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JOS RODRIGUES DE PAIVA

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da diegese sustenta-se na peculiaridade da concepção, na legibilidade do processo. As difilê<br />

são facilmente superáveis, sendo tudo uma questão de adequação de<br />

culdades de quem<br />

“registros” de leitura apontados para um romance moderno, creditando-se os resultados a<br />

uma “poética” romanesca exercitada pelo escritor. Sobretudo o espaço urbano de Évora – a<br />

sua geografia, a sua topografia, a sua arquitetura, os seus monumentos, o seu dédalo de<br />

ruas e praças – é intensamente real, e, ainda que toda a cidade, no romance, tenda para a<br />

mitificação graças à forte carga poética com que é representada sob um véu noturno de<br />

saudade e de amargor do tempo e das perdas decorridas, da emoção de uma memória que<br />

evoca para a escrita, ainda assim, a representação dessa cidade-mito é a representação de<br />

uma cidade-real. 24 Representação realista ou mesmo naturalista, que permite ao leitor do<br />

romance realizar, na cidade, as deambulações urbanas de Alberto e das demais personagens<br />

25 .<br />

24 Também a este respeito é proveitosa a leitura dos estudos de Maria Joaquina Nobre Júlio e Fernando Martinho<br />

citados na nota anterior, além da obra de J. L. Gavilanes Laso, Vergílio Ferreira: espaço simbólico e<br />

metafísico. O próprio V. F. se pronunciou sobre as questões do espaço nos seus romances e da construção<br />

de personagens, particularmente em Aparição, em depoimentos, registros e entrevistas, notadamente em<br />

Um escritor apresenta-se (p. 209) e em diversas passagens do seu diário (p. ex.: CC3, p. 75-76).<br />

25 O arquiteto A. Campos Matos, estudioso da obra de Eça de Queirós sobretudo no que diz respeito ao espaço<br />

e às imagens nesse espaço, assunto de obra sua – Imagens do Portugal queirosiano –, chegou a elaborar<br />

o projeto de um livro semelhante sobre Aparição. Vergílio Ferreira falou disso em Conta-Corrente 3:<br />

Passei quase toda a manhã com o arquiteto Campos Matos, às voltas com um seu projeto que me diz<br />

respeito. Campos Matos realizou há tempos um livro curioso. Lembrou-se ele de fotografar os locais<br />

mencionados na obra de Eça e acompanhar as fotografias do respectivo texto do escritor. O resultado<br />

é delicioso. A gente olha a fotografia e depois põe-se a imaginar o que é que o Eça diria a propósito.<br />

Lemos em seguida o que disse e descobrimos com surpresa os caminhos da sua sensibilidade.<br />

Ora bem, Campos Matos lembrou-se de fazer coisa idêntica com os locais de Évora e os textos respectivos<br />

do meu Aparição. E toda a manhã andámos às voltas pela planta enorme da cidade que ele<br />

plantara numa parede, para tecermos a rede do meu percurso. Os nomes das ruas não coincidiam<br />

com os do livro, porque eu adotara sempre a denominação usual e não a da legalidade. E isso lhe a-<br />

trapalhou os movimentos. Rua da Selaria, dos Infantes e outras não estavam assim no mapa. No fim,<br />

fiquei com uma rede de traçados que foi onde aprisionei as personagens e eu mal sabia. Porque no<br />

livro a rede é invisível e só é visível cada traço de um percurso. (CC3, p. 274).<br />

O próprio Campos Matos relembrará o assunto, mais tarde, num texto de evocação pessoal:<br />

Conheci-o [...] em casa de amigos comuns, [...]. Não demorou muito a comunicar-me quan-<br />

queirosiano. Por vezes, foi-me dizendo, tapava com a mão cer-<br />

to apreciara as Imagens do Portugal<br />

tas legendas dos textos de Eça, imaginando o que escreveria sobre aquela paisagem natural ou urbana.<br />

Disse-me ainda que, dos romances que publicara, o que mais merecia um trabalho como o<br />

das Imagens era Aparição, porque Évora desempenhava aí um papel primordial. Como resultado<br />

desta conversa, [...] , apressei-m e a reler a Aparição.<br />

[...].<br />

E não tardo u que nos encontrássemos um dia debruçados sobre uma enorme planta de Évora<br />

a demarcar a geografia real da Aparição e as moradas do seu autor na cidade. Enviei-lhe depois<br />

um texto que deveria servir como introdução a esse trabalho. Começou então a procura de um editor<br />

para o que poderia ser um belo álbum de imagens da Évora do seu romance, [...] mas para grande

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