura para importação de produtos estrangeiros e na esteira dos<br />
Programas de Qualidade Total.<br />
Para Moraes (1990), Rodrigues (1994), Fernandes (1996), Vieira (1996) e Búrigo (1997), a QVT é atualmente<br />
bastante difundida e altamente desenvolvida em diversos países, como França, Alemanha, Dinamarca, Itália, Estados Unidos,<br />
Canadá e México. No Brasil, <strong>entre</strong>tanto, o interesse pelo referido tema pode ser considerado recente, embora já sejam várias as<br />
pesquisas e estudos que o apontam, como a de Fernandes e Gutierrez (1988) e a de Fernandes e Becker (1989).<br />
2. Definições de Qualidade de Vida no Trabalho<br />
Diversos são os autores que definem conceitos e modelos de QVT. No entanto, é importante ressalvar que não<br />
existe um consenso acerca da conceituação do termo QVT e, salienta-se, este trabalho não tem a intenção de esgotar a definição de<br />
tal abordagem.<br />
Segundo Rodrigues (1994), a qualidade de vida sempre foi objeto de preocupação dos pesquisadores.<br />
Autores como Moraes (1990), Rodrigues (1994), Vieira (1996), Fernandes (1996) e Búrigo (1997) concordam que<br />
foi <strong>entre</strong> os anos compreendidos <strong>entre</strong> 1950 e 1960 que surgiu a abordagem com a denominação Qualidade de Vida no Trabalho<br />
(QVT). De acordo com Rodrigues (1994), a QVT vem recebendo várias denominações ao longo do tempo, mas sua essência<br />
continua sendo a mesma, ou seja, satisfazer as necessidades do trabalhador por meio do desenvolvimento de suas atividades nas<br />
organizações.<br />
O termo Qualidade de Vida no Trabalho tem sido utilizado para referir-se a<br />
uma série de preocupações e projetos, sendo redefinido no transcorrer do tempo, à medida<br />
que a concepção de trabalho evoluiu. Possui ampla abrangência na organização a ponto de<br />
qualquer iniciativa de melhoramento das condições de trabalho, ou mesmo das atividades<br />
desenvolvidas, ser chamada de QVT.<br />
No entender de Lima (1994), na busca de humanizar as relações de trabalho,<br />
QVT deve estar associada tanto à satisfação dos trabalhadores quanto ao desenvolvimento<br />
da organização, considerando a expectativa de que as pessoas serão mais produtivas quanto<br />
mais satisfeitas e envolvidas estiverem com o próprio trabalho. Os trabalhadores aqui são<br />
entendidos não apenas como aqueles que executam atividades-meio, mas todos os<br />
profissionais que movem a organização.<br />
Conforme França (1997, p. 80):<br />
Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) é o conjunto das ações de uma<br />
empresa que envolvem uma implantação de melhorias e inovações<br />
gerenciais e tecnológicas no ambiente de trabalho. A construção da<br />
qualidade de vida no trabalho ocorre a partir do momento em que se<br />
aborda a empresa e as pessoas como um todo. O posicionamento<br />
psicossocial representa o fator diferencial para a realização de
212<br />
diagnóstico, campanhas, criação de serviços e implantação de projetos<br />
voltados para a preservação e desenvolvimento das pessoas, durante o<br />
trabalho na empresa.<br />
Para Walton (1973, p. 11):<br />
QVT é a preocupação com determinados <strong>valores</strong> humanísticos e<br />
ambientais de certa forma, negligenciados pela sociedade industrializada<br />
em favor da tecnologia avançada, da produtividade industrial e do<br />
crescimento econômico.<br />
De acordo com Nadler e Lawler (1983), o termo QVT é definido como sendo<br />
um modo de pensar sobre pessoas, trabalho e organizações. Conforme esses autores, o<br />
referido termo estuda o impacto do trabalho sobre as pessoas, bem como sobre a eficácia<br />
organizacional. Segundo Nadler e Lawler (1983), são caracterizadas como atividades de<br />
QVT: participação nas decisões; reestruturação do trabalho pelo enriquecimento de tarefas<br />
e grupos de trabalho autônomo; inovação no sistema de recompensas com influência no<br />
clima organizacional; e melhora no ambiente de trabalho no que se refere a horas de<br />
trabalho, condições, regras e meio ambiente físico, <strong>entre</strong> outros.<br />
De acordo com Búrigo (1997), a QVT busca humanizar as relações de trabalho<br />
na organização, mantendo uma relação estreita com a produtividade e principalmente com<br />
a satisfação do trabalhador no seu ambiente de trabalho. Constitui-se ainda em condição de<br />
vida no trabalho, associada ao bem-estar, à saúde e à segurança do trabalhador.<br />
Segundo Vieira e Hanashiro (1990, p.45) QVT é a<br />
melhoria nas condições de trabalho com extensão a todas as funções de<br />
qualquer natureza e nível hierárquico em termos das variáveis<br />
comportamentais, ambientais e <strong>organizacionais</strong> que venham juntamente com<br />
o estabelecimento de políticas de Recursos Humanos, humanizar o emprego<br />
de forma a obter-se um resultado satisfatório, tanto para o emprego como<br />
para a organização.<br />
A partir desses conceitos, entende-se que a QVT possui uma conceituação<br />
ampla, abrangendo várias dimensões, sendo uma delas a que estaria relacionada ao<br />
conjunto de condições e práticas <strong>organizacionais</strong>, procurando maior satisfação por meio de<br />
cargos, participação nas decisões, sistemas de recompensa, ambiente de trabalho, d<strong>entre</strong><br />
outras; uma outra, atendendo às condições de trabalho, como as necessidades básicas,<br />
expectativas do trabalhador, ambas com reflexos na satisfação e na produtividade.
213<br />
Admite-se que a QVT, vista como processo de mudança cultural, é o alicerce<br />
de qualquer organização que planeje implantar programas de qualidade. Afinal, implantar<br />
programas de qualidade sem QVT assemelha-se ao velho padrão “faça o que digo, mas não<br />
faça o que faço”, uma vez que sugere parcialidade em detrimento da visão do todo<br />
(BÚRIGO, 1997).<br />
Contudo, em termos gerais, apesar das diferentes definições da QVT, pode-se<br />
verificar a ampla relação das mesmas, caracterizando-a como uma abordagem de Recursos<br />
Humanos à procura da maior satisfação do ser humano no ambiente de trabalho, bem como<br />
fora dele, resultando em benefícios a ele e ao próprio desenvolvimento da organização.<br />
Apresenta-se, a seguir, um quadro comparativo do processo evolutivo do<br />
pensamento de Qualidade de Vida no Trabalho, desde a década de 1950.<br />
QUADRO 3: O processo evolutivo do pensamento de qualidade de vida no trabalho<br />
PERÍODO FOCO PRINCIPAL<br />
DEFINIÇÃO<br />
1959 / 1972 Variável A QVT foi tratada como reação individual ao<br />
trabalho ou às conseqüências pessoais de<br />
experiência no trabalho.<br />
1969 / 1974 Abordagem A QVT dava ênfase ao indivíduo antes de dar<br />
ênfase aos resultados <strong>organizacionais</strong>, mas ao<br />
mesmo tempo era vista como um elo dos projetos<br />
cooperativos do trabalho gerencial.<br />
1972 / 1975 Método A QVT foi um meio para engrandecimento do<br />
ambiente de trabalho e para maior produtividade e<br />
satisfação.<br />
1975 / 1980 Movimento A QVT, como movimento, visa a utilização dos<br />
termos “gerencimento participativo” e<br />
“democracia industrial” com bastante freqüência,<br />
invocador como ideais de movimento.<br />
1979 / 1982 Tudo A QVT é vista como um conceito global e como<br />
uma forma de enfrentar os problemas de qualidade<br />
e produtividade.<br />
Previsão<br />
futura<br />
Nada A globalização da definição trará como<br />
conseqüência inevitável a descrença de alguns<br />
setores sobre o termo QVT. E para estes QVT nada<br />
representará.<br />
Fonte: (NADLER E LAWLER, apud RODRIGUES, 1994).
214<br />
Nota-se que a concepção de QVT foi evolutiva, recebendo várias qualificações.<br />
Segundo Verazo (1999), a QVT como variável (1959 a 1972) foi uma reação do indivíduo<br />
ao trabalho. Nesse estágio era investigada a forma de melhorar a qualidade de vida no<br />
trabalho para o indivíduo. Isto é, a característica marcante dessa fase foi o impacto do<br />
trabalho sobre o indivíduo, como uma variável.<br />
O foco da QVT na fase abordagem (1969 a 1974) era o indivíduo antes do<br />
resultado organizacional, mas, ao mesmo tempo, tendia a trazer melhorias tanto para o<br />
trabalhador como para a direção, ou seja, essa fase significou a união trabalhoadministração<br />
em projetos cooperativos, como uma abordagem.<br />
A QVT como um método (1972 a 1975) significou um conjunto de abordagens,<br />
métodos ou técnicas para melhorar o ambiente de trabalho e tornar o trabalho mais<br />
produtivo e mais satisfatório. Nessa fase a QVT era vista como sinônimo de grupos<br />
autônomos de trabalho, enriquecimento de cargo ou desenho de novas plantas com<br />
integração social e técnica.<br />
A QVT como um movimento (1975 a 1980) tratou da declaração ideológica<br />
sobre a natureza do trabalho e as relações dos trabalhadores com a organização. Nessa fase,<br />
os termos administração participativa e democracia industrial eram freqüentemente ditos<br />
como ideais do movimento de QVT.<br />
A QVT na fase tudo (1979 a 1982) é vista como uma panacéia contra a<br />
competição estrangeira, os problemas de qualidade, a baixa produtividade, problemas de<br />
queixas e outros problemas <strong>organizacionais</strong>. Essa fase era vista como um conceito global,<br />
freqüentemente percebido como um recurso sem nenhum valor, empregado para remediar<br />
as dificuldades.<br />
Por fim, a QVT como nada (futuro) vem demonstrar que no caso de alguns<br />
projetos seus fracassarem no futuro, ela não passará apenas de “modismo” passageiro, isto<br />
é, caso alguns projetos fracassem, não passando de apenas modismo transitório, devido ao<br />
tom vago do conceito, a QVT pode parecer igual a nada.<br />
Percebe-se que nessa evolução da QVT houve um interesse em conciliar o<br />
trabalhador com a organização e cada vez mais se volta para o trabalhador como ser<br />
humano.
215<br />
Alguns autores, como Hackman e Odlhan (1975), Nadler e Lawler (1983),<br />
Siqueira e Coleta (1989), Fernandes (1996) e Walton (1973), <strong>entre</strong> outros, têm<br />
desenvolvido modelos de QVT no intuito de apresentarem categorias ou indicadores que<br />
possam conceituar e avaliar as atividades de QVT nas organizações.<br />
3. Algumas Abordagens Sobre Qualidade de Vida no Trabalho<br />
Como percebido, o termo QVT possui uma abrangência de elementos e<br />
diferentes perspectivas, não sendo encontrada, na literatura pertinente, uma definição<br />
consensual e definitiva para o tema. Esse fato traz como conseqüência uma diversidade de<br />
abordagens que se diferenciam, em alguns casos, nas variáveis básicas de análise.<br />
Entretanto, em todos os modelos o ponto em comum é a essência humanista do conceito de<br />
Qualidade de Vida no Trabalho.<br />
Cada autor possui importância significativa na evolução dos estudos sobre<br />
QVT nas organizações. Dessa forma, destacam-se aqui algumas abordagens que têm<br />
exercido influência na maioria dos estudos de Qualidade de Vida no Trabalho<br />
desenvolvidos no Brasil.<br />
3.1. Abordagem de Hackman e Oldhan<br />
A abordagem de Hackman e Oldhan (1975) tem como pressuposto que a<br />
realização pessoal e profissional é resultante de três estados psicológicos críticos, que o<br />
indivíduo experimenta na sua relação com o trabalho: percepção de significância do<br />
trabalho (PST); percepção da responsabilidade pelos resultados (PRR); conhecimento dos<br />
reais resultados do trabalho (CTR).<br />
Quanto mais esses três estados estiverem presentes nas pessoas, mais elas<br />
estarão internamente motivadas para o trabalho – uma motivação baseada no trabalho em<br />
si e não em recompensas extrínsecas e controladas por outros. De acordo com Hackman e<br />
Oldhan (1975), esses estados psicológicos alteram-se de acordo com as dimensões da<br />
tarefa, interferindo no grau de satisfação geral do indivíduo e no grau de motivação interna<br />
em relação ao seu trabalho, assim como no grau de satisfação relativo às perspectivas de<br />
crescimento, segurança no trabalho, supervisão, compensação e ambiente social.<br />
Consideram ainda que toda essa cadeia de fatores determinantes de QVT é influenciada,<br />
em sua essência, pela força da Necessidade de Crescimento Individual (NIC) do
216<br />
trabalhador. Essa variável é definida como a necessidade de auto-desenvolvimento, que se<br />
traduz no desejo de adquirir novos conhecimentos e experimentar suas aplicações no<br />
trabalho, de ser criativo, de se desenvolver e colocar em prática idéias próprias e agir nele<br />
de forma independente.<br />
As dimensões da tarefa, presentes no modelo de Hackman e Oldhan (1975),<br />
podem ser relacionadas da seguinte forma:<br />
• Variedade de Habilidade (VH) – grau em que a tarefa exige diferentes habilidades;<br />
• Identidade da Tarefa (IT) – medida em que o trabalho é realizado do início ao fim;<br />
• Significado da Tarefa (ST) – grau em que a tarefa tem ressonância sobre a vida ou<br />
sobre o trabalho de outras pessoas, no ambiente interno e externo à organização;<br />
• Autonomia (AU) – grau de independência do homem para programar e executar<br />
tarefas;<br />
• Feedback Extrínseco (FE) – nível de informações diretas que o indivíduo recebe dos<br />
colegas, supervisores ou clientes, sobre seu desempenho;<br />
• Feedback Intrínseco ou do Próprio Trabalho (FI) – grau em que a própria execução<br />
da tarefa fornece informações acerca da performance do trabalhador;<br />
• Inter-relacionamento (IR) – contatos com as outras pessoas, proporcionado pelo<br />
trabalho.<br />
O modelo contempla ainda dois grupos de variáveis, quais sejam: resultados<br />
pessoais de trabalho e satisfações contextuais. O primeiro grupo encontra-se atrelado às<br />
reações afetivas pessoais ou sentimentos do indivíduo no desempenho do seu trabalho,<br />
gerando resultados como produção de alta qualidade, redução no absenteísmo e na<br />
rotatividade. Esse grupo é composto pelos seguintes elementos: a) Satisfação Geral com o<br />
Trabalho (SG); b) Motivação Interna para o Trabalho (MIT); c) Produção de Trabalho de<br />
Alta Qualidade (PTAQ); d) Absenteísmo e Rotatividade Reduzidos (ARR). O segundo<br />
grupo, por sua vez, tenta identificar a extensão do bem-estar do indivíduo em relação às<br />
Necessidades de Crescimento (NC); Supervisão Adequada (SA); Segurança no Trabalho<br />
(ST); Compensação (C); e Ambiente Social (AS).<br />
A partir desse modelo, pode-se então entender a Qualidade de Vida no<br />
Trabalho como resultante direta da combinação de dimensões básicas da tarefa, capazes de<br />
gerar determinados estados psicológicos que, por sua vez, resultam em motivação e<br />
satisfação em diferentes graus.
217<br />
Pode-se sintetizar o modelo de Hackman e Oldhan (1975), ressaltando que as<br />
realizações pessoais do trabalhador a partir de seu trabalho e aquelas que experimenta com<br />
o trabalho em si constituem fatores determinantes de QVT. Elas resultam dos estados<br />
psicológicos do indivíduo, que advêm de uma combinação <strong>entre</strong> seus diferentes níveis de<br />
percepção sobre as dimensões da tarefa prevista no modelo. Todo esse processo é<br />
diretamente permeado pela Necessidade Individual de Crescimento do Trabalhador.<br />
3.2. Abordagem de Westley<br />
Westley (1979) entende a QVT como os esforços empreendidos pelas<br />
organizações na busca de uma maior humanização do ambiente de trabalho. Ou seja, a<br />
QVT relaciona-se a esforços voltados para a humanização do trabalho, que buscam<br />
solucionar problemas gerados pela própria natureza das organizações existentes na<br />
sociedade industrial. Para esse autor, quatro fatores na organização afetam diretamente a<br />
qualidade de vida no trabalho: o Político, que causa a insegurança; o Econômico, que traz<br />
a injustiça devido à exploração da força de trabalho; o Psicológico, que causa a alienação;<br />
e o Sociológico, que tem como conseqüência a anomia.<br />
O Econômico é representado pela equidade salarial e pelo tratamento recebido;<br />
o Político é representado pelo conceito de segurança no emprego, o direito de trabalhar e<br />
não ser discriminatoriamente dispensado; o Psicológico é representado pelo conceito de<br />
auto-realização; e o Sociológico é representado pelo conceito de participação ativa em<br />
decisões diretamente relacionadas com o processo de trabalho, com a forma de executar as<br />
tarefas e com a distribuição de responsabilidade dentro da equipe.<br />
A seguir, visualiza-se uma síntese do modelo de Westley (1979), apresentando<br />
os problemas que dificultam a QVT e os métodos para resolvê-los.<br />
QUADRO 4 - Indicadores da QVT – Modelo de Westley (1979)<br />
ECONÔMICO POLÍTICO PSICOLÓGICO SOCIOLÓGICO<br />
Equidade Salarial<br />
Segurança no Emprego<br />
Realização Potencial<br />
Participação nas<br />
Remuneração<br />
Atuação Sindical<br />
Nível de Desafio<br />
Decisões<br />
Adequada<br />
Desenvolvimento<br />
Autonomia
218<br />
Benefícios<br />
Retroinformação<br />
Pessoal<br />
Relacionamento<br />
Local de Trabalho<br />
Liberdade de Expressão<br />
Desenvolvimento<br />
Interpessoal<br />
Carga Horária<br />
Valorização do Cargo<br />
Profissional<br />
Grau de<br />
Ambiente Externo<br />
Relacionamento com a<br />
Criatividade<br />
Responsabilidade<br />
Chefia<br />
Auto-Realização<br />
Valor Pessoal<br />
Variedade de Tarefa<br />
Identidade com a<br />
Tarefa<br />
Fonte: Fernandes (1996, p. 53)<br />
Para diminuí-los, Westley (1979) sugere a participação dos trabalhadores no processo de<br />
decisão e na divisão dos lucros, técnicas de enriquecimento de tarefas <strong>individuais</strong> e métodos sócio-técnicos<br />
para reestruturação de grupos de trabalho.<br />
Essas dimensões seriam então analisadas dentro de uma organização. Isso<br />
pressupõe que os problemas, assim como as soluções, são gerados pela própria natureza<br />
das organizações, ou seja, pela sua cultura, com suas normas e <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>.<br />
Assim sendo, Westley (1979) deixa evidente que a QVT é um processo que<br />
toma sua forma de acordo com os movimentos político, econômico, psicológico e<br />
sociológico de cada época, fato que revela a natureza histórica da QVT e afasta a<br />
incoerência de qualquer análise imediata e descontextualizada da mesma.<br />
A abordagem de Westley (1979) é uma das mais abrangentes, pois leva em<br />
consideração aspectos internos e externos à organização onde o trabalhador está inserido.<br />
3.3. Abordagem de Werther e Davis<br />
A abordagem de Werther e Davis (1983) propõe a exploração da natureza do<br />
cargo de acordo com os elementos <strong>organizacionais</strong>, ambientais e comportamenais, visando<br />
a criação de um cargo produtivo e satisfatório com a participação dos trabalhadores<br />
afetados, ou seja, o Projeto de Cargo e a QVT são influenciados por fatores<br />
<strong>organizacionais</strong>, ambientais e comportamentais.
219<br />
A seguir, visualiza-se o quadro 5, apresentando os elementos Organizacionais,<br />
Ambientais e Comportamentais que influenciam o projeto de cargo e a QVT.<br />
QUADRO 5 – Modelo de Werther e Davis (1983)<br />
ELEMENTOS<br />
ORGANIZACIONAIS<br />
Abordagem Mecanicista<br />
Fluxo de Trabalho<br />
Prática de Trabalho<br />
Fonte: Werther e Davis (1983)<br />
ELEMENTOS<br />
AMBIENTAIS<br />
Habilidade e Disponibilidade<br />
dos Trabalhadores<br />
Expectativas Sociais<br />
ELEMENTOS<br />
COMPORTAMENTAIS<br />
Autonomia<br />
Variedade<br />
Identidade da Tarefa<br />
Retroinformação<br />
Percebe-se no quadro 5 que a criação ou a reformulação do projeto de cargos promove a<br />
familiaridade com as categorias <strong>organizacionais</strong>, ambientais e comportamentais. Segundo Werther e Davis<br />
(1983), a descrição dessas categorias com seus indicadores pode ser explicada da seguinte forma:<br />
1. Elementos <strong>organizacionais</strong> do projeto de cargos – de maneira geral, esses<br />
elementos resumem-se à palavra eficiência. Uma abordagem mecanicista da administração<br />
significa que a eficiência do cargo está no quanto ele pode ser simplificado em uma única<br />
tarefa, o que significa otimizá-la pelo tempo e esforço mínimos despendidos em sua<br />
execução. Desenvolve-se, a partir daí, a especialização ou o cargo especializado. Tal<br />
abordagem evidencia a vantagem do baixo custo de mão-de-obra e requer pouco tempo e<br />
custo de treinamento. Quanto a abordagem do fluxo de trabalho, é compreendido por<br />
Werther e Davis (1983, p.76) como “a seqüência e equilíbrio <strong>entre</strong> cargos para que o<br />
trabalho seja feito com eficiência.” Em relação à abordagem das práticas de trabalho, esses<br />
autores salientam que elas têm como foco de entendimento as maneiras firmadas de<br />
desempenhar o trabalho, que podem ter sua origem nas tradições ou nos desejos dos<br />
trabalhadores.<br />
2. Elementos ambientais do projeto de cargos – dividem-se <strong>entre</strong> as<br />
habilidades, a disponibilidade dos trabalhadores e as expectativas sociais. Se os<br />
trabalhadores não têm domínio tecnológico sobre determinado aparelho, é preciso,<br />
primeiramente, obter a mão-de-obra especializada para depois adquirir tal aparelho. Da<br />
mesma maneira, não se deve negar as expectativas dos trabalhadores quando se projeta um<br />
cargo, sendo as expectativas quanto a QVT mais altas na atualidade.
220<br />
3. Elementos comportamentais do projeto de cargos – o desenho de cargo que<br />
considera o comportamento do indivíduo, visa atender às necessidades dele. D<strong>entre</strong> essas<br />
necessidades, tem-se: autonomia – é o grau de responsabilidade dos indivíduos pelo<br />
trabalho que desempenham; variedade – diversidade de trabalho é um atributo que impede<br />
o surgimento de fadiga e monotonia no trabalho; identidade de tarefa – a oportunidade de<br />
executar um trabalho do início ao fim, despertando no indivíduo um sentimento de<br />
contribuição ao produto do trabalho; e retroinformação – é a informação que o trabalhador<br />
recebe sobre o seu desempenho, o que proporciona a ele maior satisfação e o orienta acerca<br />
de sua tarefa.<br />
Entende-se que tais elementos, quando cuidadosamente considerados e<br />
corretamente combinados com um projeto apropriado do cargo, resultam em um cargo<br />
produtivo e satisfatório.<br />
Para Werther e Davis (1983), fatores como supervisão, condições de trabalho,<br />
pagamento, benefícios e projetos do cargo, afetam a QVT, sendo a natureza do cargo o<br />
fator que envolve mais intimamente o trabalhador, já que, para a maioria dos indivíduos,<br />
uma boa vida de trabalho significa um cargo interessante, desafiador e compensador. Esses<br />
autores vêem os próprios trabalhadores, a administração e os sindicatos como barreira ao<br />
sucesso dos programas de QVT, por temerem os efeitos das mudanças ocorridas em sua<br />
implantação. O rompimento dessa barreira se dá pela informação e explicação dos<br />
responsáveis pelo programa sobre a necessidade das mudanças, os resultados esperados e<br />
sobre as garantias que possam proporcionar, pois o seu sucesso exige participação dos<br />
gerentes-chaves, dirigentes sindicais e trabalhadores afetados.<br />
3.4 Abordagem de Nadler e Lawler<br />
Nadler & Lawler (1983, p.26) entendem a QVT como uma<br />
forma de pensamento envolvendo pessoas, trabalho e organização,<br />
destacando-se dois pontos: a preocupação sobre o impacto do trabalho<br />
sobre as pessoas e a participação na solução de problemas<br />
<strong>organizacionais</strong> e tomadas de decisões.
221<br />
Para Nadler e Lawler (1983) os indicadores de QVT consistem na reestruturação do trabalho pelo enriquecimento<br />
de tarefas e grupos autônomos e na inovação do sistema de recompensas que influi no clima organizacional, melhorando o ambiente<br />
de trabalho no que se refere às horas trabalhadas, condições ambientais, regras e normas <strong>organizacionais</strong>, d<strong>entre</strong> outras. Para esses<br />
autores, QVT é a grande esperança de as organizações atingirem altos níveis de produtividade, sem esquecerem a motivação e a<br />
satisfação do indivíduo. Os autores alertam, todavia, sobre o risco de a QVT ser vista por algumas organizações como mais um<br />
modismo administrativo, como tantos outros que se pode observar nos últimos 50 anos.<br />
Lima (1997) relata que Nadler e Lawler definem a Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) como uma maneira de<br />
pensar sobre o trabalhador, o trabalho e as organizações. Comenta ainda a importância da influência do trabalho sobre os<br />
trabalhadores, tanto quanto sobre a efetividade organizacional, e salienta a importância da idéia de participação na solução de<br />
problemas <strong>organizacionais</strong> e na tomada de decisão.<br />
A abordagem de Nadler e Lawler valoriza os resultados de determinadas tarefas executadas pelo trabalhador,<br />
como suas expectativas são alcançadas e como ele poderia melhorar em relação ao ambiente de trabalho e ao desenvolvimento de<br />
suas tarefas, visando um nível de produção satisfatório e proporcionando-lhe também satisfação psicológica.<br />
3.5 Abordagem de Huse e Cummings<br />
Segundo Huse e Cummings (1985), dois aspectos básicos devem ser enfocados<br />
pela QVT: a preocupação com o bem-estar do trabalhador e com a eficácia organizacional<br />
e a participação dos trabalhadores nas decisões e problemas do trabalho, sendo esses<br />
pontos operacionalizados pela participação do trabalhador nos problemas e soluções<br />
<strong>organizacionais</strong> (processo de tomada de decisão); pelo o projeto do cargo (reestruturação);<br />
pela inovação de recompensa (plano de cargos e salários); e pela melhora no ambiente de<br />
trabalho (mudanças físicas e de condições de trabalho: horários, locais, equipamentos,<br />
etc.).<br />
Os autores entendem que as intervenções de Qualidade de Vida no Trabalho<br />
podem ter um efeito direto sobre a produtividade, pela melhora da comunicação e<br />
coordenação, motivação dos trabalhadores e capacitação individual. Elas podem também<br />
influenciar indiretamente a produtividade pelos efeitos secundários da melhoria do bemestar<br />
e da satisfação dos trabalhadores.<br />
Brighenti, Silva e Fernandes (2002) afirmam que a abordagem de Huse e<br />
Cummings reúne aspectos das dimensões que promoveriam para o trabalhador uma melhor<br />
Qualidade de Vida no Trabalho: adequada e satisfatória recompensa; saúde e segurança no<br />
trabalho; desenvolvimento da criatividade humana; crescimento e segurança profissional;<br />
integração social; direitos dos trabalhadores; espaço total de vida no trabalho e fora dele; e<br />
relevância social.<br />
3.6. Abordagem de Walton
222<br />
Na perspectiva de Walton (1973), a QVT deve ser entendida como um conceito<br />
global que compreende atos legislativos, os quais visam proteger os direitos dos<br />
trabalhadores, o atendimento das expectativas e aspirações humanas e a responsabilidade<br />
social da organização.<br />
Walton (1973) busca recuperar por meio do uso do termo Qualidade de Vida,<br />
certos <strong>valores</strong> ambientais e humanistas negligenciados em favor do avanço tecnológico, da<br />
produtividade industrial e do crescimento econômico. Para Walton (1973), de um lado<br />
existem muitos trabalhadores que, independentemente de seu nível hierárquico, encontram<br />
sérias deficiências na sua Qualidade de Vida no Trabalho, pois, descontentes e alienados,<br />
desejam alterar o conteúdo de seus cargos, com a finalidade de criar mais desafios e de<br />
alcançar maior satisfação.<br />
O autor questiona a forma como a QVT deve ser conceituada e medida, os<br />
critérios apropriados e suas inter-relações; sua relação com a produtividade e se os critérios<br />
estão uniformemente destacados em todos os grupos de trabalho. Ressalta as combinações<br />
do método empírico para identificar quais os aspectos da situação de trabalho afetam<br />
significativamente a qualidade das experiências humanas no papel do trabalho, podendo,<br />
assim, produzir diferentes grupos de critérios para diferentes grupos de trabalhadores.<br />
Walton (1973) propõe um modelo de análise de experimentos importantes de<br />
QVT, que se baseia nas seguintes categorias ou dimensões, acrescentadas de seus<br />
indicadores:<br />
1) Compensação Justa e Adequada: visa caracterizar a QVT em relação à<br />
remuneração recebida pelo trabalho realizado. Tal categoria contempla os seguintes<br />
indicadores:<br />
a) Justiça na Compensação: refere-se à remuneração recebida pelo trabalho<br />
que desenvolve, para que o trabalhador viva dignamente diante das necessidades pessoais,<br />
sociais e econômicas;<br />
b) Proporcionalidade <strong>entre</strong> Salários: equidade na remuneração <strong>entre</strong> outros<br />
membros de uma mesma organização e em relação a outros profissionais do mercado de<br />
trabalho.<br />
2) Condições de Trabalho: categoria que tende a caracterizar a QVT a partir<br />
das condições existentes no local de trabalho, referindo-se à preservação da saúde e do<br />
bem-estar do trabalhador.
223<br />
Segundo Walton (1973, p.13): “... não deveriam ser expostos os trabalhadores<br />
a condições físicas que são indevidamente perigosas ou prejudiciais a sua saúde.”<br />
Essa categoria apresenta os seguintes indicadores:<br />
a) Ambiente Físico: local de trabalho e suas condições de bem-estar (conforto)<br />
e organização para o desempenho do trabalho;<br />
b) Jornada de Trabalho: número de horas trabalhadas e sua relação com as<br />
tarefas desempenhadas;<br />
c) Saúde Ocupacional: é a saúde no trabalho. Refere-se ao bem-estar físico e<br />
mental do trabalhador;<br />
d) Salubridade: diz respeito às condições ambientais propícias à saúde;<br />
e) Recursos Materiais: refere-se à quantidade e à qualidade de materiais<br />
disponíveis para a execução do trabalho.<br />
3) Uso e Desenvolvimento da Capacidade Humana: categoria que visa<br />
caracterizar a QVT em relação às oportunidades que o trabalhador possui de aplicar, no seu<br />
dia-a-dia, o saber e as aptidões profissionais.<br />
Segundo Walton (1973, p.13):<br />
O planejamento do trabalho esteve separado de sua implementação.<br />
Estas tendências progrediram em graus variados de um trabalho para o<br />
próximo: então trabalhos diferem em quanto eles permitem aos<br />
trabalhadores usar e desenvolver suas habilidades e conhecimentos.<br />
Dentro dessa categoria destacam-se os seguintes indicadores:<br />
a) Autonomia: liberdade substancial, independência e descrição no<br />
planejamento e execução de seu trabalho, medidas essas permitidas ao indivíduo;<br />
b) Multifuncionalidade: variedade de habilidades e a possibilidade de<br />
utilização de uma larga escala de capacidades e de aptidões do indivíduo;<br />
c) Informação sobre o Processo Total de Trabalho: informações e pleno<br />
conhecimento sobre o processo de trabalho.<br />
4) Oportunidades Futuras para Crescimento Contínuo e Segurança: tem por<br />
finalidade caracterizar a QVT em relação às oportunidades que a organização estabelece<br />
para o desenvolvimento das potencialidades e do crescimento pessoal de seus<br />
trabalhadores.<br />
Consideram-se os seguintes indicadores:
224<br />
a) Possibilidade de Carreira: viabilidade de oportunizar avanços na carreira;<br />
b) Crescimento Pessoal: processo de educação continuada para o<br />
desenvolvimento das potencialidades do indivíduo e aplicação das mesmas;<br />
c) Segurança e Estabilidade: o trabalhador deve se sentir seguro na<br />
organização em que trabalha, seja quanto à sua permanência no trabalho, seja quanto à<br />
garantia da sua remuneração. Walton (1973, p.14) questiona: “O emprego ou segurança de<br />
renda se associaram com o trabalho da pessoa?.”<br />
5) Integração Social na Organização: categoria que tem por objetivo<br />
caracterizar o grau de interação social existente na organização, ou seja, estabelece um<br />
bom nível de integração social na organização <strong>entre</strong> trabalhadores de mesmos e de<br />
diferentes níveis hierárquicos.<br />
Para Walton (1973, p. 14 e 15):<br />
... relacionam-se às oportunidades imediatas e de longo prazo ao alcance<br />
do trabalhador de expressar e desenvolver suas habilidades <strong>individuais</strong>.<br />
Considerando que o trabalho e a carreira estão dentro da organização<br />
social, das relações se tornando uma dimensão importante da qualidade<br />
de vida no trabalho.<br />
Essa categoria apresenta os seguintes indicadores:<br />
a) Igualdade de Oportunidades: grau de ausência de estratificação na<br />
organização de trabalho, em termos de símbolos de “status”, e de discriminação quanto à<br />
religião, sexo, raça, origens, estilos de vida ou aparência;<br />
b) Relacionamento: grau de relacionamento marcado pelo auxílio recíproco,<br />
apoio sócio-emocional, abertura interpessoal e respeito às individualidades;<br />
c) Senso Comunitário: companheirismo e espírito coletivo que se estendem<br />
além das atividades de trabalho.<br />
6) Constitucionalismo na Organização de Trabalho: caracteriza o zelo e o<br />
respeito que a organização tem pelos direitos dos trabalhadores. Para tanto, são utilizados<br />
os seguintes indicadores:<br />
a) Direitos Trabalhistas: refere-se à observância ao cumprimento das normas<br />
que regem as relações de trabalho <strong>entre</strong> trabalhadores e a organização, inclusive direitos<br />
resultantes da condição jurídica dos trabalhadores;
225<br />
dentro da organização;<br />
b) Privacidade Pessoal: respeito à individualidade que o trabalhador possui<br />
c) Liberdade de Expressão: forma como o trabalhador pode se manifestar,<br />
expressando seus pontos de vista aos seus chefes, sem medo de sofrer punições. Segundo<br />
Walton (1973, p.15), a liberdade de expressão é definida como: “O direito para divergir<br />
abertamente das visões de superiores na organização sem medo de represálias.”<br />
7) Trabalho e Espaço Total de Vida: categoria que objetiva caracterizar o<br />
equilíbrio <strong>entre</strong> a vida pessoal do trabalhador e a vida no trabalho. Segundo Walton (1973,<br />
p. 16):<br />
A experiência de trabalho de um indivíduo tem efeitos positivos e<br />
negativos em outras esferas da vida dele, como as relações dele com sua<br />
família. A relação de trabalho para o espaço total de sua vida é expressa<br />
pelo conceito de equilíbrio <strong>entre</strong> o trabalho e sua vida total.<br />
Nessa categoria destaca-se os seguintes indicadores:<br />
a) Papel Balanceado do Trabalho: distribuição racional dos horários de<br />
trabalho com relação às outras esferas da vida;<br />
b) Significado do Trabalho: refere-se a representatividade do trabalho na vida<br />
do trabalhador;<br />
c) Tempo para Lazer e para Família: relacionamento equilibrado <strong>entre</strong> o<br />
trabalho e o convívio familiar.<br />
8) Relevância Social da Vida no Trabalho: refere-se ao empenho do<br />
trabalhador, no sentido de a organização não propiciar a depreciação de seu trabalho e da<br />
sua profissão. Segundo Walton (1973, p.16):<br />
Organizações que são vistas para estar agindo de uma maneira<br />
socialmente irresponsável farão numerosos trabalhadores depreciar o<br />
valor de seu trabalho e carreira.<br />
Essa categoria destaca os seguintes indicadores:<br />
a) Valorização do Trabalho: percepção do sentimento de valorização e<br />
relevância do trabalhador, atribuído ao seu trabalho, pela organização e pela comunidade;<br />
b) Imagem e Responsabilidade Social da Organização: percepção do<br />
trabalhador quanto à importância e responsabilidade do seu trabalho e da sua organização<br />
em dar um retorno à comunidade.
226<br />
Para complementar, o quadro a seguir sintetiza as categorias e os indicadores<br />
conceituais propostos por Walton (1973) e adaptados por Búrigo (1997).<br />
QUADRO 6 – Modelo conceitual proposto por Walton (1973), adaptado por Búrigo<br />
(1997, p. 33)<br />
CATEGORIAS<br />
UNIDADES DE ANÁLISE<br />
1. Condições de Trabalho • Ambiente Físico e Social<br />
• Jornada de Trabalho<br />
• Saúde Ocupacional<br />
• Salubridade<br />
• Recursos Materiais<br />
2. Compensação Justa e Adequada • Justiça na Compensação<br />
• Proporcionalidade <strong>entre</strong> os Salários<br />
3. Uso e Desenvolvimento das Capacidades • Autonomia<br />
• Multifuncionalidade<br />
• Informações sobre o Processo Total<br />
de Trabalho<br />
• Liberdade para Planejar e<br />
Implementar Atividades<br />
4. Oportunidade de Crescimento • Possibilidade de Carreira e de<br />
Progressão<br />
• Treinamento e Capacitação<br />
• Crescimento Pessoal<br />
5. Integração Social • Igualdade de Oportunidades<br />
• Ausência de Preconceitos<br />
• Mobilidade<br />
• Relacionamentos com a Chefia e<br />
demais Trabalhadores<br />
• Senso Comunitário<br />
6. Constitucionalismo • Direitos Trabalhistas<br />
• Privacidade Pessoal
227<br />
• Liberdade de Expressão<br />
7. Trabalho e Espaço Total de Vida • Tempo para Lazer e para Família<br />
• Papel Balanceado do Trabalho<br />
• Significado do Trabalho<br />
8. Relevância Social do Trabalho • Valorização do Trabalho<br />
• Imagem e Responsabilidade Social<br />
da Organização<br />
Fonte: Búrigo (1997)<br />
As oito categorias inter-relacionadas formam um conjunto que possibilita ao<br />
pesquisador apreender os pontos percebidos pelos trabalhadores como positivos ou<br />
negativos na sua situação de trabalho. Apresentam a vantagem de analisar tanto o conjunto<br />
de condições e práticas <strong>organizacionais</strong>, como aspectos relacionados à satisfação e<br />
percepção dos trabalhadores sobre os fatores positivos no trabalho (SILVA & TOLFO,<br />
1995).<br />
Percebe-se que as categorias de Walton (1973) cobrem, portanto, desde as necessidades básicas dos trabalhadores<br />
até as condições da organização. Para ele o nível de satisfação e auto-estima do trabalhador são diretamente proporcionais à QVT.<br />
Quanto ao conjunto macro-social da abordagem de Walton (1973), Goulart e Sampaio (1999) sustentam a<br />
necessidade de contextualizar as categorias desse modelo mediante uma análise das políticas e práticas da organização para que elas<br />
possam então ser devidamente abordadas. Para esses autores, o modelo de Walton (1973), além ser o mais abrangente, é também o<br />
mais genérico.<br />
4. Algumas Pesquisas sobre QVT Desenvolvidas no Brasil<br />
D<strong>entre</strong> as diversas pesquisas desenvolvidas na área de QVT no Brasil, destacase,<br />
inicialmente, a de Quirino e Xavier (1987), que estudaram a satisfação dos<br />
pesquisadores agropecuários na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária<br />
(EMPRAPA), abrangendo uma amostra de 429 trabalhadores, sendo 238 pesquisadores e<br />
191 trabalhadores de apoio.<br />
Tal pesquisa abordou a relação <strong>entre</strong> QVT e desempenho organizacional e a<br />
satisfação dos pesquisadores da EMPRAPA, fundamentando-se nas teorias de Herzberg e<br />
de Walton, utilizando aspectos abordados na literatura sobre o assunto, como: natureza das<br />
tarefas, realização, desenvolvimento, relações humanas, supervisão, remuneração e<br />
segurança no trabalho, reconhecimento, apoio de recursos humanos, estrutura física e senso<br />
de participação.<br />
Os principais resultados obtidos pelos autores foram:<br />
1) existe uma relação <strong>entre</strong> QVT e desempenho organizacional;
228<br />
2) os aspectos da QVT que mais se relacionam com o desempenho<br />
organizacional são: meios para produzir, bases materiais e apoio de recursos humanos,<br />
seguidos de oportunidades para participar de treinamento em nível de pós-graduação;<br />
3) alguns aspectos da QVT registraram correlação negativa com o desempenho<br />
organizacional, como oportunidades de assumir responsabilidades e apoio da supervisão<br />
para resolver problemas;<br />
4) a lista de prioridades que visam desempenho (interesse da organização)<br />
difere da lista de prioridades dos trabalhadores (que visam satisfação no trabalho);<br />
5) a satisfação dos pesquisadores com a organização é alta, sendo que o item de<br />
maior concordância é a missão da organização e o de menor, refere-se à pouca liberdade de<br />
escolher os temas das pesquisas.<br />
Baseado no modelo teórico proposto por Hackman e Oldhan (1975), o estudo<br />
de Rodrigues (1994) objetivou investigar a Qualidade de Vida no Trabalho dos executivos<br />
de indústrias de confecções do Estado do Ceará. O autor aplicou questionários a uma<br />
amostra de 104 gerentes das 18 maiores indústrias de confecção do Estado do Ceará.<br />
No que diz respeito à metodologia utilizada, verificou-se que os dados<br />
receberam um tratamento estatístico. Foram correlacionadas todas as variáveis do modelo,<br />
como Potencial Motivador (PM), Significado da Tarefa (ST), Autonomia (AU), Variedade<br />
de Habilidade (VH), Identidade da Tarefa (IT), d<strong>entre</strong> outras, além do cruzamento dessas<br />
com variáveis demográficas como sexo, profissão, estado civil, escolaridade e faixa<br />
salarial.<br />
Sinteticamente, os resultados obtidos, em linhas gerais, descrevem as<br />
conclusões sobre a motivação e satisfação dos gerentes. As proposições básicas expressas<br />
por Rodrigues (1994) foram:<br />
1) a motivação é tanto maior quanto maior for o nível de escolaridade;<br />
2) a satisfação é tanto menor quanto maior for o nível de escolaridade;<br />
3) a motivação é influenciada de forma significativa pelo estado civil;<br />
4) a satisfação é tanto maior quanto maior o nível salarial.<br />
Um outro trabalho desenvolvido foi o de Fernandes e Gutierrez (1988),<br />
objetivando identificar os fatores que contribuíram para a melhoria da QVT dos<br />
trabalhadores da organização JH Santos/RS. Esses autores utilizaram o referencial de<br />
Werther e Davis (1983). No que concerne à metodologia utilizada, o estudo privilegiou a
229<br />
abordagem qualitativa de pesquisa, tendo sido os dados coletados mediante <strong>entre</strong>vistas<br />
semi-estruturadas. Foram <strong>entre</strong>vistados 94 sujeitos, d<strong>entre</strong> eles gerentes e trabalhadores.<br />
Essa pesquisa vem reforçar a importância do instrumental da QVT para a<br />
renovação das organizações brasileiras. A seguir, são apresentados alguns dos resultados<br />
obtidos:<br />
1) os gerentes perceberam a organização centralizadora, gerando um<br />
sentimento de falta de confiança e pouca autonomia. Entretanto, evidenciaram a tradição, a<br />
honestidade e a popularidade como características positivas da organização;<br />
2) os trabalhadores mostraram-se conformados com relação às normas ditadas<br />
pela organização, ressentindo-se, porém, com a falta de treinamento;<br />
3) tanto os gerentes quanto os trabalhadores da referida organização acreditam<br />
que os aspectos relacionados à QVT, que deveriam ser melhorados, compreendem as<br />
condições físicas de trabalho, expectativas sociais, relacionamento, ambiente externo da<br />
loja e maior incentivo à criatividade.<br />
A pesquisa desenvolvida por Moraes et al. (1992) teve como objetivo<br />
diagnosticar a qualidade de vida e stress em cargos de chefia intermediária, de<br />
organizações mineiras do setor público e privado. Além disso, esses autores pretenderam<br />
ainda, com essa pesquisa, verificar a influência de variáveis demográficas, profissionais e<br />
<strong>organizacionais</strong>, nas variáveis centrais da pesquisa, e verificar o grau de inter-relação <strong>entre</strong><br />
as mesmas.<br />
Tal estudo envolveu 380 respondentes. Destes, 137 pertenciam ao setor da<br />
indústria e 243 faziam parte do setor de serviços. Foram pesquisadas 12 organizações,<br />
assim distribuídas: sete do setor público, quatro organizações privadas de capital nacional e<br />
uma organização multinacional.<br />
Como instrumento básico de coleta de dados foi utilizado um questionário<br />
composto de três partes. A primeira parte resultou da adaptação do “Job Diagnostic<br />
Survey” (HACKMAN E OLDHAN, 1975); a segunda parte constou da tradução e<br />
adaptação do OSI (Occupacional Stress Indicator), elaborado por Cooper, Sloan, Williams<br />
(1988); e a terceira parte constou de dados sobre o respondente e sobre a organização.<br />
Os resultados da pesquisa mostraram que os gerentes das organizações<br />
pesquisadas possuíam uma percepção de qualidade de vida satisfatória, um nível de stress<br />
de leve a moderado e uma tensão elevada. Os autores constataram ainda que o perfil do<br />
gerente com qualidade de vida menos satisfatória é do profissional com menor índice de
230<br />
escolaridade e, d<strong>entre</strong> as variáveis <strong>organizacionais</strong>, a realização de tarefas caracterizadas<br />
pelo gerente como não-éticas, o clima de insegurança e de tensão, a tomada de decisão sem<br />
consulta prévia revelaram-se como as mais estressantes.<br />
A pesquisa de Honório, Braga e Marques (2000) propôs investigar a QVT, o<br />
Stress no trabalho e o aparecimento de doenças físicas e emocionais que pudessem<br />
prejudicar o desempenho ocupacional de profissionais de uma tradicional instituição<br />
religiosa.<br />
De um universo de 198 ocupantes de cargos pastorais na região eclesiástica<br />
escolhida para participar da pesquisa, que envolveu os Estados de Minas Gerais e Espírito<br />
Santo, extraiu-se uma amostra de 74 sujeitos.<br />
A maioria das variáveis investigadas foram extraídas do modelo de QVT de<br />
Hackman & Oldham (1975), com exceção de algumas que foram formuladas pelos<br />
pesquisadores para diagnosticar aspectos ambientais e <strong>organizacionais</strong> da instituição<br />
pesquisada não contemplados no instrumento desenvolvido por esses autores.<br />
Quanto às variáveis de Estresse Ocupacional, propostas por Cooper, Sloan &<br />
Williams (1988), elas foram categorizadas em fatores relacionados aos sintomas (físicos e<br />
mentais) de propensão ao stress; às fontes potenciais de pressão no trabalho (trabalho<br />
propriamente dito, papel gerencial, relacionamento interpessoal, carreira e realização,<br />
estrutura e clima organizacional e interface casa e trabalho) e às estratégias de combate ao<br />
stress.<br />
O questionário foi o instrumento primário de coleta de dados devido a sua<br />
possibilidade de fornecer dados uniformes do grupo estudado e também pelo fato de parte<br />
da amostra exercer suas tarefas em outro estado que não o de residência dos pesquisadores.<br />
O estudo desenvolvido por Honório, Braga e Marques (2000) constatou que a<br />
maioria das variáveis de QVT medidas foram avaliadas de maneira satisfatória pelos<br />
participantes da pesquisa. As de maior destaque estão relacionadas ao grau de interrelacionamento<br />
experimentado para a realização das tarefas, à significância dessas tarefas<br />
para as pessoas envolvidas, à segurança no emprego e à integração dos pastores nos<br />
ministérios locais. Do ponto de vista da insatisfação, destacam-se o grau de feedback<br />
recebido de superiores, colegas ou fiéis quanto ao desempenho no trabalho e o grau de<br />
participação em atividades de atualização e desenvolvimento pastoral.<br />
Quanto aos resultados relativos ao Estresse Ocupacional, os autores concluíram<br />
que os pastores caminham para situações que caracterizam propensão ou pressão de fato no
231<br />
trabalho. Os sintomas mais evidentes foram sensação de cansaço sem uma razão aparente,<br />
tendência a comer demais, respiração ofegante, tremedeira muscular, sensação de dores em<br />
partes do corpo e desânimo ao levantar, o que caracteriza os sintomas físicos de stress.<br />
Entretanto, sintomas mentais de stress como aceleração do ritmo de vida, intranqüilidade,<br />
impaciência e ansiedade também impactaram significativamente. Quanto aos fatores de<br />
pressão no trabalho, todos apresentaram médias que indicam situações variando de pressão<br />
acima da média para pressão de fato. A esse respeito, a variável que mais pressiona é o<br />
relacionamento interpessoal. Tal situação sugere que, apesar de boa parte das tarefas dos<br />
pastores exigir que mantenham alto grau de contato com fiéis, talvez não estejam<br />
devidamente preparados para lidar com a diversidade e os conflitos particulares que<br />
caracterizam a vida dessas pessoas.<br />
Uma outra pesquisa realizada por Oliveira e Moraes (2001) sobre a QVT, teve<br />
como objetivo mensurar o grau de Qualidade de Vida no Trabalho (QVT), no âmbito da<br />
carreira dos detetives lotados na Superintendência de Polícia Metropolitana de Belo<br />
Horizonte (METROPOL).<br />
Como instrumento básico de coleta de dados, adotou-se um questionário<br />
composto pelos critérios sugeridos por Walton (1973) e adaptados à realidade da<br />
organização. O questionário constituiu-se de nove blocos, sendo o primeiro deles utilizado<br />
para investigar os dados demográficos e os outros oito contendo as variáveis do modelo<br />
teórico de Walton.<br />
A amostra de 208 detetives foi selecionada de forma aleatória simples, com<br />
uma margem de erro estimada em 6%, para mais ou para menos, dentro de um intervalo de<br />
confiança de 95%. Procurando dar maior representatividade à amostra, os autores optaram<br />
por distribuí-la (208 policiais), de forma proporcional, <strong>entre</strong> as quinze seccionais de<br />
polícia.<br />
Em termos gerais foi diagnosticado um baixo grau de QVT. Os critérios que<br />
mais explicaram essa avaliação foram a remuneração, as condições de trabalho e os<br />
direitos na organização. O grau diagnosticado de QVT dos detetives foi o resultado de uma<br />
conjuntura de fatores em seu contexto de trabalho e da falta de condições para que esse<br />
mesmo profissional pudesse desempenhar suas atividades. Segundo os autores da pesquisa,<br />
a insatisfação dos detetives em relação a grande parte dos critérios pesquisados deveria<br />
levar a organização a um repensar sobre sua estrutura de trabalho e, principalmente, sobre<br />
a questão da valorização tanto financeira quanto não-financeira de seu profissional.
232<br />
A seguir serão apresentados os dois estudos referentes à realização da pesquisa<br />
de campo: a metodologia aplicada em cada estudo, os instrumentos utilizados para coleta<br />
de dados sobre os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e <strong>organizacionais</strong> e informações sobre o Programa de<br />
Qualidade de Vida no Trabalho e seus respectivos resultados.<br />
CAPÍTULO 4
233<br />
ESTUDO 1<br />
A presente pesquisa caracteriza-se como um “estudo de caso”, entendido por Bruyne,<br />
Herman e Schoutheete (1997), Richardson (1985), Chizotti (1995), e Godoy (1995) como um tipo de<br />
pesquisa qualitativa, que tem por finalidade retratar uma unidade ou uma situação particular, analisando-a<br />
em profundidade, reunindo informações e detalhes, a fim de permitir a compreensão da totalidade da<br />
referida situação.<br />
Em tal pesquisa adotou-se também um enfoque exploratório e descritivo. Cabe<br />
salientar que o estudo é exploratório, pois, conforme Triviños (1987), os estudos<br />
exploratórios permitem ao investigador aumentar sua experiência em torno de determinado<br />
problema, ou seja, o pesquisador parte de uma hipótese e aprofunda seu estudo nos limites<br />
de uma realidade específica. Conforme assevera Alves (1991), esse tipo de pesquisa<br />
proporciona uma visão geral e não enviesada do problema e ainda contribui para a<br />
focalização das questões e a identificação de informantes e outras fontes de dados. Esse<br />
estudo caracteriza-se ainda como descritivo, pois, de acordo com Triviños (1987), pretende<br />
descrever “com exatidão” as características de um dado fenômeno de determinada<br />
realidade, ou seja, deseja conhecer a sua natureza, sua composição, processos que o<br />
constituem ou nele se realizam.<br />
A pesquisa foi composta por dois estudos. No primeiro, descreve-se a coleta de<br />
dados realizada, utilizando os inventários de <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e <strong>organizacionais</strong>; no<br />
segundo, efetuam-se <strong>entre</strong>vistas <strong>individuais</strong> com trabalhadores, para levantamento de<br />
informações sobre o Programa de Qualidade de Vida no Trabalho, desenvolvido pela<br />
Interprise, além de <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e <strong>organizacionais</strong>. Foram feitas também análises<br />
documentais em relatórios, regulamentos, regimentos e outros documentos históricos<br />
disponíveis.<br />
1. Campo de Estudo<br />
A pesquisa foi realizada em uma organização pública (denominada aqui pelo<br />
nome-fantasia Interprise) formada com a seguinte composição societária:<br />
• Governo do Estado: 95%<br />
• Outros: 0,5%
234<br />
A Interprise é uma sociedade de economia mista estadual, constituída na forma da Lei Estadual nº 6.680, de 13 de<br />
setembro de 1967. Situada no Setor Leste de Goiânia, onde construiu sua sede própria, possui mais oito distritos localizados em<br />
vários setores de Goiânia. Além de prestar serviços na Capital de Goiás, está presente em 241 (duzentos e quarenta e um)<br />
municípios, todos localizados no Estado de Goiás.<br />
A Interprise atende, atualmente, a uma população de aproximadamente 3.900.000 (três milhões e novecentos mil)<br />
habitantes e possui as seguintes atribuições:<br />
• promover a saúde da população em Goiás, cumprindo-lhe especificamente elaborar<br />
projetos, realizar estudos e praticar a exploração dos serviços de sua exclusiva<br />
competência;<br />
• responsabilizar-se pelos encargos relativos ao controle da poluição ambiental;<br />
• promover a execução de novas obras;<br />
• fixar tarifas e contribuições para os seus serviços, reajustando-as, sempre que<br />
necessário, de modo a atender à amortização dos investimentos, encargos de<br />
manutenção e operação, bem como da natural e imperiosa necessidade de expansão dos<br />
sistemas.<br />
Na época da realização da pesquisa, a Interprise contava com 3.120 trabalhadores, sendo que 1.359 trabalhadores<br />
estavam lotados em Goiânia e 1.761 distribuídos pelo interior do Estado de Goiás.<br />
A estrutura hierárquica da organização é formada por Assembléia Geral, Conselho de Administração, Diretoria<br />
Colegiada e Presidência. Ligada à Presidência, de forma direta estão, a Assessoria Especial de Gestão da Qualidade, Assessoria de<br />
Auditoria e Inspeção, Assessoria de Planejamento, Assessoria Jurídica, Assessoria de Informática, Secretaria Geral, Assessoria de<br />
Empresas Especiais e Assessoria de Comunicação. Na linha hierárquica abaixo estão Diretoria de Administração, Diretoria de<br />
Engenharia e Diretoria de Produção, à quais estão subordinados três departamentos. Há também a Diretoria Comercial e de<br />
Marketing, estando a ela diretamente subordinados dois departamentos. A Diretoria de Finanças e de Relação com os Investidores<br />
tem apenas um departamento sob sua subordinação.<br />
O critério que motivou a escolha por uma organização pública de economia mista ocorreu pela mesma possuir um<br />
Programa de Qualidade de Vida no Trabalho, que se destaca <strong>entre</strong> as organizações públicas do Estado de Goiás, e também por ser<br />
uma organização pública que atua a mais de 30 anos no mercado goiano, pressupondo assim uma cultura organizacional fortemente<br />
sedimentada, com características distintas.<br />
1.1. População<br />
A população referência do estudo 1 foram todos os trabalhadores de uma<br />
organização pública estadual localizada no Município de Goiânia, em número de 1.359<br />
(um mil, trezentos e cinqüenta e nove) trabalhadores.<br />
1.2. Amostra<br />
A amostra do estudo 1 foi composta por 300 (trezentos) trabalhadores da<br />
organização pública. Para a seleção da amostra, foram considerados os critérios de: cargos,<br />
hierarquia, gênero, escolaridade, estado civil, idade e, por fim, que o trabalhador tivesse no<br />
mínimo um ano de serviço prestado na organização. Por meio de um relatório, com todos<br />
esses indicadores fornecidos pelo Departamento de Recursos Humanos, cruzou-se os dados
235<br />
e chegou-se a um quantitativo de 330 (trezentos e trinta) trabalhadores. Teve-se o cuidado<br />
de manter a proporcionalidade na amostra referente aos critérios citados anteriormente para<br />
seleção da mesma. Vale ressaltar que na amostra teve-se o cuidado também de instituir<br />
como parâmetro constituinte o percentual de 10% (dez por cento) de um universo total de<br />
300 (trezentos) trabalhadores, significando 30 (trinta) trabalhadores, como margem de<br />
segurança, caso algum trabalhador optasse por não participar da pesquisa. Finalmente<br />
pesquisou-se 300 (trezentos) trabalhadores, o que representou 22% (vinte e dois por cento)<br />
da população da organização. Esse percentual de amostra remete a uma margem de erro de<br />
6% (seis por cento).<br />
Optou-se por trabalhar apenas com os trabalhadores de Goiânia, tendo em vista<br />
todos os cargos da organização estarem representados neste Município.<br />
1.3. Dados sócio-demográficos dos participantes<br />
As tabelas seguintes apresentam os dados demográficos em percentual por:<br />
Sexo, Idade, Estado Civil, Escolaridade, Cargo e Nível Hierárquico e Tempo de Serviço.<br />
Tabela 1 – Distribuição dos Trabalhadores da “Interprise” por Gênero<br />
Sexo %<br />
Masculino 67,7<br />
Feminino 32,3<br />
TOTAL 100<br />
De acordo com a tabela 1, observa-se que 67,7% da população é formada por<br />
pessoas do sexo masculino e 32,3% do feminino, uma vez que a organização dispõe de<br />
uma grande área operacional com cargos voltados para o sexo masculino. Este é um dado<br />
que revela características das ocupações; algumas tendem para um caráter de gênero.<br />
Como afirma Hofstede (1994), há ocupações que, preferencialmente, são preenchidas mais<br />
por homens do que por mulheres, evidenciando uma característica de competitividade<br />
inerente à ocupação. São esperados ainda, pela cultura, mais resultados do homem do que<br />
da mulher na busca de sucesso material. Esse fenômeno está evidente na organização em<br />
estudo.
236<br />
Tabela 2 – Distribuição dos Trabalhadores da “Interprise” por Idade<br />
Idade %<br />
19 a 30 16,7<br />
31 a 40<br />
33,0<br />
41 a 50<br />
39,0<br />
51 a 60<br />
10,7<br />
Mais de 60<br />
7,0<br />
TOTAL<br />
100<br />
Os resultados da tabela 2 indicam que 39% dos trabalhadores da Interprise<br />
encontram-se na faixa etária de 41 a 50 anos. Esse resultado aponta para uma realidade de<br />
organização pública: por ser estatal, ao longo dos anos o valor mais reforçado foi a<br />
“estabilidade”, e pertencer à organização tornou-se uma vantagem para o trabalhador.<br />
Assim, predominou a crença de trabalho “garantido” para o resto da vida, até à<br />
aposentadoria, conforme está indicado no discurso dos trabalhadores. Segundo seus<br />
relatos, a única realidade de trabalho por eles conhecida dentro da organização é aquela em<br />
que se encontram atualmente.<br />
Tabela 3 – Distribuição dos Trabalhadores da “Interprise” por Estado Civil<br />
Estado Civil %<br />
Solteiro 20,3<br />
Casado<br />
70,0<br />
Divorciado<br />
5,3<br />
Outros<br />
4,3<br />
TOTAL<br />
100<br />
Conforme o resultado da tabela 3, pode-se observar que 70% dos trabalhadores<br />
da Interprise são casados. Isso demonstra que, por ser a Interprise uma organização pública<br />
e, por lei, dar estabilidade aos seus empregados, os trabalhadores têm mais segurança em<br />
buscar o casamento para constituir família, ou seja, sentem-se protegidos pelo aparato das<br />
leis públicas para assumirem as suas responsabilidades no casamento. Esses são <strong>valores</strong><br />
aos quais os trabalhadores atribuem muita importância, conforme está evidenciado nos<br />
resultados deste estudo.<br />
Tabela 4 – Distribuição dos Trabalhadores da “Interprise” por Escolaridade
237<br />
Escolaridade %<br />
Primário 3,7<br />
1º Grau<br />
26,0<br />
2 o Grau<br />
28,3<br />
Superior<br />
42,0<br />
TOTAL<br />
100<br />
Na tabela 4 os resultados indicam que 42% dos trabalhadores pesquisados<br />
possuem curso superior. Esse fato é explicado quando se observa nos documentos internos<br />
da Interprise (Regimento Interno, Regulamento Disciplinar de Pessoal, Estatuto, Guia de<br />
Benefícios e Política da Qualidade) que ela oferece total apoio aos seus trabalhadores para<br />
o seu desenvolvimento profissional. Isso evidencia a política de formação da organização e<br />
o seu grau de exigência no sentido de contar com uma equipe de pessoal qualificada<br />
profissionalmente e competitiva, capaz de enfrentar os desafios do mercado além de, ao<br />
mesmo tempo, contribuir para a formação básica de seus trabalhadores. Isso fica<br />
demonstrado nos relatos dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho.<br />
Tabela 5 – Distribuição dos Trabalhadores da “Interprise” por Cargo<br />
Cargo %<br />
Administrativo 64,7<br />
Operacional 35,3<br />
TOTAL 100<br />
Os resultados da tabela 5 demonstram que 64,7% dos cargos são<br />
administrativos, ou seja, são trabalhadores que executam suas atividades nos escritórios da<br />
organização. Apesar de a organização possuir uma vasta área operacional, os seus<br />
trabalhadores administrativos superam os da área operacional, uma vez que, por ser uma<br />
organização pública com uma grande influência política, vários cargos administrativos são<br />
criados, principalmente os cargos comissionados, para acomodarem os “apadrinhados<br />
políticos”. Isso fica evidente neste estudo, pelos relatos dos trabalhadores.<br />
Tabela 6 – Distribuição dos Trabalhadores da “Interprise” por Nível Hierárquico<br />
Nível Hierárquico %<br />
Diretoria 2,3<br />
Assessoria 9,7
238<br />
Superintendência<br />
Gerência<br />
Supervisão<br />
Coordenadoria<br />
TOTAL<br />
5,7<br />
16,3<br />
48,0<br />
18,0<br />
100<br />
De acordo com a tabela 6, o nível hierárquico de maior evidência é a<br />
Supervisão, com 48%. Esse resultado demonstra que o nível hierárquico da Supervisão é o<br />
que possui maior concentração dos trabalhadores dentro da organização. Isso porque a área<br />
operacional se concentra quase que totalmente nesse nível, além da própria Supervisão.<br />
Tabela 7 – Distribuição dos Trabalhadores da “Interprise” por Tempo de Serviço<br />
Tempo de Serviço %<br />
1 – 10 anos 20,60<br />
11 – 20 46,07<br />
21 – 30<br />
Acima de 31<br />
TOTAL<br />
32,08<br />
1,25<br />
100<br />
Pelo resultado da tabela 7, pode-se observar que 46,07% dos trabalhadores da<br />
Interprise têm <strong>entre</strong> 11 a 20 anos de tempo de serviço, significando uma realidade da<br />
organização pública no sentido da estabilidade proporcionada pelo setor público ao<br />
trabalhador. Esses resultados também demonstram que os trabalhadores, nessa faixa, já<br />
absorveram a cultura e os <strong>valores</strong> da organização com mais intensidade do que os<br />
trabalhadores da primeira faixa. Isso significa que os trabalhadores <strong>entre</strong> 11 a 20 anos de<br />
serviço prestado à organização estão em estágio mais avançado de socialização que os da<br />
faixa de 1 a 10 anos de prestação de serviço, por estarem ainda no início do processo de<br />
socialização, quando ainda enfatizam seus <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>.<br />
1.4. Instrumentos
239<br />
No Estudo 1, foram utilizados, como instrumento para levantamento de dados<br />
para os <strong>valores</strong>, dois inventários: a Escala de Valores Individuais (SCHWARTZ, 1993) e o<br />
Inventário de Valores Organizacionais (MENDES, 1999).<br />
Utilizaram-se duas escalas, uma para avaliar os tipos motivacionais dos <strong>valores</strong><br />
<strong>individuais</strong> e outra para analisar os eixos axiológicos dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>. Para<br />
avaliar os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>, utilizou-se a versão do Inventário de Valores de Schwartz<br />
(IVS) validado no Brasil por Tamayo e Schwartz (1993). Essa escala contém sessenta e um<br />
<strong>valores</strong> que avaliam dez tipos motivacionais: poder (poder social, autoridade, riqueza,<br />
preservação da imagem, reconhecimento social e vaidade); auto-realização (sucesso,<br />
capacidade, ambição, influência, inteligência, esperteza); hedonismo (prazer e gozo da<br />
vida); estimulação (audácia, uma vida variada e uma vida excitante); auto-direção<br />
(curiosidade, criatividade, liberdade, escolha de suas metas, independência e autorespeito);<br />
universalismo (proteção do ambiente, união com a natureza, um mundo de<br />
beleza, abertura, justiça social, sabedoria, um mundo em paz, igualdade, harmonia interior,<br />
sonho); benevolência (presteza, honestidade, perdão, lealdade, responsabilidade,<br />
espiritualidade, amizade verdadeira, amor maduro, sentido da vida e trabalho); tradição<br />
(ciência dos seus limites, devoção, humildade, respeito pela tradição, moderação e<br />
desprendimento); conformidade (obediência, respeito com os pais, autodisciplina e<br />
polidez); segurança (limpeza, segurança nacional, reciprocidade de favores, ordem social,<br />
segurança familiar, senso de pertencer e saúde).<br />
Os participantes avaliaram cada valor como “um princípio guia na minha<br />
vida”, utilizando uma escala variando de -1 (oposto aos meus <strong>valores</strong>) a 7 (de suprema<br />
importância).<br />
Para avaliar a percepção dos trabalhadores no que se refere aos <strong>valores</strong> que as<br />
suas organizações priorizam, utilizou-se o Inventário de Valores Organizacionais (IVO),<br />
desenvolvido e validado por Tamayo, Mendes e Paz (2000). Esse instrumento é composto<br />
por 66 <strong>valores</strong> que avaliam os seis pólos dos três eixos axiológicos dos <strong>valores</strong><br />
<strong>organizacionais</strong>: autonomia (criatividade, curiosidade, eficácia, eficiência, modernização,<br />
qualidade, reconhecimento, competência, prazer, inovação, realização, estímulo e<br />
liberdade); conservadorismo (disciplina, honestidade, lealdade, limpeza, ordem, polidez,<br />
prestígio, segurança, sensatez e sigilo); igualitarismo (democracia, descentralização,<br />
justiça, qualificação dos recursos humanos, sociabilidade, co-gestão, coleguismo,<br />
igualdade, cooperação, dinamismo, independência, autonomia, comunicação, respeito e
240<br />
equidade); hierarquia (fiscalização, hierarquia, obediência, poder, pontualidade, rigidez,<br />
supervisão e tradição); harmonia (integração interorganizacional, interdependência, ética,<br />
parceria, tolerância, intercâmbio, preservação, harmonia, preservação da natureza, respeito<br />
à natureza, espontaneidade, iniciativa); domínio (previsibilidade, produtividade, satisfação<br />
dos clientes, sucesso).<br />
Os participantes atribuíram uma nota variando de 0 a 6, considerando o quanto<br />
eles acreditam que a organização que eles dirigem prioriza cada valor apresentado na<br />
escala.<br />
Tais instrumentos visaram possibilitar a identificação das prioridades de<br />
<strong>valores</strong> dos participantes e os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> percebidos pelos trabalhadores da<br />
organização.<br />
1.5. Procedimentos<br />
Para a coleta de dados do estudo 1, foram visitados 6 (seis) dos 8 (oito)<br />
distritos da organização pesquisada, todos localizados no Município de Goiânia, além da<br />
sede administrativa da organização.<br />
Em cada um desses distritos, os trabalhadores escolhidos pela amostra eram<br />
convidados a participar da pesquisa e aqueles que decidiam colaborar eram encaminhados<br />
para uma sala de treinamento que a organização dispunha para ministrar cursos aos seus<br />
trabalhadores, e ali passavam-se as instruções sobre os dois inventários a serem<br />
respondidos pelos participantes. Os trabalhadores da amostra que não puderam participar<br />
da pesquisa, ou porque estavam de licença médica, ou porque haviam sido transferidos<br />
para um outro distrito do interior do Estado, ou porque se recusavam mesmo a participar,<br />
eram substituídos por outros que constavam de uma lista elaborada mediante o cruzamento<br />
de dados fornecidos pelo Departamento de Recursos Humanos da organização.<br />
Aos trabalhadores da base operacional da organização, ou seja, aqueles com<br />
menor grau de escolaridade, fazia-se necessário o pesquisador dar uma instrução mais<br />
detalhada de como responder, além de ler com eles item por item dos dois inventários, para<br />
que pudessem ter uma melhor compreensão e responder de maneira correta. Em toda a<br />
coleta de dados, os horários foram conciliados para que não houvesse prejuízos nas<br />
atividades normais de trabalho. A média de duração da aplicação dos inventários foi de 40
241<br />
minutos a 1 (uma) hora. O período de aplicação das escalas foi de 29 de setembro a 3 de<br />
outubro de 2003.<br />
Como forma de manter o sigilo dos trabalhadores participantes da pesquisa,<br />
após o preenchimento de cada Inventário Individual e Inventário Organizacional, cada<br />
trabalhador recebeu um número como forma de identificação.<br />
1.6. Técnica de Análise de Dados<br />
Em um primeiro momento, foi feita análise dos Inventários Individuais, que<br />
orientam a vida do indivíduo, de forma que os <strong>valores</strong> foram agrupados segundo a<br />
classificação dos tipos motivacionais, de acordo com seu conteúdo, conforme a proposta de<br />
Tamayo e Schwartz (1993), a seguir:<br />
No tipo motivacional Auto-determinação, foram agrupados os <strong>valores</strong>:<br />
curiosidade, criatividade, liberdade, auto-determinação, independência e auto-respeito.<br />
No tipo Estimulação, foram agrupados os <strong>valores</strong>: audácia, uma vida variada e<br />
uma vida excitante.<br />
No tipo Hedonismo, foram agrupados os <strong>valores</strong>: prazer, gozo da vida e autoindulgência.<br />
No tipo Realização, foram agrupados os <strong>valores</strong>: sucesso, capacidade,<br />
ambição, influência, inteligência e esperteza.<br />
No tipo Poder, foram agrupados os <strong>valores</strong>: autoridade, riqueza, preservação<br />
da imagem pública, reconhecimento social e vaidade.<br />
No tipo Benevolência, foram agrupados os <strong>valores</strong>: presteza, honestidade,<br />
indulgência, lealdade, responsabilidade, espiritualidade, amizade verdadeira, amor maduro,<br />
sentido da vida e trabalho.<br />
No tipo Tradição, foram agrupados os <strong>valores</strong>: ciência dos limites, devoção,<br />
humildade, respeito pela tradição, moderação e privacidade.<br />
No tipo Conformidade, foram agrupados os <strong>valores</strong>: obediência, respeito para<br />
com os pais e idosos, autodisciplina e polidez.<br />
No tipo Segurança, foram agrupados os <strong>valores</strong>: limpeza, segurança nacional,<br />
retribuição de favores, ordem social, segurança familiar, senso de pertencer e saúde..
242<br />
No tipo Filantropia (Universalismo para Schwartz), foram agrupados os<br />
<strong>valores</strong>: proteção do ambiente, união com a natureza, um mundo de beleza, abertura,<br />
justiça social, sabedoria, um mundo em paz, igualdade, harmonia interior e sonho.<br />
Depois de agrupados todos os <strong>valores</strong> do Inventário de Valores Individuais, foi<br />
feito o cálculo das Médias e Desvio Padrão relativos aos dez Tipos Motivacionais de<br />
Valores Individuais, com o objetivo de descrever os <strong>valores</strong> em maior evidência.<br />
Num segundo momento, foi feita análise dos Inventários Organizacionais, que<br />
orientam a vida da organização, de forma que os <strong>valores</strong> foram agrupados de acordo com<br />
as dimensões propostas por Tamayo (1996) e Mendes (1999), conforme segue:<br />
No eixo Autonomia, foram agrupados os <strong>valores</strong>: criatividade, curiosidade,<br />
eficácia, eficiência, modernização, qualidade, reconhecimento, competência, prazer,<br />
inovação, realização, estímulo e liberdade. Ainda no mesmo eixo, em Conservação, foram<br />
agrupados os <strong>valores</strong>: disciplina, honestidade, lealdade, limpeza, ordem, polidez, prestígio,<br />
segurança, sensatez e sigilo.<br />
No eixo Igualitarismo, foram agrupados os <strong>valores</strong>: democracia,<br />
descentralização, justiça, qualificação dos recursos humanos, sociabilidade, co-gestão,<br />
coleguismo, cooperação, dinamismo, independência, autonomia, comunicação, respeito e<br />
equidade. Em seqüência, no mesmo eixo em Hierarquia, foram agrupados os <strong>valores</strong>:<br />
fiscalização, hierarquia, obediência, poder, pontualidade, rigidez, supervisão e tradição.<br />
No eixo Harmonia, foram agrupados os <strong>valores</strong>: integração<br />
interorganizacional, interdependência, ética, parceria, tolerância, intercâmbio, preservação,<br />
harmonia, preservação da natureza, respeito à natureza, espontaneidade e iniciativa.<br />
Seguindo no mesmo eixo, em Domínio, foram agrupados os <strong>valores</strong>: previsibilidade,<br />
produtividade, satisfação dos clientes e sucesso.<br />
Depois de agrupados todos os <strong>valores</strong> do Inventário de Valores<br />
Organizacionais, foi feito o cálculo das Médias e Desvio Padrão relativos aos três eixos<br />
que compõem os seis tipos de Valores Organizacionais, com o objetivo de descrever os<br />
<strong>valores</strong> em maior evidência.<br />
Por fim, foi aplicado o coeficiente de correlação (“r” de Pearson) <strong>entre</strong> os Dez<br />
Tipos Motivacionais de Valores Individuais e as Três Dimensões dos Valores<br />
Organizacionais para identificar a relação <strong>entre</strong> <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e <strong>valores</strong><br />
<strong>organizacionais</strong>, buscando determinar em quais pares de <strong>valores</strong><br />
(Individuais/Organizacionais) ocorre uma relação mais forte <strong>entre</strong> as variáveis.
243<br />
1.7. Resultados<br />
1.7.1. Apresentação dos resultados referentes à escala de <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e o<br />
Inventário de Valores Organizacionais<br />
Primeiramente, verificou-se a média e o desvio padrão dos dez tipos<br />
motivacionais (Escala de Valores Individuais – SCHWARTZ, 1993), como sendo:<br />
Benevolência, Conformidade, Universalismo, Segurança, Auto-Direção, Tradição, Auto-<br />
Realização, Hedonismo, Poder e Estimulação. Os dados referentes a essa análise estão na<br />
tabela 8.<br />
Tabela 8 – Escores Médios e Desvio Padrão (DP) dos 10 tipos Motivacionais de<br />
Valores Individuais dos trabalhadores.<br />
Dez Tipos Motivacionais Média Desvio Padrão<br />
Benevolência 5,40 0,85<br />
Conformidade 5,25 1,00<br />
Universalismo 5,14 0,88<br />
Segurança 5,12 0,86<br />
Auto-Direção 4,96 0,96<br />
Tradição 4,46 1,09<br />
Auto-Realização 4,40 1,03<br />
Hedonismo 4,39 1,48<br />
Poder 3,73 1,06<br />
Estimulação<br />
Média Total<br />
3,09<br />
4,59<br />
1,39<br />
1,06<br />
Os resultados indicam forte orientação de dois tipos de <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>;<br />
primeiro tipo motivacional Benevolência, com média igual a 5,40 e Conformidade com<br />
média igual a 5,25; esses são seguidos pelos tipos motivacionais Universalismo<br />
(M = 5,14) e Segurança (M = 5,12). No outro pólo estão os tipos de <strong>valores</strong> Estimulação<br />
(M = 3,09) e Poder (M = 3,73), que obtiveram médias mais baixas, indicando que os<br />
trabalhadores atribuem pouca importância a esses <strong>valores</strong>. Entre os dois pólos estão os
244<br />
<strong>valores</strong> Auto-direção (M = 4,96), Tradição (M = 4,46), Auto-realização (M = 4,40) e<br />
Hedonismo (M = 4,39), evidenciando que é dada importância moderada a esses <strong>valores</strong>.<br />
Os <strong>valores</strong> são construídos socialmente, sendo freqüentemente usados para dar<br />
uma direção e orientação sobre as atitudes e os comportamentos de indivíduos e o<br />
funcionamento de organizações, instituições e sociedades. Assim, para os trabalhadores da<br />
Interprise os <strong>valores</strong> Benevolência, Conformidade, Universalismo e Segurança são mais<br />
importantes do que Estimulação e Poder.<br />
As metas motivacionais dos tipos de <strong>valores</strong> Benevolência, Conformidade,<br />
Universalismo e Segurança enfatizam a preocupação com o bem-estar das pessoas, a<br />
aceitação do outro, restrição do próprio comportamento em vista de expectativas sociais e a<br />
estabilidade nas relações. As ações na busca de cada um desses <strong>valores</strong> são mais desejadas<br />
e aceitas pela sociedade, porque pressupõem que os indivíduos que têm esses <strong>valores</strong> como<br />
orientadores para um modo desejado ou preferível de ação e conduta apresentam uma<br />
preocupação maior com a coletividade do que consigo mesmos.<br />
No outro pólo estão os <strong>valores</strong> de Estimulação e Poder. As metas<br />
motivacionais dos <strong>valores</strong> Estimulação e Poder enfatizam a procura de excitação,<br />
novidade, mudança, desafios na vida e a busca de status social, prestígio e controle sobre<br />
pessoas e recursos. Socialmente esses <strong>valores</strong> não são tão desejados, uma vez que<br />
enfatizam metas motivacionais dando uma direção e orientação no sentido de buscar o<br />
domínio e a satisfação dos próprios interesses em detrimento dos outros, indicando uma<br />
posição individualista.<br />
A pouca importância dada pelos trabalhadores da Interprise aos <strong>valores</strong><br />
Estimulação e Poder, encontram justificativa no contexto social da organização, no qual<br />
esses trabalhadores estão inseridos, fazendo com que se atribua pouca importância a esses<br />
<strong>valores</strong>. Segundo Dussault (1992), as organizações públicas têm uma dependência em grau<br />
elevado do ambiente sóciopolítico e seu quadro de funcionamento é regulado externamente<br />
à organização.<br />
A localização dos <strong>valores</strong> Auto-direção, Tradição, Auto-realização e<br />
Hedonismo <strong>entre</strong> os dois pólos, indicando uma importância moderada a eles, encontra<br />
explicação na orientação de suas metas motivacionais. Os <strong>valores</strong> de Auto-realização e<br />
Hedonismo expressam metas motivacionais de sucesso pessoal por meio da competência<br />
que leva ao reconhecimento social; Hedonismo tem como meta o prazer e a gratificação<br />
sensual. São <strong>valores</strong> que na estrutura circular são adjacentes e pertencentes ao mesmo pólo,
245<br />
não havendo, portanto, conflito <strong>entre</strong> eles. Ou seja, Auto-realização e Hedonismo<br />
expressam compatibilidade, porque estão a serviço de um mesmo interesse e possuem<br />
metas conciliáveis. Entretanto, o que se percebe é que mesmo que esses <strong>valores</strong> sejam<br />
indicação de prioridades axiológicas <strong>individuais</strong>, torna-se difícil para os trabalhadores da<br />
Interprise admitirem que têm como orientação <strong>valores</strong> de sucesso social ou prazer, uma<br />
vez que os mesmos não são tão aceitos socialmente.<br />
Os <strong>valores</strong> Auto-direção e Tradição expressam metas motivacionais de<br />
independência de pensamento e ação; Tradição enfatiza <strong>valores</strong> de comprometimento e<br />
respeito a idéias e costumes. São <strong>valores</strong> que na estrutura circular são opostos e<br />
pertencentes a pólos diferentes, havendo, portanto, conflito <strong>entre</strong> eles. Ou seja, Autodireção<br />
e Tradição expressam incompatibilidade <strong>entre</strong> si, porque estão a serviço de<br />
interesses diferentes e possuem metas inconciliáveis. Percebe-se, por meio desses <strong>valores</strong>,<br />
que há uma relação de conflito, indicando que possivelmente uma parte dos trabalhadores<br />
encontra-se em estágio mais avançado de socialização na organização, tendo internalizado<br />
sua cultura e <strong>valores</strong>. Quanto à outra parte, possivelmente por ter menos tempo de serviço<br />
na organização, ainda enfatiza seus <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>.<br />
Pesquisas têm demonstrado que certos <strong>valores</strong> são especialmente importantes<br />
socialmente (por exemplo, honestidade e outros <strong>valores</strong> pró-sociais) e outros são menos<br />
importantes (por exemplo, riqueza e outros <strong>valores</strong> de poder).<br />
Pesquisa transcultural, formada por três conjuntos de amostras, realizada por<br />
Schwartz e Bardi (2001), com o objetivo de comprovar a mesma natureza na<br />
hierarquização de <strong>valores</strong>, aponta para um tipo de estrutura hierárquica de <strong>valores</strong> em que<br />
o tipo de valor Benevolência emergiu no topo da hierarquia de <strong>valores</strong> com a maior média.<br />
Em seguida, estão os <strong>valores</strong> Auto-Direção e Universalismo. Os <strong>valores</strong> Segurança,<br />
Conformidade e Auto-Realização estão localizados no meio da hierarquia, seguidos pelos<br />
<strong>valores</strong> Hedonismo, Estimulação, Tradição e Poder, que foram localizados no final da<br />
hierarquia de <strong>valores</strong>. Ao valor Poder foi atribuída menor média por ele enfatizar domínio<br />
e exploração sobre pessoas e recursos. Essa é uma comparação <strong>entre</strong> os resultados aqui<br />
encontrados e os obtidos por Schwartz e Bardi (2001).<br />
Segundo Schwartz (1994), a busca do valor Benevolência envolve<br />
comportamento aprovado pelo grupo mais íntimo do indivíduo. Nota-se que na<br />
organização Interprise existe uma união <strong>entre</strong> os grupos dos trabalhadores, uma vez que o<br />
valor Benevolência foi o que mais se sobressaiu.
246<br />
De acordo com Schwartz (2001), a atribuição de importância ao tipo de valor<br />
Benevolência acontece em razão de sua importância para a relação social. Ele fornece a<br />
base motivacional para cooperação e apoio nas relações sociais. Os <strong>valores</strong> de<br />
Benevolência – presteza, honestidade, perdão, lealdade e responsabilidade – são reforçados<br />
e modelados pelos socializadores desde muito cedo na vida dos indivíduos e<br />
repetidamente, porque eles são críticos para assegurar comportamentos requeridos.<br />
A seguir, apresentam-se os resultados encontrados no Inventário de Valores<br />
Organizacionais – IVO (MENDES, 1999), identificando as prioridades axiológicas, que na<br />
percepção dos trabalhadores orientam a organização.<br />
Tabela 9 – Médias (M) e Desvio Padrão (DP) das Três Dimensões Bipolares dos<br />
Valores Organizacionais na percepção dos Trabalhadores<br />
Autonomia<br />
M = 3,75<br />
DP = 1,16<br />
Hierarquia<br />
M = 3,94<br />
DP = 1,06<br />
Harmonia<br />
M = 3,63<br />
DP = 1,04<br />
Conservação<br />
M = 4,00<br />
DP = 1,06<br />
Estrutura Igualitária<br />
M = 3,44<br />
DP = 1,11<br />
Domínio<br />
M = 4,02<br />
DP = 0,97<br />
Na primeira dimensão bipolar – Autonomia versus Conservação, há indicação<br />
do predomínio do pólo Conservação. Na dimensão Hierarquia versus Estrutura Igualitária,<br />
há o predomínio do pólo Hierarquia. Na dimensão Harmonia versus Domínio, há a<br />
predominância dos <strong>valores</strong> referentes ao Domínio. Assim, os resultados apresentados na<br />
tabela 9 apontam a orientação, segundo a percepção dos trabalhadores, dos <strong>valores</strong> na<br />
organização.<br />
No pólo da Conservação estão presentes os <strong>valores</strong> disciplina, honestidade,<br />
lealdade, limpeza, ordem, polidez, prestígio, segurança, sensatez e sigilo; por outro lado, a<br />
iniciativa e a criatividade do trabalhador não são promovidas, porque a ênfase é dada às<br />
tradições e à conservação do status quo, aos caminhos e às soluções já conhecidas e<br />
testadas pela organização no passado. De fato, iniciativa e criatividade do trabalhador são
247<br />
<strong>valores</strong> que, nas organizações públicas, recebem pouca ênfase, uma vez que o trabalhador,<br />
tendo o direito à estabilidade no emprego, acomoda-se, não buscando novas formas de<br />
aprimorar o trabalho. Em contraposição, para uma organização pública que trabalha com a<br />
saúde da população, transmitir honestidade, limpeza, segurança e prestígio é essencial para<br />
o desenvolvimento de seu trabalho. A organização, ao vender sua imagem aos clientes,<br />
procura passar confiança, limpeza, ordem e honestidade, por isso o valor Conservação é<br />
de extrema importância.<br />
Na percepção dos trabalhadores, o predomínio da dimensão Hierarquia sobre<br />
a Estrutura Igualitária significa a importância dada, na organização, aos <strong>valores</strong> referentes<br />
à hierarquia, obediência, fiscalização, poder, pontualidade, rigidez, supervisão e tradição.<br />
Os <strong>valores</strong> enfatizados nesse pólo são relacionados à legitimidade da definição e<br />
distribuição hierárquica de recursos e papéis sociais, como forma de garantir o<br />
comportamento dos membros da organização com sua missão (TAMAYO, 1996). Essas<br />
prioridades axiológicas são próprias dessa organização pública. As normas e supervisão<br />
impostas aos trabalhadores são acatadas pelos mesmos, para se adequarem aos arranjos<br />
<strong>organizacionais</strong> fornecidos por uma autoridade externa, ou seja, o poder da organização<br />
pública é vulnerável à interferência política. Nenhum trabalhador poderá seguir uma<br />
orientação contrária a essas normas e supervisão sem que sofra fortes sanções.<br />
Como o inventário Valores Organizacionais avaliou os <strong>valores</strong> percebidos<br />
pelos trabalhadores, reafirma-se a possibilidade de um contingente de trabalhadores, com<br />
mais tempo de serviço prestado à organização, estar socializado na mesma, já que a<br />
Hierarquia é uma de suas bases. Quanto ao outro contingente, com menos tempo de<br />
serviço prestado à organização, esse está ainda vivenciando e assimilando os <strong>valores</strong>,<br />
d<strong>entre</strong> eles a Hierarquia, tão importante para a organização.<br />
O predomínio da dimensão Domínio significa a importância dada aos <strong>valores</strong><br />
ambição, audácia, competitividade, domínio, previsibilidade, produtividade, satisfação dos<br />
clientes e sucesso. Os <strong>valores</strong> do pólo Domínio enfatizam a questão de seguir em frente<br />
por meio da auto-afirmação ativa, pelo domínio e mudança do mundo natural e social. Para<br />
uma organização pública que trabalha com a saúde da população, conseguir sobreviver em<br />
um contexto de privatizações, participando de processos de concorrência na esfera privada,<br />
esses <strong>valores</strong> são perseguidos com obstinação. Quanto à organização Interprise, ela<br />
pertence a um setor ao qual falta ainda definir o marco regulatório 6 para que se possa dar<br />
6 Nome dado à regulamentação de contratos <strong>entre</strong> as partes, referentes a investimentos produzidos pelo setor privado na
248<br />
início às privatizações, ou seja, antes de deixar que o dinheiro chegue a esse tipo de<br />
investimento, os investidores precisam saber quais as leis que os protegem, necessitando<br />
ter certeza de que estão imunes às flutuações de futuros governantes. No caso específico da<br />
organização Interprise, em que os seus serviços têm a finalidade de propiciar a saúde da<br />
população, ela está sempre colocando os <strong>valores</strong> de Domínio em prática, ou seja, esses<br />
<strong>valores</strong> são expressos com mais ênfase quando do estabelecimento de metas a serem<br />
alcançadas no que tange à eficácia dos seus serviços de saúde prestados à população. A<br />
predominância dos <strong>valores</strong> de Domínio exercidos pela organização Interprise faz com que<br />
ela exija que sejam criadas condições <strong>organizacionais</strong> congruentes com as peculiaridades e<br />
as exigências da produção de serviços profissionais no contexto público.<br />
1.7.2. Relação <strong>entre</strong> os Valores Individuais e os Valores Organizacionais<br />
Na tabela 10 são apresentados os resultados da correlação de Pearson, que<br />
mostram a relação <strong>entre</strong> os dez tipos motivacionais de <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> com as três<br />
dimensões bipolares dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>.<br />
Tabela 10 – Coeficientes de Correlação (“r” de Pearson) <strong>entre</strong> os Dez Tipos<br />
Motivacionais e as Três Dimensões Bipolares dos Valores Organizacionais<br />
TRÊS DIMENSÕES BIPOLARES – VALORES ORGANIZACIONAIS<br />
Dez Tipos<br />
Motivacionais Autonomia Conservação Igualitarismo Hierarquia Harmonia Domínio<br />
Auto-Direção 0,24 0,26 0,23 0,29 0,26 0,32*<br />
Estimulação 0,26 0,24 0,26 0,27 0,23 0,33*<br />
Hedonismo 0,28 0,26 0,27 0,28 0,28 0,40*<br />
Auto- 0,33* 0,28 0,34* 0,29 0,32* 0,43*<br />
Realização<br />
Poder 0,24 0,20 0,23 0,28 0,24 0,29<br />
Benevolência 0,24 0,32* 0,24 0,38* 0,30* 0,29<br />
Tradição 0,23 0,24 0,26 0,26 0,28 0,25<br />
Conformidade 0,28 0,30* 0,28 0,34* 0,32* 0,34*<br />
Segurança 0,24 0,25 0,23 0,33* 0,27 0,30*<br />
Universalismo 0,27 0,29 0,27 0,36* 0,32* 0,35*<br />
* = p
249<br />
Os resultados indicam que a dimensão Autonomia apresenta relação<br />
significativa com o tipo motivacional Auto-Realização. A dimensão Conservação tem<br />
relação significativa com os tipos motivacionais: Benevolência e Conformidade. A<br />
dimensão Igualitarismo apresenta relação significativa com o tipo motivacional Auto-<br />
Realização. A dimensão Hierarquia relaciona significativamente com os tipos<br />
motivacionais: Benevolência, Conformidade, Segurança e Universalismo. A dimensão<br />
Harmonia tem relação significativa com os tipos motivacionais: Auto-Realização,<br />
Benevolência, Conformidade e Universalismo. Por último, a dimensão Domínio relaciona<br />
significativamente com os tipos motivacionais: Auto-Direção, Estimulação, Hedonismo,<br />
Auto-Realização, Conformidade, Segurança e Universalismo.<br />
Essas relações constituem-se em uma dinâmica na organização, pois quanto<br />
mais os trabalhadores percebem que a organização valoriza Autonomia, mais a Auto-<br />
Realização é valorizada. Quanto mais os trabalhadores percebem que a organização<br />
valoriza Conservação, mais Benevolência e Conformidade são valorizadas; quanto mais os<br />
trabalhadores percebem que a organização valoriza Igualitarismo, mais a Auto-Realização<br />
é valorizada; quanto mais os trabalhadores percebem que a organização valoriza<br />
Hierarquia, mais Benevolência, Conformidade, Segurança e Universalismo são<br />
valorizados; quanto mais os trabalhadores percebem que a organização valoriza Harmonia,<br />
mais Auto-Realização, Benevolência, Conformidade e Universalismo são valorizados; e<br />
quanto mais os trabalhadores percebem que a organização valoriza Domínio, mais Auto-<br />
Direção, Estimulação, Hedonismo, Auto-Realização, Conformidade, Segurança e<br />
Universalismo são valorizados.<br />
Os tipos motivacionais Poder e Tradição não apresentaram relação significativa<br />
forte com nenhuma das dimensões dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, porque são prioridades<br />
axiológicas a que, na percepção dos trabalhadores, a organização dá pouca importância.<br />
Esses <strong>valores</strong> possuem metas motivacionais que não são adequadas para uma organização<br />
pública, uma vez que o Poder nessas organizações se concentra nas relações de estima e<br />
nos jogos de influência, ou seja, o direito de deliberar, agir e mandar é exercido por uma<br />
autoridade externa. Quanto a Tradição, a organização pesquisada possui uma cultura forte,<br />
imposta a ela desde a sua criação, há mais de 30 (trinta) anos. É uma cultura bastante<br />
arraigada, com forte predominância do setor público, o que dificulta a transformação de<br />
suas estruturas burocráticas e hierárquicas. Isto é, uma cultura voltada para a tradição de<br />
satisfazer a burocracia e não os clientes, de enfatizar os gastos e não a arrecadação, de
250<br />
focalizar a hierarquia e não a participação e o trabalho de equipe, pressupondo assim uma<br />
cultura organizacional fortemente sedimentada, com características distintas<br />
Os resultados demonstram também que os tipos motivacionais Auto-<br />
Realização e Conformidade, que têm como metas motivacionais o sucesso pessoal e a<br />
competência e a restrição do próprio comportamento em vista de expectativas sociais,<br />
respectivamente, tiveram uma relação significativa forte com quase todas as dimensões<br />
bipolares dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>. Isso vem demonstrar que o trabalhador que ingressa<br />
na Interprise, ou seja, em uma organização pública, com a estabilidade que lhe é<br />
concedida, tenta de todas as formas crescer por meio do seu sucesso pessoal e<br />
demonstrando sua competência por meio do sistema meritocrático, isto é, pelo mérito e<br />
desempenho. A meritocracia não é apenas valorizada como ideal, mas também é<br />
perseguida e alcançada, uma vez que constitui uma das vias legais de ascensão<br />
profissional, funcional e social dentro do serviço público.<br />
Entretanto o trabalhador, em determinadas situações neste percurso, pela busca<br />
da auto-realização, necessita submeter-se a situações nas quais se vê obrigado a<br />
desempenhar seu trabalho cumprindo uma carga horária superior à dos demais<br />
trabalhadores, que muitas vezes estão ausentes do trabalho. Isso para receberem a mesma<br />
remuneração, ou seja, o trabalhador se conforma a uma situação injusta para alcançar seu<br />
objetivo. Isso acontece por ele se condicionou à crença de estar numa organização pública<br />
onde o trabalho é seguro e para o resto da vida, até à aposentadoria. Porém, atualmente,<br />
pesquisas como a de Vaitsman (2001), têm demonstrado que a representação social da<br />
estabilidade no serviço público já não tem significado positivo <strong>entre</strong> os trabalhadores, por<br />
estar associada a “descompromisso”, “desmotivação” e “mau desempenho”.
251
252<br />
CAPÍTULO 5<br />
ESTUDO 2<br />
1. População<br />
A população referência do estudo 2, foram todos os trabalhadores de uma organização pública<br />
localizada no Município de Goiânia.<br />
2. Amostra<br />
Os sujeitos que participaram do estudo 2 foram divididos em dois grupos. O primeiro grupo –<br />
G1, foi formado por 11 (onze) trabalhadores. O seu foco foi levantar as prioridades axiológicas e as<br />
percepções desses trabalhadores em relação ao Programa de Qualidade de Vida no Trabalho desenvolvido<br />
pela organização.<br />
O segundo grupo – G2, foi formado por 4 (quatro) gestores do Programa de Qualidade de Vida<br />
no Trabalho desenvolvido pela organização. Esse foi formado com o intuito de conhecer o funcionamento do<br />
Programa de Qualidade de Vida no trabalho, além das prioridades axiológicas dos gestores.<br />
3. Caracterização da amostra<br />
No grupo G1, dos 11 (onze) trabalhadores <strong>entre</strong>vistados, 4 (quatro) eram do sexo feminino e 7<br />
(sete) do sexo masculino, com idades variando de 41 a 59 anos.
253<br />
No grupo G2, dos 4 (quatro) <strong>entre</strong>vistados, 3 (três) eram do sexo feminino e 1 (um) do sexo<br />
masculino, com idades variando de 43 a 57 anos.<br />
Dos <strong>entre</strong>vistados do grupo G1, 7 (sete) eram casados, 3 (três) solteiros e 1 (um) divorciado; no<br />
grupo G2, 2 (dois) eram casados e 2 (dois) divorciados.<br />
A escolaridade dos <strong>entre</strong>vistados pode ser assim caracterizada: no grupo G1, 1 (um) com<br />
primeiro grau, 4 (quatro) com segundo grau e 6 (seis) com terceiro grau; no grupo G2, todos os 4 (quatro)<br />
participantes com terceiro grau.<br />
Dos <strong>entre</strong>vistados do grupo G1, 5 (cinco) tinham cargos de nível administrativo e 6 (seis) de<br />
nível operacional; no grupo G2, todos os 4 (quatro) participantes possuíam cargos de nível administrativo.<br />
Em termos de nível hierárquico, no grupo G1, havia 1 (um) trabalhador lotado na Assessoria, 1<br />
(um) na Superintendência, 3 (três) na Gerência, 3 (três) na Supervisão e 3 (três) na Coordenadoria; no grupo<br />
G2, havia 1 (um) gestor lotado na Superintendência, 2 (dois) na Assessoria e 1 (um) na Gerência.<br />
Em relação a antiguidade, no grupo G1, 2 (dois) dos trabalhadores <strong>entre</strong>vistados estão na<br />
organização há 21 (vinte e um) anos, 1 (um) há 22 (vinte e dois) anos, 2 (dois) há 24 (vinte e quatro) anos, 3<br />
(três) há 25 (vinte e cinco) anos, 1 (um) há 26 (vinte e seis) anos, 1 (um) há 32 (trinta e dois) anos e 1 (um) há<br />
35 (trinta e cinco) anos; no grupo G2, 1 (um) gestor está na organização há 18 (dezoito) anos, 1 (um) há 21<br />
(vinte e um) anos, 1 (um) há 23 (vinte e três) anos e 1 (um) há 30 (trinta) anos.<br />
4. Instrumentos<br />
Tendo em vista o objetivo geral e os objetivos específicos da presente pesquisa, a <strong>entre</strong>vista<br />
tornou-se o instrumento de coleta de dados no estudo 2, “porque esta, ao mesmo tempo em que valoriza a<br />
presença do investigador, oferece todas as perspectivas possíveis, para que o informante alcance a liberdade<br />
e a espontaneidade necessárias, enriquecendo a investigação.” (TRIVIÑOS, 1987, p.146).<br />
Optou-se, nesse caso, por adotar o tipo de <strong>entre</strong>vista individual semi-estruturada, com uso de<br />
um gravador, definida por Triviños (1987) como aquela que parte de certos questionamentos básicos,<br />
apoiados em teorias e perguntas que interessam à pesquisa, e que oferecem um amplo campo de<br />
interrogativas, fruto de novas perguntas que vão surgindo, à medida que se recebem as respostas dos<br />
informantes. Portanto, o pesquisador contava com um roteiro de perguntas previamente elaboradas, que<br />
servia de base para as <strong>entre</strong>vistas. Foram elaborados dois roteiros de <strong>entre</strong>vistas, após várias consultas a<br />
dissertações que tratavam de temas afins, sendo um para os trabalhadores da organização e outro para os<br />
gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho. O objetivo da <strong>entre</strong>vista foi levantar dados sobre o<br />
Programa de Qualidade de Vida no Trabalho, principalmente com relação à percepção dos trabalhadores<br />
sobre ele e com relação à avaliação dos gestores no que diz respeito à criação, implantação, aceitabilidade,<br />
resultados, administração do Programa, e outros. A <strong>entre</strong>vista teve também o objetivo de levantar dados sobre<br />
os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> dos trabalhadores e sobre os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>.<br />
O roteiro direcionado para os trabalhadores foi composto por 22 questões (anexo 1). A<br />
primeira questão está relacionada com os dados demográficos e as demais sobre <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>, <strong>valores</strong><br />
<strong>organizacionais</strong> e a percepção dos trabalhadores sobre o Programa de Qualidade de Vida no Trabalho,
254<br />
desenvolvido pela Interprise. Como se trata de uma <strong>entre</strong>vista semi-estruturada, foi dada aos <strong>entre</strong>vistados<br />
liberdade para emitirem suas opiniões.<br />
O roteiro direcionado para os gestores foi composto por 43 questões (anexo 2). A primeira<br />
questão está relacionada com os dados demográficos e as demais abordando sobre os motivos da implantação<br />
do PQVT, sua divulgação e, histórico, <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>, <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, d<strong>entre</strong> outras. Como se<br />
trata de uma <strong>entre</strong>vista semi-estruturada, foi dada aos <strong>entre</strong>vistados liberdade para emitirem suas opiniões.<br />
A <strong>entre</strong>vista abarca, <strong>entre</strong> suas vantagens, a possibilidade de coletar dados em profundidade a respeito do<br />
comportamento humano em seus diversos aspectos, bem como abrange temas complexos que não se dão a conhecer por meio de<br />
instrumentos mais exatos como questionários ou escalas. Por isso é largamente utilizada na investigação social.<br />
Fonseca (1999) adverte que, na <strong>entre</strong>vista individual em lugar isolado, o peso recai todo no<br />
discurso verbal do informante, estando sujeito às inevitáveis discrepâncias <strong>entre</strong> discurso e prática, que pode<br />
evidenciar-se em respostas interessantes, mas que refletem uma dimensão idealizada da sociedade.<br />
Por esse motivo, complementou-se os dados da <strong>entre</strong>vista também com a técnica a seguir:<br />
• Na obtenção dos Valores Organizacionais, foi utilizada ainda pesquisa documental na organização,<br />
verificando os seguintes documentos: Regimento Interno da Organização, Regulamento Disciplinar de<br />
Pessoal da Organização, Estatuto da Organização, Guia de Benefícios da Organização e Política da<br />
Qualidade da Organização. A pesquisa documental visou compreender e complementar as informações<br />
fornecidas pelos <strong>entre</strong>vistados, bem como entender a macro-estrutura social e política, na qual a<br />
organização está inserida.<br />
5. PROCEDIMENTOS<br />
Foram realizadas 15 (quinze) <strong>entre</strong>vistas neste estudo, selecionados da amostra respondente das<br />
Escalas de Valores Individuais e Valores Organizacionais, no mês de dezembro de 2003, sendo que 11 (onze)<br />
foram com pessoas do grupo G1 e 4 (quatro) com pessoas do grupo G2.<br />
Todas as <strong>entre</strong>vistas foram gravadas e posteriormente transcritas na íntegra.<br />
Neste estudo, também com a finalidade de manter em sigilo o nome do trabalhador<br />
participante, cada <strong>entre</strong>vista gravada e transcrita foi codificada. Assim, atribuiu-se a cada <strong>entre</strong>vistado um<br />
número e uma letra: “T” para trabalhadores do grupo G1 e “G” para gestores do grupo G2. É importante<br />
salientar que o número não corresponde à ordem em que as <strong>entre</strong>vistas foram realizadas.<br />
Em todas as <strong>entre</strong>vistas, os <strong>entre</strong>vistados eram informados primeiramente sobre os objetivos do<br />
trabalho, em seguida o pesquisador solicitava autorização para gravar a conversa, informando que eles não<br />
seriam identificados na fita, nem no trabalho escrito. Em nenhum caso o informante se opôs à <strong>entre</strong>vista.
255<br />
Houve ainda a preocupação em criar um clima de descontração e confiança, tendo em vista a necessidade de<br />
estabelecer um rapport antes do seu efetivo início.<br />
As <strong>entre</strong>vistas com os trabalhadores e os gestores foram realizadas no período de 01 a 08 de<br />
dezembro de 2003. A média do tempo na sua realização foi de aproximadamente uma hora, sendo no<br />
máximo de duas horas e o mínimo meia hora. As <strong>entre</strong>vistas foram realizadas em horário de expediente e no<br />
local de trabalho, conforme disponibilidade de cada trabalhador. É importante ressaltar que as <strong>entre</strong>vistas<br />
com os gestores tiveram uma duração maior, em virtude de o roteiro da mesma possuir um maior número de<br />
questões a serem respondidas.<br />
Durante toda a coleta de dados, bem como em outras visitas, ficou evidente a disponibilidade e<br />
presteza dos trabalhadores participantes da pesquisa de colaborarem com o pesquisador.<br />
6. Técnica de Análise de Dados<br />
A análise de dados é um meio pelo qual se pode obter respostas a questões norteadoras do<br />
trabalho de forma segura e confiável.<br />
Segundo Bardin (1977, p.31), “a análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das<br />
comunicações.”<br />
Para Lane (1985, p.1):<br />
é a partir da linguagem que o ser humano poderá ampliar suas noções<br />
de tempo e espaço e irá desenvolver sua capacidade de raciocínio<br />
abstrato e, conseqüentemente, será capaz de planejar suas ações e<br />
avaliá-las depois de realizadas.<br />
Entretanto, é por intermédio dos discursos e de sua análise que se poderá chegar às respostas<br />
para os problemas propostos. Para analisar o discurso das <strong>entre</strong>vistas <strong>individuais</strong>, optou-se pela técnica de<br />
análise gráfica do discurso de Lane (1985). Essa técnica permitiu detectar os núcleos de pensamentos<br />
presentes nas representações dos sujeitos, o que facilitou a elucidação dos fatores que compuseram o discurso<br />
das pessoas <strong>entre</strong>vistadas, fornecendo assim respostas às questões levantadas.<br />
Do ponto de vista de Lane (1985), esse procedimento consiste em buscar, graficamente, os<br />
núcleos do pensamento, utilizando-se da análise das palavras que se repetem (ou dos sinônimos), seguindo a<br />
continuidade do discurso e a seqüência dos números para cada “unidade de significação”.<br />
Segundo Macêdo (1999), o procedimento para a análise gráfica do discurso obedece à seguinte<br />
seqüência: 1) transcrição do discurso da forma mais fiel possível; 2) análise, identificação e enumeração das<br />
unidades de significação; 3) ligação por setas seguindo a direção da seriação das frases nos textos<br />
discursivos; e 4) busca das palavras-chave ou dos núcleos de pensamento.<br />
Segundo a mesma autora após essas etapas é preciso realizar a elaboração de uma análise para<br />
detectar os núcleos de pensamentos, compostos pelas unidades de significação, e assim realizar um quadro de<br />
modo que um novo reagrupamento se configure, no qual os núcleos de pensamentos correspondentes sejam
256<br />
organizados, visando conter as categorias ou unidades de significados que as compõem, bem como as<br />
relações <strong>entre</strong> elas.<br />
A partir de cada questão, fizeram-se os gráficos de acordo com o núcleo das questões.<br />
Exemplo: Como você avalia o Programa de Qualidade de Vida no Trabalho na organização?<br />
AVALIE O PROGRAMA DE QUALIDADE DE VIDA NO<br />
TRABALHO<br />
De acordo com as respostas às questões, verificaram-se as palavras-chave.<br />
Exemplo: Respostas: muito bom programa; possui ações relevantes; é um programa que<br />
valoriza o trabalhador; proporciona ginástica laboral.<br />
BOM PROGRAMA VALORIZA TRABALHADORES<br />
Elabora-se então um gráfico, podendo ler o que foi dito, seguindo as numerações das linhas.<br />
AVALIE O PROGRAMA DE QUALIDADE DE VIDA NO<br />
TRABALHO<br />
1 1 2 2<br />
PROGRAMA<br />
VALORIZA<br />
1 2<br />
BOM<br />
TRABALHADORES<br />
Seguindo a seta número 1, no exemplo acima, nota-se que ela sai do núcleo indutivo, passa por<br />
outros núcleos de pensamentos e retorna para o núcleo indutivo. Ao ler seta por seta, tem-se na número 1 a<br />
avaliação de que o Programa de Qualidade de Vida no Trabalho é bom. Na seta número 2, constata-se que o<br />
programa valoriza o trabalhador. É como se cada seta fosse uma fase do discurso. Resumindo, tem-se que<br />
para os sujeitos desse discurso a avaliação que se faz do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho é a de<br />
que ele é bom e valoriza o trabalhador.
257<br />
Após todo o processo de coleta de dados e análise dos conteúdos, partiu-se para a elaboração<br />
dos resultados, que serão apresentados, analisados e discutidos a seguir.<br />
7. Resultados<br />
7.1. Apresentação da Análise Gráfica do Discurso das Entrevistas<br />
Os resultados das <strong>entre</strong>vistas serão apresentados em forma de gráficos para sua<br />
melhor compreensão.<br />
Serão atribuídos códigos a cada um dos <strong>entre</strong>vistados, para manter preservada a<br />
identidade dos mesmos. São códigos alfanuméricos, em que as letras assumiram os<br />
seguintes significados: T – trabalhador; G – gestor e S – sujeito. Serão colocados números<br />
após a letra S para indicar a posição ordinal em que o trabalhador ou gestor foi<br />
<strong>entre</strong>vistado.<br />
As análises a serem apresentadas foram fundamentadas nas teorias de cultura<br />
organizacional, <strong>valores</strong> e qualidade de vida no trabalho, conforme discutidos nos capítulos<br />
1, 2 e 3 desta dissertação.<br />
Gráfico 1: Discurso dos trabalhadores da organização Interprise, ao serem perguntados: “Quando você<br />
pensa nos seus <strong>valores</strong>, quais são as primeiras cinco palavras que lhe ocorrem?”<br />
1 1 2 2<br />
4 5 5 6 6<br />
Honestidade<br />
3 3 4<br />
Bom<br />
Relacionamento<br />
Interpessoal<br />
Trabalho<br />
5 6<br />
Saúde<br />
4<br />
Respeito<br />
Saber:<br />
- ouvir<br />
- lidar c/ pessoas<br />
Cooperação<br />
Integração<br />
Realização<br />
Crescimento<br />
Dignidade<br />
Reconhecimento<br />
Perseverança<br />
Assiduidade<br />
Dedicação<br />
Lealdade<br />
Fidelidade
258<br />
Família<br />
Gráfico 2: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da<br />
organização Interprise, ao serem perguntados: “Quando você pensa nos seus <strong>valores</strong>, quais são as cinco<br />
primeiras palavras que lhe ocorrem?”<br />
MEUS VALORES PRIORIZAM<br />
1 2 3 3 4<br />
4<br />
1<br />
Seriedade<br />
Ética<br />
2 2<br />
Solidariedade<br />
3<br />
Compromisso<br />
4<br />
Honestidade<br />
Consciência<br />
Responsabilidade<br />
Respeito<br />
Presteza<br />
Humanidade<br />
Equilíbrio<br />
Cliente<br />
Social<br />
Ideológico<br />
No gráfico 1, diante do núcleo induzido: “Quando você pensa nos seus <strong>valores</strong>, quais são as<br />
primeiras cinco palavras que lhe ocorrem?”, do discurso dos trabalhadores emergiram cinco núcleos de<br />
pensamentos: Honestidade, Família, Saúde, Bom Relacionamento Interpessoal e Trabalho. Quanto a<br />
Honestidade, Família e Saúde, os trabalhadores declararam que são esses os <strong>valores</strong> que priorizam em suas<br />
vidas. Sobre Bom Relacionamento Interpessoal, emergiu do seu discurso o respeito, o saber ouvir, a<br />
cooperação e a integração. No núcleo Trabalho emergiram duas unidades de significado: Realização – por<br />
suas respostas, os trabalhadores consideram que o trabalho leva a realização, crescimento, dignidade e
259<br />
reconhecimento; e Perseverança – trabalho já representa perseverança, assiduidade, dedicação, lealdade e<br />
fidelidade.<br />
No gráfico 2, diante do núcleo induzido: “Quando você pensa nos seus <strong>valores</strong>, quais são as<br />
cinco primeiras palavras que lhe ocorrem?”, do discurso dos gestores emergiram quatro núcleos de<br />
pensamentos: Seriedade, Ética, Solidariedade e Compromisso. Em Seriedade, os gestores declararam que<br />
esse é o valor que priorizam em suas vidas. Quanto ao núcleo Ética, eles relataram ser a ética o valor central<br />
em suas vidas, seguida pela honestidade, consciência, responsabilidade e respeito. No núcleo de pensamento<br />
Solidariedade, os gestores manifestaram como valor principal a solidariedade, ou seja, presteza, humanidade<br />
e equilíbrio. Sobre Compromisso, afirmaram, em seus discursos, que o compromisso com o cliente, com o<br />
social e com o ideológico é também priorizado em suas vidas.<br />
Nota-se que, tanto para os trabalhadores como para os gestores da Interprise, os <strong>valores</strong><br />
<strong>individuais</strong> que orientam suas vidas e guiam suas ações são aqueles que, segundo a teoria dos dez tipos de<br />
<strong>valores</strong> motivacionais de Schwartz (1994), se classificam como <strong>valores</strong> de Benevolência, ou seja, a meta<br />
motivacional desses <strong>valores</strong> é o interesse e a preocupação com o bem-estar das pessoas. Reafirma-se aqui que<br />
a orientação desses <strong>valores</strong> é mais desejada e aceita pela sociedade, porque se pressupõe que um indivíduo<br />
que os adote apresenta mais preocupação com a coletividade. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal<br />
situação:<br />
[...] compromisso com o cliente, ética interna, ou seja, você fazer o melhor que você pode e colocar<br />
para que o seu colega também faça o melhor (GS4).<br />
Os <strong>valores</strong> são construídos socialmente, dando direção e orientação para um modo desejado<br />
ou preferível de ação e conduta pessoalmente ou socialmente preferíveis.<br />
Eles exercem uma função mobilizadora e orientadora do comportamento humano. As pessoas,<br />
no processo de interação, têm necessidade de orientação, sentido e objetivo, que possam dar-lhes uma direção<br />
para se conduzirem de maneira adequada em seu espaço social e cultural.<br />
Segundo Rokeach (1981, p.132) “uma vez que um valor é internalizado, ele se torna um<br />
padrão ou critério para guiar a ação, para julgar moralmente a si e aos outros e para se comparar com os<br />
outros.”<br />
Um fato relevante apreendido nas <strong>entre</strong>vistas com os trabalhadores da Interprise, em relação<br />
aos seus <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>, foi a imposição que a Organização exerce sobre esses mesmos <strong>valores</strong>,<br />
conforme trecho da <strong>entre</strong>vista:<br />
[...] a gente não é correspondido nesses <strong>valores</strong>. Nossos <strong>valores</strong> pudessem ser reconhecidos por<br />
todos as autoridades. Eu me considero uma pessoa escrava, certa? Sem liberdade e... e eu vejo que o valor...<br />
uns dos <strong>valores</strong> grandes é a liberdade. É você poder trabalhar sem uma pressão, sem coação, e a gente<br />
muitas vezes é coagido (TS10).
260<br />
Percebe-se, por meio deste relato, que os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> da Interprise se sobrepõem<br />
aos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> de seus trabalhadores. A socialização secundária realizada com os trabalhadores faz<br />
com que sejam adaptados, isto é, submetidos e induzidos pela transmissão de uma série de conteúdos que<br />
dizem respeito, basicamente, aos objetivos fundamentais da organização, aos meios escolhidos para os<br />
alcançar, às responsabilidades dos membros e aos padrões comportamentais necessários para um<br />
desempenho eficaz, assim como a todo um conjunto de regras ou princípios relativos à conservação da<br />
identidade e integridade da organização.<br />
De acordo com Vala (1995), a socialização organizacional é um processo bidirecional: por um<br />
lado a organização procura influenciar e conduzir os indivíduos a comportamentos desejáveis e, por outro,<br />
eles reagem, transformando o que lhes é transmitido, procurando alterar o ambiente organizacional.<br />
Segundo Ravlim & Meglino (1991), é pouco provável que a socialização no ambiente de<br />
trabalho altere a estrutura básica de <strong>valores</strong> que o indivíduo traz para a organização.<br />
Para Lupi (1995), o sistema de <strong>valores</strong> de um indivíduo se constrói com o tempo e também se<br />
transforma. No entanto, ele considera que existe um núcleo de <strong>valores</strong> subjetivos adquiridos nos primeiros<br />
anos de vida, nas relações parentais, que são muito consistentes e duradouros.<br />
É provável que essa manifestação preferencial dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> sobre os <strong>valores</strong><br />
<strong>individuais</strong> dos trabalhadores da Interprise seja em função de se tratar de uma organização autocrática, isto é,<br />
o poder e a tomada de decisão são centralizados no mais alto chefe da organização, ou seja, o Governo, figura<br />
influenciadora e dominante, que maximiza metas, define o planejamento e a operacionalização.<br />
Contudo, essa relação de poder na Interprise, no passado, já foi pior quanto ao que acontece<br />
hoje. Às vezes, era extremamente autoritária em sua decisões, principalmente no que tange a demissões de<br />
trabalhadores, ocorridas na metade da década de 1990, e a processos impetrados contra a organização pelos<br />
seus trabalhadores. Era uma situação ambígua, pois nunca se sabia ao certo como agir, o que causava medo e<br />
aflição nos trabalhadores. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
[...] ainda existe muito isso na Interprise. Coação, nós fomos coagidos, aí num processo aí, que nós<br />
tinha de hora extra, o pessoal foi todo coagido a desistir do processo (TS10).<br />
Dussalt (1992, p.13) comenta sobre esse poder externo das organizações públicas quando<br />
afirma que: “as organizações de serviços públicos dependem em maior grau do que as demais do ambiente<br />
sóciopolítico: seu quadro de funcionamento é regulado externamente à organização. Seu mandato vem do<br />
Governo, seus objetivos são fixados por uma autoridade externa.”<br />
Schwartz e Bardi (2001) realizaram uma pesquisa transcultural com objetivo de identificar<br />
similaridade na hierarquização de <strong>valores</strong>.<br />
Os resultados indicaram uma estrutura hierárquica de <strong>valores</strong> em que o tipo de valor<br />
Benevolência, consistentemente, emergiu no topo da hierarquia de <strong>valores</strong>, tendo sido atribuído a ele a<br />
maior média. O resultado dessa pesquisa combina com o encontrado aqui, porque segundo os autores, a<br />
importância dada a Benevolência é em razão de sua importância para as relações sociais. Este tipo de<br />
valor fornece a base motivacional para cooperação e apoio nas relações sociais. Os <strong>valores</strong> de<br />
Benevolência – prestativo, honesto, que perdoa, leal, responsável, uma vida espiritual, amizade
261<br />
verdadeira, amor maduro, sentido da vida e trabalho – são reforçados e modelados pelos socializadores<br />
desde muito cedo na vida dos indivíduos e repetidamente, porque eles são críticos para assegurar<br />
comportamentos requeridos.<br />
Gráfico 3: Discurso dos trabalhadores da organização Interprise, ao serem perguntados: “O que o(a)<br />
levou a escolher esta organização como campo de trabalho? Como imaginava que seria?”<br />
1 2 2 3 4 4 5<br />
1<br />
Falta<br />
Questão<br />
Imaginou que Seria<br />
Financeira<br />
1 2 5 5<br />
3 3 5<br />
Carreira<br />
Promissora<br />
Outras<br />
Estudar<br />
Oportunidades<br />
Estável<br />
Experiência Anterior<br />
Sobrevivência<br />
5<br />
4<br />
Boas Condições de Trabalho<br />
Gráfico 4: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da organização<br />
Interprise, ao serem perguntados: “O que o(a) levou a escolher esta organização como campo de trabalho?<br />
Como imaginava que seria?”<br />
PORQUE ESCOLHEU TRABALHAR AQUI<br />
1 3 1 2 4 4 2 3<br />
Trabalho<br />
Comunitário<br />
1<br />
2<br />
3<br />
Salário<br />
4 2 2 3<br />
2<br />
Oportunidade<br />
Estágio<br />
4<br />
Imaginou que<br />
Seria<br />
Deixou<br />
Acontecer<br />
4<br />
Contratação<br />
Burocrático<br />
Emprego<br />
Restrição
262<br />
4<br />
4<br />
Liberdade<br />
No gráfico 3, diante do núcleo induzido: “O que o(a) levou a escolher Profissional esta organização como<br />
campo de trabalho? Como imaginava que seria?”, do discurso dos trabalhadores emergiram três núcleos de<br />
pensamentos: Falta, Questão Financeira e Imaginou Que Seria. No núcleo de pensamento Falta, consta que<br />
a escolha por estar trabalhando na organização foi em virtude da falta de outras oportunidades e por falta de<br />
experiência anterior. Em Questão Financeira, a escolha foi por razão puramente financeira, para manter os<br />
estudos e a própria sobrevivência. Em Imaginou Que Seria, eles declararam que, ao trabalharem na<br />
Interprise, imaginaram que teriam uma carreira promissora e estável, ou seja, garantia de um futuro<br />
profissional seguro, além de boas condições de trabalho.<br />
Contudo, essas boas condições de trabalho dependem da área onde os trabalhadores estão<br />
inseridos, se operacional ou administrativa, pois elas são muito diferentes dentro de uma mesma organização.<br />
No gráfico 4, diante do núcleo induzido: “O que o(a) levou a escolher esta organização como<br />
campo de trabalho? Como imaginava que seria?” do discurso dos gestores, emergiram dois núcleos de<br />
pensamentos: Oportunidade e Salário. No primeiro, alguns gestores declararam que foi a oportunidade de<br />
fazer um trabalho comunitário. Outros, que foi a oportunidade de um estágio, com contratação no final, que<br />
os levou à escolha dessa organização. Afirmaram que não imaginavam como seria, deixaram acontecer. Um<br />
outro grupo de gestores declarou que foi a oportunidade de emprego que os levou a escolher a organização<br />
como campo de trabalho, afirmando também que imaginavam ser restringidos em sua liberdade e<br />
profissionalização. No núcleo de pensamento Salário, alguns gestores manifestaram em seus discursos que<br />
foi o salário o motivo da escolha e que o trabalho seria burocrático.<br />
Os motivos para a escolha da Interprise como campo de trabalho, tanto para o grupo G1 como<br />
para o grupo G2 foram, portanto, a falta de oportunidade em outro emprego, a chance de estagiar nessa<br />
organização, a falta de experiência anterior e questões financeiras. Tinham expectativas de uma carreira<br />
bastante promissora e segura, porém julgavam que seria um trabalho burocrático e haveria restrições na<br />
liberdade e na profissionalização.<br />
A Interprise, por ser uma organização pública, é considerada por alguns como promissora,<br />
dando aos interessados a possibilidade de ingressar em seu quadro por influência política, não necessitando,<br />
portanto, de experiência anterior, além de ter a tradição de remunerar bem seus trabalhadores, com todas as<br />
vantagens e direitos de um trabalhador público, o que representa a garantia de um futuro profissional seguro,<br />
até à aposentadoria, ou seja, uma vez que o indivíduo passe a fazer parte do seu quadro, ele adquire inúmeras<br />
vantagens, d<strong>entre</strong> elas a estabilidade no emprego.<br />
Segundo Vaitsman (2001), a estabilidade pode adquirir vários significados, dependendo da<br />
situação ou do contexto. Como representação social, porém, já não tem significado positivo <strong>entre</strong> os<br />
trabalhadores de organizações públicas.
263<br />
De acordo com a autora, ainda que grande parte dos trabalhadores em organizações<br />
públicas avalie negativamente a estabilidade, do ponto de vista de suas conseqüências para o desempenho<br />
no trabalho, ninguém quer abdicar dessa condição.<br />
Isto se explica não apenas pelo próprio fato de consistir em direito adquirido, mas também pela<br />
desconfiança que predomina <strong>entre</strong> os trabalhadores em relação ao cumprimento das regras do jogo e ao<br />
efetivo exercício da meritocracia no setor público, o que costuma ser atribuído de forma generalizada à<br />
“política”. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
Estabilidade e... um futuro melhor, né? Trabalhar aqui... achei que fosse mais como empresa<br />
privada, né? mais exigido, mais... pelo que eu faço, é muito bom o que eu faço, mas ela... a empresa<br />
deveria ser menos política (TS11).<br />
A expectativa de um serviço burocrático torna-se evidente por se tratar de uma organização<br />
pública, que possui uma representação social da execução das tarefas no setor público. Isto é, o trabalho<br />
desenvolvido nesse tipo de organização está sujeito a hierarquia e a regulamentos rígidos, tornando<br />
moroso o seu desempenho. Isso fica demonstrado neste trecho de <strong>entre</strong>vista:<br />
Eu achei que ia ser... aquela... aquele serviço assim de... é a imagem que a gente tem dos<br />
funcionários públicos. Pessoa ali o dia inteiro em cima do papel, batendo carimbo, assinando,<br />
fazendo conta, atendendo mal as pessoas. E até porque eu vim de um outro órgão público (GS3).<br />
Seabra (2001, p.36), afirma que a<br />
forte ênfase que o modelo burocrático tradicional coloca no controle do<br />
processo, para proteger o interesse do setor público contra corrupção e<br />
na má conduta, tem o efeito de gerar um ambiente ineficiente. O<br />
resultado é uma complexa rede de regras e procedimentos<br />
que“amarram” os administradores públicos, dificultando a efetiva<br />
obtenção dos resultados almejados.<br />
A probabilidade de a organização Interprise usar mecanismos de restrição da liberdade e da<br />
profissionalização deu lugar a uma outra representação social, após o reconhecimento dos <strong>valores</strong> e da<br />
cultura da organização por meio da socialização organizacional. É importante lembrar que os <strong>valores</strong><br />
adquirem uma função fundamental no processo da socialização organizacional, tendo em vista que eles são
264<br />
elementos centrais da cultura organizacional, que deverá ser transmitida ao novo trabalhador e absorvida por<br />
ele. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
É uma empresa que respeita, embora seja uma empresa pública, é uma empresa que respeita a<br />
opinião dos outros. É uma empresa que me deu grandes oportunidades de qualificação. Ela tem<br />
tradição democrática em sua gestão. É uma empresa que dá chance, é uma empresa extremamente<br />
aberta (GS4).<br />
Caldas (1999, p.219) afirma que “a socialização de novos membros na organização é um processo de introdução<br />
simbólica à sua cultura e a seu imaginário social.” Verifica-se, portanto, que o objetivo da socialização organizacional é integrar o<br />
novato à organização de forma satisfatória, e para que ele tenha possibilidade de se identificar como membro dela. Nesse sentido, é<br />
importante prestar atenção não só ao que é transmitido, mas também à recepção e às possíveis transformações ocorridas durante o<br />
processo.<br />
Nota-se que na mesma organização indivíduos com <strong>valores</strong> humanos e objetivos diferentes<br />
desenvolvem também uma trajetória profissional diferente.<br />
Gráfico 5: Discurso dos trabalhadores da organização Interprise, ao serem perguntados: “O que você<br />
imaginava sobre a organização confirmou-se ou não?”<br />
3 1 1 2 3 4 5<br />
SIM<br />
NÃO<br />
Estudo<br />
4 5<br />
Valores<br />
1 1 2 3 Diferentes 4<br />
Trabalho<br />
Deve<br />
Adaptar
265<br />
1<br />
Sustento<br />
1<br />
Chances de<br />
Crescimento<br />
Satisfação<br />
3<br />
Esperança<br />
3<br />
Gratidão<br />
2 2 Política 3<br />
Interfere<br />
5<br />
Retrocesso<br />
5<br />
Insegurança<br />
4 4 5<br />
Gráfico 6: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da<br />
organização Interprise, ao serem perguntados: “O que você imaginava sobre a organização confirmouse<br />
ou não?”<br />
Tinha Idéia<br />
Pré-<br />
Concebida<br />
4 3 1 3 2 2 4<br />
1<br />
Sim<br />
4<br />
Não<br />
3 3 4<br />
1<br />
1<br />
Deixou<br />
Acontecer<br />
Houve<br />
Surpresas<br />
1 3<br />
Conheceu<br />
Positivas<br />
Realidade<br />
Depois de<br />
Entrar na<br />
Organização<br />
Negativas<br />
No Gráfico 5, diante do núcleo induzido: “O que você imaginava sobre a organização<br />
confirmou-se ou não?”, do discurso dos trabalhadores emergiram dois núcleos de pensamentos: Sim e Não.<br />
No primeiro Sim, os trabalhadores direcionaram-se para respostas como: trabalhar para sustentar os estudos,<br />
chances de crescimento, trabalho no sentido de satisfação, esperança e gratidão. No segundo Não, os<br />
trabalhadores relataram que os <strong>valores</strong> são diferentes e, também em conseqüência disso, precisam adaptar-se,<br />
o que causa insegurança. Declararam também que a política interfere, causando um retrocesso dentro da<br />
organização e gerando insegurança.
266<br />
No gráfico 6, diante do núcleo induzido: “O que você imaginava sobre a organização<br />
confirmou-se ou não?”, do discurso dos gestores emergiram quatro núcleos de pensamentos: Não, Deixou<br />
Acontecer, Positivas e Sim. No núcleo de pensamento Não, os gestores declararam que não tinham nenhuma<br />
idéia pré-concebida da organização, pois conheceram a realidade depois de nela entrarem. Os gestores<br />
expressam tal representatividade, por exemplo, no trecho seguinte:<br />
“Na realidade, eu não tinha nenhuma idéia na época. É, eu fui conhecer a partir do momento que eu<br />
<strong>entre</strong>i aqui, como era o trabalho de uma empresa. Mas não tinha nenhuma idéia, não tinha nenhum<br />
pensamento pré-concebido como seria.” (GS1)<br />
Em Deixou Acontecer, os gestores relataram que deixaram acontecer. Expressam tal<br />
representatividade, por exemplo, neste trecho:<br />
“[...] deixei o dia ir acontecendo, né? O dia acontecendo e faz 30 anos” (GS2)<br />
No núcleo Positivas, os gestores confirmaram suas expectativas positivas, mas, em relação às<br />
expectativas negativas, não confirmaram. No núcleo de pensamento Sim, eles manifestaram, em seus<br />
discursos, que suas expectativas se confirmaram em relação à organização, não tendo maiores surpresas.<br />
Apreende-se que no grupo G1 alguns trabalhadores confirmaram suas expectativas em relação<br />
ao trabalho na Interprise, no sentido de que teriam chances de crescimento, satisfação e, acima de tudo, de<br />
busca pela sobrevivência, conforme discutido na análise dos gráficos 3 e 4.<br />
Percebe-se que ocorre na sociedade essa representação social, bastante arraigada, de que a<br />
busca de um emprego em uma organização pública será sempre transformado em uma carreira com grandes<br />
chances de crescimento, satisfação e sustento para o resto da vida. De fato, é uma realidade que também<br />
acontece na Interprise, mas para que o trabalhador consiga todas essas vantagens, é necessário muito jogo<br />
político, muita manobra, amigos influentes e habilidades diplomáticas. Aqueles que não possuem esses<br />
diferenciais permanecem estagnados por longos períodos em suas funções, ou mesmo até à aposentadoria.<br />
Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
Concretizou, nossa! Uma empresa excelente aqui...A Interprise foi tudo pra mim. Tudo o que eu<br />
tenho hoje, ela participou, foi a Interprise que me deu. Às vezes eu vejo alguém falar mal da Interprise, eu<br />
falo: “Oh! Calma aí”. É uma empresa que...por mim...ficava aqui até mais tempo. (TS7).<br />
Segundo Carbone (2000), se fosse possível estabelecer um comportamento de sucesso ou de<br />
sobrevivência pessoal dentro do setor público, ele teria pouco a ver com atributos como empreendedorismo,<br />
capacidade de inovação, ousadia ou competência técnica. O que se valoriza no indivíduo que trabalha em<br />
organizações públicas é a sua capacidade de conciliar interesse, contornar conflitos e mostrar aquilo que não<br />
é.<br />
Já para outros trabalhadores do grupo G1, as expectativas não se confirmaram em relação a<br />
Interprise, porque os <strong>valores</strong> propagados por ela são divergentes dos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> dos trabalhadores,
267<br />
tendo, com isso, de se adaptarem à dinâmica da organização. Isso pode ser verificado nas análises dos<br />
gráficos 1 e 2, quando se discute a força que os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> exercem sobre os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>.<br />
Argumentam também que as expectativas não se confirmaram em virtude da interferência política que causa<br />
um retrocesso na organização e gera insegurança <strong>entre</strong> os trabalhadores. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que<br />
exemplifica tal situação:<br />
A estrutura é muito grande, é ótimo a estrutura. Tem condições de trabalho, tem condições de<br />
crescer, tem condições de coisas inovadoras, mas agora a política vem podando isso aí ao longo dos anos. A<br />
política, ela pode isso aí. Você pensa: “Pôxa! Agora eu consegui alguma coisa na empresa, eu vou subir de<br />
cargo, meu salário vai melhorar”. Mas aí o que acontece? Vem e muda de governo. Em outra palavra, volta<br />
à estaca zero, então você pensa que tá indo, você já tá é voltando (TS3).<br />
De acordo com Vaitsman (2001), nas organizações públicas, por um lado, permanecem as<br />
tradicionais práticas de loteamento político de cargos, clientelismo e um baixo grau de consciência na hora da<br />
prestação de contas pelos detentores de altas posições governamentais e administrativas; e de outro, também<br />
permanecem boa parte dos que não têm acesso a essas posições, gerando desconfiança e descrédito em<br />
relação aos “políticos” e “aos de cima”.<br />
A Interprise, por ser uma organização pública, desde sua fundação esteve vulnerável às<br />
orientações político-partidárias de quem ocupava o comando maior do Estado e também a administração de<br />
pessoal.<br />
Em relação ao grupo G2, os gestores declararam que não houve surpresas quanto às suas<br />
expectativas, até mesmo porque não existia uma idéia pré-concebida de como seria trabalhar na organização.<br />
Acharam melhor que a própria convivência do dia-a-dia mostrasse a realidade da Interprise. Nota-se que há<br />
menos frustração por parte dos gestores do que dos trabalhadores.<br />
As expectativas frustradas dos trabalhadores reportam-se ao fato de estarem mais distantes do<br />
poder, ou seja, na base da organização, passando, às vezes, por algumas situações onde precisam de apoio e<br />
não encontram, como por exemplo, em uma defesa relativa a infração de regulamentos. Já os gestores, são<br />
todos indivíduos qualificados, ocupantes de altos cargos e bem próximos ao poder, ou seja, são indivíduos<br />
com acesso ao controle de recursos, habilidade técnica, corpo de conhecimento crítico, prerrogativas legais e<br />
trânsito livre junto aos poderosos. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
[...] Eu já ocupei vários postos aqui, várias posições, só falta ser diretor, então eu acho que... Nesse<br />
período todo eu quis fazer aí, fazer como profissional, fazer como gerente e graças a Deus eu sou<br />
muito respeitado aqui hoje (GS2).<br />
O que se percebe hoje na Interprise é uma relação marcada por grande distância do poder,<br />
delimitada por normas, de acordo com a hierarquia.
268<br />
Gráfico 7: Discurso dos trabalhadores da organização Interprise, ao serem perguntados: “Como você<br />
aprendeu sobre os <strong>valores</strong> da organização?”<br />
1 1 2 2 3 3<br />
Atuando na<br />
Empresa<br />
1<br />
Conquistas<br />
Trabalhistas<br />
Relacionamento<br />
2<br />
Solidariedade<br />
das Pessoas<br />
2<br />
Pelos Chefes,<br />
Gerentes,<br />
Diretores<br />
Percebendo<br />
os Colegas<br />
Gráfico 8: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da<br />
organização Interprise, ao serem perguntados: “Como você aprendeu sobre os <strong>valores</strong> da organização?”<br />
COMO APRENDEU OS VALORES DA ORGANIZAÇÃO<br />
1 3 3 2 2
269<br />
Dentro da<br />
Empresa<br />
1 1 3<br />
Não Sei se<br />
Aprendi<br />
2<br />
Tentei Impor os<br />
Meus<br />
Várias<br />
Gestões<br />
Por Meio de<br />
Lutas<br />
No gráfico 7, diante do núcleo induzido: “Como você aprendeu sobre os <strong>valores</strong> da<br />
organização?”, do discurso dos trabalhadores emergiram três núcleos de pensamentos: Atuando na Empresa,<br />
Relacionamento e Pelos Chefes. Em Atuando na Empresa, os trabalhadores relataram que aprenderam os<br />
<strong>valores</strong> da organização por meio das conquistas trabalhistas. Em Relacionamento, relataram ter aprendido<br />
com a solidariedade das pessoas e percebendo os colegas. No núcleo de pensamento Pelos Chefes, afirmaram<br />
ter aprendido os <strong>valores</strong> da organização através da convivência com os chefes, gerentes e diretores da<br />
organização.<br />
No gráfico 8, diante do núcleo induzido: “Como você aprendeu sobre os <strong>valores</strong> da<br />
organização?”, do discurso dos gestores emergiram três núcleos de pensamentos: Dentro da Empresa, Não<br />
Sei Se Aprendi e Por Meio de Lutas. Em Dentro da Empresa, os gestores declararam que foi dentro da<br />
organização que aprenderam os <strong>valores</strong> dela. Em Não Sei Se Aprendi, eles relataram não saber se aprenderam<br />
esses <strong>valores</strong>, mas que tentaram impor os seus dentro da organização. Os gestores expressam tal<br />
representatividade, por exemplo, neste trecho:<br />
“Eu... eu não sei se eu aprendi com os <strong>valores</strong> da Interprise não. Eu tentei foi... os meus <strong>valores</strong><br />
pessoais tentar, né? Me impor aqui dentro, com os meus <strong>valores</strong>, né?” (GS2)<br />
No núcleo de pensamento Por Meio de Lutas, os gestores afirmaram que foi por meio das lutas<br />
dentro da organização que conseguiram absorver os <strong>valores</strong> da organização.<br />
Observa-se que tanto o grupo G1 quanto o grupo G2 apreenderam os <strong>valores</strong> da Interprise por<br />
meio da atuação dentro dela e por meio de conquistas para aumentar os direitos dos trabalhadores, uma vez<br />
que alguns trabalhadores buscaram conhecer esses <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> por meio dos seus chefes, gerentes<br />
e diretores. Por outro lado, alguns gestores nem tiveram a intenção de assimilar tais <strong>valores</strong>, já foram logo<br />
impondo os seus à Interprise.<br />
Entende-se essa imposição dos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> por parte de alguns gestores pelo fato de<br />
estarem em estágio inicial de socialização, quando entraram na organização, não tendo, ainda, internalizado a<br />
cultura e os <strong>valores</strong> da Interprise. Ou seja, por serem novatos, ainda enfatizavam seus <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>,<br />
conforme já discutido nos gráficos 1 e 2. Isso fica demonstrado no seguinte trecho de <strong>entre</strong>vista:
270<br />
Eu não sei se eu aprendi com os <strong>valores</strong> da Interprise não. Eu tentei foi...os meus <strong>valores</strong> pessoais<br />
tentou, né? me impor aqui dentro, com os meus <strong>valores</strong>, né? e não aceitar tudo que...coisa que eu achava<br />
que chocava com os meus <strong>valores</strong>, largava de lado, né? (GS2).<br />
De uma forma geral, pode-se dizer que a cultura consiste em elementos compartilhados que<br />
constituem os padrões que definem a melhor forma de perceber, pensar, agir e comunicar. As organizações<br />
transmitem aos seus membros, por meio de diversos mecanismos, esses elementos compartilhados. As<br />
prioridades axiológicas de uma organização expressam a estrutura básica da sua cultura (SCHWARTZ,<br />
1996).<br />
Percebe-se, porém, que alguns trabalhadores do grupo G1 demonstraram que conheceram os<br />
<strong>valores</strong> da Interprise por meio do relacionamento com colegas, chefes, gerentes e diretores. Essa prática de<br />
assimilação dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> pode ter ocorrido pelo fato de esses trabalhadores terem conseguido<br />
estabelecer uma relação de confiança <strong>entre</strong> si, situação pouco provável de ter ocorrido no estágio inicial de<br />
socialização. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
[...] Entrar na Interprise aqui penei pra caramba. Aos poucos fui vendo isso aqui e uma realidade<br />
totalmente diferente da que eu tinha lá fora, foi difícil pra mim. Muita pressão, muito...sei lá,<br />
pessoas querendo puxar o tapete uma da outra. Horrível! Horrível! Não tive uma<br />
impressão...pensava que se fosse pra trabalhar assim...sei lá, a pessoa devia, né? ter disponibilidade<br />
de querer bem você. Pra mim não foi nada bom. Foi terrível (TS1).<br />
O que se nota por esse relato é que ainda que existam, <strong>entre</strong> os trabalhadores da Interprise,<br />
aspirações e atitudes universalistas, a isso não corresponde a crença de que as regras do jogo sejam as<br />
mesmas para todos, o que provavelmente tem implicações negativas do ponto de vista da formação de um<br />
ethos de envolvimento e comprometimento com o setor público.<br />
Gráfico 9: Discurso dos trabalhadores da organização Interprise, ao serem perguntados: “Ao se<br />
deparar com os <strong>valores</strong> da organização, o que você sentiu? Como está hoje?”<br />
3 1 2 1 2 5 3 4 4 5 6<br />
POSITIVOS
271<br />
No Início<br />
Qualificação<br />
Atualmente<br />
3 2 1 1 Crescimento 4<br />
Profissional<br />
2<br />
Difícil<br />
Pouca<br />
Exigência<br />
2<br />
2<br />
Estudar<br />
1 4 5<br />
Bom Ambiente<br />
1 4 3 4<br />
Satisfeito<br />
Alegre<br />
Realizado<br />
Bem<br />
Valeu a pena<br />
Valoriza<br />
4 5<br />
5 6 6<br />
Fingir<br />
3<br />
NEGATIVOS<br />
Desvalorizado<br />
Humilhado<br />
Prejudicado<br />
Desrespeitado<br />
Decepcionado<br />
Frustrado<br />
Sufocado<br />
Constrangido<br />
6<br />
3 6<br />
Política<br />
Atrapalha<br />
6<br />
Gráfico 10: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da<br />
organização Interprise, ao serem perguntados: “Ao se deparar com os <strong>valores</strong> da organização, o que<br />
você sentiu? Como está hoje?”<br />
Como se Sente em Relação aos Valores da Organização<br />
1 2 3 4 2 1 3<br />
No Início<br />
1 1<br />
4<br />
Atualmente<br />
2 1 3
272<br />
Choque<br />
2 4 2<br />
Identifique<br />
i<br />
3<br />
Bem<br />
Não São<br />
Claros<br />
4 4<br />
4 2<br />
3<br />
Convívio<br />
Satisfatório<br />
3<br />
Inexistência<br />
Disso<br />
4<br />
Me Fiz<br />
Dentro Dela<br />
4<br />
No gráfico 9, diante do núcleo induzido: “Ao se deparar com os <strong>valores</strong> da organização, o que<br />
você sentiu? Como está hoje?”, do discurso dos trabalhadores emergiram dois núcleos de pensamentos: No<br />
Início e Atualmente. Primeiro – No Início, alguns trabalhadores relataram que se sentiram realizados, que<br />
havia um bom ambiente, com crescimento profissional e qualificação. Por outro lado, declararam também<br />
que no início foi difícil, pois a interferência da política atrapalhava e com isso se sentiam desvalorizados,<br />
desrespeitados, decepcionados.<br />
Quanto ao segundo – Atualmente, alguns disseram que se sentem realizados, que há um bom<br />
ambiente e crescimento profissional. Já outros afirmaram que é preciso fingir que sentem tudo isso em<br />
relação aos <strong>valores</strong> da organização. E, por último, há os que declararam que se sentem desrespeitados, pois a<br />
interferência da política continua atrapalhando.<br />
No gráfico 10, diante do núcleo induzido: “Ao se deparar com os <strong>valores</strong> da organização, o<br />
que você sentiu? Como está hoje?”, do discurso dos gestores emergiram dois núcleos de pensamentos: No<br />
Início e Choque. No núcleo No Início, alguns gestores declararam que no início levaram um choque, mas<br />
atualmente o convívio é satisfatório. Outros relataram que identificaram os <strong>valores</strong> da organização, mas<br />
notaram que eles não eram claros, e que atualmente sentem-se tranqüilos quanto a isso. Já outro gestores<br />
afirmaram que no início sentiram-se bem, porque se fizeram dentro da organização, e atualmente o convívio<br />
com os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> é tranqüilo.<br />
No núcleo de pensamento Choque, os gestores manifestaram que tiveram um choque ao se<br />
depararem com os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, pois concluíram que a organização não os possui, os<br />
trabalhadores sim. Declararam também que é um choque quando se deparam com esses <strong>valores</strong> atualmente,<br />
pois alguns trabalhadores os rechaçam totalmente, mas apesar de tudo sentem-se respeitados.
273<br />
A percepção do grupo G1 e do grupo G2, quanto à sensação diante dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong><br />
da Interprise, refere-se ao que foi percebido no início e ao que sentem atualmente.<br />
Dessa forma, alguns indivíduos, tanto do grupo G1 como do grupo G2, declararam que no<br />
início se sentiram encantados pela beleza e organização da Interprise, reforçando o sentimento de uma<br />
carreira profissional promissora e de felicidade, até pelo fato de alguns deles terem vindo de organizações<br />
privadas onde as regras são mais claras e rígidas e as exigências são muito maiores.<br />
Por outro lado, o impacto dos <strong>valores</strong> da organização provocado em indivíduos desses mesmos<br />
grupos, gerava uma sensação de choque, uma sensação de que a política atrapalhava, causando dificuldades,<br />
sentimentos de desvalorização, humilhação, desrespeito e constrangimento. Alguns alegaram a inexistência<br />
desses <strong>valores</strong> dentro da Interprise. Talvez esse impacto tenha ocorrido pela falta de costume com tantas<br />
regras que compõem a burocracia de organizações públicas, que tiveram não só de ser assimiladas, mas até<br />
incorporadas via alteração de <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> que as poderiam embasar. Eis trechos de <strong>entre</strong>vista que<br />
exemplificam tais situações:<br />
Olha, eu senti é bem confortável, porque isso vai, de certa forma, de encontro ao que a gente<br />
procura. É uma empresa boa de trabalhar (TS5).<br />
Me senti bem. Me senti bem, porque eu vinha vindo de empresa privada. No início foi difícil. Difícil<br />
assim, não exigia tanto qual na empresa privada, né? Na empresa privada a exigência é maior. Eu vim,<br />
quando eu <strong>entre</strong>i aqui na Interprise, eu vi que não tinha toda aquela exigência de empresa privada (TS7).<br />
[...] Limpa e transparente, nisso aí, mas...a política tem hora que deixa a desejar. Tem pessoas que<br />
às vezes ocupam certos é...cargos de confiança na empresa que às vezes não tem aquela performance aquele<br />
conhecimento. A gente se sente assim humilhado, a gente se sente prejudicado. A gente sente desrespeitado<br />
(TS3).<br />
[...] Eu confesso que eu me choquei muito quando eu cheguei a ver os <strong>valores</strong> da organização.<br />
E...assim...até hoje me choco com eles. Tanto me choco, que eu não me acostumei com eles ainda (GS4).<br />
Pode-se verificar como as normas, os princípios ou crenças que orientam o funcionamento e a<br />
vida da organização, ao mesmo tempo que se constituem em restrições, que geram sentimentos negativos,<br />
após assimilados podem gerar sentimentos de adaptação e adequação. Por isso são importantes no processo<br />
de socialização, conforme já discutido nas análises dos gráficos 1, 2, 3 e 4.<br />
A respeito das normas, Lima (1997) assinala que elas são, a princípio, um conjunto de<br />
mecanismos de controle que abrangem os sistemas institucionais operacional, punitivo, de recompensas, de<br />
controle, coordenação, etc., permitindo o acompanhamento dos indivíduos e das rotinas mediante processos<br />
comparativos. Um sistema normativo racional e equilibrado dá sensação de segurança, tanto para os<br />
trabalhadores quanto para os patrões, já que representa um roteiro formalizado e validado pela chefia em
274<br />
relação a como proceder, garantindo que “quem age como diz o manual não tem problemas” (LIMA, 1997,<br />
p. 134).<br />
Os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> estão além das próprias normas definidas pela organização e<br />
constituem uma espécie de ideologia – as normas da organização estão enraizadas nos <strong>valores</strong> e podem ser<br />
consideradas até mesmo como operacionalização desses <strong>valores</strong> (TAMAYO E GONDIM, 1996). As normas<br />
definem explicitamente as formas de comportamento esperadas dos membros de uma organização e os<br />
<strong>valores</strong> proporcionam uma justificação mais elaborada e generalizada, tanto para o comportamento<br />
apropriado como para as atividades e funções do sistema.<br />
Quanto à percepção que o grupo G1 e o grupo G2 tiveram a respeito de como se sentem<br />
atualmente frente aos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> da Interprise, indivíduos tanto do G1 quanto do G2<br />
manifestaram-se bem tranqüilos.<br />
Principalmente em relação aos gestores, por se tratar praticamente de todo o grupo G2, essa<br />
tranqüilidade sentida traduz-se em cargos no topo da hierarquia, altos salários, vantagens e benefícios que<br />
somente uma organização pública pode oferecer. No grupo G1 também vê-se esse fenômeno acontecer, mas<br />
numa proporção menor, pois esse contingente engloba trabalhadores tanto operacionais como de gerência, ou<br />
seja, indivíduos sem nenhuma qualificação e outros predicados. Já os gestores são todos qualificados e se<br />
encontram em funções de status dentro da organização. Eis alguns trechos de <strong>entre</strong>vista que exemplificam tal<br />
situação:<br />
Eu me sinto bem. Me formei, fui enquadrado. Me sinto bem, muito bem na empresa. Muito bem<br />
(TS7).<br />
Como profissional, eu diria que me sinto realizada, como profissional aqui dentro (GS1).<br />
De acordo com Tamayo (1996), basicamente, os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> são crenças sobre o<br />
que é bom e desejável para a organização, isto é, os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> são representados pelas metas<br />
enfatizadas pela organização, as quais orientam a sua ação e o comportamento dos seus trabalhadores.<br />
O que se percebe é que embora um indivíduo possa não concordar, pessoalmente, com os<br />
<strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> da Interprise, ele consegue compreender esses <strong>valores</strong> por serem da organização em<br />
que trabalha e se submete a eles devido a vários fatores. Reafirma-se que a Interprise, por se tratar de uma<br />
organização pública, oferece vantagens e benefícios e, principalmente, a estabilidade no emprego, que<br />
organizações privadas não oferecem. E isso faz com que uma grande parte dos seus trabalhadores se<br />
submetam aos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> da mesma. Ás vezes essa submissão aos <strong>valores</strong> da Interprise se torna<br />
tão profunda que se transforma numa alienação do trabalhador, conforme demonstrado em trecho de<br />
<strong>entre</strong>vista:<br />
Eu nunca me senti mal na Interprise. Sempre bem, procurando...porque é uma empresa boa de se<br />
trabalhar. Pessoas boas. Eu num falo da Interprise em momento nenhum. Acho que foi aqui que eu<br />
adquiri tudo, né? que eu tenho e então, tudo aqui na Interprise, pra mim tem seu valor, tem os seus<br />
detalhes, as suas minúcias, mas tudo assim...de bom, crescendo (TS8).
275<br />
Contudo, há indivíduos do G1 e G2 que continuam com a mesma percepção do início, ou seja,<br />
sentem-se desvalorizados, humilhados, desrespeitados e chocados atualmente com os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong><br />
da Interprise, alegando a interferência do poder político na organização e que em certos momentos precisam<br />
fingir que estão satisfeitos e realizados.<br />
Isso vem demonstrar que a Interprise, como organização pública, tem sido demandada de<br />
forma contundente a implantar mudanças de caráter substantivo em suas práticas, a fim de firmar um<br />
compromisso com os interesses do poder político, às vezes desviando de sua missão, como organização<br />
pública, que é a prática de um compromisso com a cidadania, a ampliação da qualidade e eficiência na<br />
prestação de serviços. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
[...] A Interprise é uma empresa que tem interferência política. Então, você não pode é...dar conta de<br />
segurar todo, de ser 100%, então você...mas dentro da medida do possível, você vai, você atua. Você<br />
mostra o seu trabalho, sua atuação, mas não é fácil não. Tem...as barreiras são pesadas. Você<br />
encontra muita coisa complicada aí pela frente. É...muita até muitas às vezes o próprio colega do seu<br />
lado (TS2).<br />
Gráfico 11 7 : Discurso dos trabalhadores da organização Interprise, ao serem perguntados: “Quais os<br />
<strong>valores</strong> que considera primordiais para sua vida?”<br />
2 2 4 1 1 5 3 3 4 5<br />
Honestidade<br />
Dignidade<br />
Integridade<br />
Humildade<br />
Auto-Estima<br />
Família<br />
Amor<br />
Amizade<br />
Boa Convivência<br />
Deus<br />
5<br />
Trabalho<br />
Realização Profissional<br />
Capacidade<br />
Vontade de Vencer<br />
Financeira<br />
4<br />
No gráfico 11, diante do núcleo induzido: “Quais os <strong>valores</strong> que considera primordiais para<br />
sua vida?”, do discurso dos trabalhadores emergiram três núcleos de pensamentos: Família, Honestidade e<br />
Trabalho. No núcleo de pensamento Família, os trabalhadores relataram que os <strong>valores</strong> primordiais em suas<br />
vidas são o amor, a amizade, a boa convivência e Deus. Em Honestidade, eles afirmaram que os <strong>valores</strong> que<br />
7 A mesma pergunta feita aos gestores não possibilitou a geração de gráfico, desenvolvendo-se, assim,<br />
apenas um parágrafo concernente às respostas emergidas.
276<br />
norteiam suas vidas são a dignidade, a integridade, a humildade e a auto-estima. Em Trabalho, disseram ser a<br />
realização profissional, a capacidade, a vontade de vencer e a questão financeira os <strong>valores</strong> primordiais em<br />
suas vidas.<br />
Outros trabalhadores relataram ser a união de família, amor, amizade, boa convivência e Deus<br />
com realização profissional, os <strong>valores</strong> que norteiam suas vidas. Da mesma forma outros afirmaram que tais<br />
<strong>valores</strong> são a junção de realização profissional com honestidade e humildade. Os trabalhadores expressam<br />
tais representatividades, por exemplo, por meio do trecho:<br />
“Família, é... Amor ao próximo, Trabalho e Honestidade. Acho que são os <strong>valores</strong> primordiais,<br />
certo?” (TS5)<br />
No discurso dos gestores quanto à questão “Quais os <strong>valores</strong> que considera primordiais para<br />
sua vida?”, alguns deles declararam que a honestidade juntamente com a sinceridade são os <strong>valores</strong> que<br />
priorizam suas vidas. Outros relataram que o respeito mais a valorização da vida são seus <strong>valores</strong><br />
primordiais. Um outro grupo ainda afirmou que prioriza a ética e a solidariedade.<br />
Nota-se que as respostas emergidas do núcleo induzido (Valores Primordiais na Vida) tanto do<br />
grupo G1 como do G2, são características de <strong>valores</strong> de Benevolência. Constata-se a presença forte desses<br />
<strong>valores</strong> na vida e nas relações estabelecidas dos <strong>entre</strong>vistados dos dois grupos. Esse achado de respostas<br />
típicas de <strong>valores</strong> de Benevolência confirma o que já foi analisado e discutido no gráfico 1, quando o núcleo<br />
induzido (Meus Valores Priorizam) fez emergir também <strong>valores</strong> de Benevolência, caracterizando uma meta<br />
motivacional voltada para o interesse e a preocupação com o bem-estar das pessoas.<br />
Diante da forte relação <strong>entre</strong> esses indivíduos e os <strong>valores</strong> de Benevolência, pode-se sentir que<br />
há uma busca por ações que expressem esses <strong>valores</strong> específicos, promovendo a meta central desse valor, ou<br />
seja, a motivação e a preservação do bem-estar das pessoas com as quais mantém contato freqüente. Eis um<br />
trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
Em primeiro lugar a capacidade assim de você gostar das pessoas próximas a você, né? A família e<br />
as pessoas próximas também é você. E estender isso também aos demais. E você cultivar aquela amizade.<br />
Ser honesto é também um valor muito importante, que eu acho que você sendo honesto com você mesmo e<br />
com as pessoas também (TS6).<br />
Eu acho que o respeito. Respeito pelo outro, pela opinião do outro, pelo sentimento do outro. Eu<br />
acho que isso aí é primordial (GS3).<br />
Segundo Rossi (2002), os <strong>valores</strong> existem em decorrência de uma dinâmica social em que as<br />
interações humanas acontecem. Assim, o valor surge da necessidade de orientação para guiar as ações,<br />
relações interpessoais e sobrevivência do grupo.<br />
Gráfico 12: Discurso dos trabalhadores da organização Interprise, ao serem perguntados: “Quais são<br />
as primeiras cinco palavras que lhe ocorrem quando você pensa nos <strong>valores</strong> da organização?”
277<br />
1 1 2 3 4<br />
1<br />
Falta<br />
Ética<br />
Profissionalismo<br />
Adm. Competente<br />
Valorização<br />
Valores<br />
1 Característica<br />
4<br />
2<br />
2 3 3 4 4<br />
Permite<br />
2 2<br />
Crescimento<br />
Boa Imagem<br />
Dos Trabalhadores<br />
3<br />
Seriedade<br />
Aptidão<br />
Institucionais<br />
Seguir Normas<br />
Bom relacionamento<br />
Trabalho<br />
Poder<br />
Manter<br />
2<br />
Patrimônio<br />
Capacidade Técnica<br />
Gráfico 13: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da<br />
organização Interprise, ao serem perguntados: “Quais são as primeiras cinco palavras que lhe ocorrem<br />
quando você pensa nos <strong>valores</strong> da organização?”<br />
VALORES DA ORGANIZAÇÃO PRIORIZAM<br />
1 1 2 2 3 3<br />
Rrecuso-me a<br />
Responder<br />
Disperso<br />
Setorizado
278<br />
3<br />
Respeito pelo cliente<br />
Honestidade<br />
Desenvolvimento<br />
Comunicação<br />
Amizade<br />
Presteza<br />
Saúde<br />
3<br />
Não são<br />
Arraigados<br />
3<br />
Cultura<br />
Difusa<br />
Têm alguns<br />
Liberdade de Expressão<br />
3<br />
No gráfico 12, diante do núcleo induzido: “Quais são as primeiras cinco palavras que lhe<br />
ocorrem quando você pensa nos <strong>valores</strong> da organização?”, do discurso dos trabalhadores, emergiram dois<br />
núcleos de pensamentos: Características e Valores. No núcleo de pensamento Características, alguns<br />
trabalhadores relataram que a falta de ética, a falta de profissionalismo, a falta de administração competente e<br />
a falta de valorização compõem algumas características da organização. Em contraposição, relataram também<br />
que outras características da organização permitem seu crescimento, boa imagem e mantém seu patrimônio e<br />
a capacidade técnica.<br />
No núcleo de pensamento Valores, os trabalhadores afirmaram que a organização possui<br />
<strong>valores</strong>, tais como: seguir normas, bom relacionamento, trabalho e poder. Outros manifestaram que os<br />
<strong>valores</strong> são deles próprios, como a seriedade e a aptidão.<br />
No gráfico 13, diante do núcleo induzido: “Quais são as primeiras cinco palavras que lhe<br />
ocorrem quando você pensa nos <strong>valores</strong> da organização?”, do discurso dos gestores emergiram três núcleos<br />
de pensamentos: Recuso-me a Responder, Respeito pelo Cliente e Disperso Setorizado. No primeiro, Recusome<br />
a Responder, os gestores se recusaram a responder tal pergunta. Em Respeito Pelo Cliente, os <strong>valores</strong> que<br />
priorizam a vida da organização, segundo relataram eles, são o respeito pelo cliente, a honestidade, o<br />
desenvolvimento, a comunicação, a amizade, a presteza e a saúde. Quanto a Disperso Setorizado, afirmaram<br />
que os <strong>valores</strong> da organização são dispersos, setorizados, não são arraigados na organização, que a cultura da<br />
organização é difusa, mas que, apesar de tudo, a organização tem alguns <strong>valores</strong> como liberdade de expressão<br />
e democracia.<br />
Na percepção do grupo G1, os trabalhadores expressam as prioridades axiológicas da<br />
organização Interprise de duas maneiras: manifestando que a organização possui características e, por outro<br />
lado, demonstrando que ela tem <strong>valores</strong>.<br />
Em relação às características da Interprise, expressas pelos seus trabalhadores, denota-se que<br />
elas se dividem em positivas e negativas.
279<br />
Quanto às características positivas, manifestadas pelos trabalhadores, são de uma organização<br />
que torna possível o crescimento profissional do trabalhador, gerando com isso uma boa imagem de si<br />
mesma; procura manter a capacidade técnica de seu quadro de pessoal, incluídos aí seus administradores<br />
públicos, conforme trechos de <strong>entre</strong>vista:<br />
Você pode subir na empresa, eu sei que eu tô no final de carreira, mas eu acho que quem ta entrando<br />
agora tem que pensar nisso, que a empresa tem um plano de carreira muito bom (TS7).<br />
Estrutura dentro da organização, administradores com força de vontade que saiba conduzir os<br />
colaboradores dessa organização pra não deixar eles caírem no descrédito, não ficarem<br />
desacreditados (TS3).<br />
Já quanto às características com aspectos negativos, percebe-se que a representação social<br />
expressa por esses trabalhadores é de uma organização que falta com a ética, ou seja, a conduta humana<br />
dentro dela é colocada em dúvida. Falta profissionalismo sendo uma administração feita por indivíduos com<br />
pouco conhecimento da história e da cultura da organização e, muitas vezes, sem o preparo técnico<br />
necessário, prevalecendo o predomínio de critérios políticos em detrimento da capacidade técnica ou<br />
administrativa dos nomeados. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
Precisava ser mais ética, mais profissional no sentido de não querer...de você ver que as pessoas só<br />
querem levar vantagem mesmo, ou então, de atender a situação política. Então, eu penso que a ética,<br />
o lado profissional, a visão do outro também seria, eu acho muito importante colocar muito no lugar<br />
do outro e administrar não só querendo levar vantagem (TS1).<br />
Shepherd e Valência (1996) afirmam que as situações que dificultam a administração de<br />
organizações públicas se resumem em serviços dos quais elas detêm o monopólio, o que propicia que se<br />
produza de maneira ineficiente; o controle dos eleitores sobre os políticos é normalmente imperfeito; e há<br />
dificuldade dos políticos em controlarem os trabalhadores e definirem e medirem com exatidão os resultados<br />
da administração pública.<br />
Com relação à percepção do grupo G1 quanto aos <strong>valores</strong> da Interprise, notou-se que, além dos<br />
<strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> de uma organização que busca seguir normas, há um bom relacionamento<br />
interpessoal <strong>entre</strong> os trabalhadores, que há um sentido do trabalho como atuação profissional por parte dos<br />
mesmos e uma organização investida de autoridade visando os fins do Estado, seu maior acionista; os<br />
trabalhadores também manifestaram que eles possuem <strong>valores</strong> que se correlacionam com os <strong>valores</strong> da<br />
Interprise tais como: seriedade e aptidão.<br />
Apreende-se que pode estar ocorrendo nessa organização uma fusão dos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong><br />
com os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, ou seja, não se consegue separar os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> dos trabalhadores dos<br />
<strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> da Interprise.<br />
Segundo Tamayo (1996), os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> não devem ser confundidos com os<br />
<strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> dos membros da organização. Os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> se diferenciam dos <strong>valores</strong><br />
<strong>organizacionais</strong> na medida em que aqueles são crenças de cada um dos indivíduos e estes são <strong>valores</strong> que,<br />
embora um indivíduo possa não concordar pessoalmente, tem consciência de ser um valor da organização<br />
onde trabalha.
280<br />
Segundo ainda o mesmo autor, seria falácia equacionar os <strong>valores</strong> da organização com as<br />
finalidades e metas dos seus membros. A organização possui uma estrutura de <strong>valores</strong> que não combina<br />
necessariamente com os <strong>valores</strong> de seus trabalhadores e que, inclusive, pode ser conflitivo, no todo ou em<br />
parte, com os deles. Eis um trecho que exemplifica tal situação:<br />
É que nós devemos lutar mais pelo...pela empresa, que faz parte da nossa vida. Isso aí que a gente<br />
tem que...a gente já...colocar politicamente, né? aí, né? é difícil, mas...a gente...o que eu penso dos<br />
<strong>valores</strong> dela é que ela é muito importante pra gente, pra nossos <strong>valores</strong> (TS11).<br />
Quanto à percepção que o grupo G2 teve em relação aos <strong>valores</strong> da Interprise, houve gestores<br />
que se recusaram a relatar quais seriam esses <strong>valores</strong>. O que se apreendeu por meio da <strong>entre</strong>vista com eles foi<br />
um sentimento de injustiça e ações não tão éticas, que fazem parte do dia-a-dia da organização.<br />
Dejours (1992, p.150) afirma que “haveria no silêncio de um comentário uma postura tão<br />
ativa e específica quanto na sua presença.” Em outras palavras, parece que falar dos <strong>valores</strong> da Interprise é<br />
ter de ocultar uma contradição existente dentro da organização em relação a esses <strong>valores</strong> e sua execução por<br />
ela.<br />
Outros, porém, manifestaram que a Interprise prioriza o respeito pelo cliente, a honestidade, o<br />
desenvolvimento, a comunicação, a amizade, a presteza e a saúde.<br />
O que se percebe é que a maioria desses <strong>valores</strong> são característicos de conservação.<br />
Tamayo (1996) afirma que os <strong>valores</strong> de conservação enfatizam a manutenção do status quo na<br />
organização, da interdição de comportamentos que possam perturbar as normas e as tradições da organização.<br />
São organizações onde a iniciativa e a criatividade dos trabalhadores não são promovidas, porque a ênfase é<br />
dada às tradições e à conservação do status quo, aos caminhos e às soluções já conhecidas e testadas pela<br />
organização no passado.<br />
A Interprise, por se tratar de uma organização pública com suas normas e procedimentos<br />
engessados pela burocracia, revela, com seus <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, embora se traduza apenas uma visão<br />
parcial da cultura organizacional, <strong>valores</strong> de conservação, uma vez que por trabalhar com a saúde da<br />
população, transmitir honestidade, limpeza, segurança e prestígio é essencial para o desenvolvimento de seu<br />
trabalho.<br />
Por outro lado, houve opiniões do grupo G2 de que a Interprise, por ser uma organização<br />
bastante hierarquizada, os seus <strong>valores</strong> estão também setorizados e, por isso, esses <strong>valores</strong> não são<br />
organizados, ou seja, não são <strong>valores</strong> estabelecidos, enraizados. Isso porque a Interprise possui uma<br />
rotatividade em sua diretoria, de quatro em quatro anos, e que acompanha a mudança de governo no Estado<br />
de Goiás, por ser uma organização pública. Cada diretoria que toma posse na organização modifica seus<br />
objetivos e metas, atingindo de forma indireta os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>. O resultado disso é uma cultura<br />
difusa, onde se convive com características e não com <strong>valores</strong> diferentes em cada gestão. Alguns <strong>valores</strong>,<br />
porém, ela consegue manter em sua cultura, como a liberdade de expressão e a democracia. Eis um trecho de<br />
<strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
Eu não consigo definir a Interprise por seus <strong>valores</strong>. Porque eu acho que é...é setorizado. Se você<br />
pegar por unidades, tem características daquela unidade que não tem nas outras. Essa empresa ainda<br />
tá com uma cultura muito difusa, não tem ainda <strong>valores</strong> arraigados. [...] A Interprise ela tem
281<br />
características, ela não tem <strong>valores</strong>. Ela tanto não tem valor, que se amanhã chegar uma diretoria<br />
ditatorial, ela vai sobreviver e a casa também. Não vai ter conflito. Por quê? Porque esse valor não<br />
tá arraigado na instituição. Então, esse é o perigo da instituição. Qualquer um que chega, pode impor<br />
determinados comportamentos e a casa não reage (GS4).<br />
No caso da organização Interprise e a identificação com seus <strong>valores</strong>, por parte dos<br />
trabalhadores, a cada gestão tem-se uma expectativa quanto à interferência nesses mesmos <strong>valores</strong>, por<br />
mudanças nos objetivos e metas da organização. Isso pressupõe que os trabalhadores precisam fazer um<br />
esforço muito grande para que em cada gestão se adaptem às normas por ela estabelecida.<br />
Para Heloani (1996, p.98) “a forma de identificação com os <strong>valores</strong> da organização cumpre<br />
importante papel para reafirmar as instâncias de poder. Essa forma transfere o processo de identificação<br />
<strong>entre</strong> as pessoas para a identificação com a organização.”<br />
Gráfico 14: Discurso dos trabalhadores da organização Interprise, ao serem perguntados: “Você<br />
considera que os seus <strong>valores</strong> e os <strong>valores</strong> da organização combinam? Por que?”<br />
6<br />
6 4 4 5<br />
Sim<br />
5 5<br />
Parcialmente<br />
4<br />
1 2 3 1 2 3<br />
3 2 4<br />
5 1<br />
6 Hierarquia Vence 2<br />
Conflitos<br />
3<br />
Futuro Melhor<br />
Objetivos Comuns<br />
2<br />
Política<br />
Valorização<br />
4<br />
Não<br />
3 2 4<br />
Opostos<br />
Técnica<br />
3<br />
Ajustar<br />
Pensamento<br />
Ação<br />
Gráfico 15: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da<br />
organização Interprise, ao serem perguntados:“Você considera que os seus <strong>valores</strong> e os <strong>valores</strong> da<br />
organização combinam? Por que?”
282<br />
VALORES INDIVIDUAIS E ORGANIZACIONAIS SÃO CONGRUENTES<br />
3 3 4 1 1 4 2 2<br />
Não<br />
Sim<br />
Nem Sempre<br />
3 1 2<br />
4<br />
Caso<br />
Contrário,<br />
Estaria Mal<br />
Divergentes<br />
com os da<br />
Diretoria<br />
Conflitantes<br />
São confusos<br />
2<br />
Nem os<br />
trabalhadores<br />
aceitam<br />
Cúpula Exige<br />
Ética sem<br />
Praticá-la<br />
4<br />
No gráfico 14, diante do núcleo induzido: “Você considera que os seus <strong>valores</strong> e os <strong>valores</strong> da<br />
organização combinam? Por quê?”, do discurso dos trabalhadores emergiram três núcleos de pensamentos:<br />
Não, Parcialmente e Sim. No núcleo de pensamento Não, os trabalhadores afirmaram que os <strong>valores</strong><br />
<strong>individuais</strong> e <strong>organizacionais</strong> não são congruentes, porque a hierarquia da organização sempre vence, há<br />
conflitos, a política interfere especificamente na capacidade técnica da organização, que se torna divergente<br />
e, em razão disso, há necessidade de fazer alguns ajustes. No núcleo de pensamento Parcialmente, os<br />
trabalhadores afirmaram ser parcial a congruência <strong>entre</strong> os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e <strong>organizacionais</strong>, pois<br />
pensamento e ação são opostos, gerando conflitos dentro da organização. A compatibilidade é parcial, porque<br />
não existe uma valorização plena do trabalhador dentro da organização. No núcleo de pensamento Sim, os<br />
trabalhadores relataram que existe uma congruência <strong>entre</strong> os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e <strong>organizacionais</strong>. Essa<br />
compatibilidade existe em virtude de possuírem objetivos comuns e, em conjunto, terem uma visão de um<br />
futuro melhor para ambos.<br />
No gráfico 15, diante do núcleo induzido: “Você considera que os seus <strong>valores</strong> e os <strong>valores</strong> da<br />
organização combinam? Por quê?”, do discurso dos gestores emergiram três núcleos de pensamentos: Nem<br />
Sempre, Não e Sim. No núcleo de pensamento Nem Sempre, os gestores declararam que nem sempre os seus<br />
<strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e os <strong>valores</strong> da organização são congruentes, porque divergem com os <strong>valores</strong> dos
283<br />
dirigentes da organização. No núcleo de pensamento Não, os gestores relataram que não são congruentes os<br />
seus <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> com os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, porque os <strong>valores</strong> da organização são confusos, nem<br />
os trabalhadores os aceitam; são conflitantes e a cúpula da organização se torna contraditória exigindo que se<br />
pratique a ética sem ela própria praticá-la. No núcleo de pensamento Sim, os gestores afirmaram que os<br />
<strong>valores</strong> da organização combinam com os seus <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>, porque, caso contrário, ficariam mal.<br />
Nota-se que a percepção que os grupos G1 e G2 tiveram quanto à congruência <strong>entre</strong> os <strong>valores</strong><br />
<strong>individuais</strong> e os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> foram no sentido de afirmar que há uma identificação <strong>entre</strong> eles.<br />
Contudo, alguns afirmaram que essa identificação não é total, mas parcial. Porém, há também uma<br />
divergência <strong>entre</strong> os mesmos.<br />
Em relação aos que afirmaram existir uma divergência <strong>entre</strong> os seus <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e os<br />
<strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, alegaram que o poder existe na hierarquia da organização, pois a Interprise sempre<br />
consegue sobrepor os seus <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> aos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> dos trabalhadores, conforme já<br />
analisado e discutido nos gráficos 1 e 2. E também, como já analisado e discutido nos gráficos 12 e 13, a cada<br />
gestão na Interprise a cúpula da organização modifica normas, prioridades e procedimentos que, de uma<br />
forma indireta, atingem os <strong>valores</strong> da organização, conforme identificados pelos trabalhadores na gestão<br />
passada. Isso vem demonstrar o poder que vem de fora da organização e é exercido em sua hierarquia. Há<br />
também divergência <strong>entre</strong> os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e <strong>organizacionais</strong>, quanto à interferência da política na<br />
organização, causando conflito <strong>entre</strong> tais <strong>valores</strong>. Isso porque a intervenção política, quando acontece, tenta<br />
conduzir as atividades da organização a um fim desejado, ou desviá-las de um fim não desejado, causando<br />
frustração aos trabalhadores, além de conflito, porque a cúpula da Interprise exige uma ética dentro da<br />
organização, como valor, sem praticá-la. Ou seja, os dirigentes da organização não praticam o que é prescrito<br />
e ensinado, deixando os <strong>valores</strong> confusos e fazendo com que os trabalhadores não acreditem neles. Eis<br />
trechos de <strong>entre</strong>vistas que exemplificam tais situações:<br />
[...] Embora tenha muita coisa que, às vezes, tenha uma certa determinação hierárquica, que eu vejo<br />
que poderia relevar, mas, como eu digo, é... existe uma hierarquia, sou subordinada, muitas vezes eu<br />
entro até em conflito, hierárquico mesmo (TS1).<br />
[...] A empresa gira em torno político também, ela tem seus interesses políticos, então, não dá para<br />
você focar muito dentro dessa organização para saber qual que é o seu interesse, o interesse da<br />
empresa em você e o seu interesse na empresa. [...] Agora, a empresa, ela tem essas condições todas,<br />
porque é uma empresa que... para o mercado é uma empresa que envolve ser humano, mas a política<br />
tem hora que vem aos pouquinhos e estraga essa fatia aí, vai tirando as fatias (TS3).<br />
São conflitantes. Porque, por exemplo, exigir das pessoas que estão numa organização, que de<br />
alguma forma ou de outra, tem ingerência política muito grande, exigir dessas pessoas que elas<br />
tenham comportamento ético, é no mínimo presunção, no mínimo preciosismo (GS4).<br />
A Interprise não tem esses <strong>valores</strong> estabelecidos, os <strong>valores</strong> da Interprise como a gente colocou<br />
dentro da política da qualidade “A Interprise somos nós” é... justiça, lealdade, liberdade de<br />
expressão, a gente colocou mas nem o próprio pessoal da Interprise aceita aquilo como sendo uma<br />
coisa, né? Harmonia, né? é... treinamento para o desenvolvimento, nem o pessoal da Interprise não<br />
acredita, né? “Ah! Isso não existe, aqui oh! Tá falando em justiça” quer dizer, houve injustiça, não<br />
sei o que, né? (GS2).
284<br />
Esses discursos revelam a presença de uma grande contradição da organização, em relação ao<br />
que é transmitido pela socialização organizacional, com as práticas desenvolvidas. Essa contradição<br />
percebida pelos trabalhadores e gestores deixa-os em uma situação de conflito no momento de decisões. De<br />
um lado são estimulados pelos conteúdos e idéias transmitidos na socialização organizacional, de outro são<br />
punidos por agirem conforme o ensinado.<br />
De acordo com Pagès (1993), esse é um jogo que as organizações praticam para garantir a<br />
manutenção da coerência do sistema. Às vezes, os trabalhadores são pressionados a transgredirem as regras<br />
em favor do próprio interesse da organização, porém, são punidos. Assim, tem-se a manutenção das regras<br />
em posição de centralidade. As mesmas situações que permitem aos trabalhadores exercer sua autonomia são<br />
as mesmas que transmitem a eles que não estão “cobertos”. Os trabalhadores têm o sentimento de afrontar a<br />
organização ao mesmo tempo em que a servem.<br />
Em relação à percepção dos grupos G1 e G2 de que esses <strong>valores</strong> são congruentes, manifestam<br />
suas posições declarando que tanto os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> como <strong>organizacionais</strong> têm objetivos comuns e<br />
buscam um futuro melhor tanto para os trabalhadores como para a organização. E, caso contrário, se esses<br />
mesmos <strong>valores</strong> fossem divergentes, eles se sentiriam mal.<br />
É interessante comentar que a diferença <strong>entre</strong> aqueles trabalhadores que afirmam haver<br />
divergências <strong>entre</strong> os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> e aqueles que relatam haver<br />
convergência <strong>entre</strong> esses mesmos <strong>valores</strong>, sinaliza o nível de socialização organizacional em que se<br />
encontram. Pressupõe-se que os trabalhadores aos quais os <strong>valores</strong> são contraditórios, são trabalhadores com<br />
pouco tempo de serviço na organização, demonstrando que ainda predominam seus <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>. Já os<br />
trabalhadores que consideram que esses <strong>valores</strong> são congruentes, ou seja, as divergências são menos<br />
ressaltadas, são trabalhadores com mais tempo de serviço na organização, portanto, estão em estágio mais<br />
avançado do processo de socialização organizacional, ou se conformaram, isto é, optaram pela submissão a<br />
eles.<br />
A adesão ao sistema de <strong>valores</strong> é feita, principalmente, por meio das técnicas de socialização e<br />
integração dos trabalhadores, em que os mesmos são submetidos a rituais, cerimônias, treinamentos e<br />
acompanhamentos, com o objetivo de contribuir para a manutenção desses <strong>valores</strong>, conforme a análise de<br />
Fleury et al. (1996, p.26): “Quando o gerenciamento da cultura implica a manutenção dos padrões vigentes,<br />
as possibilidades de planejamento e controle dos elementos simbólicos reforçadores do tecido cultural são<br />
maiores: investem-se assim em desenvolver os ritos, os rituais ou as práticas <strong>organizacionais</strong> [...]<br />
mantenedoras dos <strong>valores</strong> básicos da organização.”<br />
Quanto àqueles, tanto do grupo G1 como do G2, que tiveram uma visão parcial da congruência<br />
dos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e <strong>organizacionais</strong>, partem do pressuposto de que, às vezes, o pensamento e as ações<br />
da organização são opostos aos dos trabalhadores, gerando um conflito. Há momentos em que a valorização<br />
do trabalhador que a organização tenta transmitir não é condizente com aquela que os trabalhadores buscam,<br />
demonstrando, com isso, uma divergência com os <strong>valores</strong> da cúpula que administra a organização. Eis<br />
trechos de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tais situações:<br />
Nem sempre. Às vezes você fica um pouco desmotivado, porque, às vezes, você se sente<br />
desvalorizado (TS9).
285<br />
Em parte sim. Porque da minha parte eu tenho...o que eu quero e da empresa falta um<br />
pouco...tirando a parte que...vem de fora, né? que a gente quer, quer fazer e não tem condições de<br />
fazer, então, aí falta um pouco, né? (TS11).<br />
Percebe-se que mesmo esses trabalhadores e gestores, concordando parcialmente que seus<br />
<strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> são congruentes com os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, cumprem o que lhes é ordenado por<br />
superiores hierárquicos. Isso demonstra que os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> podem diferir dos <strong>individuais</strong>, sem<br />
que isso impeça o que se deve praticar na organização. No caso de haver divergência <strong>entre</strong> os <strong>valores</strong><br />
<strong>individuais</strong> e <strong>organizacionais</strong>, esses se sobrepõem aos <strong>individuais</strong>, em nome das ordens a serem cumpridas.<br />
Gráfico 16: Discurso dos trabalhadores da organização Interprise, ao serem perguntados: “Quando no<br />
desempenho de suas funções, você precisa fazer algo que coincide com os seus <strong>valores</strong>, o que acontece<br />
com você?”<br />
3 2 1 1 2<br />
Estranho<br />
raro<br />
Empresa<br />
1 1<br />
Porque<br />
2 2<br />
1<br />
Coage<br />
2<br />
2<br />
Não<br />
Realizado<br />
satisfeito<br />
gratificado<br />
confortável<br />
alegre<br />
3 3 3<br />
Trabalho é<br />
bom<br />
Gráfico 17: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da<br />
organização Interprise, ao serem perguntados: “Quando no desempenho de suas funções, você precisa<br />
fazer algo que coincide com os seus <strong>valores</strong>, o que acontece com você?”<br />
QUANDO TRABALHO COINCIDE COM OS SEUS VALORES, COMO<br />
REAGE?<br />
1 1 3 4 2 2<br />
3 4<br />
Tranqüilo
286<br />
Bem<br />
4 2<br />
3<br />
Nem tudo é<br />
perfeito<br />
Combina<br />
comigo<br />
4<br />
Forma de se<br />
colocar,<br />
postura<br />
Comportamento<br />
No gráfico 16, diante do núcleo induzido: ético “Quando no desempenho de suas funções, você<br />
precisa fazer algo que coincide com os seus <strong>valores</strong>, o que acontece com você?”, do discurso dos<br />
trabalhadores emergiram dois núcleos de pensamentos: Estranho e Realizado. No primeiro – Estranho, alguns<br />
trabalhadores declararam que é estranho, raramente isso acontece, porque a organização coage os<br />
trabalhadores, deixando grande margem para que existam conflitos de <strong>valores</strong> nela. Segundo – Realizado, os<br />
trabalhadores relataram que se sentem satisfeitos, gratificados, confortáveis e alegres, pois a organização não<br />
coage o trabalhador e consideram que o trabalho é bom.<br />
No gráfico 17, diante do núcleo induzido: “Quando no desempenho de suas funções, você<br />
precisa fazer algo que coincide com os seus <strong>valores</strong>, o que acontece com você?”, do discurso dos gestores<br />
emergiram dois núcleos de pensamentos: Bem e Tranqüilo. No núcleo de pensamento Bem, alguns gestores<br />
declararam que se sentem bem, afinal nem tudo é perfeito, que combinam com eles, porque essa coincidência<br />
de <strong>valores</strong> gera um comportamento ético. No núcleo de pensamento Tranqüilo, os gestores afirmaram que se<br />
sentem tranqüilos, porque tudo depende da forma de se colocar, de postura.<br />
Percebe-se que a coincidência <strong>entre</strong> as atividades desempenhadas e os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>,<br />
tanto do grupo G1 quanto do grupo G2, praticamente transmite um sentimento de conforto para ambos os<br />
grupos. Nota-se o quanto se sentem realizados, gratificados, tendo o trabalho como bom. Manifestam que é a<br />
maneira de se colocarem frente ao seu trabalho, por meio de um comportamento ético. Isso demonstra uma<br />
relação de prazer que esses trabalhadores e gestores possuem com seu trabalho, sendo manifestado por meio<br />
do sentido e do significado que o trabalho tem para cada um e pela possibilidade de realização pessoal,<br />
conforme trechos de <strong>entre</strong>vista:<br />
Me sinto bem, me sinto gratificado (TS3).<br />
Eu me sinto bem, sinto bem... e... sinto que estou fazendo aquilo que deveria ser feito (TS8).<br />
Me sinto bem. Muito bem, porque a gente fazer aquilo que gosta combinando com aquilo que deve ser<br />
feito é ótimo, me sinto bem (TS7).<br />
Segundo Guareschi (1993, p.47), “o trabalho é a ação transformadora, consciente e desejante<br />
que o trabalhador exerce sobre a natureza (...) O trabalhador é o sujeito do trabalho.” Em outras palavras,<br />
são as possibilidades de trocar experiências com os colegas e de entender o trabalho realizado como um ato<br />
consciente, que dão ao indivíduo a noção de criação e o fazem identificar-se como trabalhador.<br />
A satisfação no trabalho é resultado da combinação dos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> do trabalhador com<br />
suas atividades na organização. Nessa relação, o trabalhador, além de ganhar, também constrói um sentido
287<br />
para esse trabalho, estabelecendo-se um status social que não se restringe ao ambiente físico do trabalho, mas<br />
se estende para sua vida pessoal e familiar.<br />
Por outro lado, constata-se que, por trás dessa coincidência <strong>entre</strong> os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> dos<br />
trabalhadores com suas atividades desempenhadas na organização, têm-se um conflito subjacente sempre que<br />
eles desempenham suas funções nos momentos em que seus <strong>valores</strong> não são colocados em prática no<br />
desempenho de suas tarefas na Interprise. Nota-se que esses momentos conflitantes são muito maiores do que<br />
aqueles quando há uma certa coincidência <strong>entre</strong> os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e o trabalho desempenhado pelos<br />
trabalhadores. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
[...] Até que enfim algo está batendo, tá... acho que é realização mesmo, então, até que enfim<br />
apareceu uma coisa que... é aquilo que eu penso, aquilo que eu prego (TS1).<br />
Fica nítida a existência do conflito na Interprise, mas percebe-se, pelo discurso, que os<br />
trabalhadores preferem seguir a orientação da organização durante o desempenho de suas atividades, ou seja,<br />
submetem-se às normas para não serem punidos. Por considerarem legítimos representantes da Interprise e<br />
por dependerem dela para sua sobrevivência, entendem que devem agir de acordo com os <strong>valores</strong> por ela<br />
adotados. Segundo Pagès (1993), pelo fato de a organização oferecer satisfações materiais, ideológicas e<br />
espirituais, os trabalhadores se reconhecem nela a ponto de identificarem-se com ela. Essas satisfações são<br />
inerentes ao sistema de <strong>valores</strong> e crenças que a organização propõe e que constituem um quadro de referência<br />
coerente e ambicioso, uma concepção de mundo e uma moral de ação.<br />
GRÁFICO 18: DISCURSO DOS TRABALHADORES DA ORGANIZAÇÃO INTERPRISE, AO SEREM<br />
PERGUNTADOS: “QUANDO NO DESEMPENHO DE SUAS FUNÇÕES, VOCÊ PRECISA FAZER ALGO<br />
QUE NÃO COINCIDE COM OS SEUS VALORES, O QUE ACONTECE COM VOCÊ?”<br />
3 4 3 2 4 1 1
288<br />
Discute, Fala<br />
Preenche Relatório<br />
Recusa<br />
4<br />
3<br />
Resiste<br />
3<br />
4 4<br />
4<br />
Fazer<br />
Assinar<br />
Ação<br />
2 2<br />
Submete<br />
2<br />
Cumpre Ordens<br />
Sentimento<br />
1<br />
Agoniado<br />
Frustrado<br />
Sente Mal<br />
Arrasado<br />
Medo<br />
Insegurança<br />
Gráfico 19: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da<br />
organização Interprise, ao serem perguntados: “Quando no desempenho de suas funções, você precisa<br />
fazer algo que não coincide com os seus <strong>valores</strong>, o que acontece com você?”<br />
QUANDO TRABALHO DIVERGE DE SEUS VALORES, COMO<br />
REAGE?<br />
1 1 2 2 3 3 4 4<br />
Se Puder, não<br />
Faz<br />
3<br />
Mal<br />
Todos os dias<br />
4<br />
Contesta<br />
Conflito<br />
Ultrajado<br />
2 3<br />
Acata, dá<br />
Aceita, desde<br />
Solução, mas é<br />
que Prevaleça<br />
Contrário a<br />
Decisão<br />
Honestidade,<br />
Ação<br />
Superior<br />
Respeito<br />
Hierárquico<br />
No gráfico 18, diante do núcleo induzido: “Quando no desempenho de suas funções, você<br />
precisa fazer algo que não coincide com os seus <strong>valores</strong>, o que acontece com você?”, do discurso dos<br />
4
289<br />
trabalhadores emergiram dois núcleos de pensamento: Sentimento e Ação. No núcleo de pensamento<br />
Sentimento, os trabalhadores declararam sentirem-se, diante de uma situação dessas, agoniados, frustrados,<br />
mal, arrasados, com medo e inseguros. No núcleo de pensamento Ação, eles relataram que quando se<br />
deparam com uma situação assim, submetem-se e cumprem ordens. Outros afirmaram que suas reações<br />
frente a uma situação dessas é de recusa, resistência, discussão, preenchimento de relatórios e assinatura de<br />
documentos contra a sua vontade.<br />
No gráfico 19, diante do núcleo induzido: “Quando no desempenho de suas funções, você<br />
precisa fazer algo que não coincide com os seus <strong>valores</strong>, o que acontece com você?”, do discurso dos<br />
gestores emergiram quatro núcleos de pensamentos: Se Puder Não Faz, Contesta, Mal e Todos os Dias. Em<br />
Se Puder Não Faz, os gestores afirmaram que se puder eles não fazem a atividade designada a eles. Em<br />
Contesta, os gestores relataram que contestam tal tarefa a ser desempenhada por eles, mas aceitam fazer<br />
desde que prevaleça a honestidade e o respeito. No núcleo de pensamento Mal, eles declararam que se<br />
sentem mal, em conflito, que até acatam a ordem para o desempenho da atividade, mas deixam claro que é<br />
contrário à ação. No núcleo Todos os Dias, eles manifestaram, em seus discursos, que todos os dias<br />
acontecem essas divergências <strong>entre</strong> as funções desempenhadas e os seus <strong>valores</strong>. Com isso sentem-se<br />
ultrajados e sempre levam para seu superior hierárquico a decisão de acatar ou não a ordem de desempenhar<br />
a atividade.<br />
Apreende-se que tanto o grupo G1 quanto o grupo G2, frente às divergências <strong>entre</strong> seus <strong>valores</strong><br />
<strong>individuais</strong> e as atividades realizadas na Interprise, relataram comportamentos variados. Afirmaram que se<br />
sentem mal, inseguros, com medo e em conflito quando passam por esses momentos. Outros, que se<br />
submetem à ação e cumprem as ordens determinadas. Às vezes, resistem, discutem, recusam-se a fazer, até<br />
mesmo a assinar documentos que os comprometam, mas o sentimento de submissão se sobrepõe e eles<br />
cumprem o que a organização ordena. O interessante que se nota no discurso dos gestores é que são fatos que<br />
acontecem diariamente nessa organização. Há casos em que é solicitado que se crie uma unidade dentro de<br />
um setor somente com o intuito de pagar gratificação ao indivíduo contemplado pelo jogo político da<br />
organização. Por ser uma organização pública, a Interprise serve-se dessa estratégia para atender a<br />
determinados indivíduos. Eis alguns trechos de <strong>entre</strong>vista que contempla tais situações:<br />
Olha, eu me sinto mal (TS5).<br />
Faço porque sou obrigada, né? Mas...fico realmente arrasada, né? (TS6).<br />
[...] se eles querem assim, tudo bem, mas, eu não concordo com isso, mas, já que é pra ser feito<br />
desta maneira, aí eu fico chateada também, fico mesmo. Mas já que é pra fazer. E quando tem, é<br />
como eu, quando tem jeito deu não assinar aquilo, eu não assino não, sabe? Porque... eu não penso<br />
daquele jeito, não é aquilo que eu acho. Agora, quando não tem, com quanto não me prejudique lá<br />
na frente, aí eu assino, mas eu deixo muito claro que não penso assim e não é isso que eu quero<br />
(TS1).<br />
Ih! Todos os dias. Como eu sou gerente de [...] muitas solicitações são feitas em nome das pessoas e<br />
não dos processos, ou seja, “não, [...] é... você teria que criar uma unidade [...], vai ter uma<br />
gratificação, porque nós precisamos atender determinadas pessoas” (GS4).<br />
Segundo Tamayo e Gondim (1996), os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> podem ser analisados em dois<br />
níveis distintos da percepção ou da concepção da organização: real e ideal. O nível real refere-se aos <strong>valores</strong>
290<br />
existentes concretamente na organização, segundo a percepção dos trabalhadores. Valores reais guiam a vida<br />
organizacional, especialmente no que diz respeito a suas decisões e à definição e aplicação de políticas. O<br />
nível axiológico ideal refere-se aos <strong>valores</strong> que os mesmos trabalhadores crêem que a organização deve ou<br />
deveria seguir.<br />
Pressupõe-se que esse conflito que os trabalhadores e gestores têm vivido na Interprise, no<br />
momento em que suas práticas diárias divergem de seus <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>, possa estar ligado a <strong>valores</strong><br />
ideais que gostariam que existissem na organização e não a <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> reais que hoje orientam a<br />
vida da Interprise. Torna-se difícil para eles lidar com tal situação, uma vez que a Interprise, como<br />
organização pública, muda sua diretoria a cada pleito eleitoral para governador e, juntamente com isso, muda<br />
também as metas, prioridades e procedimentos da organização, atingindo de maneira indireta, os <strong>valores</strong> que<br />
guiam a Interprise. A cada gestão fica a expectativa de como será que a Interprise será administrada, ou seja,<br />
a tensão do conflito <strong>entre</strong> as atividades desenvolvidas pelos trabalhadores e gestores e seus <strong>valores</strong><br />
<strong>individuais</strong> permanecerá mesmo, diminuirá ou aumentará mais ainda.<br />
Segundo Vaitsman (2001), o sentimento de iniqüidade e injustiça, bem como a incongruência<br />
<strong>entre</strong> o discurso e as práticas oficiais produzam frustração em relação aos projetos pessoais e profissionais,<br />
causando a desmotivação e dificultando a formação de expectativas positivas em relação às possibilidades de<br />
mudança.<br />
O que se percebe é que esses trabalhadores e gestores, na maioria das vezes, submetem-se<br />
àquilo que vão contra seus <strong>valores</strong>, porque as vantagens que recebem da Interprise como, por exemplo,<br />
estabilidade no emprego, salário, plano de saúde, fundo de pensão, d<strong>entre</strong> outras, sobrepõem-se aos seus<br />
<strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> no momento de tomar a decisão quanto a fazer ou não fazer determinada tarefa, o que<br />
causa um grande conflito. Preferem passar pelo sofrimento de vivenciar um conflito, a abrir mão de<br />
privilégios que dificilmente encontrarão em outra organização.<br />
De acordo com Vaitsman (2001), o setor público é percebido como um terreno onde<br />
predominam o “apadrinhamento político”, as relações de favorecimento pessoal e os privilégios que<br />
contornam as normas formalmente instituídas. Ou seja, não existe a crença de que a competência e o<br />
desempenho constituam sempre os critérios decisivos para as melhores posições no setor público, mas a de<br />
que, quando tais critérios existem, devem vir combinados com as “relações” certas.<br />
Gráfico 20: Discurso dos trabalhadores da organização Interprise, ao serem perguntados: “Quais são os<br />
<strong>valores</strong> que você acha que norteiam a organização?”<br />
2 1 1 5 5<br />
4 6 4<br />
2<br />
Trabalhadores<br />
Promover<br />
3 3 4 4<br />
População<br />
1
291<br />
6<br />
Saúde<br />
1<br />
Serviços<br />
2<br />
Ocupacional<br />
5 5 5<br />
Vida<br />
Qualidade<br />
2 6<br />
5<br />
Limpa e<br />
Transparente<br />
Tratamento<br />
Água<br />
Esgoto<br />
Seriedade<br />
Valorização<br />
Crescimento<br />
Segurança<br />
Estabilidade<br />
6<br />
Política<br />
Gráfico 21: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da<br />
organização Interprise, ao serem perguntados: “Quais são os <strong>valores</strong> que você acha que norteiam a<br />
organização?”<br />
VALORES NORTEIAM ORGANIZAÇÃO<br />
1 1 2 3 2 3 4 4<br />
Transparência<br />
Respeito<br />
1 4<br />
Apesar de<br />
Antiga<br />
2<br />
Suas ações<br />
1<br />
Consumidor<br />
Natureza<br />
4<br />
Eles não são<br />
fortes, nem<br />
arraigados<br />
Trabalhadores<br />
2 3<br />
Sociedade<br />
Valorização<br />
Cúpula<br />
Administra<br />
como quer
292<br />
Atrapalha a<br />
Relação<br />
Prestação<br />
serviço/Cliente<br />
4<br />
4<br />
Nasce Grupo<br />
de Resistência<br />
No gráfico 20, diante do núcleo induzido: “Quais são os <strong>valores</strong> que você acha que norteiam a<br />
organização?”, do discurso dos trabalhadores emergiram seis núcleos de pensamentos: Saúde, Qualidade,<br />
Valorização, População, Promover e Limpa e transparente. Primeiro – Saúde, os trabalhadores declararam<br />
que é a saúde ocupacional dos trabalhadores os <strong>valores</strong> primordiais da organização. No segundo – Qualidade,<br />
relataram que é a qualidade de vida dos trabalhadores os <strong>valores</strong> primordiais da organização. Em<br />
Valorização, afirmaram que os <strong>valores</strong> que norteiam a organização é o crescimento, a segurança e a<br />
estabilidade. No núcleo População, eles declararam que o mais importante para a organização no que tange a<br />
seus <strong>valores</strong>, é promover a saúde da população. Quanto a Promover, relataram que proporcionar qualidade<br />
nos serviços de tratamento de água e esgoto para a população é o mais importante para a organização em<br />
termos de <strong>valores</strong>. E, por último, no núcleo de pensamento Limpa e Transparente, os trabalhadores<br />
afirmaram que os principais <strong>valores</strong> da organização é ser limpa e transparente, séria e política.<br />
No gráfico 21, diante do núcleo induzido: “Quais são os <strong>valores</strong> que você acha que norteiam a<br />
organização?”, do discurso dos gestores emergiram quatro núcleos de pensamentos: Transparência,<br />
Respeito, Valorização e Apesar de Antiga. No núcleo de pensamento Transparência, os gestores declararam<br />
que os <strong>valores</strong> que norteiam a organização é a transparência nas suas ações e nas dos trabalhadores. Em<br />
Respeito, relataram que o respeito ao consumidor, à natureza e à sociedade é o principal valor que a<br />
organização possui. Em Valorização, afirmaram ser a vida da organização orientada pela valorização que é<br />
dada aos trabalhadores. No núcleo Apesar de Antiga, eles manifestaram, em seus discursos, que apesar de a<br />
organização ser antiga os seus <strong>valores</strong> não são fortes e nem arraigados. A cúpula administra a organização<br />
como quer e, com isso, nasce o grupo de resistência àquilo que, de alguma forma, atrapalha a prestação de<br />
serviços ao cliente.<br />
Observa-se que uma parte da percepção, tanto do grupo G1 como do grupo G2, quanto aos<br />
<strong>valores</strong> que norteiam a Interprise, faz referência à saúde dos trabalhadores e da população, uma vez que a<br />
Interprise é uma organização pública que trabalha com a preservação da vida da população. É provável que<br />
esses <strong>valores</strong> sejam percebidos pelos trabalhadores e gestores pela vivência e experiência cotidianas em suas<br />
atividades na organização e também por serem <strong>valores</strong> centrais na vida dessa organização. Tais <strong>valores</strong> se<br />
tornam mais fortes por se tratar de uma organização pública que é referência na área que atua no Estado de<br />
Goiás, principalmente na cidade de Goiânia, e por já existir uma representação social pela sociedade a<br />
respeito de sua missão organizacional.<br />
Segundo Tamayo (1996), os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> são de grande relevância para a<br />
organização. Eles sustentam as atitudes, determinam a forma de julgar o comportamento organizacional e<br />
constituem em motivação para a ação.
293<br />
Por outro lado, há uma percepção, tanto pelo grupo G1 como pelo G2, de que a Interprise tem<br />
como princípios que a orientam a busca pela valorização do trabalhador, seu crescimento profissional e a<br />
vantagem, oferecida somente por organizações públicas, da estabilidade no emprego. Manifestam que se trata<br />
de uma organização que atua com transparência nas suas ações e com os trabalhadores. Percebe-se, porém,<br />
que essa percepção não é da totalidade de seus trabalhadores, gerando um paradoxo existente dentro da<br />
organização, até porque as organizações públicas nunca foram bem vistas pela população em geral, nas suas<br />
ações. Essa é uma visão bastante arraigada na sociedade. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal<br />
situação:<br />
[...] ainda existe muito isso na Interprise. Coação, nós já fomos coagidos, aí num processo aí, que<br />
nós tinha de hora extra, o pessoal foi todo coagido a desistir do processo. Na época, eu.... eu falei,<br />
inclusive, na televisão, que não deveria porque é... é... crime, coação era crime. E aí eu... aí eu<br />
envolvi toda a diretoria como culpada dessa coação (TS10).<br />
Schall (1997) afirma existir um conflito nas organizações públicas <strong>entre</strong> os trabalhadores e os<br />
indivíduos integrantes da cúpula, uma vez que estes últimos não pertencem ao quadro efetivo da organização<br />
e, portanto, possuem funções temporárias. Esse conflito pode gerar pouco empenho em relação aos<br />
procedimentos que vão contra interesses corporativos, ou seja, existe a consciência por parte dos<br />
trabalhadores de que a cúpula logo será substituída.<br />
Fica evidente também uma percepção, por parte do grupo G2, de que a Interprise, apesar de ser<br />
uma organização pública que atua no mercado goiano há mais de trinta anos, possui <strong>valores</strong>, mas não tão<br />
estabelecidos, enraizados, porque a cada gestão, uma nova equipe de administradores é escolhida para<br />
compor sua cúpula e responsabilizar-se por sua gestão, conforme já analisado e discutido nos gráficos 12, 13,<br />
18 e 19.<br />
O que se apreende disso é que elementos como cultura, interferências políticas,<br />
descontinuidade de processos, estabilidade funcional, procedimentos altamente burocratizados e sujeitos à<br />
legislação, podem adquirir vários significados, dependendo da situação ou do contexto no qual se insere, para<br />
cada gestão que se ocupa de administrar a Interprise, no sentido de estar impondo seus <strong>valores</strong> na<br />
organização.<br />
Gráfico 22: Discurso dos trabalhadores da organização Interprise, ao serem perguntados: “Você<br />
conhece o PQVT da Interprise? Como ficou sabendo dele?” e “Já participou de alguma atividade do<br />
PQVT? Qual? Como foi?”
294<br />
1 1 2 3 4<br />
3<br />
Conhece<br />
Soube<br />
1 2 4 2<br />
Avaliação<br />
Participa<br />
4 3 3 3 3 4<br />
Não<br />
Sim<br />
4 2 2 Esporadicamente 2 4 4 2<br />
3 3<br />
Porque<br />
3 2<br />
Falta<br />
3<br />
3<br />
Oportunidade<br />
Em sua<br />
Unidade<br />
4 Sempre 2 4 4 2<br />
Cartazes<br />
Boca-a-Boca<br />
Documentos<br />
Palestras<br />
Ginástica Laboral<br />
Fisioterapia<br />
2 4<br />
2 4<br />
Campanhas<br />
Muito Bom<br />
Relaxa<br />
Descontrai<br />
2 4<br />
Melhora<br />
2 4<br />
Obesidade<br />
Aids<br />
Diabetes<br />
Pressão Arterial<br />
Relacionamento<br />
Desempenho<br />
No gráfico 22, diante dos núcleos induzidos: “Você conhece o PQVT da Interprise? Como<br />
ficou sabendo dele?” e “Já participou de alguma atividade do PQVT? Qual? Como foi?”, do discurso dos<br />
trabalhadores emergiu apenas um núcleo de pensamento: Conhece. Nele, alguns trabalhadores disseram que<br />
não conhecem o programa. Outros declararam que o conhece, ficaram sabendo por cartazes, boca-a-boca,<br />
documentos e palestras, sendo que há um grupo que participa sempre, outro que participa esporadicamente de<br />
atividades, como ginástica laboral, fisioterapia e das campanhas de obesidade, aids, diabetes e pressão<br />
arterial, e um terceiro grupo que não participa por falta de oportunidade e porque falta implantar o programa<br />
em sua unidade. Os trabalhadores avaliam o programa como muito bom, pois relaxa, descontrai e melhora o<br />
relacionamento e o desempenho.<br />
Por meio do gráfico 22, nota-se que a grande parte dos trabalhadores que compõem o grupo G1<br />
conhece o Programa de Qualidade de Vida do Trabalhador desenvolvido pela Interprise. Teve conhecimento<br />
do PQVT por diversos meios de divulgação utilizados pela Interprise. Porém, o que se percebe é que existe<br />
um contingente de trabalhadores que não o conhecem, e outro que, apesar de conhecê-lo, não participa<br />
porque o programa não chega em suas unidades. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que demonstra tal situação:<br />
[...] conheço, mas a gente que tá afastado pra cá, na [...], eu não cheguei a ver isso aí não (TS7).
295<br />
A política do PQVT deveria ser ampliada para levar o Programa a todas as unidades da<br />
organização e não se concentrar somente em algumas unidades, uma vez que os trabalhadores dos setores<br />
onde o programa não chega são parte integrante da organização e não um módulo separado com políticas<br />
diferenciadas. Até porque, segundo consta em seu projeto, o PQVT da Interprise é claro quando afirma que<br />
sua finalidade é “informar e motivar os trabalhadores por meio de processos educativos, da necessidade de<br />
serem capazes de gerenciar seu estilo de vida, tornando-o mais saudável, feliz e produtivo, independente do<br />
meio que vivem ou atuam” (PROJETO PQVT DA INTERPRISE, 1994, p.1).<br />
De acordo com Lima (1994), na busca de humanizar as relações de trabalho, a QVT deve estar<br />
associada tanto à satisfação dos trabalhadores quanto ao desenvolvimento da organização, considerando a<br />
expectativa de que as pessoas serão mais produtivas quanto mais satisfeitas e envolvidas estiverem com o<br />
próprio trabalho. Os trabalhadores aqui são entendidos não apenas aqueles que executam atividades-meio,<br />
mas todos os trabalhadores que movem a organização.<br />
Entretanto, há os trabalhadores que conhecem o PQVT, mas se dividem em duas categorias:<br />
aqueles que participam sempre e aqueles que participam esporadicamente. Contudo, essas duas categorias,<br />
quando estão participando do programa, estão sempre envolvidas nas atividades de ginástica laboral,<br />
fisioterapia e nas campanhas desenvolvidas pela Interprise como: AIDS, diabetes, d<strong>entre</strong> outras.<br />
Nota-se que esses trabalhadores que participam do PQVT, mesmo que seja esporadicamente, e<br />
também aqueles cujo programa chega em suas unidades, buscam ter uma melhor qualidade de vida no<br />
trabalho, proporcionando condições favoráveis, imprescindíveis ao melhor desempenho e produtividade. Eis<br />
trechos de <strong>entre</strong>vista que exemplificam tais situações:<br />
Eu participo da ginástica laboral. [...] melhora seu relacionamento interpessoal é... de colegas é...<br />
muito bom. Você começa a ver o outro lado da pessoa fora da sala, fora do ambiente de trabalho,<br />
[...] faz bem pra mente, faz bem pro corpo, pra alma, entrosa as pessoas [...] você vai pra sala depois<br />
assim com outro ânimo (TS1).<br />
Ginástica laboral. Olha, satisfatório. Muito boa. Às vezes, é uma coisinha, detalhezinho tão pequeno<br />
que você faz de um a 5 ou 6 exercícios dentro de 3, 4 minutos, você se relaxa, você se sente bem,<br />
você se descontrai, fica mais à vontade. Quebra um pouquinho daquela tensão sua ali (TS3).<br />
Participo. [...] muito bem, muito gratificante. É... a gente se sente bem melhor, tem mais ânimo, é...<br />
mais disposição pra trabalhar e desenvolver mais o serviço (TS11).<br />
Vale ressaltar que a produtividade de uma organização não pode ter como parâmetro somente<br />
sua concentração nos estudos sobre os processos de trabalho e na tecnologia a ser aplicada. O fator humano é<br />
uma ferramenta relevante dentro desse processo e, portanto, deve ser dada a ele uma atenção toda especial. O<br />
PQVT é uma das estratégias utilizadas dentro das organizações quando se trata de um programa sério e não<br />
para “inglês ver”, no sentido de estar resgatando a valorização do trabalhador na organização.<br />
Gráfico 23: Discurso dos trabalhadores da organização Interprise, ao serem perguntados: “Na sua<br />
opinião, trabalhar em uma empresa que tenha PQVT faz alguma diferença? Qual?”
296<br />
1 2 3<br />
1<br />
Qual<br />
Sim<br />
2 3 2 2<br />
3 3<br />
1 2 1 3<br />
Melhora<br />
Mesmo<br />
Participar<br />
1 2<br />
No gráfico 23, diante do núcleo induzido: “Na sua opinião, trabalhar em uma organização<br />
que tenha PQVT faz alguma diferença? Qual?”, do discurso dos trabalhadores emergiu apenas um núcleo de<br />
pensamento: Sim. Nele os trabalhadores declararam que trabalhar em uma organização que tenha um<br />
programa de qualidade de vida no trabalho faz diferença, melhora os recursos humanos, a produtividade, a<br />
motivação e a comunicação, mas desde que o enfoque do programa esteja voltado para o trabalhador, mesmo<br />
não participando dele.<br />
Nota-se que para os trabalhadores da Interprise, trabalhar em uma organização que tenha<br />
PQVT faz toda diferença. Alegam que, mesmo sem participar do programa, um programa de qualidade de<br />
vida no trabalho traz a vantagem de melhorar a área de RH, a produtividade, a motivação e a comunicação<br />
dos trabalhadores, mas com uma ressalva: desde que o programa tenha o seu enfoque voltado para o<br />
trabalhador.<br />
sem<br />
Depreende-se que o PQVT desenvolvido pela Interprise faz com que seus trabalhadores sintam<br />
que se trata de um programa que faz a diferença, mas percebe-se que necessita de mais investimento por<br />
parte da organização no sentido de trazer melhores contribuições aos aspectos que possam ajudar o<br />
trabalhador a ter uma melhor qualidade de vida no trabalho; ações mais completas e que se estendam por toda<br />
a organização, atingindo todos os seus trabalhadores.<br />
O que torna interessante a percepção desses trabalhadores sobre o PQVT é que, na sua grande<br />
maioria, são indivíduos com mais de 20 anos de serviço prestado na Interprise. Isso demonstra que suas<br />
admissões na Interprise são anteriores ao surgimento do programa, pois o mesmo só tem 10 anos de<br />
existência. Portanto, a única percepção que têm de um PQVT é o existente dentro da Interprise, ou seja,<br />
conhecem apenas essa realidade. Assim, entendem que se trata de um programa que faz total diferença, não<br />
aparecendo no discurso nenhum trabalhador que declarasse não fazer nenhum diferencial trabalhar na<br />
Interprise só por ter PQVT.<br />
Desde que<br />
Enfoque o<br />
Trabalhador<br />
RH<br />
Produtividade<br />
Motivação<br />
Comunicação
297<br />
Gráfico 24: Discurso dos trabalhadores da organização Interprise, ao serem perguntados: “Após a<br />
implantação do PQVT, o que mudou no seu trabalho?”<br />
1 1 2 3 4 4<br />
Mudou<br />
1 2 2 Não 2<br />
3<br />
3 Impacto 3<br />
Bem-Estar<br />
Positivo na<br />
Organização<br />
1<br />
Porque<br />
3 3<br />
Disposição<br />
Vitalidade<br />
Confiança<br />
Tranqüilidade<br />
Abertura<br />
Menos Stress<br />
2<br />
Falta<br />
Conhecer<br />
Acesso<br />
Restrito<br />
1<br />
Aumenta<br />
Produtividade<br />
No gráfico 24, diante do núcleo induzido: “Após a implantação do PQVT, o que mudou no seu<br />
trabalho?”, do discurso dos trabalhadores emergiram três núcleos de pensamentos: Mudou, Não e Impacto<br />
Positivo. No núcleo de pensamento Mudou, os trabalhadores declararam ter mudado o bem-estar, a<br />
disposição, a vitalidade, a confiança, a tranqüilidade, a abertura e a diminuição do stress. E, além disso,<br />
aumentou a produtividade. No núcleo de pensamento Não, foram enfatizadas duas unidades de significação.<br />
Na primeira, os trabalhadores relataram que não mudou, porque falta conhecer o programa. Na segunda, os<br />
trabalhadores afirmaram que não mudou, porque o programa é restrito a algumas unidades da organização.<br />
No núcleo Impacto Positivo, eles declararam que com a implantação do PQVT houve um impacto positivo na<br />
organização.<br />
O que se pode apreender desse gráfico é que os trabalhadores explicitaram que, após a<br />
implantação do PQVT, alguns sentiram que realmente houve mudanças no seu trabalho, contribuindo para<br />
um melhor bem-estar, disposição, menos stress, etc. Isso demonstra que esses trabalhadores aderiram ao
Bom<br />
Válido<br />
Benefícios<br />
Importante<br />
298<br />
programa, participando de suas atividades, buscando satisfação e envolvimento psicológico saudável com o<br />
trabalho que realizam na organização. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
A satisfação de trabalhar com mais é... mais vitalidade, você tem mais... ânimo de trabalho, você<br />
fica mais ativo, né? Porque às vezes quando você tá com algum problema, você... fica um pouco<br />
aquém da produtividade sua (TS2).<br />
A QVT é, na visão de Limongi e Assis (1995), uma compreensão abrangente e comprometida<br />
sobre as condições de vida no trabalho, incluindo aspectos de bem-estar, garantia de saúde e segurança física,<br />
mental e social e capacitação para realizar tarefas com segurança e bom uso da energia pessoal.<br />
Outros trabalhadores, porém, manifestaram que não ocorreram mudanças no seu trabalho após<br />
o PQVT. Isso porque alguns trabalhadores não conhecem o programa e outros alegam ser o programa restrito<br />
somente a algumas unidades da Interprise, conforme já analisado e discutido no gráfico 22.<br />
Reafirma-se que é preciso que a Interprise, na pessoa dos gestores que administram o PQVT,<br />
procure atentar para a gama de benefícios que o PQVT pode trazer para esses trabalhadores que não<br />
conhecem o programa e para aqueles que não têm acesso a ele. Um trabalho de conscientização, <strong>entre</strong> os<br />
trabalhadores, sobre o Programa e um trabalho de rede que possa estendê-lo a todas as unidades seria de<br />
grande relevância. O PQVT, quando atua numa situação de trabalho, reflete na satisfação e na participação<br />
do trabalhador, mobilizando suas energias e atualizando seu potencial.<br />
Gráfico 25: Discurso dos trabalhadores da organização Interprise, ao serem perguntados: “O programa de<br />
Qualidade de Vida no Trabalho desenvolvido pela Interprise é compatível com seus <strong>valores</strong> ou entra em<br />
conflito com eles?” e “Como você avalia o Programa de Qualidade de Vida no Trabalho desenvolvido pela<br />
Interprise?”<br />
5 3 4 5 1 2<br />
5<br />
Não Conheço<br />
Programa<br />
4<br />
Sim<br />
Deve<br />
Combinar<br />
É Difícil<br />
Relacionar
299<br />
3 4 3 1 2 4 2 5<br />
É Importante<br />
Qual Sua<br />
1 1 3<br />
Avaliação<br />
4 2<br />
1 3 4 5 5<br />
3 1 3 4 5<br />
2<br />
No gráfico 25, diante dos núcleos induzidos: “O programa de Qualidade de Vida no Trabalho<br />
desenvolvido pela Interprise é compatível com seus <strong>valores</strong> ou entra em conflito com eles?” e “Como você<br />
avalia o Programa de Qualidade de Vida no Trabalho desenvolvido pela Interprise?”, do discurso dos<br />
trabalhadores emergiram dois núcleos de pensamentos: Sim e Não Conheço Programa. No núcleo de<br />
pensamento Sim, os trabalhadores declararam que o PQVT é compatível com os seus <strong>valores</strong> e a avaliação<br />
que fazem sobre o programa é que ele é bom, válido, traz benefícios, é importante e, além disso, melhora a<br />
informação, a disposição, a saúde e o desempenho. Outros trabalhadores relataram que seus <strong>valores</strong> são<br />
congruentes com os do PQVT, só que a avaliação que fazem do programa é que falta divulgação, expansão<br />
para as outras unidades e mais consciência a respeito do programa. No núcleo de pensamento Não Conheço<br />
Programa, os trabalhadores afirmaram que não conhecem o programa, mas ele é importante, que deve<br />
combinar com seus <strong>valores</strong> e que é difícil fazer essa relação. Quanto à avaliação que fazem do programa,<br />
consideram-no bom, válido, é benefício, é importante e melhora a informação, a disposição, a saúde e o<br />
desempenho.<br />
O que pode ser percebido nesse gráfico é que as respostas dadas pelo grupo G1, ou seja, os<br />
trabalhadores, quanto à percepção que têm sobre divergência ou congruência de seus <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> com<br />
o PQVT desenvolvido pela Interprise e também quanto à avaliação que fazem do programa, dividem-se <strong>entre</strong><br />
os que manifestam que sim, seus <strong>valores</strong> são compatíveis com o PQVT, e os que não conhecem o programa.<br />
O interessante que se nota é que os trabalhadores que dizem haver essa compatibilidade são justamente<br />
aqueles que conhecem o programa e participam de suas atividades. Isto é, são trabalhadores que possuem um<br />
referencial que os possibilita fazer essa comparação, conforme trecho de <strong>entre</strong>vista:<br />
É compatível. Porque eu acho que toda vida eu fui uma pessoa que... eu, por exemplo, fumei muitos<br />
anos e... com esse programa eu parei de fumar. Me alertou com relação ao cigarro (TS4).<br />
Além disso, na percepção desses trabalhadores, o PQVT é um programa de grande relevância<br />
para eles, pois o mesmo traz enormes benefícios para sua vida no trabalho e também para sua vida pessoal.
300<br />
Por outro lado, existem aqueles trabalhadores que não conhecem o PQVT, mas inferem que<br />
seus <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> devem combinar com ele. Consideram ser difícil para eles estabelecer essa<br />
comparação, por não terem parâmetros seguros, mas na sua avaliação o PQVT precisa se tornar mais público<br />
dentro da organização, ser expandido para que chegue em todas as unidades e, até mesmo, os próprios<br />
trabalhadores precisam ter mais consciência da existência do Programa e dos benefícios que ele pode trazer.<br />
Um programa de QVT em uma organização tem como objetivo maior a adesão dos seus<br />
trabalhadores. Percebe-se, porém, que na Interprise falta essa adesão dos trabalhadores ao Programa.<br />
Reafirma-se aqui o que já foi discutido no gráfico 22, a necessidade de a Interprise trabalhar na expansão do<br />
programa para que chegue em todos os setores da organização e, ao mesmo tempo, fazer um trabalho de<br />
sensibilização aos trabalhadores sobre o ganho que esses mesmos trabalhadores vão ter com o programa. A<br />
integração proporcionada pelo PQVT propicia a formação de um ambiente de maior satisfação e motivação<br />
individual, gerando um desempenho superior do trabalhador.<br />
Gráfico 26 8 : Discurso dos trabalhadores da organização Interprise, ao serem perguntados: “Você acha<br />
que há vantagens em estar nesta organização? Quais?” e “Você acha que há desvantagens em estar nesta<br />
organização? Quais?”<br />
1 2<br />
Vantagens<br />
Desvantagens<br />
1 1 2 2<br />
Salário<br />
Estabilidade<br />
Horário<br />
Valorização Profissional<br />
Ambiente<br />
Plano de Carreira<br />
Benefícios<br />
1<br />
2<br />
Intervenção Política<br />
Limitação de Experiência Profissional<br />
Rotina<br />
Conhece só<br />
esta Realidade<br />
8 A mesma pergunta feita aos gestores não possibilitou a geração de gráfico, desenvolvendo, assim,<br />
apenas um parágrafo concernentes as respostas emergidas.
301<br />
No gráfico 26, diante dos núcleos induzidos: “Você acha que há vantagens em estar nesta<br />
organização? Quais?” e “Você acha que há desvantagens em estar nesta organização? Quais?”, do<br />
discurso dos trabalhadores emergiram dois núcleos de pensamentos: Vantagens e Desvantagens. No núcleo<br />
Vantagens, os trabalhadores declararam que sim, há vantagens em termos de salário, estabilidade, horário,<br />
valorização profissional, ambiente, plano de carreira e benefícios. Os trabalhadores consideram esses<br />
indicadores como vantagens em relação à organização, porque, como disseram em seus discursos, só<br />
conhecem essa realidade. No núcleo de pensamento Desvantagens, eles relataram que sim, há desvantagens<br />
no que tange à intervenção política, limitação da experiência profissional e à rotina. Segundo declararam, tais<br />
desvantagens são em virtude de conhecerem somente essa realidade.<br />
No discurso dos gestores, estes afirmaram que as vantagens de estar na organização é por ela<br />
ser sólida, pagar os seus trabalhadores em dia, oferecer-lhes benefícios, oferecer estabilidade, liberdade,<br />
salário compensador e por existir uma compreensão por parte das pessoas. Já em relação às desvantagens, os<br />
gestores relataram que elas fazem com que o trabalhador se acomode, fique muito limitado e perca o<br />
referencial do mercado externo.<br />
Nota-se que, tanto para o grupo G1 quanto para o grupo G2, estar trabalhando na Interprise<br />
tem vantagens e desvantagens. Contudo, as vantagens superam as desvantagens. Na percepção desses<br />
indivíduos, as vantagens concentram-se principalmente no salário, estabilidade e benefícios, d<strong>entre</strong> outras,<br />
justamente benefícios que, praticamente, só as organizações públicas oferecem. Essas vantagens, peculiares<br />
às organizações públicas, são um grande diferencial na busca de uma colocação em seu quadro de<br />
trabalhadores.<br />
Na ótica de trabalhadores de organizações públicas, há uma representação social de que as<br />
vantagens oferecidas por essas organizações são sempre maiores que as desvantagens. Conforme Carbone<br />
(2000) salienta, porém, esses trabalhadores sempre necessitaram possuir habilidades diplomáticas nas suas<br />
relações de trabalho, para não produzirem divergências com a administração pouco competente dos gestores.<br />
Nas organizações públicas, são as relações de estima e os jogos de influência os verdadeiros indicadores de<br />
poder. Na Interprise, às vezes, para o trabalhador conseguir um benefício, numa emergência, se ele não<br />
possuir esse jogo de influência e as relações de estima, dificilmente consegue. Há até um tratamento<br />
diferenciado <strong>entre</strong> os que possuem essas condições e os que não as possuem. O prazo para obtenção de tal<br />
benefício, para uns, é imediato, para outros, é necessário uma espera de até dois, três, quatro dias, quando não<br />
uma semana.<br />
Apesar de já existir uma grande gama de vantagens oferecidas pelas organizações públicas,<br />
segundo Pimenta (1998), a Constituição promulgada em 1988, paradoxalmente, criou uma série de direitos e<br />
garantias aos trabalhadores de organizações públicas, que sobrecarregaram as despesas do Estado: é o caso da<br />
estabilidade desses trabalhadores, da obrigatoriedade de implantação do regime jurídico na área de pessoal,<br />
que aumentou seus direitos e garantias e da igualdade de vencimentos para cargos assemelhados, <strong>entre</strong><br />
outros.<br />
Já as desvantagens, apontadas tanto pelo grupo G1 como pelo grupo G2, são inerentes a<br />
organizações públicas, como a interferência política, a rotina, a acomodação, d<strong>entre</strong> outras. O que se percebe<br />
é que essa visão se torna limitada por conhecerem somente a realidade à qual estão inseridos, por perderem o<br />
senso crítico e alienarem-se, conforme trechos de <strong>entre</strong>vistas:
302<br />
Desvantagem de estar na Interprise? Não. Desvantagem, não. Você viu que eu sou apaixonada por<br />
essa empresa, né? Então, eu não acho que tenha desvantagem não. Nenhuma (TS8).<br />
Há desvantagem. Uma delas é que a gente perde o referencial externo e aí a gente começa a se<br />
nivelar por baixo, porque sabe que a empresa é estável (GS4).<br />
O sentido de acomodação do trabalhador dentro das organizações públicas fica tão nítido na<br />
Interprise, que, quando ele consegue se efetivar dentro dela, suas expectativas são rompidas quanto à busca<br />
de novas oportunidades de trabalho, ou seja, a estabilidade que a Interprise oferece ao trabalhador faz com<br />
que ele tenha o sentimento de que não precisa competir mais no mercado de trabalho. Eis um trecho de<br />
<strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
A desvantagem existe, porque a gente acomoda. Como trabalhador a gente acomoda e não procura<br />
novos horizontes. Então, essa é a desvantagem. Que aqui a gente se sente seguro, então, o tempo<br />
passa, quando a gente percebe já tá quase aposentando. (GS1).<br />
Gráfico 27: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da organização<br />
Interprise, ao serem perguntados:“Quais são os motivos que levaram a organização a implantar o PQVT?”<br />
Motivos Para Implantação do PQVT<br />
1 1 3 2 3 4 5 5<br />
2<br />
Decorrência<br />
do Programa<br />
Qualidade<br />
Produto<br />
Satisfação<br />
Clientes<br />
Produtividade<br />
2 3 2 4 5<br />
4<br />
Exigente<br />
Internos<br />
Externos<br />
4<br />
Contexto<br />
Mercado<br />
No gráfico 27, diante do núcleo induzido: “Quais são os motivos que levaram a organização a<br />
implantar o PQVT?”, do discurso dos gestores emergiram três núcleos de pensamentos: Decorrência do<br />
Programa da Qualidade do Produto (PQP), Satisfação Clientes e Contexto Mercado. No núcleo de<br />
pensamento Decorrência do PQP, os gestores declararam que o motivo que levou à implantação do PQVT<br />
na organização foi a implantação do Programa da Qualidade do Produto. Em Satisfação Clientes, os gestores<br />
relataram que foi a satisfação dos clientes internos e externos e também o aumento da produtividade os<br />
motivos que levaram a organização a implantar o PQVT. No núcleo de pensamento Contexto Mercado, foi<br />
afirmado que o motivo maior que levou a organização a implantar o PQVT foi o contexto do mercado que<br />
está mais exigente.<br />
Apreende-se que na organização Interprise o PQVT foi implantado em virtude da existência de<br />
um outro programa já implantado, o PQP. Nesse sentido, a Interprise buscou implantar o PQVT com a visão<br />
de que, se o indivíduo que cuida do produto não tem qualidade de vida, torna-se quase impossível a obtenção<br />
da qualidade do produto.
303<br />
Primeiro a Interprise implantou o PQP e trabalhou algum tempo nesse PQP. Depois chegamos à<br />
conclusão de que sem uma QVT para o trabalhador não tem como ter qualidade e produto (GS1).<br />
Por outro lado, os gestores declararam que os clientes internos e externos pesaram<br />
positivamente para que se implantasse o PQVT na Interprise. Nessa ótica, a Interprise levou em<br />
consideração a relação que mantém com seus trabalhadores e fornecedores. Isso porque, melhorando as<br />
condições internas dos trabalhadores, esses passarão a ter uma melhor relação com os clientes externos, isto<br />
é, com os fornecedores.<br />
Os motivos foi uma maior dedicação aos empregados e fornecedores, porque hoje a organização ela<br />
tem esse interesse. (GS2).<br />
A implantação do Programa, portanto, ocorreu com vistas à busca da qualidade de vida do<br />
trabalhador, ou seja, para melhorar as condições do ambiente de trabalho, de forma que o reconhecimento<br />
dessa melhoria, pelo trabalhador, resultasse em melhoria também da qualidade do produto e das relações com<br />
os fornecedores, bem como da sua produtividade.<br />
Realizar a implantação de um PQVT é buscar a democratização do ambiente de trabalho e a<br />
satisfação do trabalhador, indo ao encontro, segundo Búrigo (1997, p. 30), da “busca para humanizar as<br />
relações de trabalho na organização, mantendo uma relação estreita com a produtividade e, principalmente,<br />
em condição de vida no trabalho, associada ao bem-estar, à saúde e à segurança do trabalhador.”<br />
Gráfico 28: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da organização<br />
Interprise, ao serem perguntados: “Quais departamentos apoiaram o programa e quais não apoiaram?”<br />
Departamentos Apoiaram Programa<br />
3 4<br />
1 2 1 3 2 4<br />
1 2<br />
Espontaneamente<br />
No Início<br />
1 1 3<br />
Operacional<br />
Superintendência RH<br />
Suprimentos<br />
Sim<br />
2<br />
Por Imposição<br />
Os Demais<br />
3<br />
2<br />
Apoio<br />
Suporte<br />
Posterior<br />
Não<br />
4<br />
Alguns<br />
Trabalhadores<br />
No gráfico 28, diante do núcleo induzido: “Quais departamentos apoiaram o programa e<br />
quais não apoiaram?”, do discurso dos gestores emergiram três núcleos de pensamentos: Sim, Posterior e<br />
Não. No núcleo Sim, alguns gestores declararam que houve apoio espontâneo dos departamentos da área
304<br />
Operacional, Superintendência de RH e Suprimentos e posteriormente dos departamentos de Apoio e<br />
Suporte. Em Posterior, os gestores relataram que o apoio veio posteriormente dos departamentos, mas por<br />
imposição. No núcleo de pensamento Não, os gestores afirmaram que não houve apoio, pois alguns<br />
trabalhadores resistiram.<br />
Nota-se que o apoio dado ao PQVT pelos departamentos da Interprise deu-se de maneira<br />
espontânea, no início e posteriormente, e também por imposição da organização àqueles departamentos que<br />
resistiam em apoiar tal programa. Além disso, encontrou-se resistência por parte de alguns trabalhadores.<br />
O que se percebe na Interprise, em relação ao PQVT, é que não havia uma unidade da<br />
organização em torno do programa. Precisou-se usar o poder da organização para que departamentos<br />
constituintes do seu organograma aderissem ao programa. Ou seja, havia um conflito na tomada de decisão<br />
por parte dos departamentos e trabalhadores, ao assumirem sua participação plena no PQVT da Interprise.<br />
O que se pressupõe quanto às razões subjacentes dos departamentos e trabalhadores que<br />
resistiram em apoiar o PQVT da Interprise, seriam suas desconfianças quanto aos verdadeiros motivos da<br />
proposta do PQVT desenvolvido pela organização. Segundo Wells (1987), os Programas de Qualidade de<br />
Vida no Trabalho prometem democracia no ambiente de trabalho, mas na verdade servem de suporte para as<br />
organizações aumentarem sua lucratividade e dominação via gerência.<br />
Gráfico 29: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da organização<br />
Interprise, ao serem perguntados: “Após a idéia de implantação do programa, qual foi o primeiro passo?”<br />
Após Decisão, Qual foi o Primeiro Passo Para Implantação<br />
1 1 2 3 3 4<br />
Apresentar<br />
Desenvolver<br />
Ações<br />
1 2 2 3<br />
Trabalhador<br />
Programa<br />
Piloto<br />
Adesão<br />
4 4<br />
2<br />
1 3<br />
2<br />
Diabetes<br />
Alcoolismo<br />
Cúpula<br />
Expansão<br />
Ginástica Laboral<br />
Acompanhamento<br />
No gráfico 29, diante do núcleo induzido: “Após a idéia de implantação do programa, qual foi<br />
o primeiro passo?”, do discurso dos gestores emergiram três núcleos de pensamentos: Apresentar,<br />
Desenvolver ações e Trabalhador. No núcleo de pensamento Apresentar, os gestores afirmaram em seus<br />
discursos que, após a idéia de implantação do Programa, o primeiro passo foi apresentá-lo à cúpula da<br />
organização. Em Desenvolver Ações, eles relataram que desenvolver ações piloto e expandir os grupos de<br />
diabetes, alcoolismo e ginástica laboral foi o passo seguinte para a implantação do Programa. No núcleo de
305<br />
pensamento Trabalhador, os gestores declararam que, após as ações citadas, partiram para convencer os<br />
trabalhadores a aderirem aos grupos de diabetes, alcoolismo e ginástica laboral, para que, com isso pudesse<br />
ser feito o acompanhamento desses trabalhadores.<br />
A Interprise é uma organização onde o PQVT é gerenciado por uma equipe, mas o que se<br />
percebe por meio do discurso dos gestores é que, após determinada a sua implantação, não houve uma<br />
unidade nas decisões sobre as ações. Alguns gestores eram de opinião que se deveria primeiro apresentar o<br />
programa à cúpula da organização. Nota-se toda essa atenção em apresentar o Programa aos dirigentes, uma<br />
vez que se trata de uma organização pública e que de quatro em quatro anos sua cúpula é formada por novos<br />
administradores, com propostas diferentes. Fica nítido, assim, por meio dessa ação, que os gestores precisam<br />
vender o programa a cada nova gestão, conforme trecho de <strong>entre</strong>vista:<br />
O primeiro passo foi apresentar o programa para a Diretoria e Superintendência pra nós vendermos<br />
o programa. Vendido o programa, aí nós começamos com as primeiras ações (GS1).<br />
Por outro lado, outros gestores já partiram para as ações práticas, após a decisão de<br />
implantar o PQVT. Iniciaram com campanhas de prevenção à saúde, com a adesão dos trabalhadores ao<br />
programa, bem como o seu acompanhamento no mesmo. O que se percebe é que o programa, antes<br />
mesmo de ser implantado, já estava disperso quanto às suas ações por parte dos gestores, correndo o risco<br />
de não colher nenhum resultado concreto. É preciso que haja uma maior sintonia e envolvimento dos<br />
gestores na implementação das ações, possibilitando, assim, uma maior efetividade delas no PQVT.<br />
Gráfico 30: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da organização<br />
Interprise, ao serem perguntados: “A organização possui uma política de pessoal, ou seja, de RH? Qual?<br />
Quando foi instituída? Por quem? Como foi e como é divulgada atualmente?”
306<br />
POLÍTICA RH<br />
1 2 3 3 2 1<br />
Sim<br />
Informal<br />
1 2 3<br />
Quando<br />
Como é<br />
Divulgada<br />
1 1 2 1 2 3 3 1 1 2 3<br />
Qual<br />
1986<br />
2<br />
1 3 1 2<br />
3<br />
Por Quem<br />
Treinamento<br />
1 2 2<br />
Cartilha<br />
Jornal Interno<br />
Vida Funcional<br />
Qualidade Vida<br />
Benefícios<br />
Diretoria da<br />
Época<br />
Carreira<br />
Educação<br />
No gráfico 30, diante do núcleo induzido: “A organização possui uma política de pessoal, ou<br />
seja, de Recursos Humanos (RH)? Qual? Quando foi instituída? Por quem? Como foi e como é divulgada<br />
atualmente?”, do discurso dos gestores emergiu apenas um núcleo de pensamento: Sim. Nele os gestores<br />
declararam que existia uma política de RH, mas de maneira informal. Era baseada em treinamento, na<br />
qualidade de vida dos trabalhadores, nos benefícios, na carreira e na educação. Foi legalmente instituída em<br />
1986, pela diretoria da época. E divulgada em forma de cartilha, jornal interno e junto a documentos<br />
funcionais dos trabalhadores.<br />
Constata-se, por meio do discurso dos gestores, que há uma política de RH na Interprise,<br />
implantada no ano de 1986. Até então existia uma política, mas não era registrada no Ministério do Trabalho,<br />
ou seja, uma política centrada na informalidade e que a organização obedecia se quisesse. Hoje a política de<br />
RH tem como base os benefícios oferecidos aos trabalhadores, como um programa de QVT, Treinamento,<br />
Caixa de Assistência, Fundo de Pensão, Empréstimo Consignável, Vale-Refeição, Transporte, d<strong>entre</strong> outros.<br />
A política é divulgada por meio de uma cartilha dirigida a cada trabalhador da organização, enviada para o<br />
departamento onde ele trabalha, por meio do jornal interno da Interprise e também junto a documentos<br />
funcionais do trabalhador. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:
307<br />
Ela tem uma política. É registrado no Ministério do Trabalho já desde de 86 e ela tem assim... uma<br />
grande quantidade de benefícios. Ela concede bastante benefícios aos empregados. E tem muita<br />
gente que acha que ainda, né? que ainda tem pouco. Agora, ela já tinha uns trabalhos, tinha um<br />
plano de carreira, mas não era registrado, né? desde 1980, mas não era registrado. Agora não, é<br />
registrado, que ela tem que obedecer e tal (GS2).<br />
O que se percebe por meio desse discurso é que a política de RH da Interprise é a típica<br />
política encontrada em organizações públicas. Uma política com concentração enorme de benefícios<br />
oferecidos aos trabalhadores que, ainda assim, os consideram aquém das expectativas. Trata-se, de uma<br />
característica marcante das organizações públicas, onde os trabalhadores resistem de forma generalizada a<br />
qualquer tipo de mudanças de procedimentos e implantação de novas políticas que vão contra seus interesses.<br />
Segundo Aquino (1980), os benefícios, visam meios de complementação da renda do<br />
trabalhador, incluindo uma variedade de facilidades e vantagens desenvolvidas pela organização.<br />
Nota-se que esse é o sentido da política de RH da Interprise uma vez que, por meio do<br />
corporativismo dos trabalhadores, incluindo aí também os gestores, conseguiu-se o seu registro no Ministério<br />
do Trabalho, para evitar o seu descumprimento por qualquer gestão que venha ocupar a cúpula da<br />
organização.<br />
Gráfico 31: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da organização<br />
Interprise, ao serem perguntados: “Como e quando surgiu o setor que gerencia o PQVT da organização?<br />
Qual o seu nível hierárquico? Quantas pessoas atuam nele? Qual o seu histórico?”<br />
SETOR QUALIDADE SURGIU<br />
1 2 3 3 2 1<br />
Orientação
308<br />
Quando<br />
Hierarquia<br />
1 1<br />
1<br />
1 2 3 2 3 1 3 2 2 2<br />
Presidência<br />
1980<br />
Administrar<br />
Benefícios<br />
1998<br />
Superintendência<br />
3<br />
Holística<br />
Oficializar<br />
Projeto<br />
No gráfico 31, diante do núcleo induzido: “Como e quando surgiu o setor que gerencia o<br />
PQVT da organização? Qual o seu nível hierárquico? Quantas pessoas atuam nele? Qual o seu histórico?”,<br />
do discurso dos gestores emergiu apenas um núcleo de pensamento: Hierarquia. Nele alguns gestores<br />
relataram que o setor que gerencia o PQVT, na hierarquia da organização, está ligado à Superintendência de<br />
RH, ele surgiu no ano de 1980, com a orientação de administrar os benefícios dos trabalhadores. Outros<br />
gestores declararam que o setor que gerencia o PQVT, dentro da hierarquia da organização, está vinculado<br />
diretamente à Presidência da organização e que o mesmo surgiu em 1998, com uma orientação holística,<br />
tendo como objetivo maior oficializar o projeto, ou seja, o Programa de Qualidade de Vida no Trabalho.<br />
Observa-se, por meio do discurso dos gestores, que existem contradições em relação ao<br />
surgimento do setor da qualidade que gerencia o PQVT da Interprise, até mesmo quanto à finalidade<br />
proposta a esse setor.<br />
Para alguns gestores, o setor da qualidade surgiu da hierarquia existente na Superintendência<br />
de RH, no ano de 1980, tendo como missão administrar os benefícios oferecidos aos trabalhadores.<br />
Contraditoriamente, para outros, o setor da qualidade emergiu como uma assessoria especial ligada à<br />
presidência da Interprise, em 1998, tendo como função administrar tudo que estivesse relacionado à política<br />
da qualidade da organização e também como forma de institucionalizar o PQVT criado para a Interprise.<br />
O que se nota é uma divisão existente dentro da Interprise quanto ao setor que gerencia o<br />
PQVT. Há o cargo de Assistente Social, ligado à Superintendência de RH, que, d<strong>entre</strong> outras atribuições tem<br />
a de orientar os trabalhadores sobre os benefícios a que têm direito. D<strong>entre</strong> esses benefícios encontra-se o<br />
PQVT, e, justamente por considerar que o PQVT é um benefício, ele é, atualmente, administrado pelo<br />
indivíduo que ocupa tal cargo. Por outro lado, o setor da qualidade ligado à Presidência da organização, é um<br />
setor que se ocupa da política da qualidade no sentido da certificação de suas unidades, dando pouca atenção<br />
ao PQVT. Eis alguns trechos de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
Quando eu <strong>entre</strong>i aqui em 80, ele já existia. Existia já o serviço social. Ele na época foi criado com<br />
todos os serviços sociais de toda empresa. Hoje, o serviço social, na sua realidade, ele não existe no<br />
organograma da empresa. Existem assistentes sociais que são lotados na Superintendência de RH e<br />
que tem por objetivo orientar os empregados quanto aos seus benefícios (GS1).
309<br />
Olha, essa questão da qualidade de vida, eu tô mais ligado a questão da qualidade como um todo. O<br />
nosso programa da qualidade não trabalha essas variáveis oficialmente. O setor da qualidade é uma<br />
assessoria especial de gestão da qualidade. Ela foi criada em 98 e está ligada a presidência (GS2).<br />
Qualidade de vida? Ele é vinculado, ele é coordenado pela assistente social, né? e é vinculado a<br />
Superintendência de Recursos Humanos (GS3).<br />
Fica nítido, por meio desses discursos, que o setor da qualidade existe, mas não é atribuição<br />
sua administrar o PQVT. Recomenda-se à organização Interprise que incorpore essa função de gerenciar o<br />
PQVT ao setor da qualidade, já que ele existe e trabalha com a política da qualidade da organização, uma vez<br />
que a qualidade tem de envolver não só a qualidade do produto e serviço, mas a qualidade de vida do<br />
trabalhador, ou seja, o seu bem-estar e satisfação no trabalho. O trabalhador precisa ter uma qualidade de<br />
vida no seu local de trabalho, caso contrário torna-se difícil exigir que ele produza produtos e serviços de<br />
qualidade.<br />
Gráfico 32: Discurso dos gestores do Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) da<br />
organização Interprise, ao serem perguntados: “Como foram escolhidos os responsáveis pela<br />
implantação do PQVT? Qual a formação dessas pessoas? Por que tais pessoas foram escolhidas para<br />
serem responsáveis? Qual foi o critério de escolha? Houve a formação de um comitê de<br />
Coordenação/Implantação? Se houve, teve algum treinamento para esse comitê? Como esse comitê<br />
funciona?”<br />
ESCOLHA DOS RESPONSÁVEIS PELA IMPLANTAÇÃO PQVT<br />
2 3 4 3 1<br />
Internos<br />
4 2<br />
Comitê Central<br />
2 2 4<br />
1<br />
Não Houve<br />
1<br />
Formação<br />
Eclética<br />
2<br />
Setorial<br />
Adesão<br />
Voluntária<br />
2 4<br />
Interesse<br />
Disponibilidade<br />
Desativado<br />
Externos<br />
4 3 3<br />
Criou<br />
Consultor<br />
SENAI
310<br />
4<br />
Departamento<br />
Qualidade<br />
No gráfico 32, diante do núcleo induzido: “Como foram escolhidos os responsáveis pela<br />
implantação do PQVT? Qual a formação dessas pessoas? Por que tais pessoas foram escolhidas para serem<br />
responsáveis? Qual foi o critério de escolha? Houve a formação de um comitê de Coordenação/Implantação?<br />
Se houve, teve algum treinamento para esse comitê? Como esse comitê funciona?”, do discurso dos gestores<br />
emergiram quatro núcleos de pensamentos: Não Houve, Internos, Externos e Comitê Central. No núcleo de<br />
pensamento Não Houve, os gestores declararam que não houve escolha de responsáveis pela implantação do<br />
PQVT. A adesão foi voluntária por parte dos trabalhadores. No núcleo Internos, eles relataram que houve a<br />
formação de comitês internos e que a formação das pessoas que participavam deles era eclética. A<br />
participação dos trabalhadores estava condicionada ao interesse e disponibilidade de cada um. Existia um<br />
comitê central que comandava os comitês setoriais. No núcleo de pensamento Externos, os gestores<br />
afirmaram ter havido um responsável externo que ajudou na implantação do PQVT, ou seja, um consultor do<br />
SENAI. Além do consultor externo, participaram também trabalhadores da organização. Em Comitê Central,<br />
os gestores manifestaram que foi criado um comitê central e os setoriais para implantação do PQVT, mas que<br />
depois essa idéia foi abandonada, isto é, os comitês foram desativados e criou-se o departamento da<br />
qualidade.<br />
Percebe-se que a escolha dos responsáveis para gerenciar o PQVT da Interprise não obedeceu<br />
a critérios, mas deixou que cada trabalhador tivesse interesse e disponibilidade para participar do seu<br />
gerenciamento. Além do público interno, a Interprise contratou um consultor do SENAI para dar suporte às<br />
ações do PQVT. Esse grupo gestor criou um comitê central e vários setoriais, sendo que esses últimos, com o<br />
tempo, foram desativados, ficando somente o comitê central. Fizeram-se vários estudos com o consultor, no<br />
sentido de estabelecer estratégias de ação do programa.<br />
O que se nota, por meio do discurso dos gestores, é que toda essa articulação em torno do<br />
PQVT partiu do indivíduo que ocupa o cargo de assistente social e não do setor da qualidade da Interprise.<br />
Conforme já foi analisado e discutido no gráfico 31, existe uma divergência <strong>entre</strong> esses dois setores, isto é,<br />
<strong>entre</strong> a Superintendência de RH e o Setor da Qualidade. Reafirma-se, mais uma vez, que a Interprise<br />
necessita buscar essa unidade no gerenciamento dos seus programas da qualidade, uma vez que se criou um<br />
setor somente para isso. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
O PQVT foi uma iniciativa da assistente social. Nesse de qualidade de vida, né? Não no programa<br />
como um todo. No programa de qualidade, aí, existe toda uma equipe que é envolvida, as interfaces.<br />
Nesse de qualidade de vida, é uma iniciativa da Superintendência de Recursos Humanos (GS3).<br />
O que se apreende por meio desse discurso é que o PQVT está sendo preterido pelo setor da<br />
qualidade em detrimento de um outro programa chamado da qualidade, onde existe todo um grupo de<br />
trabalhadores dando o suporte indispensável. É necessário que a Interprise se conscientize de que um PQVT,<br />
precisa necessariamente fazer parte do programa da qualidade de uma organização, como um todo.
311<br />
Segundo Búrigo (1997), implantar programas de qualidade sem QVT assemelha-se ao velho<br />
padrão “faça o que digo, mas não faça o que faço”, uma vez que sugere parcialidade em detrimento da visão<br />
do todo.<br />
CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />
Esta pesquisa foi realizada com o intuito de investigar a relação <strong>entre</strong> <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>,<br />
<strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> e Programa de Qualidade de Vida no Trabalho. Teve como questões norteadoras<br />
levantar as prioridades axiológicas dos trabalhadores, os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> segundo a percepção dos<br />
mesmos e porque foi criado e como se apresenta o contexto do PQVT desenvolvido pela organização<br />
pesquisada.<br />
Buscou-se também compreender e analisar os discursos dos trabalhadores e gestores do PQVT,<br />
com o objetivo de conhecer semelhanças e diferenças <strong>entre</strong> suas maneiras de perceber os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>,<br />
<strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> e Qualidade de Vida no Trabalho.<br />
Observou-se, neste estudo, que existe uma contradição <strong>entre</strong> os discursos dos<br />
gestores do PQVT quanto à sua concepção e ações. Os discursos dos gestores<br />
demonstraram que ainda são necessárias muitas ações, planejamento e vontade política<br />
para que o PQVT alcance o nível de excelência desejado.<br />
Serão discutidos os resultados alcançados, integrando os dois estudos.<br />
De acordo com os resultados, pode-se perceber que o modelo de organização, com seus<br />
<strong>valores</strong>, interfere no modo como os trabalhadores vivenciam um Programa de Qualidade de Vida no<br />
Trabalho.<br />
Nas organizações públicas, a qualidade está relacionada com a questão da cidadania (RAMOS,<br />
1993; CARVALHO e TONET, 1994). Cidadãos, em um conceito genérico, são clientes internos e externos<br />
das organizações públicas, que mantém a máquina do governo com o pagamento de impostos, taxas e<br />
contribuições e, por direito, devem receber serviços públicos de qualidade. Assim, os clientes e os<br />
trabalhadores das organizações públicas estão unidos em uma única identidade; são cidadãos acima de tudo.<br />
Os resultados dos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> dos trabalhadores mostraram que as maiores médias<br />
foram encontradas nos <strong>valores</strong> Benevolência, Conformidade, Universalismo e Segurança, indicadores de que<br />
esses trabalhadores priorizam o bem-estar das pessoas, a aceitação do outro, restrição do próprio<br />
comportamento em vista de expectativas sociais e a busca da estabilidade nas relações.
312<br />
Os resultados revelam que as ações dos trabalhadores em busca dos referidos <strong>valores</strong> é mais<br />
desejada e aceita pela sociedade, porque pressupõem que os indivíduos que têm esses <strong>valores</strong> como<br />
orientadores para um modo desejado ou preferível de ação e conduta demonstram uma atenção maior para<br />
com a coletividade do que para consigo mesmos.<br />
As menores médias foram encontradas nos <strong>valores</strong> Poder e Estimulação. Esse resultado<br />
encontra justificativa no contexto social da organização no qual os trabalhadores estão inseridos, o que faz<br />
com que se atribua pouca importância a eles, haja vista que em uma organização pública a busca pelo valor<br />
Estimulação, que tem como base motivacional a novidade, os desafios e uma vida excitante, torna-se quase<br />
nula devido à cultura que rege esse modelo de organização.<br />
O valor Poder, que tem como metas motivacionais status social, prestígio e controle ou<br />
domínio sobre pessoas ou recursos, também é difícil de se perseguir nesse tipo de organização, uma vez que<br />
o centro do poder se localiza fora dela e, para tanto, necessita-se possuir habilidades diplomáticas no<br />
trabalho, relações de estima e jogos de influência, que são os verdadeiros indicadores de poder nas<br />
organizações públicas.<br />
Segundo Dussault (1992), as organizações públicas têm uma dependência em grau elevado do<br />
ambiente sociopolítico e seu quadro de funcionamento é regulado externamente.<br />
Os resultados das três dimensões bipolares dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> indicam, na percepção<br />
dos trabalhadores, como prioridades axiológicas da Interprise Conservação, Hierarquia e Domínio, <strong>valores</strong><br />
esses que orientam essa organização. Os <strong>valores</strong> pertencentes aos pólos Autonomia, Estrutura Igualitária e<br />
Harmonia não são considerados, pelos trabalhadores, como sendo importantes para a Interprise, pois<br />
obtiveram menor média.<br />
De fato, os resultados demonstram a realidade dessa organização pública, haja vista que o valor<br />
Conservação promove ênfase às tradições e à manutenção do status quo, aos caminhos e às soluções já<br />
conhecidas e testadas pela organização no passado, sendo essa dinâmica totalmente aplicável a Interprise. Por<br />
outro lado, a organização, por priorizar esse valor, não valoriza a iniciativa nem a criatividade, que, nas<br />
organizações públicas, são pouco enfatizadas, uma vez que o trabalhador tendo direito à estabilidade no<br />
emprego, na maioria das vezes se acomoda, não buscando novas formas de aprimorar o trabalho.<br />
A Interprise ao atribuir importância ao valor Hierarquia, prioriza o controle em forma de<br />
obediência, fiscalização, poder, pontualidade, rigidez e tradição. As normas, por estarem enraizadas nesse<br />
valor, estabelecem a divisão de trabalho, a divisão de função, delimitam as relações sociais, os direitos e<br />
deveres e ditam o padrão desejável de ação para o alcance de objetivos e metas. Para Tamayo (1996), os<br />
<strong>valores</strong> e normas são componentes principais da cultura organizacional, por isso a norteiam.<br />
O predomínio da dimensão Domínio significa a importância dada aos <strong>valores</strong> ambição,<br />
audácia, competitividade, domínio, previsibilidade, produtividade, satisfação dos clientes e sucesso. Diante<br />
de um mercado que começa a emergir com a privatização, faltando apenas a regulamentação de regras para o<br />
setor, e que antes era dominado pelo setor público, a “Interprise” precisa garantir sua permanência e<br />
continuidade, por isso se dá importância aos <strong>valores</strong> do pólo Domínio.<br />
Pode ser percebido, porém, como constituição de uma dinâmica contraditória, uma vez que é<br />
dada muita importância aos <strong>valores</strong> Hierarquia e Conservação. Essa contradição é percebida nesse contexto
313<br />
de quase-privatização, pela necessidade de a organização desenvolver uma nova ótica de inovação, que lhe<br />
assegure condição de grande competitividade no novo escopo que se delineia para o futuro.<br />
O resultado do coeficiente de correlação (r de Pearson) <strong>entre</strong> os dez tipos motivacionais dos<br />
<strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e as três dimensões bipolares dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> indica que os pólos dos <strong>valores</strong><br />
<strong>organizacionais</strong> Conservação, Hierarquia e Domínio apresentaram correlação significativa apenas com o tipo<br />
motivacional Conformidade.<br />
Assim, <strong>entre</strong> as preferências indicadas pelos trabalhadores quanto aos dez tipos motivacionais:<br />
Benevolência, Conformidade, Universalismo e Segurança, apenas o valor individual de Conformidade<br />
apresentou relação significativa com os pólos: Conservação, Hierarquia e Domínio.<br />
Tal resultado significa que o tipo motivacional dos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> de Conformidade é<br />
percebido pelos trabalhadores como um valor importante para a Interprise. Desse modo, pode-se afirmar que<br />
essa relação é constituída no interior da Interprise. Os trabalhadores, no desenvolvimento de suas atividades,<br />
atribuem importância aos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> apenas quando percebem que são valorizados pela organização.<br />
Retomando o objetivo geral de verificar a existência de uma relação <strong>entre</strong><br />
<strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>, <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> e Programa de Qualidade de Vida em uma<br />
organização pública sediada no Município de Goiânia, e os objetivos específicos de<br />
levantar os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> dos trabalhadores, os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> segundo a<br />
percepção desses trabalhadores e os motivos e funcionamento do PQVT, afirma-se que<br />
foram alcançados, pois forneceram elementos fundamentais que enriqueceram este estudo<br />
e contribuíram para ampliar a produção científica relacionada com o tema.<br />
Propôs-se um estudo de caráter descritivo e exploratório, com o objetivo de investigar a<br />
Relação <strong>entre</strong> Valores Individuais, Valores Organizacionais e Programa de Qualidade de Vida em uma<br />
organização pública no Município de Goiânia.<br />
A presente pesquisa caracterizou-se também como um estudo de caso, pois consegue retratar<br />
uma situação, neste caso específico o da organização em estudo, analisando-a em profundidade.<br />
A escolha pela utilização do método quanti-qualitativo deu-se em virtude de questões<br />
relacionadas ao objeto de estudo, que envolve tanto Valores quanto Programa de Qualidade de Vida no<br />
Trabalho (PQVT), possibilitando uma compreensão da dinâmica construída a partir da orientação dos <strong>valores</strong><br />
<strong>individuais</strong> e <strong>organizacionais</strong>, no desenvolvimento das ações e atividades do PQVT da organização<br />
pesquisada.<br />
Ao abordar as categorias de análise, em particular do discurso dos trabalhadores e gestores,<br />
constatou-se que:<br />
• Valores Individuais: tanto para os trabalhadores quanto para os gestores, os <strong>valores</strong> que<br />
orientam suas vidas e guiam suas ações são os <strong>valores</strong> de Benevolência. A meta motivacional desse valor é o<br />
interesse e a preocupação com o bem-estar das pessoas com as quais são mantidos contatos freqüentes. Eis<br />
trechos de <strong>entre</strong>vistas que evidenciam tal questão:
314<br />
Em primeiro lugar a capacidade assim de você gostar das pessoas próximas a você, né? A família e<br />
as pessoas próximas também é você. E estender isso também aos demais. E você cultivar aquela<br />
amizade. Ser honesto é também um valor muito importante, que eu acho que você sendo honesto<br />
com você mesmo e com as pessoas também (TS6).<br />
[...] compromisso com o cliente, ética interna, ou seja, você fazer o melhor que você pode e colocar<br />
para que o seu colega também faça o melhor (GS4).<br />
Frente a essa relação <strong>entre</strong> os trabalhadores, gestores e os <strong>valores</strong> de Benevolência, pode-se prever que há uma<br />
busca, por parte desses indivíduos, por agir de maneira a expressarem esses <strong>valores</strong> específicos, promovendo a meta central desse<br />
valor. Isso porque os <strong>valores</strong> exercem uma função mobilizadora e orientadora do comportamento humano. As pessoas, no processo<br />
de interação, têm necessidade de orientação, sentido e objetivo que possam dar-lhes uma direção para saberem se conduzir de<br />
maneira adequada em seu espaço social e cultural.<br />
• Socialização Organizacional: nessa categoria pôde ser constatado que, primeiramente, a escolha por trabalhar na<br />
organização se deu, tanto para os trabalhadores como para os gestores, pela falta de oportunidade em outro emprego, por estarem<br />
estagiando na organização, por não possuírem experiência anterior e por questões financeiras. Tinham expectativas de uma carreira<br />
bastante promissora e segura, porém julgavam que seria um trabalho burocrático e haveria restrições na liberdade e na<br />
profissionalização. Eis alguns trechos de <strong>entre</strong>vista que exemplificam tais questões:<br />
Estabilidade e... um futuro melhor, né? Trabalhar aqui... achei que fosse mais como empresa<br />
privada, né? mais exigido, mais... pelo que eu faço, é muito bom o que eu faço, mas ela... a empresa<br />
deveria ser menos política (TS11).<br />
Eu achei que ia ser... aquela... aquele serviço assim de... é a imagem que a gente tem dos<br />
funcionários públicos. Pessoa ali o dia inteiro em cima do papel, batendo carimbo, assinando,<br />
fazendo conta, atendendo mal as pessoas. E até porque eu vim de um outro órgão público (GS3).<br />
Pôde ser constatado também nessa categoria que tais expectativas foram alcançadas em parte, principalmente no<br />
que se refere à estabilidade no emprego no sentido da busca de uma carreira com grandes chances de crescimento, satisfação e<br />
sustento para o resto da vida.<br />
Concretizou, nossa! Uma empresa excelente aqui...A Interprise foi tudo pra mim. Tudo o que eu<br />
tenho hoje, ela participou, foi a Interprise que me deu. Ás vezes eu vejo alguém falar mal da<br />
Interprise, eu falo: “Oh! Calma aí”. É uma empresa que...por mim...ficava aqui até mais tempo.<br />
(TS7).<br />
Para um outro contingente de trabalhadores, porém, as expectativas não<br />
confirmaram, porque perceberam que os <strong>valores</strong> da organização eram conflitantes com os<br />
seus. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:
315<br />
A estrutura é muito grande, é ótimo a estrutura. Tem condições de trabalho, tem condições de<br />
crescer, tem condições de coisas inovadoras, mas agora a política vem podando isso aí ao longo dos<br />
anos. A política, ela pode isso aí. Você pensa: “Pôxa! Agora eu consegui alguma coisa na empresa,<br />
eu vou subir de cargo, meu salário vai melhorar”. Mas aí o que acontece? Vem e muda de governo.<br />
Em outra palavra, volta a estaca zero, então você pensa que ta indo, você já ta é voltando (TS3).<br />
Em relação à maneira que trabalhadores e gestores aprenderam os <strong>valores</strong> da<br />
Interprise, constatou-se que tanto uns como outros assimilaram esses <strong>valores</strong> por meio da<br />
atuação dentro da organização e de conquistas para aumentar os direitos dos trabalhadores.<br />
Por outro lado, alguns gestores nem tiveram a intenção de assimilar esses <strong>valores</strong>, já foram<br />
logo impondo seus <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> à Interprise.<br />
“Eu... eu não sei se eu aprendi com os <strong>valores</strong> da Interprise não. Eu tentei foi... os meus <strong>valores</strong><br />
pessoais tentar, né? me impor aqui dentro, com os meus <strong>valores</strong>, né? (GS2)<br />
Uma explicação para a imposição dos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> por parte de alguns<br />
gestores é o fato de que quando entraram na organização estavam em estágio inicial de<br />
socialização, não tendo ainda internalizado a cultura e os <strong>valores</strong> da Interprise, ou seja, por<br />
serem novatos ainda enfatizavam seus <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong>.<br />
Um resultado obtido e que chama a atenção, nessa categoria, é o fato de o<br />
estágio inicial da socialização dos trabalhadores ter sido, de certa forma, difícil e<br />
conturbado. Eis um trecho de <strong>entre</strong>vista que exemplifica tal situação:<br />
[...] Entrar na Interprise aqui penei pra caramba. Aos poucos fui vendo isso aqui e uma realidade<br />
totalmente diferente da que eu tinha lá fora, foi difícil pra mim. Muita pressão, muito...sei lá,<br />
pessoas querendo puxar o tapete uma da outra. Horrível! Horrível! Não tive uma<br />
impressão...pensava que se fosse pra trabalhar assim...sei lá, a pessoa devia, né? ter disponibilidade<br />
de querer bem você. Pra mim não foi nada bom. Foi terrível (TS1).<br />
Conclui-se, portanto, que, por mais que as expectativas dos trabalhadores e gestores tenham ou<br />
não sido atingidas em relação a Interprise, trabalhar hoje nessa organização tornou-se posição de status social<br />
e de sobrevivência para quem conhece apenas essa realidade. A assimilação dos <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong><br />
aconteceu na convivência do dia-a-dia. Entretanto, no processo de socialização descobre-se que, ainda que
316<br />
existam, <strong>entre</strong> os trabalhadores da Interprise, as aspirações e atitudes universalistas, a isso não corresponde a<br />
crença de que as regras do jogo sejam as mesmas para todos, o que provavelmente tem implicações negativas<br />
do ponto de vista da formação de um ethos de envolvimento e comprometimento com o setor público.<br />
• Valores Organizacionais: nessa categoria pôde ser constatado que, em<br />
relação aos trabalhadores, os mesmos consideram que a Interprise possui características e<br />
<strong>valores</strong> próprios. Essas características se dividem em positivas e negativas. As positivas<br />
dizem respeito ao crescimento profissional e à capacidade técnica do quadro de<br />
trabalhadores. Já as negativas se referem a uma organização que não pratica a ética<br />
faltando-lhe profissionalismo.<br />
Você pode subir na empresa, eu sei que eu tô no final de carreira, mas eu acho que quem tá entrando<br />
agora, tem que pensar nisso que a empresa tem um plano de carreira muito bom (TS7).<br />
Estrutura dentro da organização, administradores com força de vontade que saiba conduzir os<br />
colaboradores dessa organização pra não deixar eles caírem no descrédito, não ficarem<br />
desacreditados (TS3).<br />
Precisava ser mais ética, mais profissional no sentido de não querer...de você ver que as pessoas só<br />
querem levar vantagem mesmo, ou então, de atender a situação política. Então, eu penso que a ética,<br />
o lado profissional, a visão do outro também seria, eu acho muito importante colocar muito no lugar<br />
do outro e administrar não só querendo levar vantagem (TS1).<br />
Por outro lado, os <strong>valores</strong> da Interprise, segundo a percepção dos trabalhadores,<br />
são de uma organização que segue normas, proporciona um bom relacionamento<br />
interpessoal <strong>entre</strong> os trabalhadores e é investida de autoridade.<br />
Quanto à percepção dos gestores em relação aos <strong>valores</strong> da Interprise, esses<br />
manifestaram que a organização prioriza o respeito pelo cliente, a honestidade, o<br />
desenvolvimento, a comunicação, a amizade, a presteza e a saúde.<br />
Entretanto, houve alguns gestores que afirmaram que a Interprise, por ser uma<br />
organização bastante hierarquizada, seus <strong>valores</strong> são setorizados e por isso não são<br />
organizados, ou seja, não são <strong>valores</strong> estabelecidos, enraizados.<br />
O que chama atenção nessa categoria é que essa percepção dos <strong>valores</strong><br />
<strong>organizacionais</strong> não é da totalidade dos trabalhadores e gestores. Os primeiros alegam que<br />
a Interprise é uma organização que não atua com transparência nas suas ações e com os<br />
trabalhadores. Alguns gestores, por sua vez, recusaram-se a falar desses <strong>valores</strong>,
317<br />
demonstrando um sentimento de injustiça quanto a ações não tão éticas que fazem parte do<br />
dia-a-dia da organização.<br />
[...] ainda existe muito isso na Interprise. Coação, nós já fomos coagidos, aí num processo aí, que<br />
nós tinha de hora extra, o pessoal foi todo coagido a desistir do processo. Na época, eu.... eu falei,<br />
inclusive, na televisão, que não deveria porque é... é... crime, coação era crime. E aí eu... aí eu<br />
envolvi toda a diretoria como culpada dessa coação (TS10).<br />
Pode-se concluir, portanto, que em geral a percepção tanto dos trabalhadores<br />
quanto dos gestores se volta para os <strong>valores</strong> característicos de Conservação e Hierarquia,<br />
resultado esse que confirma os encontrados pelo estudo quantitativo.<br />
Os <strong>valores</strong> de Conservação são seguidos principalmente em situações que<br />
envolvem riscos, como por exemplo, o controle da saúde da população.<br />
Os <strong>valores</strong> de Hierarquia têm importância predominante na Interprise, a<br />
começar pela própria característica da representação gráfica em uma estrutura funcional,<br />
onde a interação e comunicação são estabelecidas em linha vertical, dando ênfase à<br />
autoridade, obediência, unidade de comando, controle, obrigações e direitos.<br />
Esses <strong>valores</strong> explicam o fato de, às vezes, a Interprise agir de forma<br />
autoritária, adotando controle do comportamento e punição daqueles que desobedecem às<br />
prescrições normativas, sobrepondo, assim, os seus <strong>valores</strong> aos dos trabalhadores.<br />
• Interação <strong>entre</strong> Valores Individuais e Valores Organizacionais: nessa<br />
interação se sobressaem dois tipos de relação: a dos <strong>valores</strong> convergentes e a dos<br />
divergentes.<br />
Na interação convergente <strong>entre</strong> <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>,<br />
os trabalhadores e gestores consideram que tanto uns como outros têm objetivos comuns e<br />
buscam um futuro melhor para si e para a organização.<br />
Nesse sentido há uma satisfação resultante da combinação dos <strong>valores</strong><br />
<strong>individuais</strong> dos trabalhadores e gestores com suas atividades na organização, o que<br />
demonstra que na relação <strong>entre</strong> trabalhador e trabalho não somente se ganha como também<br />
se constrói um sentido para esse trabalho, estabelecendo um status social que não se<br />
restringe ao seu ambiente físico, mas se estende para a vida pessoal e familiar dos<br />
indivíduos.<br />
Me sinto bem, me sinto gratificado (TS3).
318<br />
Eu me sinto bem, sinto bem... e... sinto que estou fazendo aquilo que deveria ser feito (TS8).<br />
Me sinto bem. Muito bem, porque a gente fazer aquilo que gosta combinando com aquilo que deve<br />
ser feito, é ótimo, me sinto bem (TS7).<br />
Na interação divergente <strong>entre</strong> os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>,<br />
trabalhadores e gestores se manifestam no sentido de que isso acontece devido à relação de<br />
poder existente na hierarquia da organização. Esse poder consegue sempre sobrepor os<br />
<strong>valores</strong> da organização aos dos trabalhadores. Um outro fator que contribui para essa<br />
divergência é a interferência política que, quando acontece, tenta conduzir as atividades da<br />
organização a um fim desejado ou desviá-las de um fim não desejado, causando frustração<br />
aos trabalhadores, gerando também conflito, porque a cúpula da Interprise exige ética<br />
como valor dentro da organização, porém, sem praticá-la.<br />
[...] Embora tenha muita coisa que, que às vezes, tenha uma certa determinação hierárquica, que eu<br />
vejo que poderia relevar, mas, como eu digo, é... existe uma hierarquia, sou subordinada, muitas<br />
vezes eu entro até em conflito, hierárquico mesmo (TS1).<br />
[...] A empresa gira em torno político também, ela tem seus interesses políticos, então, não dá para<br />
você focar muito dentro dessa organização para saber qual que é o seu interesse, o interesse da<br />
empresa em você e o seu interesse na empresa. [...] Agora, a empresa, ela tem essas condições todas,<br />
porque é uma empresa que... para o mercado é uma empresa que envolve ser humano, mas a política<br />
tem hora que vem aos pouquinhos e estraga essa fatia aí, vai tirando as fatias (TS3).<br />
São conflitantes. Porque, por exemplo, exigir das pessoas, que estão numa organização, que de<br />
alguma forma ou de outra, tem ingerência política muito grande, exigir dessas pessoas que elas<br />
tenham comportamento ético, é no mínimo presunção, no mínimo preciosismo (GS4).<br />
Há uma insatisfação no trabalho, resultado da divergência <strong>entre</strong> os <strong>valores</strong><br />
<strong>individuais</strong> dos trabalhadores e gestores e suas atividades na organização. Sentem-se mal,<br />
inseguros, com medo e em conflito quando passam por esses momentos. Às vezes,<br />
submetem-se às ações e cumprem as ordens determinadas.<br />
Conclui-se, portanto, que diante das situações que ocorrem na interação <strong>entre</strong><br />
os <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, o que prevalece na Interprise é a<br />
divergência <strong>entre</strong> eles, sobrepondo sempre os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, até porque os<br />
orientadores de suas ações – Conservação, Hierarquia e Domínio – legitimam essa ação.<br />
Os trabalhadores, por se considerarem legítimos representantes da Interprise e por
319<br />
dependerem dela para sua sobrevivência, entendem que devem agir de acordo com os<br />
<strong>valores</strong> por ela adotados.<br />
A explicação para esse fenômeno é que os trabalhadores e gestores, na maioria<br />
das vezes, submetem-se a fazer aquilo que vai contra seus <strong>valores</strong>, porque as vantagens que<br />
recebem da Interprise – estabilidade no emprego, salário, plano de saúde, fundo de pensão,<br />
empréstimo consignável com taxas de juros menores que a do mercado, etc. – se<br />
sobrepõem aos seus <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> no momento de tomar a decisão quanto a fazer ou<br />
não fazer determinada tarefa que lhe causará conflito. Preferem passar pelo sofrimento de<br />
vivenciar um conflito, a abrir mão de privilégios que dificilmente encontrarão em outra<br />
organização.<br />
Segundo Pagès (1993), pelo fato de a organização oferecer satisfações<br />
materiais, ideológicas e espirituais, os trabalhadores se reconhecem nela a ponto de se<br />
identificarem com ela. Essas satisfações são inerentes ao sistema de <strong>valores</strong> e crenças<br />
propostos pela organização, que constitui um quadro de referência coerente e ambicioso,<br />
uma concepção de mundo e uma moral de ação.<br />
• Qualidade de Vida no trabalho (QVT): em relação a essa categoria, pôde<br />
ser constatado:<br />
1. Nem todos os trabalhadores da Interprise conhecem o Programa de<br />
Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT) e quando conhecem apenas ouviram falar dele.<br />
Isso porque o Programa não chega em todas as unidades da organização.<br />
[...] conheço, mas a gente que tá afastado pra cá, na [...], eu não cheguei a ver isso aí não (TS7).<br />
2. A implantação do Programa beneficiou apenas uma parte dos trabalhadores,<br />
contribuindo para melhorar seu bem-estar, disposição e diminuir stress.<br />
A satisfação de trabalhar com mais é... mais vitalidade, você tem mais... ânimo de trabalho, você<br />
fica mais ativo, né? Porque às vezes quando você tá com algum problema, você... fica um pouco<br />
aquém da produtividade sua (TS2).
320<br />
3. Quanto a divergência ou congruência de seus <strong>valores</strong> com o PQVT, uma<br />
parte dos trabalhadores afirma que eles são convergentes; outro grupo, que não conhece o<br />
Programa ou que ele não chega em suas unidades, ficando impossibilitados, portanto, de<br />
fazer qualquer avaliação. Os resultados demonstram que os trabalhadores que dizem haver<br />
compatibilidade de seus <strong>valores</strong> são justamente aqueles que conhecem o Programa e<br />
participam de suas atividades, isto é, são os que possuem um referencial que os possibilita<br />
fazer essa comparação, conforme trecho de <strong>entre</strong>vista:<br />
É compatível. Porque eu acho que toda vida eu fui uma pessoa que... eu, por exemplo, fumei muitos<br />
anos e... com esse programa eu parei de fumar. Me alertou com relação ao cigarro (TS4).<br />
4. Os motivos para implantação do PQVT geraram uma controvérsia <strong>entre</strong> os próprios gestores<br />
do Programa. Para alguns, o PQVT foi implantado em virtude da existência de um outro Programa o<br />
Programa da Qualidade do Produto (PQP). Outros gestores, porém, alegaram que os clientes internos e<br />
externos foram o grande diferencial para que se implantasse o PQVT na Interprise.<br />
Primeiro a Interprise implantou o PQP e trabalhou algum tempo nesse PQP. Depois chegamos à<br />
conclusão de que sem uma QVT para o trabalhador não tem como ter qualidade e produto (GS1).<br />
Os motivos foi uma maior dedicação aos empregados e fornecedores, porque hoje a organização ela<br />
tem esse interesse. (GS2).<br />
5. Após a decisão de implantar o Programa a primeira medida a ser tomada dividiu a equipe de<br />
gestores: uns consideravam que o Programa deveria em primeiro lugar, ser apresentado à cúpula da<br />
organização; outros, já partiram para as ações práticas.<br />
O primeiro passo foi apresentar o programa para a Diretoria e Superintendência pra nós vendermos<br />
o programa. Vendido o programa, aí nós começamos com as primeiras ações (GS1).<br />
O que aconteceu foi que esse programa foi mais assim... mais voltado para essas questões ligada aos<br />
trabalhadores, né? como a ginástica laboral e combate ao alcoolismo, né? ajuda aos diabéticos<br />
(GS2).<br />
6. O surgimento do setor da qualidade dividiu as opiniões dos gestores: para alguns, esse setor<br />
emergiu da hierarquia existente na Superintendência de Recursos Humanos (RH) em 1980; para outros, o<br />
setor da qualidade surgiu como uma assessoria especial ligada à Presidência da Interprise em 1998.<br />
Quando eu <strong>entre</strong>i aqui em 80, ele já existia. Existia já o serviço social. Ele na época foi criado com<br />
todos os serviços sociais de toda empresa. Hoje, o serviço social, na sua realidade, ele não existe no<br />
organograma da empresa. Existem assistentes sociais que são lotados na Superintendência de RH e<br />
que tem por objetivo orientar os empregados quanto aos seus benefícios (GS1).
321<br />
Olha, essa questão da qualidade de vida, eu tô mais ligado a questão da qualidade como um todo. O<br />
nosso programa da qualidade não trabalha essas variáveis oficialmente. O setor da qualidade é uma<br />
assessoria especial de gestão da qualidade. Ela foi criada em 98 e está ligada a presidência (GS2).<br />
7. As metas e objetivos do programa também geraram controvérsia <strong>entre</strong> os gestores. Enquanto<br />
que para alguns seu alvo era a QVT do trabalhador, para outros o PQVT não teve objetivos específicos<br />
instituídos. Para outros ainda as metas e objetivos se restringiram à disseminação por todas as unidades da<br />
organização.<br />
O objetivo nosso era melhorar a qualidade de vida do empregado em seus vários aspectos (GS1).<br />
Essa questão da qualidade de vida do trabalhador, ela veio mais como semi-produto, né? No<br />
programa da qualidade, né? Não teve assim metas, como a gente também não tinha dentro do<br />
programa de qualidade naquela época, lá em 95, né? A gente não tinha metas estabelecidas, a gente<br />
só foi fazer isso em 97, quando a gente passou a fazer, fixar objetivos dentro do programa de<br />
qualidade, não a qualidade de vida, né? Mas, dentro do programa de qualidade (GS3).<br />
8. Não houve um estudo quanto à demanda de recursos humanos, financeiros e materiais<br />
destinados ao Programa. Faltou, por parte dos gestores planejamento e previsão de recursos para<br />
investimento nessa área.<br />
A gente foi mais tocando assim as coisas, né? Não era uma coisa estruturada, planejada como hoje<br />
se prega. Não tinha essa coisa bem estruturada (GS2).<br />
Não. Eu acho que isso foi...foi surgindo mesmo. Não teve assim...foi surgindo de acordo com o que<br />
ia surgindo em cada programa, cada projeto, se estruturava alguma coisa (GS3).<br />
9. A definição de responsabilidades para o PQVT resultou em controvérsias <strong>entre</strong> os gestores.<br />
Para alguns não foi definido nenhum tipo de responsabilidade sobre o Programa. Outros, porém, alegaram<br />
que foram definidas as responsabilidades do mesmo.<br />
A cada programa, a cada projeto que é desenvolvido, nós temos parceiros. [...], por exemplo, no<br />
programa que foi desenvolvido em outubro, Dia Mundial de Combate a Obesidade. Então, nós<br />
tivemos como parceiro a assessoria de comunicação, a gerência de serviços e a associação dos<br />
trabalhadores da Interprise (GS1).<br />
Sim. Nós temos as interfaces do programa. A gente tem o manual da qualidade que é voltado para o<br />
sistema de gestão, não para o programa de qualidade do trabalhador, mas o programa de gestão da<br />
qualidade, onde estão definidas claramente as atribuições no programa de cada área (GS4).<br />
10. As dificuldades encontradas durante a implantação do Programa foram, para alguns<br />
gestores, decorrentes da falta de adesão dos trabalhadores à ginástica laboral. Para outros gestores, foi a falta<br />
de comprometimento dos trabalhadores com o Programa que gerou dificuldades. Um paradoxo existente aqui<br />
foi quanto ao comprometimento da diretoria da organização, que, para alguns, foi de total descaso e para<br />
outros superou as expectativas.
322<br />
[...] como hoje a Interprise tá aí com a ginástica laboral, apesar de ser obrigado, dizem que é<br />
obrigado, né? Mas na minha turma, por exemplo, que eu faço é... parece que o maior número de<br />
pessoas que já teve lá foi 35 pessoas. Quer dizer, a Interprise, aqui na Sede, tem 500 pessoas (GS2).<br />
A Diretoria não manda parar o programa da qualidade. Não existe ninguém politicamente correto<br />
que fala assim “Não, eu sou contra o programa da qualidade, mas eles fazem, mas eles fazem, não<br />
tem problema nenhum, eu no máximo, não atrapalho”, né? Mas não dá para fazer um programa com<br />
gente assim. Dá pra fazer programa com gente que entende a importância de colaborar com o<br />
programa (GS4).<br />
11. A implantação do Programa resultou em desencontros <strong>entre</strong> os gestores. Se<br />
por um lado teve o mérito de trazer inúmeros benefícios para o trabalhador, mesmo<br />
enfrentando a escassez de investimentos, a venda do Programa a cada gestão que passa<br />
pela organização e a baixa adesão dos trabalhadores, por outro, sua implantação foi feita de<br />
forma totalmente amadora, sem estrutura, sem metas e sem comprometimento da diretoria<br />
da organização.<br />
[...] faço uma avaliação positiva. Eu diria que a melhora da saúde, a melhora da qualidade de vida<br />
dos empregados, o melhor entendimento deles a respeito da saúde deles, mesmo com a dificuldade<br />
de ter que vendê-lo a cada gestão (GS1).<br />
A avaliação assim... que a gente fez uma coisa muito é, amadorística. Faltou ser um processo mais<br />
estruturado. Falta de estruturação mesmo do programa e da diretoria (GS2).<br />
12. A mudança de imagem da organização, após a implantação do PQVT,<br />
provocou opiniões divergentes <strong>entre</strong> os gestores. Para uns, a organização passou a se<br />
conscientizar mais de sua responsabilidade social. Para outros as mudanças ocorreram<br />
somente no comportamento dos trabalhadores, não mudando em nada a imagem da<br />
Interprise perante a sociedade, que já tem uma representação social arraigada da<br />
organização.<br />
Com certeza, houve mudança [...] e vemos isso como uma responsabilidade social da empresa é...<br />
com muito bons olhos (GS1).
323<br />
Não, ainda não. Eu... eu entendo que... a Interprise ela... ela tem uma imagem é... na empresa, uma<br />
imagem na sociedade que é de uma empresa que presta um serviço importante. Mas o programa não<br />
mudou a imagem da empresa não. Eu acho que mudou o comportamento interno (GS4).<br />
13. As expectativas da organização sobre o PQVT não foram alcançadas. A<br />
maioria dos gestores alegou que isso aconteceu devido à falta de apoio e persistência, pelo<br />
Programa se pautar por ações muito amadoras, bem como se caracterizar como um<br />
Programa totalmente vulnerável.<br />
Na integridade elas não foram não. Não foram atendidas em função da falta de apoio (GS1).<br />
Eu acredito que não. Faltou persistência. Então, eu acho que foi mais um assim... uma coisa que<br />
vamo faze, agora não deu certo, deixa pra lá, né? (GS2).<br />
Feitas as devidas considerações a respeito desta categoria, conclui-se que o<br />
PQVT desenvolvido pela Interprise mostrou ser um Programa criado dentro da<br />
informalidade, sem planejamento e objetivos definidos. Percebe-se que faltou aos seus<br />
gestores a visão de que estariam executando um trabalho a médio e longo prazos,<br />
carecendo de diretrizes e planejamento, pois o PQVT significa um trabalho contínuo,<br />
sendo um de seus objetivos tornar a cultura da organização cada vez mais voltada para o<br />
conceito de excelência em qualidade de vida.<br />
É um Programa desenvolvido pela metade, pois não abrange todas as unidades<br />
da organização. É preciso que a Interprise, por meio dos gestores que administram o<br />
PQVT, procure atentar para a gama de benefícios que ele pode oferecer para os<br />
trabalhadores devendo, portanto, ser expandido para toda a organização, atingindo aqueles<br />
que ainda não tiveram acesso a ele.<br />
Fica nítida a existência de um setor da qualidade na organização, mas que a ele<br />
não é atribuída a competência de administrar o PQVT. Recomenda-se que a organização<br />
Interprise incorpore no setor da qualidade a função de gerenciar o PQVT, já que o setor<br />
existe e trabalha com a política da qualidade da organização, lembrando que a qualidade
324<br />
tem de envolver não só os produtos e serviços, mas a vida do trabalhador, ou seja, o seu<br />
bem-estar e a satisfação no trabalho.<br />
A falta de comprometimento da cúpula da organização não gerou expectativas<br />
positivas quanto ao desempenho do Programa. Com isso essas expectativas, por parte da<br />
organização, não foram alcançadas. Sugere-se à Interprise uma reavaliação da estrutura do<br />
PQVT, principalmente no que diz respeito ao comprometimento e ao gerenciamento dele<br />
pelo setor da qualidade, para que ele possa sair da informalidade e tornar-se um Programa<br />
comprometido com o trabalhador.<br />
Propõe-se também que o PQVT da Interprise busque reformular-se no sentido<br />
de apresentar uma proposta visando conhecer melhor as variáveis que interferem no ajuste<br />
do trabalhador às mudanças nas condições de trabalho, visando facilitar essa relação,<br />
promovendo melhoria da qualidade de vida do trabalhador, propiciando assim melhores<br />
condições de produtividade.<br />
Relacionando os resultados dos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong><br />
com o PQVT da Interprise, nota-se que em relação aos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> Benevolência,<br />
Conformidade, Universalismo e Segurança, o PQVT revelou ser positivo. Esse resultado<br />
pode ser explicado a partir da hipótese de que o PQVT, como tentativa de introduzir<br />
melhorias no ambiente laboral e de humanizar o trabalho, provoca experiências subjetivas<br />
de aceitação do trabalhador, estabilidade nas relações, valorização do respeito e aceitação<br />
dos costumes e idéias manifestadas na cultura de cada trabalhador.<br />
Fica clara nessa relação a busca pela cooperação, uma vez que os programas de<br />
QVT enfatizam o atingimento de objetivos e metas grupais e não <strong>individuais</strong>. Essa é uma<br />
forma de buscar a melhoria nos relacionamentos interpessoais e, conseqüentemente, a<br />
qualidade de vida no contexto do trabalho. Por isso, há um mesmo conjunto de <strong>valores</strong> que<br />
buscam metas em comum.<br />
Dessa forma, as experiências positivas, uma vez compartilhadas com o grupo e<br />
transmitidas, tornam-se pressupostos que tendem a se repetir em outros momentos e<br />
circunstâncias de trabalho, constituindo-se em uma prática já aceita pelo grupo.<br />
Por outro lado, essa relação com os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, onde predominou<br />
a Conservação, Hierarquia e Domínio, demonstrou uma certa dificuldade, uma vez que no<br />
valor de Conservação os interesse do indivíduo não é visto como diferente dos grupos e
325<br />
enfatizam a manutenção do status quo e a interdição de comportamentos que possam<br />
perturbar as normas e as tradições da organização.<br />
No valor de Hierarquia busca-se garantir o comprometimento dos membros da<br />
organização com sua missão, sendo que estão presentes os <strong>valores</strong> culturais de autoridade,<br />
poder social, influência, fiscalização e supervisão; e no valor de Domínio há uma busca na<br />
tentativa de firmar-se dominando os recursos materiais, o mercado, a tecnologia e o<br />
conhecimento na área de atuação, sendo que os <strong>valores</strong> presentes nessa dimensão referemse<br />
ao domínio, controle e exploração do ambiente físico e social para obtenção da autoafirmação.<br />
A importância dada e compartilhada com esses <strong>valores</strong> pela Interprise resulta<br />
em uma cultura organizacional autoritária e burocrática, limitando a iniciativa e a tomada<br />
de decisão, pois trata-se de uma organização pública com excessivo controle de<br />
procedimentos, gerando uma administração engessada, em que seus gestores são<br />
responsáveis perante uma autoridade externa, resultando assim em tendência à<br />
centralização das decisões.<br />
Os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> podem ser explicados pela sua significativa<br />
estabilidade dentro da organização, e também por se tratar de uma organização que atua há<br />
mais de trinta anos no mercado goiano, pressupondo uma cultura organizacional<br />
fortemente sedimentada, com características distintas. Isso não quer dizer que os <strong>valores</strong><br />
<strong>organizacionais</strong> sejam imutáveis, mas que a sua mudança é lenta. Dessa forma, inovações<br />
introduzidas pelo PQVT ou decorrentes de qualquer outro tipo de intervenção podem ter<br />
impacto sobre os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong>, mas não de imediato nem em curto prazo. E pelo<br />
fato de esses <strong>valores</strong> sustentarem as atitudes, determinarem a forma de julgar o<br />
comportamento organizacional e constituírem uma motivação para a ação, eles, de certa<br />
forma, estão sedimentados na cultura da organização pública pesquisada.<br />
Além desses aspectos, uma outra variável que contribuiu para o resultado<br />
obtido e deve ser levada em consideração é o efeito da descontinuidade tão característico<br />
neste tipo de organização, ou seja, por se tratar de uma organização pública, a alternância<br />
de poder ocorre de quatro em quatro anos. Com isso, muitos programas implantados, <strong>entre</strong><br />
eles o PQVT, sofrem o efeito de descontinuidade em decorrência da troca de governo.<br />
Cada governo só privilegia projetos que podem ser concluídos em seu mandato, para ter<br />
retorno político.
326<br />
Mais uma vez, porém, pode-se perceber uma dinâmica contraditória quando a<br />
organização pesquisada prioriza o valor Domínio ao mesmo tempo que dá importância aos<br />
<strong>valores</strong> de Conservação e Hierarquia. Reafirma-se que essa contradição pode ser<br />
explicada pelo momento que a organização tem passado no sentido de ser privatizada.<br />
Diante de um mercado que passa a ser competitivo com as privatizações nesse setor, ela<br />
precisa garantir sua permanência e continuidade, por isso é que se dá importância aos<br />
<strong>valores</strong> do pólo Domínio.<br />
Portanto, se por um lado há uma relação de centralização de poder, gerando<br />
uma administração entravada com um alto nível de burocracia e que dificulta implantação<br />
de inovações, d<strong>entre</strong> elas o PQVT, por outro, há uma relação <strong>entre</strong> inovação de práticas e<br />
políticas administrativas que facilita a implantação de um PQVT. Essas mudanças de<br />
práticas e políticas administrativas sobre os <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> ocorrem somente<br />
quando as inovações introduzidas já estão bem estabelecidas, isto é, quando já existem<br />
garantias de que elas chegaram de fato e irão cumprir o papel a que se propuseram.<br />
È natural que um PQVT desenvolvido em organizações públicas enfrente<br />
dificuldades como um programa desta natureza, ou seja, com falhas no seu planejamento e<br />
ações inexperientes, haja vista que nas organizações públicas há predominância dos<br />
processos políticos, que muitas vezes oneram de várias formas os processos operacionais e<br />
administrativos, ou mesmo se opõem a eles.<br />
É de se esperar também que um programa desse porte, em organizações<br />
públicas, seja interrompido na mudança de gestão. Segundo Schall (1997), essa<br />
descontinuidade administrativa é um dos pontos que mais diferencia a organização pública,<br />
pois a cada gestão só se privilegia projeto que se possa concluir dentro do mandato, para<br />
ter retorno político; e também a cada gestão iniciam-se novos projetos, muitas vezes quase<br />
idênticos, reivindicando a autoria para si.<br />
Um outro aspecto preditor de um PQVT em organizações públicas é a<br />
limitação crítica e os interesses políticos dentro das mesmas que, na maioria das vezes,<br />
explica o fato dos indivíduos envolvidos diretamente na organização não tomarem decisões<br />
que induziriam uma melhoria do ambiente e da estruturação do trabalho.<br />
Torna-se relevante, neste momento, lembrar que os <strong>valores</strong> são o núcleo da<br />
cultura. A cultura de organizações públicas, portanto, pode até ser um entrave para o<br />
processo de um PQVT, mas acredita-se que, ao investir no ser humano, desvelar, conhecer
327<br />
e analisar os elementos culturais da organização, bem como capacitar gestores que dêem<br />
continuidade às ações administrativas, estar-se-á somando fatores que podem criar, ao<br />
longo do tempo, uma cultura propícia ao estado da qualidade.<br />
Enquanto as organizações públicas se constituírem em “cabides de emprego”<br />
de indivíduos sem comprometimento, gerenciadas por autocratas despreparados, pouco se<br />
obterá em termos de melhoria de QVT. É preciso políticas adequadas, almejando<br />
comportamento de adesão, iniciativa e compromisso pessoal. Investir e acreditar nas<br />
pessoas é a estratégia principal, quando se pretende elevar o padrão de QVT.<br />
Finalizando, este estudo merece ser mais aprofundado para que os resultados<br />
ora alcançados sejam ampliados. Para estudos futuros a serem realizados sobre este tema,<br />
sugere-se:<br />
• analisar a percepção dos trabalhadores quanto aos <strong>valores</strong> <strong>individuais</strong> e <strong>organizacionais</strong><br />
em uma organização pública que não tenha Programa de Qualidade de Vida no<br />
Trabalho (PQVT), a fim de que se possa confrontar os resultados com as conclusões<br />
obtidas a partir desta pesquisa;<br />
• estender a aplicação desta temática de pesquisa a uma organização do setor privado que<br />
tenha Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (PQVT), a fim de se fazer um<br />
estudo comparativo com os resultados da presente pesquisa.
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A N E X O S
337<br />
Anexo 1<br />
O ROTEIRO DA ENTREVISTA DOS TRABALHADORES OBEDECEU A<br />
SEGUINTE ESTRUTURA:<br />
1. Identificação: nome, sexo, idade, estado civil, escolaridade, cargo e tempo de casa.<br />
2. Quando você pensa nos seus <strong>valores</strong>, quais são as primeiras cinco palavras que te ocorrem?<br />
3. O que o(a) levou a escolher esta organização como campo de trabalho? Como imaginava que seria?<br />
4. O que você imaginava sobre a organização se confirmou ou não?<br />
5. Como você aprendeu sobre os <strong>valores</strong> da organização?<br />
6. Ao se deparar com os <strong>valores</strong> da organização, o que você sentiu? Como está hoje?<br />
7. Quais os <strong>valores</strong> que considera primordiais para sua vida?<br />
8. Quais são as primeiras cinco palavras que te ocorrem quando você pensa nos <strong>valores</strong> da<br />
organização?<br />
9. Você considera que os seus <strong>valores</strong> e os <strong>valores</strong> da organização combinam? Porquê?<br />
10. Quando no desempenho de suas funções, você precisa fazer algo que coincide com os seus <strong>valores</strong>,<br />
o que acontece com você?<br />
11. Quando no desempenho de suas funções, você precisa fazer algo que não coincide com os seus<br />
<strong>valores</strong>, o que acontece com você?<br />
12. Quais são os <strong>valores</strong> que você acha que norteiam a organização?<br />
13. Você conhece o PQVT da INTERPRISE? Como ficou sabendo?<br />
14. Já participou da alguma atividade do PQVT? Qual? Como foi?<br />
15. Você participou do processo de Implantação do PQVT? Como? Qual foi a sua participação?<br />
16. Na sua opinião, trabalhar em uma empresa que tenha PQVT faz alguma diferença? Qual?<br />
17. Após a implantação do PQVT, o que mudou no seu trabalho?<br />
18. O Programa de Qualidade de Vida no Trabalho desenvolvido pela INTERPRISE é compatível ou<br />
entra em conflito com os seus <strong>valores</strong>?<br />
19. Como você avalia o Programa de Qualidade de Vida no Trabalho desenvolvido pela INTERPRISE?<br />
20. Você acha que há vantagens em estar nesta organização? Quais?<br />
21. Você acha que há desvantagens em estar nesta organização? Quais?<br />
22. Gostaria de dizer mais alguma coisa que não foi perguntado?
338
339<br />
Anexo 2<br />
O ROTEIRO DA ENTREVISTA DOS GESTORES OBEDECEU A SEGUINTE ESTRUTURA:<br />
1. Identificação: nome, sexo, idade, estado civil, escolaridade, cargo e tempo de casa.<br />
2. Quais são os motivos que levaram a empresa implantar o PQVT?<br />
3. Quais departamentos apoiaram o Programa e quais não apoiaram?<br />
4. A empresa divulga de alguma forma aos trabalhadores que possui tal Programa?<br />
Qual a forma de divulgação?<br />
5. Após a idéia estabelecida de implantação do Programa, qual foi o primeiro passo?<br />
6. A empresa possui uma política de pessoal, ou seja, de RH? Qual? Quando foi<br />
instituída? Por quem? Como ela foi e é divulgada atualmente?<br />
7. Como e quando surgiu o setor que gerencia o PQVT da empresa? Qual o seu nível<br />
hierárquico? Quantas pessoas atuam nele? Qual o seu histórico?<br />
8. Como foram escolhidos os responsáveis pela implantação do PQVT? Qual a<br />
formação destas pessoas? Por que tais pessoas foram escolhidas para serem<br />
responsáveis? Qual foi o critério de escolha? Houve a formação de um Comitê de<br />
Coordenação/Implantação? Se houve, teve algum treinamento para este comitê?<br />
Como este comitê funciona?<br />
9. Quais foram os objetivos e metas estipulados?<br />
10. Foi realizada uma previsão de recursos: humanos, financeiros, materiais?<br />
11. Foram realizados sensibilização e treinamento?<br />
12. Qual foi o período de implantação? Início e fim.<br />
13. Como os trabalhadores receberam a idéia inicialmente?<br />
14. Foram realizadas atividades com o objetivo de conscientização e sensibilização dos<br />
trabalhadores antes de iniciarem as atividades de implantação do Programa? Quais<br />
e quando?<br />
15. Foram definidas claramente as responsabilidades de cada uma das áreas e do<br />
pessoal? De que forma?<br />
16. Durante a implantação, houve a necessidade de ajustes? Em que áreas? De que<br />
forma ocorreu? Algumas das metas foram restabelecidas ou repensadas? Quais?<br />
Porque?<br />
17. Houve dificuldades (resistência) no decorrer da implantação? Quais? Como estas<br />
dificuldades foram vistas pela empresa?
340<br />
18. As expectativas que a empresa tinha em relação ao Programa foram atendidas?<br />
Porque? Como?<br />
19. Das metas e objetivos, quais foram alcançadas? Quais ainda estão sendo buscadas?<br />
20. Qual departamento da empresa teve maior impacto com a implantação do PQVT?<br />
Estes impactos foram positivos ou negativos? Que impactos foram estes?<br />
21. Até a conclusão, qual foi o investimento real?<br />
22. Qual a avaliação do processo de implantação? Quais os aspectos positivos e<br />
negativos do Programa? Você tem sugestões para melhorar o Programa?<br />
23. Se fosse para começar hoje a implantação do Programa, o que seria feito de<br />
diferente? Porque?<br />
24. Você acredita que ocorreu alguma mudança na imagem da empresa em decorrência<br />
do PQVT? Quais? Como essas mudanças foram analisadas?<br />
25. Após a implantação do Programa, o que foi implementado?<br />
26. Como você avalia o comprometimento da Diretoria da Empresa em relação ao<br />
Programa? E em relação aos trabalhadores?<br />
27. É feito o controle do Programa? Por quem? De que modo? Qual a periodicidade?<br />
28. Há documentos e registros do programa? Por quem são controlados? Porque é feito<br />
por tal pessoa?<br />
29. Você considera que o PQVT se relaciona com a responsabilidade social da<br />
empresa? De que forma?<br />
30. Quando você pensa nos seus <strong>valores</strong>, quais são as primeiras cinco palavras que te ocorrem?<br />
31. O que o(a) levou a escolher esta organização como campo de trabalho? Como imaginava que seria?<br />
32. O que você imaginava sobre a organização se confirmou ou não?<br />
33. Como você aprendeu sobre os <strong>valores</strong> da organização?<br />
34. Ao se deparar com os <strong>valores</strong> da organização, o que você sentiu? Como está hoje?<br />
35. Quais os <strong>valores</strong> que considera primordiais para sua vida?<br />
36. Quais são as primeiras cinco palavras que te ocorrem quando você pensa nos <strong>valores</strong> da<br />
organização?<br />
37. Você considera que os seus <strong>valores</strong> e os <strong>valores</strong> da organização combinam? Porquê?<br />
38. Quando no desempenho de suas funções, você precisa fazer algo que coincide com os seus <strong>valores</strong>,<br />
o que acontece com você?
341<br />
39. Quando no desempenho de suas funções, você precisa fazer algo que não coincide com os seus<br />
<strong>valores</strong>, o que acontece com você?<br />
40. Quais são os <strong>valores</strong> que você acha que norteiam a organização?<br />
41. Você acha que há vantagens em estar nesta organização? Quais?<br />
42. Você acha que há desvantagens em estar nesta organização? Quais?<br />
43. Gostaria de dizer mais alguma coisa que não foi perguntado?
342<br />
Anexo 3<br />
INVENTÁRIO DE VALORES INDIVIDUAIS<br />
Fonte: Tamayo, A.e Schwartz, S. H. Estrutura motivacional dos <strong>valores</strong> humanos. Psicologia: teoria e<br />
pesquisa, Brasília, DF, v. 9, p. 329-348, set. 1993.<br />
Gostaríamos de pedir a sua colaboração numa pesquisa científica.<br />
Solicitamos que você preencha este questionário até o final de acordo com as instruções. Por favor,<br />
não deixe nenhuma questão sem resposta. Não há respostas certas ou erradas neste questionário. Estamos<br />
interessados na sua opinião pessoal. Da sinceridade de suas respostas depende a qualidade desta pesquisa.<br />
Obrigado por sua colaboração!<br />
QUESTIONÁRIO DE VALORES<br />
INSTRUÇÕES<br />
Neste questionário você deve perguntar a si próprio: “Que <strong>valores</strong> são importantes PARA MIM,<br />
como princípios orientadores em MINHA VIDA, e que <strong>valores</strong> são menos importantes PARA MIM?” Há<br />
duas listas de <strong>valores</strong> nas páginas seguintes. Esses <strong>valores</strong> vêm de diferentes culturas. Entre os parênteses que<br />
se seguem a cada valor, encontra-se uma explicação que pode ajuda-lo a compreender seu significado.<br />
Sua tarefa é avaliar quão importante cada valor é para você como um princípio orientador em sua<br />
vida.<br />
Use a escala de avaliação abaixo:<br />
COMO PRINCÍPIO ORIENTADOR EM MINHA VIDA, esse valor é:<br />
não importante muito<br />
importante<br />
importante<br />
0 1 2 3 4 5 6<br />
0 – significa que o valor não é nada importante, não é relevante como um princípio<br />
orientador em sua vida.<br />
3 – significa que o valor é muito importante.<br />
6 – significa que o valor é muito importante.<br />
Quanto maior o número (0,1,2,3,4,5,6), mais importante é o valor como um princípio orientador em sua vida.<br />
Além dos números de 0 a 6, em suas avaliações você pode usar ainda, os números –1 e 7, considerando que:<br />
-1 – significa que o valor é oposto aos princípios que orientam sua vida.<br />
7 – significa que o valor é de suprema importância como um princípio orientador em sua vida;<br />
geralmente, uma pessoa não possui mais de dois desses <strong>valores</strong>.<br />
COMO PRINCÍPIO ORIENTADOR EM MINHA VIDA, esse valor é:<br />
Oposto de Aos<br />
meus não muito suprema<br />
Valores importante importante importante importância<br />
-1 0 1 2 3 4 5 6 7<br />
No espaço antes de cada valor escreva o número (-1,0,1,2,3,4,5,6,7) que corresponde à avaliação que<br />
você faz desse valor, conforme os critérios acima definidos. Tente diferenciar, tanto quanto possível, os<br />
<strong>valores</strong> <strong>entre</strong> si, usando para isso todos os números. Evidentemente, você poderá repetir os números em suas<br />
respostas/avaliações.<br />
LISTA DE VALORES I<br />
Antes de começar, leia os <strong>valores</strong> de 1 a 32, escolha aquele que é o mais importante para você e<br />
avalie sua importância. A seguir, identifique o(s) valor(es) oposto(s) aos seus <strong>valores</strong> e avalie-os como –1. Se<br />
não houver nenhum valor desse tipo, escolha o, valor menos importante para você e avalie-o como 0 ou 1, de<br />
acordo com sua importância. Depois, avalie os demais <strong>valores</strong> (até 32).<br />
01 __ IGUALDADE (oportunidades iguais para todos)<br />
02 __ HARMONIA INTERIOR (em paz comigo mesmo)<br />
03 __ PODER SOCIAL (controle sobre os outros, domínio)<br />
04 __ PRAZER (satisfação de desejos)<br />
05 __ LIBERDADE (liberdade de ação e pensamento)<br />
06 __ TRABALHO (modo digno de ganhar a vida)<br />
07 __ UMA VIDA ESPIRITUAL (ênfase em assuntos espirituais)
343<br />
08 __ SENSO DE PERTENCER (sentimento de que os outros se importam comigo)<br />
09 __ ORDEM SOCIAL (estabilidade da sociedade)<br />
10 __ UMA VIDA EXCITANTE (experiências estimulantes)<br />
11 __ SENTIDO DA VIDA (um propósito na vida)<br />
12 __ POLIDEZ (cortesia, boas maneiras)<br />
13 __ RIQUEZAS (posses materiais, dinheiro)<br />
14 __ SEGURANÇA NACIONAL (proteção da minha nação contra inimigos)<br />
15 __ AUTO-RESPEITO (crença em meu próprio valor)<br />
16__ RETRIBUIÇÃO DE FAVORES (quitação de débitos)<br />
17 __ CRIATIVIDADE (unicidade, imaginação)<br />
18 __ V AIDADE (preocupação e cuidado com minha aparência)<br />
19 __ UM MUNDO EM PAZ (livre de guerras e conflitos)<br />
20 __ RESPEITO PELA TRADIÇÃO (preservação de costumes vigentes há longo tempo)<br />
21 __ AMOR MADURO (profunda intimidade emocional e espiritual)<br />
22 __ AUTODISCIPLINA (auto-restrição, resistência à tentação)<br />
23 __ PRIVACIDADE (o direito de ter um espaço pessoal)<br />
24 __ SEGURANÇA FAMILIAR (proteção para minha família)<br />
25 __ RECONHECIMENTO SOCIAL (respeito, aprovação pelos outros)<br />
26 __ UNIÃO COM A NATUREZA (integração com a natureza)<br />
27 __ UMA VIDA VARIADA (cheia de desejos, novidades e mudanças)<br />
28 __ SABEDORIA (compreensão madura da vida)<br />
29 __ AUTORIDADE (direito de liderar ou de mandar)<br />
30 __ AMIZADE VERDADEIRA (amigos próximos e apoiadores)<br />
31 __ UM MUNDO DE BELEZA (esplendor da natureza e das artes)<br />
32 __ JUSTIÇA SOCIAL (correção da injustiça, cuidado para com os mais fracos)<br />
LISTA DE VALORES II<br />
Agora avalie quão importante é para você cada um dos <strong>valores</strong> seguintes, como um princípio<br />
orientador em sua vida. Estes <strong>valores</strong> estão expressos como modelos de agir que podem ser mais ou menos<br />
importantes para você. Mais uma vez, tente diferenciar tanto quanto possível os <strong>valores</strong> <strong>entre</strong> si, usando todos<br />
os números.<br />
Antes de começar, leia os <strong>valores</strong> de 33 a 60, escolha aquele que é o mais importante para você e<br />
avalie sua importância. A seguir identifique o(s) valor(es) oposto(s) aos seus <strong>valores</strong> e avalie-os como –1. Se<br />
não houver nenhum valor desse tipo, escolha o valor menos importante para você e avalie-o como 0 ou 1, de<br />
acordo com sua importância. Depois, avalie os demais <strong>valores</strong> (até 61).<br />
COMO PRINCÍPIO ORIENTADOR EM MINHA VIDA, esse valor é:<br />
Oposto de Aos<br />
meus não muito suprema<br />
Valores importante importante importante importância<br />
-1 0 1 2 3 4 5 6 7<br />
33 __ INEPENDENTE (ser auto-suficiente e auto-confiante)<br />
34 __ MODERADO (evitar sentimentos e ações extremadas)<br />
35 __ LEAL (ser fiel aos amigos e grupos)<br />
36 __ AMBICIOSO (trabalhar arduamente, ter aspirações)<br />
37 __ ABERTO (ser tolerante a diferentes idéias e crenças)<br />
38 __ HUMILDE (ser modesto, não me autopromover)<br />
39 __ AUDACIOSO (procurar a aventura, o risco)<br />
40 __ PROTETOR DO AMBIENTE (preservar a natureza)<br />
41 __ INFLUENTE (exercer impacto sobre as pessoas e eventos)<br />
42 __ RESPEITOSO PARA COM OS PAIS E IDOSOS (reverenciar pessoas mais velhas)<br />
43 __ SONHADOR (ter sempre uma visão otimista do futuro)<br />
44 __ AUTO-DETERMINADO (escolher meus próprios objetivos)<br />
45 __ SAUDÁVEL (gozar de boa saúde física e mental)<br />
46 __ CAPAZ (ser competente, eficaz, eficiente)<br />
47 __ CIENTE DOS MEUS LIMITES (submeter-me às circunstâncias da vida)
344<br />
48 __ HONESTO (ser sincero, autêntico)<br />
49 __ PRESERVADOR DA MINHA IMAGEM PÚBLICA (proteger minha reputação)<br />
50 __ OBEDIENTE (cumprir meus deveres e obrigações)<br />
51 __ INTELIGENTE (ser lógico, racional)<br />
52 __ PRESTATIVO (trabalhar para o bem-estar de outros)<br />
53__ ESPERTO (driblar obstáculos para conseguir o que quero)<br />
54 __ QUE GOZA A VIDA (gosta de comer, sexo, lazer etc.)<br />
55 __ DEVOTO (apegar-me fortemente à fé religiosa)<br />
56 __ RESPONSÁVEL (ser fidedigno, confiável)<br />
57 __ CURIOSO (ter interesse por tudo, espírito exploratório)<br />
58 __ INDULGENTE (estar pronto a perdoar os outros)<br />
59 __ BEM SUCEDIDO (atingir os meus objetivos)<br />
60__ LIMPO (ser asseado, arrumado)<br />
61 __ AUTO-INDIULGÊNCIA (fazer coisas prazerosas)<br />
DADOS COMPLEMENTARES<br />
(Por favor, não deixe de responder)<br />
1. Sexo: Masculino ( ) Feminino ( )<br />
2. Idade: __________________________<br />
3. Estado Civil: Solteiro ( ) Casado ( ) Divorciado ( ) Outros ( )<br />
4. Escolaridade: Primário ( ) 1° Grau ( ) 2° Grau ( ) Superior ( )<br />
5. Qual o seu cargo na organização: ________________________________<br />
6. Em que nível da hierarquia da organização fica o seu cargo:<br />
( ) Diretoria<br />
( ) Assessoria<br />
( ) Superintendência<br />
( ) Gerência<br />
( ) Supervisão<br />
( ) Coordenadoria<br />
OBRIGADO PELA COLABORAÇÃO!
INVENTÁRIO DE VALORES ORGANIZACIONAIS<br />
Fonte: MENDES, A M. Valores e vivências de prazer-sofrimento no contexto organizacional.<br />
Tese (doutorado) – Universidade de Brasília, Brasília, 1999.<br />
INSTRUÇÕES<br />
Neste questionário você deve perguntar a si próprio: “Que <strong>valores</strong> são importantes para a<br />
organização (empresa, instituição etc) em que trabalho?”<br />
Entende-se por <strong>valores</strong> <strong>organizacionais</strong> os princípios que orientam a vida das organizações.<br />
Nas páginas seguintes há uma lista de <strong>valores</strong>. Esses <strong>valores</strong> foram levantados em diferentes<br />
organizações. Entre os parênteses que se seguem a cada valor, encontra-se uma explicação que pode ajudálo(a)<br />
a compreender o seu significado.<br />
Sua tarefa é avaliar quão importante é para a sua organização cada valor, como um princípio<br />
orientador na vida da organização.<br />
Avalie a importância dos <strong>valores</strong> da sua organização numa escala de 0 a 6. A escala de avaliação se<br />
encontra abaixo:<br />
COMO UM PRINCÍPIO ORIENTADOR NA VIDA DA MINHJA ORGANIZAÇÃO, esse valor é:<br />
Nada<br />
Importante<br />
Muito<br />
Importante<br />
Importante<br />
0..................1................... 2............................3................4..................5...........................6<br />
0 = significa que o valor é nada importante; não é relevante como um princípio orientador na vida da sua<br />
organização.<br />
3 = significa que o valor é importante.<br />
6 = significa que o valor é muito importante.<br />
Quanto maior o número (0, 1, 2, 3, 4, 5, 6) mais importante é o valor como um princípio orientador na vida<br />
da sua organização.<br />
Lembre-se bem que não se trata de avaliar os seus <strong>valores</strong> pessoais, nem os <strong>valores</strong> que<br />
você gostaria que existissem na organização, mas sim os <strong>valores</strong> que, segundo você,<br />
orientam a vida da sua organização.<br />
MINHA ORGANIZAÇÃO VALORIZA:<br />
1. ____ AMBIÇÃO (busca de melhor posição no mercado)<br />
2. ____ AUDÁCIA (agir de forma arrojada em relação às outras empresas)<br />
3. ____ AUTONOMIA (auto-suficiência na realização das tarefas)<br />
4. ____ AUTORIDADE (respeito às pessoas com cargos de chefia)<br />
5. ____ CO-GESTÃO (participação dos empregados nos lucros da empresa)<br />
6. ____ COLEGUISMO (clima de relacionamento amistoso <strong>entre</strong> os empregados)<br />
7. ____ COMPETÊNCIA (auto-suficiência na área de atuação profissional)<br />
8. ____ COMPETITIVIDADE (conquista de clientes em relação à concorrência)<br />
9. ____ COMUNICAÇÃO (troca de informações na organização)<br />
10. ____ COOPERAÇÃO ( clima de ajuda mútua)<br />
11. ____ CRIATIVIDADE (capacidade de inovar na organização)
12. ____ CURIOSIDADE (busca constante de inovação e novidades)<br />
13. ____ DEMOCRACIA (participação dos empregados nos processos decisórios)<br />
14. ____ DESCENTRALIZAÇÃO (distribuição de poder pelos diversos níveis)<br />
15. ____ DINAMISMO (conquista de novos espaços de atuação no mercado)<br />
16. ____ DISCIPLINA (capacidade de respeitar regras e normas)<br />
17. ____ DOMÍNIO (manutenção da superioridade em relação ao mercado)<br />
18. ____ EFICÁCIA (realização das tarefas de forma a atingir os objetivos esperados)<br />
19. ____ EFICIÊNCIA (execução das tarefas da organização de forma certa)<br />
20. ____ EQUIDADE (tratamento proporcional ao mérito)<br />
21. ____ ESPONTANEIDADE (espaço para realização do trabalho de acordo com seu<br />
estilo pessoal).<br />
22.____ ESTIMULAÇÃO (atividades que estimulem o crescimento profissional)<br />
23.____ ÉTICA (atuação no mercado de acordo com princípios morais)<br />
24.____ FISCALIZAÇÃO (controle do serviço executado)<br />
25.____ HARMONIA (ambiente de relacionamento organizacional adequado)<br />
26.____ HIERARQUIA (respeito aos níveis de autoridade)<br />
27.____ HONESTIDADE (combate à corrupção na organização)<br />
28.____ INDEPENDÊNCIA (capacidade de decidir sobre a tarefa que realizo)<br />
29.____ INICIATIVA (motivação para iniciar atividades por conta própria)<br />
30.____ IGUALDADE (oportunidades iguais para todos os funcionários)<br />
31.____ INOVAÇÃO (introdução de novidades no trabalho)<br />
32.____ INTEGRAÇÃO INTEROGANIZACIOAL (intercâmbio com outras organizações)<br />
33.____ INTERDEPENDÊNCIA (complementaridade de papéis <strong>entre</strong> organizações)<br />
34.____ INTERCÂMBIO (troca de experiências e conhecimentos)<br />
35.____ JUSTIÇA (imparcialidade nas decisões administrativas)<br />
36.___ LEALDADE (fidelidade à organização)<br />
37.____LIBERDADE (abertura para expor sugestões e opiniões sobre o trabalho)<br />
38.____ LIMPEZA (manutenção do ambiente limpo e saudável)<br />
39.____ MODERNIZAÇÃO (investimento na aquisição de equipamentos, programas de informática e<br />
outros)<br />
40.____ OBEDIÊNCIA (tradição de respeito às ordens)<br />
41.____ ORDEM (estabilidade da organização)<br />
42.____ PARCERIA (atuação conjunta com outras empresas)<br />
43.____ PODER (capacidade de exercer controle e domínio sobre os outros)<br />
44.____ POLIDEZ (clima de cortesia e boas maneiras no relacionamento cotidiano)<br />
45.____ PONTUALIDADE (preocupação com o cumprimento de horários e compromissos)<br />
46.____ PRAZER (prazer na realização do trabalho)<br />
47.____ PRESERVAÇÃO (utilização de recursos sem causar danos ao meio ambiente)<br />
48.____ PRESTÍGIO (manutenção da imagem pública)<br />
49.____ PREVISIBILIDADE (capacidade de antecipar-se às incertezas do mercado)<br />
50.____ PRODUTIVIDADE (produção e prestação de serviços)<br />
51.____ QUALIDADE (compromisso com o aprimoramento dos produtos e serviços)<br />
52.____ QUALIFICAÇÃO DOS RECURSOS HUMANOS (capacitação e treinamento dos empregados)<br />
53.____ REALIZAÇÃO (sucesso profissional)<br />
54.____ RECONHECIMENTO (mérito na realização do trabalho)<br />
55.____ RESPEITO (consideração às pessoas e opiniões)<br />
56.____ RESPEITO À NATUREZA (proteção do meio ambiente)<br />
57.____ RIGIDEZ (manutenção das regras, normas e comportamentos na organização)<br />
58.____ SATISFAÇÃO DOS CLIENTES (bom atendimento aos clientes)<br />
59.____ SEGURANÇA (integridade de pessoas e bens)<br />
60.____ SENSATEZ (agir com prudência nas tomadas de decisões e negociações)<br />
61.____ SIGILO (proteção de informações técnico-administrativo)<br />
62.____ SOCIABILIDADE (atividades sociais fora do ambiente de trabalho)<br />
63.____ SUCESSO (êxito nos seus empreendimentos)<br />
64.____ SUPERVISÃO (acompanhamento e avaliação contínua das tarefas)<br />
65.____ TOLERÂNCIA (aceitação da liberdade do outro)<br />
66.____ TRADIÇÃO (preservação dos costumes vigentes da organização)<br />
Agora observe todos os <strong>valores</strong> que você atribuiu ponto “6” da escala e escolha <strong>entre</strong> eles 2 ou no máximo 3<br />
que, segundo você, são os <strong>valores</strong> de suprema importância como princípios orientadores da vida da sua<br />
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347<br />
organização, escreva no lugar abaixo indicado, o número destes <strong>valores</strong> supremos:<br />
Valores Supremos _____________________________<br />
_____________________________<br />
_____________________________<br />
Finalmente, observe todos os <strong>valores</strong> que você atribuiu ponto “0” da escala e escreva o número daqueles que<br />
você considera opostos aos princípios que orientam a vida da sua organização:<br />
Valores Opostos ____________________________