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A Tempo - Revista de Pesquisa em Música - n°2 (jan/jun ... - Fames

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<strong>de</strong>sse gênero, Nazareth, tocava piano<br />

na entrada <strong>de</strong> um cin<strong>em</strong>a da Avenida<br />

Rio Branco. Seu modo <strong>de</strong> tocar, flúido,<br />

inapreensível e triste, ajudou-me,<br />

igualmente, a melhor conhecer a alma<br />

brasileira (MILHAUD, apud ARAÚJO, p.<br />

154).<br />

Como po<strong>de</strong>ríamos enten<strong>de</strong>r o que<br />

Milhaud chama jeito “flúido, inapreensível<br />

e triste” <strong>de</strong> Nazareth tocar piano? Haveria<br />

um sentimentalismo <strong>em</strong> sua maneira <strong>de</strong><br />

interpretar, uma certa melancolia? Estariam<br />

as valsas incluídas neste repertório <strong>de</strong> sala<br />

<strong>de</strong> espera? Não há como traçar respostas<br />

<strong>de</strong>finitivas. Mas há como conjecturar<br />

que certamente Nazareth falava <strong>de</strong> seus<br />

sentimentos através <strong>de</strong> sua música e <strong>de</strong> sua<br />

maneira <strong>de</strong> interpretá-la; o que talvez possa<br />

ser realmente entendido como uma maneira<br />

sentimental <strong>de</strong> se tocar piano.<br />

Outro fator importante a ser consi<strong>de</strong>rado<br />

diz respeito à presença <strong>de</strong> el<strong>em</strong>entos<br />

da música <strong>de</strong> Chopin na sonorida<strong>de</strong> da<br />

música <strong>de</strong> Nazareth. Sab<strong>em</strong>os que uma das<br />

marcas da música para piano <strong>de</strong> Chopin é a<br />

aplicação dos rubatos. Como <strong>de</strong>finição do<br />

que seja o rubato, Chopin explicava (GROUT<br />

e PALISCA, 2001, p. 596) ser “uma ligeira<br />

aceleração ou atraso no fraseado da mão<br />

direita enquanto o acompanhamento da<br />

mão esquerda prossegue rigorosamente.”<br />

Acreditamos, <strong>de</strong>sta forma, ser o rubato<br />

um recurso importante a ser aplicado nas<br />

interpretações das valsas <strong>de</strong> Nazareth.<br />

Pensando-se, ainda, <strong>em</strong> parâmetros para<br />

uma prática interpretativa das valsas,<br />

precisamos consi<strong>de</strong>rar os el<strong>em</strong>entos<br />

brasileiros na música <strong>de</strong> Nazareth; fator<br />

repetido por muitos autores. Acreditamos<br />

ser importante, <strong>de</strong>sta feita, <strong>de</strong>stacar a<br />

presença do jeito <strong>de</strong> ser do brasileiro e da<br />

sonorida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua música na virada do<br />

século XIX para o XX, nas composições<br />

<strong>de</strong> Nazareth. Para sintetizar muitas falas a<br />

respeito <strong>de</strong>ste fato quer<strong>em</strong>os <strong>de</strong>stacar aqui<br />

o que Mozart <strong>de</strong> Araújo (p. 169), <strong>em</strong> trecho<br />

já citado neste trabalho, consi<strong>de</strong>ra como<br />

el<strong>em</strong>entos do jeito brasileiro na música <strong>de</strong><br />

Nazareth: “o sotaque, a ginga, o <strong>de</strong>ngue, o<br />

jeitinho nacional.” Assim como a <strong>de</strong>streza <strong>em</strong><br />

traduzir, s<strong>em</strong> transcrever, a sonorida<strong>de</strong> dos<br />

instrumentos populares (a flauta, o violão,<br />

o cavaquinho, o oficlei<strong>de</strong>, o bombardino, a<br />

percussão) através dos recursos do piano.<br />

Dentre os instrumentos da música popular<br />

citados, pareceu-nos haver uma constante,<br />

porém sutil referência à flauta, no fraseado<br />

feito pela melodia, e, <strong>em</strong> alguns poucos<br />

momentos, uma referência ao violão na<br />

condução do baixo feito pela mão esquerda.<br />

Como sugestão final acreditamos, então, ser<br />

possível elaborar um critério, nada rígido<br />

ou <strong>de</strong>finitivo, <strong>de</strong> se interpretar as valsas <strong>de</strong><br />

Nazareth. Para este fim o pianista precisa<br />

r<strong>em</strong>eter sua interpretação ao hom<strong>em</strong><br />

sentimental que se inspirava na música <strong>de</strong><br />

Chopin e se <strong>de</strong>ixava levar pela ginga e pelos<br />

sons da música popular brasileira <strong>de</strong> então.<br />

O fraseado da melodia <strong>de</strong>ve buscar traduzir<br />

as possibilida<strong>de</strong>s da flauta, produzindo,<br />

<strong>de</strong>sta feita, uma interpretação <strong>de</strong> pulsação<br />

maleável, com fraseado t<strong>em</strong>perado pelo<br />

sentimentalismo e com ares <strong>de</strong> recitação<br />

seresteira.<br />

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