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JOS RODRIGUES DE PAIVA

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obra como algo em constante evolução, uma típica work in progress com o que a expressão<br />

tem de preciso, e que só será encerrada com a morte do escritor. Esse elemento de permanência,<br />

sobretudo protagonizada por um “herói” único, é que levará Helder Godinho a propor<br />

a interpretação teórica da arquipersonagem 2 . Se se aproximarem romances tão distantes<br />

e tão díspares entre si quanto o são Mudança e Para sempre, as diferenças que os separam<br />

saltarão aos olhos, mas simultaneamente também poderão ser encontrados os elementos<br />

comuns – temas, símbolos, questionamentos, cenários que o processo de modificação<br />

não anulou. Alguns desses elementos são anteriores a Mudança – presentes ou vislumbrados<br />

nos romances da primeiríssima fase da escrita do autor, portanto em livros de problematização<br />

“menor” – mas é a partir de Mudança que este estudo se ocupará do problema<br />

que não é outro senão o da própria evolução da obra de Vergílio, na sua marcha constante,<br />

no seu constante progresso.<br />

Em Mudança Vergílio Ferreira inicia o seu gradual – ainda que rápido – afastamento<br />

da literatura de preocupações eminentemente sociais e políticas, principiando aí o aprofundamento<br />

da reflexão que viria a fazer – também gradualmente, passo a passo, tema a<br />

tema, romance a romance e também pelo ensaio e depois pelo diário – em torno de inquietantes<br />

questões de natureza existencial. Traço filosófico, mesmo metafísico que todavia<br />

não elimina ou subestima o estético, o poético, antes o valoriza, pois Vergílio Ferreira busca<br />

obsessivamente o “tom” adequado, em linguagem e atmosfera, para tratar cada questão,<br />

cada reflexão, cada livro. A fusão “pensamento/emoção”, “tema/arte-de-tratar-o-tema”, é<br />

algo de fundamental na escrita do romancista. Disto se tem uma percepção clara desde os<br />

primeiros livros e já por isto se poderia antever que seria muito breve a sua relação com a<br />

literatura social tal como a escreviam os autores portugueses de 40.<br />

Essa passagem do ideológico político para a idéia filosófica realizada a partir de<br />

Mudança, já toda a crítica vergiliana a viu e estudou detalhadamente, inclusive eu, no meu<br />

livro O espaço-limite no romance de Vergílio Ferreira 3 . Por isso, parece-me que não vale-<br />

Mourão se debruçou sobre ele em Conta-Corrente 6 (Sintra: Câmara Municipal de Sintra, 1990, p. 116-<br />

117).<br />

2 V. nota 8 da Introdução.<br />

3 V. O espaço-limite no romance de Vergílio Ferreira. Recife: Edições Encontro-Gabinete Português de<br />

Leitura, 1984. Originariamente este livro constituiu a dissertação de Mestrado que apresentei, em 1981,<br />

com o título de “Mudança”: romance-limite, ao Programa de Pós-Graduação em Letras e Lingüística da<br />

Universidade Federal de Pernambuco. Nele procurei demonstrar, com o detalhamento que me foi possível,<br />

a transição de V. F. do romance sócio-político de identidade neo-realista para a ficção de questionamentos<br />

existenciais e estéticos. Na análise, elementos como os temas (e toda uma vasta rede subsidiária de motivos<br />

temáticos), personagens, cenários, símbolos, estruturas romanescas foram cautelosamente consideradas no<br />

sentido de demonstrar essa evolução vergiliana pelo romance. Evolução e transição de uma dimensão ro-

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