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Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...

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Ainda no “Prefácio”, vê-se que para o poeta o lirismo nasce no subconsciente,<br />

e este escreve “s<strong>em</strong> pensar tudo o que [seu] inconsciente lhe grita”. O subconsciente<br />

segue “a ord<strong>em</strong> imprevista das comoções, das associações <strong>de</strong> imagens, dos contatos<br />

exteriores”. O inconsciente <strong>de</strong>sconhece a existência da gramática e das línguas<br />

organizadas, e, como Dom lirismo, é contrabandista.<br />

Dom Lirismo, ao <strong>de</strong>s<strong>em</strong>barcar do Eldorado do<br />

Inconsciente no cais da terra do Consciente, é<br />

inspecionado pela visita médica, a Inteligência,<br />

que o alimpa dos macaquinhos e <strong>de</strong> toda e<br />

qualquer doença que possa espalhar confusão,<br />

obscurida<strong>de</strong> na terrinha progressista. Dom<br />

Lirismo sofre mais uma visita alfan<strong>de</strong>gária,<br />

<strong>de</strong>scoberta por Freud, que a <strong>de</strong>nominou<br />

Censura. Sou contrabandista! E contrário à lei<br />

da vacina obrigatória. 306<br />

Apesar da diferença que <strong>Mário</strong> preten<strong>de</strong> estabelecer entre subconsciente e<br />

inconsciente, como se verifica na anotação à obra <strong>de</strong> Ribot, parece-nos que os termos<br />

acabam sendo usados por ele como sinônimos. Cabe assim um esclarecimento quanto<br />

ao uso da palavra subconsciente na psicanálise freudiana.<br />

O termo subconsciente era <strong>de</strong> uso comum na psicologia e na psicopatologia<br />

<strong>em</strong> fins do século passado, às vezes no sentido <strong>de</strong> indicar o que é “<strong>de</strong>bilmente<br />

consciente”, outras vezes no sentido <strong>de</strong> apontar para o que está abaixo do limiar da<br />

consciência, para explicar os fenômenos <strong>de</strong> <strong>de</strong>sdobramento da personalida<strong>de</strong>.<br />

Constituía-se numa das noções fundamentais do pensamento <strong>de</strong> Pierre Janet, 307 <strong>de</strong><br />

qu<strong>em</strong> <strong>Mário</strong> possuía o livro Les débuts <strong>de</strong> l’intelligence, editado <strong>em</strong> 1936. É <strong>em</strong> seus<br />

artigos iniciais que Freud utiliza o termo, especificamente num artigo publicado <strong>em</strong><br />

francês, Quelques considérations pour une étu<strong>de</strong> comparative <strong>de</strong>s paralysies motrices<br />

organiques et histériques (1893) e num fragmento dos Estudos sobre a histeria<br />

306 M. <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, “Prefácio Interessantíssimo”, Paulicéia <strong>de</strong>svairada - Poesias completas, p. 73<br />

307 A psicanálise foi introduzida na França pelo viés <strong>de</strong> “uma psicologia clínica baseada no<br />

automatismo, a subconsciência, o associacionismo ou o déficit”, via Ribot, Janet e Binet, que como<br />

Freud foram alunos <strong>de</strong> Charcot. Seguindo uma trilha divergente da vienense, seus conceitos<br />

confundiram-se com os do mestre, e conforme E. Roudinesco “não se sabe se atuaram como um<br />

obstáculo, ou se, pelo contrário, favoreceram seu triunfo”, reportando-se a esta entrada da psicanálise<br />

na França. Ribot, ao lado <strong>de</strong> Bergson, teve um papel prepon<strong>de</strong>rante na introdução <strong>de</strong> uma “ciência da<br />

alma à francesa”. Roudinesco também utiliza a expressão “inconsciente à francesa” para se referir ao<br />

filtro pelo qual passou a psicanálise na França, que implicava, antes dos psicólogos citados, as teorias<br />

da hereditarieda<strong>de</strong> e <strong>de</strong>generescência, as discussões sobre raça, a crença num i<strong>de</strong>al biológico, etc. (“El<br />

inconsciente ‘a la francesa’”, Historia <strong>de</strong>l psicoanálisis en Francia, vol. I, pp 163 a 200).<br />

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