RMU 2.1
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REVISTA DE<br />
MORFOLOGIA<br />
URBANA<br />
Revista da Rede Portuguesa de Morfologia Urbana<br />
2014<br />
Volume 2<br />
Número 1
Editor:<br />
Editores Associados:<br />
Editor dos Book Review:<br />
Editor Assistente:<br />
Consultores:<br />
Quadro Editorial:<br />
Vítor Oliveira, Universidade do Porto, Portugal, vitorm@fe.up.pt<br />
Frederico de Holanda, Universidade de Brasília, Brasil<br />
Paulo Pinho, Universidade do Porto, Portugal<br />
Teresa Marat-Mendes, Instituto Universitário de Lisboa, Portugal,<br />
marat.mendes@gmail.com<br />
Mafalda Silva, Universidade do Porto, Portugal<br />
Giancarlo Cataldi, Università degli Studi di Firenze, Itália<br />
Jeremy Whitehand, University of Birmingham, Reino Unido<br />
Kai Gu, University of Auckland, Nova Zelândia<br />
Michael Conzen, University of Chicago, Estados Unidos da<br />
América<br />
Peter Larkham, Birmingham City University, Reino Unido<br />
Isabel Martins, Universidade Agostinho Neto, Angola<br />
Jorge Correia, Universidade do Minho, Portugal<br />
José Forjaz, Universidade Eduardo Mondlane, Moçambique<br />
Judite Nascimento, Universidade de Cabo Verde, Cabo Verde<br />
Luiz Amorim, Universidade Federal de Pernambuco, Brasil<br />
Mário Fernandes, Universidade do Porto, Portugal<br />
Renato Leão Rego, Universidade Estadual de Maringá, Brasil<br />
Sandra Pinto, Universidade Nova de Lisboa, Portugal<br />
Sílvio Soares Macedo, Universidade de São Paulo, Brasil<br />
Stael de Alvarenga Pereira Costa, Universidade Federal de Minas<br />
Gerais, Brasil<br />
Teresa Marat-Mendes, Instituto Universitário de Lisboa, Portugal<br />
Os autores são os únicos responsáveis pelas opiniões expressas nos textos publicados na<br />
‘Revista de Morfologia Urbana’. Os Artigos (não deverão exceder as 6 000 palavras, devendo<br />
ainda incluir um resumo com um máximo de 200 palavras), as Perspetivas (não deverão exceder<br />
as 1 000 palavras), os Relatórios e as Notícias referentes a eventos futuros deverão ser enviados<br />
ao Editor. As normas para contributos encontram-se na página 2.<br />
Desenho original da capa - Karl Kropf. Desenho das figuras - Vítor Oliveira<br />
REDE PORTUGUESA DE MORFOLOGIA URBANA ISSN 2182-7214
REVISTA DE MORFOLOGIA URBANA<br />
Revista da Rede Portuguesa de Morfologia Urbana<br />
Volume 2 Número 1 Julho 2014<br />
3 Editorial<br />
5 F. Holanda<br />
O mundo das miudezas: Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília<br />
(PPCUB)<br />
15 N. Palma<br />
Estudos urbanos e geometria fractal<br />
25 G. Cataldi, G. L. Maffei e P.Vaccaro<br />
Saverio Muratori e a escola Italiana de tipologia projetual<br />
Perspetivas<br />
37 As origens da morfologia urbana e a geografia alemã V. Oliveira e C. Monteiro<br />
40 Extensões da forma A. Perdicoúlis<br />
42 A ‘rua direita’ portuguesa: elemento estruturador ou designação toponímica?<br />
S. M. G. Pinto<br />
44 Gramáticas genéricas para o domínio da cidade e urbanismo J. N. Beirão<br />
Relatórios<br />
14 Criação da INTBAU Portugal R. Florentino<br />
24 Turkish Network of Urban Morphology T. Ünlü<br />
36 Chinese Network of Urban Morphology W. Ding<br />
Book reviews<br />
47 C. D. Coelho (2013) Os elementos urbanos T. Marat-Mendes<br />
48 F. de Holanda (2013) 10 mandamentos da arquitetura V. Oliveira<br />
Notícias<br />
4 Urban Morphology<br />
13 ISUF2014: Our common future in Urban Morphology<br />
50 PNUM2015: Configuração urbana e os desafios da urbanidade
Normas para contributos para a Revista de Morfologia Urbana<br />
Os textos a submeter à ‘Revista de Morfologia<br />
Urbana’ deverão ser originais, escritos em<br />
Português, e não deverão estar em apreciação em<br />
nenhuma outra revista científica. Os textos serão<br />
aceites para publicação depois da avaliação<br />
favorável de, pelo menos, dois revisores<br />
independentes. Os artigos não deverão exceder as<br />
6 000 palavras, devendo ainda incluir um resumo<br />
com um máximo de 200 palavras e até cinco<br />
palavras-chave. O título do artigo, o resumo e as<br />
palavras-chave deverão ser bilingue, em<br />
Português e em Inglês. Como a autoria dos textos<br />
não é revelada aos revisores, o(s) nome(s) e o(s)<br />
endereço(s) do(s) autor(es) devem constar de uma<br />
folha em separado. As ‘perspetivas’ (também<br />
sujeitas a ‘revisão por pares’) e os book reviews<br />
não deverão exceder as 1 000 palavras. Os artigos<br />
e as ‘perspetivas’ devem ser formatados em word<br />
e enviados por email para o Editor<br />
(vitorm@fe.up.pt). Os book reviews deverão ser<br />
endereçados ao Editor dos Book Review<br />
(marat.mendes@gmail.com). Os textos deverão<br />
ser submetidos em formato de coluna única com<br />
margens largas. Os autores não deverão tentar<br />
reproduzir o layout da revista. Todas as medições<br />
devem ser expressas no sistema métrico.<br />
Os autores são os únicos responsáveis pelas<br />
opiniões expressas nos textos publicados na<br />
‘Revista de Morfologia Urbana’. São ainda<br />
responsáveis por assegurar eventuais permissões<br />
para reprodução de ilustrações, citações extensas,<br />
etc.<br />
Referências<br />
Os autores deverão usar o sistema de<br />
referenciação Harvard, no qual o nome do autor<br />
(sem as iniciais) e a data são apresentados no<br />
corpo do texto – por exemplo (Whitehand e<br />
Larkham, 1992). As referências são apresentadas<br />
por ordem alfabética no final do texto, sob o<br />
título ‘Referências’, da seguinte forma:<br />
Conzen, M. P. (2012) ‘Urban morphology, ISUF<br />
and a view forward’, 18th International<br />
Seminar on Urban Form, Montreal, 26 a 29<br />
de Agosto.<br />
Conzen, M. R. G. (1968) ‘The use of town plans<br />
in the study of urban history’, em Dyos, H. J.<br />
(ed.) The study of urban history (Edward<br />
Arnold, Londres) 113-30.<br />
Hillier, B. (2008) Space is the machine<br />
(www.spacesyntax.com) consultado em 9<br />
Setembro de 2013.<br />
Kropf, K. S. (1993) ‘An inquiry into the<br />
definition of built form in urban morphology’,<br />
Tese de Doutoramento não publicada,<br />
University of Birmingham, Reino Unido.<br />
Moudon, A. V. (1997) ‘Urban morphology as an<br />
emerging interdisciplinary field’, Urban<br />
Morphology 1, 3-10.<br />
Whitehand, J. W. R. e Larkham, P. J. (eds.)<br />
(1992) Urban landscapes, international<br />
perspectives (Routledge, Londres).<br />
No caso de publicações com múltiplos<br />
autores, todos os nomes devem ser incluídos na<br />
lista de referências. Apenas as referências citadas<br />
devem ser incluídas na lista.<br />
Ilustrações e tabelas<br />
Os desenhos e as fotografias deverão ter a<br />
dimensão adequada à sua reprodução. Nesse<br />
sentido, a dimensão das páginas da revista deverá<br />
ser tida em consideração pelo autor ao desenhar<br />
as ilustrações. As ilustrações devem ser a preto e<br />
branco a menos que a cor seja essencial. Devem<br />
ser numeradas de forma consecutiva, referidas<br />
diretamente no texto e submetidas em formato<br />
JPEG ou TIFF. As ilustrações fotográficas<br />
deverão ter uma resolução de, pelo menos, 1200<br />
dpi, e os desenhos de, pelo menos, 600 dpi. Todas<br />
as ilustrações devem ter uma designação. No<br />
final do texto, após a lista de referências, deve ser<br />
incluída uma lista das ilustrações, da seguinte<br />
forma:<br />
Figura 1. Análise metrológica de Lower<br />
Broad Street, Ludlow<br />
Deverá ser dedicada uma atenção especial ao<br />
layout das tabelas, devendo ser desenhada uma<br />
tabela por página. As tabelas deverão ser<br />
desenhadas com o mínimo recurso a<br />
normalizações quer na vertical quer na horizontal.<br />
Deverão ter margens largas em todos os lados.<br />
Página de título<br />
Numa página em separado deverá ser indicado o<br />
título do artigo e o nome, a filiação académica<br />
(ou profissional) e o endereço completo<br />
(incluindo email) do(s) autor(es).<br />
Títulos<br />
Apenas na primeira letra e nos nomes próprios<br />
serão utilizadas maiúsculas. Os títulos deverão<br />
ser justificados à esquerda. Os títulos primários<br />
deverão ser a negrito e os secundários em itálico.<br />
Números<br />
Deverão ser usados algarismos para todas as<br />
unidades de medida, à exceção de quantidades de<br />
objetos e pessoas, quando estas se referirem a<br />
valores compreendidos entre um e vinte. Nesse<br />
caso, os números deverão escritos por extenso.<br />
Por exemplo: 10 dias, 10 km, 24 habitantes, 6400<br />
m; mas dez pessoas, cinco mapas.<br />
Provas<br />
Durante o processo de publicação serão enviadas<br />
provas aos autores. Nesta fase, apenas serão<br />
corrigidos erros de impressão, não sendo<br />
aceitáveis alterações de fundo.
Editorial<br />
Diferentes abordagens no estudo da forma urbana<br />
Ao longo das últimas décadas tem vindo a<br />
desenvolver-se todo um conjunto de<br />
diferentes teorias, conceitos e métodos para a<br />
descrição, explicação e desenho da forma<br />
física das cidades. Os artigos e viewpoints<br />
reunidos neste número da ‘Revista de<br />
Morfologia Urbana’ expressam esta<br />
diversidade teórica e metodológica: desde a<br />
abordagem tipológica projetual promovida<br />
pela Escola Muratoriana (Cataldi et al., pp.<br />
25-36) até à sintaxe espacial (Holanda, pp. 5-<br />
13), da análise fractal (Palma, pp. 15-24) às<br />
gramáticas da forma (Beirão, pp. 44-6). De<br />
algum modo, estes textos dão também<br />
continuidade ao conjunto de artigos e<br />
viewpoints, incluídos no primeiro número da<br />
Revista, sobre a abordagem históricogeográfica<br />
promovida pela Escola<br />
Conzeniana, a sua articulação com a sintaxe<br />
espacial e, ainda, sobre os autómatos<br />
celulares.<br />
Este dinamismo na formulação e<br />
desenvolvimento de novas teorias, conceitos<br />
e métodos tem, naturalmente, uma série de<br />
vantagens, mas contém também uma<br />
fragilidade fundamental, já que o debate em<br />
morfologia urbana não foi ainda capaz de<br />
fornecer uma meta-estrutura comparativa que<br />
permita, a académicos e profissionais,<br />
perceber: i) que abordagens usar face à<br />
natureza específica de um determinado caso<br />
em análise; ii) se é possível combinar<br />
diferentes abordagens; e, ainda, iii) em que<br />
momentos ou perante que aspetos de um<br />
determinado caso fará mais sentido usar cada<br />
uma das abordagens escolhidas. O esforço de<br />
construção de uma estrutura desta natureza<br />
deverá ser informado pelo desenvolvimento<br />
de estudos comparativos das várias teorias,<br />
conceitos e métodos morfológicos.<br />
Perante este desafio, alguns projetos de<br />
investigação têm-se centrado na utilização de<br />
uma abordagem morfológica, ou de um<br />
conceito ou método, em diferentes tipos de<br />
áreas urbanas em diferentes partes do<br />
mundo. Whitehand (2009) descreve a<br />
utilização do método de ‘regionalização<br />
morfológica’ na identificação e<br />
representação de ‘unidades de paisagem<br />
urbana’. Tendo em vista a aplicação do<br />
método em diferentes contextos, Whitehand<br />
alerta para a necessidade de um<br />
conhecimento aprofundado de cada local e<br />
da utilização do mesmo nível de resolução na<br />
identificação das unidades de paisagem.<br />
Conzen (2009) desenvolve uma avaliação<br />
comparativa do desempenho do conceito de<br />
‘cintura periférica’ nos diferentes contextos<br />
culturais em que foi aplicado. Para além de<br />
identificar as semelhanças e as diferenças<br />
fundamentais entre os diferentes casos de<br />
estudo, Conzen reflete sobre a eficácia e<br />
sobre os limites do próprio conceito.<br />
Num âmbito diferente, Conzen (2008)<br />
analisa os resultados do European Historic<br />
Town Atlas, um programa cujo objetivo<br />
fundamental, partilhado por um vasto<br />
conjunto de investigadores em diferentes<br />
países, é o ‘redesenho’ de cartografia antiga<br />
de áreas urbanas, a uma escala uniforme e<br />
com as mesmas regras de representação, no<br />
sentido de facilitar a sua posterior<br />
comparação.<br />
Outros autores exploraram a utilização de<br />
diferentes abordagens no mesmo caso de<br />
estudo. Osmond (2007) propõe uma<br />
metodologia integrada, desenvolvida em<br />
torno do conceito de Urban Structural Unit e<br />
incluindo técnicas morfológicas<br />
complementares (sintaxe espacial e<br />
geometria fractal), e aplica-a a dois<br />
subúrbios de Sydney. Pinho e Oliveira<br />
(2009) estudam a evolução da forma urbana<br />
do Porto ao longo dos séculos XIX e XX,<br />
combinando a abordagem Conzeniana e a<br />
sintaxe espacial e encontrando importantes<br />
relações entre diferentes conceitos<br />
formulados no seio das duas abordagens. Do<br />
mesmo modo, Griffiths et al. (2010)<br />
combinam estas duas abordagens, num<br />
ambiente integrado de SIG, para analisar a<br />
persistência de centros urbanos no território<br />
da ‘Grande Londres’.<br />
Kropf (2009) desenvolve uma análise<br />
crítica de um conjunto de textos<br />
fundamentais das seguintes abordagens:<br />
Revista de Morfologia Urbana (2014) 2(1) 3-4 Rede Portuguesa de Morfologia Urbana ISSN 2182-7214
4 Editorial<br />
análise espacial, configuracional (sintaxe<br />
espacial), tipológica projetual e históricogeográfica.<br />
Depois de identificar os<br />
fenómenos que são objeto da análise<br />
morfológica, Kropf identifica um aspeto<br />
comum às quatro abordagens que poderá ser<br />
usado para coordenar as diferentes visões. O<br />
seu objetivo fundamental é estabelecer uma<br />
estrutura comparativa na qual as diferentes<br />
abordagens se suportem mutuamente no<br />
sentido de construir um conhecimento mais<br />
aprofundado dos assentamentos urbanos. No<br />
final, e apesar dos passos dados no artigo,<br />
Kropf sustenta a necessidade de aprofundar<br />
esta análise crítica comparativa.<br />
A necessidade de desenvolver estudos<br />
comparativos sobre as diferentes abordagens<br />
é, de facto, um desafio fundamental que se<br />
coloca à morfologia urbana. Ao longo dos<br />
próximos meses, três eventos promovidos<br />
pelo International Seminar on Urban Form<br />
(ISUF) e pela Rede Portuguesa de<br />
Morfologia Urbana (PNUM) darão um<br />
sólido contributo a este debate. O primeiro<br />
corresponde à inclusão de um conjunto de<br />
sessões no ISUF2014-Porto, coordenadas por<br />
Jeremy Whitehand, dedicado a este tema.<br />
Estas sessões irão centrar-se na comparação<br />
das diferentes escolas e abordagens<br />
morfológicas, na comparação da aplicação de<br />
conceitos morfológicos em diferentes<br />
contextos geográficos e, por fim, na análise<br />
das dinâmicas da forma urbana em ambientes<br />
multiculturais. O segundo será a conclusão e<br />
publicação de resultados, de um estudo,<br />
financiado pelo ISUF, que compara a<br />
utilização de quatro abordagens (históricogeográfica,<br />
tipológica projetual, sintaxe<br />
espacial e análise espacial) no mesmo caso<br />
de estudo, a Rua de Costa Cabral na cidade<br />
do Porto. Por último, no final do primeiro<br />
semestre de 2015 realizar-se-á (em<br />
articulação com o ISUF2015-Roma e com o<br />
PNUM2015-Brasília), na Faculdade de<br />
Engenharia da Universidade do Porto, o<br />
primeiro Workshop de Morfologia Urbana do<br />
PNUM com o tema ‘Diferentes Abordagens<br />
no Estudo da Forma Urbana’.<br />
Referências<br />
Conzen, M. P. (2008) ‘Retriving the preindustrial<br />
built environment of Europe: the<br />
Historic Town Atlas programme and<br />
comparative morphological study’, Urban<br />
Morphology 12, 143-56.<br />
Conzen, M. P. (2009) ‘How cities internalize<br />
their former urban fringes: a cross-cultural<br />
comparison’, Urban Morphology 13, 29-54.<br />
Griffiths, S., Jones, C. E., Vaughan, L. e Haklay,<br />
M. (2010) ‘The persistence of suburban centres<br />
in Greater London: combining Conzenian and<br />
space syntax approaches’, Urban Morphology<br />
14, 85-99.<br />
Kropf, K. S. (2009) ‘Aspects of urban form’,<br />
Urban Morphology 13, 105-20.<br />
Osmond, P. (2007) ‘Quantifying the qualitative:<br />
an evaluation of urban ambience’, Proceedings<br />
of the 6 th International Space Syntax<br />
Symposium, Istanbul.<br />
Pinho, P. e Oliveira, V. (2009) ‘Different<br />
approaches in the study of urban form’, Journal<br />
of Urbanism 2, 103-25.<br />
Whitehand, J. W. R. (2009) ‘The structure of<br />
urban landscapes: strengthening research and<br />
practice’, Urban Morphology 13, 5-27.<br />
Vítor Oliveira<br />
Urban Morphology<br />
O último número da revista Urban Morphology,<br />
referente ao mês de Abril, foi já publicado, sendo<br />
que a versão online se encontra disponível, para<br />
os subscritores, em http://www.<br />
urbanform.org/online_public/index.shtml.<br />
Este número inclui quatro artigos. Kai Gu e<br />
Jian Zhang debatem a utilização de fontes<br />
cartográficas na investigação em morfologia<br />
urbana que tem vindo a ser desenvolvida na<br />
China. Vítor Oliveira, Mafalda Silva e Ivor<br />
Samuels apresentam os resultados do primeiro<br />
caso de estudo desenvolvido sob o<br />
enquadramento da ISUF Task Force on Research<br />
and Practice in Urban Morphology – a cidade do<br />
Porto e o seu Plano Diretor Municipal (PDM).<br />
Karl Kropf desenvolve um ensaio crítico sobre as<br />
diferentes definições de forma construída, de<br />
modo a construir um elemento de referência para<br />
a análise dos diferentes aspetos da forma urbana.<br />
Por fim, Renato Leão Rego aborda a temática da<br />
‘cidade ideal versus cidade construída’ através da<br />
análise comparada de duas cidades Brasileiras<br />
planeadas em meados do século XX, Maringá e<br />
Sinop. O próximo número da revista Urban<br />
Morphology será publicado em Outubro.
O mundo das miudezas: Plano de Preservação do Conjunto<br />
Urbanístico de Brasília – PPCUB<br />
Frederico de Holanda<br />
Universidade de Brasília, Campus Universitário Darcy Ribeiro, Brasília - CEP 70910-<br />
900, Brasil. Email: fredholanda44@gmail.com<br />
Artigo revisto recebido a 18 de Fevereiro de 2014<br />
Resumo. O projeto de lei complementar do Plano de Preservação do<br />
Conjunto Urbanístico de Brasília encontra-se em tramitação no âmbito do<br />
Poder Legislativo, do Distrito Federal, Brasil. Infelizmente, o projeto não<br />
considera históricos problemas da cidade: rupturas do tecido urbano;<br />
vazios sem justificativa funcional, bioclimática ou expressiva; questões de<br />
acessibilidade universal; má definição de espaços para a vida pública; uma<br />
das mais perversas estratificações socioespaciais do mundo. Décadas de<br />
crítica a configurações modernas, que não consideram o espaço ‘entre<br />
edifícios’ como alvo da atenção projetual, são ignoradas. Mais que em<br />
projetos do período clássico do urbanismo moderno (anos 1960), projetos<br />
recentes fazem proliferar espaços definidos por paredes cegas, ou edifíciosilhas<br />
em esquemas introvertidos: atividades abrem para o interior dos<br />
prédios e esvaziam o âmbito público de transições entre fechado e aberto.<br />
As iniciativas do ‘homem comum’ de Certeau, sempre a reinventar a cidade<br />
mediante fascinantes ‘fissuras urbanas’ na ordem hegemônica, são<br />
ignoradas. Em vez de atacar problemas estruturais da cidade, o Plano<br />
perde-se em pormenorizar atributos das parcelas urbanas, no furor<br />
legislativo de quase duzentos artigos e uma miríade de anexos. O mundo das<br />
miudezas.<br />
Palavras-chave: Brasília, patrimônio, preservação, PPCUB.<br />
No momento da escrita a minuta do Projeto<br />
de Lei Complementar do Plano de<br />
Preservação do Conjunto Urbanístico de<br />
Brasília (doravante PPCUB) encontra-se em<br />
tramitação no Poder Legislativo do Distrito<br />
Federal (doravante DF), Brasil, a ele<br />
encaminhado pelo Poder Executivo local. O<br />
documento de quase 200 artigos trata da área<br />
tombada de Brasília como Patrimônio<br />
Cultural da Humanidade, pela UNESCO. A<br />
proposta inclui considerações sobre as ‘áreas<br />
de entorno’, que supostamente também<br />
devem ser controladas por interferirem na<br />
paisagem da área tombada.<br />
A prolixidade do documento impressiona.<br />
A área tombada é dividida em onze Áreas de<br />
Preservação (APs), subdivididas em 71<br />
Unidades de Preservação (UPs) (o Art. 2,<br />
sobre as 45 siglas utilizadas, indica o que<br />
vem pela frente). Tradicionalmente observase<br />
que o controle urbanístico de Brasília<br />
transformou-se, no tempo, num labirinto<br />
interminável de NGBs (Normas de Uso e<br />
Gabarito), quase uma para cada terreno da<br />
cidade. O PPCUB seria a oportunidade para<br />
reordenar o caos jurídico e fazer da<br />
legislação urbanística algo mais claro, que<br />
concebesse os documentos legais como<br />
instrumentos para a consecução de uma<br />
melhor paisagem urbana – para a resolução<br />
dos problemas estruturais da cidade, pelo<br />
menos os relacionados à configuração da<br />
urbe.<br />
Mais uma oportunidade perdida, como<br />
tantas outras na história da Capital Federal<br />
do Brasil. E o mais lamentável: o intenso<br />
debate sobre o Plano ocorrido ao longo de<br />
2013 entre o Poder Executivo e a Sociedade<br />
Civil. Não poderia ter sido mais ‘ideológico’,<br />
no mau sentido do termo: fundado em<br />
Revista de Morfologia Urbana (2014) 2(1) 5-13 Rede Portuguesa de Morfologia Urbana ISSN 2182-7214
6 O mundo das miudezas: Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília – PPCUB<br />
‘aparências’, ignorando o conhecimento<br />
sistemático produzido sobre a cidade ao<br />
longo de décadas; eivado de ‘valores<br />
inconfessos’ e de doutrinas que se gostaria<br />
de ter visto há muito enterradas; ‘paroquial’,<br />
porque não enxerga as medidas propostas no<br />
contexto da ‘cidade como sistema’, mas<br />
como intervenções a supostamente<br />
resolverem problemas pontuais.<br />
Decerto os problemas de Brasília<br />
extrapolam o âmbito da área tombada. Mas,<br />
no mínimo, seu equacionamento também<br />
passa por transformações na área. Não há<br />
espaço aqui para a análise das diretrizes de<br />
todas as áreas de preservação, menos ainda<br />
de todas as unidades de preservação ou das<br />
áreas de entorno. A título de exemplo, alguns<br />
pontos ilustram as diretrizes do PPCUB e<br />
revelam como elas passam ao largo dos<br />
problemas identificados em várias<br />
oportunidades e por vários autores (Holanda,<br />
2002, 2010, 2011a, 2011b, 2011c, 2011d,<br />
2012; Paviani, 1985).<br />
Áreas de entorno<br />
Brasília é uma ‘cidade tricéfala’ (Holanda,<br />
2010). Para caracterizar a situação,<br />
propomos três conceitos de ‘centro’. As<br />
cidades têm: i) o ‘centro funcional’, ou<br />
centro de comércio e serviços (CCS), ponto<br />
em torno do qual se concentra a maioria dos<br />
empregos e serviços; ii) o ‘centro<br />
morfológico’, ponto mais acessível<br />
topologicamente, isto é, aquele a que<br />
chegamos com menos inflexões de percurso,<br />
em média, a partir de todos os demais pontos<br />
da cidade, considerado o sistema viário –<br />
conceito de acessibilidade advindo da Teoria<br />
da Sintaxe Espacial (Hillier e Hanson, 1984;<br />
Holanda, 2010); iii) o ‘centro demográfico’,<br />
ponto que minimiza a distância per capita<br />
média para os habitantes da metrópole,<br />
considerado o local de moradia (o ‘centro de<br />
massa’ populacional).<br />
Brasília é tricéfala porque organiza de<br />
maneira peculiar a relação entre as três<br />
centralidades. O ‘centro funcional’, ponto em<br />
torno do qual estão 44 % dos empregos do<br />
DF (CODEPLAN, 2004), localiza-se no<br />
entorno imediato do cruzamento dos dois<br />
eixos estruturais do Plano Piloto – o Eixo<br />
Monumental e o Eixo Rodoviário. Ele dista<br />
10 km do centro morfológico, a sudoeste. O<br />
centro demográfico, ou ‘de massa’, não<br />
coincide com o primeiro nem com o segundo<br />
(Figura 1). A Figura 1 mostra parte dos eixos<br />
viários do município de Brasília, onde estão<br />
os três centros da cidade tricéfala. O mapa de<br />
eixos provém de técnicas da Teoria da<br />
Sintaxe Espacial. Quanto mais quentes as<br />
cores, mas acessíveis são os eixos ao<br />
conjunto do sistema. A separação das três<br />
centralidades em ‘locais distintos’ – o que<br />
não acontece em outras cidades brasileiras –<br />
implica enormes custos, particularmente para<br />
a população de baixa renda que dispõe de um<br />
arremedo de transporte coletivo: caro,<br />
ineficiente e sucateado.<br />
O centro morfológico e o centro<br />
demográfico estão na AE 02 (Área de<br />
Entorno 02, Figura 2). A área é tangenciada<br />
pela ‘Estrada Parque Indústria e<br />
Abastecimento’ (EPIA), via que define o<br />
limite oeste da área tombada (Figura 2). Ao<br />
longo dela, o uso do solo transformou-se<br />
radicalmente nas últimas décadas – exemplo<br />
da ‘lei do movimento natural’, como<br />
sugerida por Hillier et al. (1993): a alta<br />
acessibilidade de uma área urbana puxa para<br />
ela intensos fluxos motorizados, que por sua<br />
vez atraem atividades urbanas centrais.<br />
O desenvolvimento de qualquer cidade<br />
faz deslocar as centralidades. Fenômeno<br />
universal, o mero tamanho da cidade implica<br />
novos centros, embora o centro histórico<br />
raramente perca sua proeminência – no caso<br />
brasileiro, assim foi com o Rio de Janeiro,<br />
São Paulo, Recife (Villaça, 1998). À medida<br />
que distâncias crescem, novos centros criam<br />
oportunidades de emprego e serviços mais<br />
próximos às residências.<br />
Uma excelente oportunidade para<br />
desenvolver-se uma nova centralidade de<br />
Brasília está na AE 02, e nas AE 06a e AE<br />
06b, também situadas ao longo da EPIA.<br />
Minuta recente do PPCUB reconhece a<br />
potencialidade, mas ela foi retirada do<br />
projeto de lei, depois de intensos debates<br />
entre governo e representantes da Sociedade<br />
Civil. Lamentavelmente, a discussão foi<br />
intensamente ideologizada. Nada<br />
pormenorizada, sabe-se, contudo, que a<br />
proposta do Executivo retoma os piores<br />
problemas do urbanismo moderno: haveria<br />
um ‘setor de trabalho’ isolado das<br />
habitações; o ‘setor habitacional’ seria mais<br />
um bairro socialmente homogêneo, como da
O mundo das miudezas: Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília – PPCUB 7<br />
Figura 1. Centralidades em locais distintos, peculiaridade de Brasília.<br />
tradição no DF (neste caso, para a classe<br />
média). Por outro lado, a reação crítica não<br />
está preocupada com estes problemas, mas<br />
com o fato de uma nova zona urbana vir<br />
eventualmente agravar os problemas de<br />
tráfego na região. Uso de solo e mobilidade<br />
não são ‘ambas’ pensadas como ‘variáveis’<br />
da equação; não se cogita que uma nova<br />
centralidade ‘exige’ a contrapartida de novos<br />
padrões de mobilidade, mormente em<br />
Brasília, onde cedo ou tarde os padrões<br />
atuais baseados no carro terão que ser<br />
revistos (já o estão sendo, embora muito<br />
timidamente, pois a cidade está seriamente<br />
travada).<br />
Mas a reação da Sociedade Civil, em<br />
bloco, contra a área de expansão, esconde<br />
algo mais, não apenas questões de<br />
mobilidade: mascara a ‘ideologia da<br />
apartação’, pela qual um cordon sanitaire<br />
deve continuar a isolar, tanto quanto<br />
possível, o coração metropolitano – o Plano<br />
Piloto projetado por Lucio Costa – do resto<br />
da urbe. Por imediatismo político, o Estado<br />
retirou a proposta de pauta. Cedo ou tarde ela<br />
retornará: mais um capítulo, dentre outros,<br />
que ilustram a tendência, também em<br />
Brasília, para uma cidade mais compacta,<br />
malgré os desejos isolacionistas das classes<br />
altas que habitam áreas centrais da<br />
metrópole.<br />
Dentre as considerações sobre as<br />
expansões, não se comenta sobre alturas<br />
edificadas em função de critérios claros de<br />
visibilidade do conjunto tombado, cujo sítio<br />
tem a forma aproximada de uma calota (área<br />
clara no centro da Figura 2). Na AE 06b, na<br />
mesma figura, nada construído com menos<br />
de 100 m de altura será visto das asas<br />
residenciais ou do Eixo Monumental. Sequer<br />
teremos um contraponto similar ao de La<br />
Défense (Paris), no prolongamento dos<br />
Champs Élysées, onde o problema não é a<br />
altura dos espigões, mas o mau espaço<br />
público que eles definem (Figura 3). Essas<br />
áreas do ‘entorno’ são um recurso precioso<br />
para o desenvolvimento metropolitano, uma<br />
potencialidade até agora ignorada. Difícil<br />
discernir o que é pior para a cidade: as<br />
propostas do Executivo ou as reações<br />
ideológicas da Sociedade Civil.<br />
Eixo Monumental<br />
O Eixo Monumental é o mais forte
8 O mundo das miudezas: Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília – PPCUB<br />
Figura 4. Unidades de Preservação (UPs) da<br />
Área de Preservação 1 (AP1). Fonte:<br />
www.sedhab.df.gov.br/.<br />
Figura 2. Áreas do Entorno, segundo o<br />
PPCUB. Fonte: www.sedhab.df.gov.br/.<br />
Figura 3. La Défense, Paris.<br />
elemento macroestruturador de Brasília, a<br />
unidade morfológica responsável pelo forte<br />
caráter simbólico da cidade. Mede quase 9<br />
km da extremidade leste da Praça dos Três<br />
Poderes até a Estação Rodoferroviária, na<br />
ponta oeste (considerando o prolongamento<br />
até a borda lacustre, são mais 3 km). No<br />
PPCUB ele é a AP 1, dividido em seis UPs<br />
(Figura 4). À exceção da Praça do Buriti,<br />
sede do governo local, todas as UPs são<br />
áreas ‘consolidadas, vedados novos<br />
parcelamentos’. Entretanto, ao mesmo<br />
tempo, admite-se: i) a complementação da<br />
Esplanada dos Ministérios por edifícios para<br />
atividades de apoio, segundo proposta<br />
original de Lucio Costa, nunca<br />
implementada, o que implica novo<br />
parcelamento – é positiva a recomendação de<br />
concurso público para tal (tema abordado em<br />
Holanda e Tenorio, 2010); ii) no último<br />
tramo, a oeste, que vai da Praça do Buritis à<br />
Estação Rodoferroviária (AP1, UP6),<br />
admite-se a complementação com atividades<br />
institucionais, de comércio varejista<br />
relacionado a artigos ‘culturais, recreativos e<br />
desportivos’, e de prestação de serviços,<br />
proposta também retirada do projeto de lei<br />
(não se explicam as razões de serem apenas<br />
estes usos).<br />
Chama a atenção o fato de o perímetro<br />
das unidades morfológicas (no caso, as UPs)<br />
coincidir com o eixo das vias limítrofes (à<br />
exceção da Praça do Buriti). Como na boa<br />
cartilha moderna, não se considera os<br />
‘espaços’ por onde passamos e que<br />
percebemos, de fato, como unidades<br />
morfológicas que deviam ser objeto de<br />
atenção; afinal, pela cartilha, vias obedecem<br />
à função exclusiva de circular, não de<br />
permanência ou usufruto do lugar.<br />
Considerar vias como simples<br />
ferramentas de circulação motorizada refletese<br />
– novamente – na desconsideração para<br />
com as construções lindeiras. A configuração<br />
do Eixo Monumental, necessariamente<br />
diferençada por tramos, deveria ter estado<br />
presente, mormente numa cidade que prima,<br />
em muitos aspectos, por uma ordem<br />
espacial-volumétrica clara. Não: hoje a<br />
ocupação das bordas é aleatória e não há, no<br />
Plano, discussão sobre isso. Nas laterais do<br />
Eixo Monumental há de tudo: prédios de 65<br />
m de altura nos setores hoteleiros; vazio
O mundo das miudezas: Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília – PPCUB 9<br />
de estacionamentos de grandes<br />
equipamentos, como os do Estádio Mané<br />
Garrincha ou do Ginásio Nielson Nelson; os<br />
palácios da Praça do Buriti; as residências<br />
unifamiliares do Setor Militar Urbano e do<br />
bairro Cruzeiro Velho, etc. A cada demanda<br />
surgida, a definição dos tipos edilícios é ad<br />
hoc – e arbitrária – não está relacionada à<br />
configuração da unidade maior que deveria<br />
definir (algo que se faz, tão bem, na<br />
Esplanada dos Ministérios).<br />
Nas áreas ‘consolidadas’, mas com<br />
muitos espaços vazios admitia-se, na<br />
proposta do governo, lotes ‘de no mínimo<br />
10 000 m 2 e no máximo 20 000 m 2 ’, mas não<br />
há nada sobre critérios para sua quantidade,<br />
localização e configuração. É<br />
particularmente o caso da área retangular<br />
gramada central entrevias de 2 500 m de<br />
extensão por 170 m de largura onde existe<br />
apenas a Catedral Militar Rainha da Paz<br />
(último tramo a oeste, UP6, Figura 4).<br />
Mantendo-se o caráter predominante de<br />
parque mediante lotes isolados, baixos<br />
índices de aproveitamento, taxas de<br />
ocupação e alturas, o espaço deveria ser<br />
pontuado por edifícios ímpares. Seriam<br />
fortalecidas referências imagéticas locais,<br />
aumentando a informação visual e<br />
consequente orientabilidade ao longo do<br />
elemento macroestruturador Eixo<br />
Monumental. As descontinuidades atuais não<br />
têm qualidades funcionais, expressivas ou<br />
ecológicas, ao contrário, funcionam como<br />
rupturas indesejadas no tecido urbano. No<br />
entanto, sua ocupação foi vista, por setores<br />
da Sociedade Civil, como refletindo<br />
interesses inconfessáveis em prol da<br />
privatização de terras públicas. Não: ocupar<br />
criteriosamente parte desses espaços com<br />
equipamentos de interesse público implicaria<br />
mais gente a usufruir espaços de centralidade<br />
privilegiada. Ideologia, novamente.<br />
Os setores centrais<br />
Nas áreas centrais mais densas do Plano<br />
Piloto proliferam rupturas e caminhos a<br />
serem percorridos pelos pedestres em longos<br />
trechos desprovidos de atividades –<br />
caminhos em meio ao nada. Mais até que em<br />
projetos do período clássico do urbanismo<br />
moderno (consideremos assim os anos<br />
1960), projetos mais recentes (por exemplo,<br />
o Setor Comercial Norte, Figura 5) fazem<br />
proliferar espaços definidos por paredes<br />
cegas ou edifícios-ilhas em esquemas<br />
introvertidos: as atividades abrem para o<br />
interior e esvaziam o âmbito público de<br />
transições entre o fechado e o aberto.<br />
Preocupações morfológicas quanto ao espaço<br />
para a vida pública estão ausentes do<br />
PPCUB. Não há índices ‘urbanísticos’, há<br />
índices ‘edilícios’: o Art. 63 lista cinco deles,<br />
‘todos’ relativos ‘ao espaço da divisa do lote<br />
para dentro’. Preocupações quanto à<br />
‘configuração do espaço público aberto’<br />
simplesmente inexistem (exceto<br />
recomendações genéricas quanto ao seu<br />
mobiliário, arborização, etc.). Nada impede a<br />
proliferação, noutras áreas, das soluções<br />
perversas já detectadas. É de temer um<br />
eventual projeto de reformulação da parte<br />
dos setores hoteleiros onde estão prédios de<br />
apenas dois pavimentos – cedo ou tarde isso<br />
acontecerá, pois nada justifica essa ocupação<br />
numa área tão central. As mais altas<br />
densidades contribuirão para maior<br />
vitalidade da área central da cidade. Mas,<br />
como antes, não se trata simplesmente de<br />
aumentar alturas e índices de<br />
aproveitamento, como é a exclusiva<br />
preocupação hoje, mas de configurar o<br />
âmbito público.<br />
Em todas as áreas da metrópole isso se<br />
verifica, mas é mais grave nos setores<br />
centrais de Brasília. Em vez de dar o<br />
exemplo para o resto da cidade, o centro<br />
metropolitano maximiza a perversidade. O<br />
recuo ante o modernismo clássico chega ao<br />
ponto de propostas de Lucio Costa,<br />
constantes do Relatório do Plano Piloto<br />
(1957), serem ignoradas. Por exemplo, nunca<br />
foi executado o edifício explicitado no<br />
‘Relatório do Plano Piloto’, entre os Setores<br />
de Diversões, norte e sul – no local, um<br />
imenso buraco (Figura 6). No PPCUB, nem<br />
uma palavra sobre ele. Pelo contrário, é ‘área<br />
consolidada, vedados novos parcelamentos<br />
urbanos’. Como em outros casos, um<br />
‘urbanismo de adições’ seria altamente<br />
recomendável – para referir provocativa<br />
ideia de Rodrigo Perez de Arce, quando faz a<br />
crítica dos ‘desertos’ modernos. Aqui, não<br />
seria nem isso, mas um ‘urbanismo de<br />
completações’...
10 O mundo das miudezas: Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília – PPCUB<br />
Figura 5. Setor Comercial Norte, Brasília.<br />
Figura 6. Vazio imprevisto pelo projeto, entre<br />
o Setor de Diversões Sul e seu simétrico norte,<br />
Brasília.<br />
O ‘labirinto do deserto’<br />
A AP 07 e AP 08 compreendem as áreas de<br />
baixa ocupação a leste das asas residenciais<br />
do Plano Piloto. São áreas de muito baixa<br />
ocupação, onde proliferam resquícios de um<br />
dos dois ‘labirintos’ típicos do urbanismo<br />
moderno – o ‘labirinto do deserto’, onde<br />
predomina ‘o longe’: grandes<br />
descontinuidades morfológicas, com poucos<br />
ou nenhum estímulo visual na escala menor,<br />
prejudicando legibilidade e orientabilidade<br />
urbanas. O termo é inspirado no conto de<br />
Jorge Luís Borges ‘Os dois reis e os dois<br />
labirintos’. Borges (2009) fala no ‘labirinto<br />
de muros’ (onde se perdem referências mais<br />
amplas, onde só se apreende o ‘perto’) e no<br />
‘labirinto do deserto’ (onde se perdem<br />
referências locais, onde só se apreende o<br />
‘longe’). Os dois labirintos são típicos do<br />
urbanismo moderno. A eles, Hillier e Hanson<br />
se referem no pós-escrito de The social logic<br />
of space, embora usem termos diversos: a<br />
‘solução dura’, o primeiro labirinto, e a<br />
‘solução suave’, o segundo labirinto (Hillier<br />
e Hanson, 1984).<br />
É quase inacreditável que a vista da<br />
Figura 7 tenha sido tomada de um ponto de<br />
enorme centralidade da metrópole,<br />
imediatamente ao norte da Esplanada dos<br />
Ministérios. Ao sul do Eixo Monumental o<br />
problema se repete: há inúmeros trechos de<br />
‘terra de ninguém’ entre as quadras das<br />
embaixadas. Aqui, uma ocupação de baixa<br />
densidade, com reformulação do sistema<br />
viário labiríntico atual, seria condizente com<br />
a ‘escala bucólica’ (como normalmente a<br />
área é referida). Se sobra ‘labirinto do<br />
deserto’ na escala bucólica, espaços livres e<br />
públicos na margem do lago deveriam ser<br />
mais amplos. O ponto está relacionado a um<br />
pecado original do projeto. Lucio Costa<br />
admitia a privatização da orla, embora não<br />
tanto quanto aconteceu: ‘apenas os clubes<br />
esportivos, os restaurantes, os lugares de<br />
recreio, os balneários e núcleos de pesca<br />
poderão chegar à beira d’água’ (Costa, 1995,<br />
p. 294). Admitir privatização das margens<br />
contrasta com a tradição brasileira de se<br />
manterem públicas as áreas lindeiras a<br />
corpos d’água – rios, lagos, mar (Couto,<br />
2003). Criou-se precedente que fez da<br />
exceção a regra. Além de clubes e<br />
restaurantes, surgiram centros de<br />
convenções, conjuntos de cinema multiplex<br />
com praças de alimentação, academias de<br />
ginástica e apartamentos de luxo cada vez<br />
menos disfarçados de hotéis (a imprensa tem<br />
dado inúmeros exemplos de clubes<br />
substituídos por condomínios fechados). O<br />
PPCUB propõe a desprivatização da orla,<br />
mas prevê apenas a norma legal de reserva<br />
de 30 m. Ao contrário, e variando em função<br />
do trecho, a faixa pública deveria ser muito<br />
mais generosa. Ainda há bons trechos a<br />
(re)conquistar para o cidadão comum.<br />
À guisa de conclusão: o mundo das<br />
miudezas... incompleto<br />
O PPCUB é o mundo das miudezas, contudo,<br />
mesmo nelas, incompleto. Além da falta de
O mundo das miudezas: Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília – PPCUB 11<br />
Figura 7. O ‘labirinto do deserto’, imediatamente ao norte da Esplanada dos Ministérios.<br />
equacionamento de problemas no nível<br />
macro da metrópole (desejáveis e factíveis),<br />
o documento carece de atenção para com o<br />
âmbito local. A literatura acumula sugestões<br />
de indicadores para o espaço digno da boa<br />
vida pública, particularmente nas áreas<br />
centrais das cidades. Desde os pioneiros<br />
Kevin Lynch (1960) e Jane Jacobs (1961) –<br />
para não falar em Camillo Sitte (1889) – têm<br />
contribuído Christopher Alexander et al.<br />
(1977), Bill Hillier e Julienne Hanson<br />
(1984), Alan Jacobs e Donald Appleyard<br />
(1987), o movimento Project for Public<br />
Spaces (2005), Andrés Duany et al. (2000) e<br />
o Congress for the new urbanism (1993), Jan<br />
Gehl (2006) e muitos outros (Tenorio, 2012,<br />
apresenta uma revisão crítica da literatura e<br />
uma proposta metodológica para a avaliação<br />
de tais lugares). Exemplificam-se<br />
preocupações dos autores, ausentes no<br />
PPCUB: a quantidade e a forma do espaço<br />
livre ante o espaço total das áreas (espaço<br />
livre em demasia só é ocupado em<br />
circunstâncias excepcionais, não no dia a dia<br />
da cidade); o tamanho médio das unidades de<br />
espaço aberto, particularmente a largura das<br />
ruas, mirando um espaço adequado<br />
interfachadas, para a boa visibilidade e<br />
reconhecimento do outro; a variedade,<br />
complementaridade e distribuição temporal<br />
das atividades, relacionadas num espaço<br />
urbano vital; a ocorrência de habitação nas<br />
zonas centrais, em distribuição adequada de<br />
tipos edilícios variados e em densidade que<br />
proporcione a concentração de pessoas; o<br />
microdesenho do espaço para atender as<br />
questões de mobilidade, prioridade ao<br />
pedestre, ciclistas, transporte público, etc.,<br />
mas a predominância do carro é generalizada<br />
na cidade, ocupando uma parcela espantosa –<br />
e crescente – dos espaços livres; a reduzida<br />
dimensão dos quarteirões, facilitando a<br />
permeabilidade interpartes da cidade nas<br />
suas áreas centrais; o tamanho das parcelas<br />
relacionadas ao espaço público, favorecendo<br />
a maior quantidade de estabelecimentos por<br />
metro linear de extensão de rua; as<br />
‘constituições’ dos lugares – frequentes<br />
transições diretas entre dentro e fora, mas<br />
também numerosas janelas (os ‘olhos da<br />
rua’) – evitando-se uma das mais perversas<br />
doenças do urbanismo moderno: as longas<br />
empenas cegas, etc.<br />
O PPCUB reproduz a visão moderna<br />
clássica da cidade: os objetos de atenção são<br />
os ‘setores’ da cidade. As normas ‘nunca’<br />
dizem respeito aos espaços ‘entre’ as massas<br />
edificadas – concentram-se nos índices
12 O mundo das miudezas: Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília – PPCUB<br />
‘dentro das parcelas’. As regras estão<br />
relacionadas às ‘unidades de preservação’<br />
cujos limites são vias arteriais importantes<br />
que, entretanto, não são objeto de atenção<br />
enquanto definidas pelas massas edificadas<br />
lindeiras – ou então se chega ao aparente<br />
paradoxo de definir uma via, ‘ela própria’,<br />
como unidade de preservação,<br />
independentemente do que está ao redor<br />
(caso da manutenção da configuração<br />
perversa do ‘Eixão da Morte’). Decerto, a<br />
normativa mantém as alturas edificadas<br />
condizentes com as ‘escalas’ da cidade –<br />
maiores no centro, mais baixas nas asas<br />
residenciais, etc. É pouco. Em todas as áreas<br />
problemas morfológicos continuarão a<br />
rondar a cidade como fantasmas insepultos.<br />
O PPCUB é a tradução exemplar, na letra<br />
da lei, da hegemonia do urbanismo moderno,<br />
contestado em tantos lugares do planeta pelo<br />
dano causado aos espaços para a vida<br />
pública. Em Brasília ele continua a reinar<br />
soberano. Acredita-se que a manutenção das<br />
qualidades essenciais da cidade depende da<br />
reprodução ortodoxa dos princípios<br />
modernos. Pelo contrário: as qualidades<br />
essenciais de Brasília não se relacionam à<br />
cartilha moderna. Elas decorrem de atributos<br />
que fazem a excelência das cidades desde<br />
sempre, ainda que, no caso de Brasília,<br />
limitem-se principalmente a dimensões<br />
expressivas: uma forte identidade, uma<br />
legibilidade interpartes clara (à la Lynch),<br />
uma beleza ímpar, uma configuração que<br />
cumpriu à excelência os requisitos de cidadesímbolo<br />
da nacionalidade. Os problemas,<br />
sim: a cidade-para-todas-as-classes, realizada<br />
mediante um ‘tipo edilício ideal e universal’,<br />
revelou-se um mito (superquadras não são<br />
acessíveis a baixos poderes aquisitivos);<br />
fortes barreiras físicas impõem pesados ônus<br />
para os pedestres; padrões de mobilidade são<br />
compatíveis com o veículo privado, não com<br />
o transporte público; bioclimaticamente, a<br />
cidade é confortável no interior dos setores<br />
(ou superquadras), muito desconfortável fora<br />
deles (ou entre eles).<br />
Brasília não foi tombada por razões<br />
‘históricas’, não por ser ‘original’, por<br />
representar à maravilha certo movimento<br />
arquitetônico ou certa época. Decerto razões<br />
‘contingenciais’ aparecem nos textos de sua<br />
declaração como Patrimônio Cultural da<br />
Humanidade. Mas será isso que subjaz ao<br />
tombamento, ou esse é um discurso<br />
ideológico cego às qualidades ‘essenciais’ da<br />
cidade? Pensar assim não seria ‘degradar a<br />
apreciação estética a uma apreciação<br />
histórica’ (Cícero, 2012)? Sim: Brasília vale<br />
porque Lucio Costa não está entre os<br />
primeiros a fazer algo, mas porque está entre<br />
os melhores; não porque faz o novo, mas<br />
porque faz o que não envelhece (Cícero,<br />
2012).<br />
Resolver os problemas pendentes é<br />
libertar a cidade das (perversas)<br />
circunstâncias nas quais ela foi gerada.<br />
Ainda não foi dessa vez.<br />
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Tradução do resumo e palavras-chave<br />
A piecemeal world: the Preservation Plan for the Urban Complex of Brasilia - PPCUB<br />
Abstract. The Project for the Complementary Law of the Preservation Plan for the Urban Complex of<br />
Brasilia is now within the realm of the Legislative Power, Federal District, Brazil. Unfortunately the<br />
project does not consider the historical problems of the city: ruptures of the urban tissue, urban voids<br />
without functional bioclimatic or expressive reasons, accessibility issues, poor definition of spaces<br />
promoting public life, and one of the most perverse socio-spatial stratifications in the world. Decades of<br />
critique on modern configurations, which do not consider the ‘space between buildings’, are ignored.<br />
More than the projects of the classic period of the modern urbanism (1960s), the recent projects propose<br />
the proliferation of spaces defined by blind walls, of ‘island buildings’ in introverted schemes, and of<br />
activities opening to inner spaces and emptying the public realm of transitions between the ‘inside’ and<br />
the ‘outside’. Initiatives of the ‘ordinary man’, who reinvents the city through fascinating ‘urban<br />
fissures’ in the dominant order, are ignored. Instead of facing the structural problems of the city, the<br />
Plan focuses on attributes of urban plots individually, in a ‘legislative storm’ of almost 200 articles and a<br />
great number of appendixes. A piecemeal world.<br />
Key words: Brasilia, heritage, preservation, PPCUB<br />
ISUF2014: Our common future in Urban Morphology<br />
A Faculdade de Engenharia da Universidade do<br />
Porto recebe, entre os dias 3 e 6 de Julho, o<br />
International Seminar on Urban Form (ISUF). A<br />
21ª conferência do ISUF, organizada por uma<br />
equipa coordenada por Vítor Oliveira e Paulo<br />
Pinho, reunirá na cidade do Porto os maiores<br />
especialistas no estudo da forma física das<br />
cidades. A julgar pelo número de abstracts<br />
submetidos e aceites, esta deverá será uma das<br />
maiores conferências já realizadas nos 20 anos de<br />
história do ISUF.<br />
Os 4 dias de trabalhos incluem 4 sessões<br />
plenárias, uma série de sessões paralelas, eventos<br />
sociais (com o apoio da Câmara Municipal do<br />
Porto) e um conjunto de passeios pela cidade<br />
onde os participantes, vindos dos 5 continentes,<br />
poderão contactar diretamente com as ruas, os<br />
quarteirões e os edifícios da cidade do Porto.<br />
Mais informações estão disponíveis no website da<br />
conferência em http://isuf2014.fe.up.pt/.
14 Relatório<br />
Criação da INTBAU Portugal<br />
Figura 1. Criação da INTBAU Portugal: 1ª Assembleia Geral.<br />
No dia 4 de Abril de 2014 realizou-se em Lisboa<br />
a 1ª Assembleia Geral da Associação INTBAU<br />
Portugal, tendo sido aprovados o seu regulamento<br />
e os primeiros órgãos sociais. Esta Associação é o<br />
chapter português da INTBAU – International<br />
Network for Traditional Building, Architecture<br />
and Urbanism, com sede em Londres e cujo<br />
patrono é sua alteza real o Príncipe de Gales. Esta<br />
rede internacional visa a promoção das formas de<br />
construção tradicional, numa perspetiva<br />
culturalista, em todos os países onde tem<br />
delegações, não apenas na Europa, mas também<br />
em todos os continentes, no Canadá, na Índia, no<br />
Irão ou na Austrália, por exemplo.<br />
Por ocasião da recente criação do chapter<br />
Espanhol, surgiu a hipótese de se constituir uma<br />
Associação Ibérica, mas a sede da INTBAU<br />
entendeu que se deveria formalizar a delegação<br />
portuguesa, dado ter nos seus registos cerca de 40<br />
membros inscritos, residentes no nosso país.<br />
No final de 2013, a Direção da INTBAU<br />
celebrou com José Franqueira Baganha o acordo<br />
para a constituição da INTBAU Portugal, que<br />
veio a registar-se enquanto associação sem fins<br />
lucrativos, de direito português, a 3 de Fevereiro<br />
deste ano. Nos seus objetivos está, como<br />
não poderia deixar de ser, a promoção da<br />
construção, da arquitetura e do urbanismo<br />
tradicionais em Portugal, mediante a organização<br />
de atividades destinadas a esse fim.<br />
Na 1ª Assembleia Geral da INTBAU Portugal<br />
ficou decidido o princípio de não se implementar<br />
qualquer quota aos seus membros, procurando-se<br />
que a Associação possa gerar receitas das suas<br />
atividades e de mecenato, sobretudo institucional.<br />
Os primeiros órgãos sociais são formados, na sua<br />
grande maioria, por arquitetos: a Mesa da<br />
Assembleia Geral está a cargo de Cristina<br />
Cavaco, Jorge Silva e Catarina Santos, o<br />
Conselho Fiscal de Eduardo Figueiredo, Álvaro<br />
Barbosa e Alexandre Reffóios e a Direcção de<br />
José Baganha, Alexandre Gamelas e Rui<br />
Florentino. Na Assembleia foi também a decidida<br />
a agenda de uma nova reunião, para debate sobre<br />
as primeiras atividades da Associação, que deverá<br />
realizar-se no Convento de Cristo, em Tomar.<br />
Rui Florentino, CESUR-IST, Universidade de<br />
Lisboa, Av. Rovisco Pais 1, 1049-001 Lisboa,<br />
Portugal. Email: ruiflorentino@gmail.com.
Estudos urbanos e geometria fractal<br />
Niara Palma<br />
Universidade de Santa Cruz do Sul, Rua Jerônimo Coelho 267, CEP 90010241 Bairro<br />
Centro Histórico, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil.<br />
Email: niara.palma.br@gmail.com<br />
Artigo revisto recebido a 24 de Janeiro de 2014<br />
Resumo. Muitas metodologias convencionais utilizadas no estudo da forma<br />
urbana não têm considerado o grau de irregularidade dos perímetros urbanos<br />
nem toda a complexidade morfológica, pois tratam a forma das cidades dentro<br />
do âmbito da geometria euclidiana. Este artigo explora a aplicação da<br />
geometria fractal ao estudo de áreas urbanas, centrando-se num conjunto de<br />
aspetos da forma urbana relacionados com a fragmentação dos tecidos<br />
urbanos, a presença de vazios urbanos e, por fim, a ‘auto-semelhança’ em<br />
diferentes escalas de observação. Esta análise desenvolve-se a partir do<br />
trabalho de investigação desenvolvido por Frankhauser desde os anos 90. A<br />
análise fractal é aplicada a um conjunto de cinco cidades no Vale do Rio<br />
Pardo, no Rio Grande do Sul, Brasil. Ao longo dos últimos anos, este conjunto<br />
de cidades tem crescido de forma desordenada, sendo que o desenvolvimento<br />
acelerado e a ampliação do perímetro urbano originaram uma ocupação<br />
rarefeita com grandes impactos sobre os tecidos urbanos.<br />
Palavras-chave: estudos urbanos, geometria fractal, dimensão fractal, autosemelhança,<br />
Vale do Rio Pardo<br />
A evolução da estrutura urbana pode ser<br />
representada como um sistema que progride<br />
em passos discretos. Cada estado alcançado<br />
depende das relações funcionais, da história e<br />
do processo de evolução anterior. Neste<br />
artigo considera-se a cidade como um<br />
sistema dinâmico, em constante<br />
transformação, onde a estrutura urbana é<br />
formada ao longo do tempo, gerando<br />
potenciais de atratividade capazes de<br />
catalisar a transformação espacial. A<br />
estrutura urbana é, então, o resultado de uma<br />
série de relações espaciais e socioeconómicas<br />
que se complementam e que se manifestam<br />
fisicamente no espaço construído. Assim<br />
como as decisões de localização de<br />
atividades (decisões que deixam marcas<br />
importantes na composição do espaço<br />
urbano), também as inovações de uso<br />
interferem no crescimento e na densidade de<br />
ocupação, estruturando a organização e a<br />
complexidade do sistema urbano.<br />
Os estudos urbanos consideram o<br />
crescimento da cidade, as suas<br />
transformações, os padrões que nela vão<br />
emergindo – as novas ordens e estruturas.<br />
Neste sentido, os investigadores nesta área<br />
científica têm trabalhado no desenvolvimento<br />
de modelos que possam refletir, de uma<br />
forma cada vez mais refinada, as<br />
características dinâmicas do sistema urbano.<br />
O modelo, sendo uma representação<br />
simplificada da realidade, permite a<br />
‘descrição’ de um modo sistémico. Este<br />
processo ocorre no sentido de extrair do<br />
sistema urbano concreto os aspetos<br />
fundamentais de cada fenómeno estudado e<br />
de inferir sobre as principais relações<br />
existentes.<br />
A análise do crescimento urbano pode<br />
requerer formas quantitativas de ‘descrição’<br />
que permitam a identificação de diferentes<br />
padrões de ocupação. Para uma reflexão<br />
sobre as diferentes formas de crescimento<br />
urbano deverá ser considerada a forma destes<br />
padrões, a sua representação e a possibilidade<br />
de comparação da sua forma, podendo<br />
relacionar diferentes sistemas urbanos ou<br />
Revista de Morfologia Urbana (2014) 2(1) 15-24 Rede Portuguesa de Morfologia Urbana ISSN 2182-7214
16 Estudos urbanos e geometria fractal<br />
manter o foco na análise da evolução de<br />
apenas um sistema ao longo do tempo.<br />
Em muitos casos, as áreas urbanas são<br />
formadas por clusters, de diferentes<br />
tamanhos, distribuídos espacialmente de<br />
forma não homogénea ao longo de vales,<br />
linhas de transporte ou áreas menos<br />
acessíveis ocupadas de maneira esparsa.<br />
Estas situações levam os investigadores e os<br />
profissionais a procurar novos modos de<br />
‘descrição’ da forma urbana, abrindo-se aqui<br />
um espaço para a utilização da geometria<br />
fractal.<br />
Geometria fractal<br />
Ao longo dos anos 70 e 80, Mandelbrot<br />
desenvolveu a geometria fractal, uma<br />
descrição sistemática e abrangente da<br />
linguagem matemática subjacente aos<br />
processos e formas naturais – ver por<br />
exemplo, o livro seminal The fractal<br />
geometry of nature (Mandelbrot, 1982). Em<br />
1975, Mandelbrot introduziu o termo fractal,<br />
do latim fractus, que significa ‘fragmentado’.<br />
A própria palavra ‘fractal’ contém um<br />
importante aspeto visual dessas estruturas<br />
matemáticas, e de muitas estruturas naturais<br />
– a sua aparência irregular e fragmentada<br />
(Joye, 2011).<br />
Uma característica importante das formas<br />
fractais é que este aspeto fragmentado surge<br />
em diferentes escalas da estrutura – uma<br />
propriedade designada como ‘autosemelhança’.<br />
Talvez a característica mais<br />
importante de um fractal seja a ‘dimensão<br />
fractal’. Enquanto na geometria Euclidiana a<br />
dimensão fornece uma informação sobre o<br />
espaço ocupado pelo objeto, na geometria<br />
fractal a dimensão (fractal) representa<br />
também o nível de irregularidade de um<br />
objeto (Mandelbrot, 1991). Quanto maior for<br />
a irregularidade de uma forma, maior será a<br />
sua dimensão fractal. Essa característica da<br />
dimensão fractal torna-a numa ferramenta<br />
muito útil para a apreensão das características<br />
individuais de uma forma. Torna-a, por<br />
exemplo, uma ferramenta útil para perceber a<br />
expansão de novas áreas urbanas a partir de<br />
uma área inicial.<br />
Na geometria Euclidiana, um ponto tem<br />
dimensão 0, uma linha tem dimensão 1, um<br />
quadrado ou um retângulo têm dimensão 2 e<br />
um volume no espaço é 3-dimensional. Pelo<br />
contrário, um fractal num plano terá uma<br />
dimensão entre 1 e 2, e um fractal no espaço<br />
terá uma dimensão entre 2 e 3. Os fractais<br />
têm uma dimensão não-integral pois ocupam<br />
mais espaço do que uma simples linha – a<br />
primeira dimensão – mas não ocupam todo o<br />
plano – a segunda dimensão (Joye, 2011).<br />
Falconer (1991) sustenta que para um<br />
objeto ser considerado um fractal deverá<br />
cumprir um conjunto de requisitos: ser autosimilar<br />
(um intervalo entre 0 e ½ deve ser<br />
igual a um intervalo entre ½ e 1); ser<br />
demasiado irregular para poder ser descrito<br />
pela geometria tradicional; possuir dimensão<br />
fractal, que será normalmente superior à<br />
dimensão Euclidiana; poder ser obtido<br />
através de um procedimento recursivo; e, por<br />
fim, não variar com a escala.<br />
A geometria fractal tem vindo a ser<br />
utilizada em diversas áreas do conhecimento<br />
como o estudo de sistemas caóticos (por<br />
exemplo, o padrão de formação de nuvens), a<br />
caracterização de objetos, a análise e o<br />
reconhecimento de padrões em imagens, a<br />
análise de texturas e a medição do<br />
comprimento de curvas.<br />
Desde os anos 80 a geometria fractal tem<br />
sido utilizada para a análise de fenómenos<br />
urbanos, destacando-se: na década de 90, os<br />
trabalhos de Allen (1997), Batty e Longley<br />
(1994) e Frankhauser (1994, 1998); na<br />
primeira década do século XX, os textos de<br />
Batty (2003), Benguigui et al. (2008),<br />
Cooper e Oskrochi (2008), Frankhauser e<br />
Pumain (2000), Frankhauser (2002) e<br />
Weidlich (2000); e nos primeiros anos da<br />
presente década, Feng e Chen (2010) e Terzi<br />
e Kaya (2011). No Brasil esta abordagem foi<br />
já utilizada, na área da geografia, por<br />
Azevedo e Christofoletti (2007) e Trentin<br />
(2012).<br />
Batty e Longley (1994) consideram que<br />
do mesmo modo que o crescimento natural,<br />
também o crescimento urbano envolve<br />
adição e subtração de unidades básicas,<br />
células ou partículas. No caso das cidades,<br />
estas unidades podem ser individuais,<br />
residências, firmas, ligações de transporte e<br />
outros. As cidades crescem através da<br />
acumulação destas unidades básicas. Estes<br />
padrões podem existir em escalas maiores e<br />
indicar auto-similaridade em escalas que<br />
emergem do processo de crescimento.
Estudos urbanos e geometria fractal 17<br />
Considera-se que dentro de cada processo de<br />
crescimento existem códigos que determinam<br />
o modo como a organização destas unidades<br />
básicas de desenvolvimento urbano define o<br />
seu crescimento e forma, repetindo-se em<br />
diferentes escalas. Deste modo a repetição de<br />
padrões torna-se um elemento natural no<br />
crescimento urbano.<br />
Modelos clássicos<br />
A propriedade mais básica de um objeto<br />
fractal é ele ser, por definição, multi-escalar.<br />
Esta característica resulta do procedimento<br />
utilizado para construir um fractal teórico,<br />
baseado na repetição da mesma operação,<br />
definida pelo objeto gerador, em escalas cada<br />
vez menores. Ao mesmo tempo, o limite<br />
deste objeto geométrico torna-se cada vez<br />
mais complexo pela inclusão de um número<br />
crescente de tentáculos (Frankhauser, 2004).<br />
A Figura 1 ilustra a geração do chamado<br />
‘Tapete de Sierpinski’ (figura plana<br />
desenvolvida por Sierpinski).<br />
Neste exemplo a estrutura geométrica<br />
permanece confinada á área do quadrado<br />
inicial. O mesmo tipo de objeto geométrico<br />
pode ser também construído pela adição de<br />
quadrados de uma determinada dimensão e<br />
de acordo com uma regra de geração, dando<br />
origem a um objeto cada vez mais complexo.<br />
Segundo Frankhauser (2004), este<br />
exemplo pode ser, de algum modo,<br />
relacionado com um processo de expansão<br />
urbana onde, a partir de um núcleo inicial,<br />
são adicionadas novas áreas ao longo de<br />
quatro eixos de saída da cidade. Numa fase<br />
seguinte, a expansão continua ao longo dos<br />
eixos principais, mas também ao longo de<br />
eixos secundários dando origem a uma rede<br />
viária hierarquizada (Figura 2).<br />
Por outro lado, a Figura 3 poderá sugerir<br />
áreas metropolitanas formadas por<br />
assentamentos de dimensão variada,<br />
desconectados, distribuídos de maneira<br />
desigual sobre o espaço. Novamente, a<br />
estrutura dos fractais torna-se mais e mais<br />
complexa a cada nova iteração.<br />
Os fractais, regulares e irregulares,<br />
parecem assim oferecer uma base<br />
interessante para o estudo de assentamentos<br />
urbanos. Em seguida, serão considerados os<br />
espaços construídos da cidade como os<br />
Figura 1. Geração de um Tapete de Sierpinski.<br />
Em cada passo, cada quadrado é substituído<br />
por n=5 quadrados com comprimento<br />
reduzido pelo fator r = 1/3.<br />
Figura 2. Geração de um fractal pela adição de<br />
elementos (relacionável com a rede viária).<br />
Figura 3. Um Tapete de Sierpinski consistente<br />
de uma série de clusters (a), um compacto com<br />
hierarquia de espaços abertos (b) e um tipo<br />
Poeira de Fournier que remete uma rede viária<br />
intra-urbana (c).<br />
elementos constitutivos da ‘massa’ de uma<br />
estrutura fractal. Este processo envolve a<br />
contagem do número de pontos ocupados,<br />
que se encontram a uma determinada<br />
distância de cada ponto ocupado, calculandose<br />
em seguida a correlação entre eles. O<br />
processo inicia-se com apenas um ponto (um<br />
pixel), sendo de seguida ampliada a escala de<br />
análise até se cobrir a figura como um todo.<br />
A dimensão mede o grau de concentração<br />
dos espaços ocupados através de diferentes<br />
escalas, ou mais precisamente, o decaimento<br />
relativo na massa em qualquer distância do<br />
ponto onde a massa é concentrada. Neste<br />
sentido, é possível perceber em detalhe a<br />
distribuição dos pontos ocupados na forma<br />
em análise. Como foi já referido, para as<br />
formas perfeitas, usualmente estudadas pela
18 Estudos urbanos e geometria fractal<br />
geometria Euclidiana, o valor estimado de<br />
dimensão fractal é muito próximo de 1.<br />
A dimensão fractal de uma superfície<br />
uniformemente ocupada será igual a 2, pois<br />
essa não possui irregularidades. Note-se que<br />
no modelo de Frankhauser (2004), aqui<br />
utilizado para o cálculo de dimensão fractal,<br />
o valor é estimado segundo o número de<br />
pixels ocupado em cada figura, representada<br />
como uma forma dentro de um limite<br />
quadrado (geração de imagens que ainda<br />
deixam espaços em branco no seu limite).<br />
Devido a esta característica de leitura do<br />
modelo, os valores não são exatamente iguais<br />
a 2.<br />
Naturalmente, os assentamentos urbanos<br />
não são construídos como as figuras aqui<br />
apresentadas. Como tal, Frankhauser (2004)<br />
sugere diferentes métodos para verificar o<br />
quanto um padrão observado é, de facto,<br />
estruturado de acordo com a lógica fractal.<br />
Estes métodos reproduzem a lógica de<br />
interação medindo a distribuição dos espaços<br />
ocupados ou do comprimento da fronteira<br />
através de múltiplas escalas. Este tipo de<br />
análise foi utilizado para o estudo de<br />
diferentes tipos de ocupação, especialmente<br />
tipos considerados ‘amorfos’, com fronteiras<br />
‘suaves’ ou ‘dendríticas’. Quando a forma<br />
em análise não é uma figura geométrica<br />
perfeita, ou é preenchida de forma irregular,<br />
a sua dimensão fractal assume um valor<br />
compreendido entre 1 e 2. A Figura 4<br />
compara uma forma circular perfeita<br />
(perímetro), com uma forma circular com<br />
preenchimento irregular e, ainda, com uma<br />
forma circular com a superfície<br />
uniformemente ocupada.<br />
Na secção seguinte descreve-se uma<br />
aplicação a um conjunto de cidades do Vale<br />
do Rio Pardo. A aplicação centra-se no<br />
perímetro urbano e nos vazios internos, e tem<br />
em vista a identificação do tipo de ocupação<br />
presente em cada cidade. Foi utilizado o<br />
software Fractalyse desenvolvido no centro<br />
de investigação ThéMA num projeto<br />
coordenado por Frankhauser e Tannier. Será<br />
aplicada a medida de dimensão fractal, do<br />
tipo correlação, onde cada ponto é rodeado<br />
por uma janela de pequena dimensão.<br />
Contabiliza-se o número de pontos<br />
ocupados dentro de cada janela, sendo que,<br />
em seguida, a mesma operação é aplicada<br />
para janelas cada vez maiores. Se houver<br />
Figura 4. Dimensão Fractal de um círculo<br />
segundo seu perímetro, preenchimento<br />
irregular e totalmente preenchido.<br />
alteração de pontos proporcionalmente à<br />
escala da nova janela (correlação positiva), a<br />
forma é considerada uniforme. Por outro<br />
lado, se o número de pontos não for<br />
proporcional à mudança da escala de<br />
crescimento das janelas utilizadas, está-se em<br />
presença de uma forma fragmentada e<br />
irregular, como mostra a Figura 5. Em cada<br />
gráfico, o eixo X representa o lado da janela<br />
Ɛ = (2i + 1), o eixo Y representa a média de<br />
pontos contados por janela e o parâmetro<br />
principal é o tamanho do lado da janela Ɛ.<br />
Caso de estudo: cinco cidades no Vale do<br />
Rio Pardo<br />
Escala regional e urbana<br />
Esta secção apresenta a aplicação da<br />
geometria fractal a cinco cidades do Vale do<br />
Rio Pardo, no Rio Grande do Sul: Estrela,<br />
Lajeado, Santa Cruz do Sul, Venâncio Aires<br />
e, por fim, Vera Cruz. O Vale do Rio Pardo é<br />
uma região no Rio Grande do Sul – uma das<br />
27 unidades federativas Brasileiras,<br />
localizada no extremo sul do país. Reside<br />
nesta região (com uma área de 13 250 km²)<br />
uma população de perto de 450 000<br />
habitantes (dados da Fundação de Economia<br />
e Estatística do Rio Grande do Sul)<br />
distribuída por um vasto conjunto de cidades<br />
de pequena e média dimensão. A rede de<br />
cidades do Vale do Rio Pardo é apresentada<br />
na Figura 6, onde se identifica as que serão<br />
parte desta análise. Embora a figura destaque<br />
apenas as estradas principais, pode-se<br />
perceber a existência de uma rede formada<br />
por essas estradas e pelo conjunto de vias<br />
secundárias utilizadas diariamente pela<br />
população que transita entre estas cidades em<br />
função das relações de trabalho, estudo e<br />
transporte de mercadorias.<br />
De entre as cinco cidades selecionadas
Estudos urbanos e geometria fractal 19<br />
Figura 5. Ampliação da janela para a contagem de pontos existentes em cada escala<br />
considerada até preencher toda a figura. Neste caso foram consideradas janelas de 1 a 117<br />
pixels.<br />
será dada uma maior atenção a Santa Cruz do<br />
Sul, devido à sua situação de principal polo<br />
regional, concentrando as principais<br />
indústrias de fumo, principal produto agrícola<br />
da região. A partir de uma primeira análise<br />
de Santa Cruz do Sul será possível<br />
estabelecer um conjunto de parâmetros que<br />
sirvam de referência para a análise dos<br />
resultados das demais cidades que fazem<br />
parte do seu sistema regional. Santa Cruz do<br />
Sul é um dos principais núcleos da<br />
colonização alemã do Rio Grande do Sul. A<br />
colónia foi fundada, por lei provincial, a 6 de<br />
Dezembro de 1847. Esta cidade possui dois<br />
importantes limites: a leste, o morro chamado<br />
‘Cinturão Verde’, e a oeste, a BR 471. Santa<br />
Cruz do Sul desenvolveu-se a partir de um<br />
núcleo planeado, com lotes de traçado<br />
regular (demarcados pelo engenheiro<br />
Frederico Cabral) e com um limite<br />
quadrangular – figuras 7 e 8.<br />
Até aos anos 20 do século passado, Santa<br />
Cruz manteve uma forma bastante regular.<br />
Ao longo do século XX a cidade foi-se<br />
expandindo seguindo antigas estradas e<br />
incluindo parcelas ligadas ao perímetro<br />
urbano anterior (Figura 7). Os morros foram<br />
sempre os ‘constrangimentos’ mais<br />
significativos, acabando por definir uma<br />
cidade com uma forma mais ‘dendrítica’.<br />
Nos últimos anos, a cidade cresceu de forma<br />
rápida e pouco regulada. Esta particularidade<br />
é detetada através da observação dos valores<br />
de dimensão fractal que, em apenas 10 anos,<br />
aumentaram cerca de 25 por cento (Figura 8).<br />
A criação do distrito industrial e a<br />
ocupação da Área de Preservação<br />
Permanente – o Cinturão Verde –<br />
contribuíram para este tipo de ocupação e<br />
para o crescimento do perímetro urbano.<br />
Outra característica fundamental de Santa<br />
Cruz do Sul é a ocupação de áreas próximas<br />
às suas principais saídas em direção às<br />
demais cidades do Vale do Rio Pardo, com<br />
uma forte ligação de complementaridade<br />
socioeconómica, provocando uma grande<br />
interação espacial. Esta interação ocorre<br />
diariamente, sendo que o fluxo de pessoas<br />
gerado se deve fundamentalmente a<br />
deslocações casa-trabalho, casa-estudo, local<br />
de produção-abastecimento, e por fim, ao<br />
acesso à oferta diversificada do seu polo<br />
principal, Santa Cruz do Sul. Naturalmente,<br />
esta rede afeta também as outras cidades, de<br />
dimensão mais reduzida, do Vale do Rio<br />
Pardo (Figura 9).<br />
Muitos sistemas numa fase de<br />
crescimento apresentam auto-similaridade.<br />
Também a cidade tem sido considerada como<br />
um elemento com estas características. A<br />
similaridade pode também influenciar um<br />
conjunto de elementos que possuam ligação<br />
entre si, assim como as interações espaciais<br />
encontradas em sistemas regionais. Nas<br />
últimas décadas do século XX, uma parte da<br />
comunidade científica, na área da Física,<br />
começou a interessar-se pela dinâmica de<br />
sistemas ditos complexos, cujas partes<br />
interagem de forma não-linear. Uma das<br />
propriedades marcantes de tais sistemas é a<br />
presença de leis de escala ou Leis de<br />
Potência. Uma Lei de Potência é uma relação<br />
funcional entre duas quantidades. Por<br />
exemplo: a relação de complementaridade
20 Estudos urbanos e geometria fractal<br />
Figura 6. Distribuição territorial das cidades<br />
estudadas.<br />
socioeconômica existente num sistema<br />
regional, regido por um polo principal, que<br />
pode afetar as demais cidades da rede, num<br />
determinado atributo. Neste caso, o atributo é<br />
a forma urbana e a ocupação urbana, medida<br />
pela dimensão fractal de cada cidade<br />
analisada.<br />
A hipótese principal é que se um<br />
determinado tipo de ocupação começa a<br />
desenvolver-se numa cidade que é<br />
considerada um polo de um sistema regional<br />
– como é o caso de Santa Cruz do Sul –<br />
outras cidades da mesma região poderão vir a<br />
apresentar o mesmo tipo de crescimento e<br />
ocupação do solo, gerando assim<br />
características formais similares. A dimensão<br />
fractal de cada uma das cidades permite<br />
comparar o grau de fragmentação do tecido<br />
urbano gerado pela ocupação recente – que<br />
define sua forma atual – tendo em<br />
consideração o seu perímetro urbano e os<br />
vazios internos.<br />
Apesar de Santa Cruz do Sul ter mantido,<br />
ao longo de muitas décadas, uma forma<br />
compacta e regular semelhante ao seu núcleo<br />
inicial, com as mudanças na região e com o<br />
aparecimento de novos loteamentos e novos<br />
tipos habitacionais (por exemplo, os<br />
condomínios fechados), a cidade passou a<br />
apresentar uma forma dendrítica.<br />
No contexto regional do Vale do Rio<br />
Pardo, o fenómeno de ocupação do solo<br />
urbano pode ser considerado como ‘coevolução’,<br />
ou seja, um processo<br />
evolucionário que surge da interação entre<br />
componentes de espécies diferentes num<br />
mesmo sistema – neste caso, as cidades da<br />
região que têm apresentado mudanças na sua<br />
forma urbana resultantes de novas ocupações<br />
do solo e de uma expansão incontrolada da<br />
área urbana. Nas cidades estudadas é possível<br />
observar um parcelamento de propriedades<br />
próximas às áreas já urbanizadas, e o<br />
desenvolvimento urbano ao longo de eixos<br />
fundamentais de transporte.<br />
A uma escala menor, o crescimento<br />
envolve transições individuais relacionadas<br />
com o uso do solo, a ocupação e a densidade<br />
urbana. Se há uma alteração na configuração<br />
deste conjunto de componentes, o sistema<br />
urbano resultante deixa de apresentar apenas<br />
as propriedades coletivas dos componentes,<br />
passando também a incluir propriedades<br />
emergentes do sistema decorrentes de<br />
alterações das relações entre os componentes<br />
da estrutura urbana. Neste caso, a Lei de<br />
Potência, gerada por novas formas de<br />
ocupação urbana, leva a que no contexto<br />
regional se encontrem padrões similares. Isto<br />
mesmo é visível nas Tabela 1 e 2, que<br />
apresentam os resultados da análise da<br />
dimensão fractal das cinco cidades<br />
analisadas.<br />
No caso da cidade de Lajeado, a ocupação<br />
urbana possuiu outro grau de organização,<br />
com uma alta dimensão fractal, próxima de 2.<br />
Como tal, poderia ser considerada uma figura<br />
totalmente ocupada. A contradição, porém, é<br />
a formação de um tecido urbano com pouca<br />
acessibilidade, com muitos loteamentos, com<br />
um modelo do tipo ‘espinha de peixe’ que<br />
está associado a uma elevada segregação.<br />
As Leis de Potência revelam<br />
regularidades em propriedades de sistemas<br />
complexos – como são as cidades – que<br />
sofrem transformações em diferentes escalas<br />
e que apresentam similaridades entre elas. A<br />
visão numa determinada escala pode ser<br />
similar à visão noutras escalas. Os exemplos<br />
apresentados nas primeiras secções do artigo<br />
apresentam uma auto-similaridade perfeita<br />
por se tratarem de modelos matemáticos. No<br />
entanto, isto não acontece nem no ambiente<br />
urbano nem na natureza.<br />
Conforme foi dito anteriormente, em<br />
muitos casos, as áreas urbanas são formadas<br />
por clusters de diferentes tamanhos,<br />
distribuídos espacialmente de um modo não<br />
homogéneo ao longo de vales, linhas de<br />
transporte e áreas menos acessíveis, que são<br />
ocupadas de maneira esparsa. Uma mudança<br />
de escala, da urbana para a regional, e<br />
considerando as diferentes cidades
Estudos urbanos e geometria fractal 21<br />
Figura 7. Plantas de Santa Cruz do Sul em 1870, 1922 e 1957.<br />
Figura 8. Perímetro urbano de Santa Cruz do Sul entre 1870 e 2012.<br />
Figura 9. Contorno e vazios internos das cidades de Venâncio Aires, Vera Cruz, Estrela e<br />
Lajeado.
22 Estudos urbanos e geometria fractal<br />
Tabela 1. Dimensão Fractal de Santa Cruz<br />
do Sul entre 1870 e 2012.<br />
Tabela 2. Dimensão fractal de Venâncio<br />
Aires, Vera Cruz, Estrela e Lajeado.<br />
Figura 10. Parcela da cidade de Santa Cruz do Sul.<br />
Figura 11. Parcela da cidade de Lajeado.<br />
integrantes do Vale do Rio Pardo, evidencia<br />
todo um conjunto de semelhanças no tipo de<br />
crescimento urbano. Por outro lado, a<br />
característica básica de um fractal é a autosimilaridade<br />
em diferentes escalas que pode<br />
passar do âmbito regional para o urbano e<br />
para o intraurbano.<br />
Escala intraurbana<br />
A análise dos limites de uma cidade revela<br />
propriedades importantes do modo como se<br />
estrutura internamente. Estas propriedades<br />
podem ser medidas de diversos modos numa<br />
hierarquia que define dimensão, forma e<br />
escala. A característica de auto-similaridade<br />
em contexto intraurbano foi testada nas duas<br />
maiores cidades do conjunto em análise,<br />
Santa Cruz do Sul e Lajeado. Escolheram-se,<br />
de forma aleatória, parcelas ocupadas<br />
localizadas no perímetro urbano das<br />
respetivas cidades. O objetivo era testar se,<br />
em escalas menores, com uma definição de
Estudos urbanos e geometria fractal 23<br />
ruas e quarteirões, a alta fragmentação do<br />
tecido urbano permaneceria (mantendo-se<br />
também no perímetro urbano como um todo).<br />
No caso de Santa Cruz do Sul existe autosemelhança<br />
quando se parte para escalas<br />
menores de observação intraurbana. A<br />
dimensão fractal da parcela estudada nesta<br />
cidade é 1,565, quando analisado o perímetro<br />
urbano e as áreas de ocupação mais rarefeita<br />
(Figura 10). Do mesmo modo, também no<br />
caso da parcela da cidade de Lajeado a<br />
dimensão fractal continua elevada, com<br />
1,567 (Figura 11).<br />
Os exemplos das parcelas de Santa Cruz<br />
do Sul e Lajeado mostram que, mesmo<br />
alterando a escala de observação do<br />
território, é possível observar que os<br />
impactos gerados no tecido urbano são<br />
semelhantes às análises anteriores –<br />
desenvolvidas a escalas maiores – desde o<br />
desenvolvimento de uma forma dendrítica,<br />
até à incompatibilidade dos novos<br />
loteamentos com a rede viária existente.<br />
Conclusões<br />
Com o estudo de caso aqui apresentado, foi<br />
possível demonstrar a validade de uma<br />
metodologia de análise dos fenómenos<br />
urbanos, centrada na forma urbana e com<br />
uma forte componente de geometria fractal.<br />
Neste caso, o grau de fragmentação e<br />
preenchimento urbano pode ser avaliado a<br />
partir da dimensão fractal que, em Santa Cruz<br />
do Sul, contribui para a compreensão da<br />
dinâmica espacial e temporal da sua forma<br />
urbana. Com essa abordagem foi também<br />
possível analisar a dinâmica regional de<br />
expansão urbana de um conjunto de cidades<br />
inter-relacionadas por complementaridades<br />
socioeconómicas no Vale do Rio Pardo.<br />
Com base na dimensão fractal<br />
identificaram-se padrões de crescimento<br />
semelhantes associados à expansão<br />
desregrada, vigente na região, que leva à<br />
fragmentação dos tecidos urbanos e à<br />
emergência de formas urbanas irregulares.<br />
Essa propriedade foi detectada através da<br />
aplicação da dimensão fractal, mostrando-se<br />
tanto em âmbito intraurbano (indicando a<br />
existência de descontinuidades e vazios)<br />
como em perímetros irregulares (que se<br />
repetem, em maior ou menor grau, nas<br />
cidades analisadas).<br />
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24 Estudos urbanos e geometria fractal<br />
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Tradução do resumo e palavras-chave<br />
Abstract. Conventional methodologies in the study of urban form have not been considering the whole<br />
morphological complexity of cities or the degree of irregularity of urban perimeters as they address the<br />
physical form of cities within the scope of Euclidean geometry. This paper explores the application of<br />
fractal geometry in the study of urban areas, focusing on a number of aspects of physical form related to<br />
the fragmentation of urban fabrics, the presence of urban voids and, finally, the existence of selfsimilarity<br />
at different scales of observation. This analysis draws on the research work developed by<br />
Frankhauser from the 1990s onwards. Fractal analysis is applied to a set of five cities in the Vale do Rio<br />
Pardo, Rio Grande do Sul, Brazil. Over the last years, this set of cities had an uncontrolled pattern of<br />
growth. The rapid urban development patterns and the expansion of urban perimeters have led to a type<br />
of rarefied territorial occupation with major impacts on the urban fabrics of these cities.<br />
Key Words: Urban studies, fractal geometry, fractal dimension, self-organization, Vale do Rio Pardo<br />
Turkish Network of Urban Morphology<br />
A primeira reunião da Turkish Network of<br />
Urban Morphology (TNUM) teve lugar no dia<br />
11 de Abril de 2014 no Center for<br />
Mediterranean Urban Studies da Mersin<br />
University, em Mersin. Os objetivos<br />
fundamentais desta reunião foram os seguintes:<br />
formar um espaço comum para a partilha de<br />
diferentes estudos morfológicos; discutir as<br />
possibilidades de desenvolvimento de estudos<br />
colaborativos, na área da forma urbana, por<br />
diferentes investigadores e instituições turcas; e,<br />
por fim, alargar os estudos a um nível<br />
internacional através da cooperação com outras<br />
redes nacionais e regionais e com o<br />
International Seminar on Urban Form (ISUF).<br />
A primeira reunião da rede, designada como<br />
Foundation Workshop, foi palco de muitas e<br />
proveitosas discussões. Na primeira parte do<br />
workshop os vários investigadores tiveram<br />
oportunidade de partilhar os seus estudos e<br />
análises. A segunda parte foi dedicada a um<br />
debate sobre o futuro do TNUM e sobre os<br />
diferentes desenvolvimentos possíveis para esta<br />
nova rede de investigação.<br />
Sublinham-se três aspetos fundamentais<br />
deste debate. O primeiro refere-se à estrutura<br />
organizacional da rede. Foi definido que o<br />
Center for Mediterranean Urban Studies irá<br />
atuar como elemento coordenador do TNUM.<br />
Os investigadores que estiveram presentes no<br />
workshop farão parte de uma comissão diretiva<br />
presidida por Ayşe Sema Kubat (Department of<br />
Urban and Regional Planning, Istanbul<br />
Technical University) coadjuvada pelo diretor<br />
do Center for Mediterranean Urban Studies,<br />
Tolga Ünlü (Department of City and Regional<br />
Planning, Mersin University).<br />
O segundo aspeto que importa referir<br />
prende-se com a formação de uma comissão<br />
com o objetivo de preparar uma lista<br />
bibliográfica de estudos sobre forma urbana na<br />
Turquia. Este trabalho terá por base o artigo de<br />
Ayşe Sema Kubat, The study of urban form in<br />
Turkey, publicado na revista Urban Morphology<br />
(Kubat, 2010).<br />
Por fim, foi estabelecido que o primeiro<br />
simpósio do TNUM realizar-se-á na Mersin<br />
University, a 22 e 23 de Outubro de 2015, e irá<br />
discutir as diferentes abordagens e perspetivas<br />
no estudo da forma urbana na Turquia.<br />
Reference<br />
Kubat, A. S. (2010) ‘The study of urban form in<br />
Turkey’, Urban Morphology 14, 31-48.<br />
Tolga Ünlü, Department of City and Regional<br />
Planning, Mersin University, Yenisehir, Mersin<br />
33343, Turkey. Email: tolgaunlu@gmail.com
Saverio Muratori e a escola Italiana de tipologia projetual<br />
Giancarlo Cataldi, Gian Luigi Maffei e Paolo Vaccaro<br />
Dipartimento di Progettazione dell’Architettura, Università degli Studi di Firenze,<br />
Viale Gramsci 42, 50132 Firenze, Italy, Email: giancarlo.cataldi@gmail.com,<br />
gianluigimaffei@libero.it<br />
Artigo originalmente publicado na Urban Morphology em Abril de 2002<br />
Resumo. Este artigo descreve o desenvolvimento da escola Muratoriana de<br />
morfologia urbana e tipologia do edificado. Partindo do trabalho de<br />
Muratori enquanto arquiteto experiente, profundamente envolvido na<br />
interpretação Romana do racionalismo Italiano, os autores descrevem o<br />
crescente interesse de Muratori pela história como meio para recuperar o<br />
sentido de continuidade na prática arquitetónica. Adotando uma abordagem<br />
teórica assente na arquitetura e no desenho urbano, Muratori começou a<br />
trabalhar num quadro crítico que pudesse explicar a criação e a<br />
transformação da forma urbana ao longo dos séculos. Muratori teve muitos<br />
seguidores. Descreve-se o ressurgimento do interesse pelo trabalho de<br />
Muratori nos anos 90.<br />
Palavras-chave: Muratori, Caniggia, história, tipologia projetual, Itália<br />
O quinquagésimo aniversário da publicação<br />
do ensaio fundamental de Saverio Muratori<br />
Vita e storia della città (Muratori, 1950)<br />
constitui uma oportunidade para descrever os<br />
acontecimentos e a evolução das ideias que<br />
caracterizaram a escola desenvolvida a partir<br />
da atividade de ensino de Muratori. De<br />
acordo com Muratori, ao longo da primeira<br />
metade do século XX, o planeamento urbano<br />
e a teoria de desenho urbano foram deixando<br />
de ser instrumentos culturais enraizados na<br />
história. Este processo refletiu-se no<br />
crescimento de uma abordagem positivista<br />
relativamente ao edifício. O planeamento e o<br />
desenho tornaram-se pouco mais do que<br />
instrumentos técnicos. Na opinião de<br />
Muratori, isto conduziu, progressivamente, a<br />
um empobrecimento da disciplina. Apenas<br />
um conhecimento sistemático das leis de<br />
reprodução da história poderia recrear o<br />
papel reclamado anteriormente pelo desenho<br />
urbano. Para alcançar esse conhecimento era<br />
necessário um novo quadro teórico, e foi à<br />
construção desse quadro que Muratori<br />
dedicou a sua vida profissional.<br />
Saverio Muratori<br />
Muratori (1910-73) desenvolveu o seu<br />
percurso como estudante, na escola e na<br />
universidade, durante um período de<br />
profunda renovação das instituições de<br />
ensino Italianas (Cataldi, 1982a, 1984;<br />
Marcucci, 1984; Pigafetta, 1990). A Riforma<br />
Gentile de 1923 constituiu uma tentativa de<br />
reestabelecer o conhecimento académico nas<br />
disciplinas das humanidades e das ciências.<br />
A mudança foi finalmente introduzida em<br />
1929. A aproximação destas duas culturas<br />
deu relevância à arquitetura, já que nela seria<br />
possível ultrapassar as diferenças entre<br />
escolas de arte e escolas politécnicas de<br />
engenharia.<br />
Pouco tempo depois da sua graduação,<br />
numa escola clássica, o jovem Muratori terá<br />
absorvido o conceito de arquitetura<br />
contextualizada nas aulas dos seus primeiros<br />
professores (Fasolo, Giovannoni, Foschini,<br />
Calandra e Piacentini), em particular<br />
Gustavo Giovannoni. Este conceito foi<br />
posteriormente incorporado e desenvolvido<br />
Revista de Morfologia Urbana (2014) 2(1) 25-36 Rede Portuguesa de Morfologia Urbana ISSN 2182-7214
26 Saverio Muratori e a escola Italiana de tipologia projetual<br />
na sua própria teoria.<br />
Após a conclusão do curso em 1933, uma<br />
grande curiosidade intelectual e um elevado<br />
referencial cultural levaram Muratori a<br />
aprofundar o seu conhecimento sobre<br />
arquitetura moderna, através da elaboração<br />
de um conjunto de artigos para a revista<br />
Architettura sobre os mais recentes projetos<br />
arquitetónicos na Europa. Este trabalho<br />
influenciou os seus primeiros projetos,<br />
maioritariamente desenvolvidos em<br />
colaboração com Ludovico Quaroni e<br />
Francesco Fariello, nos quais se inclui uma<br />
maqueta da Praça Imperial Romana para a<br />
Exposição Universal de Roma em 1937.<br />
Os projetos subsequentes, de sua<br />
exclusiva autoria, caracterizam-se por um<br />
interesse experimental pela composição das<br />
praças Italianas: temas urbanos<br />
fundamentais, nos quais o ambiente<br />
consolidado envolvente constitui a razão<br />
contextualizada para a existência da praça e<br />
dos edifícios monumentais que a rodeiam.<br />
A guerra interrompeu a atividade de<br />
planeamento de Muratori, mas não a sua<br />
reflexão crítica que, pelo contrário,<br />
aumentou de intensidade. Os seus ensaios de<br />
1944-46, publicados a título póstumo por<br />
Guido Marinucci, testemunham isto mesmo.<br />
O conceito de cidade como organismo vivo,<br />
como obra de arte coletiva, e a ideia de<br />
planear novos edifícios em continuidade com<br />
a cultura edificatória do lugar são<br />
apresentados pela primeira vez nesses<br />
ensaios. Com uma forma embrionária está<br />
também presente a ideia de ‘história<br />
operativa’, que viria a encontrar uma<br />
definição explícita nos livros sobre Veneza.<br />
Nos anos de reconstrução do pós-guerra,<br />
Muratori envolveu-se profundamente nos<br />
planos de habitação do Istituto Nazionale<br />
delle Assicurazioni (INA), lançados em 1948<br />
e implementados em todas as grandes<br />
cidades Italianas. Muratori foi responsável,<br />
enquanto líder de grupo, por alguns distritos<br />
de Roma, como é o caso de Tuscolano, onde<br />
a abordagem de planeamento urbano e o<br />
edificado foram influenciados pelo<br />
empirismo Escandinavo.<br />
Durante este período, Muratori desenhou<br />
quatro edifícios públicos fundamentais em<br />
três cidades Italianas: a igreja de S. Giovanni<br />
al Gatano em Pisa (Figura 1), o edifício de<br />
escritórios da Ente Nazionale di Previdenza<br />
ed Assicurazione Sociale em Bolonha<br />
(Figura 2), a sede do Partido Democrata<br />
Cristão (Figura 3) e a, incompleta, igreja de<br />
Tuscolano, ambos em Roma. Desta forma,<br />
Muratori pode explorar soluções para<br />
problemas técnicos modernos (inerentes a<br />
novos materiais e, em particular, ao betão<br />
armado) quer ao nível do estilo quer ao nível<br />
do ambiente. É notável como, nestes<br />
trabalhos, Muratori abarca os períodos mais<br />
significativos da história da arquitetura<br />
Italiana: desde o Românico em Pisa, ao<br />
Gótico em Bolonha, até ao Renascimento e<br />
ao Barroco em Roma. Não importa a nossa<br />
apreciação destes trabalhos; eles sobressaem<br />
no panorama internacional da arquitetura<br />
contemporânea porque os temas que<br />
exploram estão décadas à frente do seu<br />
tempo.<br />
Muito provavelmente, estas experiências<br />
induziram em Muratori uma profunda<br />
insatisfação com o vazio conceptual que é<br />
evidente entre os planos urbanos e estes<br />
trabalhos de arquitetura. Ele considerou que<br />
os primeiros – seguindo as funções do seu<br />
tempo – se encontravam relacionados de<br />
forma pobre com a complexidade e a<br />
originalidade dos últimos.<br />
Em 1952, foi convidado para Veneza para<br />
a cátedra de Características Distributivas dos<br />
Edifícios. Aqui, reexaminou as primeiras<br />
pesquisas urbanas sobre o centro da cidade e<br />
as hipóteses teóricas do seu ensaio de 1950.<br />
Muratori fez tudo isto utilizando os conceitos<br />
fundamentais de tipo, tecido, organismo e<br />
história operativa. Studi per una operante<br />
storia urbana di Venezia constituiu a<br />
primeira pesquisa sistemática sobre os<br />
edifícios históricos de uma cidade e surgiu<br />
um ano antes do livro complementar de<br />
Paolo Maretto sobre L’edilizia gótica<br />
veneziana, que continha uma introdução<br />
crítica de Muratori (Maretto, 1960; Muratori,<br />
1959).<br />
Em 1954 Muratori regressou a Roma para<br />
substituir Arnaldo Foschini como Professor<br />
de Composição Arquitetónica. Em Roma,<br />
Muratori procurou renovar o ensino da<br />
arquitetura. A sua experiência em Veneza<br />
despoletou a ideia de história operativa, que<br />
veio a inspirar e a fornecer a base para os<br />
planos dos estudantes em Roma. Os temas<br />
propostos tinham em vista a compreensão<br />
dos diferentes valores inerentes às diferentes
Saverio Muratori e a escola Italiana de tipologia projetual 27<br />
Figura 3. Edifício de escritórios, Roma (1955-<br />
58), anterior Sede do Partido Democrata<br />
Cristão, projetado por S. Muratori.<br />
Figura 1. Igreja de S. Giovanni al Gatano, Pisa<br />
(1947-70), projetada por S. Muratori.<br />
Figura 2. Edifício de escritórios da Ente<br />
Nazionale di Previdenza ed Assicurazione<br />
Sociale, Bolonha (1952-57), projetado por S.<br />
Muratori.<br />
fases de formação urbana, incluindo as<br />
influências e as implicações dos novos<br />
projetos sobre os edifícios existentes quer no<br />
centro histórico das cidades, onde o tecido é<br />
compacto, quer nos subúrbios, onde os<br />
territórios eram suscetíveis de acomodar um<br />
vasto leque de soluções.<br />
Ao considerar os organismos<br />
arquitetónicos, Muratori reforça os temas<br />
urbanos, como é exemplificado pelo famoso<br />
exercício da ‘capela em alvenaria’. Aqui, era<br />
pedido aos estudantes para planearem um<br />
edifício representativo e coerente, no qual, a<br />
organização espacial da forma – enquanto<br />
síntese de materiais, estrutura e plano<br />
compositivo – era o propósito fundamental.<br />
No início dos anos 60, a equipa de<br />
professores assistentes de Muratori começou<br />
a formar-se. Esta equipa incluía Renato<br />
Bollati, Sergio Bollati, Gianfranco Caniggia,<br />
Guido Figus, Sandro Giannini, Romano<br />
Greco, Paolo Maretto e Guido Marinucci.<br />
Com os Bollati e com Marinucci, Muratori<br />
foi responsável pelo notável atlas Studi per<br />
una operante storia urbana di Roma,<br />
concluído em 1963 (Muratori et al., 1963).<br />
Com outros, participou em importantes<br />
concursos de arquitetura, vencendo o<br />
concurso para Barene di S. Giuliano em<br />
Veneza em 1959. Este projeto incluía a<br />
recreação, numa versão moderna, na frente<br />
da lagoa, de três momentos particularmente<br />
significativos da história urbana de Veneza.<br />
Muratori tinha já aplicado este método de<br />
planeamento por fases (Cataldi, 1998), de<br />
forma menos explícita, nos conjuntos<br />
habitacionais do INA nos planos de<br />
expansão urbana em Magliana, em Roma.<br />
Entretanto, o ensino de Muratori, que se<br />
tinha distanciado de forma radical das<br />
tendências em voga, foi contestado por<br />
movimentos de jovens estudantes e por<br />
colegas do corpo docente de Roma, que<br />
acharam prudente afastarem-se de uma<br />
pessoa incómoda, totalmente comprometida<br />
com uma refundação da arquitetura e que,<br />
como tal, não apoiaria os formalismos e<br />
tecnicismos do movimento moderno. No<br />
final, o trabalho, a controvérsia e as
28 Saverio Muratori e a escola Italiana de tipologia projetual<br />
contendas produziram em Muratori um<br />
sentido crescente de isolamento, que<br />
coincidiu com o seu desejo de concentrar as<br />
suas reflexões filosóficas em temas mais<br />
abrangentes, fora do campo disciplinar<br />
específico da arquitetura. Civilità e territorio<br />
constitui o culminar de um percurso<br />
reflexivo que começou em 1962 com<br />
Architettura e civilità in crisi (Muratori,<br />
1963, 1967): ambos os títulos são indicativos<br />
das suas preocupações intelectuais. No<br />
primeiro, assume-se que a crise arquitetónica<br />
é expressão de uma crise mais abrangente. O<br />
segundo livro analisa os processos de autoconsciência.<br />
Para Muratori, a única forma de<br />
resolver a crise consistia na capacidade dos<br />
seres humanos estabelecerem, a uma escala<br />
global, uma relação equilibrada com os<br />
‘seus’ territórios.<br />
Muratori morreu em 1973 num momento<br />
de grande fervor intelectual, rodeado de<br />
alguns estudantes e colegas, incluindo Enzo<br />
Flamini, que teve a oportunidade de<br />
assimilar os últimos aspetos problemáticos<br />
do seu pensamento. Os projetos Atlante<br />
territoriale e Tabelloni, que pretendiam ser<br />
uma espécie de classificação lógica universal<br />
das estruturas construídas pelo homem,<br />
ficaram por concluir (Cataldi, 1984).<br />
Nos últimos anos, consciente do pouco<br />
tempo que lhe restava e da dificuldade em<br />
expressar as suas ideias, Muratori adquiriu o<br />
hábito de gravar os seus discursos e as suas<br />
aulas, que preparava utilizando diagramas e<br />
cartas sinópticas. Este é o tema das<br />
transcrições de Guido Marinucci (1924-<br />
2000) que, com uma profunda dedicação e<br />
uma paciência inesgotável, se dedicou ao<br />
trabalho do mestre nas décadas<br />
subsequentes. Em larga medida, Marinucci<br />
foi o responsável pelos dois volumes de<br />
trabalho póstumo centrado na metodologia<br />
do sistema realidade / auto-consciência, que<br />
constitui a última evidência escrita do<br />
pensamento de Muratori (Muratori, 1976,<br />
1978). Um homem culto com inúmeros<br />
interesses, um grande arquiteto com instinto<br />
para os problemas das formas; Marinucci<br />
ficou tão impressionado pelo seu encontro<br />
com Muratori que decidiu ser o curador e o<br />
promotor das suas ideias. Juntamente com os<br />
Bollati, Marinucci deu um importante<br />
contributo para a preparação do livro sobre<br />
Roma, que ele bem conhecia e amava.<br />
A escola Romana de Saverio Muratori<br />
A revolução no ensino iniciada por Saverio<br />
Muratori resultou numa reforma intelectual,<br />
ao invés de uma reforma cultural, para os<br />
seus assistentes que chegavam com<br />
diferentes experiências de aprendizagem. Ao<br />
longo dos anos, desenvolveu com eles um<br />
seminário, com a participação de alguns<br />
alunos mais interessados, no qual cada<br />
assistente era responsável por um conjunto<br />
de temas. Mais tarde, essa experiência<br />
conduziu aos cursos livres de 1965-66<br />
desenvolvidos sob sua orientação (Muratori,<br />
1967). Estes cursos constituíram uma<br />
tentativa de criar um curriculum para uma<br />
nova faculdade de arquitetura, altamente<br />
integrada, no que se refere às componentes<br />
de ensino. Esta tentativa entrou em conflito<br />
aberto com as propostas inovadoras para os<br />
estudos arquitetónicos, introduzidas alguns<br />
anos antes por Bruno Zevi, para quem<br />
Muratori era um académico e um<br />
tradicionalista. Atacado publicamente,<br />
Muratori reagiu através do famoso Discorso<br />
del Roxi (Cataldi, 1984), no qual reafirmou a<br />
sua posição e convidou para os seus cursos,<br />
aqueles que no movimento estudantil não<br />
partilhavam o extremismo de Zevi. Este<br />
processo deu lugar à formação de um grupo<br />
de estudantes altamente motivados, que<br />
promoveram uma campanha, na faculdade, a<br />
favor de Muratori. Muratori decidiu aceder<br />
aos seus pedidos e organizou cursos de<br />
planeamento não-institucionais. O fracasso<br />
dessas iniciativas, devido à oposição da<br />
faculdade e ao levantamento dos estudantes<br />
em 1968, provocou em Muratori um sentido<br />
de isolamento e introversão que atravessou<br />
as aulas dos seus últimos anos (que foram<br />
publicadas a título póstumo por Marinucci).<br />
Entretanto, um conjunto de assistentes de<br />
Muratori começou a desenvolver os seus<br />
próprios programas de investigação sobre<br />
tecidos, organismos urbanos e território.<br />
Enquanto Marinucci e os Bollati ajudaram<br />
Muratori com o seu livro sobre Roma,<br />
Caniggia publicou Como: lettura di una città<br />
em 1963, ao mesmo tempo que publicava<br />
Esperienze operative sul tessuto urbano di<br />
Roma com S. Bollati, G. Marinucci e A.<br />
Giannini (Bollati et al., 1963; Caniggia,<br />
1963). Estes livros foram seguidos pelo<br />
ensaio do jovem bolseiro Paolo Vaccaro
Saverio Muratori e a escola Italiana de tipologia projetual 29<br />
sobre Tipo e tissuto edilizio a Roma<br />
(Vaccaro, 1968).<br />
Para um grupo considerável de<br />
assistentes, a primeira oportunidade para<br />
colocar em prática o método tipológico<br />
surgiu na Etiópia em 1964, com a<br />
necessidade de planear 22 cidades (Bollati et<br />
al., 1968). Neste caso, a interpretação dos<br />
processos de formação territorial Etíope<br />
forneceu a chave conceptual para formular<br />
os diferentes planos de cidades. Estes foram<br />
condensados numa única carta sinóptica: um<br />
procedimento clássico de Muratori.<br />
Alessandro Giannini deixou-nos um<br />
conjunto de artigos que constituem um<br />
registo escrito destas experiências, com uma<br />
grande importância quer a nível científico<br />
quer como registo histórico de um mundo<br />
pós-colonial em desaparecimento.<br />
A dispersão a partir de Roma<br />
A morte de Muratori privou os seus<br />
assistentes não só de uma referência<br />
essencial para o seu desenvolvimento<br />
intelectual como também de um conjunto de<br />
oportunidades de carreira na Universidade de<br />
Roma, onde foram ostracizados pelo restante<br />
corpo docente. No entanto, as reformas nos<br />
estudos arquitetónicos de 1970, que criaram<br />
novas faculdades, ofereceram-lhes novas<br />
oportunidades, sendo de destacar o apoio<br />
fundamental de Luigi Vagnetti.<br />
Praticamente um contemporâneo de<br />
Muratori, Luigi Vagnetti (1915-80)<br />
distinguiu-se como um dos mais brilhantes<br />
alunos de Arnaldo Foschini, tornando-se seu<br />
assistente após a conclusão do curso<br />
(Cataldi, 1982b; Cataldi e Rossi, 2000). A<br />
sua relação com Muratori intensificou-se<br />
durante o período do pós-guerra na<br />
sequência de concursos e de trabalhos<br />
desenvolvidos em equipa, testemunhando o<br />
interesse que Vagnetti partilhava com<br />
Muratori por uma arquitetura<br />
contextualizada. Quando Muratori substituiu<br />
Foschini na docência, Vagnetti, que<br />
permaneceu alguns anos como assistente em<br />
Roma antes de se tornar professor<br />
catedrático em Palermo em 1962, teve a<br />
oportunidade de conhecer o seu pensamento<br />
e, em simultâneo, de apreciar o trabalho dos<br />
seus assistentes.<br />
Como presidente da comissão científica<br />
da nova Faculdade de Reggio Calabria,<br />
Vagnetti convidou Paolo Maretto e<br />
Gianfranco Caniggia para assistentes (sendo<br />
que o primeiro, em alguns aspetos, se tinha<br />
tornado mais independente do mestre). Mais<br />
tarde, em Génova e Florença, Vagnetti<br />
confirmou o seu papel ‘histórico’ enquanto<br />
promotor da escola Muratoriana,<br />
promovendo a contratação de Giannini, dos<br />
Bollati e de Vaccaro. Grupos de assistentes<br />
formados em Reggio Calabria, Génova e<br />
Florença, reviviam assim, na sua prática<br />
pedagógica, o método de trabalho<br />
apreendido em Roma com Muratori.<br />
Enquanto estudante, Paolo Maretto<br />
(1931-98) colaborou com Muratori em<br />
Veneza, estudando a cidade lagunar<br />
enquanto se formava. O seu último livro, La<br />
casa veneziana nella storia della città,<br />
publicado em 1986, concluiu um ciclo de<br />
investigação apaixonada, cujo ponto de<br />
partida tinha sido L’ edilizia gótica<br />
veneziana. Maretto também publicou livros<br />
sobre as cidades e o território do sul da<br />
Calábria e sobre o centro histórico de<br />
Génova (Cataldi, 1975; Maretto, 1975;<br />
Maretto et al., 1978). Os seus textos teóricos<br />
fundamentais (Maretto, 1971, 1973, 1980)<br />
expressam o desejo de organizar o estudo<br />
tipológico de acordo com as quatro escalas<br />
interrelacionadas fundamentais do contexto<br />
humano. Maretto também mostrou um<br />
grande interesse pela experimentação de<br />
linguagens arquitectónicas, evidente no<br />
complexo paroquial de Sarmeola na<br />
província de Pádua.<br />
Desde o início, Renato e Sergio Bollati<br />
(ambos nascidos em Atlanta, EUA, em<br />
1929), que foram formados na escola de<br />
Roma nos anos 50, demostraram uma<br />
marcada inclinação para a prática<br />
profissional de arquitetura. Juntamente com<br />
Guido Marinucci foram os mais fiéis<br />
assistentes do mestre. Sob a orientação de<br />
Muratori participaram na preparação do livro<br />
sobre Roma, do incompleto Atlas territorial,<br />
dos planos para Magliana e para a Barene<br />
veneziana, e dos edifícios religiosos e da<br />
Câmara dos Deputados em Roma.<br />
Contactados por Vagnetti para a Reggio<br />
Calabria, foi aqui que desenvolveram a sua<br />
experiência pedagógica, com investigação<br />
abrangente sobre numerosos tecidos e
30 Saverio Muratori e a escola Italiana de tipologia projetual<br />
cidades na Calábria e na Sicília. Esta<br />
investigação fundamental é praticamente<br />
desconhecida devido à relutância dos Bollati<br />
em expô-la fora dos círculos académicos<br />
(Bollati R, 1976; Bollati S, 1976; Bollati R,<br />
1980; Bollati S, 1980; Bollati et al., 1990).<br />
Os seus projetos mostram como Muratori os<br />
influenciou no sentido da criação de soluções<br />
orgânicas e contextuais (Cataldi, 1991a).<br />
Sandro Giannini (nascido em 1929) tem<br />
um percurso de vida complementar ao dos<br />
Bollati, com quem partilha a autoria do<br />
Tabellone, um exemplo gráfico do trabalho<br />
de Muratori (Bollati et al., 1978). Giannini<br />
foi o primeiro assistente a seguir o mestre no<br />
desenvolvimento de estudos territoriais de<br />
larga escala; primeiro em Reggio e depois<br />
em Génova, tendo começado com os artigos<br />
mencionados acima sobre a Etiópia,<br />
desenvolvendo depois estudos fundamentais<br />
sobre a Ligúria (Giannini e Ghelfi, 1980,<br />
1981). Participou também na interpretação<br />
dos tipos e tecidos de Ostia Antica e<br />
realizou, de forma sistemática, uma<br />
comparação entre arquitetura, música e<br />
filosofia (Giannini, 1983). Giannini revisitou<br />
o pensamento de Muratori (Giannini, 1983)<br />
de um modo original, redefinindo e<br />
atualizando os termos fundamentais do<br />
léxico do mestre (Giannini, 1979, 1993). Nos<br />
seus últimos anos, desenvolveu uma<br />
metodologia específica para interpretação<br />
territorial com ênfase especial nas periferias<br />
das cidades, focando a sua atenção nos<br />
‘espaços vazios’, por oposição aos ‘espaços<br />
construídos’ (Giannini, 1995).<br />
Gianfranco Caniggia<br />
Desde os seus dias como estudante<br />
universitário, Gianfranco Caniggia (1932-87)<br />
teve um percurso brilhante. Seguiu o<br />
percurso do seu pai, Emanuele, que desde<br />
cedo o envolveu em importantes projetos,<br />
incluindo o complexo Trinità dei Pellegrini<br />
em Roma, construído em três fases<br />
sequenciais, o que demonstra a progressiva<br />
aquisição por Caniggia dos temas de<br />
planeamento de Muratori. Convidado por<br />
Muratori para o seu grupo de assistentes,<br />
Caniggia aplicou o método de interpretação<br />
nos estudos sobre Como, uma cidade<br />
planeada de origem Romana. A interpretação<br />
do processo de desenvolvimento urbano,<br />
através de um método de síntese tipológica<br />
que avança e recua no tempo, permitiu-lhe<br />
compreender, perante as casas em banda<br />
Romanas, a persistência da domus como um<br />
tipo de substrato. Esta foi uma intuição<br />
fundamental que abriu uma linha de<br />
investigação sobre os processos de formação<br />
das casas-pátio medievais nas cidades<br />
históricas Europeias (Caniggia, 1976).<br />
Como os outros assistentes de Muratori,<br />
também Caniggia foi obrigado, pela diáspora<br />
de Roma, a ensinar em Reggio e depois em<br />
Génova e em Florença. Nas duas últimas<br />
cidades, construiu, nos cursos de<br />
planeamento, uma linha de investigação em<br />
que desenvolve a metodologia de<br />
interpretação das cidades e as suas<br />
componentes. Caniggia foi progressivamente<br />
estabilizando uma sólida experiência<br />
pedagógica que viria a dar corpo a<br />
Composizione architettonica e tipologia<br />
edilizia, estruturado em quatro volumes. Os<br />
dois primeiros, publicados com o importante<br />
contributo de Gian Luigi Maffei, centram-se<br />
na interpretação do ‘edificado básico’<br />
(Caniggia e Maffei, 1979, 1984): concebidos<br />
como um manual, foram utilizados em<br />
muitos cursos de arquitetura, tendo sido<br />
traduzidos para Espanhol, Francês e Inglês<br />
(Caniggia e Maffei, 1995; 2000; 2001). Os<br />
volumes sobre a interpretação e o desenho<br />
dos edifícios de exceção encontravam-se<br />
numa versão provisória quando Caniggia<br />
morreu.<br />
A preocupação fundamental de Caniggia<br />
era transmitir as ideias de Muratori em<br />
termos arquitetónicos, partindo da convicção<br />
que a sua difusão era, de algum modo,<br />
impedida pelas dificuldades de compreensão<br />
do pensamento de Muratori. Como tal,<br />
Caniggia procurou simplificar e reduzir o seu<br />
sistema teórico, sublinhando os aspetos<br />
operativos mais diretos. Neste sentido, o<br />
significado fundamental deste contributo<br />
consiste na utilização e na importância dada,<br />
nos seus textos, aos termos e conceitos de<br />
‘tipo’, ‘tecido construído’ e, acima de tudo,<br />
‘edificado básico’, entendido como a matriz<br />
formativa dos edifícios especializados. Não<br />
era por acaso que Caniggia utilizava esta<br />
última expressão ao invés de ‘arquitetura’,<br />
contestando abertamente a visão de Zevi de<br />
edifícios de arquitetura como invenções ou
Saverio Muratori e a escola Italiana de tipologia projetual 31<br />
fenómenos irrepetíveis.<br />
O plano do tribunal de Teramo (1971-75)<br />
foi claramente influenciado por temas que<br />
Caniggia desenvolveu durante os cursos de<br />
Muratori. O seu período de observância mais<br />
próxima de Muratori inclui os planos da<br />
Câmara de Deputados e das igrejas em<br />
Roma.<br />
Depois da morte do mestre, Caniggia<br />
seguiu o seu próprio caminho, colocando em<br />
prática no bairro Quino, em Génova (Figura<br />
4), aquilo que tinha aprendido sobre as<br />
peculiares características do ambiente urbano<br />
Genovês (Caniggia e Maffei, 1984).<br />
Durante os anos 80, Caniggia e os seus<br />
colegas participaram em importantes<br />
concursos nacionais. As estações ferroviárias<br />
de Pescara e Bolonha, a área de Murate em<br />
Florença, a expansão edificada da Giudecca<br />
em Veneza e os ‘vazios’ em Roma (Caniggia<br />
et al., 1984; Maffei, 1988; Regazzoni<br />
Caniggia, 1988) constituem passos de um<br />
único e consistente processo de planeamento,<br />
que pretende demonstrar a sua convicção de<br />
que a única forma verdadeiramente<br />
inovadora de planear as cidades consiste na<br />
sua interpretação de acordo com a história,<br />
evitando soluções extemporâneas ligadas a<br />
invenções individuais injustificadas.<br />
O contínuo diálogo com Caniggia<br />
estimulou Adelaide Reggazoni Caniggia a<br />
aplicar o seu método a elementos móveis que<br />
contribuem para a definição qualitativa e<br />
dimensional dos espaços interiores. O seu<br />
livro Profilo di tipologia dell’ arredo, em<br />
combinação com outros estudos, representa<br />
um importante contributo para o<br />
conhecimento da decoração interior<br />
(Reggazioni Caniggia, 1977). Esta escala<br />
interior surge na classificação de estruturas<br />
construídas pelo homem de Muratori (e<br />
também nas versões dos Bollati e de<br />
Giannini) como a primeira das escalas<br />
construídas.<br />
Após a morte prematura de Caniggia, os<br />
seus inúmeros e inacabados estudos foram<br />
integrados e publicados por Gian Luigi<br />
Maffei, seu pupilo e amigo. Nesta ligação, os<br />
livros de Maffei sobre as casas Romanas e<br />
Florentinas têm um particular significado. A<br />
abordagem metodológica e os conteúdos<br />
referem-se explicitamente a Caniggia<br />
(Maffei, 1990a, 1990b, 1999) cujos últimos<br />
textos – que na sua maioria não foram<br />
publicados – foram recolhidos por Maffei no<br />
volume póstumo Ragionamenti di tipologia<br />
(Caniggia, 1997).<br />
A atual escola<br />
Existe atualmente uma geração de seguidores<br />
da obra de Muratori que não o conheceram<br />
diretamente. Estão presentes em diferentes<br />
universidades Italianas, nomeadamente em<br />
Reggio Calabria, Génova, Florença, Roma e,<br />
mais recentemente, em novas faculdades de<br />
arquitetura como Ferrara, Cesana e Bari.<br />
O grupo de Florença tem sido,<br />
indubitavelmente, o mais ativo e o centro<br />
académico de referência para a escola, desde<br />
a morte de Caniggia. Para os seus membros,<br />
a primeira ocasião para uma colaboração<br />
reciproca foi fornecida pela exposição de<br />
1987 Cortona, struttura e storia coordenada<br />
por Paolo Vaccaro, e que teve Giancarlo<br />
Cataldi e Enrico Lavagnino como<br />
responsáveis pela interpretação territorial, e<br />
Gian Luigi Maffei e Vaccaro como<br />
responsáveis pela interpretação urbana e do<br />
edificado (Vaccaro et al., 1987). Foi uma<br />
oportunidade fundamental para o<br />
desenvolvimento de discussões<br />
metodológicas e para a comparação e o<br />
intercâmbio interdisciplinar com arqueólogos<br />
e historiadores, particularmente para<br />
verificar e examinar, na cidade Etrusca, as<br />
relações, a várias escalas, entre fases<br />
espontâneas e planeadas.<br />
Em simultâneo, Giancarlo Cataldi e os<br />
seus assistentes investigaram o período até<br />
então inexplorado da arquitetura primitiva.<br />
Os resultados foram apresentados num<br />
conjunto de exposições internacionais,<br />
conferências e publicações (Cataldi, 1986,<br />
1988, 1989, 1991b; Cataldi e Farneti, 1989;<br />
Cataldi e Corallo, 1992; Cataldi et al., 1982).<br />
Esta investigação é baseada na hipótese de<br />
classificação geral dos processos tipológicos<br />
(Figura 5).<br />
Em meados dos anos 90, uma outra<br />
investigação em Florença, coordenada por<br />
Gian Luigi Maffei, abordou os edifícios<br />
históricos Toscanos sujeitos a sismos<br />
(Maffei, 1997). O estudo comparativo<br />
envolvendo inúmeros assentamentos,
32 Saverio Muratori e a escola Italiana de tipologia projetual<br />
Figura 4. Parte do bairro Quino, Génova (1982), projetado por G. Caniggia.<br />
Figura 5. Visão geral de um conjunto de tipos habitacionais.<br />
Reproduzido de Cataldi (ed.) (1986).
Saverio Muratori e a escola Italiana de tipologia projetual 33<br />
incluindo cidades de pequena e de média<br />
dimensão, sublinhou, face a uma identidade<br />
cultural comum, o caracter distintivo das<br />
diferentes áreas sub-regionais.<br />
Em 1981 Giancarlo Cataldi, com<br />
Nicholas Adams, Lero Di Cristina, Fausto<br />
Formichi, Laura Marcucci e Henry Millon,<br />
fundou o CISPUT (Centro Internazionale<br />
per lo Studio dei Processi Urbani e<br />
Territoriali). O propósito fundamental era<br />
fornecer oportunidades para arquitetos e<br />
historiadores de arquitetura se encontrarem e<br />
desenvolverem comparações, verificando,<br />
sob o ponto de vista de diferentes disciplinas,<br />
os resultados do método de Muratori, em<br />
particular em relação a Pienza e ao seu<br />
território (Cataldi, 1978, 1983, 1992).<br />
No décimo aniversário da morte de<br />
Muratori, em 1983, o CISPUT organizou em<br />
Pienza – com o importante contributo dos<br />
seus assistentes – uma exposição e uma<br />
conferência sobre o pensamento e o trabalho<br />
do mestre (Cataldi, 1984). A esta seguiramse<br />
outras conferências internacionais sobre<br />
edifícios e cidades (Cataldi, 1985). Desde<br />
1993, as conferências do CISPUT têm-se<br />
realizado com uma periodicidade anual,<br />
criando oportunidades fundamentais para o<br />
debate no interior da escola.<br />
Depois de Pienza, a exposição sobre<br />
Muratori deslocou-se para outras cidades<br />
Italianas: Reggio Calabria, Génova, Modena<br />
e Bolonha; e depois para o Instituto<br />
Politécnico de Zurique (através do convite de<br />
Sylvain Malfroy), para a Escola de<br />
Estrasburgo (através do convite de Pier<br />
Giorgio Gerosa) e para alguns colégios e<br />
universidades nos Estados Unidos (por<br />
iniciativa de Nicholas Adams). Durante os<br />
anos 80, Caniggia foi convidado por Malfroy<br />
e Anne Vernez Moudon para lecionar em<br />
Lausanne e Seattle.<br />
Nos anos 90, era chegado o momento de<br />
um encontro internacional de grupos e<br />
escolas centradas nas cidades e nos seus<br />
processos de transformação. O primeiro<br />
destes encontros realizou-se em Lausanne<br />
em 1994. Entre os presentes estavam Gian<br />
Luigi Maffei, Sylvain Malfroy, Bruno<br />
Marchand, Paulo Maretto, Anne Vernez<br />
Moudon e Jeremy Whitehand. Este encontro<br />
conduziu à fundação do ISUF. Durante a<br />
segunda metade dos anos 90, os pontos de<br />
vista teóricos e metodológicos das escolas<br />
Francesa, Inglesa e Italiana emergiram de<br />
forma cada vez mais clara. Depois da<br />
conferência de Birmingham, em 1997, o<br />
ISUF tornou-se no principal ponto de<br />
referência internacional para os estudos de<br />
forma urbana, suportado pela Urban<br />
Morphology, que rapidamente se tornou num<br />
eficaz instrumento de difusão, debate e<br />
comparação.<br />
Para a nossa escola, a conferência em<br />
Florença em 1999 (Corona e Maffei, 1999)<br />
representou um importante reconhecimento<br />
que fortaleceu a nossa vontade de trabalhar<br />
em equipa. A este nível, a construção do<br />
nosso Léxico, sob os auspícios do ISUF, é<br />
particularmente importante. Este trabalho<br />
procura dar resposta à necessidade de<br />
clarificar o uso e o significado de diferentes<br />
termos em diferentes línguas. Com este<br />
propósito realizou-se um conjunto de<br />
seminários (em Florença, no Dipartimento di<br />
Projettazione dell’Architettura, e em<br />
Anghiai e Chioggis – 12ª e 13ª conferências<br />
do CISPUT). Um importante contributo<br />
epistemológico foi dado por Pier Giorgio<br />
Cerosa e Pierre Larochelle. Nos seminários<br />
desenvolveu-se o debate e a comparação<br />
com base num léxico pormenorizado de<br />
‘fragmentos’ das principais definições<br />
utilizadas por Muratori. Uma simplificação e<br />
uma redefinição crítica e funcional dos<br />
termos deverá ser a base para o futuro léxico,<br />
que pretendemos traduzir para Inglês,<br />
Francês e Espanhol.<br />
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territorio (Editrice Grafica l’Etruria, Cortona).
36 Saverio Muratori e a escola Italiana de tipologia projetual<br />
Tradução do título, resumo e palavras-chave<br />
Abstract. This paper outlines the development of the Muratorian school of urban morphology and<br />
building typology. Starting from Muratori’s experience as a talented architect, deeply rooted in the<br />
Roman interpretation of Italian rationalism, the authors describe the growth of Muratori’ s interest in<br />
history as a means of recovering a sense of continuity in architectural practice. Adopting a theoretical<br />
approach grounded in architecture and urban design, he started working on a critical framework which<br />
could explain the creation and transformation of urban form over the centuries. He had many followers.<br />
The resurgence of interest in Muratori’s work in the 1990s is described.<br />
Tradução<br />
Key Words: Muratori, Caniggia, history, processual typology, Italy<br />
Este texto foi traduzido por Vítor Oliveira, que agradece a Giancarlo Cataldi a disponibilidade<br />
permanente para esclarecer todas as questões relacionadas com este processo.<br />
Chinese Network of Urban Morphology<br />
Durante o processo de urbanização sem<br />
precedentes que tem vindo a ocorrer na China<br />
desde os anos 90, novas questões teóricas e<br />
práticas foram sendo levantadas.<br />
Perante este cenário, a morfologia urbana,<br />
enquanto ciência da forma urbana, parece<br />
fornecer não só o enquadramento teórico como<br />
também um conjunto de ferramentas para<br />
abordar estas questões.<br />
Ao longo dos últimos anos foram-se<br />
estabelecendo, nas principais universidades<br />
Chinesas, grupos de investigação com um<br />
trabalho relevante na área da forma urbana. A<br />
Chinese Network of Urban Morphology foi<br />
recentemente estabelecida (o seminário<br />
inaugural decorreu na Nanjing University em<br />
Outubro de 2013) com o propósito fundamental<br />
de fornecer uma plataforma para incentivar, e<br />
cristalizar, interesses de investigação e práticas<br />
de comunicação. Os fundadores institucionais<br />
da rede são a Nanjing University, a South China<br />
University of Technology, a Southeast<br />
University, a Peking University, a Tongji<br />
University e, ainda, a Xi’an University of<br />
Architecture and Technology.<br />
A partir destas contribuições individuais e<br />
institucionais foram acordados três requisitos<br />
que deverão sustentar o caminho a percorrer<br />
num futuro próximo pela Chinese Network of<br />
Urban Morphology: i) existe uma necessidade<br />
crucial de estabelecer a morfologia urbana<br />
como uma teoria nuclear de suporte à prática de<br />
desenho urbano; ii) os resultados da<br />
investigação em morfologia urbana deverão ser<br />
utilizados na prática profissional de um modo<br />
mais eficaz; e, finalmente, iii) para lançar um<br />
conjunto de solidas fundações neste domínio do<br />
conhecimento é essencial construir uma<br />
terminologia integradora e uma metodologia de<br />
morfologia urbana que tenha em conta o fórum<br />
internacional, diverso e multilinguístico, no<br />
qual a teoria e a prática morfológica têm vindo<br />
a funcionar.<br />
Foram ainda definidos três objetivos<br />
fundamentais para a Chinese Network of Urban<br />
Morphology: i) a promoção do estudo da forma<br />
urbana na China; ii) o desenvolvimento de uma<br />
rede de investigação ‘dentro’ e ‘fora’ da China<br />
sobre a morfologia urbana chinesa, através da<br />
organização de seminários e da publicação de<br />
uma newsletter; e ainda iii) o fortalecimento das<br />
relações com o International Seminar on Urban<br />
Form (ISUF), e com as suas redes nacionais e<br />
regionais, através da colaboração nas suas<br />
diferentes iniciativas.<br />
Wowo Ding, School of Architecture and Urban<br />
Planning, Nanjing University, Hankou Road 22,<br />
Nanjing 210093, China. E-mail:<br />
dww@nju.edu.cn
PERSPETIVAS<br />
Debate sobre temas fundamentais<br />
em morfologia urbana<br />
As origens da morfologia urbana e a geografia alemã<br />
Vítor Oliveira, CITTA – Centro de Investigação do Território, Transportes e<br />
Ambiente, Faculdade de Engenharia, Universidade do Porto, Rua Roberto Frias 4200-<br />
465 Porto, Portugal. E-mail: vitorm@fe.up.pt. Cláudia Monteiro CM Arquiteta, Rua<br />
Santos Pousada 1185-1ºEsq, Porto, Portugal. E-mail:aclaudiamonteiro@inbox.com<br />
O termo ‘morfologia’ foi inicialmente proposto,<br />
na viragem do século XVIII para o século XIX,<br />
por Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832), o<br />
famoso escritor e pensador alemão que dedicou<br />
uma parte do seu trabalho à biologia. Goethe<br />
utilizou a expressão morfologia para designar a<br />
‘ciência que lida com a essência das formas’.<br />
Apesar da expressão morfologia ter sido<br />
proposta como um ramo da biologia, o seu<br />
sentido mais geral e abstrato permitiu-lhe ser<br />
aplicada muito para além da ciência dos seres<br />
vivos. Um século mais tarde esta aplicação adotou<br />
as áreas urbanas como objeto de estudo. Na<br />
viragem para o século XX e durante as primeiras<br />
décadas desse século, surgem os primeiros<br />
estudos em morfologia urbana desenvolvidos,<br />
essencialmente, por geógrafos Alemães. Em<br />
meados do século XX a história da morfologia<br />
urbana, enquanto área do conhecimento, passará<br />
inevitavelmente pelos trabalhos de um conjunto<br />
de arquitetos em Itália e geógrafos em Inglaterra –<br />
em particular Saverio Muratori e M. R. G.<br />
Conzen – e nas últimas décadas do século por<br />
uma nova abordagem, inicialmente desenvolvida<br />
por arquitetos ingleses – a sintaxe espacial.<br />
Esta ‘perspetiva’ centra-se no contributo<br />
pioneiro dos geógrafos alemães para o campo da<br />
morfologia urbana. A perceção rigorosa desse<br />
contributo é dificultada pela língua em que os<br />
mesmos são escritos. Esse constrangimento levou<br />
a que este texto se construísse fundamentalmente<br />
a partir da leitura de um vasto conjunto de fontes<br />
secundárias, das quais se destacam dois artigos de<br />
revisão deste período publicados na revista Urban<br />
Morphology, Hofmeister (2004) e Heineberg<br />
(2007), bem como o artigo de Whitehand sobre a<br />
tradição Conzeniana, cuja tradução para<br />
Português se incluiu no último número da<br />
‘Revista de Morfologia Urbana’ (Whitehand,<br />
2013).<br />
A geografia humana alemã da última década<br />
do século XIX é marcada por duas obras<br />
fundamentais (Tabela 1). Em 1894, o historiador<br />
(e esta é a única exceção disciplinar num contexto<br />
dominado por geógrafos) Johannes Fritz publica<br />
Deutsche Stadtanlagen, um estudo comparativo<br />
sobre mais de 300 cidades alemãs. A inovação<br />
fundamental deste estudo é a utilização do ‘plano’<br />
da cidade e da cartografia como fonte de<br />
informação primordial para a história urbana, algo<br />
que até então não acontecia. Um dos resultados<br />
do estudo é a proposta de uma classificação de<br />
cidades baseada precisamente no tipo de plano.<br />
Cinco anos mais tarde, e claramente influenciado<br />
pelo texto de Fritz, Otto Schlüter publica Über<br />
den Grundriβ der Städte. Este artigo fundamental<br />
desenvolve a linha de investigação sobre o plano<br />
da cidade iniciado por Fritz, incluindo a<br />
identificação das diferentes partes ou zonas que<br />
constituem o centro da cidade. Whitehand (2007)<br />
Revista de Morfologia Urbana (2014) 2(1) 37-46 Rede Portuguesa de Morfologia Urbana ISSN 2182-7214
38 Perspetivas<br />
Tabela 1. Geografia humana Alemã 1890-1929<br />
Década<br />
Ano de<br />
publicação<br />
Autor (Instituição<br />
de ensino)<br />
Estudos sobre cidades<br />
1890-99 1894 Johannes Fritz<br />
(Estrasburgo)<br />
1899 Otto Schlüter<br />
(Halle)<br />
1900-09 1903 Friedrich Ratzel<br />
(Leipzig)<br />
1910-19 1916 Hugo Hassinger<br />
(Viena)<br />
1918 Walter Geisler<br />
(Halle)<br />
1920-29 1924 Walter Geisler<br />
(Halle)<br />
1925 Hans Dörries<br />
(Goettingen)<br />
1927 Hans Bobek<br />
(Viena)<br />
1928 Rudolf Martiny<br />
-<br />
1930-39 1932 M. R. G. Conzen<br />
(Berlim)<br />
1936 Herbert Louis<br />
(Berlim)<br />
Deutsche Stadtanlagen<br />
Cidades Alemãs<br />
Über den Grundriβ der Städte<br />
Sobre a estrutura das cidades<br />
Die Geographische Lage der groβen Städte<br />
A localização geográfica das grandes cidades<br />
Kunsthistorischer Atlas von Wien<br />
Atlas histórico-artístico de Viena<br />
Danzig: ein siedlungsgeographischer Versuch<br />
Danzig: um ensaio sobre a geografia do assentamento<br />
Die Deutsche Stadt: ein Beitrage zur Morphologie der Kulturlandschaft<br />
A cidade Alemã: um contributo para a morfologia da paisagem cultural<br />
Die Städte im oberen Leinetal,Göttingen, Northeim und Einbeck<br />
As cidades de Leinetal, Goettingen, Northeim e Einbeck<br />
Grundfragen der stadtgeographie<br />
Questões básicas em geografia urbana<br />
Die Grundriβgestaltung der deutschen Siedlungen<br />
A estrutura dos assentamentos Alemães<br />
Die Havelstädte<br />
As cidades do Havel<br />
Die geographische Gliederung von Gross-Berlin<br />
A estrutura geográfica da Grande Berlim<br />
sustenta que este trabalho foi pioneiro daquilo<br />
que, anos mais tarde, se viria a designar por<br />
‘abordagem morfogenética’. Um outro aspeto<br />
importante no trabalho deste geografo é a<br />
convicção de que o estudo da cidade passa<br />
necessariamente pelo estudo da paisagem mais<br />
abrangente onde ela se insere.<br />
Na primeira década do século XX, Die<br />
Geographische Lage der groβen Städte de<br />
Friedrich Ratzel continua a linha de investigação<br />
iniciada no final do século XIX. Um dos<br />
principais contributos deste texto de 1903, é o<br />
facto de se centrar não só na localização das<br />
cidades, mas nos motivos e nas características que<br />
levam à escolha do local original para a fundação<br />
dos assentamentos humanos.<br />
Na década seguinte surgem dois textos em que<br />
se pretende ir para além do estudo de localização<br />
e das questões genéticas. Cada um dos textos<br />
estuda em detalhe uma única cidade, Viena e<br />
Danzig (a atual cidade de Gdańsk). Em 1916,<br />
Hugo Hassinger publica um atlas históricoartístico<br />
de Viena. Neste livro, o geógrafo<br />
identifica na planta da cidade de Viena, os estilos<br />
arquitetónicos e a idade dos edifícios, recorrendo<br />
para isso à utilização da cor. O resultado desta<br />
análise é um conjunto de plantas que constitui um<br />
elemento fundamental para a conservação do<br />
património edificado de Viena. Como os seus<br />
colegas, Hassinger sustenta que uma planta podia<br />
mostrar toda uma série de aspetos que um texto,<br />
uma tabela ou um diagrama, não podiam. Dois<br />
anos mais tarde, um antigo aluno de Schlüter<br />
Walter Geisler, publica um dos textos mais<br />
importantes deste período (Geisler, 1918).<br />
Paradoxalmente, Geisler faz referência ao<br />
trabalho de todos os autores descritos acima, à<br />
exceção de Hassinger. O livro sobre Danzig<br />
estrutura-se em duas partes fundamentais,<br />
divididas em dezassete capítulos: a primeira<br />
aborda as condições físico-geográficas,<br />
demográficas e económicas de Danzig; a segunda<br />
parte centra-se na estrutura e na organização<br />
espacial da cidade. Para além de um vasto<br />
conjunto de quadros e fotografias de Danzig, o<br />
livro contem uma inovação fundamental, para a<br />
época em que foi preparado, uma série de plantas<br />
desenhadas pelo autor incluindo a identificação<br />
dos usos do solo e do edificado, e do número de<br />
pisos dos edifícios residenciais na área central da
Perspetivas 39<br />
Figura 1. Planta da área central de Danzig.<br />
Fonte: Geisler (1918) Danzig: ein siedlungsgeographischer Versuch.<br />
cidade (Figura 1).<br />
Em 1924, Geisler publica um novo e influente<br />
livro, desta vez sobre as cidades Alemãs, Die<br />
Deutsche Stadt. Neste texto propõe uma<br />
classificação dessas cidades com base nos sítios<br />
escolhidos para a sua fundação, no plano térreo e<br />
nos tipos de edificado. Em 1925, Hans Dörries<br />
retoma a linha desenvolvida por Hassinger e<br />
Geisler na década anterior, identificando no plano<br />
de um conjunto de cidades históricas a idade dos<br />
seus edifícios e os seus estilos arquitetónicos. Em<br />
1928, e após um conjunto de estudos preliminares<br />
sobre cidades da região de Vestfália, Rudolf<br />
Martiny publica um texto sobre a estrutura dos<br />
assentamentos alemães. Do mesmo modo que<br />
Geisler, quatro anos antes, Martiny procura<br />
definir um conjunto de elementos generalizáveis<br />
sobre as cidades Alemãs. Quase em simultâneo,<br />
Hans Bobek publica um artigo sobre questões<br />
básicas em geografia urbana. Segundo Hofmeister<br />
(2004), este artigo lança as bases para uma<br />
mudança de direção numa das linhas dominantes<br />
na geografia humana Alemã. De um modo geral,<br />
a partir de então e até às últimas décadas do<br />
século XX, a questão das funções urbanas adquire<br />
um maior peso em detrimento da temática da<br />
forma urbana.<br />
No entanto, na década de 30 são ainda<br />
produzidos dois textos com um papel fundamental<br />
nas origens da morfologia urbana. O primeiro é a<br />
dissertação de M. R. G. Conzen concluída em<br />
1932 (um ano antes do geógrafo emigrar para<br />
Inglaterra), onde é analisado o plano e o tecido<br />
edificado (os dois primeiros elementos da sua<br />
divisão tripartida da paisagem urbana) de doze<br />
cidades localizadas a noroeste de Berlim. Do<br />
mesmo modo que Geisler, Conzen utiliza a cor<br />
para representar o número de pisos e os diferentes<br />
tipos edificatórios existentes nestas cidades. O<br />
segundo é o texto de Herbert Louis (um dos<br />
mentores de Conzen) sobre a estrutura geográfica<br />
da ‘Grande Berlim’. Neste capítulo de livro,<br />
Louis introduz o conceito de Stadtrandzone<br />
(cintura periférica), um elemento de forma urbana
40 Perspetivas<br />
constituído por parcelas com uma grande<br />
variedade ao nível da geometria e das dimensões,<br />
e cuja formação na borda de uma área construída<br />
está associada a um momento de estagnação ou<br />
crescimento lento dessa área e ao modo como,<br />
anos mais tarde, essa mesma área reinicia o<br />
processo de crescimento.<br />
O trabalho dos geógrafos alemães no início do<br />
século XX teve uma importância fundamental<br />
para o estabelecimento da morfologia urbana<br />
como ciência que estuda a forma física das<br />
cidades, bem como os atores e os processos que a<br />
moldam. Este trabalho teve uma forte influência<br />
não só na Alemanha (apesar de tardia) mas<br />
também noutros países. Tendo por base a série de<br />
revisões nacionais publicadas na revista Urban<br />
Morphology, com a designação ‘The study of<br />
urban form in…’, Oliveira (2013) identifica uma<br />
forte influência destes autores na morfologia<br />
urbana na Polónia, Irlanda e Inglaterra. É<br />
justamente em Inglaterra que esta influência<br />
adquire a sua expressão maior, no trabalho de M.<br />
R. G. Conzen. Apesar de a partir da década de 30,<br />
a abordagem morfogenética perder peso na<br />
geografia humana Alemã, ela vai ser retomada<br />
nas décadas seguintes no trabalho que o geógrafo<br />
alemão, então emigrado, desenvolve em<br />
Inglaterra.<br />
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siedlungsgeographischer Versuch (Kafemann,<br />
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Extensões da forma<br />
Anastássios Perdicoúlis, CITTA – Centro de Investigação do Território, Transportes e<br />
Ambiente, Faculdade de Engenharia, Universidade do Porto, Porto, Portugal; ECT –<br />
Escola de Ciências e Tecnologia, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila<br />
Real, Portugal. E-mail: tasso@utad.pt<br />
A forma é – por definição – a parte visível, ou a<br />
configuração da essência. Falando em forma, logo<br />
se pensa em espaço: a forma tem dimensões<br />
físicas, é ‘3D’, e tem que ser visível –<br />
principalmente visível. Mas, ‘se retirassemos o<br />
aspeto visual da forma, como poderíamos<br />
perceber a essência?’ Colocando a questão<br />
especificamente em relação à cidade, como<br />
podemos perceber a essência urbana sem auxílio<br />
visual? Não há melhor maneira de saber do que<br />
fechar mesmo os olhos – ou, por razões de<br />
segurança, fazer uma experiência mental.<br />
Para este propósito, enviaremos um<br />
‘observador’ em missão a uma cidade<br />
desconhecida – num sítio ‘exótico’, num país<br />
distante – para explorar ‘a qualidade invisível da<br />
cidade’: o que seriam os complementos ou<br />
extensões da forma urbana ou, por vezes, os seus<br />
substitutos. Para este tipo de experiência, com<br />
estímulos visuais reduzidos, o observador chega<br />
ao sítio à noite, após uma viagem de avião, e<br />
aponta as suas observações.<br />
‘O primeiro encontro com a cidade é marcado<br />
pelo seu ar quente e húmido. Um vento suave faz<br />
passar um cheiro forte a especiarias. Ao fundo,<br />
ouve-se trânsito rodoviário, imensas buzinadelas,<br />
motores a dois tempos e sente-se um ligeiro<br />
cheiro a óleo queimado’.<br />
Face à ausência de informação visual, os<br />
sentidos de ‘segunda ordem’ como o olfato, a<br />
audição e o tato – neste caso, o con-tato da pele<br />
com a temperatura, a humidade, e o vento –<br />
despertam e tornam-se protagonistas na perceção<br />
do espaço. Existe sentido de orientação (dado, por<br />
exemplo, pelo vento) e de atividade humana<br />
(transmitido, por exemplo, pelo trânsito). Os<br />
cheiros das especiarias despertam a imaginação<br />
ou, até mesmo, o apetite.<br />
‘A dado momento, o sentido do tato fica<br />
muito intenso: o que parecem ser dezenas de<br />
pequenas mãos agarram o meu corpo pelas<br />
pernas, imobilizando-o por completo. Ouvem-se
Perspetivas 41<br />
vozes de crianças – muitas crianças – todas a falar<br />
no mesmo tempo. A interpretação torna-se<br />
absolutamente necessária. Será um assalto? Será<br />
um convite para uma brincadeira? Ou será<br />
simplesmente o ato de pedir esmola em grupo?’<br />
O contato com a cidade aprofunda-se um pouco<br />
mais, tornando-se literalmente em envolvimento.<br />
Cada uma das hipóteses do observador revelaria<br />
situações sociais diferentes. O assalto seria mais<br />
grave, indicando condições de vida muito<br />
degradadas, com violência elevada, uma eventual<br />
motivação de sobrevivência, ou inclusive a<br />
ausência de princípios civilizacionais. O convite<br />
para uma brincadeira poderia ser uma hipótese,<br />
em alguns contextos, mas o observador teria de<br />
ser, ou de ter, algo especial para atrair a atenção<br />
das crianças. O pedido de esmola seria a opção<br />
mais provável, mas o elevado número de pedintes<br />
conferia uma grande intensidade ao ato, tornandoo<br />
relativamente perigoso.<br />
Não intimidado pela surpresa, o observador<br />
continua a exploração noturna da cidade,<br />
confiando no motorista para o conduzir pela<br />
cidade — afinal, de algum modo, tem que<br />
conhecer a forma, ou ‘como a cidade é’.<br />
‘Ouve-se que o trânsito é dominado por<br />
triciclos (motor a dois tempos) cada vez mais<br />
perto. O nosso triciclo entra numa corrida de<br />
trânsito com acelerações bruscas em três<br />
dimensões: no plano horizontal, e no eixo frentetrás,<br />
o motor e os travões provam-se capazes de<br />
provocar emoções fortes. A agilidade dos<br />
veículos provoca movimentos bruscos também no<br />
eixo lateral do plano horizontal. Os buracos na<br />
estrada são responsáveis por uma imensidade de<br />
altos e baixos. O espaço da cidade começa a ser<br />
vivido muito intensamente, em três dimensões<br />
(envolvendo tontura e náusea) mas, curiosamente,<br />
continua a ser um espaço que ainda não foi visto.’<br />
Após uma irresistível tentativa de adivinhar a<br />
forma visível do espaço (as figuras e as cores, o<br />
horizonte, a vegetação, as casas, os espaços<br />
comerciais, as estradas com os triciclos), no dia<br />
seguinte chega uma revelação. Mais uma surpresa<br />
– desta vez à primeira vista – com aquela<br />
sensação familiar de que ‘ver é conhecer’.<br />
‘A forma visível da cidade, no seu exotismo, é<br />
impressionante: edifícios altos e favelas coloridas<br />
na mesma vista; esgotos de águas pluviais a céu<br />
aberto atravessam a cidade; e um mar de triciclos<br />
a saltitar, misturado com um outro mar de pessoas<br />
e de animais – todos a emitirem os seus sons, a<br />
marcar a sua presença e a desenvolverem as suas<br />
atividades.’<br />
A cidade ‘exótica’ parece ter uma forma<br />
precária, face a standards ocidentais. No entanto,<br />
é muito concreta para muitos outros sítios do<br />
mundo (Pinto, 2013; Viana et al., 2013). Mais<br />
uma surpresa espera o observador ao entrar em<br />
contacto um pouco mais próximo com os adultos<br />
daquela cidade.<br />
‘O dia revela também um aspeto da vida nesta<br />
cidade exótica que é raro, ou até impossível, na<br />
cidade ocidental: o sorriso genuíno das pessoas –<br />
tantos sorrisos, de tantas pessoas – impressionaria<br />
em quaisquer circunstâncias, mas dentro de um<br />
meio urbano que seria caracterizado como<br />
desordem no mundo ocidental, contrasta e<br />
impressiona. Como é que é possível alguém estar<br />
feliz naquelas condições?’<br />
Os imensos sorrisos poderiam ser dirigidos,<br />
ou não, ao observador: a informalidade do<br />
ambiente, mesmo em torno dos grandes edifícios,<br />
leva as pessoas a estarem mais ‘à vontade’,<br />
dando-lhes liberdade para fazerem coisas naturais<br />
– por exemplo, serem amigáveis sem desconfiar<br />
se vão ser atacadas ou burladas, sorrirem quando<br />
estão contentes, parar e olhar quando e para tudo<br />
que lhes apeteça, procurarem comida nas<br />
proximidades, ou até, fazerem as suas<br />
necessidades no mesmo espaço de proximidade –<br />
talvez um extremo comportamental,<br />
particularmente perigoso em ambientes de alta<br />
densidade populacional. Sorrir pode também<br />
indicar descontração. Por exemplo, a<br />
descontração de quem não tem preocupações<br />
relativas à desvalorização da sua propriedade, ao<br />
cumprimento dos pagamentos de crédito pessoal<br />
na hipótese de perder o seu emprego, de que está<br />
mesmo contente com aquilo (pouco) que tem.<br />
De forma não revelada, parece que a essência<br />
da cidade é naturalmente incógnita. E quando se<br />
trata de uma realidade fora das convenções<br />
familiares, como a cidade exótica, este carácter<br />
incógnito transforma-se em mistério. Mas com<br />
um pouco de atenção em relação aos outros<br />
sentidos e à informação que vem por via destes,<br />
há sempre pistas para substituir o aspeto visual da<br />
forma urbana. Este modo de conhecer a cidade<br />
está atento a qualidades da essência da cidade que<br />
poderiam não estar presentes nas fotografias ou<br />
nos desenhos técnicos de arquitetura – por<br />
exemplo, a formalidade (ou não) da ‘estrutura’<br />
socio-económica (propriedade, competição) e a<br />
‘função’ humana no ambiente urbano (liberdade<br />
de usos). Estas dimensões invisíveis estendem a<br />
essência da cidade para além da forma, que é<br />
visual. Ou, talvez, definam uma ‘forma invisível’.<br />
Referências<br />
Pinto, S. M. G. (2013) ‘Regular = planeado<br />
versus irregular = espontâneo: nascimento e<br />
morte de uma relação dicotómica nos estudos<br />
históricos da forma urbana’, Revista de<br />
Morfologia Urbana 1, 5-16.<br />
Viana, D. L., Sanz, J. R. L. e Natálio, A. (2013)<br />
‘Aprendendo com a forma urbana de Maputo<br />
(in)formal’, Revista de Morfologia Urbana 1,<br />
17-30.
42 Perspetivas<br />
A ‘rua direita’ portuguesa: elemento estruturador ou<br />
designação toponímica?<br />
Sandra M. G. Pinto, Centro de História de Além-Mar, Lisboa, Portugal. Centro de<br />
Documentação e Pesquisa dos Domínios Portugueses (XV-XIX), Curitiba, Brasil. Rua<br />
João Bravo n.º 22 1ºG, 3040-379 Coimbra, Portugal. Email: sandramgpinto@gmail.com<br />
Nesta ‘perspetiva’ procura-se questionar o<br />
conceito de ‘rua direita’ dentro da História do<br />
Urbanismo Português. A pergunta enunciada no<br />
título é necessariamente provocadora, já que não<br />
se duvida que aquela foi, ou é, uma designação<br />
toponímica. A hesitação prende-se, portanto, em<br />
entendê-la como ‘o’ elemento estruturador dos<br />
espaços urbanos. Perceba-se, então, a razão da<br />
própria questão.<br />
Entre os diversos estudos linguísticos e<br />
etnológicos relativos a Portugal, Vasconcelos<br />
(1917), ao examinar Chaves, deu conta que o<br />
topónimo de ‘rua direita’ estava presente em<br />
várias cidades e vilas, mas que, ao contrário do<br />
que o qualificativo (i.e. ‘direita’) à partida poderia<br />
indiciar, as ruas assim nomeadas eram sinuosas.<br />
A ‘aparente contradição’ foi resolvida pelo<br />
esclarecimento de que o qualificativo não se<br />
referia à forma física, mas ao facto de tal rua ser<br />
central e de ligar diretamente um extremo ao<br />
outro da área urbana. Este mesmo fenómeno e a<br />
mesma explicação foram depois aprofundados por<br />
outros investigadores, tendo Ribeiro (1968)<br />
dedicado especial atenção à Rua Direita de Viseu,<br />
tornando-se assim consensual considerar que as<br />
‘ruas direitas’, apesar de serem formalmente<br />
tortuosas, eram funcionalmente o centro<br />
comercial, ‘o coração’, e o eixo principal de<br />
circulação, ligando os pontos de referência, ‘os<br />
órgãos vitais’ (Ribeiro, 1984 [1965]).<br />
Teoricamente, a contraposição foi dada por<br />
Robert Smith. Como forma de provar a sua<br />
conjetura, de que os portugueses não souberam<br />
planear cidades ordenadas e regulares no Brasil,<br />
aproveitou para ridiculizar o facto de que as ‘ruas,<br />
ironicamente chamadas direitas, eram tortas e<br />
cheias de altibaixos’ (Smith, 1955, p. 12).<br />
Contudo, a sua leitura derivava mais da<br />
comparação formal entre as aglomerações<br />
coloniais da América Latina erigidas por<br />
portugueses e por espanhóis, do que do<br />
conhecimento efetivo da cultura e produção<br />
urbana dos primeiros. Curioso é que foi o<br />
‘desmanchar’ deste preconceito que fez avançar o<br />
próprio conhecimento.<br />
Neste sentido, e provavelmente não por acaso,<br />
a ‘rua direita’ passou a ser vista como o elemento<br />
disciplinador do desenvolvimento urbanístico<br />
português. Para a emergente historiografia<br />
nacional, a aparente falta de regularidade<br />
geométrica dos espaços urbanos foi compensada<br />
por um modo caraterístico ou específico da<br />
produção portuguesa, no qual o elemento urbano<br />
com aquela designação passou a constituir-se<br />
como ‘o’ eixo a partir do qual se organizava todo<br />
o espaço. Através de um raciocínio abdutivo,<br />
criou-se, assim, um fenómeno de estudo,<br />
sustentado empiricamente pelas atuais<br />
designações toponímicas dos arruamentos.<br />
Metodologicamente tornou-se corrente procurar<br />
‘a’ rua direita de cada caso particular, e a proposta<br />
teórica disseminou-se nos estudos históricos do<br />
urbanismo português, pois aquela designação<br />
fazia-se sentir em várias aglomerações<br />
continentais e ultramarinas (por exemplo:<br />
Fernandes, 1989; Gaspar, 1985; Rossa, 1995).<br />
Todavia, o posterior confronto com as<br />
informações toponímicas e topográficas de<br />
períodos mais recuados – pois as primeiras até ao<br />
século XIX variaram ao longo do tempo<br />
(Andrade, 1993) – levou ao reconhecimento de<br />
que tal qualificativo existiu em muitas artérias<br />
viárias num mesmo espaço urbano e que estas<br />
podiam ainda receber outros atributos, conforme<br />
o percurso aludido, começando-se a questionar a<br />
relação, anteriormente estabelecida, entre o<br />
topónimo e a forma/função das artérias (por<br />
exemplo: Borges, 1995; Rossa, 2001).<br />
A exploração dos documentos escritos antigos<br />
consente ainda outras considerações, de âmbito<br />
toponímico. Permite comprovar a aceção de<br />
direção, como se depreende pelo exemplo<br />
escalabitano de uia publica que uenit directe de<br />
porta de Alpram et uadit ad portam de Alcaçoua,<br />
assim designada em 1294, sendo fácil presumir a<br />
redução da expressão ‘rua que vai direita’ para<br />
apenas ‘rua direita’. Mas, mostra igualmente que,<br />
em alguns casos, o tal circunlóquio foi<br />
introduzido em épocas posteriores, não só ao<br />
aparecimento físico/material das artérias viárias,<br />
mas até à própria inclusão de outros atributos,<br />
como se verifica também para Santarém, onde,<br />
entre outras, as ruas ‘da Ramada’, ‘dos<br />
Mercadores’ ou ‘do Açougue Velho’ foram<br />
referidas somente como ‘ruas’, respetivamente,<br />
em 1240, 1245 e 1294, aparecendo já como ‘ruas<br />
direitas de’ em 1437, 1380 e 1363 (Viana, 2007).<br />
De facto, as fontes documentais, como também os
Perspetivas 43<br />
estudos históricos de toponímia, permitem atestar<br />
que foi na segunda metade do século XIV que a<br />
palavra ‘direita’, utilizada para qualificar<br />
determinadas ‘ruas’, começou a aparecer<br />
abundantemente na documentação escrita. Tal<br />
como, outrossim, também o qualificativo de<br />
‘travessa’, tomando, neste caso, a expressão de<br />
‘rua travessa’, como tão bem comprova o caso do<br />
topónimo bracarense, Rua Travessa que vai do<br />
Postigo até à porta da Igreja de Santiago da<br />
Cividade primeiramente da mão direita como vão<br />
para a dita Igreja, referido no Tombo do Cabido<br />
datado de 1369-80 (Ribeiro, 2008, p. 421). Daqui<br />
depreende-se que ‘direita’ e ‘travessa’ foram,<br />
então, qualificativos de direção, justapostos ao<br />
substantivo ‘rua’, de modo a nomear, distinguir e<br />
a caracterizar determinadas artérias fossem elas<br />
novas ou existentes dentro do conjunto urbano.<br />
Ambos os qualificativos aludiam ao itinerário,<br />
pois se naquele o percurso era ‘direto’ entre dois<br />
pontos de referência, neste era de<br />
‘atravessamento’ entre dois espaços de circulação.<br />
Evidencie-se ainda que com o tempo surgiram<br />
alterações nas designações: algumas ‘ruas<br />
direitas’ perderam o qualificativo; nalgumas ‘ruas<br />
travessas’ o qualificativo transformou-se em<br />
substantivo; e outras artérias foram<br />
alternadamente identificadas de ‘rua’ e ‘travessa’,<br />
dentro de um mesmo intervalo cronológico ou, até<br />
mesmo, dentro do mesmo documento.<br />
Com efeito, os dados toponímicos encontrados<br />
na documentação histórica obrigam, assim, a<br />
relativizar a ideia de que todas as artérias<br />
identificadas pela designação de ‘ruas direitas’<br />
foram ‘os’ eixos estruturantes dos espaços<br />
urbanos portugueses. Não se nega que algumas<br />
dessas ruas, tal como outras, ou até algumas ‘ruas<br />
travessas’, tenham desempenhado tal papel; ainda<br />
que outras com o mesmo qualificativo possam ter<br />
sido somente um acesso mais direto, mais curto<br />
ou mais rápido, sem qualquer importância<br />
comercial. O que se almeja com este<br />
esclarecimento é que, nos estudos históricos da<br />
forma urbana portuguesa, se procure e dê a<br />
importância devida a cada artéria viária dentro de<br />
uma leitura morfológica mais global, e não se<br />
evidencie as ruas chamadas de ‘direitas’, apenas e<br />
só, por causa da sua designação toponímica,<br />
sendo então necessário cruzar duas leituras<br />
históricas diferentes, a formal e a toponímica,<br />
para assim perceber as dinâmicas e as mutações<br />
ao longo do tempo.<br />
Referências<br />
Andrade, A. A. (1993) ‘Conhecer e nomear: a<br />
toponímia das cidades medievais portuguesas’,<br />
A Cidade, Jornadas Inter e Pluridisciplinares I<br />
(Universidade Aberta, Lisboa) 123-40.<br />
Borges, A. M. (1995) ‘A toponímia de Évora no<br />
final da Idade Média’, Estudos de Arte e<br />
História, Homenagem a Artur Nobre de<br />
Gusmão (Editorial Vega, Lisboa) 80-8.<br />
Fernandes, J. M. (1989) ‘O Funchal e o<br />
urbanismo de raiz portuguesa no Atlântico,<br />
Estudo comparativo e de enquadramento<br />
histórico-estrutural’, Colóquio Internacional de<br />
História da Madeira I (DRAC, Funchal) 247-<br />
60.<br />
Gaspar, J. (1985) ‘A cidade portuguesa na Idade<br />
Média: aspetos da estrutura física e<br />
desenvolvimento funcional’, En la España<br />
medieval (La ciudad hispánica durante los<br />
siglos XIII al XVI) 6, 133-50.<br />
Ribeiro, M. (2008) Braga entre a época romana e<br />
a Idade Moderna. Uma metodologia de análise<br />
para a leitura da evolução da paisagem urbana,<br />
Tese de Doutoramento não publicada,<br />
Universidade do Minho, Portugal.<br />
Ribeiro, O. (1984 [1965]) ‘Cidade’, Dicionário de<br />
História de Portugal II (Livraria Figueirinhas,<br />
Porto) 60-6.<br />
Ribeiro, O. (1968) ‘A rua direita de Viseu’,<br />
Geographica, Revista da Sociedade de<br />
Geografia de Lisboa 16, 49-63.<br />
Rossa, W. (1995) ‘A cidade portuguesa’, História<br />
da Arte Portuguesa III (Círculo de Leitores,<br />
Lisboa) 233-323.<br />
Rossa, W. (2001) DiverCidade: Urbanografia do<br />
espaço de Coimbra até ao estabelecimento<br />
definitivo da Universidade, Tese de<br />
Doutoramento não publicada, Universidade de<br />
Coimbra, Portugal.<br />
Smith, R. C. (1955) Arquitetura colonial: as artes<br />
na Bahia (Livraria Progresso, Salvador).<br />
Vasconcelos, J. L. (1917) ‘Por Trás-os-Montes’,<br />
O Archeogolo Português 22, 1-53.<br />
Viana, M. (2007) Espaço e povoamento numa<br />
vila portuguesa, Santarém 1147-1350<br />
(Caleidoscópio, Casal de Cambra).
44 Perspetivas<br />
Gramáticas genéricas para o domínio da cidade e urbanismo<br />
José Nuno Beirão, CIAUD, Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa, Rua<br />
Sá Nogueira, Pólo Universitário Alto da Ajuda, 1349-055 Lisboa. Portugal. Email:<br />
jnb@fa.ulisboa.pt<br />
Em Urbanismo o recurso ao uso de regras ou<br />
códigos constitui uma constante. As regras podem<br />
utilizar-se em 4 níveis de atuação distintos: i) num<br />
modo analítico, como forma de compreensão do<br />
desenvolvimento dos tecidos e padrões urbanos;<br />
ii) como instrumento de síntese na génese de<br />
soluções, iii) como instrumento regulamentar; e,<br />
ainda, iv) na instrução de algorítmos de simulação<br />
do comportamento e desenvolvimento urbano.<br />
No presente documento apresenta-se o<br />
conceito de ‘gramática genérica’ como estrutura<br />
suporte constituinte de software aplicável aos 4<br />
níveis de atuação referidos recorrendo à ‘regra’<br />
como o elemento gerativo. Começa-se por<br />
explicar a estrutura comum de uma regra,<br />
transversal a uma linguagem de padrões e a uma<br />
gramática da forma. De seguida expõe-se a sua<br />
aplicação a um domínio formal específico<br />
estruturado sob a forma de uma ontologia.<br />
Finalmente, indica-se como se constituem<br />
gramáticas genéricas num domínio formal<br />
recorrendo como exemplo ao domínio da cidade.<br />
A título conclusivo explica-se como as gramáticas<br />
genéricas podem constituir a base de um sistema<br />
de modelação de informação urbana (City<br />
Information Modeling – CIM).<br />
A estrutura comum de uma regra possui na<br />
sua forma mais genérica o formato ‘predicado →<br />
consequente’, ou, numa linguagem mais familiar<br />
ao domínio da sintaxe formal o formato: ‘se →<br />
então’. Genericamente este formato propõe que<br />
num domínio de objetos previamente definido,<br />
perante a ocorrência de um objeto ou conjunto de<br />
objetos A se aplique uma transformação t a esses<br />
objetos produzindo um consequente B tal que B =<br />
t(A). Este formato genérico de regra (A→B) é<br />
transversal quer ao conceito de linguagem de<br />
padrões (Alexander et al., 1977), quer ao de<br />
gramáticas da forma (Stiny e Gips, 1972). Veja-se<br />
na estrutura da linguagem de padrões (capítulo<br />
introdutório: ‘Using this book’, pp. IX a XLIV)<br />
onde se indica a identificação de um problema<br />
recorrente em meio urbano como predicado para<br />
o qual se aponta uma solução suportada na<br />
tradição ou experiência comprovada como<br />
consequente desse predicado. Numa gramática da<br />
forma tomamos como argumentos das nossas<br />
regras formas A ocorrendo num projeto C que<br />
reconhecemos como predicado e que<br />
transformamos de acordo com a seguinte<br />
expressão:<br />
(1) B = (C-A) + t(A)<br />
Por outras palavras subtraímos a uma forma<br />
complexa C a ocorrência A e adicionamos a sua<br />
transformação t(A). Na realidade, a leitura da<br />
ocorrência A verifica-se não só ao nível de um<br />
reconhecimento puro da forma A mas de qualquer<br />
variação Euclidiana de A, seja ela uma simetria,<br />
uma rotação ou homotetia de A. Esta operação<br />
permite a aplicação da transformação a uma<br />
forma existente ou a qualquer ocorrência de uma<br />
forma semelhante escalada ou não, rodada ou não.<br />
Quando a regra se aplica a uma forma qualquer<br />
que seja a proporção das suas partes (por<br />
exemplo, a qualquer quadrilátero) podemos dizer<br />
que a regra se aplica a qualquer atribuição de<br />
valores g aos parâmetros de A. A expressão (1)<br />
toma então a forma:<br />
(2) B= (C-g(A)) + t(g(A))<br />
A gramática torna-se assim uma gramática<br />
paramétrica (Stiny, 1980).<br />
O paralelo acima traçado com a teoria da<br />
linguagem de padrões de Alexander pode-se<br />
facilmente suportar argumentando o recurso ao<br />
mesmo formato A→B. A grande diferença ocorre<br />
ao nível da estrutura semântica das regras e,<br />
acima de tudo, ao nível da sua pragmática. A<br />
estrutura descritiva dos padrões de Alexander<br />
mantém uma ambiguidade de leitura das<br />
ocorrências (predicados) útil à interpretação<br />
semântica dos espaços urbanos e arquitetónicos.<br />
Igualmente, e acima de tudo, essa ambiguidade de<br />
interpretação mantém-se ao nível da<br />
transformação a aplicar (dimensão semântica e<br />
dimensão pragmática) obtendo-se como resultado<br />
um consequente que abre o seu espaço<br />
representacional à ambiguidade e ao espaço<br />
idiossincrático da profissão de arquiteto e<br />
urbanista.<br />
Concentremo-nos agora na noção de domínio<br />
formal e/ou conceptual e em particular no<br />
domínio da ‘cidade e o urbanismo’. O domínio da<br />
cidade deverá conter os conceitos capazes de<br />
descrever a cidade tal como ela é, enquanto o<br />
domínio do urbanismo tem em vista descrever a<br />
cidade como se pretende que ela seja, ou mais<br />
precisamente, descrever quais as transformações<br />
que admitimos que ocorram no domínio da cidade<br />
para garantir que a sua evolução não se desvia
Perspetivas 45<br />
muito de um objetivo a que chamaremos visão<br />
(Friedman, 1997). No campo da computação<br />
chamamos uma ontologia computacional às<br />
especificações da conceptualização de um<br />
domínio (Gruber, 1993). Mais concretamente,<br />
trata-se de uma descrição do nosso domínio em<br />
termos das classes e subclasses de objetos que o<br />
compõem, dos seus atributos e das relações<br />
expressas entre classes.<br />
O domínio da ‘cidade e o urbanismo’ é<br />
particularmente complexo porque as leituras do<br />
que são ‘as coisas’ (ou objetos) neste domínio<br />
revestem-se por vezes de grande ambiguidade. No<br />
entanto, a fim de simplificar essa leitura podemos<br />
subdividir as descrições do domínio em<br />
subdomínios (sistemas) correspondentes a óticas<br />
distintas de leitura do domínio principal. Por<br />
exemplo, podemos ler a cidade como um sistema<br />
de ruas, como um sistema construído ou como um<br />
sistema de propriedade. Dentro de cada sistema<br />
podemos incluir subclasses que complementam a<br />
descrição do sistema. Por exemplo, considerando<br />
a cidade como sistema de ruas a que chamaremos<br />
apenas networks podemos identificar várias<br />
subclasses de representação deste sistema: i) as<br />
ruas como representação axial da network ou<br />
apenas como eixos de composição de um plano<br />
onde se especificam as suas hierarquias na rede;<br />
ii) a classificação da rua no sistema viário (via<br />
coletora, distribuidora, acesso local, etc); iii) a sua<br />
nomenclatura no léxico corrente da língua natural<br />
do contexto em que nos inserimos (por exemplo,<br />
rua principal, avenida, travessa, beco, circular,<br />
etc); iv) a composição de cada rua para cada<br />
descrição das classes anteriores como um<br />
conjunto de faixas (ou componentes) que<br />
constituem um perfil de rua em particular; e, por<br />
fim, v) a descrição detalhada (incluindo<br />
parâmetros e atributos) de cada componente de<br />
perfil de rua (faixas de rodagem, estacionamento,<br />
passeios, ciclovias, faixas bus, faixas ajardinadas,<br />
alinhamentos arbóreos, etc). Para maior detalhe<br />
ver Beirão (2012).<br />
Na descrição de um domínio as dependências<br />
ou relações entre as classes são especificadas nas<br />
definições dos objetos pertencentes a cada classe.<br />
Podem existir também relações de dependência<br />
entre objetos pertencentes a subdomínios ou<br />
sistemas diferentes. Por exemplo, edifícios que<br />
pertencem ao sistema construído estão dentro de<br />
lotes que pertencem ao sistema de propriedade.<br />
Voltando às gramáticas e padrões, cada regra<br />
opera apenas um conjunto limitado de objetos<br />
geralmente pertencente a uma classe de objetos.<br />
Numa gramática, uma classe representa-se por um<br />
conjunto de formas (F i ) e símbolos (S i ): {F i ,S i }.<br />
Uma gramática urbana descreve um pequeno<br />
conjunto identificável de operações de urbanismo<br />
que podem ser traduzidas através de um conjunto<br />
de regras R que operam sobre o conjunto {F i ,S i } a<br />
partir de uma forma inicial I i . Uma gramática<br />
genérica Γ que opera no domínio da ‘cidade e<br />
urbanismo’ é constituída pelo conjunto das<br />
subgramáticas Γ i em que i representa a classe de<br />
objectos {F i ,S i } da ontologia considerando que as<br />
classes são identificadas pelo índice i<br />
(1,2,3,4,...,i).<br />
A forma inicial I i estabelece o elemento de<br />
comunicação entre as diferentes gramáticas Γ i<br />
pois são as únicas formas nas gramáticas que<br />
podem pertencer a conjuntos de formas fora da<br />
classe a que a gramática se refere. As formas<br />
iniciais podem ser de três tipos: i) objetos préexistentes;<br />
ou seja, objetos selecionados pelo<br />
projetista ou utilizador da ferramenta<br />
computacional, a partir do conjunto de todos os<br />
elementos pré-existentes E 0 , ou seja, do contexto;<br />
ii) objetos que na gramática Γ i podem ser lidos<br />
como objetos iniciais; iii) objetos resultantes da<br />
geração produzida por outras gramáticas e que<br />
foram (a) ou podem ser (b) classificados como<br />
objetos iniciais da gramática que estamos a<br />
considerar. Os objetos (a) são objetos que foram<br />
anteriormente classificados como objetos iniciais<br />
de outras gramáticas em função das relações<br />
expressas na ontologia. Os objetos (b) são<br />
classificados pelo projetista.<br />
Cada gramática assume a forma<br />
Γ i ={F i ,S i ,R,I i }. Voltando aos padrões, um padrão<br />
reproduz transformações urbanísticas genéricas<br />
comuns ao ato de projeto urbano ou a uma<br />
transformação espontânea comum em meio<br />
urbano, as quais, por serem comuns, podem ser<br />
geralmente entendidas através de um curto<br />
vocábulo ou representação icónica como<br />
Alexander sugere. Por exemplo:<br />
GridbyAddingAxes ou GridbyAddingCells. Um<br />
projeto urbano ou uma simulação é obtido pela<br />
aplicação combinada de vários padrões que geram<br />
soluções de acordo com a sua gramática e com os<br />
inputs fornecidos.<br />
Assim, utilizando gramáticas genéricas<br />
organizadas sob a forma de padrões obtém-se<br />
uma metalinguagem de padrões aplicável na<br />
geração de projetos urbanos ou na simulação de<br />
desenvolvimentos urbanos. Na implementação de<br />
um tal sistema obtém-se uma ferramenta<br />
computacional que automatiza alguns<br />
procedimentos e deixa outros para a decisão e<br />
interferência do utilizador. A estrutura descritiva<br />
do domínio (ontologia) mantém no entanto a<br />
integridade nas representações, qualquer que seja<br />
a formalização do projeto, que permite a partir<br />
das representações produzir cálculos de<br />
propriedades do projeto gerado pelo sistema, por<br />
exemplo, o cálculo automático de indicadores de<br />
densidade (Berghauser-Pont e Haupt, 2010) ou<br />
outros que possam ser calculados a partir dos
46 Perspetivas<br />
dados ou representações gerados pelas<br />
gramáticas. O confronto dos cálculos de<br />
indicadores com as soluções formais permite ao<br />
utilizador da ferramenta avaliar a pertinência da<br />
correlação entre indicadores e solução formal e<br />
variar os parâmetros de entrada para afinar as<br />
soluções.<br />
Para a obtenção de uma tal ferramenta<br />
desenvolveu-se um modelo juntando uma base de<br />
dados geográfica, uma plataforma de SIG<br />
(Sistema de Informação Geográfica) e um<br />
interface de desenho paramétrico incluindo uma<br />
plataforma de CAD e um interface de<br />
programação visual onde se implementaram os<br />
padrões acima referidos conjuntamente com um<br />
módulo de cálculo de indicadores. Este conjunto<br />
integrado de ferramentas permite reunir num<br />
conjunto pleno de interatividade, a análise urbana,<br />
a síntese de soluções e algumas ferramentas de<br />
avaliação. Tais ferramentas podem ser usadas<br />
como bases para projetar o urbano ou,<br />
simplesmente, simular os seus comportamentos<br />
analisando e avaliando resultados em contexto<br />
disponibilizando uma plataforma que dá corpo às<br />
tendências mais recentes de integração e<br />
conjugação de vários métodos e ferramentas<br />
analíticas como suporte à decisão em projeto<br />
urbano, como por exemplo Gil et al. (2007), Nes<br />
et al. (2012), Stahle et al. (2003), Ye e Nes<br />
(2013). Este conjunto de ferramentas, por<br />
analogia com o BIM (Building Information<br />
Modeling) designou-se por CIM (City<br />
Information Modeling).<br />
Nesta ‘Perspetiva’, abordou-se a definição de<br />
uma gramática genérica aplicada ao domínio da<br />
cidade e urbanismo como conceito primordial<br />
constituinte de uma plataforma de CIM.<br />
Ilustrações das aplicações deste sistema estão<br />
disponíveis no link http://www.measurb.org/docs/<br />
TODOS_Workshop.pdf onde se podem consultar<br />
os resultados da sua aplicação, num formato de<br />
workshop, a um problema de desenho urbano<br />
específico. Ficam por detalhar a estrutura<br />
discursiva das gramáticas genéricas e a descrição<br />
detalhada da implementação, as quais podem ser<br />
consultadas respetivamente em Beirão (2012),<br />
Beirão et al. (2011) e Beirão et al. (2012).<br />
Referências<br />
Alexander, C., Ishikawa, S., Silverstein, M.,<br />
Jacobson, M., Fiksdahl-King, I. e Angel, S.<br />
(1977) A Pattern Language (Oxford University<br />
Press, Oxford).<br />
Beirão, J. (2012) CItyMaker: Designing<br />
Grammars for Urban Design<br />
(http://repository.tudelft.nl/view/ir/uuid:16322b<br />
a7-6c37-4c31-836b-bc42037ea14c/) consultado<br />
em 28 de Março de 2014.<br />
Beirão, J., Nourian, P. e Mashhoodi, B. (2011)<br />
‘Parametric urban design: an interactive<br />
sketching system for shaping neighborhoods’,<br />
29 th eCAADe Conference, Ljubljana.<br />
Beirão, J., Arrobas, P. e Duarte J. (2012)<br />
‘Parametric urban design: joining morphology<br />
and urban indicators in a single interactive<br />
model’, in Achten, H., Pavlicek, J., Hulin, J. e<br />
Matejdan, D. (eds.) Digital Physicality -<br />
Proceedings of the 30 th eCAADe Conference,<br />
Czech Technical University, Prague<br />
(http://cumincad.scix.net/cgibin/works/Show?_i<br />
d=ecaade2012_130&sort=DEFAULT&search=<br />
Beir%e3o&hits=11) consultado em 28 de<br />
Março de 2014.<br />
Berghauser-Pont, M. e Haupt, P. (2010)<br />
Spacematrix. space, density and urban form<br />
(NAi Publishers, Roterdão).<br />
Friedman, A. (1997) ‘Design for change: flexible<br />
planning strategies for the 1990s and beyond’,<br />
Journal of Urban Design 2, 277-95.<br />
Gil, J., Stutz, C. e Chiaradia, A. (2007)<br />
‘Confeego: tool set for spatial configuration<br />
studies’, New developments in space syntax<br />
software, 15.<br />
Gruber, T. R. (1993) A translation approach to<br />
portable ontology specifications<br />
(http://www.dbis.informatik.huberlin.de/dbisold<br />
/lehre/WS0203/SemWeb/lit/KSL-92-17.pdf)<br />
consultado em 28 de Março de 2014.<br />
Nes, A. v., Berghauser-Pont, M. and Mashhoodi,<br />
B. (2012) ‘Combination of space syntax with<br />
spacematrix and the mixed use index’, 8 th<br />
International Space Syntax Symposium,<br />
Santiago do Chile, 3 a 6 de Julho.<br />
Stahle, A., Marcus, L. e Karlstrom, L. A. (2003)<br />
‘Place syntax tool - GIS software for analysing<br />
geographic accessibility with axial lines’, New<br />
developments in space syntax software, 35.<br />
Stiny, G. (1980) ‘Introduction to shape and shape<br />
grammars’, Environment and Planning B:<br />
Planning and Design 7, 343-51.<br />
Stiny, G. e Gips, J. (1972) ‘Shape grammars and<br />
the generative specification of painting and<br />
sculpture’, Information Processing 71, 1460-5.<br />
Ye, Y., e Nes. A. v. (2013) ‘The spatial flaws of<br />
new towns’, 9 th International Space Syntax<br />
Symposium, Seoul, 31 de Outubro a 3 de<br />
Novembro.
BOOK<br />
REVIEWS<br />
Os elementos urbanos, de Carlos Dias<br />
Coelho (coordenação), João Pedro Costa,<br />
João Silva Leite, José Miguel Silva, Luísa<br />
Trindade, Paulo Pereira, Sérgio Barreiros<br />
Proença, Sérgio Padrão Fernandes e Xavier<br />
Monteys, Argumentum, Lisboa, Portugal,<br />
2013, 205 pp. ISBN 978-972-8479-78-7.<br />
‘Os Elementos Urbanos’ constitui o primeiro<br />
número de uma série de quatro volumes da<br />
coleção ‘Cadernos de Morfologia Urbana -<br />
Estudos da Cidade Portuguesa’, que resulta do<br />
trabalho realizado pelo grupo de investigação<br />
FormaUrbis Lab, no âmbito do Centro de<br />
Investigação de Arquitetura, Urbanismo e Design<br />
(CIAUD) da Faculdade de Arquitetura da<br />
Universidade de Lisboa (FAUL). Os restantes<br />
números desta coleção cujas edições se aguardam<br />
para breve incluirão os seguintes títulos: O<br />
Tempo e a Forma; Outras Abordagens; e<br />
Conceitos e Metodologias.<br />
‘Os Elementos Urbanos’ constitui uma<br />
notável publicação que resulta do trabalho de<br />
reflexão sobre a forma da cidade, realizada pelos<br />
membros do grupo Forma Urbis Lab, com a<br />
coordenação de Carlos Dias Coelho. São coautores<br />
desta obra João Pedro Costa, João Silva<br />
Leite, José Miguel Silva, Sérgio Barreiros<br />
Proença, Sérgio Padrão Fernandes, membros do<br />
grupo de investigação FormaUrbis Lab, mas<br />
também Paulo Pereira da FAUL e Xavier<br />
Monteys da Universidade Politécnica da<br />
Catalunya, ambos consultores do grupo de<br />
investigação, bem como Luísa Trindade, da<br />
Universidade de Coimbra.<br />
A divulgação da investigação produzida pelo<br />
grupo FormaUrbis Lab tem sido disponibilizada<br />
através do website do grupo<br />
http://formaurbislab.fa.utl.pt/home. O interesse<br />
dos membros do grupo pelo estudo da forma da<br />
cidade portuguesa revê-se nomeadamente através<br />
de publicações anteriores dedicadas, por<br />
exemplo, à temática da inventariação de<br />
elementos específicos da forma urbana,<br />
designadamente ‘a praça’ (Coelho, 2007; Coelho<br />
e Lamas, 2005).<br />
A maior parte dos conteúdos deste livro<br />
resultam de material recolhido de Projetos de<br />
Investigação, realizados por este grupo,<br />
nomeadamente o Projeto ‘Atlas Morfológico’,<br />
mas também da contribuição de vários projetos<br />
de investigação individuais, articulados com o<br />
projeto anterior. Neste sentido destacam-se os<br />
contributos de várias teses de doutoramento,<br />
realizadas por alguns dos investigadores deste<br />
grupo de investigação e co-autores do livro.<br />
Grande parte dos investigadores deste grupo é<br />
também docente na Faculdade de Arquitetura da<br />
UL. A investigação produzida por este grupo<br />
beneficia certamente da oportunidade de articular<br />
o ensino com a investigação, promovendo-se<br />
desta forma um enriquecimento dos conteúdos<br />
pedagógicos, no âmbito do ensino da Arquitetura<br />
e do Urbanismo, através do processo<br />
metodológico levado a cabo por este grupo e dos<br />
seus respetivos resultados científicos.<br />
‘Os Elementos Urbanos’ constituem uma<br />
excelente oportunidade, para que um público<br />
mais alargado, para além dos estudantes de<br />
arquitetura da FAUL, venha a conhecer a<br />
excelência do trabalho de investigação realizado<br />
pelo grupo FormaUrbis Lab. Excelência esta, que<br />
nos tem sido já dada a conhecer através de<br />
diversas comunicações, de diferentes elementos<br />
do grupo, em diversos encontros científicos<br />
nacionais e internacionais.<br />
Resumidamente, destacam-se neste livro dois<br />
aspetos fundamentais. Primeiro, a qualidade<br />
gráfica e visual que tem acompanhado desde<br />
sempre o trabalho produzido por esta equipa de<br />
investigadores, bem como a consistência desse<br />
mesmo material gráfico. Segundo, a coerência<br />
dos vários temas abordados pelos diferentes<br />
membros do grupo, no que concerne ao estudo da<br />
forma urbana, evidenciando o sucesso da<br />
Revista de Morfologia Urbana (2014) 2(1) 47-50 Rede Portuguesa de Morfologia Urbana ISSN 2182-7214
48 Book Reviews<br />
coordenação do trabalho realizado por este grupo<br />
mas também numa apreciável unidade de grupo,<br />
face aos objetivos a cumprir nas diferentes<br />
investigações em curso. Estes dois fatores<br />
permitem a identificação de uma identidade,<br />
neste grupo de investigação, que se destaca pelo<br />
esforço de construir ferramentas de leitura da<br />
cidade apoiadas numa metodologia, cujo objetivo<br />
é o de analisar exaustivamente os diferentes<br />
elementos que compõem a forma urbana no seu<br />
todo, através de um exercício de decomposição. E<br />
assim, procurando responder a um objetivo<br />
comum – o estudo da cidade portuguesa.<br />
Foi precisamente apoiando-se neste exercício<br />
de decomposição dos diferentes elementos que<br />
constituem a forma urbana, que os autores deste<br />
livro estabeleceram a sua estrutura. Encontramos<br />
assim neste livro, ‘Os Elementos Urbanos’, nove<br />
capítulos que testemunham, segundo os seus<br />
autores, a decomposição do tecido urbano através<br />
dos seus vários elementos urbanos.<br />
Designadamente: i) o Tecido; ii) o Traçado; iii) a<br />
Malha; iv) a Praça; v) a Rua; vi) o Quarteirão;<br />
vii) a Parcela; viii) o Edifício Singular; e ix) o<br />
Edifício Comum.<br />
O livro inclui ainda um conjunto considerável<br />
de imagens a ilustrar os seus vários capítulos.<br />
Estas imagens testemunham a excelência da<br />
qualidade gráfica que identifica este grupo e que<br />
certamente contribui enquanto importante<br />
ferramenta de divulgação do trabalho junto do<br />
seu público-alvo, o estudante de arquitetura, mas<br />
também do leitor com interesse pelo estudo da<br />
forma da cidade. Salienta-se o uso da planta,<br />
como imagem primordial para a representação<br />
gráfica da forma urbana por este trabalho e que é<br />
notória ao longo dos seus vários capítulos, com<br />
pequenas exceções. Estas incluem o uso da<br />
fotografia bem como perfis.<br />
Finalmente, a apresentação sumária da<br />
metodologia, que os autores procuram enunciar,<br />
poderia ter encontrado neste livro um capítulo<br />
específico para sua sistematização,<br />
nomeadamente num capítulo conclusivo. Assim<br />
‘Os Elementos Urbanos’ teriam certamente<br />
contribuído para que o seu público-alvo, mais<br />
facilmente identificasse essa mesma metodologia<br />
e a pudesse utilizar como guia para futuras<br />
aplicações.<br />
Destaca-se contudo a oportunidade de<br />
calendário da publicação deste livro, pois<br />
coincide com um momento rico em debates<br />
acerca do ensino da morfologia urbana, e que tem<br />
conquistado espaço e atualização (Marat-Mendes<br />
e Cabrita, 2012; Oliveira, 2014) no âmbito da<br />
Rede Portuguesa de Morfologia Urbana e do<br />
próprio International Seminar on Urban Form<br />
(ISUF).<br />
Referências<br />
Coelho, C. D. e Lamas, J. (coord.) (2005) A<br />
Praça em Portugal - Açores, Inventário do<br />
Espaço Público (FAUTL e DROTRH, Ponta<br />
Delgada).<br />
Coelho, C. D. (coord.) (2007) A Praça em<br />
Portugal, Inventário de Espaço Público -<br />
Continente (DGOTDU, Lisboa).<br />
Oliveira, V. (2014) ‘Manuals for urban<br />
morphological education’, Urban Morphology<br />
18, 77-8.<br />
Marat-Mendes, T. e Cabrita, M. A. (2012)<br />
‘Morfologia urbana em Portugal: percurso e<br />
visibilidade’, in Sampayo, M., André, P. e<br />
Marat-Mendes (eds.) Morfologia urbana nos<br />
países lusófonos (ISCTE-IUL, Lisboa) 1750-<br />
81.<br />
Teresa Marat-Mendes, Instituto Universitário de<br />
Lisboa ISCTE-IUL, DINÂMIA’CET-IUL,<br />
Departamento de Arquitectura e Urbanismo, Av.<br />
das Forças Armadas, 1649-026 Lisboa, Portugal.<br />
Email: teresa.marat-mendes@iscte.pt<br />
10 mandamentos da arquitetura, de<br />
Frederico de Holanda, FRBH, Brasília,<br />
Brasil, 2013, 344 pp. ISBN 978-85-64222-<br />
06-9.<br />
Frederico de Holanda é um dos maiores<br />
comunicadores do nosso tempo na área da<br />
morfologia urbana. Antevi-o quando assisti pela<br />
primeira vez a uma das suas apresentações em<br />
Estocolmo, em 2009. Confirmei-o nas<br />
comunicações a que assisti nos três anos<br />
seguintes – no Porto, em Montreal e em Lisboa –<br />
e ainda na leitura dos seus livros. ‘10<br />
mandamentos da arquitetura’ comprova esta<br />
capacidade. É um livro notável, escrito numa<br />
linguagem simples e apelativa, que certamente<br />
alcançará um público alargado, indo muito para<br />
além dos círculos académicos e profissionais.<br />
O formato do livro retoma uma ideia de<br />
Hanson (1988), na altura centrada<br />
exclusivamente na escrita de textos académicos,<br />
estruturando-se num conjunto de dez<br />
‘mandamentos’ ou orientações. Em termos de<br />
organização dos conteúdos, o texto constrói-se a<br />
partir de uma experiência de Holanda como<br />
Professor Visitante em Santiago de Querétaro,<br />
México, em 2005. Alguns dos textos são inéditos<br />
(na totalidade ou em parte), outros revisitam<br />
temas abordados em anteriores apresentações,
Book Reviews 49<br />
artigos e livros (particularmente em Holanda,<br />
2010, 2011). Como nos trabalhos precedentes de<br />
Holanda, o leitor reencontrará aqui a cidade de<br />
Brasília, os arquitetos Lucio Costa e Oscar<br />
Niemeyer, bem como, a Teoria da Sintaxe<br />
Espacial. Ficará também a conhecer outras<br />
influências de Holanda, nomeadamente Evaldo<br />
Coutinho e Carlos Nelson dos Santos.<br />
O livro estrutura-se em dez capítulos, cada um<br />
deles correspondendo a um ‘mandamento’,<br />
abordando os seguintes temas: i) o alargamento<br />
do conceito de arquitetura à cidade e ao território<br />
(clarificando logo à partida qualquer malentendido<br />
que o título da obra pudesse sugerir);<br />
ii) as causas, ou ‘aquilo’ que está por detrás da<br />
arquitetura (definindo ainda os elementos<br />
arquitetónicos fundamentais – cheios, vazios e<br />
relações cheios-vazios); iii) os efeitos que a<br />
arquitetura provoca (abarcando aspetos<br />
funcionais, económicos, sociológicos,<br />
topocetivos, afetivos, simbólicos e estéticos); iv)<br />
as possibilidades e as restrições da arquitetura,<br />
bem como o modo como esta interfere na vida<br />
das pessoas; v) o modo como a arquitetura reflete<br />
(e pode contribuir para fomentar) igualdades e<br />
desigualdades sociais; vi) dois tipos de<br />
implicações da arquitetura, as implicações<br />
sintáticas, relacionadas com a configuração, e as<br />
implicações semânticas, ligadas a aspetos<br />
convencionais, circunstanciais e históricos; vii) o<br />
equilíbrio entre ordem e desordem, relacionando<br />
a última, ora com uma dimensão de inovação, ora<br />
com uma dimensão de regressão; viii) a utilização<br />
da história em arquitetura, apelando a um<br />
conhecimento crítico que seja capaz de abarcar<br />
longos períodos temporais; ix) o contributo de<br />
cada edifício para a qualificação do espaço<br />
público, distinguindo entre edifícios ‘com rosto’ e<br />
‘edifícios com costas’ ou ‘edifícios com ombros’;<br />
e, por fim, x) as teorias do conhecimento e a<br />
valorização de um conhecimento objetivo<br />
informado pela evidência.<br />
De entre os temas abordados ao longo do<br />
livro gostaria de retomar três: o alargamento do<br />
conceito de arquitetura; a relação entre<br />
arquitetura e comportamentos; e, por fim, o<br />
enfoque no espaço e não na forma. No prefácio<br />
do livro, Ruth Verde Zein refere que ‘(…) cada<br />
vez menos a arquitetura é socialmente<br />
considerada como uma das mais importantes<br />
facetas da vida e da criatividade humanas’. Uma<br />
das razões fundamentais para este fenómeno será<br />
porventura o enfoque cada vez mais reduzido que<br />
o arquiteto adota, concentrando todo o seu<br />
esforço técnico e criativo no desenho do edifício<br />
isolado. A modernidade iniciou este processo e a<br />
pós-modernidade continuou a alimentá-lo. Daí a<br />
importância fundamental do primeiro<br />
‘mandamento’ deste livro: alargar o conceito de<br />
arquitetura à cidade (às ruas e às praças) e ao<br />
território (ao território artificial e à paisagem<br />
natural), incluindo não apenas os objetos<br />
excecionais, mas também a ‘arquitetura sem<br />
arquitetos’ (Rodofsky, 1964), produzida por um<br />
saber implícito, ainda que sem uma aparente<br />
‘intenção’ estética.<br />
Como Holanda nos lembra, o modo como tem<br />
sido abordada a relação entre arquitetura e<br />
comportamentos – o determinismo arquitetónico<br />
– enquadra-se normalmente em dois extremos<br />
opostos. Por um lado, os que acham que a<br />
arquitetura determina a sociedade, porventura<br />
seguindo o apelo modernista. Por outro lado,<br />
aqueles que defendem que a arquitetura é vazia<br />
de conteúdos sociais e que as opções da<br />
arquitetura não têm qualquer efeito sobre a vida<br />
diária das pessoas. O autor apela a uma<br />
abordagem mais informada desta questão,<br />
alertando para o facto de a arquitetura refletir<br />
igualdades e desigualdades sociais, contradições<br />
e conflitos. Para ilustrar isto mesmo recorre a três<br />
exemplos esclarecedores na cidade de Brasília – o<br />
comércio informal na Esplanada dos Ministérios,<br />
os vendedores ambulantes na Plataforma<br />
Rodoviária e a feira da Torre da TV – e ainda ao<br />
caso de uma área residencial em Islington,<br />
Londres, estudada por Hillier (1996). Holanda<br />
alerta ainda para o facto de a arquitetura ser um<br />
campo de possibilidades mas também um campo<br />
de restrições. Trata-se, no fundo, de tornar o<br />
arquiteto consciente de que as suas ações podem<br />
contribuir para o estabelecimento de uma cidade<br />
mais justa e de uma sociedade mais democrática<br />
– ou o contrário.<br />
Por fim, ‘10 mandamentos da arquitetura’<br />
coloca-nos um desafio fascinante: mudar o nosso<br />
enfoque da forma para o espaço. A ideia não é<br />
nova (desde o final dos anos 70 que Hillier,<br />
Hanson e tantos outros aderentes da Teoria da<br />
Sintaxe Espacial, a têm vindo a desenvolver) e é<br />
aparentemente simples, mas na realidade<br />
representa uma mudança de paradigma no modo<br />
como vemos e construímos os nossos edifícios e<br />
as nossas cidades. O desafio consiste assim em<br />
privilegiar os vazios, os ‘elementos-fim’ que são<br />
realmente estruturantes nas nossas cidades e nos<br />
nossos edifícios, ao invés dos cheios, os<br />
‘elementos-meio’, que dependem de convenções<br />
e ideologias (no sentido mais estrito do termo) de<br />
uma determinada sociedade e de um dado tempo<br />
e que, como tal, sofrem constantes alterações.<br />
Aceitar este novo paradigma significa aceitar a<br />
importância fundamental da rua (dos espaços<br />
exteriores de circulação) e da praça (dos espaços<br />
exteriores de permanência) nas nossas cidades;<br />
significa voltar a conformá-los com fachadas<br />
frontais (com rosto) e não com fachadas laterais<br />
(ombros) ou fachadas de fundo (costas); significa
50 Book Reviews<br />
ainda questionar, com base num conhecimento<br />
profundo da história, o modo como as<br />
‘arquiteturas contemporâneas’ elegem como seu<br />
objetivo último o desenho do edifício isolado e o<br />
desenvolvimento de uma linguagem dos<br />
‘elementos-meio’.<br />
Referências<br />
Hanson, J. (1988) ‘The ten commandements<br />
(for writing academic papers)’<br />
(http://eden.dei.uc.pt/~jcardoso/ForStudents/Wr<br />
itingPaper.pdf) consultado em 20 de Janeiro de<br />
2014.<br />
Hillier, B. (1996) Space is the machine<br />
(Cambridge University Press, Cambridge).<br />
Holanda, F. de (2010) Brasília – cidade moderna,<br />
cidade eterna (FAU UnB, Brasília).<br />
Holanda, F. de (2011) O espaço de exceção<br />
(FRBH, Brasília).<br />
Rudofsky, B. (1964) Architecture without<br />
architects. A short introduction to nonpedigreed<br />
architecture (Museum of Modern<br />
Art, Nova Iorque).<br />
Vítor Oliveira, CITTA – Centro de Investigação<br />
do Território, Transportes e Ambiente,<br />
Faculdade de Engenharia, Universidade do<br />
Porto, Rua Roberto Frias 4200-465, Porto,<br />
Portugal. Email: vitorm@fe.up.pt<br />
PNUM2015: Configuração urbana e os desafios da urbanidade<br />
A 4ª Conferência Anual da Rede Portuguesa de<br />
Morfologia Urbana (PNUM) realizar-se-á em<br />
Brasília, Brasil, a 25 e 26 de Junho de 2015.<br />
O título da conferência é ‘Configuração<br />
urbana e os desafios da urbanidade’ e os temas<br />
em debate são os seguintes: i) transformações<br />
urbanas recentes – novos impactos, novos<br />
desafios; ii) desigualdade socioespacial das<br />
cidades; iii) configuração urbana e patrimônio<br />
cultural; iv) o legado da cidade moderna; e, por<br />
fim, v) a urbanização total: tendências para a<br />
metápole.<br />
O call for abstracts será lançado em<br />
Outubro de 2014, sendo que os resumos deverão<br />
ser submetidos até 1 de Fevereiro de 2015. Os<br />
autores serão notificados acerca da aceitação do<br />
resumo até 6 de Abril, podendo enviar o artigo<br />
completo (opcional) até 31 de Maio de 2015. A<br />
data limite de inscrição no PNUM2015 é o<br />
primeiro dia da conferência, 25 de Junho. O<br />
website do PNUM2015 contendo informações<br />
detalhadas sobre a conferência, será lançado<br />
muito em breve.<br />
A Comissão Organizadora da conferência<br />
inclui: Gabriela Tenorio (Presidente), Frederico<br />
de Holanda, Valério Medeiros, Ana Barros, Liza<br />
Andrade, Cláudia Garcia e Mônica Gondim. A<br />
Comissão Cientifica do PNUM2015 inclui:<br />
Frederico de Holanda (Presidente), Décio<br />
Rigatti, Edja Trigueiro, Gabriela Tenorio, Jorge<br />
Correia, Luiz Amorim, Miguel Bandeira, Nuno<br />
Norte Pinto, Renato Saboya, Stael Pereira da<br />
Costa, Teresa Marat-Mendes, Valério Medeiros,<br />
Vinicius Netto e Vítor Oliveira.<br />
Figura 1. Brasília (Source: Rodrigo Studart Corrêa).
REDE PORTUGUESA DE MORFOLOGIA URBANA<br />
A Rede Portuguesa de Morfologia Urbana (PNUM) foi criada em 2010, em Hamburgo, como<br />
um grupo regional do International Seminar on Urban Form. Os objectivos do grupo são:<br />
promover e desenvolver o estudo da forma urbana; consolidar uma verdadeira rede de<br />
investigação no domínio da morfologia urbana, através da organização de reuniões e<br />
conferências, e da publicação da presente Revista; e, por fim, estabelecer uma relação<br />
privilegiada com o International Seminar on Urban Form, através da colaboração com<br />
iniciativas de debate e divulgação do ISUF. Para mais informações consultar o sitío do PNUM<br />
em: pnum.fe.up.pt/pt.<br />
Conselho Cientifico<br />
Presidente: Vítor Oliveira, Universidade do Porto, Portugal (2016)<br />
Membros: Frederico de Holanda, Universidade de Brasília, Brasil (2016)<br />
Jorge Correia, Universidade do Minho, Portugal (2015)<br />
Miguel Bandeira, Universidade do Minho, Portugal (2016)<br />
Nuno Norte Pinto, The University of Manchester, Reino Unido (2016)<br />
Stael de Alvarenga Pereira Costa, Universidade Federal de Minas Gerais,<br />
Brasil (2016)<br />
Teresa Marat-Mendes, Instituto Universitário de Lisboa, Portugal (2016)<br />
(As datas entre parentesis indicam o final do mandato)
3 Editorial<br />
5 F. Holanda<br />
O mundo das miudezas: Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB)<br />
15 N. Palma<br />
Estudos urbanos e geometria fractal<br />
25 G. Cataldi, G. L. Maffei e P. Vaccaro<br />
Saverio Muratori e a escola Italiana de tipologia projetual<br />
Perspetivas<br />
37 As origens da morfologia urbana e a geografia alemã V. Oliveira e C. Monteiro<br />
40 Extensões da forma A. Perdicoulis<br />
42 A ‘rua direita’ portuguesa: elemento estruturador ou designação toponímica? S. M. G. Pinto<br />
44 Gramáticas genéricas para o domínio da cidade e urbanismo J. Beirão<br />
Relatórios<br />
14 Criação da INTBAU Portugal R. Florentino<br />
24 Turkish Network of Urban Morphology T. Ünlü<br />
36 Chinese Network of Urban Morphology W. Ding<br />
Book reviews<br />
47 C. D. Coelho (2013) Os elementos urbanos T. Marat-Mendes<br />
48 F. Holanda (2013) 10 mandamentos da arquitetura V. Oliveira<br />
Notícias<br />
4 Urban Morphology<br />
13 ISUF2014: Our common future in Urban Morphology<br />
50 PNUM2015: Configuração urbana e os desafios da urbanidade