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JOS RODRIGUES DE PAIVA

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nascer e que vai integrar a sua personalidade profunda. “Eis porque uma alcunha – diz<br />

Vergílio Ferreira – normalmente nos ofende, mesmo que a constitua um nome vulgar: o<br />

nosso verdadeiro nome é ainda a nossa pessoa, darem-nos outro é pretender-se que não<br />

sejamos nós.” (IMC, p. 289). Esta reflexão diretamente se relaciona com aspectos de Estrela<br />

polar e com a significatividade dos nomes escolhidos pelo romancista para identificar as<br />

suas personagens. Poderíamos começar a pensar na semelhança existente entre os nomes<br />

Aida e Alda e entre Alberto (de Aparição) e Adalberto. Aida e Alda, personagens, são idênticas<br />

até ao extremo da impossibilidade (para Adalberto) da identificação entre uma e ou-<br />

de início ele se aproxima amorosamente, mas Alda vai-se-lhe impondo<br />

tra. É de Aida que<br />

ao longo das ocorrências de equívocos de reconhecimento. Após a morte de Alda (que A-<br />

dalberto julgou ser Aida) ocorrida acidentalmente no naufrágio de um barco em passeio<br />

numa temporada de praia, é com Aida que Adalberto casa, mas julgando casar com Alda.<br />

O engano foi mantido por muito tempo, até o nascimento do filho (a quem Adalberto pôs o<br />

seu nome, para ainda mais ser a continuidade de si). Mas não se manteve por muito mais<br />

tempo, porque Aida o não pôde suportar, dando-se a reconhecer, num momento que era<br />

para ela de extrema tensão:<br />

– Que sabes tu de mim? Que sabes tu das outras pessoas?<br />

– Alda!<br />

– Não digas sempre “Alda”!<br />

– Mas se é o teu nome...<br />

Ela então pôs-se de pé:<br />

– Estou farta, farta!<br />

Falava em voz surda para me julgar desde um tempo muito antigo:<br />

quando através dos olhos a sentimos a fulgir sobre nós, aquela intrigante totalidade que está ali na<br />

pessoa que vemos, aquele princípio de si que é inimaginável que não esteja vivo porque nos perguntamos<br />

invencivelmente “onde está?”... (IMC, p. 77, itálico da citação).<br />

18-Janeiro (domingo) [1981]. Que misteriosa é esta coisa de se ser uma “pessoa”. Aparição<br />

e Estrela polar falam disso. Mas de vez em quando e subitamente o mistério ataca-me de todo o lado<br />

e suspende-me a respiração. Como é que estabelecemos uma relação com alguém? Que é que define<br />

e identifica esse alguém? A que é que de uma pessoa nos dirigimos? Com quê dela estabelecemos<br />

relações? Que é que emerge de todas elas e é ela e a isso que amamos, odiamos, estabelecendo<br />

toda a sorte de correspondências? Porque uma pessoa não é o feitio do corpo, a face, o modo de falar,<br />

de gesticular de realizar toda a infinita maneira de se manifestar. A pessoa dir-se-ia mesmo que<br />

não é a pessoa, porque com a pessoa nós identificamos o somatório dos mil aspectos que a continuem.<br />

A última e definitiva realidade dela, aquilo dela com que estabelecemos as nossas relações é o<br />

indizível dela, que é aquilo para que falamos, que sentimos que ela é, a indefinível presença que está<br />

nela, o “espírito” que isso anima e está antes disso e sobressai disso e é a coisa única que é ela e com<br />

quem nos confrontamos, dialogamos, a quem amamos ou detestamos. (CC3, p. 218-219).

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