Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...
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categórico ao dizer que “não existe outra via <strong>em</strong> que se manifeste no sujeito a<br />
incidência da sexualida<strong>de</strong>” 198 . E aí, aponta uma carência no sujeito, pois no que toca à<br />
pulsão, não há nada que represente seu ser <strong>de</strong> macho ou fêmea.<br />
Do lado do vivente enquanto ser a ser tomado na fala, enquanto não<br />
po<strong>de</strong> jamais enfim aí inteiro advir. Nesse aquém do limiar que não é<br />
entretanto n<strong>em</strong> <strong>de</strong>ntro n<strong>em</strong> fora, não há acesso ao Outro do sexo<br />
oposto senão pela via das pulsões, ditas parciais, on<strong>de</strong> o sujeito<br />
procura um objeto que lhe substitui essa perda <strong>de</strong> vida que é a sua<br />
por ser sexuado 199 .<br />
Adolescências<br />
O conto “Fre<strong>de</strong>rico Paciência”, cuja versão <strong>de</strong>finitiva é <strong>de</strong> 1942, aborda o<br />
relacionamento entre dois rapazes, lá pelos seus 14 anos, que principiavam a <strong>de</strong>scobrir<br />
os encantos da amiza<strong>de</strong> e do amor, divididos entre os apelos da sexualida<strong>de</strong> e as<br />
con<strong>de</strong>nações da moral social. No início do conto, as reticências, recurso utilizado pelo<br />
autor dos Contos novos, como um modo <strong>de</strong> s<strong>em</strong>i-dizer, <strong>de</strong>ixam implícito que algo se<br />
passou 200 . Logo surge a admiração <strong>de</strong> Juca por Fre<strong>de</strong>rico, por sua beleza física e<br />
também por suas qualida<strong>de</strong>s pessoais, como a simpatia, que suscitavam o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong><br />
imitá-lo; chegava a ter inveja da perfeição do amigo: “Quis ser ele, ser <strong>de</strong>le, me<br />
confundir naquele esplendor, e ficamos amigos”. Acreditou, <strong>de</strong> início, que se<br />
aproximara daquele que viria a ser seu amigo apenas por simpatia, mas a admiração<br />
foi crescendo e, numa “comoção envergonhada”, confessa a Fre<strong>de</strong>rico que ele é seu<br />
“único amigo”.<br />
O i<strong>de</strong>al que Fre<strong>de</strong>rico representava para Juca, como esclarece o narrador, era<br />
o i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> seu próprio ser, o que lhe provocava, às vezes, o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> corrigi-lo, para<br />
que mais se aproximasse do “ser que eu queria me dar”. Fica claro o quanto Fre<strong>de</strong>rico<br />
Paciência encarna, para Juca, o “indivíduo i<strong>de</strong>al” que ele mesmo almejava ser, e o<br />
quanto isto o faz amar o amigo. Em Freud, além do amor narcísico, especular, que<br />
implica uma simetria na relação com o outro, há o amor como dissimétrico. Já no<br />
198 Id<strong>em</strong>, ibid<strong>em</strong>.<br />
199 Id<strong>em</strong>, ibid<strong>em</strong>.<br />
200 Rabello <strong>de</strong>staca dois comentários <strong>de</strong> <strong>Mário</strong> <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> a respeito <strong>de</strong>ste conto: o primeiro, numa<br />
carta a Fernando Sabino, na qual o escritor afirma ter terminado um conto “difícil”, sobre o que existe<br />
“<strong>de</strong> frágil e misturado nas gran<strong>de</strong>s amiza<strong>de</strong>s <strong>de</strong> rapazice” ( Cartas a um jov<strong>em</strong> escritor, p 53-54); no<br />
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