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Iana Sudo MEDICALIZAÇÃO DAS MULHERES - Instituto de ...

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vaza, teu corpo é como se ele não te pertencesse. Então, você também tem que ter um<br />

tempo pra amadurecer isso, eu acho que tem mulher até que não, fala assim: “- ai, que<br />

lindo! Eu tô assim porque eu sou mãe!”, sabe, mas eu acho que tem gente que nem fala,<br />

mas se sente mal, sabe, porque tua barriga tá mole, seu peito tá gran<strong>de</strong>. Eu lembro que eu<br />

falava assim: “- gente, eu pareço uma vitamina <strong>de</strong> mamão, cheiro <strong>de</strong> leite, aquele mamão<br />

no meu peito”, sabe, aquela coisa batida, porque per<strong>de</strong> um pouco <strong>de</strong> sangue, sabe, eu<br />

olhava pra mim, eu tava linda, um dia antes <strong>de</strong> internar, sabe, toda queimada, lindona, eu<br />

tive uma gravi<strong>de</strong>z maravilhosa. Até o último dia eu tava andando, passeando, viajando,<br />

enten<strong>de</strong>u, andando, indo pra Barra, passeando. Então, quando eu fiquei <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> casa, sem<br />

dormir, daquele jeito, com cinta, aqueles peitos enormes, pô, você é outra mulher. Ai foi<br />

um choque pra mim, sabe, não é uma vaida<strong>de</strong>, foi um choque. Meu corpo era outro,<br />

completamente. Eu não me conhecia daquele jeito. Então eu acho que isso também é uma<br />

coisa que é legal <strong>de</strong> conversar, eu acho que isso era legal <strong>de</strong> você falar no grupo, sabe. Não<br />

sei se é uma visão muito intelecutalizada, mas eu acho que é uma coisa , se eu tivesse<br />

escutado, teria sido legal, se alguém tivesse me dito isso, sabe: “- ai, Nina, aproveita muito<br />

porque <strong>de</strong>pois tem uma fasesinha que é meio complicada, você vai ver uma coisa assim”,<br />

eu acho, assim, conversar numa boa, não é terrorismo, sabe. Mas conversar disso, sabe,<br />

<strong>de</strong>ssa mudança <strong>de</strong> corpo, porque parece que a mudança é só gravi<strong>de</strong>z, aí passou a gravi<strong>de</strong>z,<br />

você teve filho, acabou, fica parecendo o tempo inteiro que é isso, que é você passar a<br />

gravi<strong>de</strong>z. O meu problema é que a minha gravi<strong>de</strong>z foi <strong>de</strong>z. Então, quando chegou <strong>de</strong>pois,<br />

eu falei: “-gente, isso é horrível”, o meu foi ao contrário, o meu choque veio <strong>de</strong>pois, porque<br />

toma um monte <strong>de</strong> remédios, tira ponto, “-olha, resguardo, não abaixa, não abre gaveta,<br />

cuidado quando você pegar a neném”. Sabe, assim, sentar, você sente dolorido, você sente<br />

teu útero mexer. Tá tudo mole lá <strong>de</strong>ntro, tá tudo costurado. Então, você, puxa, eu acho que<br />

conversar disso, eu acho que é muito bom, <strong>de</strong>ve ser muito bom, eu acho, <strong>de</strong>ve ser uma<br />

experiência rica.<br />

I: E, pra você, o ato <strong>de</strong> amamentar seria natural, eu acho que pra você enquanto<br />

antropóloga, mas essa idéia <strong>de</strong> que é instintivo, é natural?<br />

N: Eu acho que tem uma dimensão, seguinte: teu corpo se prepara pra isso, eu acho que,<br />

tem uma dimensão biológica, a gente não po<strong>de</strong> negar: o teu peito vai ficando inchado, as<br />

tuas veias vão se dilatando, porque segundo os padrões naturais, você vai ter uma criança,<br />

vai tá gerando uma vida, e ele se prepara praquilo. Agora, a resolução <strong>de</strong> viver essa<br />

experiência, eu acho que, e como você vai viver, eu acho que é cultural. Como você vai<br />

encarar isso, como é que você vai administrar isso na sua vida, eu acho que sim, o que você<br />

vai pensar disso.<br />

I: E você acha que isso falta nos médicos?<br />

N: Eu acho que falta conversar <strong>de</strong> uma forma mais humana. Eu acho que o quê acontece é<br />

que os médicos têm, eu acho, duas teorias, talvez, né, não sei se tem duas. Mas tem uma<br />

maneira <strong>de</strong> agir, que eu acho que é essa da minha pediatra, que tá muito em comum, que é a<br />

seguinte: é você ir no tapa, tipo assim: “- você tem que agüentar!”; “você tem que fazer!”;<br />

“isso vai fazer bem pro teu filho, senão ele vai ficar doente!”, sabe, é uma coisa <strong>de</strong> chamar<br />

a responsabilida<strong>de</strong> que é muito duro. Que eu acho que é importante, mas eu acho, na minha<br />

cabeça, que po<strong>de</strong>ria ser feita <strong>de</strong> uma outra maneira, talvez, eles não achem, eles achem que<br />

não, que é assim funciona, eu não sei. Mas que eu acho que muita gente <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong><br />

amamentar, porque chega ali e vê que o negócio é complicado, que muito muita gente<br />

chega e fala assim: “- gente, não era isso que eu pensei”, porque eu pensei isso. Depois <strong>de</strong><br />

tudo o que eu li, chegou lá, não era nada disso. No início eu não tinha prazer nenhum. Eu

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