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130<br />Os recém-chegados compreenderam, de pronto, com que espécie de<br />comerciante iriam entrar em contacto.<br />O empregado de Opílio aventurou uma pergunta sobre o velho afinador de<br />Lião, ao que Saturnino ajuntou, apressado:<br />— Dos assentamentos em nosso poder, sei que Basílio, escravo de nossa<br />casa, foi afastado das obrigações habituais, sob compromisso, como alguns<br />outros servidores cujo paradeiro desconhecemos.<br />Estampou enigmático sorriso e acrescentou:<br />— Nossos interesses têm sido vilmente explorados. Há mais de dez anos<br />venho procurando corrigir grandes erros e sustar clamorosas usurpações.<br />Imprimindo imensa doçura na voz, Helena ponderou, muito calma:<br />— Reconheço que não teremos qualquer dificuldade para um bom<br />entendimento.<br />Acontece que Basílio, hoje velhinho, é nosso valioso cooperador na Gália<br />Lugdunense. Tamanhos serviços devemos a ele e tanto se aflige o nosso<br />admirável colaborador com os débitos do passado, que prometemos<br />providenciar a transferência da dívida para nós outros.<br />Os olhos de Saturnino iluminaram-se, de súbito.<br />Com inequívocos sinais de ambição e alegria, respondeu, entusiasmado:<br />- Por Júpiter! ainda existe honestidade na Terra! É a primeira vez que<br />encontro um devedor preocupado em auxiliar-nos. Não oporemos qualquer<br />embargo à transação. Basílio será definitivamente liberado.<br />Rogou licença para afastar-se alguns instantes e, logo após, trouxe consigo<br />a documentação existente.<br />Os visitantes não regatearam.<br />Saturnino ajuntou à importância legal significativa quantia de juros, e<br />Teódulo, a um sinal da companheira, pagou todo o montante, sem pestanejar.<br />Na posse de elementos comprobatórios do resgate, os dois se retiraram e,<br />em caminho, Helena dirigiu-se ao companheiro, explicando:<br />— Agora, temos o velho patife em nossas mãos. Ele e a filha não nos<br />escaparão. Meu plano está progredindo regularmente. Avancemos para os<br />novos fatos. Combinarei com meu pai o teu regresso imediato à colônia. Serás<br />o emissário de uma carta minha a Taciano, implorando-lhe a vinda urgente a<br />Roma, em companhia de Blandina. Tomarei por pretexto a enfermidade de<br />Lucila, que pintarás para a imaginação dele como estando em processo de<br />morte gradativa. Estou convencida de que meu esposo atenderá. Calcularemos<br />o tempo preciso para voltarmos a Lião, antes que ele possa cruzar as águas.<br />Aportando aqui, não mais nos encontrará, de vez que instruirei meu pai a fim<br />de justificar o nosso retorno precipitado, a conselho médico, numa tentativa<br />suprema de salvar a doente. Achar-nos-emos, assim, em Lião, suficientemente<br />desembaraçados para o trabalho punitivo. Conseguirei algumas cartas<br />importantes para incentivar a perseguição aos nazarenos e poderemos<br />apresentar o afinador como escravo fugido e revolucionário perigoso.<br />Agitaremos as autoridades governamentais. Com a documentação que<br />possuímos, o filósofo e a filha estão naturalmente liquidados.<br />Meditou, cabisbaixa, por alguns momentos, e concluiu:<br />— Assim, quando Taciano e Blandina estiverem de regresso a casa, serão<br />surpreendidos pelo serviço já terminado.<br />O amigo, espantado, concordou, presto:<br />— Efetivamente, o projeto está perfeito.
Helena silenciara.<br />Teódulo deitou-lhe os olhos assombrados, sem saber se fôra invadido pela<br />admiração ou pelo medo.<br />A breves minutos, o carro estacou ante os jardins de Vetúrio.<br />Anoitecia...<br />O crepúsculo tisnava-se de espessa neblina, semelhante ao nevoeiro moral<br />que envolvia aquelas almas em sombra.<br />131
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