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Revista Espírita - Primeiro Ano – 1858 - Portal do Espírito

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O fantasma da senhorita Clairon<br />

Depois desta cena, fiquei alguns meses sem nada ouvir. Acreditava-me livre para sempre, e<br />

me enganava.<br />

"To<strong>do</strong>s os espetáculos haviam si<strong>do</strong> manda<strong>do</strong>s para Versailes, para o casamento <strong>do</strong> Delfim.<br />

Havia-me arruma<strong>do</strong>, na avenida de Saint-Cloud, um quarto que ocupava com a senhora<br />

Grandval. Às três horas da manhã, eu lhe disse: Estamos no fim <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>; ao grito seria<br />

embaraçoso ter que nos procurar aqui... Ele saiu! A senhora Grandval acreditou que o inferno<br />

to<strong>do</strong> estivesse no quarto: ela correu, de camisa, de alto a baixo a casa, onde ninguém pôde<br />

fechar o olho durante a noite; mas, ao menos, foi a última vez que se fez ouvir.<br />

"Sete ou oito dias depois, conversan<strong>do</strong> com a minha roda costumeira, o sino de onze horas<br />

foi segui<strong>do</strong> de um tiro de fuzil, da<strong>do</strong> em uma das minhas janelas. To<strong>do</strong>s nós ouvimos o tiro;<br />

to<strong>do</strong>s vimos o fogo; a janela não tinha nenhum tipo de dano. Concluímos, to<strong>do</strong>s, que queriam<br />

a minha vida, que haviam erra<strong>do</strong> o alvo e que seria preciso tomar precauções para o futuro.<br />

O senhor de Marville, então tenente de polícia, foi visitar as casas defronte a minha; a rua foi<br />

repleta de to<strong>do</strong>s os espiões possíveis; mas, quaisquer cuida<strong>do</strong>s que se tivessem toma<strong>do</strong>, o<br />

tiro, durante três meses inteiros, foi ouvi<strong>do</strong>, visto, da<strong>do</strong> sempre à mesma hora, na mesma<br />

vidraça, sem que ninguém tivesse jamais podi<strong>do</strong> ver de que sítio partia. Esse fato foi<br />

constata<strong>do</strong> nos registros da polícia.<br />

"Acostumada com o meu fantasma, que achava um rapaz bastante bom, uma vez que se<br />

conservava em enganos sagazes, não toman<strong>do</strong> consciência da hora que era, fazen<strong>do</strong> muito<br />

calor, abri a janela eleita e, o intendente e eu nos apoiamos sobre o balcão. Soam onze<br />

horas, o tiro parte e nos lança, to<strong>do</strong>s os <strong>do</strong>is, no meio <strong>do</strong> quarto, onde caímos como mortos.<br />

Retornan<strong>do</strong> a nós mesmos, sentin<strong>do</strong> que não tínhamos nada, reconhecen<strong>do</strong> que havíamos<br />

recebi<strong>do</strong>, ele sobre a face esquerda, eu sobre a face direita, a mais terrível bofetada que se<br />

tenha jamais aplica<strong>do</strong>, nos pusemos a rir como <strong>do</strong>is loucos.<br />

"Dois dias depois, convidada pela senhorita Dumesnil para estar numa pequena festa<br />

noturna, que dava na sua casa da Barrière Blanche, tomei um carro de praça, às onze horas,<br />

com minha aia. Fazia o mais belo luar, e fomos conduzidas pelos bulevares que começavam a<br />

se encher de casas. Minha aia me disse: Não foi aqui que morreu o senhor de S...? - Segun<strong>do</strong><br />

as notícias que me deram, deve ser, disse-lhe, designan<strong>do</strong> com meu de<strong>do</strong>, uma das duas<br />

casas ali diante de nós. De uma delas partiu esse mesmo tiro de fuzil que me perseguia:<br />

atravessa a nossa viatura; o cocheiro <strong>do</strong>bra sua marcha, cren<strong>do</strong>-se ataca<strong>do</strong> por ladrões.<br />

Chegamos ao encontro, fazen<strong>do</strong> força para refrear nossos senti<strong>do</strong>s, e, de minha parte,<br />

penetrada de um terror que conservei por muito tempo, o confesso; mas, essa explosão foi a<br />

última, das armas de fogo.<br />

À sua explosão, sucedeu um estalar de mãos, com certo compasso e re<strong>do</strong>bros. Esse ruí<strong>do</strong>, ao<br />

qual a bondade <strong>do</strong> público me havia acostuma<strong>do</strong>, não me deixou fazer nenhuma observação .<br />

durante muito tempo; meus amigos a fizeram por mim. Nós espreitamos, disseram-me: é às<br />

onze horas, quase sob vossa porta que ele ocorre; nós o ouvimos, não vimos ninguém; isso<br />

não pode ser senão uma conseqüência daquilo que haveis experimenta<strong>do</strong>. Como esse ruí<strong>do</strong><br />

não tinha nada de terrível, não conservei a data da sua duração. Não prestei mais atenção<br />

aos sons melodiosos que se fizeram ouvir depois; parecia que uma voz celeste dava o esboço<br />

da ária nobre e tocante que ela ia cantar; essa voz começava na esquina de Bussy e<br />

terminava na minha porta; e, como ocorreu com to<strong>do</strong>s os outros sons precedentes, ouvia-se<br />

e não se via nada. Enfim, tu<strong>do</strong> cessou depois de um pouco mais de <strong>do</strong>is anos e meio."<br />

Daí a algum tempo, a senhorita Clairon recebe, da senhora i<strong>do</strong>sa que tinha si<strong>do</strong> a amiga<br />

devotada <strong>do</strong> senhor S..., o relato <strong>do</strong>s seus últimos momentos. "Ele contava, disse-lhe, to<strong>do</strong>s<br />

http://www.espirito.org.br/portal/codificacao/re/<strong>1858</strong>/02c-o-fantasma.html (2 of 4)7/4/2004 08:13:00

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