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Cavaquistas querem que Vítor Gaspar saia - Europa

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14 Público Domingo 29 Janeiro 2012<br />

Entrevista<br />

Espanha, devemos ir a Espanha.<br />

Há um custo de localização, de<br />

pouca sorte, <strong>que</strong> não se resolve<br />

aumentando uma oferta sem<br />

qualidade. E isso também é<br />

racionar. Não pode haver tantos<br />

hospitais a tratar cancro como há.<br />

Por<strong>que</strong> <strong>que</strong>m trata poucos cancros<br />

por ano, trata mal. Se me diz... ah,<br />

mas o povo não <strong>que</strong>r, paciência.<br />

Ou manda o ministro<br />

embora como fez no caso das<br />

maternidades com o Correia de<br />

Campos.<br />

Atenção <strong>que</strong> o Correia de Campos<br />

foi um excelente ministro da<br />

Saúde.<br />

E o <strong>que</strong> diz do actual?<br />

Não digo. Não conheço. Se <strong><strong>que</strong>rem</strong><br />

<strong>que</strong> diga algo positivo, foi a<br />

recondução dos directores do S.<br />

João e IPO <strong>que</strong> tanto quanto sei<br />

não são próximos do partido do<br />

Governo. São excelentes gestores.<br />

E aqui dou outra ideia. Este tipo<br />

de efi ciência de gestão pode<br />

ser usado como exemplo para<br />

hospitais semelhantes (cuidado,<br />

não se pode comparar coisas <strong>que</strong><br />

são diferentes). O São João pode<br />

ser comparado com o Hospital da<br />

Universidade de Coimbra e com<br />

o Santa Maria (em Lisboa). Seria<br />

sempre a favor de usar exemplos<br />

concretos, em vez dos tais cortes<br />

cegos. Que também é muito raro<br />

na nossa cultura, <strong>que</strong> é muito<br />

retórica. As pessoas gostam dos<br />

tipos <strong>que</strong> falam, falam... Quando<br />

alguém faz muito coloca os pares<br />

em che<strong>que</strong> e fere um maior<br />

número de interesses instalados.<br />

São mudanças difíceis...<br />

A grande resistência da sociedade<br />

portuguesa à transformação está<br />

na iliteracia. Continuamos a não<br />

saber o <strong>que</strong> nos interessa. Além<br />

disso, temos uma sociedade com<br />

corporações muito instaladas.<br />

Aí, as resistências são múltiplas.<br />

Nós podemos poupar imenso sem<br />

racionar. O <strong>que</strong> é uma estupidez é<br />

as pessoas começarem a chatear<br />

toda a gente se o velhinho de 70<br />

anos vai ou não fazer hemodiálise<br />

quando podemos é diminuir<br />

imenso as pessoas <strong>que</strong> precisam de<br />

hemodiálise.<br />

Acha <strong>que</strong> vamos conseguir sair<br />

da crise?<br />

Acho <strong>que</strong> sim, apesar de tudo<br />

temos condições razoáveis. Temos<br />

um desenvolvimento muito<br />

grande da ciência e educação.<br />

Tivemos. Somos muito sensíveis<br />

ao estrangeirado, é uma das<br />

características do Portugal. Mas,<br />

se repararmos, estamos a reagir de<br />

uma forma muito mais organizada<br />

do <strong>que</strong>, por exemplo, os gregos, os<br />

espanhóis e italianos.<br />

Temos mais espírito de sacrifício<br />

ou somos mais conformados?<br />

Temos mais espírito de sacrifi co.<br />

E, está bem, estamos mais calados<br />

mas isso é bom em termos de<br />

concertação social. Um dos<br />

grandes problemas para nós<br />

seria se, de repente, caíssemos<br />

num desespero tal <strong>que</strong> levasse,<br />

por exemplo, a um aumento da<br />

violência urbana.<br />

Acha <strong>que</strong> isso não pode ainda vir<br />

a acontecer? Ainda estamos no<br />

A nossa ciência está<br />

muito dependente<br />

do privado. Mas eu<br />

prefiro <strong>que</strong> exista<br />

a Champalimaud<br />

e a Gulbenkian<br />

do <strong>que</strong> não os ter.<br />

Não resolvo o meu<br />

problema com<br />

inveja. Ao menos<br />

<strong>que</strong> venham eles.<br />

Por outro lado,<br />

acho uma estupidez<br />

esta ideia de <strong>que</strong> é<br />

melhor emigrar<br />

início...<br />

É verdade. E estou muito<br />

assustado. Mas a minha fuga é<br />

sempre para a frente, é fazendo.<br />

Mesmo aqui no Ipatimup, onde<br />

estamos a passar uma fase difícil.<br />

O Governo cortou de uma forma<br />

estúpida, a universidade cortou e<br />

as pessoas não nos pagam.<br />

Que corte tiveram no orçamento?<br />

Tínhamos um contrato com<br />

a Fundação para a Ciência e<br />

Tecnologia de 1,6 milhões de<br />

euros por ano e reduziram-nos<br />

para o valor de 2005, 1,2 milhões.<br />

Este ano vamos aguentar com<br />

o dinheiro <strong>que</strong> tínhamos no<br />

banco. Mais dois anos assim<br />

e ou despedimos pessoas ou<br />

desligamos o a<strong>que</strong>cimento...<br />

ainda temos também o problema<br />

das prestações de serviços aos<br />

hospitais <strong>que</strong> também não estão a<br />

pagar.<br />

A investigação está ser afectada<br />

pela crise?<br />

Está muito bem por<strong>que</strong> ainda<br />

está com o lanço <strong>que</strong> teve com<br />

o ministro Mariano Gago. Está<br />

a ser afectada, mas apesar de<br />

tudo este ministro [Nuno Crato] é<br />

inteligente e a secretária de Estado<br />

[Leonor Parreira] é muito sensível<br />

à investigação. Esta decisão de<br />

passar para o orçamento de 2005 é<br />

do ano anterior, estes responsáveis<br />

mantiveram mas não diminuíram<br />

ainda mais. O futuro é assustador.<br />

Mas não estou tão preocupado<br />

com a ciência por<strong>que</strong> a ciência é<br />

internacional.<br />

Somos premiados e respeitados,<br />

mas somos apoiados?<br />

A nossa ciência está muito<br />

dependente do privado. Mas eu<br />

prefi ro <strong>que</strong> exista a Champalimaud<br />

e a Gulbenkian do <strong>que</strong> não os ter.<br />

Não resolvo o meu problema com<br />

inveja. Ao menos <strong>que</strong> venham<br />

eles. Por outro lado, acho uma<br />

estupidez esta ideia de <strong>que</strong> é<br />

melhor emigrar.<br />

Há fuga de cérebros?<br />

Há muita gente <strong>que</strong> está a sair.<br />

O país ganha em criar condições<br />

para <strong>que</strong> muitos dos bons fi <strong>que</strong>m.<br />

Não é preciso <strong>que</strong> fi <strong>que</strong>m todos.<br />

Voltamos à saúde e ao ensino. No<br />

ensino também temos de racionar.<br />

Não podemos ter o número de<br />

universidades e politécnicos <strong>que</strong><br />

temos. Temos dezenas de cursos<br />

de arquitectura, de psicologia...<br />

e os miúdos vão quase todos<br />

para o desemprego. Num país<br />

<strong>que</strong> está fragilizado, por razões<br />

circunstanciais e estruturais, o<br />

tru<strong>que</strong> não é apostar em pessoas<br />

e fait-divers, é apostar em<br />

instituições. Mas os políticos não<br />

gostam de escolher instituições.<br />

Perdem votos.<br />

Nem gostam de fechar<br />

universidades ou hospitais...<br />

Exacto. O grande obstáculo, além<br />

das corporações, são os próprios<br />

políticos. Os políticos vivem<br />

das corporações por interposta<br />

pessoa.<br />

E, ainda assim, acha <strong>que</strong> vamos<br />

conseguir sair disto?<br />

Acho por<strong>que</strong> não temos<br />

alternativa.<br />

Vamos sair disto diferentes?<br />

Já estamos um bocadinho<br />

diferentes. Aumentámos as<br />

exportações... não vamos<br />

continuar a fazer auto-estradas...<br />

acho <strong>que</strong> nós, como povo,<br />

somos bons em situações de<br />

grande aperto, em catástrofes.<br />

Despertamos solidariedade,<br />

generosidade. Não somos bons é<br />

na manutenção.<br />

O problema é <strong>que</strong> tudo indica<br />

<strong>que</strong> esta catástrofe é de longa<br />

duração...<br />

Vamos ter de aguentar por<strong>que</strong><br />

não temos alternativa. Não sei até<br />

<strong>que</strong> ponto vamos mudar os nossos<br />

comportamentos sociais. Se isto<br />

fi zesse com <strong>que</strong> houvesse menos<br />

hospitais e melhores, com redes de<br />

referenciação, menos e melhores<br />

universidades, menos cursos,<br />

menos e melhores instituições de<br />

ciência, tínhamos dado um passo<br />

de reforço do tecido social. O <strong>que</strong><br />

acho indecente é se o Governo<br />

aproveitar esta oportunidade para<br />

destruir o tecido institucional<br />

público.<br />

Há esse risco?<br />

Tenho medo. Sou totalmente a<br />

favor de reforçar o público, no<br />

ensino, na investigação e saúde.<br />

Se for preciso aparando as arestas,<br />

mas reforçá-lo. Não fragilizá-lo.<br />

Continuo a achar <strong>que</strong> é criminoso<br />

acreditar <strong>que</strong> a medicina privada e<br />

a privatização é melhor. É pior em<br />

custos e em efi ciência e qualidade.<br />

Está a falar das PPP [parcerias<br />

público-privadas]?<br />

Estou a falar de hospitais<br />

universitários e IPO <strong>que</strong> é o <strong>que</strong><br />

conheço melhor. Seria mortal<br />

<strong>que</strong> fossem transformados em<br />

empresas semiprivadas. Se<br />

quisermos dar cabo do SNS a<br />

melhor maneira é acabar com<br />

os hospitais universitários e IPO.<br />

São estas as instituições <strong>que</strong><br />

dão es<strong>que</strong>leto ao sistema. Sou<br />

totalmente contra a privatização<br />

da saúde. Não tenho nada contra<br />

a existência de áreas da saúde<br />

<strong>que</strong>, com regras claras, estejam<br />

privatizadas. Mas privatizar o<br />

SNS de uma forma disfarçada<br />

com a ideia de <strong>que</strong> os privados<br />

gerem melhor <strong>que</strong> o público? Não.<br />

Conheço públicos e privados <strong>que</strong><br />

são horrorosamente geridos. Todos<br />

nós já chamamos canalizadores a<br />

casa! Todos nós já recorremos a<br />

serviços privados <strong>que</strong> são muito<br />

maus.<br />

Disse recentemente numa<br />

entrevista <strong>que</strong> acabou o<br />

tempo das mordomias. Temos<br />

mordomias?<br />

Tínhamos. O dinheiro europeu<br />

para a nossa escala era muito e<br />

barato. Não nos apercebemos <strong>que</strong><br />

estávamos a comprar chatices para<br />

o futuro. Estávamos a criar um<br />

mundo cada vez mais desigual.<br />

Além das catástrofes naturais (da<br />

água e da energia), o <strong>que</strong> mais me<br />

assusta é a desigualdade. Por <strong>que</strong><br />

está a aumentar de uma maneira<br />

obscena. Como sociedade, fomos<br />

apanhados de surpresa. E é<br />

verdade <strong>que</strong> não desenvolvemos<br />

ri<strong>que</strong>za. Acabámos com a pesca,<br />

agricultura, têxtil... o dinheiro<br />

da <strong>Europa</strong> veio contribuir para<br />

<strong>que</strong> isso fosse defi nhando e,<br />

em contrapartida, não criamos<br />

alternativas além do turismo e<br />

umas coisas muito incipientes e<br />

<strong>que</strong> não são muito empregadoras.<br />

O têxtil e o calçado estão agora<br />

a recuperar. Mas estou muito<br />

assustado.<br />

É o avô <strong>que</strong> está assustado?<br />

O avô, o pai, o colega... a falta<br />

de segurança para desenhar um<br />

futuro profi ssional. Eu vivi melhor<br />

do <strong>que</strong> os meus pais. Acho <strong>que</strong><br />

os nossos fi lhos vão ter mais<br />

difi culdades do <strong>que</strong> nós. E é a<br />

primeira vez <strong>que</strong> isso acontece.

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