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Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...

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Acha que Dermée, no fundo t<strong>em</strong> razão, mas errou na fórmula. E, inimigo <strong>de</strong> fórmulas,<br />

<strong>de</strong>sdobra, corrigindo, para mais errada, a fórmula incapaz <strong>de</strong> Paulo: “lirismo puro +<br />

crítica + palavra = poesia”. Admira o contra-senso, com que, a maneira <strong>de</strong> dissertação<br />

professoral, s<strong>em</strong> nenhuma cor autêntica <strong>de</strong> verda<strong>de</strong> psicológica, introduz o novo<br />

el<strong>em</strong>ento “crítica” numa fórmula ten<strong>de</strong>nte a <strong>de</strong>finir o conceito <strong>de</strong> poesia, quando<br />

afirma, <strong>em</strong> todas as gamas, por vários modos, que a sua poesia é do inconsciente, o<br />

que para logo afasta a idéia <strong>de</strong> crítica, que é o ato natural do consciente. Barafunda<br />

marioandra<strong>de</strong>sca. Enfim, quando, sentindo por introspecção, o inútil <strong>de</strong> sua tentativa,<br />

<strong>em</strong> <strong>de</strong>finir poesia, estado que ainda não revelou conhecer experimentalmente, mas<br />

doutrinalmente o explica, sai-se por uma fresta, bufando <strong>de</strong> raiva dançante nas<br />

solturas do estilo caricatural: “t<strong>em</strong>os, pois igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> vistas entre Adão, Aristóteles<br />

e a corja quanto ao conceito <strong>de</strong> poesia”. E resolve a dificulda<strong>de</strong> que se lhe ante-olha<br />

por uma prática muito comezinha entre os partidários mo<strong>de</strong>rnistas, do menor esforço<br />

– a troça: “são poetas homens que só escreveram prosa ou (...) jamais escreveram<br />

coisa nenhuma. O mais belo po<strong>em</strong>a <strong>de</strong> D’Annunzio é a aventura <strong>de</strong> Fiume”. Mais a<br />

troça do <strong>Mário</strong> t<strong>em</strong> um caráter novo, incontestavelmente: é o <strong>de</strong> inculcar-se, note-se<br />

isto com precisão, é o <strong>de</strong> inculcar-se s<strong>em</strong>pre <strong>de</strong> aluado, <strong>de</strong>trás <strong>de</strong> cuja comodida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ste insinuado conceito <strong>de</strong> loucura, se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> contra as exigências do critério<br />

crítico, se acaso lhe venha pedir explicações das suas probl<strong>em</strong>áticas teorias <strong>de</strong> arte. E<br />

dispara: “Excluo da poesia bom número <strong>de</strong> obras primas inegáveis, etc. Não direi<br />

quais (...) seria expulso do convívio humano (...) o que, aliás, não seria mui gran<strong>de</strong><br />

exílio para qu<strong>em</strong> por universal consenso já vive no mundo da lua (...)”<br />

Conceito <strong>de</strong> Poesia<br />

Não é <strong>Mário</strong> o primeiro que tenta resolver esta questão estética por uma<br />

fórmula algébrica. Esse recurso dá um caráter <strong>de</strong> precisão à doutrina, graças aos<br />

símbolos s<strong>em</strong>pre b<strong>em</strong> aceitos da mat<strong>em</strong>ática. Mas <strong>de</strong>sconfi<strong>em</strong>os das aparências<br />

lógicas num terreno controverso como é o das teorias estéticas. Zola também<br />

“começou por conta <strong>de</strong> somar”, quando disse que a “obra d’arte é um canto da<br />

natureza visto através <strong>de</strong> um t<strong>em</strong>peramento”. E João Ribeiro, estabelecendo<br />

comparação entre essa conhecidíssima teoria e a <strong>de</strong> Arno Holz, citando a fórmula,<br />

irmã das <strong>de</strong> Paulo Dermée e <strong>Mário</strong> <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, “arte + natureza = X”, assim<br />

conceitua: “Para ele, a arte não é, como para Zola, uma ‘soma’, não é o texto ‘mais’ a<br />

interpretação do artista; é, ao contrário, uma ‘diferença’ entre a natureza e a própria<br />

natureza”. Como quer que seja, a “soma” <strong>de</strong> Zola, a “soma” <strong>de</strong> Arno Holz, a “soma”<br />

<strong>de</strong> Paulo Dermée, a “soma” <strong>de</strong> <strong>Mário</strong> <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, como a última <strong>em</strong> (...) não<br />

satisfaz<strong>em</strong>, à luz da crítica objetiva, como soluções do conceito do trabalho mental no<br />

seu mecanismo da palavra pensada, sentida, expressa <strong>em</strong> símbolos <strong>de</strong> imagens e<br />

idéias. Poesia, <strong>em</strong> suma. O po<strong>de</strong>r associativo das idéias e das imagens, segundo um<br />

ritmo inelutável da vida, produz-se <strong>em</strong> geral, por uma excitação nervosa, ou frêmito<br />

interior, ou exterior irradiante. É dos princípios rudimentares <strong>de</strong> psicologia, mas<br />

necessariamente l<strong>em</strong>brados por esclarecer a argumentação. O resultado anônimo<br />

<strong>de</strong>sse trabalho interior da colméia cerebral é a obra <strong>de</strong> arte, tanto mais rica <strong>de</strong> beleza<br />

ou graça, quanto mais feliz, próprio, fácil e amplo o po<strong>de</strong>r das relações espontâneas<br />

entre idéias e imagens associadas ou dissociadas, que é um fenômeno inverso, por<br />

simultaneida<strong>de</strong> ou contraste, mas s<strong>em</strong>pre sob as mesmas leis misteriosas do psiquismo<br />

humano. Cham<strong>em</strong>-lhe inconsciente, subconsciente, ultraconsciente, consciente.<br />

Cit<strong>em</strong>-se todos os analistas da alma e do (...), Freud, que é o <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>iro <strong>em</strong> moda da<br />

galeria gloriosa. Mas o fato é que a obra <strong>de</strong> arte continuará a produzir-se in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte<br />

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