A vacina da gripe - Ordem dos Farmacêuticos
A vacina da gripe - Ordem dos Farmacêuticos
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Director: J. A. Aran<strong>da</strong> <strong>da</strong> Silva<br />
Boletim do CIM<br />
Julho/Agosto<br />
centro de informação do medicamento<br />
ORDEM DOS FARMACÊUTICOS<br />
2006<br />
A <strong>vacina</strong> <strong>da</strong> <strong>gripe</strong><br />
Os vírus Influenza pertencem à família Orthomyxoviri<strong>da</strong>e,<br />
vírus com envelope, de ARN em cadeia simples segmenta<strong>da</strong>,<br />
1 contendo à sua superfície duas glicoproteínas, a<br />
hemaglutinina (HA) e a neuramini<strong>da</strong>se (NA). A família é<br />
composta por quatro géneros diferentes: A, B, C e Thogoto,<br />
2 sendo os tipos A e B particularmente importantes<br />
por estarem associa<strong>dos</strong> à ocorrência de pandemias e<br />
epidemias humanas. Os vírus do tipo A são ain<strong>da</strong> classifica<strong>dos</strong><br />
em subtipos, com base nas características antigénicas<br />
<strong>da</strong> HA e <strong>da</strong> NA. A hemaglutinina é responsável<br />
por mediar a ligação <strong>da</strong> partícula viral aos receptores <strong>da</strong><br />
célula hospedeira e por promover a libertação do ARN<br />
viral através <strong>da</strong> fusão membranar. 3 A neuramini<strong>da</strong>se é<br />
de vital importância no ciclo de replicação <strong>dos</strong> vírus Influenza.<br />
Facilita a libertação <strong>da</strong> progenia de viriões <strong>da</strong>s<br />
células infecta<strong>da</strong>s, previne a sua agregação e permite a<br />
penetração <strong>dos</strong> vírus através do muco protector <strong>da</strong>s vias<br />
respiratórias. 4 Actualmente são conheci<strong>dos</strong> 16 subtipos<br />
de HA e 9 subtipos de NA. 3<br />
Os vírus Influenza, sobretudo os vírus do tipo A, são caracteriza<strong>dos</strong><br />
por uma eleva<strong>da</strong> taxa de alteração <strong>da</strong>s suas<br />
características antigénicas. Pode acontecer que estas<br />
mutações originem proteínas suficientemente diferentes<br />
para que não sejam reconheci<strong>da</strong>s pelos anticorpos do<br />
hospedeiro, evitando a neutralização <strong>dos</strong> vírus e resultando<br />
numa nova variante capaz de causar doença. 5,6 Este<br />
é o tipo de alteração mais frequente, responsável pelas<br />
vulgares <strong>gripe</strong>s e pela necessi<strong>da</strong>de de revisão anual <strong>da</strong><br />
composição <strong>da</strong>s <strong>vacina</strong>s. A segun<strong>da</strong> alteração é menos<br />
frequente e conduz a alterações antigénicas significativas. 6<br />
Surge quando dois vírus diferentes, na maioria <strong>dos</strong> casos<br />
provenientes de espécies hospedeiras diferentes, infectam<br />
conjuntamente um único hospedeiro, que funciona<br />
como “vaso de mistura”. 5 Forma‐se então um novo vírus,<br />
resultado <strong>da</strong> recombinação entre segmentos de ambos os<br />
genomas. Este novo vírus possui uma patogenici<strong>da</strong>de imprevisível,<br />
podendo ter a capaci<strong>da</strong>de de causar epidemias<br />
ou mesmo pandemias devido à ausência de imuni<strong>da</strong>de <strong>da</strong><br />
população. As pandemias e epidemias ocorri<strong>da</strong>s no último<br />
século resultaram deste tipo de acontecimento. A primeira<br />
pandemia e mais conheci<strong>da</strong> ocorreu em 1918‐1919 e ficou<br />
conheci<strong>da</strong> como “<strong>gripe</strong> espanhola”. Foi causa<strong>da</strong> por um<br />
vírus H1N1 e causou a morte a pelo menos 40 milhões de<br />
pessoas. Outras pandemias de menor severi<strong>da</strong>de ocorreram<br />
em 1957 (“<strong>gripe</strong> asiática”, causa<strong>da</strong> por vírus H2N2),<br />
em 1968 (“<strong>gripe</strong> de Hong Kong”, causa<strong>da</strong> por vírus H3N2)<br />
e em 1977 (“<strong>gripe</strong> russa”, causa<strong>da</strong> por vírus H1N1). 3,7<br />
Desde 1947 a Organização Mundial de Saúde (OMS)<br />
monitoriza a activi<strong>da</strong>de <strong>dos</strong> vírus Influenza através <strong>da</strong><br />
avaliação de <strong>da</strong><strong>dos</strong> epidemiológicos colhi<strong>dos</strong> em 110<br />
centros Influenza espalha<strong>dos</strong> por 82 países e 4 centros<br />
de colaboração <strong>da</strong> OMS, localiza<strong>dos</strong> em Atlanta (EUA),<br />
Londres (Reino Unido), Melbourne (Austrália) e Tóquio<br />
(Japão). 8 A monitorização tem por base análises antigénicas<br />
e genéticas <strong>da</strong>s estirpes virais circulantes e serve<br />
de fun<strong>da</strong>mento à escolha <strong>da</strong>s estirpes de vírus Influenza<br />
a integrarem a <strong>vacina</strong> para uma determina<strong>da</strong> época.<br />
A vAcinA interpAnDémicA<br />
A <strong>vacina</strong>ção é uma <strong>da</strong>s formas mais eficazes de controlo <strong>da</strong><br />
<strong>gripe</strong>, mas a sua eficácia é reduzi<strong>da</strong> no caso de as estirpes<br />
virais que a compõem serem diferentes <strong>da</strong>s circulantes.<br />
Assim, e tendo por base as estirpes virais que circularam<br />
durante a época anterior (no caso do Hemisfério Norte,<br />
período que vai de Outubro a Janeiro/Fevereiro), a OMS<br />
emite em Fevereiro de ca<strong>da</strong> ano as recomen<strong>da</strong>ções para a<br />
composição <strong>da</strong>s <strong>vacina</strong>s contra a <strong>gripe</strong> <strong>da</strong> época seguinte.<br />
Após a emissão <strong>da</strong>s recomen<strong>da</strong>ções pela OMS segue‐se<br />
um período em que são desenvolvi<strong>da</strong>s e testa<strong>da</strong>s diversas<br />
estirpes de vírus de eleva<strong>da</strong> capaci<strong>da</strong>de de crescimento,<br />
potencialmente utilizáveis na produção de <strong>vacina</strong>s. Com<br />
base na informação <strong>da</strong> OMS e <strong>dos</strong> 4 centros de colaboração<br />
<strong>da</strong> OMS, relativamente à capaci<strong>da</strong>de de crescimento<br />
<strong>da</strong>s estirpes virais, às suas características antigénicas e<br />
ain<strong>da</strong> a <strong>da</strong><strong>dos</strong> de estu<strong>dos</strong> serológicos, a Agência Europeia<br />
de Medicamentos (EMEA) emite as recomen<strong>da</strong>ções<br />
sazonais para a composição <strong>da</strong>s <strong>vacina</strong>s, após o que são<br />
forneci<strong>da</strong>s as estirpes de referência aos produtores para<br />
a produção <strong>da</strong>s mesmas. Assim, a composição aprova<strong>da</strong><br />
para a época 2006/2007 é a seguinte:<br />
A/New Caledonia/20/99 (H1N1);<br />
A/Wisconsin/67/2005 (H3N2);<br />
B/Malaysia/2506/2004.<br />
As <strong>vacina</strong>s contra a <strong>gripe</strong> habitualmente utiliza<strong>da</strong>s são<br />
<strong>vacina</strong>s inactiva<strong>da</strong>s, podendo ser de virião total, virião<br />
fragmentado, ou de antigénios de superfície. Independentemente<br />
do tipo, a sua composição deverá obedecer<br />
às recomen<strong>da</strong>ções <strong>da</strong> OMS e <strong>da</strong> EMEA, e terá de ser anualmente<br />
avalia<strong>da</strong> e autoriza<strong>da</strong> pela autori<strong>da</strong>de nacional,<br />
o INFARMED.<br />
Apesar de nem sempre associa<strong>da</strong> a um diagnóstico correcto,<br />
as infecções por vírus Influenza são responsáveis por<br />
uma taxa de mortali<strong>da</strong>de anual nos países desenvolvi<strong>dos</strong><br />
superior à origina<strong>da</strong> por to<strong>da</strong>s as outras doenças respiratórias<br />
em conjunto. 9 Encontra‐se descrita uma eficácia <strong>da</strong><br />
<strong>vacina</strong> contra a <strong>gripe</strong> entre 70‐90%, em indivíduos adultos,<br />
para <strong>vacina</strong>s contendo estirpes idênticas às circulantes. 8
Julho/Agosto 2006 Boletim do CIM<br />
No Hemisfério Norte as <strong>vacina</strong>s são normalmente administra<strong>da</strong>s<br />
entre Outubro e Novembro de ca<strong>da</strong> ano, tendo<br />
os seguintes grupos populacionais como alvo: 10<br />
crianças <strong>dos</strong> 6 aos 23 meses e pessoas com i<strong>da</strong>de superior<br />
a 65 anos;<br />
pessoas com doenças crónicas <strong>dos</strong> sistemas pulmonar<br />
e cardiovascular;<br />
pessoas que possam vir a estar grávi<strong>da</strong>s durante a<br />
época habitual de <strong>gripe</strong>s;<br />
residentes de instituições prestadoras de cui<strong>da</strong><strong>dos</strong> de<br />
saúde, independentemente <strong>da</strong> sua i<strong>da</strong>de;<br />
pessoas ou crianças que necessitaram durante o decorrer<br />
do ano anterior de cui<strong>da</strong><strong>dos</strong> médicos ou hospitalização<br />
devido a desordens metabólicas crónicas, disfunção<br />
renal, hemoglobinopatias ou imunossupressão;<br />
crianças e adolescentes (6 meses‐18 anos) que receberam<br />
terapia prolonga<strong>da</strong> com ácido acetilsalicílico, e<br />
assim em risco de desenvolverem o síndroma de Reye<br />
após infecção pelo vírus Influenza.<br />
A vAcinA pAnDémicA<br />
Enquanto a composição <strong>da</strong>s <strong>vacina</strong>s interpandémicas tem<br />
por base uma previsão <strong>da</strong>s estirpes que irão circular na<br />
época seguinte, no caso <strong>da</strong> <strong>vacina</strong> pandémica essa previsão<br />
é impossível pelo facto de se desconhecer qual irá<br />
ser a estirpe (ou estirpes) pandémica. Existem actualmente<br />
algumas estirpes potencialmente pandémicas, cujo<br />
reservatório habitual são as aves aquáticas mas que, ao<br />
transporem a barreira <strong>da</strong>s espécies, se tornam altamente<br />
patogénicas para o Homem. Exemplos são as estirpes<br />
H5N1 ou H7N7, que até à <strong>da</strong>ta causaram 62 mortes. 2<br />
Os desenvolvimentos na produção de <strong>vacina</strong>s pandémicas<br />
conduziram no final de 2005/início de 2006 à submissão,<br />
para apreciação pela EMEA, de dois <strong>dos</strong>siês de <strong>vacina</strong>s<br />
pandémicas. 11,12 Ambos seguiram o procedimento recentemente<br />
instituído ao nível <strong>da</strong> Agência Europeia, de avaliação<br />
e aprovação de um “core <strong>dos</strong>sier” pandémico em<br />
período interpandémico. A esta etapa seguir‐se‐á, em caso<br />
de pandemia, uma aprovação rápi<strong>da</strong> <strong>da</strong> <strong>vacina</strong> pandémica<br />
basea<strong>da</strong> na submissão de uma variação pandémica (alteração<br />
<strong>da</strong>s estirpes). Este processo é baseado na produção<br />
de uma <strong>vacina</strong> “mock‐up”, <strong>vacina</strong> que tem o mesmo sistema<br />
de produção <strong>da</strong> <strong>vacina</strong> pandémica, o mesmo conteúdo<br />
em antigénios, o mesmo adjuvante e igual forma<br />
de administração. Os antigénios desta <strong>vacina</strong> deverão ser<br />
diferentes <strong>dos</strong> correntemente em circulação de modo a<br />
simular uma situação em que a população não se encontra<br />
imune. 13 O objectivo deste procedimento é o de agilizar o<br />
processo de autorização <strong>da</strong>s <strong>vacina</strong>s em caso de pandemia.<br />
Existem actualmente em desenvolvimento 31 <strong>vacina</strong>s pandémicas<br />
de diferentes tipos (inactiva<strong>da</strong>s com antigénios de<br />
superfície, de virião total, de virião fragmentado, e vivas<br />
atenua<strong>da</strong>s), com produção em sistema celular ou recorrendo<br />
à forma mais tradicional (em ovos embriona<strong>dos</strong>), contendo<br />
ou não adjuvante, 14 à espera <strong>da</strong> próxima pandemia.<br />
OS AntivirAiS<br />
A alternativa à prevenção é a terapêutica, e no caso <strong>da</strong>s<br />
infecções por Influenza, a utilização de agentes antivirais.<br />
Existem duas classes de agentes antivirais: os inibidores<br />
M2 e os inibidores <strong>da</strong> neuramini<strong>da</strong>se. Os inibidores M2, de<br />
que são exemplos a amantadina e rimantadina, actuam<br />
por inibição <strong>da</strong> replicação <strong>dos</strong> vírus, através do bloqueio<br />
<strong>da</strong> activi<strong>da</strong>de do canal iónico M2. 15 Têm a desvantagem<br />
de se limitarem ao tratamento <strong>da</strong>s infecções por vírus tipo<br />
A e causarem alguns efeitos secundários, nomea<strong>da</strong>mente<br />
neurológicos. Os inibidores na neuramini<strong>da</strong>se, como o<br />
zanamivir e o oseltamivir, encontram‐se indica<strong>dos</strong> para<br />
o tratamento de infecções por vírus quer do tipo A, quer<br />
B. Ao inibirem a acção <strong>da</strong> neuramini<strong>da</strong>se, previnem a libertação<br />
<strong>dos</strong> vírus <strong>da</strong>s superfícies celulares e impedem a<br />
sua movimentação através <strong>da</strong>s mucosas. 16 Os fármacos<br />
antivirais não devem substituir as <strong>vacina</strong>s como medi<strong>da</strong><br />
preventiva primária contra o vírus Influenza, mas são<br />
recomen<strong>da</strong><strong>dos</strong> em algumas situações de saúde pública<br />
como adjuvantes à <strong>vacina</strong>ção. Em caso de pandemia, estes<br />
fármacos ganham particular importância; num cenário<br />
em que não haja disponibili<strong>da</strong>de de <strong>vacina</strong>s para to<strong>da</strong> a<br />
população, ou em caso de ineficácia <strong>da</strong>s mesmas, serão<br />
certamente um recurso viável.<br />
Como foi anteriormente referido, as <strong>vacina</strong>s são a forma<br />
mais eficaz de prevenir a infecção por vírus Influenza. As<br />
<strong>vacina</strong>s sazonais contra a <strong>gripe</strong> são vendi<strong>da</strong>s em farmácias,<br />
mediante apresentação de receita médica. O papel do<br />
farmacêutico passará não só por aconselhar a <strong>vacina</strong>ção a<br />
determina<strong>dos</strong> grupos de risco, como forma eficaz de evitar<br />
a disseminação <strong>da</strong>s infecções causa<strong>da</strong>s por estes agentes,<br />
mas também eventualmente por avaliar a necessi<strong>da</strong>de/<br />
adequabili<strong>da</strong>de dessa <strong>vacina</strong>ção, nomea<strong>da</strong>mente tendo<br />
em consideração a época do ano mais adequa<strong>da</strong>.<br />
Alexandra Safara inverno 1 , Helder mota‐Filipe 2<br />
1<br />
Bióloga, Lab. Biologia e Biotecnologia (INFARMED)<br />
2<br />
Farmacêutico, Prof. Farmacologia (FFUL)<br />
e Vice‐Presidente CA (INFARMED)<br />
Bibliografia<br />
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(acedido a 07.08.06).<br />
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16. Macdonald S.J.F., et al. J Med Chem, 2005; 48: 2964‐2971.
A <strong>gripe</strong> constitui um grande problema de saúde pública. 1<br />
É uma doença altamente infecciosa que pode causar morbili<strong>da</strong>de<br />
e mortali<strong>da</strong>de significativas, 2 bem como grandes<br />
per<strong>da</strong>s económicas, 1,3 resultantes tanto do uso de recursos<br />
de saúde, como de per<strong>da</strong>s de produtivi<strong>da</strong>de. 3<br />
O vírus influenza (VI) pertence à família Orthomyxoviri<strong>da</strong>e<br />
<strong>dos</strong> vírus ARN. 1,4 Os 3 tipos mais importantes são A,<br />
B e C; 5,6 os VI de tipo A são geralmente responsáveis por<br />
infecções mais graves do que os VI de tipo B; o de tipo C<br />
provoca apenas uma sintomatologia benigna. O VI de tipo<br />
A é o único que possui subtipos, caracteriza<strong>dos</strong> consoante<br />
as proprie<strong>da</strong>des antigénicas <strong>da</strong>s duas glicoproteínas de<br />
superfície, 5 a hemaglutinina e a neuramini<strong>da</strong>se. 1,4,5<br />
O VI transmite‐se por meio de inalação de gotículas de<br />
secreções respiratórias infecta<strong>da</strong>s, 2,5,7,8 por contacto directo,<br />
ou indirecto através de autoinoculação no tracto<br />
respiratório superior ou mucosa conjuntival. 7,8 Após um<br />
período de incubação de 1 a 2 dias, os sintomas iniciam‐<br />
‐se abruptamente 4 pela aparição de febre, tosse, dores<br />
musculares, cefaleias 2,4,5 arrepios, 4,5 dor de garganta, rinite,<br />
astenia, 2,5 anorexia e mal‐estar. 4<br />
Na maioria <strong>dos</strong> casos a doença é autolimita<strong>da</strong>; 4 contudo,<br />
a <strong>gripe</strong> pode acarretar uma eleva<strong>da</strong> incidência de morbili<strong>da</strong>de<br />
e mortali<strong>da</strong>de em populações como crianças muito<br />
novas, 4,5,7 indivíduos com mais de 65 anos, 1,5,7 grávi<strong>da</strong>s, 4<br />
indivíduos com patologias crónicas do sistema respiratório,<br />
cardiovascular, endócrino ou imunitário, 1,4,5,7 com<br />
doença crónica renal 1,5,7 ou hepática, 1 doença neoplásica,<br />
1,5 doentes transplanta<strong>dos</strong> ou com doença crónica do<br />
tecido conjuntivo. 1 As complicações são principalmente<br />
de natureza respiratória 5,7 – pneumonia viral primária 4<br />
ou bacteriana secundária 1,4 e os doentes crónicos podem<br />
sofrer um agravamento <strong>da</strong> sua patologia. 5,7<br />
Existem 2 classes de fármacos que interferem com o VI:<br />
os inibidores <strong>da</strong> proteína M2 (IM2) – amantadina e rimantadina,<br />
e os inibidores <strong>da</strong> neuramini<strong>da</strong>se (INA) – zanamivir<br />
e oseltamivir. 1,4,7,9,10<br />
inibiDOreS DA prOteínA m2<br />
Inibem a função <strong>da</strong> proteína M2, que permite a entra<strong>da</strong><br />
de iões H+ dentro do vírus, 1,2 necessários para a libertação<br />
do seu genoma a partir <strong>da</strong> célula infecta<strong>da</strong>. 4,5 O canal<br />
iónico do VI de tipo B é estruturalmente diferente e por<br />
isso não é bloqueado pelos IM2. 1,2,4,11,12<br />
Apresentam uma eficácia semelhante contra o VI de tipo A,<br />
tanto em tratamento como em profilaxia, mas a rimantadina<br />
possui um melhor perfil de efeitos adversos. 2,10 Uma<br />
vez que a rimantadina não se encontra disponível no nosso<br />
país, não será abor<strong>da</strong><strong>da</strong> com mais pormenor.<br />
Amantadina – Os ensaios clínicos têm demonstrado uma<br />
redução <strong>dos</strong> sintomas gripais em cerca de 1 dia. 1,5,10 Em<br />
profilaxia, mostrou ser eficaz 13 na população geral, em<br />
residentes em lares e também em crianças. 2,5 Apresenta<br />
menor eficácia em profilaxia pós‐exposição, devido a<br />
que o uso em tratamento conduz à selecção de estirpes<br />
resistentes. 12 Não existem evidências de que previna as<br />
complicações associa<strong>da</strong>s à <strong>gripe</strong>. 5,10<br />
Os efeitos adversos <strong>da</strong> amantadina são dependentes <strong>da</strong><br />
<strong>dos</strong>e. Ocorrem frequentemente perturbações digestivas<br />
– anorexia, náuseas, vómitos ou obstipação, 5 e do SNC<br />
– nervosismo, dificul<strong>da</strong>des de concentração, 2,5 insónias 1,2 e,<br />
Antivíricos na <strong>gripe</strong><br />
em casos mais graves, pesadelos, 1 delírio, convulsões 2,5 e<br />
alucinações, 1,2,5 especialmente em doentes i<strong>dos</strong>os ou com<br />
insuficiência renal, 1,2,5 nos quais a <strong>dos</strong>e deve ser reduzi<strong>da</strong>. 1,5<br />
Os factores limitantes ao uso <strong>da</strong> amantadina são o seu espectro<br />
limitado, 1,2,9 rápido desenvolvimento de estirpes resistentes<br />
1‐3,5,6,9,10,12,14 em cerca de 30% <strong>dos</strong> doentes, 1,5,6,10‐12,14<br />
com transmissibili<strong>da</strong>de e virulência semelhantes às <strong>da</strong>s<br />
estirpes sensíveis, 2,6,9,10,14 e os seus efeitos adversos e<br />
estreita margem terapêutica. 1,2,9<br />
inibiDOreS DA neurAminiDASe<br />
Ligam‐se ao sítio activo <strong>da</strong> neuramini<strong>da</strong>se viral, dificultando<br />
a libertação e dispersão <strong>dos</strong> vírus recém‐forma<strong>dos</strong>, o que<br />
diminui a disseminação <strong>da</strong> infecção no tracto respiratório.<br />
1,4,5,9,11 São activos contra os VI de tipo A e B. 1,5‐7,9<br />
Os ensaios demonstraram uma redução na duração <strong>dos</strong><br />
sintomas <strong>da</strong> <strong>gripe</strong> entre 1 a 2 dias 1,9 quando inicia<strong>dos</strong> até<br />
36‐48 h após o seu aparecimento, 3,9 reduzindo também<br />
a sua gravi<strong>da</strong>de. 1,3 O início precoce do tratamento parece<br />
ser o determinante mais importante para a eficácia <strong>dos</strong><br />
INAs. 1,3,9 Parecem também eficazes em profilaxia; 7,9,12,15<br />
estu<strong>dos</strong> em adultos saudáveis demonstraram uma eficácia<br />
de 70‐90% 7,9,15 em prevenção sazonal ou pós‐exposição. 7,9<br />
Os INAs são também eficazes na prevenção de complicações;<br />
contudo, não previnem infecções assintomáticas e<br />
diminuem mas não interrompem a excreção nasal de VI. 13<br />
Os INAs são muito menos susceptíveis de promover o<br />
desenvolvimento de resistências. 9,14 A emergência de resistência<br />
durante o tratamento com zanamivir tem sido<br />
rara. 9,10,14 A frequência de isolamento de vírus resistentes<br />
ao oseltamivir é superior, 5,9 parecendo particularmente eleva<strong>da</strong><br />
em crianças, 6,9,10,16 o que pode constituir um problema<br />
sério, 9,10 uma vez que estas são uma importante fonte de<br />
transmissão <strong>da</strong> <strong>gripe</strong> na comuni<strong>da</strong>de. 9 Da<strong>dos</strong> recentes relatam<br />
o isolamento de estirpes resistentes em indivíduos não<br />
trata<strong>dos</strong> com INAs, 10,17 o que indicia que possam ser transmissíveis,<br />
17 facto já sugerido por estu<strong>dos</strong> em animais. 9,10,14<br />
Zanamivir – A sua fraca biodisponibili<strong>da</strong>de oral requer que<br />
seja administrado através de pó para inalação. 9,10,12 Ensaios<br />
clínicos demonstraram uma redução <strong>dos</strong> sintomas em 1 5<br />
a 1,5 dias. 10 Aparenta maior benefício em doentes mais<br />
graves ou mais velhos, 12 mas ensaios em crianças também<br />
mostraram uma diminuição na duração e gravi<strong>da</strong>de<br />
<strong>dos</strong> sintomas. 9 Em análises retrospectivas não demonstrou<br />
benefício relativamente ao risco de complicações <strong>da</strong> <strong>gripe</strong>. 5<br />
Contudo, alguns estu<strong>dos</strong> indicam que pode reduzir o risco<br />
de complicações do tracto respiratório inferior. 14 Parece<br />
eficaz em profilaxia, 5,9,12 tanto sazonal como pós‐exposição<br />
em meio familiar, 5,9 bem como em residentes em lares. 10<br />
O zanamivir é geralmente bem tolerado. 4,9 Os seus efeitos<br />
adversos são principalmente sintomas pseudogripais; 5,10<br />
contudo, também pode ocorrer broncoespasmo, 5,9,10 por<br />
vezes mortal, 5 diminuição <strong>da</strong> função respiratória 4,5,9 e tosse. 9<br />
Estes efeitos ocorrem essencialmente em doentes asmáticos<br />
ou com doença pulmonar obstructiva crónica, 4,5,10 mas não<br />
só. 5 A inalação oral requer uma boa coordenação motora e<br />
destreza, 11 o que pode ser difícil em alguns doentes i<strong>dos</strong>os. 1<br />
Oseltamivir – Tem eficácia demonstra<strong>da</strong> no tratamento<br />
<strong>da</strong> <strong>gripe</strong>, 9,13 especialmente quando iniciado nas primeiras<br />
12 horas após o aparecimento <strong>dos</strong> sintomas. 1,9 Parece diminuir<br />
a incidência de complicações respiratórias. 9,10,13,14<br />
Julho/Agosto 2006
Julho/Agosto 2006 Boletim do CIM<br />
Contudo, numa síntese de vários ensaios, não provou reduzir<br />
a incidência de pneumonia e a taxa de hospitalização<br />
de doentes em risco elevado de complicações. 5<br />
Diversos estu<strong>dos</strong> demonstraram a sua eficácia profiláctica,<br />
tanto na <strong>gripe</strong> sazonal como pós‐exposição familiar em<br />
adultos e crianças. 9,10 Alguns <strong>da</strong><strong>dos</strong> indicam que também<br />
possa ser eficaz na profilaxia <strong>da</strong> <strong>gripe</strong> em doentes com risco<br />
de complicações, como i<strong>dos</strong>os residentes em lares. 5,9,10<br />
Os efeitos adversos mais frequentes do oseltamivir são<br />
digestivos: náuseas, vómitos e dores abdominais. 4,5,9<br />
O consumo de alimentos não interfere com a absorção do<br />
fármaco 9 e pode reduzir as náuseas e vómitos. 4,9<br />
recOmenDAçõeS De uSO<br />
A <strong>vacina</strong>ção, que constitui o aspecto essencial do controlo<br />
<strong>da</strong> <strong>gripe</strong>, 1,3,4,9 tem sido dirigi<strong>da</strong> aos grupos de alto risco. 1,3<br />
Quando existe concordância antigénica entre a <strong>vacina</strong> e a<br />
estirpe circulante, aquela previne a doença em cerca de<br />
70% <strong>dos</strong> adultos saudáveis. 3,4,12,15 No entanto, em i<strong>dos</strong>os,<br />
a eficácia <strong>da</strong> <strong>vacina</strong> pode ser de apenas 40% 1,3,4 ou inferior,<br />
3,4 bem como em doentes com imunossupressão, já<br />
que podem não formar anticorpos suficientes. 1,12<br />
O uso de antivíricos pode ser adequado em: tratamento<br />
de doentes de alto risco não <strong>vacina</strong><strong>dos</strong> 1,12 ou de infecções<br />
que surjam apesar <strong>da</strong> <strong>vacina</strong>ção, controlo de surtos em<br />
lares e instituições, profilaxia em situações nas quais a<br />
estirpe circulante difere <strong>da</strong> estirpe <strong>vacina</strong>l 1,2 ou enquanto<br />
a <strong>vacina</strong> não gera imuni<strong>da</strong>de, ou em indivíduos que não<br />
se podem <strong>vacina</strong>r (ex. alergia a constituintes <strong>da</strong> <strong>vacina</strong>). 12<br />
Os indivíduos não <strong>vacina</strong><strong>dos</strong> em ocupações críticas também<br />
podem beneficiar com o tratamento. 1<br />
As principais vantagens <strong>dos</strong> INAs sobre os IM2 são a sua<br />
activi<strong>da</strong>de contra os VI A e B, melhor perfil de segurança<br />
1,2,11,12 e menor potencial de indução de resistências. 2,11,12<br />
O uso <strong>dos</strong> IM2 não é actualmente aconselhado no tratamento<br />
<strong>da</strong> <strong>gripe</strong>. 1,13 Em profilaxia, o uso <strong>dos</strong> INAs também<br />
parece preferível 2,9 mas a amantadina pode ser adequa<strong>da</strong><br />
em profilaxia sazonal na comuni<strong>da</strong>de se a estirpe circulante<br />
for do tipo A. 9 O oseltamivir pode ser utilizado em profilaxia<br />
pós‐exposição em indivíduos não <strong>vacina</strong><strong>dos</strong> 5,9 e durante<br />
surtos em instituições (p. ex. lares), em complemento a<br />
outras medi<strong>da</strong>s. 5 Os antivíricos não devem ser prescritos<br />
se os sintomas estão presentes há mais de 36‐48 horas, 1<br />
excepto em doentes críticos. Os INAs devem idealmente<br />
ser inicia<strong>dos</strong> até 12 horas após o começo <strong>da</strong> doença. 9<br />
Gripe AviáriA<br />
As pandemias de <strong>gripe</strong> são surtos globais <strong>da</strong> doença<br />
causa<strong>dos</strong> por um vírus com novos subtipos antigénicos<br />
e com 3 características importantes: capaci<strong>da</strong>de para<br />
infectar humanos, população vulnerável sem imuni<strong>da</strong>de<br />
preexistente e transmissão eficiente entre humanos. 7,9<br />
O vírus <strong>da</strong> <strong>gripe</strong> aviária altamente patogénico H5N1 já<br />
cumpre os 2 primeiros critérios – apesar de relatos de<br />
provável transmissão entre humanos, não foi ain<strong>da</strong> documentado<br />
que tal aconteça de forma sustenta<strong>da</strong>, 8,9 e parece<br />
o candi<strong>da</strong>to mais viável para originar uma pandemia. 6<br />
Os antivíricos constituem uma importante parte <strong>da</strong> estratégia<br />
para li<strong>da</strong>r com uma epidemia de <strong>gripe</strong> causa<strong>da</strong> por<br />
um novo VI, <strong>da</strong>do que <strong>vacina</strong>s específicas para uma estirpe<br />
emergente requerem diversos meses de preparação. 6,9<br />
O rápido desenvolvimento de resistência durante o tratamento<br />
e os efeitos adversos limitam a utili<strong>da</strong>de <strong>dos</strong> IM2 durante<br />
uma pandemia. 7 Estirpes do VI H5N1 isola<strong>da</strong>s recentemente<br />
são resistentes aos IM2 mas sensíveis aos INAs. 6,7,9,14 Assim,<br />
estes são actualmente as únicas opções para tratamento<br />
ou profilaxia. 9 Em pandemias anteriores os IM2 atingiram<br />
eficácias protectoras de cerca de 70%; espera‐se que a<br />
eficácia <strong>dos</strong> INAs seja pelo menos tão alta. 8,9 Contudo, a<br />
informação existente sobre a eficácia <strong>dos</strong> INAs em infecção<br />
pelo VI H5N1 é limita<strong>da</strong>, 6,7 havendo autores que afirmam<br />
que não existem evidências credíveis <strong>da</strong> sua eficácia em estirpes<br />
de VI aviares. 13 A OMS recomen<strong>da</strong> preferencialmente<br />
o uso do oseltamivir devido aos níveis séricos relativamente<br />
baixos do zanamivir e ausência de <strong>da</strong><strong>dos</strong> referentes à sua<br />
eficácia, bem como pelo modo de administração, que pode<br />
ser problemático em crianças muito novas e i<strong>dos</strong>os, doentes<br />
intuba<strong>dos</strong> ou gravemente doentes. 6 Há relatos recentes<br />
de aparecimento de estirpes do VI H5N1 com eleva<strong>da</strong><br />
resistência ao oseltamivir. 7,8,17 Isto sugere que ambos os<br />
INAs devam ser incluí<strong>dos</strong> numa estratégia de preparação<br />
contra uma pandemia, 6,9 <strong>da</strong>do que, ao contrário do oseltamivir,<br />
a molécula do zanamivir não requer um rearranjo<br />
antes de se ligar ao seu alvo, 7 mantendo‐se provavelmente<br />
eficaz contra estirpes resistentes ao oseltamivir. 7,11,14<br />
Doentes com suspeita de infecção pelo VI H5N1 devem ser<br />
trata<strong>dos</strong> com oseltamivir enquanto se aguar<strong>da</strong> confirmação<br />
laboratorial. Em profissionais de saúde com possível<br />
exposição não protegi<strong>da</strong> recomen<strong>da</strong>‐se profilaxia com o<br />
oseltamivir, 8 bem como a contactos próximos de casos<br />
confirma<strong>dos</strong>. 7,8 O zanamivir pode ser equacionado para<br />
profilaxia em profissionais de saúde a cui<strong>da</strong>r de doentes<br />
em tratamento com oseltamivir e no tratamento de doentes<br />
menos graves que podem não necessitar de níveis<br />
séricos eleva<strong>dos</strong>. 6 Deve ser pondera<strong>da</strong> profilaxia de longa<br />
duração em indivíduos com funções essenciais na socie<strong>da</strong>de.<br />
7 Existem recomen<strong>da</strong>ções nacionais sobre o uso <strong>dos</strong><br />
antivíricos na doença humana por VI H5N1. 18<br />
O uso <strong>dos</strong> INAs numa situação de pandemia só deve ser<br />
considerado com medi<strong>da</strong>s de saúde pública concomitantes.<br />
13,14 O seu uso indiscriminado no tratamento <strong>da</strong> <strong>gripe</strong><br />
deve ser desencorajado, já que vai promover a emergência<br />
de estirpes resistentes. 6 A dependência excessiva de<br />
soluções farmacológicas pode alterar comportamentos e<br />
facilitar a disseminação do vírus, além de impedir o desenvolvimento<br />
e implementação de estratégias de intervenção<br />
basea<strong>da</strong>s em medi<strong>da</strong>s de saúde pública. 13<br />
Ana paula mendes<br />
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Período de alerta pandemia – Fase 3. Vacinas e antivirais. GAH7.<br />
Profissionais de Saúde. 06.03.06. Direcção Geral de Saúde. Disponível<br />
em: www.dgs.pt (Consulta 04.08.2006).