Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...

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26.02.2014 Views

O catálago da exposição BRASIL Psicanálise & Modernismo 29 indicou-nos os passos iniciais desta investigação, ou seja, alguns livros e textos a serem pesquisados. Aliás, foi do contato com o tema desta exposição que nasceu meu desejo de desenvolver a pesquisa, cujo percurso ora apresento. Os capítulos da tese não pressupõe nenhuma continuidade evolutiva ou linear, e talvez possam ser lidos como uma montagem, numa perspectiva que se aproxima à do pensamento benjaminiano: Se o texto original se põe em ruínas nos golpes que lhe arrancam citações, com elas se constroem outros textos – as idéias descontínuas e monadológicas agrupam-se em novas constelações, o pensamento é um experimento lingüístico, ensaio, montagem. 30 No primeiro capítulo, intitulado “Seqüestro”, trataremos deste tema tal como foi estudado e desenvolvido por Mário de Andrade a partir de suas pesquisas sobre o folclore musical e de suas leituras psicanalíticas, que culminaram na publicação do artigo “O seqüestro da dona ausente”. Analisaremos o seqüestro como uma operação que aponta para o processo enunciado por Freud como recalcamento, e a sua relação com as formações do inconsciente e com a sublimação. Também rastrearemos as definições de seqüestro e recalque, com o intuito de lançar algumas hipóteses acerca da livre tradução de Mário, seus usos e possibilidades. Dando seqüência ao tema do seqüestro, abordaremos a temática da libido em Mário de Andrade, através de fragmentos dos contos “Atrás da Catedral de Ruão”, “Frederico Paciência”, “Vestida de Preto” e “Tempo da camisolinha”, todos incluídos nos Contos novos, de trechos de Amar, verbo intransitivo e do artigo crítico “Amor e medo”, articulando-os com a teoria psicanalítica. A libido será tratada a partir de Freud e de Lacan, tanto em sua vertente terna, ou seja, como amor, traduzindo-se em Mário, por exemplo, através do tema do amor à mãe, quanto em sua vertente sensual, como pulsão de vida (Eros) e como pulsão de morte (Tanatos). 29 No segundo semestre de 2000, o Museu de arte de São Paulo (MASP) recebe a exposição Freud: Conflito e Cultura, concebida pela Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos. A curadoria da exposição decidiu realizar um contraponto brasileiro para a mesma, que explorasse as relações entre a psicanálise e o modernismo. A versão brasileira da exposição chamou-se – BRASIL Psicanálise & Modernismo. Os curadores da Exposição foram Olívio Tavares de Araújo, Leopold Nosek, também coordenador geral, e Maria Ângela G. Moretzsohn. Uma grande equipe de psicanalistas ficou encarregada de fazer a revisão das obras de modernistas importantes como Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, dentre outros. Foram também examinados livros de alguns médicos, tais como Osório César, Franco da Rocha e Durval Marcondes, precursores da psicanálise no Brasil. 30 K. Muricy, Alegorias da dialética, p. 26. 13

No terceiro capítulo, o tema da loucura será tratado através de três vertentes. Inicialmente, tomaremos fragmentos da obra de Mário de Andrade nos quais se apresenta tal temática, apontando esta para alguns sentidos. Em seguida, a loucura servirá de encruzilhada entre modernistas e psiquiatras, através dos episódios e escritos que cercaram a história de Febrônio Índio do Brasil, que despertou o interesse de Blaise Cendrars e Mário de Andrade. O primeiro produziu uma série de artigos na imprensa francesa sobre Febrônio, e o segundo escreve um artigo crítico sobre o livro As revelações do príncipe do fogo, de autoria de Febrônio. Na terceira vertente, o tema da loucura será abordado via psicanálise (Freud e Lacan), marcando-se uma diferença em relação ao discurso psiquiátrico vigente na época em que estourou na imprensa o ‘caso Febrônio’. Por último, ainda tendo como referência a psicanálise, articularemos os temas psicose e escritura, procurando inserir aí questões surgidas nas duas outra vertentes. O último capítulo trata do “Inconsciente” e dos modos como Mário lançou mão do termo. Traça um percurso que vai da noção de subconsciente como profundo, energético e imagético, que se prende com os estudos da psicologia francesa, ao inconsciente como memória, reminiscência. Com os atos falhos, temos uma leitura de Freud já bastante incorporada por Mário – por exemplo, nas crônicas “Na sombra do erro” e “O dom da voz”. O sujeito do inconsciente, o inconsciente como vazio, teorizado por Lacan a partir de Freud, é surpreendido em trechos dessas mesmas crônicas. A diferença entre o sujeito como vazio e suas identificações será abordada com o poema “Eu sou trezentos...”, e através do conto “História com data”. Relações entre Mário, Freud e Benjamin serão articuladas via o seu interesse pelo fragmentário, pelo diminuto, pelo resíduo arqueológico como índice do recalcado. Por último, encontramos um inconsciente como sem-sentido na leitura do “Poema escrito aos dez anos”. A referência teórica fundamental desta tese não poderia ser outra senão a psicanálise, em função tanto do tema escolhido quanto da minha formação. Os autores que sustentam a nossa argumentação são Freud e Lacan, além dos comentadores de ambos. Dos textos freudianos, destacam-se os artigos metapsicológicos sobre o inconsciente, as pulsões e a repressão, bem como aqueles que abordam o problema da sublimação. De Lacan, foram centrais o seminário XI, Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise, o seminário III, As psicoses, trechos do seminário VII, A ética da psicanálise, e bem assim os escritos e seminários que tocam nas questões 14

No terceiro capítulo, o t<strong>em</strong>a da loucura será tratado através <strong>de</strong> três vertentes.<br />

Inicialmente, tomar<strong>em</strong>os fragmentos da obra <strong>de</strong> <strong>Mário</strong> <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> nos quais se<br />

apresenta tal t<strong>em</strong>ática, apontando esta para alguns sentidos. Em seguida, a loucura<br />

servirá <strong>de</strong> encruzilhada entre mo<strong>de</strong>rnistas e psiquiatras, através dos episódios e<br />

escritos que cercaram a história <strong>de</strong> Febrônio Índio do Brasil, que <strong>de</strong>spertou o interesse<br />

<strong>de</strong> Blaise Cendrars e <strong>Mário</strong> <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. O primeiro produziu uma série <strong>de</strong> artigos na<br />

imprensa francesa sobre Febrônio, e o segundo escreve um artigo crítico sobre o livro<br />

As revelações do príncipe do fogo, <strong>de</strong> autoria <strong>de</strong> Febrônio. Na terceira vertente, o<br />

t<strong>em</strong>a da loucura será abordado via psicanálise (Freud e Lacan), marcando-se uma<br />

diferença <strong>em</strong> relação ao discurso psiquiátrico vigente na época <strong>em</strong> que estourou na<br />

imprensa o ‘caso Febrônio’. Por último, ainda tendo como referência a psicanálise,<br />

articular<strong>em</strong>os os t<strong>em</strong>as psicose e escritura, procurando inserir aí questões surgidas nas<br />

duas outra vertentes.<br />

O último capítulo trata do “Inconsciente” e dos modos como <strong>Mário</strong> lançou<br />

mão do termo. Traça um percurso que vai da noção <strong>de</strong> subconsciente como profundo,<br />

energético e imagético, que se pren<strong>de</strong> com os estudos da psicologia francesa, ao<br />

inconsciente como m<strong>em</strong>ória, r<strong>em</strong>iniscência. Com os atos falhos, t<strong>em</strong>os uma leitura <strong>de</strong><br />

Freud já bastante incorporada por <strong>Mário</strong> – por ex<strong>em</strong>plo, nas crônicas “Na sombra do<br />

erro” e “O dom da voz”. O sujeito do inconsciente, o inconsciente como vazio,<br />

teorizado por Lacan a partir <strong>de</strong> Freud, é surpreendido <strong>em</strong> trechos <strong>de</strong>ssas mesmas<br />

crônicas. A diferença entre o sujeito como vazio e suas i<strong>de</strong>ntificações será abordada<br />

com o po<strong>em</strong>a “Eu sou trezentos...”, e através do conto “História com data”. Relações<br />

entre <strong>Mário</strong>, Freud e Benjamin serão articuladas via o seu interesse pelo fragmentário,<br />

pelo diminuto, pelo resíduo arqueológico como índice do recalcado. Por último,<br />

encontramos um inconsciente como s<strong>em</strong>-sentido na leitura do “Po<strong>em</strong>a escrito aos <strong>de</strong>z<br />

anos”.<br />

A referência teórica fundamental <strong>de</strong>sta tese não po<strong>de</strong>ria ser outra senão a<br />

psicanálise, <strong>em</strong> função tanto do t<strong>em</strong>a escolhido quanto da minha formação. Os autores<br />

que sustentam a nossa argumentação são Freud e Lacan, além dos comentadores <strong>de</strong><br />

ambos. Dos textos freudianos, <strong>de</strong>stacam-se os artigos metapsicológicos sobre o<br />

inconsciente, as pulsões e a repressão, b<strong>em</strong> como aqueles que abordam o probl<strong>em</strong>a da<br />

sublimação. De Lacan, foram centrais o s<strong>em</strong>inário XI, Os quatro conceitos<br />

fundamentais da psicanálise, o s<strong>em</strong>inário III, As psicoses, trechos do s<strong>em</strong>inário VII, A<br />

ética da psicanálise, e b<strong>em</strong> assim os escritos e s<strong>em</strong>inários que tocam nas questões<br />

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