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é presente, como à própria vida, falhada no presente e no passado, cerca a idéia de nulidade.<br />
Tudo é nulo, tudo é nada, tudo é e foi inútil. E a certa altura do romance associam-se,<br />
então os dois vocábulos, as partículas do título:<br />
Nítido nulo o horizonte e já frio, um deus cresce dentro de mim. É um deus poderoso,<br />
centro convergente da força do mar – ouço-o. [...]. E uma insinuada idéia, ou não é idéia<br />
– uma sugestão alada alta lateral como a luz das nuvens que vem do sol, uma insinuada<br />
idéia do primeiro homem em mim e do último, ali em pé, em frente ao oceano que é talvez<br />
maior do que o mar. [...].<br />
Estou só. E o universo à minha roda, poderoso e nulo. Há no centro disto uma verdade<br />
intensa e não a atinjo [...]. (NN, p. 281-282).<br />
O traço abstrato do título intensifica a idéia dessa “verdade intensa” que não se a-<br />
tinge. Uma verdade nítida mas nula ou, paradoxalmente, obscura. Como um universo “poderoso”<br />
e nitidamente nulo, no centro do qual está o homem. Na verdade o título do romance<br />
é apenas um elemento de uma estrutura mais ampla que haveria de identificar este<br />
livro de Vergílio não só como um romance abstrato (desde o título), mas também como um<br />
romance transgressor do seu próprio modelo, enquanto gênero, transgressor das convenções<br />
de construção romanesca que apesar da modernidade libertária ainda se mantêm,<br />
mesmo que só relativamente. Um romance que, pela transgressão, ultrapassa a própria i-<br />
dentificação com o moderno situando-se para além dele, enseja, obviamente, uma classificação<br />
do tipo “pós-moderno”, que, não sendo postulada nem mesmo desejada ou bem recebida<br />
pelo escritor, foi no entanto, em função de alguns romances – entre os quais Nítido<br />
nulo –, estabelecida por alguns dos seus críticos 29 .<br />
29 V. F. não postula para si nem para este seu romance (NN) a classificação de “pós-moderno”, expressão e<br />
conceito com os quais não simpatiza e a que foi mesmo avesso, assim se declarando por diversas ocasiões,<br />
no diário, em ensaios da série Espaço do invisível e em entrevistas. Em registro da Conta-Corrente – 4, a<br />
propósito de um artigo de Eduardo Prado Coelho sobre o “pós-modernismo”, ele assim se manifestou:<br />
[...]. E o que se diz nesse texto, militarizado de citações, é que depois do modernismo, que é o cansaço,<br />
o chateamento, a saturação do modernismo, não há o retorno a antes dele, que é o cansaço e<br />
tudo mais a dobrar. Assim, o que há é a flutuação, hesitação, derivação, neutro, ou seja cinza. O que<br />
há é o não se saber o que há. [...]. Eduardo Prado Coelho dá alguns exemplos portugueses do pósmodernismo.<br />
Merquior, que ele cita, dizia-me que um era Nítido nulo. Não há razão para me envaidecer<br />
[...]. (CC4, p. 155-156).<br />
Também Maria Alzira Seixo considera ser V. F. um romancista pós-moderno, sobretudo tomando-se em<br />
conta o romance Signo sinal (Cf. Vergílio Ferreira, os modernos, os pós-modernos e a questão das dominantes.<br />
In: _____ . Outros erros. Porto: Asa, 2001, p. 213-221). Entretanto, V. F. ratifica a sua opinião sobre<br />
o pós-modernismo: “Que é isso [...] do ‘pós-modernismo’? É a hora dos restos, dos desperdícios, do