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Iana Sudo MEDICALIZAÇÃO DAS MULHERES - Instituto de ...

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não vou mentir, não. Naquela primeira semana eu não tinha prazer nenhum, aquilo era um<br />

sofrimento, enten<strong>de</strong>u. Daí o conflito, o conflito é esse : “cadê, cadê a mãe? Cadê, cadê<br />

aquilo que vai baixar, que eu vou começar a ficar aqui feliz, falando: ‘ai, que coisa linda a<br />

minha filha’”, não, eu não conseguia, porque doía, sangrava, eu não dormia, ela chora, ela<br />

tem cólica. “O que quê essa menina tem?”, sabe. Então, eu acho que, não sei, eu acho que<br />

isso aí tinha que ser melhor resolvido, se todo mundo falasse pra mim: “- não, a maioria dá<br />

sem problema”, eu ia dizer assim: “eu tive um problema, eu tive um problema”, eu acho<br />

que algumas mulheres têm, mas eu acho que o fato não é esse, só que a maioria, <strong>de</strong> repente,<br />

não problematiza. O que aconteceu comigo, talvez por ser intelectualizada, eu quis resolver,<br />

eu peitei, e falei: “eu vou tentar conseguir, eu quero conseguir, eu vou dar um jeito, eu vou<br />

resolver”, que eu acho que muita gente faz o seguinte “- Deus me livre, isso é horrível, um<br />

abraço”, enten<strong>de</strong>u, “me dá essa mama<strong>de</strong>ira”. Não pensa, não pensa, sem culpas, enten<strong>de</strong>u,<br />

porque eu acho que é isso “sem culpas, eu não agüento isso”, eu já ouvi gente falar “- eu<br />

não agüento”, por isso que tem muita gente que fala assim “ah, não tenho leite, o leite tá<br />

secando, o meu filho não engorda”, enten<strong>de</strong>u, e vai dando e nem fala pra pediatra, e aí já<br />

chega lá com aquele papo porque a criança já tá realmente na mama<strong>de</strong>ira, porque eu acho<br />

que tem duas coisas aí: um tipo <strong>de</strong> mulher como eu, que <strong>de</strong> repente, mais intelectualizada e<br />

fica pensando, ou talvez não menos intelectualizada mas também são pessoas informadas,<br />

que têm uma preocupação com isso, aí outras mulheres que vivem isso, talvez, mais<br />

naturalmente, “ah, você tem filho, sei lá, você fica grávida, tem filho, <strong>de</strong>u pra fazer, <strong>de</strong>u;<br />

não <strong>de</strong>u, não <strong>de</strong>u”.<br />

I: Você conhecia a campanha nacional (<strong>de</strong> incentivo ao aleitamento materno) na época<br />

em que você ficou grávida?<br />

N: Eu conhecia <strong>de</strong> ver na televisão, né. Eu conhecia da televisão, eu conhecia <strong>de</strong> ver os<br />

anúncios, das pessoas falando. Mas não me interessei por aquilo, porque eu acho que <strong>de</strong>ntro<br />

da minha classe a gente conversava o tempo inteiro.<br />

I: E também não te influenciou?<br />

N: Não, por aquilo, jamais.<br />

I: Nina, pra gente terminar, então a Campanha Nacional não influenciou: tem que<br />

amamentar até seis meses, tem que ser até...?<br />

N: Não, eu acho que isso existia, não pela campanha, mas pela médica, por todo o<br />

processo.<br />

I: Ela reproduzia a Campanha?<br />

N: Ela reproduzia, sim, tipo assim, pelo menos, ela falou assim: “<strong>de</strong> cinco ou seis meses”,<br />

ela sempre falou isso pra mim <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início, com certeza.<br />

I: E você acha que, <strong>de</strong> repente, esse discurso dificulta a mãe que não quer amamentar,<br />

mas <strong>de</strong> tanto ouvir esse discurso, ela se sente culpada em parar (<strong>de</strong> amamentar)?<br />

N: Talvez, né. Eu acho que você vai assimilando aquilo também, da campanha, e eu acho<br />

que talvez <strong>de</strong> alguma maneira você fala assim: “- não, tem que fazer, tem que fazer e tal,<br />

diz que é pra fazer, tá todo mundo falando que é assim, que assim é que é melhor”, às vezes<br />

você nem sabe muito bem por que, mas você, né, fica com aquela “não, tem que fazer, tem<br />

que fazer”, né. Então, eu acho assim, eu não fui influenciada porque eu acho que eu queria<br />

amamentar, eu parti <strong>de</strong>sse princípio. Então eu não precisava da campanha pra isso. Na<br />

minha cabeça eu achava que era bom, e <strong>de</strong>pois que eu tive mesmo com os dilemas, tava lá a<br />

médica, quer dizer, enfim, enten<strong>de</strong>u, eu tava num ambiente em que isso era uma coisa que<br />

iria continuar acontecendo, sabe, porque eu acho que eu tinha essa preocupação. Mas eu<br />

lembro da Campanha. Mas, engraçado, que eu vi a campanha, isso, assim, antes <strong>de</strong> eu

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