Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...
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hom<strong>em</strong>, o incomensurável do abismo e da morte. Po<strong>de</strong>ríamos pensar que nesse ponto,<br />
ao rejeitar a orig<strong>em</strong> da sublimação nas pulsões sexuais, <strong>Mário</strong> está funcionando no<br />
âmbito dos seus valores iluministas e humanistas-cristãos.<br />
Há <strong>em</strong> Freud esta característica da sublimação como tornando possível as<br />
ativida<strong>de</strong>s psíquicas consi<strong>de</strong>radas superiores – científicas, artísticas, i<strong>de</strong>ológicas –,<br />
valorizadas socialmente, por cumprir<strong>em</strong> importante papel no <strong>de</strong>senvolvimento<br />
cultural e civilizatório. Todavia, a sua fonte provém das pulsões sexuais, inibidas <strong>em</strong><br />
sua finalida<strong>de</strong>, como se verifica <strong>em</strong> “As pulsões e suas vicissitu<strong>de</strong>s”.<br />
Talvez boa parte do <strong>de</strong>sconforto do crítico que escreve “Do cabotinismo” <strong>em</strong><br />
relação a essa patologização do artista – que se <strong>de</strong>ve muito mais àquilo que fizeram da<br />
psicanálise todos aqueles que gravitam <strong>em</strong> torno do mundo “psi”, do que ao próprio<br />
Freud – se dissipasse caso o acesso à perspectiva <strong>de</strong> Lacan lhe fosse possível. Para o<br />
psicanalista, que trabalhou com a noção <strong>de</strong> sublimação especialmente no s<strong>em</strong>inário<br />
VII, A ética da psicanálise, a obra <strong>de</strong> arte não é uma formação do inconsciente, mas<br />
um produto. Isto quer dizer que ela não po<strong>de</strong> ser interpretada como um sonho, um ato<br />
falho, um sintoma ou um chiste, como pensava Freud <strong>em</strong> seu método <strong>de</strong> leitura das<br />
obras <strong>de</strong> arte.<br />
Sarah Kofman, <strong>em</strong> A infância da arte, observa, quanto ao método <strong>de</strong> leitura <strong>de</strong><br />
Freud, que tanto na interpretação das obras <strong>de</strong> arte quanto na interpretação dos sonhos<br />
se trata <strong>de</strong> “<strong>de</strong>scobrir o arcaico sob o que parece novo”. A autora recorta dois<br />
momentos no modo como Freud lança mão das obras <strong>de</strong> arte: num primeiro momento,<br />
busca confirmar a análise dos sonhos através da obra <strong>de</strong> arte, e num segundo<br />
momento a interpretação dos sonhos se torna um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> compreensão dos motivos<br />
artísticos. A obra <strong>de</strong> arte, assim como o sintoma ou o sonho, seria um enigma a<br />
<strong>de</strong>cifrar, o que sugere que Freud tratava uma obra literária ou uma pintura como uma<br />
formação do inconsciente, ou seja, como um representante do sujeito. A maneira<br />
como opera com o fragmento <strong>de</strong> l<strong>em</strong>brança <strong>de</strong> Leonardo Da Vinci, por ex<strong>em</strong>plo,<br />
revela que ele acreditava que po<strong>de</strong>ria tratar a obra <strong>de</strong> um artista como tratava o<br />
material inconsciente <strong>de</strong> um paciente <strong>em</strong> análise. Por outro lado, na “Gradiva” pe<strong>de</strong><br />
ao leitor que tenha s<strong>em</strong>pre o cuidado <strong>de</strong> l<strong>em</strong>brar que está lidando com um personag<strong>em</strong><br />
<strong>de</strong> um texto ficcional, referindo-se ao arqueólogo Norbert Arnold. E chega a dizer,<br />
quanto à obra, <strong>em</strong> Moisés e o Monoteísmo, que “muitas vezes ela é in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do<br />
autor, a ele estranha <strong>de</strong> alguma forma”, questionando com isso a auto-suficiência do<br />
autor, o lugar <strong>de</strong> pai da criação.<br />
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