Ave Cristo - Espiritismoemdebate.com.br

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O artista miúdo que tocava e cantava, ao mesmo tempo, era familiar do<br />
público, porque várias pessoas lhe chamavam pelo nome, exclamando:<br />
— Celso, cante mais!<br />
— Celso, toque mais um pouco!...<br />
O menino atendia, satisfeito, recolhendo moedinhas esparsas, entregandoas<br />
à enferma.<br />
Lívia não mais viu a figura paterna, talvez diluída nas emoções novas a lhe<br />
penetrarem a mente, mas ainda escutou a palavra de Basílio, que lhe falava,<br />
branda:<br />
— Descerra o coração, minha filha!... Repara! Uma criança humilde recorre<br />
à bondade nas ruas... Ajuda para que te ajudem, revela-te aos outros para que<br />
outros se revelem a ti...<br />
A moça notou que uma força nova irrompera-lhe nalma.<br />
O petiz terminara uma das cantigas regionais que aprendera, e,<br />
instintivamente, ela também se associou ao público, chamando:<br />
- Celso! Celso, deixa-me tocar o instrumento. O pequeno aquiesceu, de<br />
pronto.<br />
De posse do alaúde, a cega tornou, em pensamento, ao antigo lar.<br />
Esqueceu-se de que se achava na posição de estrangeira numa terra que<br />
desconhecia e cantou com toda a alma, qual se estivesse numa de suas horas<br />
mais felizes, à frente do velho pai.<br />
Grande silêncio acompanhou-lhe as belas canções romanas.<br />
Os transeuntes adensavam-se agora no pequeno átrio de Minerva, e a<br />
criança, ao fim de cada número, recebia as contribuições de senhoras e cavalheiros<br />
comovidos, repletando a surrada bolsa.<br />
O quadro vivo de uma cega a exibir-se, de uma tuberculosa ao relento e de<br />
um pequerrucho esfarrapado passou a arrancar as lágrimas de muitos.<br />
Depois de vasto repertório, em que tivera o cuidado de selecionar as<br />
melodias para não ferir as suscetibilidades do público, então dividido no culto a<br />
Jesus e no culto às antigas divindades, Lívia calou-se.<br />
Muitas damas emocionadas cumprimentaram-na às despedidas.<br />
Esvaziou-se o recinto, pouco a pouco.<br />
Celso, entretanto, conchegou-se-lhe ao colo, ternamente.<br />
— Como te chamas? — indagou ele, com simplicidade e candura.<br />
— Lívia. E tu, meu inteligente cantor?<br />
— Quinto Celso.<br />
— Estás sozinho?<br />
— Minha mãe está comigo.<br />
Feita a apresentação, abraçaram-se ambas.<br />
Hortênsia Vipsânia, a genitora de Celso, biografou-se em frases rápidas.<br />
Era viúva de Tércio Avelino, um miliciano que morrera sem honras,<br />
deixando-lhe o filhinho único nos braços. O marido falecera em Siracusa, onde<br />
residiam desde a transferência de Roma; todavia, tão angustiosa se lhe tornara<br />
a vida, na grande cidade, que, enfraquecida e derrotada, resolvera experimentar<br />
a permanência em Drépano, onde conseguia manter-se com menos<br />
dificuldade. Lutara intensivamente, fabricando guloseimas para vender, no<br />
entanto, adquirira a pertinaz enfermidade que a minava devagarinho... Sitiada<br />
pela miséria, ensinara o filho a tanger imperfeitamente o alaúde, de modo a<br />
recorrerem à caridade pública.<br />
Sentia-se, porém, exausta. Receava morrer, de momento para outro. Por