Cavaquistas querem que Vítor Gaspar saia - Europa
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6 Público Domingo 29 Janeiro 2012<br />
O país mais pobre<br />
Tendência para reduzir custos salariais<br />
no sector privado acentua-se em 2012<br />
A partir do momento em <strong>que</strong> o Governo cortou os salários da função pública, as empresas<br />
privadas começaram a tentar replicar o modelo. Em algumas já houve acordo<br />
Ra<strong>que</strong>l Martins<br />
a Empresas de consultoria, arquitectura,<br />
engenharia, media, restauração,<br />
hotelaria e cultura. Muitos trabalhadores<br />
estão a ser confrontados com propostas<br />
de redução de salários, cortes<br />
na isenção de horário e outras regalias.<br />
Esta é uma tendência <strong>que</strong> se tem<br />
afi rmado no sector privado, a partir do<br />
momento em <strong>que</strong> o Governo decidiu<br />
cortar os salários no sector público,<br />
mas <strong>que</strong> é difícil de quantifi car.<br />
Nas situações relatadas ao PÚBLICO<br />
por advogados da área laboral, os cortes<br />
salariais são apresentados como a<br />
alternativa ao desemprego, ao lay off<br />
ou ao encerramento da empresa. Em<br />
muitos casos, os trabalhadores acabam<br />
por aceitar.<br />
Foi o <strong>que</strong> aconteceu com João (nome<br />
fi ctício), engenheiro numa pe<strong>que</strong>na<br />
empresa <strong>que</strong> viu mais de metade dos<br />
colegas sair ao longo dos últimos dois<br />
anos, devido às <strong>que</strong>bras na actividade.<br />
No último trimestre do ano passado, e<br />
perante as difi culdades perspectivadas<br />
para 2012, a empresa propôs um corte<br />
salarial de 15% aos <strong>que</strong> fi caram. O<br />
acordo foi assinado pela maioria, com<br />
o compromisso de a empresa rever a<br />
situação ao fi m de seis meses.<br />
Nos escritórios de advogados desde<br />
fi nais do ano passado <strong>que</strong> se sucedem<br />
os pedidos de informações por parte<br />
de empresas e trabalhadores. As primeiras<br />
<strong><strong>que</strong>rem</strong> saber como reduzir<br />
os custos salariais. Os segundos como<br />
reagir às propostas de cortes.<br />
António Garcia Pereira dá conta de<br />
pelo menos oito pedidos de informação<br />
recebidos este mês. São sobretudo<br />
casos de empresas “do sector terciário<br />
onde a taxa de sindicalização é muito<br />
baixa e onde muitos trabalhadores estão<br />
com contratos a termo”.<br />
Sem concretizar, o advogado fala<br />
em empresas prestadoras de serviços,<br />
como auditoria e consultoria, e órgãos<br />
de comunicação social de pe<strong>que</strong>na dimensão.<br />
E aponta como principal causa<br />
para estas propostas o corte salarial<br />
feito no ano passado aos funcionários<br />
públicos “<strong>que</strong> o Tribunal Constitucional<br />
validou”. “Generaliza-se a ideia de<br />
<strong>que</strong> vale tudo”, alerta.<br />
Mas, destaca o advogado, nem tudo<br />
é permitido. Antes de mais, a empresa<br />
não pode decidir unilateralmente e<br />
é preciso demonstrar <strong>que</strong> a isenção<br />
de horário de trabalho decorre da<br />
actividade da empresa e “não é uma<br />
forma de compor o salário”. E mesmo<br />
assim Garcia Pereira entende <strong>que</strong><br />
“não há hipóteses de o empregador<br />
alterar essa situação sem o acordo do<br />
trabalhador”.<br />
Também o advogado Fausto Leite<br />
tem recebido pedidos de trabalhadores<br />
para avaliar propostas das empresas.<br />
Os ateliers de arquitectura, a restauração,<br />
o imobiliário e o sector das<br />
artes são alguns dos casos <strong>que</strong> tem em<br />
mãos. A pressão para os trabalhadores<br />
aceitarem, diz, “é muito mais fácil nas<br />
micro-empresas”. “A situação é quase<br />
sempre a mesma: ou há redução dos<br />
custos salariais ou a empresa ameaça<br />
avançar para o lay off ou despedimentos”.<br />
Embora rejeite à partida medidas<br />
<strong>que</strong> levem à redução dos salários,<br />
Fausto Leite admite <strong>que</strong> em alguns<br />
casos é a única alternativa: “A redução<br />
unilateral é ilegal. Mas não me repugna<br />
se for demonstrado <strong>que</strong> é a única<br />
via para evitar o encerramento.”<br />
Filipe Fraústo da Silva, advogado<br />
da Uría Menéndez-Proença de Carvalho,<br />
os pedidos de informação de<br />
empresas chegaram depois de se confi<br />
rmarem os cortes salariais no sector<br />
público. “Muitas empresas abordamnos<br />
para saber se é possível fazer algo<br />
semelhante no privado”, relata. E há<br />
também <strong>que</strong>m <strong>que</strong>ira saber como reti-<br />
rar isenção de horário de trabalho ou<br />
pergunte se é possível despedir para<br />
depois readmitir o mesmo trabalhador<br />
por um salário mais baixo, uma<br />
situação ilegal.<br />
No caso da isenção, Fraústo da Silva<br />
lembra <strong>que</strong> há <strong>que</strong> ter em conta<br />
os contratos colectivos do sector e o<br />
contrato do trabalhador em causa. “A<br />
maior parte dos acordos de isenção<br />
de horário são omissos quanto às circunstâncias<br />
em <strong>que</strong> a empresa pode<br />
retirar a isenção.” E nesse caso, o advogado<br />
entende <strong>que</strong> a empresa deve<br />
poder retirá-la, embora os tribunais<br />
do trabalho entendam <strong>que</strong> a decisão<br />
não pode ser unilateral. Uma vez <strong>que</strong><br />
o Código do Trabalho prevê a irredutibilidade<br />
do salário, “as empresas de<br />
maior dimensão preferem não arriscar”,<br />
diz.<br />
Nos escritórios<br />
de advogados<br />
sucedem-se<br />
os pedidos<br />
de informação<br />
Os sindicatos não negam as pressões<br />
para os trabalhadores do privado<br />
aceitarem reduzir salários, mas<br />
garantem <strong>que</strong> a maioria não se concretizou.<br />
Ou por<strong>que</strong> as negociações<br />
estão a decorrer ou por<strong>que</strong> fi caram<br />
pelo caminho devido à intervenção<br />
do próprio sindicato.<br />
José Manuel Oliveira, coordenador<br />
da FECTRANS, diz <strong>que</strong> no sector privado<br />
as reduções de custos têm sido<br />
feitas sobretudo à custa do corte nas<br />
ajudas de custo. O mesmo diz Sérgio<br />
Monte, do SITRA, <strong>que</strong> aponta para os<br />
cortes <strong>que</strong> se avizinham no pagamento<br />
do trabalho suplementar, <strong>que</strong> nos<br />
transportes privados de passageiros<br />
representa 30 a 40% da remuneração<br />
<strong>que</strong> o motorista leva para casa. No sector<br />
têxtil ou do calçado, a pressão é<br />
sobretudo para aceitar fl exibilidades<br />
de horários, enquanto na indústria<br />
química, farmacêutica e no sector da<br />
propaganda médica, as empresas têm<br />
optado por reduções de pessoal, como<br />
precisaram ao PÚBLICO dirigentes<br />
sindicais.<br />
Na área da comunicação social, pelo<br />
menos dois jornais, o PÚBLICO e o i<br />
optaram por reduzir custos salariais,<br />
mas segundo Garcia Pereira há outros<br />
na calha.