26.02.2014 Views

Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...

Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...

Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

O banquete, <strong>de</strong> Platão, é uma referência comum entre “ Herr professor Freud”<br />

e <strong>Mário</strong> <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, e será também uma referência para Lacan 133 , mesmo que seja<br />

para criar o seu próprio mito, como ver<strong>em</strong>os mais adiante. Em Amar..., ao abordar o<br />

t<strong>em</strong>a do hermafroditismo originário nos seres humanos, <strong>Mário</strong> <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> se reporta<br />

“à fábula discreta contada por Platão no ‘Banquete’”, referindo-se ao mito do<br />

andrógino, contado por Aristófanes neste diálogo platônico. O autor do idílio voltará a<br />

referir-se a Platão, quando assimila um diálogo entre Fräulein e Carlos à maiêutica<br />

socrática, “o método socrático <strong>de</strong> perguntas e respostas”. E introduz a sua<br />

compreensão do que seja a verda<strong>de</strong>:<br />

A resposta <strong>de</strong> Carlos falava lindíssima verda<strong>de</strong>. Porém, quando as verda<strong>de</strong>s<br />

saltam do coração, nós homens intelectuais lhe damos o nome feio <strong>de</strong><br />

confissões. Carlos confessara apenas, não apren<strong>de</strong>ra nada com a verda<strong>de</strong> que<br />

dissera. Só quando do peito passa pro cérebro, a confissão se transforma <strong>em</strong><br />

verda<strong>de</strong> 134 .<br />

Na crônica “Biblioteconomia” (1937), <strong>Mário</strong>, expressando sua admiração por<br />

Platão, se refere ao “encanto maravilhoso <strong>de</strong> Platão” <strong>em</strong> comparação com “a secura<br />

s<strong>em</strong> beijo <strong>de</strong> Aristóteles”. L<strong>em</strong>br<strong>em</strong>os também do Banquete <strong>de</strong> <strong>Mário</strong>, diálogo<br />

estético-filosófico no qual os convivas se reún<strong>em</strong>, como no Banquete <strong>de</strong> Platão, <strong>em</strong><br />

torno <strong>de</strong> um t<strong>em</strong>a, só que <strong>de</strong>sta vez a conversação terá como t<strong>em</strong>a central a música e<br />

não o amor, como no primeiro caso. Diga-se <strong>de</strong> passag<strong>em</strong>, nesta obra <strong>de</strong> 1944, a visão<br />

que t<strong>em</strong> <strong>Mário</strong> da psicanálise freudiana é b<strong>em</strong> mais crítica <strong>em</strong> comparação com a<br />

reverência às “afirmativas daqueles al<strong>em</strong>ães sapientíssimos” que se percebe <strong>em</strong> Amar,<br />

verbo intransitivo <strong>de</strong> 1927. Enquanto que nesta última obra o mo<strong>de</strong>rnista busca<br />

validar as suas asserções através <strong>de</strong> teorias científicas, no Banquete questiona o<br />

133 No s<strong>em</strong>inário VIII, A transferência, Lacan toma O banquete para <strong>de</strong>senvolver o t<strong>em</strong>a do amor na<br />

transferência. Destaca dois termos gregos, Érastès e Érômenos (na sua grafia francesa), para assinalar<br />

duas posições diferentes no amor, que ao se substituír<strong>em</strong> produzirão uma “metáfora do amor”. Érastès<br />

é o amante, o que <strong>de</strong>seja – ao nível do ter, é o que não t<strong>em</strong>, é aquele a qu<strong>em</strong> falta. Érômenos é o amado,<br />

o <strong>de</strong>sejável, aquele que t<strong>em</strong>. Para ilustrar a significação do amor, a sua metáfora, Lacan recorre a uma<br />

imag<strong>em</strong> poética: “Esta mão que se esten<strong>de</strong> para o fruto, para a rosa, para a acha que se inflama <strong>de</strong><br />

repente, o seu gesto <strong>de</strong> pegar, <strong>de</strong> atrair, <strong>de</strong> atiçar é estreitamente solidário com a maturação do fruto,<br />

com a beleza da flor, com o flamejar da acha. Mas quando, nesse movimento <strong>de</strong> pegar, <strong>de</strong> atrair, <strong>de</strong><br />

atiçar, a mão foi longe o bastante <strong>em</strong> direção ao objeto, se do fruto, da flor, da acha, sai uma mão que<br />

se esten<strong>de</strong> ao encontro da mão que é da vocês, e neste momento é a sua mão que se <strong>de</strong>tém fixa na<br />

plenitu<strong>de</strong> fechada do fruto, aberta da flor, na explosão <strong>de</strong> uma mão <strong>em</strong> chamas – então, o que aí se<br />

produz é o amor” (p. 59).<br />

134 M. <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, Amar, verbo intransitivo, p. 102.<br />

63

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!