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03.09.2014 Views

Vieira (2002b) defende que diversos foram os fatores que influenciaram a mudança do aleitamento materno para a alimentação industrializada. Alterações na estrutura da sociedade brasileira, no que tange aos papéis desenvolvidos pela mulher, que passou a conciliar a função de mãe e esposa com responsabilidades fora do lar; e a industrialização e a alteração do estilo de vida das famílias, com o advento da urbanização das comunidades O reinteresse pela amamentação materna voltou a ganhar mais visibilidade somente em meados da década de 60 e, principalmente, nas décadas de 70 e no transcorrer dos anos oitenta, através de atitudes em defesa da amamentação. Durante a década de 1970, muitos médicos brasileiros passaram a fazer intercâmbios em países europeus, como a França, em busca de absorver mais conhecimentos científicos sobre o tema e trouxeram, para o Brasil, a ideologia vigente de então. Deste modo, foram realizados diversos simpósios, palestras, conferências, encontros e projetos sobre amamentação no peito, destacando-se o programa realizado pela Secretaria Municipal de Paulínia (Campinas, São Paulo) 30 e a fundação do Comitê Nacional de Estímulo ao Aleitamento Materno da Sociedade Brasileira de Pediatria (MARTINS FILHO, 2001). Ainda no final daquele período, conforme lembra Martins Filho (2001), criou-se o Grupo Técnico Nacional de Incentivo ao Aleitamento Materno (GTENIAM), cuja finalidade era de se estimular e promover o aleitamento materno em todo o território nacional e combater a mortalidade infantil e a desnutrição. Em 1982, foi criado o Programa Nacional de Incentivo ao Aleitamento Materno (PNIAM), que se transformou no principal órgão de proteção e promoção do aleitamento materno, com o desenvolvimento de ações e projetos, como bancos de leite humano, treinamento de profissionais de saúde etc., tornando-se um dos principais programas do mundo nesse assunto. Já no final da década de 80, Almeida (1999) afirma que os estudos científicos sobre a amamentação prevaleceram sobre o leite industrializado. O discurso da medicina se separou do discurso da indústria, antes em benefício das indústrias de leite em pó. Devo 30 Eram realizadas palestras para professores e alunos dos níveis básico e fundamental sobre a amamentação. Também implantaram creches (MARTINS FILHO, 2001).

acrescentar que, para o autor, a utilização do discurso da ciência pela indústria é muito mais uma questão de ética, onde “a apropriação do saber científico pela propaganda se faz, no mínimo, questionável (...)” (Ibid., p. 46). 3.2.1 A “política do peito”: o modelo atual da amamentação “E, às vezes, esse discurso (técnico): “olha, o seu filho vai ser mais saudável”; “olha, você está fazendo isso, mas está fazendo isso pro futuro dela. Ela não vai ter doença, ela não vai ter não sei o quê”. Então, como é que você pára e dá uma mamadeira quando você tem tudo isso na cabeça? Me diz como é que se faz isso? Eu não podia. Eu olhava praquela mamadeira, ela ficou lá” (Nina, 38 anos, antropóloga). 31 A década de 90 representou uma época em que se registrou um grande número de ações mundiais em relação ao incentivo da amamentação materna. Em 1990, influenciado pela Declaração de Innocenti, 32 o Brasil assina o termo de compromisso de se reduzir à mortalidade infantil na Cúpula Mundial em Favor da Infância em Nova Iorque. Tem-se início a Campanha Nacional de Incentivo à Amamentação, 33 com o mesmo intuito de outros países: o de estimular o hábito de amamentar os bebês exclusivamente com o leite materno nos seus primeiros seis meses de vida e a sua continuidade até aos dois anos 34 e melhorar as ações de saúde voltadas para a criança de todo o país. Desde 1992, em vários países, entre eles Itália, Japão, Estados Unidos, inclusive o Brasil, comemora-se, anualmente, a Semana Mundial de Aleitamento Materno (SMAM), idealizada pela organização não-governamental (ONG) World Alliance for Breast-Feeding 31 Relato obtido durante o meu trabalho de campo. 32 A Declaração de Innocenti foi produzida e adotada por representantes de organizações governamentais, ONGs e defensores da amamentação no mundo todo, com o intuito de encorajar, estimular e apoiar a prática do aleitamento materno, através de ações como a implantação dos dez passos para o sucesso da amamentação em maternidades, implementação do código internacional de comercialização de substitutos do leite materno na Itália (2001). 33 Esse incentivo ao aleitamento materno, através da promoção de práticas alimentares saudáveis, integra o que o PNAN denomina de adoção de estilos de vida saudáveis (BRASIL, 1999). 34 A amamentação exclusiva é o uso restrito do leite materno, até aos seis primeiros meses de idade, na alimentação da criança, sem a introdução de alimentos, chás, águas etc. (BRASIL, 1999).

Vieira (2002b) <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que diversos foram os fatores que influenciaram a mudança<br />

do aleitamento materno para a alimentação industrializada. Alterações na estrutura da<br />

socieda<strong>de</strong> brasileira, no que tange aos papéis <strong>de</strong>senvolvidos pela mulher, que passou a<br />

conciliar a função <strong>de</strong> mãe e esposa com responsabilida<strong>de</strong>s fora do lar; e a industrialização e<br />

a alteração do estilo <strong>de</strong> vida das famílias, com o advento da urbanização das comunida<strong>de</strong>s<br />

O reinteresse pela amamentação materna voltou a ganhar mais visibilida<strong>de</strong> somente<br />

em meados da década <strong>de</strong> 60 e, principalmente, nas décadas <strong>de</strong> 70 e no transcorrer dos anos<br />

oitenta, através <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong>s em <strong>de</strong>fesa da amamentação. Durante a década <strong>de</strong> 1970, muitos<br />

médicos brasileiros passaram a fazer intercâmbios em países europeus, como a França, em<br />

busca <strong>de</strong> absorver mais conhecimentos científicos sobre o tema e trouxeram, para o Brasil,<br />

a i<strong>de</strong>ologia vigente <strong>de</strong> então. Deste modo, foram realizados diversos simpósios, palestras,<br />

conferências, encontros e projetos sobre amamentação no peito, <strong>de</strong>stacando-se o programa<br />

realizado pela Secretaria Municipal <strong>de</strong> Paulínia (Campinas, São Paulo) 30 e a fundação do<br />

Comitê Nacional <strong>de</strong> Estímulo ao Aleitamento Materno da Socieda<strong>de</strong> Brasileira <strong>de</strong> Pediatria<br />

(MARTINS FILHO, 2001).<br />

Ainda no final daquele período, conforme lembra Martins Filho (2001), criou-se o<br />

Grupo Técnico Nacional <strong>de</strong> Incentivo ao Aleitamento Materno (GTENIAM), cuja<br />

finalida<strong>de</strong> era <strong>de</strong> se estimular e promover o aleitamento materno em todo o território<br />

nacional e combater a mortalida<strong>de</strong> infantil e a <strong>de</strong>snutrição. Em 1982, foi criado o Programa<br />

Nacional <strong>de</strong> Incentivo ao Aleitamento Materno (PNIAM), que se transformou no principal<br />

órgão <strong>de</strong> proteção e promoção do aleitamento materno, com o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> ações e<br />

projetos, como bancos <strong>de</strong> leite humano, treinamento <strong>de</strong> profissionais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> etc.,<br />

tornando-se um dos principais programas do mundo nesse assunto.<br />

Já no final da década <strong>de</strong> 80, Almeida (1999) afirma que os estudos científicos sobre<br />

a amamentação prevaleceram sobre o leite industrializado. O discurso da medicina se<br />

separou do discurso da indústria, antes em benefício das indústrias <strong>de</strong> leite em pó. Devo<br />

30 Eram realizadas palestras para professores e alunos dos níveis básico e fundamental sobre a amamentação.<br />

Também implantaram creches (MARTINS FILHO, 2001).

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