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3. SIGNO SINAL:<br />
Anoitece sobre o labirinto, sobre o mundo desmoronado e a sua (impossível)<br />
narrativa<br />
Se Nítido nulo é o romance “abstrato” para o qual o próprio Vergílio Ferreira defende<br />
essa qualidade ou característica fundamental, e se de algum modo Rápida, a sombra<br />
continua, do romance anterior, o mesmo sentido de “abstração” – embora em menor grau,<br />
porque ao final se verá que o materializa um texto a cuja “gestação” se assistiu durante<br />
toda a diegese –, Signo sinal, prosseguindo o caminho, apresenta-se tão abstrato quanto<br />
Nítido nulo, vindo a ser a configuração de um paradoxo enquanto narrativa da impossibilidade<br />
de narrar.<br />
Efetivamente, é isso que se tem em Signo sinal, uma espécie de metáfora da impossibilidade<br />
de narrar, que aponta, tanto para o domínio da estruturação formal do livro,<br />
quanto para o seu domínio temático. Signo sinal é o romance da desestruturação romanesca,<br />
tanto quanto o é da desestruturação (ou desconstrução) do mundo, de que a aldeia destruída<br />
por um terremoto é o símbolo. A representação de um mundo destruído e do projeto,<br />
dos esforços, das tentativas sempre frustradas para a sua reconstrução, reflete-se sobre o<br />
próprio “modelo” romanesco, sobre o processo de construção de um romance em que, segundo<br />
a afirmação de Eduardo Prado Coelho, “não há nada que contar que tenha dimensão<br />
romanesca.” 50 . Portanto, um romance “sem história”, um romance sem ação, que era já o<br />
que de há muito estava no horizonte estético de Vergílio Ferreira. Por várias vezes ele o<br />
afirmou em diversos espaços textuais, sobretudo em entrevistas e repetidamente ao longo<br />
da Conta-Corrente 51 . Sendo um romance em que “não há nada que contar” e portanto “sem<br />
ação” (no sentido tradicional desta categoria narrativa), há que se pensar em Signo sinal<br />
50 COELHO, Eduardo Prado. Signo sinal ou a resistência do invisível. In: _____ . A mecânica dos fluidos.<br />
Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1984, p. 59.<br />
51 Para exemplificação, basta este registro, selecionado dentre os inúmeros possíveis:<br />
[...] eu não escrevo “histórias”. Acho infantil, atrasado, o romance que conta uma “história”. Insuportável.<br />
Uma “anedota” – não. Deixei de fazê-lo há muito. Um romance impõe à nossa emoção, inteligência,<br />
uma situação, um problema, um instante de... numa pulverização da “anedota”, a recuperar<br />
não bem em narrativa mas em saldo emotivo. Construir histórias que se não possam “narrar”.<br />
Transpor a “história” imediata para a sua transfiguração. Não a história prosificada mas irrealizada<br />
em poesia. Não “contar”, mas “presentificar” uma situação. Não separá-la de mim, mas vivenciá-la,<br />
através de mim, com o leitor. Assim me não interessa “descrever” seja o que for, nomeadamente as<br />
emoções, mas vivê-las. (CC1, p. 165 – anotação de 24 de agosto de 1973).