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26.02.2014 Views

Capítulo IV – Inconsciente 127

Supraconsciente Em 1921, quando escreve o “Prefácio interessantíssimo” à Paulicéia desvairada, o Mário vanguardista, interessado nas experiências de renovação estética, estuda o papel do consciente e do inconsciente na elaboração do discurso poético. As pesquisas sobre o inconsciente, juntamente com os estudos acerca da imaginação, do mecanismo das emoções e do processo criador, inserem-se no conjunto das preocupações que visam uma compreensão de problemas concernentes ao campo das artes. No referido Prefácio, Mário escreve, citando o psicólogo francês Théodule Ribot: “Ribot disse algures que inspiração é telegrama cifrado transmitido pela atividade inconsciente à atividade consciente que o traduz”. 304 Trata-se de uma citação do livro Essai sur l’imagination créatrice de Ribot, ao lado da qual anota o leitor: “‘Inspiração’ significa imaginação supraconsciente de que é apenas um caso particular, o mais eficiente. A imaginação consciente é a rédea que prende e aperfeiçoa”. 305 Como esclarece numa outra anotação marginal no mesmo livro, supraconsciente é como chama o subconsciente e como traduz o termo inconsciente, utilizado pelo psicólogo naquele contexto. Na mesma nota, aproxima e diferencia as manifestações inconscientes e “supraconscientes”: “a incerteza, a vacuidade, a liberdade independente do próprio eu” implicam a semelhança que há entre as duas, e, assim como os sonhos, “as inspirações fictícias, provocadas pelos tóxicos”, são manifestações inconscientes, e não supraconscientes. Em A escrava que não é Isaura, Mário volta à idéia de que é necessário traduzir o que vem do subconsciente: “O poeta traduz em línguas conhecidas o eu profundo”, tradução realizada através da inteligência. Na seqüência do texto esclarece, novamente tomando Ribot como referência, que o “eu profundo” não é regido por “nenhuma determinação intelectual, que independe de nós mesmos, é impessoal e estranho”. Em La psychologie des sentiments, de 1896, Ribot define o inconsciente a partir de uma parte profunda e escondida, subconsciente, da consciência, diferenciando-a do conceito freudiano de Unbewusst. Acredita o psicólogo que o inconsciente seria uma espécie de acumulador de energia para uso da consciência. 304 M. de Andrade. Poesias completas, p. 72. 305 M. de Andrade apud Nites T. Feres, Leituras em Francês de Mário de Andrade, p. 61. 128

Supraconsciente<br />

Em 1921, quando escreve o “Prefácio interessantíssimo” à Paulicéia<br />

<strong>de</strong>svairada, o <strong>Mário</strong> vanguardista, interessado nas experiências <strong>de</strong> renovação estética,<br />

estuda o papel do consciente e do inconsciente na elaboração do discurso poético. As<br />

pesquisas sobre o inconsciente, juntamente com os estudos acerca da imaginação, do<br />

mecanismo das <strong>em</strong>oções e do processo criador, inser<strong>em</strong>-se no conjunto das<br />

preocupações que visam uma compreensão <strong>de</strong> probl<strong>em</strong>as concernentes ao campo das<br />

artes.<br />

No referido Prefácio, <strong>Mário</strong> escreve, citando o psicólogo francês Théodule<br />

Ribot: “Ribot disse algures que inspiração é telegrama cifrado transmitido pela<br />

ativida<strong>de</strong> inconsciente à ativida<strong>de</strong> consciente que o traduz”. 304 Trata-se <strong>de</strong> uma<br />

citação do livro Essai sur l’imagination créatrice <strong>de</strong> Ribot, ao lado da qual anota o<br />

leitor: “‘Inspiração’ significa imaginação supraconsciente <strong>de</strong> que é apenas um caso<br />

particular, o mais eficiente. A imaginação consciente é a ré<strong>de</strong>a que pren<strong>de</strong> e<br />

aperfeiçoa”. 305 Como esclarece numa outra anotação marginal no mesmo livro,<br />

supraconsciente é como chama o subconsciente e como traduz o termo inconsciente,<br />

utilizado pelo psicólogo naquele contexto. Na mesma nota, aproxima e diferencia as<br />

manifestações inconscientes e “supraconscientes”: “a incerteza, a vacuida<strong>de</strong>, a<br />

liberda<strong>de</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do próprio eu” implicam a s<strong>em</strong>elhança que há entre as duas, e,<br />

assim como os sonhos, “as inspirações fictícias, provocadas pelos tóxicos”, são<br />

manifestações inconscientes, e não supraconscientes. Em A escrava que não é Isaura,<br />

<strong>Mário</strong> volta à idéia <strong>de</strong> que é necessário traduzir o que v<strong>em</strong> do subconsciente: “O poeta<br />

traduz <strong>em</strong> línguas conhecidas o eu profundo”, tradução realizada através da<br />

inteligência. Na seqüência do texto esclarece, novamente tomando Ribot como<br />

referência, que o “eu profundo” não é regido por “nenhuma <strong>de</strong>terminação intelectual,<br />

que in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> nós mesmos, é impessoal e estranho”. Em La psychologie <strong>de</strong>s<br />

sentiments, <strong>de</strong> 1896, Ribot <strong>de</strong>fine o inconsciente a partir <strong>de</strong> uma parte profunda e<br />

escondida, subconsciente, da consciência, diferenciando-a do conceito freudiano <strong>de</strong><br />

Unbewusst. Acredita o psicólogo que o inconsciente seria uma espécie <strong>de</strong> acumulador<br />

<strong>de</strong> energia para uso da consciência.<br />

304 M. <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Poesias completas, p. 72.<br />

305 M. <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> apud Nites T. Feres, Leituras <strong>em</strong> Francês <strong>de</strong> <strong>Mário</strong> <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, p. 61.<br />

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