Cavaquistas querem que Vítor Gaspar saia - Europa
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Portugal<br />
O Presidente tem o olhar crítico sobre a política do Governo<br />
<strong>Cavaquistas</strong> defendem saída<br />
de <strong>Vítor</strong> <strong>Gaspar</strong> do Governo<br />
A rota de colisão entre Cavaco e Passos acelerou-se. E os cavaquistas não<br />
escondem as divergências profundas em relação à política do Governo<br />
São José Almeida<br />
a É absoluta a discordância de algumas<br />
das mais proeminentes personalidades<br />
do cavaquismo e do próprio<br />
Presidente da República sobre<br />
a condução da política orçamental e<br />
as prioridades para a organização das<br />
fi nanças públicas, <strong>que</strong> têm sido adoptadas<br />
pelo Governo. O PÚBLICO sabe<br />
<strong>que</strong>, dentro deste grupo de personalidades<br />
<strong>que</strong> apoiam Cavaco Silva, há<br />
<strong>que</strong>m defenda já <strong>que</strong> o Governo deve<br />
substituir o ministro das Finanças, <strong>Vítor</strong><br />
<strong>Gaspar</strong>, <strong>que</strong> vêem como “um ultraliberal”<br />
<strong>que</strong> está a “dar cabo” do modelo<br />
social e económico construído<br />
após o 25 de Abril e no qual, frisam,<br />
os três governos de Cavaco (1985-1995)<br />
tiveram um papel crucial.<br />
A <strong>que</strong>stão de fundo — <strong>que</strong> tem<br />
criado tensão entre o Governo e o<br />
Presidente, cuja existência o Expresso<br />
ontem noticiou — passa pelo<br />
facto de <strong>que</strong> estas personalidades, a<br />
maioria das quais com conhecimento<br />
e refl exão precisamente na área<br />
económica, quando não mesmo em<br />
fi nanças públicas, como é o caso do<br />
próprio Cavaco Silva, verem como errado<br />
<strong>que</strong> as medidas de austeridade<br />
<strong>que</strong> são impostas pela crise da dívida<br />
pública sejam concretizadas com<br />
um enquadramento <strong>que</strong> vai conduzir,<br />
acreditam, à destruição da classe média<br />
e, conse<strong>que</strong>ntemente, do tecido<br />
económico português, <strong>que</strong> assenta<br />
em pe<strong>que</strong>nas e médias empresas, <strong>que</strong><br />
vivem do consumo.<br />
É notório, nas conversas com as<br />
personalidades do cavaquismo, o<br />
crescendo de preocupação sobre o<br />
<strong>que</strong> vêem como a “desestruturação<br />
da economia”, pela ausência de investimento.<br />
Isso é transparente em<br />
vésperas de mais uma cimeira europeia,<br />
<strong>que</strong> decorrerá amanhã, segunda-feira,<br />
em Bruxelas, e em <strong>que</strong> os<br />
responsáveis dos 27 Estados-membros<br />
vão, pela primeira vez, discutir<br />
a necessidade de uma agenda para o<br />
crescimento económico e políticas de<br />
investimento.<br />
Cavaco, o crítico<br />
O próprio Presidente já assumiu publicamente<br />
a sua discordância com<br />
o Governo. E as críticas de Cavaco<br />
Silva estenderam-se mesmo aos líderes<br />
da União Europeia, no discurso<br />
<strong>que</strong> fez a 12 de Outubro, no Instituto<br />
Universitário Europeu, Florença, Itália,<br />
quando defendeu <strong>que</strong> o problema<br />
não era do euro, mas das opções<br />
políticas dos Estados-membros e da<br />
falta de solidariedade e de políticas<br />
comuns conducentes à recuperação<br />
dos países em crise.<br />
A posição de crítica de Cavaco foi<br />
assumida internamente, dias depois,<br />
ao intervir no Congresso dos Economistas,<br />
em Lisboa, a 19 de Outubro,<br />
onde afi rmou explicitamente <strong>que</strong> era<br />
necessário “justiça na repartição dos<br />
sacrifícios” e combater “<strong>que</strong> se instale<br />
a ideia de <strong>que</strong> não se faz tudo o<br />
<strong>que</strong> podia ser feito para dinamizar a<br />
economia e combater o desemprego”.<br />
E, à saída da sala do congresso,<br />
declarou aos jornalistas <strong>que</strong> considerava<br />
<strong>que</strong> o Orçamento do Estado<br />
para 2012 não tinha políticas de<br />
investimento nem de dinamização<br />
do investimento, bem como <strong>que</strong><br />
considerava contrário ao princípio<br />
constitucional da equidade fi scal a<br />
confi scação fi scal dos subsídios de<br />
DANIEL ROCHA<br />
férias e de Natal da função pública.<br />
É assim conhecido o posicionamento<br />
crítico de Cavaco Silva à política<br />
económica e orçamental do<br />
Governo. E entre as personalidades<br />
O próprio<br />
Presidente<br />
já assumiu<br />
publicamente a<br />
sua discordância<br />
com o Governo<br />
em relação ao<br />
Orçamento do<br />
Estado e criticou<br />
mesmo os líderes<br />
da União Europeia<br />
Público Domingo 29 Janeiro 2012 17<br />
cavaquistas são apontadas soluções<br />
governativas alternativas às do Governo<br />
de Passos Coelho e não subsidiarias<br />
de uma lógica neoliberal, mas<br />
sim de defesa do Estado-providência<br />
dentro das concepções <strong>que</strong> caracterizam<br />
o modelo social europeu e o<br />
papel social do Estado.<br />
As alternativas do Presidente<br />
E se há <strong>que</strong>m frise <strong>que</strong> as preocupações<br />
sociais do actual Presidente<br />
sempre foram patentes na sua governação,<br />
há <strong>que</strong>m lembre <strong>que</strong>, em privado,<br />
quando era primeiro-ministro,<br />
Cavaco comentava <strong>que</strong> não se revia<br />
na comparação <strong>que</strong> era então feita<br />
pelos <strong>que</strong> o alcunhavam de “Thatcher<br />
português”, precisamente por<strong>que</strong> se<br />
distanciava da visão neoliberal do papel<br />
social do Estado.<br />
Uma das <strong>que</strong>stões em <strong>que</strong> a divergência<br />
entre Cavaco e as políticas gizadas<br />
por <strong>Vítor</strong> <strong>Gaspar</strong> é profunda<br />
é o tratamento dado aos pensionistas.<br />
Entre as personalidades do cavaquismo<br />
é clara a condenação de o<br />
Governo estar a mexer nas pensões<br />
de reforma e sobrevivência, quando<br />
estas são o resultado de uma vida de<br />
trabalho e de descontos <strong>que</strong> as pessoas<br />
fi zeram, pelo <strong>que</strong> são direitos<br />
adquiridos.<br />
Outra linha de crítica do Presidente<br />
a Vitor <strong>Gaspar</strong> tem <strong>que</strong> ver com a<br />
equidade fi scal. O facto de os impostos<br />
extraordinários caírem quase exclusivamente<br />
sobre o rendimento do<br />
trabalho, bem como o facto de o corte<br />
de despesa ter sido feito sobre a massa<br />
salarial dos funcionários públicos e<br />
não sobre as “gorduras” e “avenças”<br />
e “consultadorias” <strong>que</strong> se instalaram<br />
e “sugam” os dinheiros públicos, é<br />
outro pomo de discórdia. Ao <strong>que</strong> o<br />
PÚBLICO sabe, <strong>que</strong>r o Presidente<br />
<strong>que</strong>r as personalidades cavaquistas<br />
consideram <strong>que</strong> a política fi scal<br />
não podia deixar de fora e poupar<br />
as empresas e os mais ricos. Ou seja,<br />
mais concretamente, <strong>que</strong> o aumento<br />
fi scal devia incidir no IVA e no IRS,<br />
mas também no IRC e na criação, por<br />
exemplo, de impostos sobre produtos<br />
de luxo e sobre os mais ricos.<br />
Outro exemplo de discordância,<br />
é a lei das rendas. Há mesmo <strong>que</strong>m<br />
classifi <strong>que</strong> o esta lei de “disparate”<br />
e <strong>que</strong>m se lhe tenha referido como<br />
“uma lei inútil”. E explicam <strong>que</strong>, num<br />
momento de crise e quando a maior<br />
parte das rendas já estão a valores<br />
de mercado, bem como são quase só<br />
idosos <strong>que</strong> têm rendas antigas, pelo<br />
<strong>que</strong> estão protegidos, aumentar as<br />
rendas de habitação vai criar um problema<br />
social suplementar ao Estado,<br />
pois haverá pessoas <strong>que</strong> irão precisar<br />
de ser apoiadas com subsídios, o <strong>que</strong><br />
aumenta a despesa social.<br />
E no domínio do aumento social<br />
do Estado, há personalidades do cavaquismo<br />
<strong>que</strong> frisam o aumento de<br />
despesa <strong>que</strong> o crescer do desemprego<br />
vai trazer. O aumento de desemprego,<br />
aliás, e o aumento de falências<br />
de pe<strong>que</strong>nas e médias empresas, por<br />
causa da perda de poder de compra<br />
da população portuguesa é um dos<br />
aspecto <strong>que</strong> mais preocupa o Presidente<br />
e por isso ele tem sido tão insistente<br />
nas declarações públicas sobre<br />
a necessidade de criar condições de<br />
investimento.