Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...
Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...
Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
escritura po<strong>de</strong> funcionar como supl<strong>em</strong>ento da fala é porque esta já está marcada pela<br />
ausência e pelo mal-entendido.<br />
O texto inconsciente já está tecido <strong>de</strong> traços puros, <strong>de</strong> diferenças <strong>em</strong> que se<br />
un<strong>em</strong> o sentido e a força, texto <strong>em</strong> parte alguma presente, constituído por<br />
arquivos que são s<strong>em</strong>pre já transcrições. (...) <strong>de</strong>pósitos <strong>de</strong> um sentido que<br />
nunca esteve presente, cujo presente significado é s<strong>em</strong>pre reconstituído mais<br />
tar<strong>de</strong>, nachträglich, posteriormente, supl<strong>em</strong>entarmente: nachträglich também<br />
significa supl<strong>em</strong>entar. 387<br />
O inconsciente, nestes termos, é pensado como alterida<strong>de</strong> radical, como ação diferida<br />
e não como uma presença originária.<br />
A respeito do inconsciente constituído pela repressão primária, dir-nos-á<br />
Jonathan Culler, a partir <strong>de</strong> Derrida: “Como différance, que <strong>de</strong>signa a orig<strong>em</strong><br />
impossível da diferença no diferenciador e do diferenciador na diferença, o<br />
inconsciente é uma orig<strong>em</strong> não originada a que Freud chamou <strong>de</strong> repressão<br />
primária”. 388 Não sendo o inconsciente uma “auto-presença escondida, virtual e<br />
potencial”, ele difere <strong>de</strong> si mesmo. Há apenas o traço como orig<strong>em</strong> da orig<strong>em</strong>, mas<br />
sendo traço, é s<strong>em</strong>pre já repetição. Em A gramatologia, Derrida, prefere tratar <strong>de</strong><br />
arqui-traço, para diferenciá-lo <strong>de</strong> um traço <strong>em</strong>pírico e <strong>de</strong>slocá-lo <strong>em</strong> relação a um<br />
esqu<strong>em</strong>a clássico que o faria <strong>de</strong>rivado <strong>de</strong> um não-traço originário.<br />
Estas reflexões propostas por Derrida nos serv<strong>em</strong> para arrancar o inconsciente<br />
<strong>de</strong> uma metafísica da presença, evitando supô-lo um continente <strong>de</strong> heteróclitos<br />
conteúdos. Tais reflexões articulam-se, assim, às <strong>de</strong> Freud <strong>em</strong> “Construções <strong>em</strong><br />
análise”, que parec<strong>em</strong> apontar para a mesma direção. Em “Construções <strong>em</strong> análise”,<br />
Freud escreve que a matéria prima do trabalho do analista consiste <strong>em</strong> fragmentos <strong>de</strong><br />
l<strong>em</strong>branças, imagens <strong>de</strong>formadas dos sonhos, palavras e idéias que alud<strong>em</strong> ao<br />
reprimido. O paciente <strong>em</strong> análise seria levado a recordar o que foi esquecido e<br />
reprimido. A tarefa do analista seria reunir estes fragmentos e completar o que foi<br />
esquecido através <strong>de</strong> construções. Mas, se inicialmente Freud afirma, referindo-se ao<br />
“objeto psíquico”, que tudo está aí, essencialmente s<strong>em</strong> perdas, por outro lado, no<br />
movimento dialético do texto, ressaltará que não é possível fazer o paciente l<strong>em</strong>brar<br />
<strong>de</strong> todo o recalcado. N<strong>em</strong> tudo po<strong>de</strong> retornar, ser r<strong>em</strong><strong>em</strong>orado, na medida <strong>em</strong> que há<br />
um recalcado originário. A novida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste artigo <strong>de</strong> 1937 é que, ao constatar que n<strong>em</strong><br />
387 Id<strong>em</strong>, p. 200.<br />
160