05.08.2014 Views

o_18uj0ggsurp7ahj1c02eb11j7s9.pdf

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

A VIOLÊNCIA 335<br />

adequando ao que os indicadores da beleza exigem de nós.<br />

A leitora acaba o artigo e olha as ilustrações. O rosto da<br />

mulher dá a impressão de que ela recebeu um golpe transversal<br />

aos malares com um cano de ferro. Os olhos estão<br />

enegrecidos. A pele dos quadris está coberta de contusões.<br />

Os seios estão inchados e amarelados como olhos<br />

de alguém que sofra de hipertireoidismo e icterícia ao mesmo<br />

tempo. Os seios da mulher não se mexem. O sangue<br />

forma crostas abaixo das suturas. Há dois ou três anos,<br />

a leitora considerava alarmistas as imagens dessa natureza.<br />

Hoje ela percebe que elas são promocionais. Já não<br />

se espera que ela reaja com a repugnância que a princípio<br />

sentia. As revistas femininas estabelecem os indicadores<br />

da beleza. Deram enorme cobertura à cirurgia, em<br />

parte porque muito pouco do que acontece no mundo da<br />

beleza tem algo de novo. Essas matérias fazem com que<br />

nós leitoras acreditemos que não devemos recuar diante<br />

de nada, já que aparentemente outras leitoras, nossas concorrentes,<br />

estão se portando com bravura. O artigo típico,<br />

que descreve semanas de dores atrozes que terminam<br />

com uma mulher bela e feliz, provoca nas mulheres algo<br />

como uma compulsão consumista.<br />

Uma mulher num abrigo para vítimas de violência<br />

uma vez descreveu para mim as suas pernas como "uma<br />

contusão só, como se estivessem usando meias roxas". Numa<br />

entrevista para um livro de promoção da cirurgia estética,<br />

ouvida por acaso numa lanchonete de Manhattan,<br />

uma mulher que fizera lipoaspiração usou uma imagem<br />

semelhante. Não são as mutilações que precisam ser examinadas,<br />

mas a atmosfera em que vivemos que faz com<br />

que elas não tenham importância.<br />

Entramos num estágio novo e apavorante da cirurgia<br />

estética. Todos os limites foram derrubados. Nenhuma<br />

quantidade de sofrimento ou risco de deformação consegue<br />

servir de freio. O que está acontecendo ao corpo<br />

da mulher no que diz respeito à cirurgia estética é semelhante<br />

ao que está acontecendo com o equilíbrio da vida<br />

no planeta. Estamos num momento decisivo da história.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!