Iana Sudo MEDICALIZAÇÃO DAS MULHERES - Instituto de ...

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03.09.2014 Views

hora eu tava muito desesperada, porque são sentimentos muito contraditórios. Você quer fazer uma coisa, mas aquilo tá te deixando, sabe, deprimido. E eu ficava com medo porque as pessoas falavam: “- olha, não fica nervosa que o leite seca”, ah, aí eu falava assim: “Ai, o meu leite vai secar! Olha que coisa horrível que eu vou fazer com a minha filha!”. Então, você vive uma gangorra, sabe, numa hora você tá lá em cima, daqui a pouco você tá lá embaixo. E eu estou acostumada, quer dizer, eu tive filho com 35, 36 anos, quer dizer, eu sempre fui uma mulher acostumada, assim, a ter conta da minha vida, eu sempre saí, fiz o que quis, quando quis, do jeito que quis. De repente a minha vida ela era toda cronometrada: se eu tinha que sair, sai, volta correndo, sai com o telefone na mão, toda hora liga, sabe, então eu me sentia muito prisioneira daquela situação, isso eu achei terrível, não tinha uma válvula de escape, não podia tomar um chope, sabe: “ai, vou tomar um chope!”, sabe assim, umas coisas, de extravasar, poder: “ai, vou comer uma comida gostosa, eu vou!”, não, nada, sabe, tudo é assim: não pode chocolate, não pode fritura, não pode não sei o quê, então eu acho que é duro. I: E você conhecia esse grupo de auto-ajuda? N: Não, não conheci nada, não entrei em nada. Eu saí absolutamente com a ajuda dos amigos e eu acho que com o amadurecimento da situação. Eu acho que isso foi, depois a pediatra também, na consulta de vinte dias, eu acho, quinze, uma coisa assim, aí ela foi uma outra pessoa, aí quando eu cheguei lá, ela falou assim: “- Nina, me desculpa, eu fui muito dura com você, mas eu sou assim sempre. Porque muita mãe larga ali, onde você tava”, a teoria dela, ela disse: “- muita larga ali, então eu não dou muita conversa mesmo, mas eu vou dizer pra você: é difícil mesmo!”, eu falei: “pô, agora você vem me dizer?!”, ela falou assim, nisso tinha vinte dias, mas, aí, daí pra frente, ela foi muito mais amiga, porque ela falou assim: “porque eu queria que você procurasse enfrentar, porque eu não sabia se você tava tendo uma coisa, uma crise e tal, uma depressão, ou se você tava tendo aquilo que muita mãe tem, tipo assim: correndo da raia, fugindo da raia”, porque ela falou: “- tem muita mãe que começa dizendo que tem um monte de coisa, que não tem leite, isso e aquilo, pra fugir, eu não sabia”, ela falou: “- não te conheço e tal”, aquelas histórias. Eu falei: “pô, doutora, mas...”, ela falou: “-, é, mas na dúvida, eu optei pela sua filha, mas eu digo pra você que é muito difícil mesmo”, aí ela me falou que ela teve depressão pós-parto no terceiro filho, e nos dois primeiros ela não teve nada, e no terceiro ela teve, e ela teve tudo que ela não teve, e ela já como médica, então, quer dizer, aí te dá um alívio: pô, ela é médica, teve, entendeu e você vai começando a atravessar aquilo de uma outra maneira, eu comecei a sair daquela, eu pensei: pô, eu pensava nesses casos, nessas situações, e falava assim: “puxa, tá aí, então, se ela é médica, ela sabe tudo isso, lá no terceiro filho ela teve, quer dizer, puxa, não sou nenhuma, ela falou: “- é ruim mesmo, porque você não toma conta da sua vida, realmente a sua vida vai ficar, né, assim durante um tempo, mas agüenta esses três primeiros meses e tal, vamos ver como a coisa vai”. E realmente, depois que as cólicas passaram, eu... I: Isso depois de quanto tempo? N: Quase quatro meses. Aí foi muito difícil porque o peito tava legal, o leite ela mamava, com o meu leite ela crescia, tava tudo bem, mas, era essa roda-vida, não, comer o quê, não, não é isso, a própria médica falou pra mim: “- Nina, não é nada disso. Quando a criança tem que ter ela tem mesmo, não fica assim também, pode comer”, porque aí tem todos os mitos, eu fiquei um pouco prisioneira dos mitos. Então, eu comia alguma coisa, eu achava que era aquilo, eu associava imediatamente, já não queria mais comer. E a médica, depois ela falou: “- Nina, não é”. Ela me deu alguma coisa pra ler, ela falou: “- no final das contas

ninguém sabe muito bem, não há uma informação tão precisa. Eu acho que a imaturidade, algumas crianças têm tendência, a sua por algum acaso tem”. Mas, a Clara não tinha à noite, ela só tinha de dia, o que era também interessante porque eu conheci pessoas que tinham casos horrendos, tem de dia, tem de noite, só tem à noite, então você acaba assim, “menos pior”, né, aquela coisa Polyanna, “ai meu Deus, pelo menos não tem à noite, pelo menos ela dorme à noite alguma coisa. Então, o dia é horrível, mas à noite”, você fica meio Polyanna mesmo, você fica meio se agarrando nas experiências, nas histórias das pessoas. Depois que passou tudo isso, ficou bom. Ficou bom depois dos quatro meses pro cinco meses, que aí não tinha mais cólica, ela começou a comer alguma coisa, eu também já não sentia o peso, e podia comer mais alguma coisa, e eu já saía mais de casa também, sabe, minha vida parecia assim, melhor, sabe, eu já podia sair um pouco mais, enfim, já podia circular, já não tinha mais essa coisa da cólica, os horários começaram a expasar, as mamadas também. Então, o primeiro dia que eu dormi umas quatro horas, eu fiquei feliz da vida, eu fiquei melhor, eu falei: “nossa, o quanto que eu dormi”, sabe, eu tava mais descansada, porque tem isso também: uma roda-viva, você também não descansa, você não descansa, você tá sempre com aquela pressão, sabe, e aquela coisa: “eu preciso dormir porque eu tenho que descansar” e eu quanto mais eu pensava isso, menos eu conseguia dormir. Então, eu acho que tem todos esses fatores juntos. Então, eu acho assim, o que me ajudou, talvez eu não tenha entrado numa depressão maior, talvez eu não tenha vivido isso, embora durante o período desses três meses eu chorei muito, porque meu marido voltou a trabalhar, a minha sogra trabalha e a minha mãe ficou aqueles primeiros dias e foi embora pra casa, então, eu ficava o dia inteiro sozinha com ela. I: E você tinha alguém que te ajudava com ela? N: Não. A minha sogra vinha um pouco, fazia comida, porque eu não tenho empregada, tenho uma diarista, entendeu, então ela vinha, arrumava a casa uma vez por semana, fazia comida congelada, mas o resto não. Então, assim, eu ficava sozinha... I: E você também tinha que cuidar da casa, do marido e dela? N: Do marido não, porque ele se virou muito bem, graças a Deus que nessa parte ele me ajudou pra caramba, e a minha sogra, mas assim, eu cuidei do jeito que deu, isso eu fechei o olho legal, não me cobrei porque não dava. Então, a comida minha sogra trazia, a casa ela que tratava, então, o resto, eu ia fazendo enquanto ela dormia. Mas, a Clara, por conta da cólica, ela não dormia muito. Isso foi horrível, isso foi um caos, eu chorei muito, chorava, e quando ela chorava, eu chorava de novo “ai não, ela vai ter cólica de novo, ai ¨meu Deus, eu não agüento isso. E aí eu liguei pra uma nutricionista que me ajudou na gravidez, ela: “- Nina, vê se ela não libera um remedinho pra gases e tal”, e ela liberou, só que eu tive que mudar, porque aquele remédio não funcionava. Mas aí, também, eu não falava pra muito gente, pra minha irmã, por exemplo, ela falou assim: “- remédio, pra criança?”, mas as filhas dela não tiveram cólica, então ela não tem noção do que é uma criança berrando, entendeu, então, ela falou assim: “- eu não posso dar remédio pra criança”. Eu tinha, assim, muita preocupação com a minha irmã. Minha irmã, ela tem um processo muito diferente do meu, ela tem uma visão, e ela é toda natural. I: Ela é mais velha? N: É mais nova, e com dois filhos. Então, é uma coisa complicada. Eu senti todas essas angústias e eu não falava pra ela, pra ela eu não falava, porque eu lembro que um dia que eu falei assim: “ah, a primeira febrinha que ela teve que eu dei um antitérmico, ela: “- o que quê cê deu?”, eu falei: “dei novalgina e depoi...”, “- novalgina?!, isso é um absurdo, olha, isso é um crime, porque baixa a pressão!”, olha, eu fiquei tremendo, depois eu falei: “ai

ninguém sabe muito bem, não há uma informação tão precisa. Eu acho que a imaturida<strong>de</strong>,<br />

algumas crianças têm tendência, a sua por algum acaso tem”. Mas, a Clara não tinha à<br />

noite, ela só tinha <strong>de</strong> dia, o que era também interessante porque eu conheci pessoas que<br />

tinham casos horrendos, tem <strong>de</strong> dia, tem <strong>de</strong> noite, só tem à noite, então você acaba assim,<br />

“menos pior”, né, aquela coisa Polyanna, “ai meu Deus, pelo menos não tem à noite, pelo<br />

menos ela dorme à noite alguma coisa. Então, o dia é horrível, mas à noite”, você fica meio<br />

Polyanna mesmo, você fica meio se agarrando nas experiências, nas histórias das pessoas.<br />

Depois que passou tudo isso, ficou bom. Ficou bom <strong>de</strong>pois dos quatro meses pro cinco<br />

meses, que aí não tinha mais cólica, ela começou a comer alguma coisa, eu também já não<br />

sentia o peso, e podia comer mais alguma coisa, e eu já saía mais <strong>de</strong> casa também, sabe,<br />

minha vida parecia assim, melhor, sabe, eu já podia sair um pouco mais, enfim, já podia<br />

circular, já não tinha mais essa coisa da cólica, os horários começaram a expasar, as<br />

mamadas também. Então, o primeiro dia que eu dormi umas quatro horas, eu fiquei feliz da<br />

vida, eu fiquei melhor, eu falei: “nossa, o quanto que eu dormi”, sabe, eu tava mais<br />

<strong>de</strong>scansada, porque tem isso também: uma roda-viva, você também não <strong>de</strong>scansa, você não<br />

<strong>de</strong>scansa, você tá sempre com aquela pressão, sabe, e aquela coisa: “eu preciso dormir<br />

porque eu tenho que <strong>de</strong>scansar” e eu quanto mais eu pensava isso, menos eu conseguia<br />

dormir. Então, eu acho que tem todos esses fatores juntos. Então, eu acho assim, o que me<br />

ajudou, talvez eu não tenha entrado numa <strong>de</strong>pressão maior, talvez eu não tenha vivido isso,<br />

embora durante o período <strong>de</strong>sses três meses eu chorei muito, porque meu marido voltou a<br />

trabalhar, a minha sogra trabalha e a minha mãe ficou aqueles primeiros dias e foi embora<br />

pra casa, então, eu ficava o dia inteiro sozinha com ela.<br />

I: E você tinha alguém que te ajudava com ela?<br />

N: Não. A minha sogra vinha um pouco, fazia comida, porque eu não tenho empregada,<br />

tenho uma diarista, enten<strong>de</strong>u, então ela vinha, arrumava a casa uma vez por semana, fazia<br />

comida congelada, mas o resto não. Então, assim, eu ficava sozinha...<br />

I: E você também tinha que cuidar da casa, do marido e <strong>de</strong>la?<br />

N: Do marido não, porque ele se virou muito bem, graças a Deus que nessa parte ele me<br />

ajudou pra caramba, e a minha sogra, mas assim, eu cui<strong>de</strong>i do jeito que <strong>de</strong>u, isso eu fechei o<br />

olho legal, não me cobrei porque não dava. Então, a comida minha sogra trazia, a casa ela<br />

que tratava, então, o resto, eu ia fazendo enquanto ela dormia. Mas, a Clara, por conta da<br />

cólica, ela não dormia muito. Isso foi horrível, isso foi um caos, eu chorei muito, chorava, e<br />

quando ela chorava, eu chorava <strong>de</strong> novo “ai não, ela vai ter cólica <strong>de</strong> novo, ai ¨meu Deus,<br />

eu não agüento isso. E aí eu liguei pra uma nutricionista que me ajudou na gravi<strong>de</strong>z, ela: “-<br />

Nina, vê se ela não libera um remedinho pra gases e tal”, e ela liberou, só que eu tive que<br />

mudar, porque aquele remédio não funcionava. Mas aí, também, eu não falava pra muito<br />

gente, pra minha irmã, por exemplo, ela falou assim: “- remédio, pra criança?”, mas as<br />

filhas <strong>de</strong>la não tiveram cólica, então ela não tem noção do que é uma criança berrando,<br />

enten<strong>de</strong>u, então, ela falou assim: “- eu não posso dar remédio pra criança”. Eu tinha, assim,<br />

muita preocupação com a minha irmã. Minha irmã, ela tem um processo muito diferente do<br />

meu, ela tem uma visão, e ela é toda natural.<br />

I: Ela é mais velha?<br />

N: É mais nova, e com dois filhos. Então, é uma coisa complicada. Eu senti todas essas<br />

angústias e eu não falava pra ela, pra ela eu não falava, porque eu lembro que um dia que<br />

eu falei assim: “ah, a primeira febrinha que ela teve que eu <strong>de</strong>i um antitérmico, ela: “- o que<br />

quê cê <strong>de</strong>u?”, eu falei: “<strong>de</strong>i novalgina e <strong>de</strong>poi...”, “- novalgina?!, isso é um absurdo, olha,<br />

isso é um crime, porque baixa a pressão!”, olha, eu fiquei tremendo, <strong>de</strong>pois eu falei: “ai

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