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JOS RODRIGUES DE PAIVA

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180<br />

dos representantes mais autênticos e mais brilhantes, sendo precisamente aquele que<br />

marca o aparecimento de um universo autônomo de objetos, com sua própria estrutura e<br />

suas leis, e através do qual só se pode ainda exprimir, em certa medida, a natureza humana.<br />

16<br />

Obviamente o que mais nos importa nesta “hipótese” de Goldmann é a referência<br />

que ele faz à “dissolução do personagem” como característica de um período da “história<br />

das formas romanescas”, sendo também, entretanto, de anotar que, segundo ele, Nathalie<br />

Sarraute realiza disto “uma das suas manifestações mais radicais” e que Robbe-Grillet<br />

“marca o aparecimento de um universo autônomo de objetos.” Mais adiante, preparando-se<br />

para analisar a obra de Nathalie Sarraute, Goldmann de certo modo radicaliza: “ela pareceme<br />

[...] um escritor que exprime um aspecto essencial da realidade contemporânea numa<br />

forma para a qual criou, sem dúvida, uma nova modalidade, mas que é ainda a dos escritores<br />

do desaparecimento do personagem, Kafka, Musil, Joyce, de quem ela, aliás sofre a<br />

influência em várias instâncias.” 17 . A radicalização está no “desaparecimento” da personagem,<br />

que, por mais transformada que esteja em relação ao seu modelo clássico e tradicional,<br />

por mais extremo que seja o processo de “dissolução” a que as vanguardas romanescas<br />

a submetam continuará existindo (e portanto não pode “desaparecer”) como categoria indispensável<br />

à narrativa ficcional.<br />

Mais adiante, discorrendo sobre os romances de Robbe-Grillet, Goldmann refere a<br />

“passividade crescente, o caráter de “olheiros” que os indivíduos adquirem, progressivamente,<br />

na sociedade moderna, a ausência de participação ativa na vida social, aquilo que,<br />

na sua manifestação mais visível, os sociólogos modernos chamam a despolitização, mas<br />

que, no fundo, é um fenômeno muito mais fundamental que se poderia designar, numa<br />

graduação progressiva, por termos tais como: despolitização, dessacralização, desumanização,<br />

coisificação.” 18 .<br />

Observe-se que expurgada a carga histórico-sociológica e econômica de que as análises<br />

de Goldmann estão “contaminadas”, interessa, à aproximação com Vergílio Ferreira a<br />

“passividade crescente” de que se nota sofrerem (desde Carlos Bruno) as suas personagens<br />

mais dramaticamente existenciais; o “caráter de ‘olheiros’” de algumas delas (Alberto,<br />

16 GOLDMAN, op. cit., p. 180.<br />

17 Idem, ibidem, p. 181 (o itálico é meu).<br />

18 Idem, ibidem, p. 190. (Os itálicos são de Goldmann, mas é importante chamar a atenção para os termos<br />

“dessacralização”, “desumanização” e “coisificação” por extremamente adequados à problemática de Nítido<br />

nulo que enseja a reflexão que aqui está em curso).

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