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JOS RODRIGUES DE PAIVA

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ferro e de cimento” (ibid., p. 73) –. Já era, mais ou menos assim, em Mudança, o engenheiro<br />

Rui. Ele também, tal como Chico, carregado de certezas, de pragmatismo, de soli-<br />

de racionalidade e de ironia. O nouveau roman manifesta-se ainda, em Ale-<br />

dez material,<br />

gria breve, na quebra de convenções romanescas, como por exemplo, a inexistente segu-<br />

quanto às coisas narradas. A narração é carregada de incertezas quanto a<br />

rança do narrador<br />

fatos, datas, falas, participação de personagens em atos da ação. Já desde Estrela polar as<br />

incertezas do narrador se haviam instalado na narrativa como uma estranha maneira de<br />

contribuir para a sua estruturação, ou, ao inverso disso, para simular a sua desestruturação,<br />

tal como interessava ao movimento estético francês, para fazer a representação de um<br />

mundo desestruturado, passível de ser destruído – literalmente pulverizado – com toda a<br />

humanidade que o habita, ao simples premir de botões que deflagrassem o poder de terríveis<br />

máquinas de destruição.<br />

Na aproximação entre Alegria breve e o nouveau roman ainda se poderia invocar<br />

possíveis relações deste romance vergiliano com o cinema. Como se sabe, a experiência<br />

romanesca francesa guardou uma relação muito forte com a cinematografia, com alguns<br />

cineastas escrevendo narrativas ou preparando eles mesmos os roteiros dos seus filmes,<br />

alguns escritores fazendo a um tempo literatura e cinema, e alguns outros simplesmente<br />

tendo romances adaptados à linguagem cinematográfica. Alain Resnais, Marguerite Duras,<br />

Michel Butor, Nathalie Sarraute, Robbe-Grillet, Claude Simon são nomes que podem ser<br />

invocados para exemplificação. A técnica narrativa de Alegria breve parece ter claramente<br />

algo de cinematográfico, e isso, claro, independentemente da referência que o texto do roa<br />

certa altura faz à técnica do cinema, ou mais exatamente aos seus mance<br />

“truques”:<br />

Luis Barreto, de smoking, tem o copo de uísque na mão. [...]. Está sentado no extremo<br />

do sofá vermelho, [...]. Subitamente, não o vejo. Subitamente, o seu lugar está vazio, ou<br />

senta-se aí Ema, Vanda, mesmo o Padre Marques. Como num truque cinematográfico,<br />

saltam à minha frente, desaparecendo, revezando-se. Há uma conversa múltipla que pastrazer-me<br />

um livro e me falou do Carmo e da galeria 2. Há uma conversa múltipla e<br />

sa de uns para os outros, que passa mesmo pelo sujeito de bigode que veio a minha casa<br />

qualquer coisa indivisível que a atravessa em ziguezague e é a minha voz. (AB, p. 92, i-<br />

tálico meu).<br />

Mas não se limitam a esta sugestão de “truques” as possíveis relações de Alegria<br />

breve com a narrativa cinematográfica, sendo importante atentar para a valorização das<br />

imagens no texto do romance, e nelas um certo toque expressionista, as grandes

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