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JOS RODRIGUES DE PAIVA

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metáfora representativa da modernidade técnica e tecnológica contida na exemplificação<br />

dada por Adorno a propósito do entrelaçamento do comentário com a ação, em Proust,<br />

significando que “o narrador ataca um elemento fundamental na sua relação com o leitor: a<br />

distância estética”. Inamovível no romance tradicional – diz ele – ela passa a variar “como<br />

as posições da câmara no cinema: ora o leitor é deixado fora, ora guiado, através do comentário,<br />

até o palco, para trás dos bastidores, para a casa das máquinas.” 66 As metáforas<br />

da câmera cinematográfica e da “casa das máquinas” vestem como luvas, quanto a determinados<br />

aspectos já expostos na análise destes três romances de Vergílio, de que venho<br />

tratando. E sobretudo a da “casa das máquinas” aponta também, como é óbvio, para o<br />

rompimento do “contrato” ficcional, o pacto desde sempre implícito entre autor e leitor,<br />

que finge aceitar como verdade a mentira contada no romance. A “casa das máquinas” do<br />

romance mostra ao leitor como ele é feito e como funciona o seu mecanismo, retirando-lhe<br />

o caráter ilusório da representação e acentuando-lhe a verdade de se estar diante de uma<br />

criação artística. Esse é o procedimento de Vergílio Ferreira, desde Estrela polar. Vê-se a<br />

“casa das máquinas” dos seus romances, mas o escritor ainda mais e melhor demonstra o<br />

seu “funcionamento” em alguns ensaios, algumas entrevistas e, sobretudo, no seu diário,<br />

onde é freqüente ler-se a respeito da sua concepção de romance e do seu processo de criação.<br />

As propostas e reflexões estéticas sobre a narrativa contemporânea feitas por Benjamin,<br />

Adorno e Döblin e praticadas na própria criação romanesca, além de também “pensadas”<br />

por Vergílio Ferreira, implicam a concepção de um romance novo que, superando a<br />

crise instalada sobre o gênero, ultrapassa mesmo as fronteiras – então já enfraquecidas – da<br />

própria ousadia moderna, apontando claramente para um novo estágio ou um novo passo<br />

ou uma nova direção do modernismo. É evidente o estranhamento causado pela idéia de<br />

um romance que se constrói sobre a impossibilidade de narrar. Como se estrutura e como<br />

se mantém ou se “sustenta” um tal romance enquanto narrativa? O que narra e como narra<br />

um romance como Signo sinal? É evidente que a resposta a tal pergunta deve ser buscada<br />

na leitura do próprio romance, mas voltando ao ensaio de Eduardo Prado Coelho já aqui<br />

largamente referido, no ponto em que dá continuidade à afirmação de que Signo sinal é<br />

“um romance em que não há nada para contar que tenha dimensão romanesca”, encontramos:<br />

66 ADORNO: op. cit., p. 272.

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