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JOS RODRIGUES DE PAIVA

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a Carlos a afirmativa de que “Um homem não é as evidências dos outros. É só e absolutamente<br />

a sua própria evidência.” (ibid., p. 135). Ora, aqui temos, muito antes de Aparição a<br />

antecipação do seu conceito metafísico: a evidência do ser a si mesmo. Em Manhã submersa<br />

a palavra surge algumas vezes ao longo do romance, mas sempre ou quase sempre<br />

com sentido denotativo, mas não destituída de uma certa carga emotiva ou inserida num<br />

contexto de emoção:<br />

“quando a camioneta entrou na curva donde há tanto eu sonhara com a aparição da minha<br />

terra, um súbito desalento, feito da noite e do meu desamparo, paralisou-me de medo<br />

ou de uma indiferença profunda.” (MS, p. 67) 1 – “Lembro-me bem da terra úmida,<br />

esponjosa de morrinha, dos troncos nus de inverno, escorrendo aguaceiro, das aparições<br />

fantásticas que atravessavam encapotadas a fumarada da névoa, [...].” (ibid., p. 95) –<br />

“O luar gelado entrava pelas grandes janelas, transfigurava tudo em aparições de espectros.”<br />

(p. 117) – “A fixidez de todo o interior da camioneta, deslizando sobre a rápida e<br />

sucessiva aparição das árvores, caminhos, casebres que saltavam à estrada, dava-me a<br />

sensação estranha de uma suspensão do tempo, [...].” (p.153-154) – “Uma dádiva sem<br />

margens abria o mundo todo à aparição das sombras.” (p. 156).<br />

Em Apelo da noite, logo à página 16, lê-se: “Repousa na almofada branca, Lídia.<br />

Lídia. Face esmaecida, lábios mudos, longos cabelos louros de aparição. Só nos olhos flutuava<br />

ainda uma memória vã de palavras.” 2 . E mais adiante: “A aparição da certeza revelava-se<br />

onde a não desejara, as palavras de Adriano eram agora como a publicação de um<br />

segredo que ela guardasse.” (ibid., p. 137). E ainda: “Quebrado, condescendentemente,<br />

deixava que o percorresse esse rio profundo, secreto de nascentes, aguardava a sua fugidia<br />

aparição nas palavras.” (p. 187). Um dos aspectos fundamentais na problemática filosófica<br />

de Aparição, a descoberta alarmada e violenta da morte e a conseqüente evidência de que a<br />

vida é fugazmente finita, também está em Apelo da noite, constituindo o grande motivo da<br />

angústia do seu protagonista. “Visitava-o a morte agora pela primeira vez, o seu absurdo, a<br />

sua violência como um estampido. Só tarde Lídia estaria bem morta: agora vivia ainda<br />

incrivelmente no timbre da sua voz, no seu riso como uma flor, quase só riso do olhar...”<br />

(AN, p. 18). Conhecer a vida sem a morte. Uma das indagações feitas a Adriano por um<br />

seu companheiro de luta política. Ao que ele afirma que “É preciso ver morrer alguém,<br />

1 Nesta, e nas subseqüentes transcrições, são meus os itálicos que destacam a palavra aparição.<br />

2 A edição utilizada, é, como já se sabe, a 1ª – Lisboa: Portugália, 1963. Também aqui, são meus os destaques<br />

em itálico.

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