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JOS RODRIGUES DE PAIVA

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207<br />

mais do que um processo de substituição, o que ocorrerá em Júlio será muito mais uma<br />

espécie de fusão das duas mulheres, a partir da simbolização conotada nos seus nomes.<br />

Helena, essa mulher do mar e do sol, responde por um nome grego, mediterrânico e carrega<br />

da Hélade toda uma reminiscência. Hélia, no seu nome, sugere o sol (Hélio). Ambas são<br />

louras e luminosamente belas, no auge da juventude de cada uma. Pouco a pouco esse processo<br />

de fusão entre as duas mulheres se vai insinuando no texto do romance, na representação<br />

de uma rememoração confusa, emocionada e por isso incerta, ambígua e fragmentária,<br />

que é como e por onde se desenvolve a diegese:<br />

[Helena] Era do Sul, da alegria marítima, da claridade solar. Tem sol no corpo de leite,<br />

no cabelo, usas agora o cabelo curto, nos olhos vivos, é solar o teu nome. Chama-se Hélia.<br />

(RS, p. 30).<br />

E com um traço de ironia para expressar o pesar e o desconforto da diferença de idade entre<br />

ele e a jovem amiga da filha,<br />

Meu Deus, porque me não fizeste perfeito nos sítios em que uma mulher nos reconhece<br />

a perfeição? Ou um pouco mais atrasado nas tuas contas dos nascimentos. (Ibid.).<br />

E mais adiante, na ocasião em que conheceu Hélia, que lhe fora apresentada pela filha<br />

num casual encontro de praia, observando-a no momento em que ela emergia das ondas:<br />

–Vem do fundo do mar?<br />

devo ter perguntado. Como perguntei a Helena. Porque a vida não dá para se<br />

perguntar muita coisa. Trazemos uma pergunta, vamos-lhe dando as resposta que podemos.<br />

[...]. Mas Hélia está aqui ao pé e eu tenho de ir dizendo coisas, enfeixadas, sutis,<br />

no percurso sutil de uma súbita clandestinidade. Um corpo tenro de leite, mon amour.<br />

Rútilo o rosto, gotas suspendem-se reluzentes dos cabelos, das pestanas, e os dentes claros,<br />

os olhos riem na violência da manhã. A camiseta molhada, transparente. Colada aos<br />

seios redondos róseos, velada doçura. E as coxas. Morenas, explodindo-me em força à<br />

violência das mãos. [...]. Hélia desdobra-se na graça infantil do rosto em cima, onde estou,<br />

e na firmeza do corpo para baixo onde estou também. Toda ela brinca na face uma<br />

inocência perversa que não é de lá. Eu alegro-me nos olhos e noutras partes visíveis, trilhado<br />

miudamente em sítios que se não vêem. (RS, p. 60-62).

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