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Iana Sudo MEDICALIZAÇÃO DAS MULHERES - Instituto de ...

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Simon <strong>de</strong> Vallambert, que consi<strong>de</strong>ravam esse um ato antinatural, uma prática <strong>de</strong> abandono<br />

(FLANDRIN, 1988). As mães que o praticavam eram, então, consi<strong>de</strong>radas <strong>de</strong>snaturadas,<br />

cruéis, <strong>de</strong> péssimo caráter, por sentirem, segundo eles, um sentimento <strong>de</strong> indiferença em<br />

relação aos seus filhos (HUFTON, 1991). Este discurso, segundo Gélis (1991), é<br />

característico do novo sentimento da infância, <strong>de</strong>monstrando que a evolução <strong>de</strong>sse<br />

sentimento não se manifestou <strong>de</strong> maneira linear.<br />

Gélis (1991) <strong>de</strong>lineia que essa alteração <strong>de</strong> consciência da vida, em relação às<br />

crianças, ocorreu em todas as classes sociais, como conseqüência <strong>de</strong> uma mudança cultural<br />

que passou a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r uma necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se preservar ao máximo a vida das crianças e<br />

diminuir seus sofrimentos, encontrando em médicos e obras <strong>de</strong> pedagogia, como <strong>de</strong> John<br />

Locke – Da educação das crianças (publicada em Londres, em 1693), as principais vozes<br />

legitimadoras nesse novo comportamento familiar. Esta mudança ocorreu em todos as<br />

classes e em todos os meios.<br />

Knibiehler (1991) relata que, no século XVIII, o discurso médico continuava a<br />

responsabilizar os pais que ainda utilizavam os serviços das amas. Nesta época prevalecia,<br />

naquele discurso, o significado <strong>de</strong> que a criança era tida como um ser que nascia<br />

“incompleto”, “inacabado”. Desta forma, ela <strong>de</strong>veria ser alimentada pelo leite da mãe,<br />

consi<strong>de</strong>rado um sangue embranquecido ou cozido, uma vez que o leite estranho era<br />

consi<strong>de</strong>rado perigoso. Acreditava-se que o aleitamento materno transmitia a natureza e a<br />

moral e a criança corria o risco <strong>de</strong> ser afetada por uma natureza estranha, ao ser<br />

amamentada por uma pessoa <strong>de</strong>sconhecida (GÉLIS, 1991).<br />

Assim, a medicalização da amamentação toma corpo no século XVIII. A família<br />

começa a ser encarada como incapaz <strong>de</strong> proteger a vida das crianças, fato estampado no<br />

alto índice <strong>de</strong> mortalida<strong>de</strong> infantil (KNIBIEHLER, 1991). 23 Sob tal argumento, começam a<br />

aparecer, na Europa, as prescrições sobre a “arte <strong>de</strong> amamentar”, através <strong>de</strong> algumas<br />

23 Esses números são contestados no trabalho <strong>de</strong> Schiebinger (1998), que menciona que eles eram muitas<br />

vezes aumentados pelos ministros <strong>de</strong> Estado, no século XVIII, numa tentativa <strong>de</strong> se coibir o uso <strong>de</strong> amas-<strong>de</strong>leite.

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