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que era verdade. É absurdo, nunca tinha achado que fosse verdade. Que é que queria isso<br />
dizer? (Ibid.).<br />
Jaime tivera com Águeda, sua mulher, um filho a quem ela pôs o seu nome (“Vou<br />
ter um filho. Terá o teu nome e o do António, se for um rapaz.” – p. 41), mas Antônio Jaime<br />
(como se chamou à criança) morreu aos três anos. E é o outro filho, aquele de concepção<br />
e nascimento extraordinários – que Vanda decerto terá tido, mas longe – que Jaime<br />
espera com a certeza da sua vinda. É a espera paciente e profética de uma vinda messiânica.<br />
Sempre fundamental na complexa problemática suscitada por Vergílio Ferreira em<br />
torno dos elementos identificadores da pessoa, e não só, a questão dos nomes mais uma<br />
vez reaparece em Alegria breve, numa dimensão que ultrapassa a do nome do filho do pro-<br />
também nas atitudes, no que diz e no que pensa: “– Nasci para escandalizar [...]. É o<br />
tagonista. Jaime, que nada faz para mudar o destino da aldeia e nem mesmo o seu próprio,<br />
chama-se Jaime Faria (mas não fez). Aristides – o engenheiro – “um nome mal feito e sem<br />
préstimo” [...], que “não é nada, não diz nada.” (AB, p. 60) 44 . Verdial – o pai de Águeda –<br />
é um nome ridículo para um homem ridículo, um homem “verde” mesmo quando já velho,<br />
presunçoso de um vasto conhecimento que julga equivocadamente possuir. Vedor é um<br />
nome estranho (que significado terá?, aquele que vê?). É um nome aproximável de Médor,<br />
o cão que “tinha um nome literário”. E o que significará Médor? Uma referência mitológica<br />
ou um anagrama de “dorme”? O cão Médor dormirá para sempre, executado pelo tiro<br />
disparado por Jaime para livrar o mundo de uma presença inferior, velha e doente. Importância<br />
maior parecem ter os nomes das mulheres: “Vanda! Teu nome. Como um vento do<br />
norte.” (p. 20). E como esse vento longínquo Vanda desaparecerá para ter o seu filho a<br />
uma distância desconhecida. Ema tem alguma coisa que relembra Elsa, e não só no nome,<br />
mas<br />
único modo de se estar vivo. [...]. / Tudo o que é vivo é escandaloso / porque a morte é o<br />
estado normal do homem, / – quero dizer: vulgar.” (AB, p. 169). Elsa diz em algum lugar:<br />
“ Nasci para passar”. E esta irmandade de Ema com o escândalo de estar viva, fala de imediato<br />
à sensibilid ade de Jaime: “Imediatamente senti que alguma coisa estalava em mim.<br />
Imediatamente senti que Ema existia a meu lado” (ibid.). Elsa é um nome que sugere leveza<br />
e fluidez, ausência de peso, movimentos rápidos para o infinito... como devem ser os de<br />
44 Interessante notar, na mesma passagem do romance, a seguinte reflexão sobre a questão do nome: “Há<br />
nomes que servem , que são funcionais, que se adaptam às pessoas e as vestem e as moldam. Há outros que<br />
mesmo sem servirem, mesmo antes de emprego, já têm uma função. São nomes magros ou gordos, delicados<br />
e rudes, melífluos e grosseiros, claros e escuros. Mas<br />
Aristides não é nada, não diz nada.” (AB, p. 60).