EMAC - UFG - EMAC - Mestrado em Música e Artes Cênicas - UFG
EMAC - UFG - EMAC - Mestrado em Música e Artes Cênicas - UFG EMAC - UFG - EMAC - Mestrado em Música e Artes Cênicas - UFG
156 espiritual estiveram para mim, durante algum tempo, associadas a alguns tipos de música. Isto me trouxe inúmeras inquietações e questionamentos sobre corporeidade e acarretou em dificuldades em lidar de forma mais profunda e criativa com meu próprio corpo. Tive ainda a oportunidade de engajar-me em alguns projetos sociais vinculados à igreja, nos quais eu utilizava a música com grupos de crianças e adolescentes como forma de socialização. Já na adolescência, o desejo natural de “transgredir”, isto é, de ir além dos limites estabelecidos, realizou-se através do aprendizado do violão, da participação em corais e outros projetos musicais desenvolvidos pela escola, no Ensino Médio. Um maior contato com a música popular brasileira e o fato de assistir a shows musicais de artistas veiculados pela mídia me fizeram ter novas representações de música, provindas das novas situações vividas nessa fase e da inserção em outros grupos sociais. Assim, como afirmam Chombart de Lauwe e Feuerhahn sobre a gênese das representações sociais (1989, apud RIBEIRO e ALMEIDA, 2003, p.153), “o papel do indivíduo se ressocializa em função das transformações materiais e ideológicas de sua sociedade e época, bem como por sua inserção em novos papéis, segundo as idades da vida e os acontecimentos de sua história pessoal”. Durante o preparatório para o processo seletivo para o curso de graduação em Musicoterapia e também no decorrer desta formação, tive contato com novas compreensões a respeito da música. No estudo do violão clássico e ao relacionar-me com alunos de Música e Educação Musical, percebia como aquele era um universo em que se respirava uma “música de qualidade”, diferente daquelas tocadas nas rádios e do gosto da maioria dos jovens. Essas representações de música erudita, uma música destinada aos instruídos, inicialmente pareciam-me antagônicas às idéias difundidas pelos professores da área da Musicoterapia, que partiam de um conceito amplo de música, e mostravam como eu deveria despir-me de meus preconceitos a fim de atender às necessidades de meus futuros clientes, estando aberta a utilizar qualquer tipo de música, independente de meus gostos musicais e preferências estéticas. No entanto, com o passar dos anos, convivendo com essa “polaridade”, tornou-se mais claro que, como musicoterapeuta, eu deveria estar sensível à condição do meu cliente, porém sempre em busca da aquisição de um amplo saber musical que me desse condições de realizar uma escuta da produção do cliente, que aprimorasse a minha produção musical, e que
157 me capacitasse a realizar uma leitura e análise musicoterapêuticas acertadas. Isto é, a compreensão da musicoterapia enquanto complexo arte-ciência. De tal modo, as experiências musicoterapêuticas com função didática, que permitiram a mim, estudante, experimentar e vivenciar a Musicoterapia autenticamente como cliente, coordenadas pelas professoras do curso, tiveram importante valor em minha formação. Lembro-me de determinada experiência em que fui conduzida pela música a criar diferentes movimentos corporais, e inicialmente um forte estranhamento me ocorreu. Então, a troca de olhares cheios de censura e crítica com outros colegas pareciam me fortalecer na evitação do contato com a música. Porém, depois de um breve tempo, vi-me completamente envolvida com a proposta, junto aos meus colegas; invadida pela música, eu fluía com ela. Despertei, por essa e tantas outras experiências, para a capacidade da música de mobilizar em diferentes sentidos, provocando reações não somente cognitivas, mas também corporais, psico-emocionais e transpessoais. Comecei a relacionar cada vez mais a música como forma de promoção de saúde. As experiências de estágio e a prática clínica, depois de formada, colocaram-me em contato com diferentes realidades, e fizeram-me lidar melhor com as diferenças, com os excluídos, com aqueles que precisavam de ajuda e já haviam esgotado suas esperanças em outras fontes. Conforme descreve Barcellos (2004b, p.47), “na prática clínica estão o paciente, o terapeuta e a música, num espaço que podemos chamar de „sagrado‟ e a dinâmica da relação ou do encontro destes”. A autora esclarece que “o paciente traz consigo seu mundo, suas necessidades, seus conflitos e desejos, enfim, seus conteúdos internos” e “o musicoterapeuta está nesse espaço para acolher o paciente e seu mundo. Para interagir com ele, para fazer intervenções – o que se constitui como importante instrumento de mudanças –, e para ser o continente ou o continente sonoro de toda a expressão do paciente”. Assim, ao entrar no mundo das crianças autistas, em minha primeira experiência de estágio, deparei-me com a falta de contato visual, estereótipos, auto e heteroagressão. “Que mundo é esse?” eu me perguntava a cada atendimento, ansiosa por resultados. Após compartilhar dos mesmos sentimentos dos familiares dessas crianças, que se queixavam da enorme dificuldade de se relacionarem com elas, e me sentir, em algumas situações no setting, como um objeto do qual a criança se aproximava apenas para sentar-se e cujo olhar parecia me atravessar, tive que repensar meu instrumento de trabalho, confiar no poder terapêutico da música e passei a acolher essas crianças, independe de uma ação recíproca. Então, o trabalho
- Page 117 and 118: 105 Perspectivas para o futuro As r
- Page 119 and 120: 107 suas falas aspectos que evidenc
- Page 121 and 122: 109 Ao conversarmos um pouco mais c
- Page 123 and 124: 111 As opiniões dos participantes
- Page 125 and 126: 113 No segundo encontro optamos pel
- Page 127 and 128: 115 trabalham. Ao final do atendime
- Page 129 and 130: 117 Assim, notamos que pelo conteú
- Page 131 and 132: 119 Ainda nesse atendimento Sandra
- Page 133 and 134: 121 demais pode extrapolar e ai, n
- Page 135 and 136: 123 respingando em mim, me veio um
- Page 137 and 138: 125 musical 33 dando oportunidade a
- Page 139 and 140: 127 O grupo representou uma cena ve
- Page 141 and 142: 129 monitores e técnicos, possibil
- Page 143 and 144: 131 Pra que usar de tanta educaçã
- Page 145 and 146: 133 caso tal intervenção de nossa
- Page 147 and 148: 135 instrumento musical dos partici
- Page 149 and 150: 137 né?! Se tivesse os instrumento
- Page 151 and 152: 139 “Hoje eu já me sinto mais co
- Page 153 and 154: 141 Percebendo a profundidade do co
- Page 155 and 156: 143 Um participante comentou que du
- Page 157 and 158: 145 Joaquim escreveu um poema em um
- Page 159 and 160: 147 músicas instrumentais 38 utili
- Page 161 and 162: 149 Musicoterapia, ao proporcionar
- Page 163 and 164: 151 Esclarecemos ainda que um prime
- Page 165 and 166: 153 seu universo imaginando-se em s
- Page 167: 155 Ao optar pela fundamentação t
- Page 171 and 172: 159 históricocultural. Todas essas
- Page 173 and 174: 161 Sobre o distanciamento entre t
- Page 175 and 176: abertura ao inusitado e às singula
- Page 177 and 178: 165 seus próprios sons, a criaçã
- Page 179 and 180: BENENZON, R. O. O manual de Musicot
- Page 181 and 182: 169 CRAVEIRO DE SÁ, L. Música em
- Page 183 and 184: 171 JODELET, D. (org.) As represent
- Page 185 and 186: 173 MOTTA, K. A. M. B.; MUNARI, D.B
- Page 187 and 188: 175 RICHARDSON, R. e WAINWRIGHT, D.
- Page 189 and 190: 177 de Engenharia de produção e S
- Page 191 and 192: ANEXO I - FOLHA DE APROVAÇÃO DO P
- Page 193 and 194: participação na pesquisa poderá
- Page 195 and 196: Estarão presentes uma musicoterape
- Page 198 and 199: ANEXO V - IMAGEM ESCOLHIDA PELA PAR
- Page 201 and 202: I ANEXO VII - PARTITURA COMPOSIÇÃ
- Page 203 and 204: ANEXO IX - IMAGENS ESCOLHIDAS PELAS
- Page 205 and 206: ANEXO XI - AVALIAÇÃO DOS ENCONTRO
- Page 207: ANEXO XII - PARTITURA DA CANÇÃO
157<br />
me capacitasse a realizar uma leitura e análise musicoterapêuticas acertadas. Isto é, a<br />
compreensão da musicoterapia enquanto complexo arte-ciência.<br />
De tal modo, as experiências musicoterapêuticas com função didática, que<br />
permitiram a mim, estudante, experimentar e vivenciar a Musicoterapia autenticamente como<br />
cliente, coordenadas pelas professoras do curso, tiveram importante valor <strong>em</strong> minha<br />
formação. L<strong>em</strong>bro-me de determinada experiência <strong>em</strong> que fui conduzida pela música a criar<br />
diferentes movimentos corporais, e inicialmente um forte estranhamento me ocorreu. Então, a<br />
troca de olhares cheios de censura e crítica com outros colegas pareciam me fortalecer na<br />
evitação do contato com a música. Porém, depois de um breve t<strong>em</strong>po, vi-me completamente<br />
envolvida com a proposta, junto aos meus colegas; invadida pela música, eu fluía com ela.<br />
Despertei, por essa e tantas outras experiências, para a capacidade da música de mobilizar <strong>em</strong><br />
diferentes sentidos, provocando reações não somente cognitivas, mas também corporais,<br />
psico-<strong>em</strong>ocionais e transpessoais.<br />
Comecei a relacionar cada vez mais a música como forma de promoção de saúde.<br />
As experiências de estágio e a prática clínica, depois de formada, colocaram-me <strong>em</strong> contato<br />
com diferentes realidades, e fizeram-me lidar melhor com as diferenças, com os excluídos,<br />
com aqueles que precisavam de ajuda e já haviam esgotado suas esperanças <strong>em</strong> outras fontes.<br />
Conforme descreve Barcellos (2004b, p.47), “na prática clínica estão o paciente, o<br />
terapeuta e a música, num espaço que pod<strong>em</strong>os chamar de „sagrado‟ e a dinâmica da relação<br />
ou do encontro destes”. A autora esclarece que “o paciente traz consigo seu mundo, suas<br />
necessidades, seus conflitos e desejos, enfim, seus conteúdos internos” e “o musicoterapeuta<br />
está nesse espaço para acolher o paciente e seu mundo. Para interagir com ele, para fazer<br />
intervenções – o que se constitui como importante instrumento de mudanças –, e para ser o<br />
continente ou o continente sonoro de toda a expressão do paciente”.<br />
Assim, ao entrar no mundo das crianças autistas, <strong>em</strong> minha primeira experiência<br />
de estágio, deparei-me com a falta de contato visual, estereótipos, auto e heteroagressão. “Que<br />
mundo é esse?” eu me perguntava a cada atendimento, ansiosa por resultados. Após<br />
compartilhar dos mesmos sentimentos dos familiares dessas crianças, que se queixavam da<br />
enorme dificuldade de se relacionar<strong>em</strong> com elas, e me sentir, <strong>em</strong> algumas situações no setting,<br />
como um objeto do qual a criança se aproximava apenas para sentar-se e cujo olhar parecia<br />
me atravessar, tive que repensar meu instrumento de trabalho, confiar no poder terapêutico da<br />
música e passei a acolher essas crianças, independe de uma ação recíproca. Então, o trabalho